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Transcriptômica em placentas de mulheres com doença falciforme

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE BIOLOGIA

LETICIA DE CARVALHO BAPTISTA

TRANSCRIPTÔMICA EM PLACENTAS DE MULHERES COM

DOENÇA FALCIFORME

CAMPINAS 2019

(2)

LETICIA DE CARVALHO BAPTISTA

TRANSCRIPTÔMICA EM PLACENTAS DE MULHERES COM DOENÇA FALCIFORME

Tese apresentada ao Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Genética e Biologia Molecular, na Área de Genética Animal e Evolução

Orientadora: Dra. MONICA BARBOSA DE MELO

Co-orientadora: Dra. MARIA LAURA COSTA DO NASCIMENTO

CAMPINAS 2019 ESTE ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA LETICIA DE CARVALHO BAPTISTA E ORIENTADA PELA PROFª. DRª. MONICA BARBOSA DE MELO.

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Biologia Ana Maria Rabetti – CRB 8/2471

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Transcriptomics in placentas of women with sickle cell disease Palavras-chave em inglês:

Placenta

Hemoglobin SC disease Sickle cell anemia Hemoglobinopathies Gene expression

Área de concentração: Genética Animal e Evolução Titulação: Doutora em Genética e Biologia Molecular Banca examinadora:

Mônica Barbosa de Melo [Orientador] Nicola Amanda Conran Zorzetto Cláudia Vianna Maurer Morelli Daniela Sanchez Bassères Roseli Mieko Yamamoto Nomura Data de defesa: 12-07-2019

Programa de Pós-Graduação: Genética e Biologia Molecular

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)

- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0003-0992-4368

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Campinas, 12 de julho de 2019

COMISSÃO EXAMINADORA

Profa. Dra. Monica Barbosa de Melo

Profa. Dra. Nicola Amanda Conran Zorzetto

Profa. Dra. Cláudia Vianna Maurer Morelli

Dra. Daniela Sanchez Bassères

Dra. Roseli Mieko Yamamoto Nomura

Os membros da Comissão Examinadora acima assinaram a Ata de Defesa, que se encontra no processo de vida acadêmica do aluno.

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Dedico esta tese ao meu pai, Nelson. Por estar sempre ao meu lado me apoiando em cada decisão da minha vida.

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AGRADECIMENTOS

À Dra. Mônica pela orientação, pela confiança depositada em mim desde o princípio e pela amizade.

À Dra. Laura pela co-orientação que foi essencial e que me ajudou a conduzir este trabalho, pelos ensinamentos adquiridos, disponibilidade e confiança.

Aos meus pais, Nelson e Magda, por todas as palavras de incentivo, pelo apoio e pela compreensão que tiveram comigo nos últimos anos.

Ao Hugo pela cumplicidade, compreensão, apoio e respeito as minhas escolhas. À Larissa pela amizade, pelas conversas e por sempre estar me incentivando.

Ao excelente grupo de pesquisa conduzido pelo Dr. Fernando Ferreira Costa que tanto me ajudou a crescer profissionalmente.

A todas as gestantes que participaram do estudo; sempre foram muito gentis e solícitas. À Dani e à Flávia por sempre terem me ajudado no laboratório quando foi preciso. Aos colegas de laboratório do CBMEG.

A todos que fizeram parte da minha rotina nos últimos anos e que de alguma forma me ajudaram a trilhar esse caminho.

À FAPESP (número do processo 2015/08330-5) e à CAPES pelo apoio financeiro. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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“Penso noventa e nove vezes e nada descubro; Deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio –

e eis que a verdade se me revela.”

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RESUMO

As doenças falciformes (DF) constituem um grupo de patologias genéticas que têm como característica comum a presença da hemoglobina (Hb) S. O quadro clínico desta doença é muito heterogêneo, de modo que diferentes pacientes podem apresentar evoluções clínicas significativamente distintas. Praticamente todos os órgãos podem ser afetados, inclusive a placenta, que pode apresentar anormalidades estruturais e funcionais. A gestação em mulheres com DF apresenta riscos para a mãe e para o feto, tais como: aumento da mortalidade e morbidade materna, pré-eclâmpsia (PE), parto prematuro, restrição de crescimento fetal e mortalidade perinatal. Além disso, é acompanhada por incidência aumentada de episódios de dor, infecções, complicações pulmonares e eventos tromboembólicos. O acompanhamento pré-natal especializado e o seguimento clínico, laboratorial e proposta transfusional seriada promoveram grande impacto para a redução da mortalidade materna e neonatal; no entanto, a morbidade associada à DF é ainda elevada e os mecanismos responsáveis pelo desencadeamento destas complicações e a fisiopatologia envolvida são pouco explorados. O objetivo central desta pesquisa foi avaliar o perfil de expressão gênica em placentas de mulheres com DF por meio de sequenciamento de RNA. Para isso, propusemos um estudo do tipo caso-controle, com avaliação de três grupos: grupo de gestantes com anemia falciforme (HbSS, n=10), grupo de gestantes com hemoglobinopatia SC (HbSC, n=15) e grupo de gestantes sem DF (HbAA, n=21). Os resultados demonstraram diferença de expressão em alguns genes, tais como NOS2 (fold change=4,52; FDR=0,003), HLAG (fold change=5,56; FDR=6x10-7), ASCL2 (fold change=3,61; FDR=0,005), CXCL10 (fold change=-3,66; FDR=0,020) e IL1R2 (fold change=3,92; FDR=0,0002) para o grupo HbSC e S100A8 (fold change=-3,82; FDR=0,013), CPXM2 (fold change=4,57; FDR=0,020), CXCL10 (fold change=-4,59; FDR=0,013), CXCL11 (fold change=-3,72; FDR=0,024) e CAMP (fold change=-4,55; FDR=0,020) para o grupo HbSS. Os genes diferencialmente expressos estão associados, principalmente, à migração, à diferenciação dos trofoblastos e à inflamação. As causas que levam à alteração da expressão gênica em placentas de pacientes falciformes não são totalmente compreendidas, mas a presença do heme e a vaso-oclusão, com ciclos de isquemia e reperfusão podem contribuir para o surgimento de um ambiente impróprio para a fisiologia placentária, alterando o fornecimento de nutrientes e troca metabólica para o crescimento do feto. A maioria das pacientes em nosso estudo estava sob transfusão profilática regular após 28 semanas com o objetivo de reduzir a quantidade de HbS abaixo de 30% e, assim, diminuir as crises de falcização. Porém, somente

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com a transfusão profilática no terceiro trimestre não é possível prevenir por completo as complicações. O conhecimento de vias que podem ser alteradas com aumento da Hb livre e heme em placentas pode contribuir potencialmente para uma melhor compreensão das complicações clínicas e terapia para mulheres com DF.

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ABSTRACT

Sickle cell diseases (SCD) are a group of genetic pathologies that have as common characteristic the presence of hemoglobin (Hb) S. The clinical manifestation of this disease is very heterogeneous, so that different patients may present significantly different clinical evolutions. Almost all organs can be affected, including the placenta, which can have structural and functional abnormalities. The pregnancy in women with SCD presents risks to the mother and fetus, such as: increased maternal mortality and morbidity, preeclampsia (PE), preterm birth, fetal growth restriction and perinatal mortality. In addition, the pregnancy is accompanied by increased incidence of episodes of pain, infections, pulmonary complications and thromboembolic events. Specialized prenatal follow-up and clinical, laboratory, and serial transfusion procedures have had a major impact on reducing maternal and neonatal mortality; however, the morbidity associated with SCD is still high and the mechanisms responsible for triggering these complications and the pathophysiology involved are not well explored. The main objective of this investigation was to evaluate the gene expression profile in placentas of women with SCD by means of RNA sequencing. For this, we proposed a case-control study, with three groups: pregnant women with sickle cell anemia (HbSS, n=10), pregnant women with SC hemoglobinopathy (HbSC, n=15), and group of pregnant women without SCD (HbAA, n = 21). The results showed differences in expression in some genes such as NOS2 (fold change = 4.52; FDR = 0.003), HLAG (fold change = 5.56; FDR = 6x10-7), ASCL2 (fold change = 3.61; FDR = 0.005), CXCL10 (fold change = -3.66; FDR = 0.020) and IL1R2 (fold change = 3.92; FDR = 0.0002) for the HbSC group and S100A8 (fold change = -3.82; FDR = 0.013), CPXM2 (fold change = 4.57; FDR = 0.020), CXCL10 (fold change = -4.59; FDR = 0.013), CXCL11 (fold change = -3.72; FDR = 0.024) and CAMP (fold change = -4.55; FDR = 0.020) for the HbSS group. Differentially expressed genes are mainly associated with migration, trophoblast differentiation and inflammation. The causes leading to altered gene expression in placentas of sickle cell patients are not fully understood, but the presence of heme and vaso-occlusion, with cycles of ischemia and reperfusion, may contribute to the emergence of an environment improper for placental physiology, altering nutrient supply and metabolic exchange for fetal growth. Most of the patients in our study were undergoing regular prophylactic transfusion after 28 weeks in order to reduce the amount of HbS below 30% and thus reduce sickling attacks. However, only with prophylactic transfusion in the third trimester is it not possible to completely prevent complications. The knowledge of pathways that may be altered with

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increased free Hb and heme in placentas may potentially contribute to a better understanding of clinical complications and therapy for women with SCD.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1. Mecanismo de vaso-oclusão na anemia falciforme...21

Figura 2. Desenho esquemático de uma secção transversal de placenta humana...27

Figura 3. Histopatologia placentária avaliada pela coloração de H&E...28

Figura 4. Desenvolvimento da placenta...29

Figura 5. Padronização da concentração do par de primer que amplifica o gene ASCL2...36

Figura 6. Exemplo de uma análise de qualidade de bases realizada pelo programa FastQC...41

Figura 7. Heatmap dos 30 genes codificadores de proteínas selecionados a partir dos menores valores do FDR do grupo HbSC...44

Figura 8. Heatmap dos 30 genes codificadores de proteínas selecionados a partir dos menores valores do FDR do grupo HbSS...44

Figura 9. Níveis relativos de mRNA no grupo HbSC...47

Figura 10. Níveis relativos de mRNA no grupo HbSS...48

Figura 11. Visão macroscópica das placentas de uma mesma paciente com AF em duas gestações diferentes...62

Figura 12. Heatmap gerado a partir dos 64 genes com a maior diferença de expressão entre as amostras de placenta da primeira gestação (AF + PE + RCF, n=1) e segunda gestação (AF, n=1)...65

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Genes escolhidos para validação e suas respectivas sequências, concentrações utilizadas e tamanho dos primers...35 Tabela 2. Comparação das características materno-fetais entre os grupos analisados...39 Tabela 3. Dados dos sequenciamentos das 15 bibliotecas...40 Tabela 4. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSC quando comparado ao grupo controle (HbAA)...42 Tabela 5. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSS quando comparado ao grupo controle...42 Tabela 6. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSS vs. HbSC...43 Tabela 7. Análise de enriquecimento de ontologia gênica (GO) nos GDEs de tecido placentário da comparação HbSC vs. HbAA...45 Tabela 8. Análise de enriquecimento de ontologia gênica (GO) nos GDEs de tecido placentário da comparação HbSS vs. HbAA...46 Tabela 9. Comparação de fold change e valor-p entre RNA-seq e qPCR...48 Tabela 10. Resultados maternos e perinatais da mesma paciente com anemia falciforme em duas gestações diferentes...60 Tabela 11. Características sociodemográficas, resultados maternos e perinatais dos casos incluídos neste estudo...61 Tabela 12. Genes diferencialmente expressos pela comparação da placenta da mesma paciente com anemia falciforme em sua primeira gestação complicada com pré-eclâmpsia e restrição de crescimento fetal (AF + PE + RCF) com a placenta de sua segunda gestação não complicada (AF). 1a gestação vs. 2a gestação...63

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

2,3-DPF 2,3-difosfoglicerato ACTB Actin beta

AF Anemia falciforme

AOC1 Amine oxidase copper containing 1 APOE Apolipoprotein E

AQP1 Aquaporin 1

ASCL2 Achaete-scute family bHLH transcription factor 2 ATP5D ATP synthase F1 subunit delta

B3GNT7 UDP-GlcNAc:betaGal beta-1,3-N-acetylglucosaminyltransferase 7 CAISM Centro de Atenção Integral da Saúde da Mulher

CAMP Cathelicidin antimicrobial peptide

CPXM2 Carboxypeptidase X, M14 family member 2 CRIP2 Cysteine rich protein 2

CXCL10 C-X-C motif chemokine ligand 10 CXCL11 C-X-C motif chemokine ligand 11 CXCR3 C-X-C motif chemokine receptor 3

CYP1A1 Cytochrome P450 family 1 subfamily A member 1 DAMP Padrões moleculares associados a danos

DEFA4 Defensin alpha 4

DF Doença falciforme

DNAc DNA complementar

FDR Taxa de falsa descoberta

GAPDH Glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase GDE Gene diferencialmente expresso

GO Gene Ontology

GPIHBP1 Glycosylphosphatidylinositol anchored high density lipoprotein binding protein 1

Hb Hemoglobina

hCG Gonadotrofina coriônica humana

HIF1A Hypoxia inducible factor 1 subunit alpha

HLA-DMA Major histocompatibility complex, class II, DM alpha HLA-DPA1 Major histocompatibility complex, class II, DP alpha 1 HLA-DPB1 Major histocompatibility complex, class II, DP beta 1 HLA-DR Major histocompatibility complex, class II, DR beta 1 HLA-DRB5 Major histocompatibility complex, class II, DR beta 5 HLA-G Major histocompatibility complex, class I, G

Hp Haptoglobina

IL1R2 Interleukin 1 receptor type 2

LacTad Laboratório Central de Tecnologias de Alto Desempenho NAA11 N(alpha)-acetyltransferase 11, NatA catalytic subunit NOS2 Nitric oxide synthase 2

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PE Pré-eclâmpsia

PRG2 Proteoglycan 2, pro eosinophil major basic protein PSG Glicoproteína específica da gravidez

PSG4 Pregnancy specific beta-1-glycoprotein 4 PSG9 Pregnancy specific beta-1-glycoprotein 9 qPCR PCR quantitativo em tempo real

RCF Restrição de crescimento fetal

RNAm RNA mensageiro

RNA-Seq Sequenciamento de RNA

S100A12 S100 calcium binding protein A12 S100A8 S100 calcium binding protein A8 TAC3 Tachykinin 3

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas USP6 Ubiquitin specific peptidase 6 UTI Unidade de terapia intensiva

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SUMÁRIO

1.0 INTRODUÇÃO ... 18

1.1 HEMOGLOBINA ... 18

1.2 PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA ... 18

1.3 BASES MOLECULARES DA DOENÇA FALCIFORME ... 19

1.5 FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA FALCIFORME ... 20

1.6 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ... 22

1.6.1 GRAVIDEZ NA DOENÇA FALCIFORME ... 23

1.6.2 ACOMPANHAMENTO PRÉ-NATAL E TRATAMENTO DE COMPLICAÇÕES ... 24 1.7 PLACENTA ... 26 1.7.1 BIOLOGIA DO TROFOBLASTO ... 28 1.8 JUSTIFICATIVA ... 30 2.0 CAPÍTULO 1 ... 31 2.1 OBJETIVOS ... 31 2.1.1 OBJETIVO GERAL ... 31 2.1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 31 2.2 CASUÍSTICA ... 32 2.2.1 SELEÇÃO DE CASOS ... 32

2.2.2 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO ... 32

2.2.3 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA ... 32

2.3 MATERIAIS E MÉTODOS ... 33

2.3.1 COLETA ... 33

2.3.2 EXTRAÇÃO DE RNA ... 33

2.3.3 SEQUENCIAMENTO DE RNA ... 33

2.3.4 PROCESSAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS ... 34

2.3.5 VALIDAÇÃO DAS ANÁLISES TRANSCRICIONAIS POR qPCR ... 34

2.4 RESULTADOS ... 38

2.4.1 COMPLICAÇÕES CLÍNICAS ... 38

2.4.2 ANÁLISE DO TRANSCRIPTOMA ... 38

2.4.3 EXPRESSÃO DIFERENCIAL ... 41

2.4.4 CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL DOS GDEs ... 45

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2.5 DISCUSSÃO ... 49 2.6 CONCLUSÕES ... 53 3.0 CAPÍTULO 2 ... 54 3.1 OBJETIVOS ... 54 3.1.1 OBJETIVO GERAL ... 54 3.1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 54 3.2 CASUÍSTICA ... 55 3.2.1 PACIENTES ... 55

3.2.2 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA ... 55

3.3 MATERIAIS E MÉTODOS ... 56

3.3.1 COLETA ... 56

3.3.2 EXTRAÇÃO DE RNA ... 56

3.3.3 SEQUENCIAMENTO DE RNA ... 56

3.3.4 ANÁLISE DIFERENCIAL DE EXPRESSÃO GÊNICA ... 57

3.4 RESULTADOS ... 58

3.4.1 DESCRIÇÃO DO CASO ... 58

3.4.2 ANÁLISE MACROSCÓPICA DAS PLACENTAS ... 59

3.4.3 IDENTIFICAÇÃO DE GDEs ... 59 3.5 DISCUSSÃO ... 66 4.0 REFERÊNCIAS ... 70 5.0 ANEXOS ... 85 5.1 Anexo 1 ... 85 5.2 Anexo 2 ... 94 5.3 Anexo 3 ... 99 5.4 Anexo 4 ... 108 5.5 Anexo 5 ... 110

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1.0 INTRODUÇÃO

1.1 HEMOGLOBINA

A hemoglobina (Hb) é uma metaloproteína encontrada no interior dos eritrócitos e tem como função primordial o transporte de oxigênio na corrente sanguínea, permitindo assegurar as necessidades metabólicas das células. Além disso, também é responsável pelo transporte de dióxido de carbono e manutenção do equilíbrio ácido-base [1].

A Hb é uma proteína tetramérica com peso de aproximadamente 64.000 Da, formada por dois pares de cadeias globínicas, um par de cadeias do tipo alfa (alfa-α e zeta-ξ) e outro par de cadeias do tipo beta (beta-β, delta-δ, gama-γ e épsilon-ε), cada uma associada a um grupo heme (anel tetrapirrólico com um átomo de ferro, responsável pela ligação ao oxigênio) [2]. As combinações entre as cadeias alfa e beta originam múltiplos tipos de Hbs em diferentes estágios da vida: há a formação dos tipos Gower 1 (ξ2ε2), Gower 2 (α2ε2), Portland (ξ2γ2), fetal (HbF; α2γ2), A (HbA; α2β2) e A2 (HbA2; α2δ2) [3, 4].

No ser humano ocorrem dois switching de Hb que correspondem à inativação de um gene simultaneamente à ativação de outro. O principal switching ocorre após o nascimento, com a diminuição da expressão do gene da globina γ e o aumento da expressão do gene da globina β, levando à diminuição progressiva da produção de HbF e ao aumento da produção de HbA [5]. Esse fato está relacionado a uma afinidade aumentada da HbF pela molécula de oxigênio em relação à HbA, favorecendo a entrega de oxigênio para o feto através da circulação placentária [6]. Em indivíduos adultos, a HbA corresponde a mais de 95% do total de Hbs, enquanto que a HbA2 se mantém em níveis inferiores a 3,5% e a HbF é produzida em níveis inferiores a 1% [2, 7].

1.2 PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA

As hemoglobinopatias, principalmente as talassemias e DF, são as doenças genéticas mais frequentes da população mundial. A DF apresenta alta incidência na África, Arábia Saudita e Índia. No Brasil, distribuem-se heterogeneamente, sendo mais frequentes onde a proporção de antepassados negros da população é maior, devido ao grande contingente da população africana desenraizada de suas origens para o trabalho escravo [14].

A incidência de DF em recém-nascidos varia substancialmente entre os estados do Brasil, refletindo a heterogeneidade étnica da população brasileira. Em 2014, a incidência foi de aproximadamente 1:650 recém-nascidos rastreados no estado da Bahia, 1:1.300 no estado

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do Rio de Janeiro e 1:13.500 no estado de Santa Catarina. Para o estado de São Paulo a incidência de nascidos vivos diagnosticados com traço falciforme foi de 1:40 [15]. Em 2016, a incidência de nascidos vivos diagnosticados com DF foi de 1.071 e estima-se que haja 30.000 pessoas com essa doença em todo o território nacional. A prevalência do alelo βS no Brasil varia de 1,2% a 10,9%, dependendo da região, enquanto a prevalência do alelo βC está entre 0,15% e 7,4% [8].

O número de indivíduos de todas as idades afetados pela AF no mundo é atualmente desconhecido e não pode ser estimado com confiabilidade devido à escassez de dados epidemiológicos, em particular, dados de mortalidade em áreas de alta prevalência [15, 16].

1.3 BASES MOLECULARES DA DOENÇA FALCIFORME

Uma única substituição nucleotídica resulta no alelo da Hb falciforme (HbS). A proteína alterada é decorrente da substituição do aminoácido ácido glutâmico por valina (GAG → GTG) no códon 6 da beta globina localizado no cromossomo 11. Sob condições de desoxigenação (isto é, quando a Hb não está ligada ao oxigênio), os tetrâmeros de Hb podem polimerizar e fazer os eritrócitos assumirem uma forma de foice, daí o nome da doença. A associação da HbS com outras variantes de síntese ou estruturais da Hb, como as hemoglobinas HbC ou HbD, dão origem às doenças falciformes (DF) [8].

Indivíduos que são heterozigotos para o alelo βS carregam o traço falciforme (HbAS), mas não apresentam DF, enquanto indivíduos homozigotos para βS têm anemia falciforme (AF; HbSS). A AF, a forma mais comum de DF, é uma doença caracterizada por anemia hemolítica crônica, com episódios imprevisíveis de falcização e clínica de dor e dano generalizado aos órgãos. Existe uma grande variabilidade na gravidade clínica da AF e estudos de associação genômicos constataram que altos níveis de HbF e a co-herança de alfa talassemia estão associados com fenótipos menos graves de DF. No entanto, esses dois fatores explicam apenas uma pequena fração da variabilidade fenotípica observada [9-11].

A co-herança das variantes da HbS e da HbC causa a doença da hemoglobina SC (HbSC). A HbC resulta da substituição do aminoácido ácido glutâmico por lisina (GAG →

AAG), também no sexto códon do gene da beta globina. A doença da HbSC é complexa, caracterizada pela desidratação dos eritrócitos, falcização intracelular e aumento da viscosidade do sangue. Embora considerada uma variante mais branda da DF, a HbSC está associada a morbidades potencialmente graves que justificam vigilância [12, 13].

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1.4 POLIMERIZAÇÃO DA HEMOGLOBINA S

A polimerização da HbS é a ocorrência fisiopatológica essencial na DF, pois altera a forma e as propriedades físicas dos eritrócitos resultando em anemia hemolítica e bloqueio do fluxo sanguíneo, principalmente em pequenos vasos, que podem danificar qualquer órgão. Comparando-se com a HbA, a HbS tem afinidade reduzida ao oxigênio, favorecendo a sua polimerização. A afinidade ao oxigênio da HbS é ainda mais reduzida pelo 2,3-difosfoglicerato (2,3-DPG) - que é um intermediário glicolítico fisiologicamente presente em níveis muito altos nos eritrócitos falciformes - por meio da interação com subunidades β-globina desoxigenadas [17, 18].

À medida que as fibras de polímero se estendem, elas deformam os eritrócitos e interferem em sua flexibilidade e propriedades reológicas (isto é, como elas fluem), podendo provocar vaso-oclusão (VOC). Episódios repetidos de polimerização e falcização podem causar lesões na membrana celular, fazendo com que a rigidez e configuração em forma de foice persistam mesmo após a reoxigenação. Esses eritrócitos são conhecidos como “células irreversivelmente falcizadas” ou células densas [19].

Em decorrência de sua acentuada rigidez, as células irreversivelmente falcizadas têm vida-média reduzida e contribuem significativamente para a anemia hemolítica dos pacientes. Ademais, a polimerização da HbS altera direta ou indiretamente o lipídio da bicamada e proteínas da membrana eritrocitária. Como consequências dessas alterações, há a redução da hidratação celular, aumento da hemólise e interações anormais com outras células do sangue, contribuindo para a apoptose precoce dos eritrócitos [20].

1.5 FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA FALCIFORME

Dois processos fisiopatológicos decorrentes da polimerização da HbS caracterizam a DF: a VOC e a anemia hemolítica. O fenômeno de VOC ocorre geralmente na microcirculação. No entanto, grandes artérias, principalmente nos pulmões e cérebro, também podem ser afetadas. Atualmente, acredita-se que o fenômeno vaso-oclusivo compreende um processo com várias etapas que envolve interações entre hemácias, leucócitos ativados, células endoteliais, plaquetas e proteínas do plasma (Figura 1) [20].

Os eritrócitos falciformes são altamente instáveis, com uma vida útil reduzida em mais de 75% [21, 22]. Acredita-se que a hemólise ocorra principalmente via fagocitose extravascular por macrófagos, mas uma fração substancial (aproximadamente um terço) ocorre por meio de hemólise intravascular [23]. Além disso, em uma subpopulação de eritrócitos falciformes, a

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fosfatidilserina (que geralmente se encontra no interior da membrana) é exposta na superfície dos eritrócitos. Os eritrócitos circulantes expostos à fosfatidilserina têm um papel importante em muitos eventos fisiopatológicos, incluindo aumento da hemólise, ativação endotelial, interação entre células do sangue e ativação das vias de coagulação [24, 25].

Figura 1. Mecanismo de vaso-oclusão na anemia falciforme. O contato direto das hemácias SS e a presença de hemólise intravascular levam à ativação das células endoteliais que revestem o vaso; a presença do heme livre na circulação tem efeito deletério no vaso e ainda consome o óxido nítrico (NO) sintetizado pelas células endoteliais. Juntamente com a presença de espécies reativas de oxigênio (ROS), a hipóxia e os vasoconstritores como endotelina-1 (ET-1), contribuem para a ativação das células endoteliais. O estado de hipercoagulabilidade leva a níveis aumentados de fator tecidual (FT), fator ativador de plaquetas (FAP), fator de von Willebrand (FvW) e ativação plaquetária. A ativação do endotélio também conta com a presença das plaquetas ativadas no vaso sanguíneo e a sua adesão à parede vascular. Após ativação, as células endoteliais aumentam a expressão das moléculas de adesão (como ICAM-1, VCAM-1 e E-selectina) na superfície do vaso e também liberam mais citocinas e quimiocinas como IL-8, IL-6 e IL-1β que com o TNF-α contribuem para a inflamação vascular e a ativação das células sanguíneas. A vasoconstrição elevada e a obstrução física do vaso ocasionam uma redução no fluxo sanguíneo com consequente hipóxia e falcização das hemácias, dificultando a passagem do sangue, e finalmente resultando na vaso-oclusão. Figura retirada de Costa FF, Conran N, Fertrin KY. Anemia Falciforme. In: Zago, MA; Falcão, RP; Pasquini, R. Tratado de hematologia. São Paulo: Editora Atheneu, 2013. Cap 27, p. 205-223.

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A destruição dos glóbulos vermelhos pode causar sérios danos ao organismo, uma vez que leva à liberação de Hb no plasma e, consequentemente, reduz a biodisponibilidade de óxido nítrico, que é um importante vasodilatador, facilitando assim, a vasoconstrição e a ativação de moléculas de adesão endotelial. Esta interação entre eritrócitos e o endotélio vascular resulta em episódios de oclusão e isquemia, seguidos de restauração do fluxo sanguíneo, o que aumenta a lesão tecidual mediada pela inflamação e estresse oxidativo [20].

Com a circulação obstruída e hipóxia local, a polimerização das HbS tende a aumentar causando danos à membrana do eritrócito com consequente hemólise. Esses dois eventos estão envolvidos na DF formando um ciclo: a VOC aumenta a taxa de hemólise, a qual está envolvida na diminuição do tônus vascular e no aumento da obstrução na microcirculação [26]. Assim, diferentes processos biológicos contribuem para a fisiopatologia da DF, com manifestações multissistêmicas.

1.6 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

A DF é uma condição multissistêmica complexa caracterizada por complicações agudas e crônicas. Os avanços nos cuidados médicos gerais, o diagnóstico precoce e o tratamento abrangente levaram a melhorias substanciais na expectativa de vida dos pacientes em países de alta renda [27, 28], onde quase todos os pacientes sobrevivem além dos 18 anos de idade [29]. No entanto, mesmo com os melhores cuidados, a expectativa de vida ainda é reduzida e a rotina e o atendimento de emergência para pessoas com DF têm altos custos financeiros. A qualidade de vida se deteriora com frequência durante a vida adulta e os efeitos sociais e psicológicos continuam sendo subestimados [30].

As manifestações clínicas na DF são extremamente variáveis, mas são derivadas primariamente da oclusão vascular e, em menor grau, da anemia. Apesar dos pacientes apresentarem a mesma doença genética, o curso clínico é variável, podendo ser assintomático em alguns casos e em outros, complicações graves e óbito [31]. O recém-nascido é protegido pelos elevados níveis de HbF nos eritrócitos durante as primeiras 8 a 10 semanas de vida. Mas como estes níveis declinam, as manifestações clínicas aparecem, em geral, após os seis meses de idade [32].

A dor aguda, que quase sempre é o primeiro sintoma da doença, constitui a complicação mais frequente e a causa mais comum que leva o paciente a procurar assistência médica. As principais manifestações que acometem crianças são o sequestro esplênico e o agravamento das infecções, principalmente as pulmonares. O sequestro esplênico é caracterizado pela retirada do eritrócito danificado pelo baço, acarretando ao aumento deste órgão, com sintomas de dor

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abdominal, taquicardia, fraqueza e diminuição no nível de Hb. Muitas vezes o sequestro esplênico é associado a infecções bacterianas e suas complicações comprometem a vida da criança, de forma que em alguns casos opta-se pela retirada do baço (esplenectomia) [33].

Os pacientes com doença HbSC apresentam manifestações clínicas semelhantes às da AF, embora geralmente com evolução menos severa, com menor taxa de complicações. Porém, certas complicações ocorrem com maior frequência nesse genótipo, como retinopatia proliferativa e osteonecrose [34], devido ao aumento da viscosidade do sangue. Os sintomas são raros no primeiro ano de vida, podendo cerca de um quarto dos doentes permanecer assintomático durante a primeira década de vida [12].

A DF acomete múltiplos órgãos e dentre as complicações desta doença incluem-se: as neurológicas (risco aumentado de acidente vascular cerebral, ataques isquêmicos transitórios, hemorragia cerebral, convulsões), cardíacas, pulmonares (síndrome torácica aguda), hepatobiliares, genitourinárias (proteinúria e priapismo), oftalmológicas, osteoarticulares, manifestações cutâneas (úlcera de perna) e decorrentes da gravidez [8].

1.6.1 GRAVIDEZ NA DOENÇA FALCIFORME

A falta de dados abrangentes sobre os resultados da gravidez nas mulheres falciformes fez com que o aconselhamento pré-natal, os cuidados clínicos e os padrões de referência para o atendimento de saúde em instituições em todo o mundo fossem desafiadores. Apesar dos avanços no manejo da DF, obstetrícia e medicina neonatal, as gestações complicadas pela doença permanecem associadas ao aumento do risco de desfechos maternos e perinatais adversos [35].

A gravidez resulta em uma variedade de alterações fisiológicas que podem interagir negativamente com a HbS para promover falcização. Dentre estas inclui-se o comprometimento da reserva de oxigênio materna, pois o consumo de oxigênio aumenta e a capacidade residual funcional diminui durante a gestação, predispondo as gestantes com DF à hipoxemia e, como consequência, podendo levar à polimerização da HbS [36].

Uma meta-análise realizada por Eugene Oteng-Ntim e colaboradores identificou uma forte associação entre DF e desfechos adversos como: risco aumentado de mortalidade materna, pré-eclâmpsia (PE), natimortos, parto prematuro e recém-nascidos pequenos para a idade gestacional [35]. A base patológica para o aumento da taxa de morte fetal intraparto e restrição de crescimento fetal (RCF) em mulheres com DF é pouco compreendida. Bloqueio do fluxo de sangue causado pela VOC na placenta pode levar ao infarto placentário e afetar sua função, alterando o fornecimento de nutrientes e troca metabólica para o crescimento do feto. Além

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disso, o efeito da anemia crônica materna elevada e a incidência de hipertensão gestacional podem contribuir para o aumento do risco de morte fetal intraparto [37].

1.6.2 ACOMPANHAMENTO PRÉ-NATAL E TRATAMENTO DE COMPLICAÇÕES Uma vez que a gravidez é confirmada, mulheres com DF devem ter o seu atendimento pré-natal prestado por uma equipe multidisciplinar. A melhora nos resultados maternos e fetais foi atribuída à melhora na atenção obstétrica e hematológica com melhor suporte de terapia intensiva e transfusional [38].

O pré-natal de alto risco e os cuidados puerperais devem focar na identificação dos fatores de risco para baixo peso ao nascimento, partos pré-termo e demais complicações associadas à gestação. Nutrição adequada e profilaxia de fatores que precipitem eventos dolorosos devem ser enfatizadas. O monitoramento do peso deve ser rigoroso e a medida do tamanho do baço naquelas que mantém esplenomegalia é um cuidado adicional, na tentativa de detectar precocemente sequestro esplênico. O cuidado pré-natal ainda inclui triagem infecciosa rigorosa, realização de vacinação (incluindo vacinação para meningo e pneumococo) e controle seriado de vitalidade fetal [34, 39].

Após avaliação geral, a paciente deve ser orientada quanto aos fatores específicos que influenciam a gravidez como as necessidades nutricionais e uso de ácido fólico. A suplementação de ferro só deve ser administrada quando sua deficiência for confirmada, pois em algumas pacientes as concentrações de ferro são aumentadas devido a transfusões de sangue anteriores. Além disso, deve ser recomendada a ingestão diária de líquidos para evitar desidratação [40].

Em relação à analgesia, os opiáceos são os mais indicados na presença de dor severa. A maioria dos relatórios não demonstra evidência de teratogenicidade em relação ao consumo de opiáceos na gravidez, mas a exposição a longo prazo pode resultar em síndrome de abstinência neonatal logo após o nascimento [41].

Intervenções profiláticas para reduzir a PE são limitadas, mas baixas doses de aspirina a partir de 12 semanas de gestação até o final da gravidez mostraram diminuir a ocorrência de PE em outros grupos de mulheres de alto risco [42]. Embora nunca formalmente testado em um estudo randomizado especificamente em mulheres com DF, é provável que a aspirina seja similarmente benéfica para essas gestantes [43].

Para gestantes que utilizavam hidroxiureia como tratamento para a DF, antes da gravidez, até o momento há indicação de interromper seu uso, uma vez que o Programa Nacional de Toxicologia reconheceu a possibilidade de comprometimento do desenvolvimento

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em fetos de camundongos e ratos com o uso materno de hidroxiureia durante o período gestacional, embora não existam estudos em humanos [44].

A hidroxiureia é um medicamento que, a princípio, era utilizado para aumentar as concentrações de HbF. Porém, hoje já se sabe que a hidroxiureia atua em outras vias, como na síntese do óxido nítrico, contribuindo para uma melhora da morbidade da DF. Entretanto, não são todos os indivíduos que respondem positivamente aos tratamentos existentes, e acredita-se que variantes genéticos possam ser os responsáveis pela boa ou má resposta [45, 46].

O único tratamento curativo atualmente conhecido é o transplante de medula óssea [47]. A Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea entrou em consenso e colocou a DF entre as doenças que tem indicação de transplante de medula óssea levando em consideração dados da literatura internacional que apontam a cura dos doentes tratados. Recentemente, o Ministério da Saúde ampliou a faixa etária para indicação de transplante de medula aparentado para tratamento da DF a fim de dar maior qualidade de vida a essas pessoas. Antes só podiam fazer o transplante pessoas abaixo de 16 anos pois não havia dados científicos para atestar segurança e eficácia do procedimento para maiores dessa idade. A partir de 2018, pessoas acima de 16 anos também podem fazer o transplante alogênico aparentado de medula óssea, de sangue periférico ou de sangue de cordão umbilical, do tipo mieloablativo, para tratamento da DF [48]. A assistência adequada do pré-natal poderia facilitar a detecção precoce de eventos adversos que indicam a necessidade de transfusão sanguínea. Apesar de não haver um consenso sobre os benefícios da transfusão profilática na gravidez, vários estudos realizados no Brasil demonstraram haver uma redução de complicações materno-fetais [49-51]. A transfusão sanguínea é indicada, principalmente, para mulheres que manifestam eventos adversos, por exemplo, uma queda acentuada nos níveis de Hb (<50-60 g/L, ou uma queda de 20% do valor normal) ou que sejam afetadas por doenças cardíacas, problemas respiratórios, episódios de VOC, gestações gemelares ou histórico de morte fetal [52].

A mortalidade de pacientes com DF tem diminuído devido a vários fatores, incluindo detecção precoce com triagem neonatal, uso de penicilina profilática, imunização contra bactérias encapsuladas e administração de hidroxiureia [52]. Essa melhora na taxa de sobrevida levou a um aumento no número de mulheres que atingem a idade reprodutiva. No entanto, apesar desta significativa queda na mortalidade devido à evolução na terapêutica destas pacientes e também no diagnóstico e intervenções transfusionais disponíveis, a morbidade materna e neonatal continuam elevadas, com necessidade de seguimento pré-natal rigoroso, controle clínico e laboratorial seriado por equipe multidisciplinar e avaliação de vitalidade fetal frequente [35].

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1.7 PLACENTA

A placenta é um órgão formado por tecidos materno-fetal, altamente vascularizado. É responsável pela transferência de gases para o feto, papel desempenhado pelos pulmões ao nascimento. Atua também de maneira semelhante aos rins, realizando a excreção, o balanço hídrico e a manutenção fisiológica do pH fetal. Tem função endócrina, secretando os hormônios proteicos como a gonadotrofina coriônica (hCG) e esteroides como a progesterona, estradiol, estrona e estriol [53].

Possui dois componentes: uma porção fetal e uma porção materna. A parte fetal é derivada do córion viloso, enquanto que a parte materna é originada de uma porção do endométrio uterino denominada decídua basal (Figura 2) [54]. O córion é um conjunto de tecidos derivado do citotrofoblasto, sinciciotrofoblasto e mesoderma extraembrionário. A partir do final da 2a semana ocorre a formação de vilosidades em toda a extensão do córion. O saco coriônico permanece recoberto por vilosidades coriônicas até o início da 8a semana. Durante o resto da gestação, as vilosidades da placa coriônica aumentam em número, se ramificam, crescem e tonam-se vascularizadas [54, 55].

Como resultado do crescimento contínuo do feto e da expansão do útero, a placenta também aumenta de tamanho. A placenta totalmente desenvolvida cobre de 15% a 30% da superfície interna do útero [54]. No início do segundo trimestre, a relação entre o peso da placenta e a do feto é 1:1 e, ao final da gestação, esta relação é de aproximadamente 1:6 [56, 57].

Placentas de pacientes com DF apresentam anormalidades estruturais e funcionais. São anormais em tamanho, localização, aderência à parede uterina e histologia [58, 59]. Em algumas gestantes falciformes há descolamento da placenta que pode ser causada pelo processo de VOC, levando à trombose da arteríola decidual, necrose decidual e hemorragia venosa subsequente [60].

Estudos de ultrassom do tipo Doppler demonstraram evidências de fluxo sanguíneo útero-placentário restrito, indicativo de possível lesão vascular, estreitamento ou vasoconstrição [61]. É provável que a VOC crônica, mesmo na ausência de crise de dor clinicamente evidente ou síndrome torácica aguda, contribua para a lesão da placenta e afete negativamente o crescimento fetal [62].

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Figura 2. Desenho esquemático de uma secção transversal de placenta humana (Ilustração modificada). Figura adaptada de Benirschke K, Burton GJ, Baergen RN, editors. Infectious diseases. In: Pathology of the human placenta. 6th ed. Berlin: Springer; 2012:557-656.

No estudo de Trampont e colaboradores, nos quais exames macro e microscópicos de placentas de pacientes com DF foram realizados, as placentas do grupo falciforme apresentaram mais anomalias vasculares, principalmente no parênquima localizado entre o feto e as superfícies maternas, quando comparadas com as placentas do grupo controle [63]. Além disso, também ocorre com maior frequência excesso de formação de nós sinciciais e depósitos de fibrina, associados ou não à necrose vilosa (Figura 3) [59].

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Figura 3. Histopatologia placentária avaliada pela coloração de H&E. A- Tecido viloso placentário de uma paciente controle sem complicações com 36 semanas de gravidez. B- Tecido viloso placentário de uma gravidez de 35 semanas de paciente com DF. Achados anormais são apontados no painel B. Seta preta indica nó sincicial, seta vermelha indica dilatação dos capilares vilosos e círculos indicam glóbulos vermelhos falciformes maternos no espaço interviloso. Ampliação original: 40x para A e B. Figura retirada de Baptista LC, Costa ML, Ferreira R, Albuquerque DM, Lanaro C, Fertrin KY, et al. Abnormal expression of

inflammatory genes in placentas of women with sickle cell anemia and sickle hemoglobin C disease. In: Ann Hematol. 2016.

1.7.1 BIOLOGIA DO TROFOBLASTO

Após a concepção, a divisão celular do óvulo fertilizado forma o blastocisto: uma esfera de células embrionárias com toda a superfície externa composta por células trofoblásticas e com um aglomerado de células no centro denominado corpo embrionário, a partir do qual o embrião e depois o feto se desenvolverá. Entre o blastocisto e as células epiteliais endometriais maternas que delimitam a decídua (o revestimento do útero) estão as células citotrofoblásticas que se fundem para formar o sinciciotrofoblasto (célula multinucleada), adquirindo, então, um fenótipo invasivo. Diversas enzimas são secretadas pelo sinciciotrofoblasto para degradar a matriz extracelular e permitir a invasão do blastocisto no tecido materno. Nesta fase, cerca de 1 semana após a concepção, a gonadotrofina coriónica humana (hCG) é produzida pelo sinciciotrofoblasto para manter a gravidez. Projeções do sinciciotrofoblasto conhecidas como vilosidades, gradualmente se enchem com líquido intersticial e depois com sangue materno [64].

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Após três semanas da concepção, colunas proliferativas de citotrofoblastos se projetam das superfícies das vilosidades coriônicas, tornando-se trofoblastos extravilosos. Eles migram para a decídua, formando trofoblastos intersticiais, e para o lúmen das artérias espiraladas. Aqui, esses trofoblastos endovasculares degradam a musculatura lisa que recobre a arteríola tornando as artérias espiraladas flácidas, garantindo baixa resistência ao fluxo sanguíneo arterial uterino e possibilitando aumento do fluxo sanguíneo materno para o espaço interviloso, necessário para um crescimento fetal ideal (Figura 4). Por outro lado, a transformação ineficaz das artérias espiraladas é considerada como causa contribuinte para vários distúrbios da gravidez, incluindo PE, RCF, parto prematuro espontâneo, ruptura prematura das membranas e aborto [65-67]. Esses tipos diferenciados de trofoblastos extravilosos invasivos não expressam antígenos HLA de classe I A ou B mas, quase exclusivamente, expressam HLA-G [64, 68].

Figura 4. Desenvolvimento da placenta. Os trofolastos extravilosos proliferam nas colunas de ancoragem para invadirem a decídua com sucesso (1) e transformam as artérias espiraladas distais (2). Estas mudanças aumentam o volume sanguíneo no espaço interviloso (3). As vilosidades placentárias são cobertas pelos trofoblastos vilosos (4), compostos por citotrofoblastos que proliferam para gerar o sinciciotrofoblasto externo que está em contato direto com o sangue materno. Figura adaptada de Kingdom, J. C. P. & Drewlo, S. Is heparin a placental anticoagulant in high-risk pregnancies? Blood 118, 4780–4788 (2011).

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1.8 JUSTIFICATIVA

A DF tem uma prevalência relativamente alta em nossa população. A terapêutica cada vez mais eficaz permitiu melhor qualidade de vida aos acometidos; sendo assim, o número de mulheres em idade reprodutiva e gestantes com esta patologia cresceu consideravelmente nas últimas décadas. O acompanhamento pré-natal especializado e o seguimento clínico, laboratorial e proposta transfusional seriada promoveram grande impacto para a redução de mortalidade materna e neonatal; no entanto, a morbidade associada à DF é ainda elevada. Na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), centro de referência para o atendimento de gestações de alto risco, existe um ambulatório específico para o seguimento de gestantes com hemoglobinopatia, com protocolo assistencial multidisciplinar, envolvendo obstetrícia, hematologia, cardiologia, psicologia, nutrição e enfermagem

Resultados de PCR Array e qPCR em placentas de gestantes com DF seguidas no nosso serviço demonstraram haver desregulação de expressão em alguns genes quando comparadas com o grupo controle (gestantes sem DF) [59]. A alteração da expressão de genes associados à resposta inflamatória sugere que falha na invasão dos trofoblastos possa estar ocorrendo, prejudicando o fornecimento de oxigênio e nutrientes para o feto. Pouco se sabe a respeito do perfil de expressão gênica em placentas de pacientes com DF. Portanto, a estratégia de análise da expressão gênica em larga escala (RNA-Seq) utilizada no presente estudo fornece importantes dados para uma melhor compreensão de como a doença afeta a fisiologia da placenta e aumenta os riscos de complicações materna e fetal, ampliando as possibilidades para estudos futuros.

Esta tese foi dividida na forma de capítulos de acordo com o tipo de estudo realizado. O primeiro capítulo trata de um estudo do tipo caso-controle e o segundo capítulo de um relato de caso de diferentes gestações de uma paciente com anemia falciforme.

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2.0 CAPÍTULO 1

PERFIL DE TRANSCRIPTOMA EM PLACENTAS DE MULHERES COM DOENÇA FALCIFORME

2.1 OBJETIVOS

2.1.1 OBJETIVO GERAL

Avaliar os genes diferencialmente expressos em placentas de mulheres com DF de genótipos HbSS e HbSC, comparadas a controles (HbAA).

2.1.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

1. Analisar o perfil transcricional de tecido placentário do grupo HbSS comparado com o grupo HbAA por meio da técnica de RNA-seq.

2. Analisar o perfil transcricional de tecido placentário do grupo HbSC comparado com o grupo HbAA por meio da técnica de RNA-seq.

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2.2 CASUÍSTICA

2.2.1 SELEÇÃO DE CASOS

Para o estudo realizado foram avaliados três grupos de gestantes, todas acompanhadas no ambulatório de Pré-Natal Especializado no Centro de Atenção Integral da Saúde da Mulher (CAISM) - Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti, UNICAMP. Dois grupos foram compostos por gestantes com DF e um grupo por gestantes sem DF, denominado grupo controle. Os grupos foram divididos em: grupo I- pacientes com AF, HbSS (n=10), grupo II- pacientes com hemoglobinopatia HbSC (n=15) e grupo III- pacientes controle, HbAA (n=21). Para todas as mulheres foi preenchida uma ficha de coleta de dados (características sociodemográficas, antecedente obstétrico e clínico, resultados maternos e perinatais), a partir da avaliação do prontuário médico. Todas as gestantes falciformes que eram admitidas no CAISM para fazer o pré-natal eram convidadas a participar da pesquisa. Portanto, o tamanho amostral foi definido somente após o prazo de um semestre para a finalização da pesquisa.

2.2.2 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO

- Para os grupos I e II: diagnóstico de DF comprovado por eletroforese de Hb.

- Para o grupo III: confirmação da ausência de HbS por eletroforese de Hb e exclusão de gestantes com hipertensão, proteinúria, diabetes, infecções maternas durante o pré-natal e anomalias fetais.

- Para os três grupos: concordância da mulher em participar do estudo – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado, pré-natal e parto realizados no CAISM.

2.2.3 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA

Conforme previsto na resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, o presente estudo seguiu os princípios enunciados no Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP em 17/05/2016 segundo o parecer nº 1.563.328 (Anexo 1). Todas as gestantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 2).

Após a coleta de dados, as fichas contendo as informações dos prontuários foram numeradas e, em banco eletrônico, foram suprimidos os nomes ou iniciais das pacientes, como forma de preservar a confidencialidade.

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2.3 MATERIAIS E MÉTODOS

2.3.1 COLETA

As placentas (armazenadas a 4 °C) foram coletadas dentro de 3 horas após o parto. Amostras de tecido das vilosidades placentárias foram selecionadas aleatoriamente a partir das áreas centrais próximas ao cordão umbilical, como descrito anteriormente [69]. Antes da coleta, as placentas foram pesadas e fotografadas. As amostras foram coletadas (~200 mg) em três regiões diferentes, evitando áreas de infartos visíveis ou calcificações. Em seguida, foram então separadas em três amostras iguais e lavadas com tampão fosfato salino para remover o sangue materno residual. Imediatamente após a coleta, os tecidos foram congelados em nitrogênio líquido e armazenados a –80 °C até a extração do RNA. O protocolo de coleta encontra-se no anexo 3.

2.3.2 EXTRAÇÃO DE RNA

O RNA total foi extraído com o TRIzol Reagent (Ambion), seguido pelo RNeasy Mini Kit (Qiagen). O nível de pureza e a concentração do RNA total foram medidos utilizando-se o espectrofotômetro NanoDrop 2000 (Thermo Scientific) e a integridade do RNA foi verificada por leitura no equipamento Agilent 2100 Bioanalyzer (Agilent Technologies).

2.3.3 SEQUENCIAMENTO DE RNA

Amostras de RNA com RIN ≥ 5 foram enviadas ao Laboratório Central de Tecnologias de Alto Desempenho (LacTad) – Unicamp para a preparação das bibliotecas e realização dos sequenciamentos de RNA (RNA-seq). No total foram sequenciadas seis amostras placentárias do grupo HbSC, cinco amostras placentárias do grupo HbSS e quatro amostras placentárias do grupo controle (HbAA). O número de amostras de cada grupo para sequenciamento foi limitado pelo número de amostras de tecido placentário obtidas por cesárea eletiva. Optou-se por sequenciar amostras provenientes somente de cesárea eletiva para eliminar possíveis interferências de expressão gênica das vias de estresse oxidativo e inflamatória presentes no parto vaginal. Bibliotecas de DNA complementares (DNAc) foram preparadas por meio do kit de preparação de amostras Illumina TruSeq RNA de acordo com o protocolo do fabricante (Illumina). As bibliotecas de DNAc foram sequenciadas em ambas as extremidades pela plataforma Illumina HiSeq2500, e foram produzidas leituras paired-end de ~100pb.

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2.3.4 PROCESSAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS

Os resultados de RNA-Seq foram enviados com a extensão fastq e utilizou-se o programa FastQC versão 0.11.5 [70] para a verificação da qualidade das bibliotecas. A montagem do transcriptoma foi feita usando como referência o genoma humano GRCh38.88 por meio do programa STAR [71]. A expressão gênica diferencial e normalização foram realizadas utilizando-se o pacote DESeq2 [72].

Após as análises, classificaram-se como genes diferencialmente expressos (GDEs) aqueles com diferença de pelo menos duas vezes de fold change e para controlar a taxa de erro global utilizou-se o ajuste de FDR com o nível de significância (α) igual a 5%. A categorização funcional dos genes foi determinada de acordo com o Gene Ontology (GO) [73] e para a identificação das vias foi realizada a anotação com o Kegg Orthology [74]. O programa WebGestalt [75] foi utilizado para ambas as análises. Os heatmaps foram construídos por meio de uma ferramenta web denominada ClustVis [76] a partir dos GDEs e as clusterizações foram feitas pelo método de Correlação de Pearson.

2.3.5 VALIDAÇÃO DAS ANÁLISES TRANSCRICIONAIS POR qPCR

Para a validação dos resultados obtidos através do RNA-Seq foram selecionados cinco genes que apresentaram diferença de expressão nas amostras placentárias de pacientes HbSS (n=10) e cinco genes que apresentaram diferença de expressão nas amostras placentárias de pacientes HbSC (n=15) em relação às placentas do grupo controle (n=21).

2.3.5.1 SÍNTESE DE DNAc

Para retirar qualquer contaminação do RNA com moléculas dupla fita, 1 μg de cada RNA extraído foi tratado com 1 μL da enzima DNAseI (Fermentas, Thermo Scientific) e 1 μL de DNAseI reaction buffer 1X (Tris-HCl 20 mM, MgCl2 2 mM, KCl 50 mM), em um volume final de 10 μL. A reação foi incubada por 30 min com temperatura de 37 °C e interrompida para a adição de EDTA 2,27 mM e novamente incubada por 10 min a 65 °C. A síntese de DNAc procedeu-se a partir do RNA previamente tratado com DNAseI, mediante o kit RevertAidTM H Minus First Strand cDNA Synthesis (Fermentas), seguindo as recomendações do fabricante. A concentração de DNAc foi estimada utilizando-se o espectrofotômetro NanoDrop 2000 (Thermo Scientific).

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2.3.5.2 DESENHO DE PRIMERS PARA qPCR, PADRONIZAÇÃO DAS REAÇÕES E EFICIÊNCIA DE REAÇÃO

As sequências do RNA mensageiro (RNAm) foram obtidas do banco de dados National Center for Biotechnology Information (www.ncbi.nlm.nih.gov). Os primers foram desenhados, sempre que possível, em éxons diferentes e com temperatura de anelamento de 60 ºC. Posteriormente, as sequências selecionadas foram submetidas aos programas: Blast (www.ncbi.nlm.nih.gov/blast) para confirmação de homologia com o gene de interesse, e GeneRunner, para avaliação das estruturas formadas (hairpins, dimers, etc).

Para a padronização da reação de qPCR foram determinadas três concentrações (70 nM, 150 nM e 300 nM) dos primers (sense e anti-sense), sendo selecionada a concentração ideal em que o gene alvo foi amplificado mais precocemente (menor valor de Ct – cycle threshold). Os primers utilizados e suas concentrações estão listados na Tabela 1.

Tabela 1. Genes escolhidos para validação e suas respectivas sequências, concentrações utilizadas e tamanho dos primers.

Genes Sequência dos primers Concentração

(nM) Produto (pb) ACTB F: TGACCCAGATCATGTTTGAGACC R: CAGAGGCGTACAGGGATAGCA 150 81 GAPDH F: AAGATCATCAGCAATGCCTCCT R: GGTCATGAGTCCTTCCACGATAC 150 96 ASCL2 F: CACTGCTGGCAAACGGAGAC R: AAAACTCCAGATAGTGGGGGC 150 98 CXCL10 F: CCACGTGTTGAGATCATTGCTAC R: GAGATCTTTTAGACCTTTCCTTGCT 150 121 HLAG F: CAGATACCTGGAGAACGGGA R: CAGTATGATCTCCGCAGGGT 300 139 IL1R2 F: ATGTTGCGCTTGTACGTGTTG R: CCCGCTTGTAATGCCTCCC 150 112 CXCL11 F: TGTTCAAGGCTTCCCCATGT R: TGGGTACATTATGGAGGCTTTCT 150 106 S100A8 F: ATCAGGAAAAAGGGTGCAGAC R: ACGCCCATCTTTATCACCAG 150 104 CPXM2 F: AACATCCAGGCGGGCATTA R: CACCCAGTCACTCAGCCAGA 150 162

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CAMP F: GACCCAGACACGCCAAAG

R: TCACCAGCCCGTCCTTCT 150 109

NOS2 F: TGAACACATCTGCAGACACG

R: GGTAGCCAGCATAGCGGAT 150 140

F = forward, R = reverse e pb = pares de bases.

A confiabilidade e reprodutibilidade da qPCR estão diretamente relacionadas com a eficiência da reação. Assim, uma reação é realizada utilizando-se a concentração de primers selecionada e diluições seriadas (6,32 ng; 20,0 ng; 63,26 ng; 120,0 ng; 200,0 ng e 632,6 ng) de uma amostra, obtendo-se uma curva cujo valor da inclinação (slope) é aplicado à fórmula [10 (-1/slope) -1] x 100 = 100%, resultando no valor percentual de eficiência de reação. Foram aceitas como ótimas as curvas que apresentaram valores entre 99 e 100% e correlação acima de 0,98. Um exemplo de padronização de primers pode ser visualizado na figura 5.

Figura 5. Padronização da concentração do par de primers que amplifica o gene ASCL2. A figura mostra a curva de amplificação da diluição em seis concentrações de cDNA (6,32 ng; 20,0 ng; 63,26 ng; 120,0 ng; 200,0 ng e 632,6 ng), a curva de melting dos primers (79,48°C),

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indicando a especificidade da amplificação, e a curva padrão com 100% de eficiência e 0,996 de correlação.

2.3.5.3 PCR QUANTITATIVO EM TEMPO REAL (qPCR)

As reações de PCR foram preparadas com o reagente SYBR Green PCR Master Mix (Applied Biosystems – Life Technologies Corp.) e a detecção de amplificação em tempo real foi realizada no equipamento Step One Plus (Applied Biosystems). Para todas as amostras foram realizadas reações com 12 μL de volume final; sendo 6,0 μL do reagente SYBR Green PCR Master Mix, 3,0 μL de mix de amostra de DNAc (10 ng/μL de concentração final) e 3,0 μL do mix de primer. As amostras foram amplificadas em duplicata, com o uso de controles negativos para cada primer com poços contendo água estéril em substituição à amostra. O programa foi iniciado a 95 °C/10 minutos, seguido de 40 ciclos: 95 °C/15 s e 60 °C/1 min. Posteriormente, adicionou-se uma etapa de 20 min, na qual a temperatura aumenta gradualmente de 60°C para 95°C para a realização da curva de Melting.

2.3.5.4 ANÁLISE DOS DADOS DE qPCR E ESTATÍSTICA

Todas as análises das reações de qPCR foram realizadas a partir da quantificação relativa baseada na fórmula de 2^(-ΔCt). Os valores da expressão foram normalizados em relação aos controles endógenos ACTB e GAPDH. Os resultados foram indicados em média e desvio padrão. Os gráficos e os cálculos foram obtidos por meio do programa GraphPad Prism 5 (GraphPad Software, Inc.). O teste de Mann-Whitney foi utilizado para avaliar a diferença de expressão entre os dois grupos e valores de p < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.

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2.4 RESULTADOS

2.4.1 COMPLICAÇÕES CLÍNICAS

O estudo avaliou dez mulheres com HbSS, 15 mulheres com HbSC e 21 mulheres saudáveis sem DF e com genótipo HbAA. Os genótipos HbSS e HbSC foram ambos comparados com o HbAA. Foram observadas diferenças estatisticamente significativas nos grupos HbSC e HbSS quando comparados com o grupo controle em idade gestacional, peso do recém-nascido e peso placentário. No entanto, é importante ressaltarmos que não foi feita a correção da idade gestacional para os pesos do recém-nascido e da placenta.

As mulheres com o genótipo HbSS apresentaram menor idade materna (25,20 ± 1,66 anos, p = 0,2249), menor idade gestacional (35,70 ± 1,09 semanas, p = 0,0001), menor peso do recém-nascido (2413 ± 240,5 gramas, p < 0,0001) e menor peso placentário (473,3 ± 43,19 gramas, p = 0,0002) entre os grupos analisados.

As complicações relacionadas à doença durante a gravidez foram mais frequentes no grupo HbSS do que no grupo HbSC com exceção da síndrome torácica aguda: crises vaso-oclusivas (70,0 vs. 46,6%), RCF (20,0 vs. 6,7%), mortalidade perinatal (10,0 vs. 0%), síndrome torácica aguda (10,0 vs. 13,3%). Os dados para cada grupo são mostrados na Tabela 2. Um total de 20 (80,0%) gestantes com DF recebeu transfusões de sangue profiláticas (nove gestantes do grupo HbSS e 11 do grupo HbSC).

Na instituição onde foi desenvolvido esse estudo, a transfusão sanguínea regular tem sido usada como profilaxia para diminuir os resultados maternos e fetais adversos [47]. Cinco das pacientes (um HbSS e quatro HbSC) não receberam transfusões profiláticas por diferentes razões. Em dois casos, o nascimento prematuro ocorreu antes da primeira transfusão agendada, e em um deles a morte neonatal ocorreu logo após o nascimento. As outras três gestantes tiveram dificuldade em aderir ao tratamento, devido a questões pessoais.

2.4.2 ANÁLISE DO TRANSCRIPTOMA

Após a filtragem, cada biblioteca produziu pelo menos 46 milhões de leituras pareadas de 100pb (intervalo: 46,783 - 196,274 milhões). Para avaliar a qualidade de cada biblioteca foi utilizado o programa FastQC [70]. O conteúdo GC foi de aproximadamente 49% para cada amostra. Um mínimo de 89% das bases atingiu uma pontuação de qualidade 30 (Q30), diminuindo assim, a probabilidade de uma base ter sido sequenciada erroneamente. Após a remoção dos adaptadores Illumina, pelo menos 81% das reads foram unicamente alinhadas ao genoma humano, com uniformidade de mapeamento de leitura adequada em todas as amostras

(39)

[77]. Os números de reads geradas e alinhadas de cada biblioteca estão descritas na Tabela 3. Para avaliar a qualidade por base das sequências é gerado um gráfico de Whisker, como mostrado na Figura 6. Os valores referentes à qualidade do fragmento de 100 pares de base (acima de 29, área verde considerada satisfatória) foram suficientes para todas as amostras.

Tabela 2. Comparação das características materno-fetais entre os grupos analisados.

Características Grupo controle Grupo HbSC Grupo HbSS

Total de gestantes (n) 21 15 10

Idade materna (anos) ±SD 27,86 ± 1,25 26,33 ± 1,99 25,20 ± 1,66

Nulíparas 6 8 7

Idade gestacional (semanas) 39,43 ± 0,28 36,60 ± 0,24*** 35,70 ± 1,09***

Trabalho de parto prematuro 0 3 (20%) 4 (40%)

Via de parto Vaginal 3 2 3 Cesárea 18 13 7 Tabagismo 0 1 0 Complicações relacionada à DF Crises álgicas - 7 (46,6%) 7 (70%) Infecções - 4 (26,6%) 5 (50%)

Síndrome torácica aguda - 2 (13,3%) 1 (10%)

Transfusão de sangue programada - 11 (73,3%) 9 (90%) Peso ao nascer (g) 3458 ± 77,74 2961 ± 100,9*** 2413 ± 240,5*** Sexo do RN Feminino 14 4 4 Masculino 7 11 6 Peso da placenta (g) 695,8 ± 29,78 (n = 18) 520,0 ± 15,07*** 473,3 ± 43,19*** Apgar de 5 min ≤ 7 0 0 0 RCF 0 1 (7%) 2 (20%) Mortalidade perinatal 0 0 1 (10%)

RN: recém-nascido e RCF: restrição de crescimento fetal. ***p < 0,001, Teste t de student não pareado.

(40)

Tabela 3. Dados dos sequenciamentos das 15 bibliotecas submetidas ao RNAseq.

Amostras Reads geradas % de reads alinhadas % de bases ≥ Q30

HbSC - 1 55.570.680 83,80 93,79 HbSC - 2 56.396.816 87,26 94,08 HbSC - 3 54.097.294 82,57 93,50 HbSC - 4 91.188.328 88,59 89,09 HbSC - 5 58.849.248 81,37 95,84 HbSC - 6 65.327.668 84,30 96,01 HbSS - 1 137.690.086 85,06 89,06 HbSS - 2 145.467.728 90,22 89,28 HbSS - 3 77.921.850 85,83 93,09 HbSS - 4 74.415.306 82,85 93,89 HbSS - 5 53.457.250 94,13 95,87 Controle - 1 46.783.258 84,54 93,12 Controle - 2 65.341.538 91,71 93,70 Controle - 3 55.616.916 86,58 93,42 Controle - 4 196.274.802 93,51 89,39

(41)

Figura 6. Exemplo de uma análise de qualidade de bases realizada pelo programa FastQC. Foi possível observar que os valores referentes à qualidade foram considerados satisfatórios (acima de 29, área verde).

2.4.3 EXPRESSÃO DIFERENCIAL

Após a montagem dos transcritos, o nível de expressão dos genes foi avaliado por meio do pacote DESeq2 [72]. Os resultados obtidos foram comparados com o banco de dados Expression Atlas para placenta e nossos resultados estão de acordo com o observado.

A partir dos critérios estabelecidos (log2 fold change ≥ 1,0 e taxa de falsa descoberta – FDR < 0,05), foram observados 12 GDEs no grupo HbSC quando comparado ao grupo controle (Tabela 4). Destes 12, dois não codificam proteínas (AC135371.1 e AC099552.4). Somente dois genes apresentaram menores níveis de expressão e dez genes foram superexpressos. Em contrapartida, para o grupo HbSS, foram encontrados sete GDEs (Tabela 5) dos quais dois genes mostraram-se com maiores níveis de expressão (dentre estes, um gene não codifica proteína: AC022730.3-201) e cinco genes subexpressos.

O único GDE em comum encontrado nos grupos HbSC e HbSS quando comparados ao grupo controle foi a quimiocina CXCL10. Também foi realizada a análise comparando o grupo HbSS com o grupo HbSC e foram encontrados dez GDEs, sendo três não codificadores de proteínas (AC068446.2, AP000350.6 e Y_RNA) (Tabela 6).

(42)

Tabela 4. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSC quando comparado ao grupo controle (HbAA).

Tabela 5. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSS quando comparado ao grupo controle.

Símbolo gênico Fold change FDR

HLA-G 5,56 6.37e-07 IL1R2 3,92 0,0002 B3GNT7 3,29 0,0009 NOS2 4,52 0,003 ASCL2 3,61 0,005 PNCK 3,96 0,006 VWCE 3,00 0,010 KRT15 3,70 0,015 CXCL10 -3,66 0,020 AC099552.4 3,87 0,028 AC135371.1 -3,69 0,040 C5orf46 3,73 0,041

FDR: taxa de falsa descoberta

Símbolo gênico Fold change FDR

CXCL10 -4,59 0,013 S100A8 -3,82 0,013 CPXM2 4,57 0,020 CAMP -4,55 0,020 AC022730.3-201 4,51 0,023 CXCL11 -3,72 0,024 DEFA4 -4,41 0,027

(43)

Tabela 6. Genes diferencialmente expressos do grupo HbSS vs. HbSC.

FDR: taxa de falsa descoberta

Após a análise de expressão diferencial, a partir das contagens individuais dos transcritos, foram construídos gráficos do tipo heatmap incluindo os 30 genes codificadores de proteínas selecionados devido aos menores valores de FDR obtidos e mantendo o nível de significância do fold change de pelo menos 2. Na figura 7 é possível observar os 30 genes da análise HbSC vs. HbAA e na figura 8 os 30 genes da análise HbSS vs. HbAA.

Símbolo gênico Fold change FDR

POLQ 2,45 0,003 ISG20 -2,62 0,011 GABRA3 2,09 0,015 S1PR4 -3,95 0,015 CST6 -3,35 0,015 AC068446.2 3,06 0,017 CRIP2 -2,76 0,021 AP000350.6 3,02 0,037 Y_RNA 3,63 0,037 PDLIM4 -2,99 0,046

(44)

Figura 7. Heatmap dos 30 genes codificadores de proteínas selecionados a partir dos menores valores do FDR do grupo HbSC.

Figura 8. Heatmap dos 30 genes codificadores de proteínas selecionados a partir dos menores valores do FDR do grupo HbSS.

Referências

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