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Ressignificações para o ensino de escrita no nível médio: práticas docentes em uma escola técnica de Campinas (SP)

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

NATÁLIA FRANZONI DE OLIVEIRA

RESSIGNIFICAÇÕES PARA O ENSINO DE ESCRITA NO

NÍVEL MÉDIO: PRÁTICAS DOCENTES EM UMA ESCOLA

TÉCNICA DE CAMPINAS (SP)

CAMPINAS

2019

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RESSIGNIFICAÇÕES PARA O ENSINO DE ESCRITA NO NÍVEL

MÉDIO: PRÁTICAS DOCENTES EM UMA ESCOLA TÉCNICA DE

CAMPINAS (SP)

Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Linguística Aplicada na área de Linguagem e Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Márcia Rodrigues de Souza Mendonça

Este exemplar corresponde à versão final da Dissertação defendida pela aluna Natália Franzoni de Oliveira e orientada pela Profa. Dra. Márcia Rodrigues de Souza Mendonça.

CAMPINAS

2019

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Leandro dos Santos Nascimento - CRB 8/8343

Oliveira, Natália Franzoni,

OL4r OliRessignificações para o ensino de escrita no nível médio: práticas docentes em uma escola técnica de Campinas (SP) / Natalia Franzoni de Oliveira. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

OliOrientador: Márcia Rodrigues de Souza Mendonça.

OliDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem.

Oli1. Escrita. 2. Letramento. 3. Prática docente. 4. Ensino técnico. I. Mendonça, Márcia Rodrigues de Souza. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Resignifications to write teaching in high school: teaching practices

in a technical school in Campinas (SP)

Palavras-chave em inglês:

Writing Literacy

Teaching practice Professional Education

Área de concentração: Linguagem e Educação Titulação: Mestra em Linguística Aplicada Banca examinadora:

Márcia Rodrigues de Souza Mendonça [Orientador] Raquel Salek Fiad

José Ribamar Lopes Batista Júnior

Data de defesa: 29-08-2019

Programa de Pós-Graduação: Linguística Aplicada Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)

- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0003-4394-416X - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/1862633051134029

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Márcia Rodrigues de Souza Mendonça

Raquel Salek Fiad

José Ribamar Lopes Batista Júnior

IEL/UNICAMP 2019

Ata da defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria de Pós Graduação do IEL.

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Escrever é um ócio muito trabalhoso. (Goethe)

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DEDICATÓRIA

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, autor da vida e dela o primeiro mestre, por ter iluminado meus caminhos ao longo de todo esse percurso, não deixando que as dificuldades me impedissem de seguir o caminho dos meus sonhos.

Gratidão especial à professora Márcia Mendonça, orientadora querida e amiga, não só pelo essencial acompanhamento desta pesquisa, com leituras sensíveis dos dados, mas também por ser inspiração na vida acadêmica.

Aos colegas do grupo de pesquisa MELP, coordenado pela professora Márcia, pela troca crucial de conhecimentos, em especial Débora, Juliana, Marília e Sônia, com quem mais convivi durante o período da pós-graduação.

Aos professores Ribamar Batista e Raquel Fiad, pela leitura atenciosa do trabalho de qualificação, cujos encaminhamentos muito contribuíram para a finalização do texto da dissertação. Gratidão também por aceitarem fazer parte da banca de defesa.

Às professoras Cynthia Agra de Brito Neves e Flávia Sordi pela participação como suplentes.

Agradeço de forma muito especial, também, à escola onde gerei os dados, pertencente ao Centro Paula Souza, particularmente à equipe de coordenação, ao professor e aos alunos que foram os participantes desta pesquisa: gratidão pela disponibilidade, por confiarem em meu trabalho e me darem acesso a todos os materiais e documentos necessários e pela convivência de muita aprendizagem durante o semestre em que permaneci na escola.

À minha família, pelo incentivo e por estarem sempre na torcida pelo meu sucesso. De forma especial, a meus pais, Carlos e Edna, os maiores incentivadores de minha formação, aqueles que me ensinaram a buscar meus sonhos e me deram as oportunidades para alcançá-los. E também à minha irmã, Ana, a pessoa que sempre acredita na minha capacidade e está do meu lado. Pai, mãe e Ana, obrigada por sermos sempre família!

Ao meu marido, Willian, amor de toda a vida, pela compreensão e apoio nos momentos mais difíceis, por sempre me acalmar quando eu achava que não conseguiria. Gratidão eterna pelo nosso companheirismo.

A todos os meus amigos, em especial àqueles que fiz na Unicamp e que me acompanharam durante todo esse percurso da vida acadêmica.

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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RESUMO

O presente trabalho, desenvolvido em nível de mestrado, insere-se na área de Linguística Aplicada, mais especificamente no campo de estudo de ensino-aprendizagem de línguas, e busca compreender como o ensino de escrita se organiza na disciplina relacionada ao ensino de língua portuguesa de cursos técnicos de nível médio, a partir das práticas de letramento privilegiadas. Nessa perspectiva, esta pesquisa fundamenta-se, prioritariamente, na teoria dos novos estudos do letramento (STREET, 1984; BARTON & HAMILTON, 2000), da escrita como prática de linguagem (GERALDI, 1984), e também nos conceitos de gênero e esfera de Bakhtin (2003 [1979]). A coleta de dados ocorreu em uma escola técnica do Centro Paula Souza, localizada na cidade de Campinas, SP, entre agosto e dezembro de 2017, e teve como foco as aulas responsáveis pelo trabalho com a língua portuguesa do curso de mecânica integrado ao ensino médio, bem como do curso de mecânica modular. Recorremos à observação do campo de pesquisa e à tomada de notas, além da realização de entrevistas com alunos, professores e coordenação. Ademais, nossa pesquisa baseou-se na análise de documentos e diretrizes curriculares, assim como de dispositivos didáticos utilizados em aula. Nessa perspectiva, este estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, pois utilizou de ferramentas que exigem uma análise de base interpretativista por parte do pesquisador, e define-se como um estudo de caso (STARK & TORRANCE, 2005; ANDRÉ, 2012), cuja metodologia de coleta foi a observação participante (JONES & SOMEKH, 2005), com a adoção de uma postura etnográfica. Após organização dos dados a partir da descrição dos eventos de letramento (BARTON & HAMILTON, 2000) ocorridos nas aulas de língua portuguesa, identificamos três práticas de escrita que, pelo interesse dos alunos e abordagem do professor, tiveram destaque e foram escolhidas para análise – a prática de redação escolar, a de TCC e as do mundo do trabalho-, a qual foi orientada por três categorias de análise: natureza das atividades realizadas, ou seja, o que o professor realiza, como ele desenvolve o trabalho com a escrita; objetos de ensino mobilizados, isso é, quais os conteúdos que se tornaram foco de ensino; e materiais didáticos utilizados, qual seja, os instrumentos didáticos a que o professor recorreu. Os resultados apontaram para uma mescla entre diferentes concepções de escrita por parte do docente a depender da prática de escrita a ser trabalhada, estando ora mais próximo de uma visão desta como processo, ora de um produto acabado, o que evidencia um professor em busca da consolidação de seu trabalho de mediador da aprendizagem de escrita dos seus alunos em curso técnico.

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ABSTRACT

The present work was developed in a Master’s degree level, it is in the field of Applied Linguistics, related specifically to the study of language teaching and learning. It aims to understand how the writing teaching organizes itself in the discipline related to the Portuguese language teaching in the technical courses in high school based on privileged practices of literacy. In this term, this research is based first and foremost on the theory of the New Literacy Studies (STREET, 1984; BARTON & HAMILTON, 2000), in the writing as a language practice (GERALDI, 1984), and also in the concept of genre e sphere de Bakhtin (2003 [1979]). The gathering of data occurred in a Centro Paula Souza technical school, located in the city of Campinas – SP, in the period between August to December in the year of 2017, the focus was in the classes where the Portuguese language was taught in the Professional/Secondary School, as well as modular mechanics. We observed the field of research and we took some notes, we also had interviews with the teachers, students and coordinators. Moreover, our research is based on the analysis of documents together with curricular guidelines and also in teaching mechanisms used in class. In this perspective, this study has a characteristic of a qualitative research because it has used tools that demand an interpretational base on the part of the researcher and defines itself as a case study (STARK & TORRANCE, 2005; ANDRÉ, 2012), whose the collecting methodology was the participant observation (JONES & SOMEKH, 2005), with the adoption of an ethnographic posture. After organizing the data based on the description of the literacy events (BARTON & HAMILTON, 2000) occurred in the Portuguese classes, we have identified three writing practices that, by student’s interest and teacher’s approach, were highlight and were chosen for the analysis – the school essay writing; Course Conclusion Paper and the ones related to the work environment, which was oriented by three analysis categories: the nature of the realized activities, in other words, what the teacher does, how the task is developed by the teacher; mobilized teaching objects, that means what contents became the teaching focus; and didactic material used, which can be the didactic instruments that the teacher has used. The results pointed to a mix of different writing conceptions on the part of the teacher depending on the writing practice that will be used, sometimes it is closer to a process, and sometimes something that is finished, that shows a teacher looking for the consolidation of the work as an writing learning mediator of his student in the Professional Education.

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CONVENÇÕES DE TRANSCRIÇÃO1

... - Qualquer pausa

(inint.) - Incompreensão de palavras ou segmentos

/ - Truncamento (palavras incompletas)

MAIÚSCULA - Entoação enfática

:: - Prolongamento de vogal ou de consoante

? – Entonação de pergunta

1 Adaptadas das normas adotadas pelo projeto NURC (Norma Urbana Oral Culta). Disponível em: PRETI D. (Org.) O discurso oral culto. São Paulo: Humanitas Publicações – FFLCH/USP, 1999.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 13

CAPÍTULO 1 – O ENSINO TÉCNICO NO BRASIL: DE ONDE VEIO, PARA ONDE CAMINHA ... 17

1.1. Percurso histórico da educação profissional técnica de nível médio ... 18

1.2. O Centro Paula Souza ... 25

1.2.1. O ensino de Língua Portuguesa no Centro Paula Souza ... 26

CAPÍTULO 2 – O TRABALHO COM O EIXO DA ESCRITA: UM PANORAMA DO CONTEXTO EDUCACIONAL BRASILEIRO ... 34

2.1. Leitura e escrita: habilidades ou práticas sociais? O que diz a teoria dos letramentos .. 37

CAPÍTULO 3 - METODOLOGIA ... 41

3.1. A metodologia de pesquisa: objetivos e perguntas de pesquisa ... 41

3.2. A abordagem qualitativa de pesquisa e a metodologia de coleta dos dados ... 42

3.2.1. O estudo de caso: uma abordagem de estudo em profundidade ... 43

3.2.2. Metodologia de coleta: observação participante e postura etnográfica... 46

3.3. O campo de pesquisa ... 50

3.4. O processo de análise dos dados: categorias e critérios ... 52

CAPÍTULO 4 - O TRABALHO COM A ESCRITA NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO TÉCNICA: DA ESFERA ESCOLAR À ESFERA DO MUNDO DO TRABALHO ... 54

4.1. As aulas de Língua Portuguesa em análise: o que fazem alunos e professor? ... 54

4.2. Língua Portuguesa, Literatura e Comunicação Profissional (LPL): A prática de redação escolar ... 65

4.3. Linguagem, Trabalho e Tecnologia (LTT): As práticas do mundo do trabalho ... 73

4.4. LPL e LTT: A prática do TCC ... 85

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 103

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 107

ANEXO I – Roteiros de entrevistas semiestruturadas ... 111

ANEXO II – Questionários aplicados às turmas... 115

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ANEXO IV – Modelo de TCLE ... 122 ANEXO V – Modelo de Termo de Assentimento ... 125

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INTRODUÇÃO

A pesquisa científica na área do ensino médio, última etapa a ser incluída como educação básica no Brasil, configura-se como uma necessidade, tendo em vista os múltiplos questionamentos acerca das funções de tal etapa, quais sejam, se um ensino mais propedêutico, se mais voltado para o mercado de trabalho, ou ainda se integrador de tais alternativas e, então, as possibilidades para isso. Nesse contexto, o ensino técnico de nível médio apresenta-se como um objeto de estudo significativo, por ser uma modalidade em que as esferas escolar e profissional atravessam-se, transpondo-se uma a outra, o que é ampliado no contexto brasileiro, no qual a construção da cultura escrita não se restringiu à difusão da instrução nas escolas, mas estendeu-se às relações das letras com os diferentes grupos da sociedade, inclusive no âmbito do trabalho (LUZ, 2007). Nesse sentido, há um interesse nesta pesquisa em compreender quais são as práticas que ocorrem nas aulas de língua portuguesa do ensino técnico, ou seja, se mais voltadas para a esfera escolar, para a profissional ou se acontece um equilíbrio entre ambas, visando, ao final, colaborar com reflexões sobre a formação e prática docente na área de linguagens dentro do contexto da educação técnica. Desse modo, esta pesquisa de mestrado tem como recorte temático o ensino-aprendizagem do eixo da escrita no contexto da educação técnica profissional de nível médio e, para realizá-la, foram acompanhadas as aulas relacionadas ao ensino da língua portuguesa em uma escola do Centro Paula Souza, autarquia do Estado de São Paulo responsável pelas ETECs e FATECs (escolas e faculdades técnicas, respectivamente).

O interesse pelo estudo do ensino médio técnico inicia-se a partir de uma pesquisa de iniciação científica realizada pela pesquisadora, a nível de graduação, que discutia práticas de leitura e escrita na esfera do trabalho e foi empreendida em uma imobiliária no interior do estado de São Paulo. Assim, em um desejo de aproximação do contexto escolar, sem perder de vista a área do trabalho, buscou-se por uma escola que tivesse alguma interface com a formação para o trabalho, chegando-se, assim, às escolas técnicas.

Para além das motivações pessoais, o interesse pela área justifica-se por, a partir do século XX no Brasil, a formação profissional do cidadão delinear-se claramente como uma preocupação do Governo Federal, já que a esse ensino se atribui um papel estratégico para o país, visto que está direcionado tanto a interesses do próprio trabalhador – ou de estudantes prestes a ingressarem no mercado de trabalho -, por ser uma forma de atingirem uma melhor qualificação, de forma mais rápida do que no ensino superior, quanto a interesses do governo e do setor empresarial, os quais estão em busca de um desenvolvimento do mercado interno e de mão de obra mais qualificada.

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Além disso, considerando a responsabilidade social que a pesquisa aplicada exige, a qual direciona para um ativismo por parte do pesquisador (MOITA LOPES, 1996), principalmente em casos nos quais a temática está em evidência no âmbito público, o interesse pelo estudo do ensino técnico é ampliado, tendo em vista a recente reforma implementada no Brasil no âmbito do ensino médio, por meio de medida provisória decretada pelo então Governo Federal em 2016 (Medida Provisória nº 746), que, em 2017, é sancionada como Lei 13.415. Dentre as modificações impostas à Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), esta nova legislação determina, em seu Artigo 36, que o currículo do ensino médio deverá ser composto pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que à época já estava em discussão, e por cinco itinerários formativos, sendo eles: linguagens e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais aplicadas; e formação técnica e profissional. Isso significa que essa nova estrutura determina uma parte comum e obrigatória a todas as escolas, por meio da BNCC, e uma parte flexível, pelos itinerários formativos, na qual, em tese, os alunos optariam pelo caminho que mais lhes interessa para um aprofundamento. Como consta no portal do Ministério da Educação (MEC)2, a BNCC ocupará 1800 horas do currículo do ensino médio, sendo responsável por definir as competências e conhecimentos essenciais das 4 áreas do conhecimento (linguagens e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais aplicadas), sendo que as únicas disciplinas a serem mantidas ao longo dos três anos do ensino médio são português e matemática. As outras 1200 horas do currículo serão ocupadas pelo itinerário formativo pelo qual o aluno optar. Nesse cenário, surge uma primeira preocupação, já que a redação do Artigo 36 da LDB deixa claro que as escolas não são obrigadas a oferecer todos os itinerários, quando afirma que

o currículo do ensino médio será composto pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerários formativos, que deverão ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino (BRASIL, LDB, Art. 36).

Observa-se, assim, que essa lei busca resolver, de forma desastrosa para a qualidade de ensino, a falta de professores, de várias disciplinas, enfrentada por muitas escolas, já que agora bastaria não oferecer o itinerário cuja área tem de escassez de docentes. Assim, em vez de incentivar a formação docente e sua valorização, opta-se por tornar legal a

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cada vez maior falta de professores, relacionada, dentre diversos motivos, à desvalorização contínua sofrida pela carreira.

Outra preocupação que se manifesta, agora mais claramente relacionada à educação técnica, diz respeito à redução da carga horária do núcleo comum de disciplinas do ensino médio para quem optar pelo itinerário da formação técnica e profissional. Isso porque, até então, os alunos que faziam o ensino técnico integrado ao médio, deveriam cursar, ao menos, as 2400 horas do ensino médio regular, além de 1200 horas do técnico. Com a nova lei, como consta no site do MEC, será permitido que o aluno opte por uma formação técnica dentro da carga horária do ensino médio regular, desde que ele curse português e matemática ao longo dos três anos. Assim, quem fizer essa escolha, cursará as 1800 horas do currículo previsto pela BNCC, e as outras 1200 horas do currículo técnico. Dessa forma, nota-se a redução de 600 horas de disciplinas do núcleo regular em relação ao contexto anterior à reforma. Logo, nesse cenário ainda muito nebuloso, surge a dúvida sobre que caminhos se delinearão para a área técnica. Isso porque desponta o receio de que estes cursos voltem a restringir o acesso de parte da população à continuação dos estudos acadêmicos, uma vez que com a carga horária de disciplinas do ensino médio reduzida, o acesso aos vestibulares pode ser dificultado, ficando esses alunos limitados apenas à composição da mão de obra, o que seria um retrocesso frente às conquistas iniciadas neste século de acesso à universidade. Por isso, o estudo da educação técnica de nível médio apresenta-se também como importante ferramenta de resistência, à medida que focaliza esse contexto.

Além de salientar esse contexto de disputas do ensino médio técnico, esta pesquisa aborda ainda o trabalho com a escrita, eixo bastante discutido, tendo em vista a busca por um ensino que considere a aprendizagem da escrita como um processo, e não como um produto acabado, além de levar em conta a situação de produção do texto e seu contexto de recepção, evitando uma prática de escrita descontextualizada e baseada em modelos rígidos, que vise apenas à aprovação em provas, padrão de ensino tão recorrente nos dias de hoje.

Pode-se dizer, então, que o objetivo geral deste estudo é compreender como o ensino de escrita organiza-se na disciplina de língua portuguesa de cursos técnicos de nível médio, a partir das práticas de letramento privilegiadas. Para cumprir tal objetivo, a escrita desta dissertação divide-se em quatro capítulos, além das considerações finais. No primeiro, é traçado um perfil histórico do ensino técnico no Brasil, desde suas primeiras configurações até a consolidação e expansão da rede federal, além da apresentação do Centro Paula Souza, seus histórico, modalidades de cursos ofertados, objetivos, currículos, já então fazendo um

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recorte para a área de linguagens a fim de explicar como está organizado o ensino-aprendizagem de língua portuguesa na instituição. Em seguida, o segundo capítulo contextualiza o trabalho com a leitura e, principalmente, a escrita, no contexto brasileiro, identificando as principais abordagens teóricas que influenciaram o campo nas últimas décadas, discorrendo, pois, sobre os letramentos, conceito chave desta pesquisa. O terceiro capítulo, a sua vez, explicita a metodologia do estudo, apresentando desde as perguntas que guiaram a pesquisa, os objetivos geral e específicos, até as perspectivas metodológicas adotadas, como o estudo de caso, a observação participante e a postura etnográfica. É feita, ainda, a enumeração dos instrumentos de coleta utilizados, a delimitação do corpus gerado, descrição do campo de pesquisa, bem como explicitação do processo de análise dos dados, as categorias e critérios utilizados. Já no quarto capítulo, insere-se a descrição e análise dos dados gerados, que buscam identificar o que se realiza nas aulas observadas a fim de discutir sobre como ocorre o ensino de escrita no contexto em questão. Por fim, as considerações finais trazem uma síntese das questões observadas na análise, além de algumas ponderações sobre possíveis caminhos a serem seguidos no trabalho com o eixo da escrita no contexto do ensino técnico de nível médio, a partir do que evidenciou a pesquisa.

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CAPÍTULO 1 – O ENSINO TÉCNICO NO BRASIL: DE ONDE VEIO, PARA ONDE CAMINHA

As instituições de Educação Fundamental e Média não são uma mansão pronta, sólida, estável onde os únicos a mudarem, inovarem, são os moradores, a mobília, a culinária, o cardápio intelectual. O sistema educacional é uma construção histórica construída no tempo, mas também desconstruída, renovada, ao menos pautada, maquiada em cada tempo.

(Miguel Arroyo)

O mundo do trabalho tem forte presença na vida dos jovens, seja pelos questionamentos sobre qual profissão seguir, seja pela necessidade, de muitos jovens brasileiros, de trabalhar desde muito cedo para ajudar na subsistência da família. Nesse contexto, preparar para o trabalho e para a cidadania é uma das finalidades do ensino médio brasileiro, definida no Artigo 35 da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), mas, apesar da inserção no mercado de trabalho ser uma preocupação para grande parte do público juvenil, a ideia de escola como um lugar que prepara para o trabalho é algo recente, como aponta Corrochano (2014), já que até o início do século XIX, os filhos dos trabalhadores, ou seja, pertencentes às classes sociais mais baixas, tinham de trabalhar desde muito cedo, o que, somado à não obrigatoriedade de escolarização até então, afastava da escola os princípios sobre trabalho. No Brasil atual, embora estar na escola seja obrigatório, vários jovens ainda ingressam muito cedo no mercado, o que faz com que conciliem ou superponham estudo e trabalho. Por isso, pode-se dizer que “(...) o processo de expansão do ensino não retirou o jovem do mercado de trabalho. É o jovem trabalhador que se torna estudante” (CORROCHANO, 2014, p. 213).

Assim, embora saibam que a escola não garante, necessariamente, o alcance a um bom emprego, esses jovens trabalhadores têm conhecimento do quão competitivo e exigente encontra-se o mercado de trabalho, ainda mais em um contexto de alta taxa de desemprego, aliada às múltiplas mudanças trabalhistas que se configuram, em sua maioria, como perdas para o empregado, o que os leva a apostar que a permanência na escola é uma chance maior na corrida pelo emprego. Os cursos profissionalizantes aparecem, então, como uma

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alternativa, já que de acordo com Corrochano (2014), a escola média tem muito pouco a oferecer aos jovens no que diz respeito a seus projetos de trabalho. Nesse viés, pode-se entender que a configuração do ensino médio como local de preparação para exames vestibulares afastou a possibilidade de uma formação também voltada ao trabalho, ou mais grave ainda, como discute Arroyo (2014), tornou essa etapa de ensino sem identidade própria ou tendo como referência apenas o que é demandado pelo ensino superior. Corrochano (2014) pontua, então, que a busca pelos cursos técnicos se relaciona também a uma demanda ao próprio ensino médio, já que a educação técnica se mostra aos alunos como uma possibilidade de experimentação e encontro de repostas sobre carreira, mercado de trabalho, ou seja, o planejamento de projetos para a vida futura, o qual, muitas vezes, a escola básica não oferece.

Na perspectiva de melhor compreender como essa modalidade de ensino organiza-se, e considerando as recentes modificações previstas ao ensino técnico, já comentadas na introdução deste trabalho, este capítulo busca traçar um histórico da educação técnica de nível médio brasileira, na tentativa de entender seu surgimento e expansão, aliados a diferentes fatores, como momento histórico, interesses políticos e econômicos, além da demanda social.

1.1. Percurso histórico da educação profissional técnica de nível médio

O ensino técnico brasileiro, tal como conhecemos hoje, começa a se configurar apenas no início do século XX, porém a formação de trabalhadores tem suas raízes já no período da colonização brasileira, tendo índios e escravos como os primeiros aprendizes de ofícios, o que, segundo Fonseca (1961), habituou o povo a entender tal forma de ensino como destinada somente às pessoas pertencentes às camadas mais baixas do estrato social. Nota-se, assim, que a polêmica acerca da educação técnica como uma formação destinada às classes minoritárias é remota.

Mas é no início do século XIX que ocorrem as primeiras iniciativas sistemáticas de uma educação profissional. Ainda nesse viés assistencialista, implementa-se a aprendizagem dos ofícios manufatureiros que, de acordo com documento publicado pelo Ministério da Educação, quando dos cem anos da Rede Federal de Educação Profissional3, era destinada ao amparo das pessoas menos privilegiadas. Nesse contexto, encaminhavam crianças e jovens para casas onde aprendiam ofícios como carpintaria e sapataria, além da

3 Documento disponível no Portal MEC:

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instrução primária. Um marco importante para a formalização educacional dessa época é a criação, por Dom João VI, com a chegada da família real ao Brasil, do Colégio das Fábricas, que tinha por objetivo a educação de artistas e aprendizes vindos de Portugal. Pode-se dizer que tal estabelecimento é o primeiro instalado pelo poder público com fins educativos (GARCIA, 2000 apud MEC, 2009). Observa-se, pelo contexto até aqui evidenciado, que o surgimento da educação técnica no Brasil tem claramente um viés assistencialista, o que é, inclusive, assumido pelo documento base da educação profissional técnica de nível médio integrada, publicado pelo MEC em 2007, quando diz

A educação profissional no Brasil tem, portanto, a sua origem dentro de uma perspectiva assistencialista com o objetivo de amparar os órfãos e os demais desvalidos da sorte, ou seja, de atender àqueles que não tinham condições sociais satisfatórias, para que não continuassem a praticar ações que estavam na contra ordem dos bons costumes (MEC, 2007, p. 10/11).

O documento ainda ressalta que o século XIX foi marcado pela criação, principalmente pela sociedade civil, dessas instituições destinadas ao ensino das primeiras letras, bem como à iniciação em ofícios, evidenciando ainda como o ensino técnico, em sua gênese, esteve ligado à iniciativa privada, o que, segundo Zibas (2005), era também uma característica da educação secundária pelo menos até a década de 30 do século XX, já que havia a ideia de que tal luxo aristocrático deveria ser abandonado pelo Estado ao setor particular.

É no século XX, em um contexto de economia voltada ao setor agrário e à exportação, já com várias fábricas instaladas no Brasil, que o ensino profissional deixa de ser visto apenas pelo viés assistencial, para assumir a identidade de preparatório para o exercício profissional. Ou seja, tal modalidade de ensino passa a atender às necessidades dos empregadores, que, em um contexto emergente de industrialização e agricultura, precisavam de uma mão de obra mais qualificada, tendo em vista o recente fim da escravidão no país. O primeiro passo para a formalização da educação profissional é dado por Nilo Peçanha, em 1906, quando ainda era governador do Rio de Janeiro que, por meio do decreto nº 746, cria quatro escolas profissionais no estado. Ainda nesse ano, ocorreram ações importantes para a consolidação do ensino técnico no Brasil, como a apresentação ao Congresso Nacional de um projeto de promoção do ensino prático industrial, agrícola e comercial, que previa a criação de oficinas escolares para habilitar os alunos no manuseio de instrumentos de trabalho; e também o aumento do orçamento dos Estados para criação de escolas profissionais (MEC, 2009, p. 2). As transformações na visão do ensino técnico, assim como o foco dado a essa modalidade de ensino, ficam claras inclusive pela fala no discurso de posse do então presidente da República,

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Afonso Pena, segundo o qual “A criação e multiplicação de institutos de ensino técnico e profissional muito podem contribuir também para o progresso das indústrias, proporcionando-lhes mestres e operários instruídos e hábeis” (MEC, 2009, p. 2).

O marco da criação do que atualmente é conhecido como a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica deu-se em 1909, quando, após a morte de Afonso Pena, Nilo Peçanha assume a presidência do país e assina o decreto nº 7566, pelo qual cria 19 “Escolas de Aprendizes Artífices”, destinadas ao ensino profissional, primário e gratuito, sob a competência do Ministério dos Negócios da Agriculta, Indústria e Comércio. É interessante observar aqui como a institucionalização da educação técnica assume um fim relacionado aos interesses econômicos do país, o que pode ser observado pelo Ministério responsável por seu desenvolvimento. É somente em 1930 que ocorre a criação do Ministério da Educação, à época chamado Ministério da Educação e Saúde Pública, que, por meio de uma inspetoria, torna-se o responsável pela supervisão das Escolas de Aprendizes. Paralelo a isso, de acordo com Cordão (2005), desde o início do período republicano, era de responsabilidade do Ministério da Justiça e dos Negócios Interiores os ensinos secundário e superior, evidenciando os fins de cada uma das modalidades de ensino (técnico e propedêutico).

Em termos constitucionais, é somente no Estado Novo, de Getúlio Vargas, em 1937, que a educação técnica é abordada. Nota-se, pela redação do artigo 129, o dualismo que acompanha o ensino técnico ao longo da história, pela ideia de que este seria destinado às classes mais pobres, enquanto o ensino propedêutico seria direcionado às classes altas.

O ensino pré-vocacional e profissional destinado às classes menos favorecidas é, em matéria de educação, o primeiro dever do Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1937, Art. 129 apud MEC, 2009, p. 4).

Além dessa dualidade, a Constituição de 1937 aponta ainda para o papel da iniciativa privada no contexto da formação técnica, quando afirma o dever das indústrias em criar escolas de aprendizes destinadas aos filhos dos operários, o que claramente remonta à ideia de uma escola técnica voltada apenas à formação de mão de obra, sem a possibilidade de continuidade dos estudos.

É dever das indústrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera de sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderes que caberão ao Estado sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo poder público (ibidem).

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É nesse contexto que, em 1942, é criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e, em 1946, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), em exercício ainda hoje, no que se conhece como sistema “S”, isso é, um sistema de contribuições que são repassadas a entidades privadas, como as acima citadas, além de outras sete, como o SESI (Serviço Social da Indústria).

Essa evidente maior preocupação do poder público com a implementação da educação técnica no país é consolidada em 1941 com a Reforma Capanema, liderada pelo ministro Gustavo Capanema, que remodelou o ensino técnico no país. Dentre as resoluções criadas, destaca-se o fato de o ensino profissional passar a ser considerado de nível médio, tendo em vista que, até então, era parte da educação primária; tem-se, ainda, a criação dos exames de admissão para entrada nas escolas técnicas; e também o início do processo que culminará na vinculação do ensino técnico à estrutura educacional do país como um todo, já que pela lei nº 1076/50, passa-se a permitir que os concluintes de cursos profissionalizantes pudessem ingressar no ensino superior (CORDÃO, 2005).

É preciso considerar, a partir do contexto evidenciado acima, que entre 1930 e 1945, houve uma demanda muito grande por operários qualificados, o que segundo Winckler e Santagada (2012), é consequência da implantação do capitalismo industrial, introduzido pelo projeto industrializante de país.

A criação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) em 1961 é que acaba formalmente com a dualidade entre ensino técnico e propedêutico, isso é, que põe fim (ao menos por um momento) à ideia de uma educação voltada às elites e outra à classe operária, já que institui a equivalência entre todos os cursos de mesmo nível sem a necessidade de provas que os equiparem. De acordo com o documento base da educação profissional, tal cessação é apenas formal, devido aos currículos dos cursos, os quais continuavam privilegiando o estudo científico e das artes nas escolas voltadas às elites, enquanto as escolas técnicas reduziam tais conteúdos em favor das necessidades do mundo do trabalho. Para Winckler e Santagada (2012), essa insistente separação entre educação propedêutica e profissional é consequência do princípio educativo dos modelos taylorista e fordista, que propõem uma separação rigorosa entre atividades intelectuais e operacionais, como consequência refletindo na organização separatista dos sistemas de ensino, apesar da equivalência legal entre as modalidades. Vale dizer ainda que é por essa LDB, também, que se formaliza a liberdade para a iniciativa privada no setor educacional.

Passados apenas dez anos, implementou-se uma mudança significativa nessa primeira LDB no que diz respeito à educação profissional, visto que esta se tornou universal

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no nível do ensino médio, à época chamado ensino de 2º grau. Tal obrigatoriedade do ensino profissional, antes delegado a classes inferiorizadas, tem relação com o momento histórico do país, o qual vivia uma ditadura militar que visava o conhecido “milagre econômico” que, a sua vez, exigia mão de obra para atender a esse crescimento. Para Cordão (2005), no entanto, tal reforma educacional foi impulsionada principalmente para frear a busca pelas universidades por parte dos concluintes do 2º grau, tendo em vista que leis recentes haviam permitido o acesso por todas as modalidades de nível médio. Para o autor, os efeitos de tal reforma foram desastrosos, pois centenas de cursos técnicos foram criados sem os investimentos adequados, tanto para a estrutura física, quanto para aspectos educacionais, como a formação de professores, o que gerou cursos de baixa qualidade e, para piorar, ajudou na descaracterização do ensino secundário, em especial o público estadual. Isso porque não houve uma preocupação por parte do Governo em preservar a carga horária mínima destinada à formação geral do cidadão, sob alegação da necessidade de mais aulas profissionalizantes a fim de que o aluno concluísse o 2º grau e conseguisse um emprego. Essa visão de educação, apoiada no modelo de expansão econômica do momento, tinha um intuito omisso de alavancar o setor privado da educação superior, desobrigando o governo de maiores investimentos nesse nível.

O discurso oficial prestava-se a motivar os alunos à conclusão de um curso técnico, arrumar um emprego, e assim conseguir recursos para investir na educação superior, especialmente na educação superior privada. Muitos dos cursos criados, entretanto, atenderam mais a apelos mercadológicos ou então político-eleitorais do que a demandas reais da sociedade, principalmente dos trabalhadores e dos empregadores (CORDÃO, 2005, p. 51).

Como consequência, ocorreu uma migração dos filhos da classe média em direção às escolas privadas, o que somado às múltiplas críticas no âmbito acadêmico ao então contexto da educação média, alimentou o processo de desvalorização da escola pública, especialmente as estaduais, o que ainda hoje motiva discursos de desvalorização do ensino público e abertura das escolas à iniciativa privada, seja na área da gestão, seja na escolha dos materiais didáticos.

Em um contexto tão problemático, a profissionalização obrigatória perde forças e inicia um processo de desaparecimento no país, já que, no início da década de 80, a lei n. 7044/82 torna facultativa tal modalidade. Esse fato relaciona-se diretamente, segundo Winckler e Santagada (2012), à reestruturação do Estado e da economia sob um viés liberal, pautado em uma agenda de desenvolvimento proposta por órgãos internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, os quais tinham por pressuposto uma educação voltada para a formação

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cidadã, o que valorizou a educação geral em detrimento da profissional, já que esta era muito mais voltada à transmissão de conteúdos. Assim, mesmo os cursos profissionalizantes passam a ter uma preocupação com a formação integral do indivíduo, uma vez que inclusive a Constituição de 1988 trata da educação profissional como relacionada a dois direitos básicos do cidadão: o direito à educação e o direito ao trabalho.

A Reforma da Educação Profissional, em 1997, adota novamente a separação entre ensino propedêutico e ensino técnico, já que este último passa a ser oferecido obrigatoriamente de forma separada do primeiro. No caso, os cursos profissionais poderiam ser oferecidos de forma concomitante ao ensino médio, isso é, o estudante cursa ao mesmo tempo ambas as modalidades, mas com matrículas distintas; ou sequencial, quando o aluno já concluiu o ensino médio. Essa Reforma tinha como pano de fundo uma visão de governo neoliberal, que avaliava a rede federal de ensino técnico como custosa em relação ao ensino médio regular (WINCKLER E SANTAGADA, 2012), e previa a privatização do setor público, já que a ideia era reestruturar a Rede Federal a fim de torna-la competitiva no mercado educacional e, assim, buscar arrecadação a partir da prestação de serviços, eximindo o Estado de custear sua manutenção.

Em 2004 ocorre nova mudança nesse cenário em função das visões educacionais do governo eleito, que considerando as desigualdades sociais do país e, portanto, a necessidade de muitos jovens de entrarem no mercado de trabalho antes da conclusão do ensino médio, encontra como alternativa a implantação de um ensino médio que garanta o aprofundamento dos conhecimentos científicos de forma integrada à formação profissional. Assim, além do oferecimento das modalidades concomitante e subsequente, volta-se a ter a possibilidade da educação técnica de nível médio integrada ao ensino médio, mas com a clareza de que a primeira não pode tomar o lugar do segundo, como ocorreu em 1971. Nesse contexto, a educação profissional passa por um período de expansão4, o qual foi marcado, em 2008, pela publicação do Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos, um importante instrumento de divulgação e regulação dos cursos técnicos no país. Tem-se, então, a configuração de uma educação que se origina como uma política voltada para as classes desvalorizadas, e que alcança a ideia de permitir que todos tenham acesso às conquistas técnicas e científicas.

A conclusão a que se chega a partir de tal cenário é que o ensino médio, em especial sua relação com a educação profissional, é marcado por movimentos de avanço e retrocesso, sempre em busca de tentar resolver a dualidade que o cerca. Segundo Krawczyk

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(2014), ora algumas reformas procuraram integrar as variadas modalidades e pôr fim ao caráter de terminalidade dos estudos profissionalizantes, ora restringiram a mobilidade educacional e reforçaram a segmentação do sistema.

E é devido a este último protótipo de reforma, de caráter mais separatista, que surge o receio, já evidenciado na introdução deste trabalho, acerca da última reforma do ensino médio, aprovada em 2017 no Brasil. É preciso considerar, primeiramente, que a universalização do ensino médio público e gratuito é muito recente, pois, embora a Constituição de 1988 já identificasse tal etapa como parte do ensino básico, é somente em 2009, com a lei nº 12.061, que se garante o ensino completo obrigatório. Logo, esta é uma etapa de expansão muito recente no país e, apesar disso, já se discute uma nova reforma, a qual se sustentaria pelos índices de evasão, baixo desempenho em exames avaliadores e desinteresse dos alunos. No entanto, tais aspectos não são característicos somente do ensino médio, já que de acordo com o Censo Escolar de 2018, publicado pelo INEP em 31 de janeiro de 2019, houve uma queda de 7,1% nas matrículas do ensino médio, mas também de 4,9% no ensino fundamental. Parece haver, então, uma tendência a usar tais indicadores para justificar reformas, fechamento de salas em escolas (como ocorreu recentemente em São Paulo) e desvalorização do ensino público, o que, a sua vez, altera o foco dos reais problemas encontrados, como a continuada desvalorização da carreira do professor, a falta de infraestrutura das escolas, a lotação das salas de aula, isso é, uma precarização da escola pública que, na verdade, podemos dizer estar aliada a uma precarização maior, da própria vida, vide os congelamentos de gastos com direitos sociais, a exemplo da PEC 55, a Reforma Trabalhista e os mais recentes avanços contra a aposentadoria das classes menos favorecidas.

Nesse contexto, a Reforma do Ensino Médio (Lei nº 13.415), instituída de início como Medida Provisória, aparece, nos discursos políticos, como uma solução para os problemas acima evidenciados, mas, na verdade, parece vir a complementar um projeto de desvalorização/ precarização do ensino público, a fim de que as classes menos favorecidas se mantenham sem acesso à educação de qualidade. É o que se observa, por exemplo, pela delimitação, da então Reforma de 2017, de que apenas Português e Matemática serão disciplinas obrigatórias ao longo dos três anos do Ensino Médio, provocando uma diminuição na carga horária de outras disciplinas, a depender do itinerário formativo que o aluno optar seguir, além de passar a ideia de que as outras áreas do conhecimento humano têm menos importância para a socialização e o avanço intelectual do jovem. Nesse cenário, a situação da educação técnica é ainda mais preocupante, visto que a Formação técnica e profissional passa a ser um dos itinerários formativos (junto aos outros quatro: Linguagens e suas Tecnologias,

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Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Ciências Humanas e Sociais Aplicadas) a que o aluno pode optar seguir. Em caso de ser essa a escolha, esse aluno terá apenas as 1800 horas de Base Nacional Comum Curricular (BNCC) dedicadas à formação geral (já que as outras 1200 horas serão de formação técnica), e pode, a depender do cenário que se configure, ter ainda mais dificuldades de acesso ao ensino superior, vide a concorrência com alunos das escolas privadas, onde é pouco provável que a formação geral seja reduzida. Além disso, essa Reforma tem como consequência uma abertura à iniciativa privada, pois torna possível realizar o curso técnico à distância com instituições privadas conveniadas, já que os investimentos para implementação de formação técnica não estão disponíveis a todas as escolas, tendo em vista o alto custo para manutenção das escolas técnicas da Rede Federal, por exemplo, as quais têm um melhor plano de carreira para o professor, além de investimentos em laboratórios e pesquisas.

Observa-se, assim, um receio sobre o que se configurará nos próximos anos para o ensino médio brasileiro, em especial para a educação profissional, considerando todo esse histórico de uma modalidade marcada pela estigmatização, mas que muito conquistou nos últimos anos, principalmente pelo ensino técnico integrado ao médio, com a possibilidade de uma formação técnica, mas articulada ao incentivo à reflexão, que tem por fim a redefinição de regras e valores estabelecidos.

1.2. O Centro Paula Souza

O Centro Paula Souza é uma autarquia do Governo do Estado de São Paulo, isso é, uma instituição que goza de independência administrativa, financeira, didática e disciplinar, e está vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, a qual é um órgão do governo estadual que objetiva intensificar o desenvolvimento sustentável do Estado, além de estimular as vantagens competitivas das empresas e dos empreendedores, incorporar tecnologia e fortalecer as condições para atração de investimentos. A essa Secretaria, também estão vinculadas as faculdades e universidades estaduais, como a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP).

A instituição foi criada em outubro de 1969, como resultado de um grupo de trabalho que buscou avaliar a viabilidade de implantação de uma rede de cursos superiores de tecnologia com duração de dois a três anos. Já no ano seguinte, começou a operar com o nome de Centro Estadual de Educação Tecnológica de São Paulo (CEET), com três cursos na área

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de Construção Civil e dois na área de Mecânica, configurando, assim, o início das Faculdades de Tecnologia do Estado de São Paulo. Observa-se, então, que o órgão nasceu com a responsabilidade de organizar os cursos superiores de tecnologia, mas, no decorrer dos anos, acabou englobando também a educação profissional de nível médio, responsabilidade esta que foi assumida, segundo Ferreti (2005), diante do descaso e da dificuldade da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo em administrar a rede de ensino técnica do estado após a lei federal nº 5.692, de 1971, que tornava obrigatório o ensino técnico em todas as escolas de nível médio. Nesse cenário, o Centro assumiu 18 escolas técnicas.

Ao longo de sua história, que completa 50 anos em outubro do presente ano, a instituição absorveu outras várias escolas técnicas já existentes, além de ter construído novas. Atualmente, segundo o site da instituição5, o Centro Paula Souza está presente em cerca de 300 municípios do Estado de São Paulo e administra 223 Escolas Técnicas (Etecs) e 73 Faculdades de Tecnologia (Fatecs), atendendo a cerca de 290 mil alunos, dos quais 208 mil são da modalidade de educação técnica de nível médio: Ensino Técnico, Ensino Médio e Ensino Técnico Integrado ao Médio. Na cidade de Campinas, onde esta pesquisa foi realizada, há duas escolas pertencentes à entidade. Ainda de acordo com o site da instituição, sua missão, hoje, é promover a educação pública profissional e tecnológica de excelência, visando o desenvolvimento tecnológico, econômico e social do Estado de São Paulo. Como objetivos, apresenta, dentre vários outros, a intenção de ampliar a oferta da educação profissional, além de atender às demandas sociais e do mercado de trabalho, o que mostra seu compromisso tanto com interesses da qualificação do trabalhador, e do aluno prestes a ingressar no mercado de trabalho ou seguir seus estudos na educação superior, como também com interesses do mercado econômico.

1.2.1. O ensino de Língua Portuguesa no Centro Paula Souza

No ensino médio regular, a disciplina intitulada Língua Portuguesa pertence à área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, juntamente com Literatura, Inglês, Espanhol, Arte e Educação Física (OCEM, 2006), e tem por objetivo a ampliação dos saberes relativos a leitura, escrita, fala e escuta, já desenvolvidos no ensino fundamental.

Pode-se dizer que as ações realizadas na disciplina Língua Portuguesa, no contexto do ensino médio, devem propiciar ao aluno o refinamento de habilidades de leitura e de escrita, de fala e de escuta. Isso implica tanto a ampliação contínua de saberes relativos à configuração, ao funcionamento e

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à circulação dos textos quanto ao desenvolvimento da capacidade de reflexão sistemática sobre a língua e a linguagem (OCEM, 2006, p. 18). Já na educação profissional técnica de nível médio, a disciplina responsável pelo trabalho com as habilidades acima citadas recebe nome distinto no Centro Paula Souza. Antes de apresentá-la, identificamos, primeiramente, as formas possíveis de oferecimento da educação técnica de nível médio, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), a saber: a articulada ao ensino médio e a subsequente ao ensino médio. A primeira pode ocorrer de duas maneiras: integrada ao ensino médio, isso é, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-se matrícula única para cada aluno; concomitante ao ensino médio, a qual é oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e podendo ocorrer na mesma instituição em que o aluno curse o ensino médio ou em instituição distinta. Já a segunda forma, subsequente, consiste em cursos destinados somente a quem já tenha concluído o ensino médio. A figura abaixo esquematiza as modalidades de oferecimento acima descritas.

No Centro Paula Souza, há duas disciplinas que se relacionam às habilidades a serem desenvolvidas na disciplina de Língua Portuguesa do ensino médio regular, a intitulada Língua Portuguesa, Literatura e Comunicação Profissional (adiante, LPL) e a Linguagem, Trabalho e Tecnologia (adiante, LTT). A primeira (LPL) pertence à modalidade técnica articulada integrada ao ensino médio; já a segunda (LTT), às modalidades articulada concomitante ao ensino médio e subsequente. A disciplina de LPL integra os três anos dos cursos técnicos integrados, com carga horária total de 480 horas-aula, o que significa quatro aulas semanais da disciplina ao longo de todo o ensino médio. Já a disciplina de LTT é

Figura 1: Formas de oferecimento da educação profissional técnica de nível médio

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oferecida durante um semestre (ou um módulo6) entre os três ou quatro semestres (a depender do curso) dos cursos concomitante e subsequente e apresenta carga horária de 40 horas-aula, o que representa duas aulas semanais da disciplina durante um semestre letivo.

É preciso esclarecer que a disciplina de Linguagem, Trabalho e Tecnologia não se trata de uma equivalência à disciplina de Língua Portuguesa do ensino médio regular, já que é oferecida em cursos não diretamente ligados ao ensino médio. Tanto que, segundo os Planos de Curso do Centro Paula Souza, tal disciplina não precisa, necessariamente, ser ministrada por um profissional formado em Letras, podendo ser oferecida por um tradutor com habilitação em português, um secretariado, dentre outros profissionais. Apesar de tal permissão, na escola em que esta pesquisa coletou os dados, apenas professores licenciados em Letras ministravam-na. Assim, por se tratar da disciplina em que é previsto o ensino-aprendizagem de conhecimentos linguísticos, compõe os objetos de estudo deste trabalho.

1.2.1.1. Currículos prescritos: o que dizem os planos de curso

Os planos de curso do Centro Paula Souza são produzidos e atualizados, desde 1999, pelo Laboratório de Currículo, criado pela própria instituição a fim de construir currículos mais afinados com as necessidades do mercado, com os princípios da LDB para a educação profissional técnica de nível médio, bem como com o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos e a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).

Os planos relativos ao técnico em Mecânica, que foi o curso com o qual esta pesquisa trabalhou, estão inseridos no eixo tecnológico de controle e processos industriais, e foram desenvolvidos ao final de 2013 com o objetivo de serem implementados em 2016. Um diz respeito aos cursos ofertados nas formas concomitante e subsequente ao ensino médio, ou seja, que atendem tanto ao aluno que esteja cursando o ensino médio – desde que já matriculado no 2º ano – e deseja preparar-se para o mercado de trabalho, quanto ao profissional que já concluiu o ensino médio, trabalha e deseja ampliar seu conhecimento (a este, chamaremos plano de curso modular); o outro é ofertado na forma integrada ao ensino médio, isso é, o aluno possui uma única matrícula no ensino médio e no ensino técnico e, ao longo de três anos, cursa ambas as modalidades, obtendo duplo diploma (a este, chamaremos plano de curso integrado). Um e outro estão organizados em 9 capítulos, além dos anexos e pareces técnicos e de aprovação, sendo eles: 1. Justificativa e Objetivos; 2. Requisitos de Acesso; 3. Perfil Profissional de Conclusão; 4. Organização Curricular; 5. Critérios de

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Aproveitamento de Conhecimentos e Experiências Anteriores; 6. Critérios de Avaliação da Aprendizagem; 7. Instalações e Equipamentos; 8. Pessoal Docente e Técnico; 9. Certificados e Diploma.

O curso modular está estruturado em quatro módulos sequenciais com terminalidade, o que possibilita certificações parciais aos concluintes. O plano destaca que os módulos são “(...) organizações de conhecimentos e saberes provenientes de distintos campos disciplinares e, por meio de atividades formativas, integram a formação teórica à formação prática, em função das capacidades profissionais que se propõem desenvolver” (CENTRO PAULA SOUZA, Plano 238, p. 20). Nota-se, então, uma busca em ressaltar a valorização do trabalho interdisciplinar dos módulos e uma preocupação em promover atividades formativas e que integrem a teoria à prática, ou seja, uma necessária articulação à prática profissional do curso. Além disso, o plano destaca os módulos como um importante instrumento de flexibilização e de abertura do currículo, que permite adaptação às distintas realidades regionais. Os componentes curriculares são apresentados por módulos e descritos, em tabelas, em termos de competências, habilidades e bases tecnológicas. Estas últimas, pelo que se observou, seriam o conjunto de conteúdos, princípios e conceitos a serem trabalhados pelas disciplinas, a fim de dar suporte às competências e habilidades a serem desenvolvidas. Já o plano de curso integrado é estruturado em três séries anuais articuladas, também com terminalidade correspondente à ocupação identificada no mercado de trabalho. O documento apresenta tanto os componentes curriculares da Formação Geral (ensino médio), quanto os componentes da Formação Profissional (ensino técnico), ressaltando que as competências a serem desenvolvidas na Formação Geral são as mesmas para todos os componentes curriculares. Dessa forma, elenca as competências relativas a cada série do curso e, ao final, o que chama de lista de temas por disciplina, o que, pela análise, verificou-se serem os conteúdos disciplinares. Ainda segundo o plano, dentre os diversos temas listados, a seleção dos que serão trabalhados deve depender da integração que se fará, por meio de projetos interdisciplinares, entre os diversos componentes curriculares do ensino médio, bem como destes com as constituintes disciplinares da área técnica. Nota-se, assim, que o plano permite e espera o trabalho interdisciplinar. Ao mesmo tempo, porém, considera que as competências da formação geral devem estar voltadas “à aquisição de bases científicas requisitadas pelas bases tecnológicas que constituem a organização curricular da parte técnica” (CENTRO PAULA SOUZA, Plano 259, p. 20), o que permite também a interpretação das disciplinas do ensino médio por uma visão mais instrumental. Os componentes curriculares da área técnica, a sua vez, são apresentados da mesma forma que no plano de curso modular, com

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competências, habilidades e bases tecnológicas. Ao contrário do plano modular, o integrado considera, em diversos momentos, uma preocupação com as questões particulares e singulares da cultura local, pois em várias competências do ensino médio, assim como na enumeração dos princípios pedagógicos do curso, ressalta a necessidade de práticas contextualizadas, adequadas à situação de produção, considerando que para despertar interesse nos estudantes e promover condições ideias para uma aprendizagem significativa, os objetos de aprendizagem “(...) devem ser apresentados da forma como estão incorporados ao contexto de inserção e em suas ligações com os outros elementos que o compõem” (CENTRO PAULA SOUZA, Plano 259, p. 89).

Pôde-se observar, então, pela leitura dos planos, que ambos assumem uma preocupação com uma educação voltada para a formação de um profissional com múltiplas competências técnicas, e com vistas ao desenvolvimento de uma mão de obra capacitada. Nesse contexto, o egresso do curso técnico em mecânica é um profissional preparado para atuar em diversos setores da indústria. Logo, preza-se por um ensino-aprendizagem que forme mão de obra capacitada, mas não de forma massiva e transmissiva, e sim trabalhando com um aluno que seja sujeito de seu próprio desenvolvimento. Para isso, ambos os planos prezam por um processo de aprendizagem que privilegie a definição de “projetos, problemas e/ou questões geradores que orientem e estimulem a investigação, o pensamento e as ações, assim como a solução de problemas” (CENTRO PAULA SOUZA, Plano 238, p. 65). Apesar desta clara igualdade entre os planos, o integrado, por contemplar também a formação geral, elucida, na apresentação de competências e de princípios pedagógicos, a preocupação com uma aprendizagem crítica, construtiva, orientada para o protagonismo e autonomia dos educandos.

Feita essa análise mais generalizada dos planos de curso, passamos agora a uma observação mais específica do que cada documento propõe às disciplinas que trabalham com os conhecimentos linguísticos, a de LTT a de LPL. O plano de curso modular traz apenas quatro competências relativas à disciplina de LTT, quais sejam:

I) analisar textos técnicos/comerciais da área de mecânica, por meio de indicadores linguísticos e de indicadores extralinguísticos;

II) desenvolver textos técnicos aplicados à área de mecânica, de acordo com normas e convenções específicas;

III) pesquisar e analisar informações da área de mecânica, em diversas fontes convencionais e eletrônicas;

IV) definir procedimentos linguísticos que levem à qualidade nas atividades relacionadas com o público consumidor.

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Observando-as, é possível notar que não há uma preocupação em trabalhar a partir de práticas de linguagem, mas sim em desenvolver habilidades linguísticas formais/ estruturais. Logo, o foco da disciplina parece ser capacitar os alunos na leitura e escrita de textos da área profissional, mas com uma concepção de linguagem mais como instrumento de comunicação do que como forma de interação, o que pode ser observado pelas seguintes habilidades a serem desenvolvidas: a) utilizar instrumentos da leitura e da redação técnica, direcionadas à área de mecânica; b) aplicar modelos de correspondência comercial aplicados à área de mecânica; c) utilizar recursos linguísticos de coerência e de coesão, visando atingir objetivos da comunicação comercial, relativos à área de mecânica. Dessa forma, o trabalho com a linguagem em seu contexto de uso não é evidenciado pelo plano.

A fim de atingir o desenvolvimento das competências enunciadas, o plano apresenta as bases tecnológicas da disciplina, com a delimitação dos conteúdos e conceitos a serem trabalhados. Tais bases estão organizadas, em sua maioria, por gêneros: há a listagem de diversos gêneros da área (ofícios, comunicados, cartas, curriculum, relatório técnico, memorial descritivo etc.), e a observação para que se trabalhe “conceitos de coerência e coesão” na análise e produção destes, além de técnicas de redação, evidenciando uma preocupação com os aspectos formais de tais gêneros. Ademais, orienta-se o trabalho com vocabulário, morfologia e sintaxe de textos técnicos, com a apresentação de glossário de termos da área, ou seja, novamente um trabalho mais normativo. Por fim, o plano estabelece que a disciplina aborde a estrutura composicional do trabalho de conclusão de curso (TCC), além da preparação para a apresentação deste.

Observa-se, então, que os gêneros do discurso são contemplados pelo plano, mas em uma perspectiva que trabalha apenas com seus aspectos formais e estruturais, sem articulá-los com as práticas de leitura e escrita, e não contemplando seu contexto de produção e esfera de circulação, como defendido por Barbosa (2010). Outra questão apontada pela autora, e que também não é considerada, é a variabilidade dos gêneros, já que o plano se refere a “modelos preestabelecidos” dos gêneros, entendendo suas propriedades, portanto, mais como regras fixas e normativas.

Já no plano de curso do integrado, as competências que se relacionam à disciplina de LPL apresentam aspectos que permitem depreender uma preocupação com múltiplas práticas de linguagem, cujos significados são dependentes dos interlocutores envolvidos e do contexto de produção. Vale lembrar que, no currículo do integrado, as competências da formação geral, correspondente ao ensino médio, são as mesmas para todas as disciplinas. Tais competências estão divididas em 3 funções no currículo da instituição, da mesma forma

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que nos PCNEM (1999), quais sejam: representação e comunicação; investigação e compreensão; e contextualização sociocultural, e, embora sejam interdisciplinares, é na primeira função principalmente que se encontram questões relacionadas à disciplina de LPL. Dentre as 23 competências listadas – 8 para a 1ª série, 7 para a 2ª série e 8 para a 3ª série -, destacamos as seguintes7:

I – Compreender e usar a língua portuguesa como geradora de significação e integradora da percepção, organização e representação do mundo e da própria identidade;

II – Entender e utilizar textos de diferentes naturezas: tabelas, gráficos, expressões algébricas, expressões geométricas, ícones, gestos etc.;

III – Analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, segundo diferentes aspectos: natureza; função; organização; estrutura; condições de produção/ recepção (ou seja, intenção, época, local, interlocutores participantes da criação e propagação de ideias e escolhas, tecnologias disponíveis etc.);

IV – Utilizar-se das linguagens como meio de expressão, informação e comunicação, em situações intersubjetivas, adequando-as aos contextos diferenciados dos interlocutores e das situações;

V – Exprimir-se por escrito ou oralmente com clareza, usando terminologia pertinente;

VI – Considerar a linguagem e suas manifestações como fonte de legitimação de acordos e condutas que se realizem em contextos histórico-culturais específicos.

(CENTRO PAULA SOUZA, Plano 259, p. 24-26; 66-69) Nota-se, então, que as competências contemplam questões relativas à multiplicidade de textos e semioses. Na primeira competência, por exemplo, o plano destaca habilidades de usar diferentes códigos de linguagem, que sejam pertinentes a diferentes contextos e situações, além de elaborar gêneros variados. Na segunda, a sua vez, observa-se uma preocupação em trabalhar o uso de diferentes linguagens, como sugere Rojo (2009), para contemplar os múltiplos letramentos e semioses. Já as terceira, quarta e quinta competências discutem uma questão central para o ensino-aprendizagem de escrita, que é o contexto de produção e circulação dos textos, pensando a pertinência e adequação de certas formas de linguagem e de vocabulário a depender das situações, objetivos e interlocutores, já que os significados destes se constituem a partir da prática social contextualizada. Por fim, na última competência acima destacada, evidencia-se o reconhecimento da linguagem como poder, tendo em vista que se destacam, entre as habilidades, questões relativas a convivência e dominação entre culturas.

7 As seis competências aqui destacadas não correspondem às seis primeiras apresentadas pelo Plano de Curso, mas sim às que escolhemos para comentar, já que se sobressaíram perante os objetivos deste trabalho.

Referências

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