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O discurso de todos nós : um estudo sobre a rede social de formação continuada de professores Todos Nós em Rede

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DANIEL DE RAEFFRAY BLANCO NASCIMENTO

O DISCURSO DE TODOS NÓS:

UM ESTUDO SOBRE A REDE SOCIAL DE

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

TODOS NÓS EM REDE

CAMPINAS

2017

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DANIEL DE RAEFFRAY BLANCO NASCIMENTO

O DISCURSO DE TODOS NÓS:

UM ESTUDO SOBRE A REDE SOCIAL DE FORMAÇÃO CONTINUADA

DE PROFESSORES TODOS NÓS EM REDE

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração de Educação.

Orientadora: Professora Doutora Maria Teresa Eglér Mantoan

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO DANIEL DE RAEFFRAY BLANCO NASCIMENTO, E ORIENTADA PELO(A) PROFA. DRA. MARIA TERESA EGLÉR MANTOAN

CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO - FE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

O DISCURSO DE TODOS NÓS:

UM ESTUDO SOBRE A REDE SOCIAL DE FORMAÇÃO

CONTINUADA DE PROFESSORES TODOS NÓS EM REDE

Autor: Daniel de Raeffray Blanco Nascimento

COMISSÃO JULGADORA:

Profa. Dra. Maria Teresa Eglér Mantoan Prof. Dr. Fernando Lefèvre

Profa. Dra. Maria Cecília Calani Baranauskas Prof. Dr. Heiko Horst Hornung

Profa. Dr. Edilene Aparecida Ropoli

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

Campinas 2017

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O reparo, a travessura, a sorridente suspeita, a zombaria são sinais de saúde: tudo absoluto pertence à patologia. Friedrich Nietzsche - Além do Bem e do Mal

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Agradecimentos

“Jé... lê aqui essa parte pra mim, por favor? Vê se tá bom assim...” Eu mesmo Inicio meus agradecimentos com uma epígrafe que cita a mim mesmo. Isso porque estas minhas falas foram repetida mais vezes do que posso lembrar, e demonstram parte fundamental do trabalho que agora apresento na forma desta dissertação. Como fica evidente, ocorre que contei com um apoio inenarrável de minha companheira, Jéssica Perini ao longo de todo o processo. Além do apoio direto nas leituras e comentários da qualificação, artigos, trabalhos para disciplinas, e dissertação final, não posso deixar de citar o apoio tácito, materializado em tantas delicadezas e gestos de boa vontade quanto se possa imaginar. Por isso, registro meu mais sincero agradecimento.

Em seguida, agradeço à Professora Mantoan, como sempre a chamei. Agradeço por ter sido uma orientadora que contribuiu com o percurso deste mestrado de forma aberta e generosa. Aberta por ter estado sempre disposta a ouvir minhas ideias, intenções, e devaneios; Generosa por sempre oferecer sugestões e orientações que, inquestionavelmente, engrandeceram a mim e ao meu trabalho. Agradeço-a especialmente por ter de fato orientado o meu trabalho, jamais levando-me a seguir por caminhos alheios àqueles que eu levando-mesmo desejava.

Expresso, ainda, meu agradecimento aos membros titulares e suplentes de minhas bancas do Exame de Qualificação e Examinadora de Dissertação. Ao Professor Doutor Fernando Lefevre pela disposição e abertura para discussões relativas ao método desta pesquisa. À Professora Doutora Cecília Baranauskas pelos comentários e sugestões feitos quando da Qualificação e que muito acrescentaram a este trabalho, e por ter sido uma das idealizadoras do TNR. À Doutora Edilene Ropoli pelas considerações cuidadosas e precisas que fez no trabalho que apresentei para minha Qualificação. Ao Professor Doutor Heiko Hornung pelo apoio no processo de aprendizagem sobre como funciona um Mapa

do Site, e no levantamento das estatísticas de usos e acessos do Todos Nós em

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Agradeço à minha família pela confiança que sempre depositou em mim, e por tudo o que todos fizeram para que eu pudesse sempre estar onde desejava.

Registro também meu agradecimento à Professora Doutora Norma Lima Trindade pelos diálogos, convites e trabalhos que, indubitavelmente, muito expandiram meus saberes e vivências.

Agradeço, também, aos colegas do Leped, que sempre estiveram dispostos a dialogar comigo. Na construção de saberes, na colaboração para publicações e trabalhos, ou no encaminhamento de questões práticas, sempre encontrei apoios nos colegas: Bel Dias, Eduardo Lanuti, Lilia Barreto, Gustavo Tomazi, Meire Cavalcante, Martinha Clarete, Eliane Ramos, Thaís Tkatchuk e Bruna Leite.

Considerando que sem eles este trabalho seria absolutamente impossível, registro também meu mais sincero agradecimento a todos os membros e demais pesquisadores, idealizadores e criadores do Todos Nós em Rede.

Finalmente, agradeço ao CNPq pelo apoio financeiro. Afirmo convictamente que a bolsa que recebi teve fundamental importância no tempo e empenho que pude dedicar a este trabalho.

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RESUMO

O ordenamento jurídico brasileiro contemporâneo garante às pessoas com deficiência, transtorno do espectro do autismo e/ou superdotação/altas habilidades o acesso a uma educação comum inclusiva de qualidade. Para tanto, especialmente a partir da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008), garante-se a este alunado o Atendimento Educacional Especializado - AEE. Este atendimento, complementar/suplementar à sala de aula comum, e de oferta obrigatória por todas as escolas, tem o papel de identificar e apoiar a superação de barreiras que porventura estejam atrapalhando ou impedindo a plena participação destes alunos em seus processos escolares. Para que o AEE seja efetivo em suas ações, é proveitoso que professores recebam formação inicial e continuada sobre o tema. Entendendo que tal formação continuada poderia ser oferecida de forma inovadora, pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas - Unicamp - uniram-se para desenvolver o Todos Nós em Rede - TNR. O TNR é uma rede social digital construída enquanto proposta de formação continuada autônoma de professores de Atendimento Educacional Especializado. Nesta rede, não há currículo preestabelecido: a formação acontece a partir das relações estabelecidas entre os participantes, que podem discutir abertamente seus saberes, práticas, dúvidas etc. Especificamente na seção Nossos Casos do TNR, os membros da rede são convidados a desenvolver coletivamente Estudos de Casos, descrevendo suas realidades e/ou dando e recebendo contribuições de outros membros interessados. Esta pesquisa debruçou-se sobre esta seção para observar se os comentários e contribuições que são oferecidos neste espaço digital avançam na construção de práticas e saberes relativos à educação inclusiva, ou se insistem na reprodução e disseminação dos já ultrapassados conceitos da educação especial substitutiva da escolarização comum. Com o uso do método do Discurso do Sujeito Coletivo, todas as falas de sentido semelhante registradas por membros do TNR em cada Caso selecionado para análise foram aglutinadas em discursos coesos. Desta forma, foi possível construir um panorama geral sobre as ideias centrais compartilhadas pelo coletivo. Tal panorama revelou que o TNR tem servido para a troca coletiva de saberes que apoiam um entendimento inclusivo da educação especial sem, contudo, estar absolutamente livre de ideias incompatíveis à educação inclusiva. Todavia, considerando que se trata de uma proposta de formação continuada, parece natural, e mesmo necessário, que seus membros ainda tragam ao debate estas ideias já ultrapassadas. Afinal, se todos os membros do TNR compartilhassem apenas práticas e saberes absolutamente adequados às propostas e bases da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008), não haveria a necessidade de existência do TNR enquanto rede de formação continuada. Antes de encerrar o trabalho, apresenta-se breve discussão sobre uma possível evolução do TNR que ampliaria o caráter autônomo da rede.

Palavras-chave: Educação Especial; Formação Continuada; Formação Docente; Educação Inclusiva; Discurso do Sujeito Coletivo

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ABSTRACT

Brazil’s current legal ordainment guarantees an inclusive educational system for people considered disabled, with giftedness or high abilities, and/or with autism spectrum disorder. For that end, after the National Policy for Special Education according to an Inclusive Educational Perspective, those students have the right to receive a Specialized Educational Service - SES. This Service, complementary/supplementary to regular classroom, and of mandatory offer, has the role of identifying and supporting the overcoming of barriers that may hinder or impede the full participation of these students in their scholarly processes. In order to be effective, it is desirable that SES teachers participate in initial and continued education on the subject. Understanding that such continued education could be offered in an innovative setting, researchers from the University of Campinas - Unicamp - joined forces to develop Todos Nós em Rede, or All of Us Networked - TNR. TNR is a digital social network built as an autonomous continued education solution for SES teachers. On this network, there is no pre-established curriculum: people learn by engaging in public debates about their knowledge, practices and doubts. One specific section of TNR is called Our Cases. There, members of the network are invited to collectively develop Case Studies, describing their realities and/or giving and receiving contributions from other interested members. This research has focused on such section to observe whether the comments and contributions that are shared on this digital space support the construction of knowledge and practices related to an inclusive understanding of education, or whether they insist on reproducing and disseminating the already outdated concepts of special education as a substitute for regular schooling. By using the Collective Subject Discourse method, all similar meaning speeches shared by TNR members in each selected Case were joined together in cohesive discourses. By doing so, a general panorama on the ideas shared by the members of TNR was built. Such panorama revealed that TNR has been being used for the collective sharing of knowledge that supports an inclusive understanding of special education. This, however, does not mean that TNR is completely free of ideas that are incompatible to an inclusive education. Nevertheless, bearing in mind that TNR is a solution for continued education, it seems natural, necessary even, that its members keep bringing these outdated ideas. After all, if all members of TNR always shared knowledges and practices completely adequate to the bases of the National Policy for Special Education according to an Inclusive Educational Perspective, there would not be a reason for the existence of such network as a solution for continued education. Before the conclusion of this dissertation, a brief discussion is presented on a possible evolution for TNR, further developing the concept of autonomy on the network.

Keywords: Special Education; Continued Education; Teacher Education; Inclusive Education; Collective Subject Discourse.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Tela Inicial do TNR ... 42

Figura 2: Seção Início ... 44

Figura 3: A Seção Nossos Casos ... 45

Figura 4: A Visão Geral de um Caso ... 46

Figura 5: Comentários em um Caso ... 47

Figura 6: A Seção Material de Apoio ... 48

Figura 7: Novos Cadastrados no TNR por mês e total acumulado... 49

Figura 8: Número de visitantes únicos no TNR. ... 50

Figura 9: Possível representação do trabalho colaborativo (NASCIMENTO, 2013). ... 70

Figura 10: Possível representação do trabalho cooperativo (NASCIMENTO, 2013) ... 71

Figura 11: Nuvem de Palavras ... 155

Figura 12: Representação da atual configuração do TNR ... 171

Figura 13: Representação de possível configuração do TNR enquanto rede P2P ... 172

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Distribuição de Membros do TNR no Brasil segundo Moreira

(2015) ... 51

Tabela 2: Número de Casos Selecionados ... 82

Tabela 3: Dados quantitativos do Caso 1 ... 88

Tabela 4: Dados quantitativos Caso 2 ... 98

Tabela 5: Dados quantitativos Caso 3 ... 105

Tabela 6: Dados quantitativos Caso 4 ... 108

Tabela 7: Dados quantitativos Caso 5 ... 116

Tabela 8: Dados quantitativos Caso 6 ... 122

Tabela 9: Dados quantitativos Caso 7 ... 130

Tabela 10: Dados quantitativos Caso 8 ... 135

Tabela 11: Dados quantitativos Caso 9 ... 139

Tabela 12: Dados quantitativos Caso 10 ... 145

Tabela 13: Dados quantitativos Caso 11 ... 151

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACA Ano do Ciclo de Alfabetização

AEE Atendimento Educacional Especializado

CAAE Certificado de Apresentação para Apreciação Ética CAPSI Centro de Atenção Psicossocial Infantil

CRAEI Centro de Referência e Apoio à Educação Inclusiva CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CONEP Comissão Nacional de Ética em Pesquisa EaD Educação à Distância

IC Implante Coclear

Leped Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença MEC Ministério da Educação

NIED Núcleo de Informática Aplicada à Educação OEA Organização dos Estados Americanos ONU Organização das Nações Unidas PCD Pessoa com Deficiência

PCDI Pessoa com Deficiência Intelectual PEI Plano de Ensino Individualizado PNE Plano Nacional de Educação PPP Projeto Político-Pedagógico

RS Representação Social

SAAI Salas de Apoio e Acompanhamento à Inclusão SAC Sala de Aula Comum

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TEA Transtorno do Espectro do Autismo TGD Transtorno Global do Desenvolvimento TNR Todos Nós em Rede

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Sumário

0. Antes de uma Introdução ... 16

1. Introdução ... 18

2. Um Contexto, Um Enigma, e uma Resposta ... 22

2.1. Inclusão e educação: um breve panorama ... 23

2.1.4. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva ... 33

2.2. O Enigma ... 38

2.3. A Resposta ... 38

2.3.1. A “cara” da rede ... 39

2.3.2. As Estatísticas de Uso do TNR ... 49

2.3.3. O TNR enquanto tecnologia educacional ... 51

2.3.4. O TNR e a Aprendizagem Baseada em Casos ... 56

2.3.5. O TNR como Comunidade Virtual de Aprendizagem ... 63

2.3.6. O TNR, a autonomia, e a emancipação ... 68

2.3.7. O TNR e a Colaboração que sua Horizontalidade Possibilita . 69 3. O(s) Discurso(s) do(s) Sujeito(s) Coletivo(s) ... 72

3.1. O Método ... 72

3.1.1. A Representação Social ... 74

3.1.2. Operadores e Atributos do Discurso do Sujeito Coletivo ... 76

3.1.3. Fechando a Discussão sobre o Método ... 80

3.2. Critérios de Inclusão e Exclusão para Análise e Processamento de Dados ... 81

3.3. Análise e Processamento dos Casos Selecionados ... 83

Caso 1: José ... 85

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Caso 3: Como trabalhar no AEE? ... 103

Caso 4: AEE e a Escola Regular ... 107

Caso 5: Aluna com autismo e cegueira ... 112

Caso 6: Rosângela ... 120

Caso 7: André ... 126

Caso 8: Estratégias de como trabalhar com aluno com Síndrome de Down ... 133

Caso 9: DI e DM na Educação Infantil ... 138

Caso 10: Aparentes avanços e retrocessos. Como lidar? ... 141

Caso 11: Língua Portuguesa para crianças surdas ... 149

3.4. Discussão dos Dados Qualiquantitativos Processados ... 155

4. Arremate quase final ... 165

5. Considerações Finais ... 168

Referências Bibliográficas ... 174

Anexos ... 185

Parecer CEP/Conep propondo alterações ao Projeto Inicial ... 185

Parecer CEP/Unicamp de aprovação do Projeto ... 189

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0. Antes de uma Introdução

Antes de iniciar o texto desta dissertação em si, gostaria de pedir licença aos leitores para alguns esclarecimentos sobre o texto aqui apresentado. Tratam-se de questões acerca da forma e conteúdo desta redação que, por vezes, poderá fugir ao esperado, ao costume, neste tipo de escrita.

Infelizmente, vivemos ainda em um mundo muito padronizado e normativo. As amarras, que nos são social, laboral e, notadamente aqui, academicamente impostas, interditam nosso discurso - como bem nos lembra Foucault (2014b) - e reduzem a potência criativa de nossas produções. Neste cenário, tomo como dever ético o ato de encontrar frestas possíveis para vazar (BAUMAN, 2001) ideias presas a estas amarras e sustentar em plenos pulmões aquilo que, desviando da norma, tenho como correto. A partir desta afirmação, podemos caminhar às explicações e demarcações necessárias ao texto científico. Não as separo em ordem de importância, mas o texto escrito exige uma sequência de apresentação.

Primeiramente, esclareço que este trabalho não pretende encontrar respostas determinadas, universais e replicáveis. Ao contrário, penso como Nietzsche (2005) na epígrafe que inaugura este texto: “o absoluto pertence à patologia”. Na produção deste trabalho, tive como pano de fundo o entendimento de

fazer ciência enquanto algo instável, complexo, temporário, e disponível à crítica por

infinitos ângulos. Afinal, como em muito me esclareceu Colom (2004), a produção científica parte de uma interpretação da realidade, não da realidade em si. Deleuze e Guatarri (2011) também discutem isso, de alguma forma, pensando em termos de “decalques” sobre uma realidade que é “rizomática”. Por este mesmo motivo, inclusive, tentei abordar o problema estudado em sua própria complexidade (MORIN, 2011), sem compartimentações e recortes desnecessários. Mas voltarei a esta questão quando tratar sobre o método da pesquisa.

O próximo ponto a ser discutido previamente diz respeito à Wikipédia e sua validade enquanto fonte bibliográfica. Uma discussão aprofundada desta afirmação renderia uma dissertação inteira - como de fato já rendeu: Vieira (2008). Não me aventurarei a tanto. Mas, na leitura de um trabalho que justamente se

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debruça sobre uma rede colaborativa, como veremos a seguir, não é possível que ainda haja dúvidas sobre a seriedade da Wikipédia e da comunidade que, voluntariamente, mobiliza o que Lévy (2011) denomina de uma inteligência coletiva em torno do objetivo comum de escrever a maior enciclopédia do mundo. Sem muitas delongas, parece suficiente afirmar que há bibliografia suficiente (para citar alguns: GARFINKEL, 2008; GILES, 2005; JANKOWSKI, 2013) para corroborar minha defesa da Wikipédia enquanto fonte confiável de informações. Em última análise, caso o leitor ainda discorde, fica o convite: comece a contribuir com a comunidade da Wikipédia, e ajude a torná-la ainda melhor. Vale a ressalva, contudo, de que é evidente que não proponho que a Wikipédia seja única fonte para um trabalho inteiro. Ter uma única fonte de informação não parece razoável para nenhum tipo de empreitada. Mas afirmo haver espaço, e validade, para que se dê voz também a esta enciclopédia colaborativa.

Por último, antes de seguir à dissertação propriamente dita, peço ao leitor que não estranhe o tom da escrita. Para que esta produção não seja de prateleira, não morra em uma virtualidade do conhecimento inacessado, tentei escrevê-la assim como neste início: sem grandes formalidades ou termos rebuscados. E o fiz justamente pensando na acessibilidade - entendida em seu sentido mais amplo - do trabalho. Militante do conhecimento livre, advogo que devemos sempre cuidar de produzir recursos que possam ser acessados por absolutamente qualquer pessoa que por eles se interessem. Neste sentido, defendo - e aqui tentei fazer - que as produções sejam disponibilizadas gratuitamente, em licenças e formatos abertos, e com uma redação acessível.

Feitas as devidas demarcações, resta partir à dissertação. Espero que faça boa leitura.

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1. Introdução

A formação continuada de professores de Atendimento Educacional Especializado - AEE - em serviço é um campo de pesquisa rico em possibilidades de estudo. O mesmo pode ser dito da educação a distância - EaD - e de suas ferramentas. Para esta pesquisa, estas questões foram reunidas em torno de uma proposição de pesquisa simples de ser anunciada: avaliar como tem sido utilizada uma proposta de formação continuada a distância de professores de AEE de todo o Brasil.

A proposta em análise leva o nome de Todos Nós em Rede - TNR. Trata-se, ao mesmo tempo, de um Ambiente Virtual de Aprendizagem e de uma visão inovadora sobre educação. Isso porque, como desenvolverei a seguir, este ambiente foi idealizado e construído, nas palavras de suas criadoras, visando

a) A busca de expertise para a solução de problemas que esses professores encontram no cotidiano de seus trabalhos em salas de recursos multifuncionais;

b) O compartilhamento de ideias e a socialização de casos bem sucedidos e de casos ainda não resolvidos que esses professores estejam trabalhando ou já tenham trabalhado;

c) O estabelecimento de uma dinâmica continuada de estudos e respostas mediada pela tecnologia. (MANTOAN; BARANAUSKAS, 2014)

Sobre estas bases, é desenvolvido desde 2010 este Ambiente Virtual de Aprendizagem - AVA - que pode ser facilmente caracterizado com o que se habituou chamar de rede social digital ou virtual (RECUERO, 2014; WELLMAN, 2002; REDE SOCIAL VIRTUAL, 2017). Com funcionamento totalmente horizontal, o TNR não tem professores, monitores, tutores. Os próprios participantes da rede vão articulando seus conhecimentos, alheios a qualquer supervisão externa. A proposta oferece aos participantes a possibilidade de apresentarem suas dúvidas e conhecimentos à rede, participando autonomamente de um processo coletivo de construção de saberes, sem currículos previamente desenhados.

Esta perspectiva de trabalho horizontal e colaborativo é especialmente relevante para a formação de professores de AEE. Como tratarei adiante, a boa

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atuação deste profissional no dia-a-dia de sua prática está bastante atrelada a uma postura proativa e colaborativa dentro do contexto escolar. Com isso, o funcionamento do TNR também tem a potência de apoiar a formação destes profissionais em seus modi operandi, ultrapassando o que diz respeito apenas aos conhecimentos necessários.

Há que se reconhecer que todo o funcionamento e estrutura do TNR são bastante inovadores no campo da educação a distância. Ao longo de sua história, a EaD tem sido uma forma de educação muito relacionada a um entendimento tecnicista de currículo. Via de regra, cursos de EaD são oferecidos através da distribuição de conteúdos fechados em etapas compartimentadas, denominadas

módulos. Este método cartesiano de trabalho encontra apoio em linhas teóricas da

psicologia cognitiva (GAGNÉ et al., 2005) e das ciências da computação (MCCORMACK, 1998), além de ser um reflexo do modelo multidisciplinar ainda largamente utilizado, em geral, na Educação institucionalizada (GALLO, 2000).

O TNR, ao materializar uma proposta de EaD contracorrente, apresenta-se como terreno fértil para a proposição de análiapresenta-ses aprofundadas. Neste apresenta-sentido, a questão sobre a qual este estudo se debruça diz respeito à observação de como se dão as construções coletivas realizadas em uma das seções do TNR, a Nossos

Casos, e se vão ao encontro de uma Educação Especial na Perspectiva da

Educação Inclusiva ou se reproduzem os, já desatualizados, conceitos e práticas de uma Educação Especial substitutiva à Escolarização Comum. Já que não há supervisão externa no cotidiano da rede, parece importante avaliar em qual sentido tem se dado a construção dos conhecimentos neste espaço digital.

Partindo do princípio de que esta observação pode ser realizada através do uso de métodos científicos que propusessem a análise sistemática das construções desenvolvidas nos espaços do TNR, desenvolve-se a pesquisa aqui apresentada. O método utilizado para tratamento e análise das produções dos membros do TNR na seção Nossos Casos é o Discurso do Sujeito Coletivo. Trata-se de um método que permite analisar qualiquantitaviamente (LEFEVRE; LEFEVRE, 2012) tais produções, de tal forma que fique exposto como esta coletividade tem discutido. A seção Nossos Casos do TNR foi escolhida para este estudo por dois motivos. Primeiramente, a centralidade que o Estudo de Caso tem na atuação dos

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professores de Educação Especial e na própria organização do TNR. Em segundo lugar, o DSC demanda perguntas abertas - que nesta pesquisa são as proposições de Casos - e respostas - que aqui são as contribuições que os membros do TNR levam a tais Casos. Todos estes elementos, é evidente, serão discutidos em maior profundidade ao longo do trabalho, que se apresenta nos seguintes momentos:

1. Apresentação de um panorama sobre as bases teóricas e legais da educação inclusiva, com especial atenção às demandas à formação docente presentes na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e outros documentos relevantes, tais como: Convenção da Guatemala, Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Plano Nacional de Educação etc. Isso porque é por estes documentos que se encontra a descrição do papel dos professores de AEE, além de orientações e pistas sobre as demandas específicas relativas à formação continuada destes profissionais.

2. Na sequência, analisaremos como estas demandas foram traduzidas na estrutura e concepção computacional/pedagógica do TNR, e como esta rede foi desenhada e estruturada de forma a constituir-se como sistema inovador e disruptivo.

3. Resolvidas as descrições daquilo que fundamenta o trabalho e seu olhar analítico, partimos à explicitação do método utilizado para tratamento e análise dos dados disponíveis na seção Nossos Casos: o Discurso do Sujeito Coletivo.

a. A partir do método adotado, apresentam-se os dados qualiquantitativos processados a partir dos Casos e seus comentários registrados na seção Nossos Casos do TNR. 4. Parte-se, então à discussão dos dados qualiquantitativos processados,

ponderando em que medida apontam, ou não, uma disseminação de saberes e práticas relativos à educação inclusiva na rede.

5. Para Arrematar tudo o que fora apresentado ao longo desta dissertação, busco retomar seus principais pontos, sintetizando os achados a partir dos dados analisados e discutidos;

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6. Antes de dar por encerrado o trabalho, proponho algumas Considerações Finais, versando sobre uma possível evolução do TNR enquanto rede social digital verdadeiramente autônoma.

Antes de dar seguimento ao texto, cabe destacar que o projeto desta pesquisa foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp, sob CAAE: 45682415.0.0000.5404. Toda a documentação referente à aprovação do Projeto pelo sistema CEP/CONEP está anexada a este trabalho.

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2. Um Contexto, Um Enigma, e uma Resposta

Vivemos hoje, nós que nos dedicamos à educação, qual Édipos diante da Esfinge. Ou deciframos o enigma que o monstro nos coloca ou somos devorados por ele. No processo educativo, ser devorado pela Esfinge é passar a fazer parte do sistema educacional vigente, tornar-se mais uma engrenagem dessa máquina social, reproduzindo-a a todo instante em nossos fazeres cotidianos. A condição de não ser mais uma engrenagem é sermos capazes de decifrar os enigmas que a crise na educação nos apresenta, conseguindo superar esse momento de rupturas. (GALLO, 2000)

Tal como proposto por Sílvio Gallo na epígrafe acima, advogo que a construção do TNR deu-se quando um grupo de pesquisadores da Unicamp colocou-se diante da Esfinge, representada por uma sociedade imersa numa compreensão excludente de mundo, e propôs-se a responder ao seguinte Enigma: como atender as necessidades específicas à formação continuada de professores de Atendimento Educacional Especializado? A Resposta encontrada foi justamente a construção do Todos Nós Rede - TNR, rede social digital tema central deste estudo. Defendo aqui que os autores do TNR teriam sido devorados pela Esfinge caso organizassem apenas mais um Ambiente Virtual de Aprendizagem como qualquer outro já disponível: vertical, modular, tecnicista.

Ao longo deste capítulo, apresentarei primeiro um panorama do contexto político, social e científico que gera as necessidades específicas presentes no

Enigma. Proponho-me a apresentar as bases teóricas e os referenciais legais da

Educação Especial como a entendemos hoje, suplementar/complementar à educação comum - portanto, inclusiva - em contraposição à antiga educação especial substitutiva da escola comum. Neste movimento, buscarei evidenciar quais são as demandas específicas à formação docente que emergem deste novo entendimento do papel da educação especial.

Apresentarei, a seguir, as formas disruptivas encontradas pelos autores do TNR para propor esta Resposta na forma de uma rede social digital que organiza uma educação “em rede, autônoma, e colaborativa” (MANTOAN; BARANAUSKAS, 2014). Em outras palavras, discutirei como o Todos Nós em Rede organiza-se, e

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como esta organização oferece condições para que se respondam as tais demandas de formação continuada em educação especial na perspectiva inclusiva.

Este exercício de análise do TNR e suas bases é importante para que fique claro porque e como esta rede está organizada antes que se possa partir à análise dos conteúdos produzidos e compartilhados por meio dela na seção Nossos

Casos. Assim, será possível esclarecer aquilo que diz respeito à estrutura

computacional/pedagógica da rede e quais são os conteúdos compartilhados por seus membros.

2.1. Inclusão e educação: um breve panorama

Em 2008, o Ministério da Educação do Brasil publicou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva de Educação Inclusiva (MEC, 2008). Tal Política propõe uma nova natureza à educação especial: não mais substitutiva, mas complementar/suplementar à educação comum. Esta natureza parte do entendimento - já não tão novo, na opinião deste autor - de que a educação é direito de todos, sem absolutamente qualquer tipo de ressalva ou exceção (ONU, 1948; BRASIL, 1988; ONU, 2006). A perspectiva inclusiva da educação especial demanda profissionais capazes de operar a partir deste entendimento. Para tanto, é necessário formar estes profissionais. Como o TNR é justamente uma proposta de formação continuada de professores de AEE, parece essencial observar as demandas de formação da educação especial na perspectiva da educação inclusiva para que seja possível, então, descrever e analisar a rede em si e os conteúdos gerados/compartilhados nela.

Para que possamos entender profundamente este entendimento inclusivo da educação especial e todas as suas nuances e armadilhas, como diria Mantoan (2011), parece relevante analisarmos alguns outros documentos que pavimentaram o caminho para a formulação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008). Isso porque tal documento, é evidente, foi escrito e publicado, como tudo, dentro de um contexto histórico, científico, político e social. Portanto, para entendê-lo, precisamos observar ao menos alguns destes pontos que fundamentam sua escrita.

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2.1.1. O Conceito de Discriminação

Como o objetivo aqui não é o de desenhar uma genealogia da inclusão, mas sim um panorama sobre as bases e sobre o conteúdo mesmo da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva de Educação Inclusiva, faço o convite para caminharmos, no campo das legislações nacionais e internacionais, no máximo até 10 anos antes da Política, começando a discussão pela Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, de 1999, aceita pelo Brasil em 2001 (OEA, 1999; BRASIL, 2001a)1. Por ter sido disponibilizada para aderência dos Estados membros da OEA na Cidade da Guatemala, convencionou-se chamar o documento de Convenção da Guatemala.

A Convenção da Guatemala já anunciava algumas questões que, nove anos mais tarde estariam refletidas na Política. Dentre elas, quero destacar o Artigo segundo desta Convenção, que define a

Discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência:

a) o termo "discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência" significa toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, consequência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais. (OEA, 1999)

Antes de dar seguimento à discussão, cabe registrar uma dúvida, colocada aqui como incômodo, sem pretensões diplomáticas: Se esta definição é aceita pelo Brasil no plano interno desde 2001 (BRASIL, 2001a), como é possível que ainda haja escolas especiais neste país?; como é possível que ainda se

1

As datas relativas à Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência podem parecer um tanto confusas. Explico: o documento começou a ser discutido na Organização dos Estados Americanos em 1996; em 1999, foi aprovado pela Assembléia Geral da OEA; em 2001 o Congresso Nacional aprovou o Decreto Legislativo nº 198, de 13 de junho de 2001, aprovando o texto da Convenção para o âmbito nacional; ainda em 2001 a Presidência da República publicou o Decreto Nº 3.956, De 8 De Outubro De 2001 que, finalmente, Promulga a Convenção. Neste trabalho, portanto, esta Convenção pode ser citada como OEA (1999), quando discutida no nível internacional, ou como Brasil (2001a), quando discutida no nível nacional.

(25)

25

diferenciem ambientes, métodos e currículos a partir de um critério tão arbitrário como a deficiência dos estudantes? Responder a esta dúvida também renderia um trabalho por si só - como, novamente, já rendeu (CAVALCANTE, 2012). Aqui, basta ficar com o espanto causado por tal realidade.

Retomando a definição de discriminação contra pessoas com deficiência apresentada pela Convenção da Guatemala, este mesmo documento também discute aquilo que não constitui discriminação:

a diferenciação ou preferência adotada pelo Estado Parte para promover a integração social ou o desenvolvimento pessoal dos portadores de deficiência, desde que a diferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à igualdade dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitar tal diferenciação ou preferência. (OEA, 1999)

Com isso, fica claro que quaisquer diferenciações que de alguma forma dificultem ou impeçam a garantia de direitos de pessoas com deficiência são entendidas como discriminatórias, enquanto que não são discriminatórias as diferenciações voltadas ao apoio do desenvolvimento, da garantia de direitos, e da plena participação na sociedade. Para a educação, este entendimento implica um olhar igualitário no que diz respeito ao direito à educação, mas um olhar que pode diferenciar recursos e meios para a promoção de tal direito. Boaventura de Sousa Santos condensa bem este entendimento ao descrever o imperativo cultural da

hermenêutica diatópica: “temos o direito a ser iguais quando a diferença nos

inferioriza; temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza.” (2006).

2.1.2. A Escola Inclusiva Enquanto Meta para o País

Na sequência da Convenção da Guatemala, e condizente com um cenário internacional de mobilizações e discussões em favor da inclusão, temos o posicionamento do Plano Nacional de Educação - PNE 2001-2011 (BRASIL, 2001b) sobre o tema. Em sua Meta oito, este documento discute as diretrizes para a educação especial na década 2001-2011. O documento, portanto, engloba o período de redação e publicação da Política. As diretrizes da referida Meta Oito partem do princípio de que

(26)

26

[...] o grande avanço que a década da educação deveria produzir será a construção de uma escola inclusiva, que garanta o atendimento à diversidade humana. (BRASIL, 2001b)

Entretanto, é como muito bem colocou a colega Meire Cavalcante sobre a redação desta meta do PNE 2001-2011:

[...] o texto interpreta incorretamente a Constituição Federal dizendo que esta “estabelece o direito de as pessoas com necessidades

especiais receberem educação preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208, III)”, o que confere à Educação Especial

caráter substitutivo. Diz, ainda, que “As políticas recentes do setor têm indicado três situações possíveis para a organização do atendimento: participação nas classes comuns, de recursos, sala

especial e escola especial. Todas as possibilidades têm por

objetivo a oferta de educação de qualidade”. (CAVALCANTE, 2012. Destaques da autora).

Esta interpretação equivocada da Constituição Federal feita pelo PNE 2001-2011, cabe ressaltar, acaba ignorando também o que fora acordado e aceito na Convenção da Guatemala. Contudo, serve de alento sabermos que tal visão, incompatível com a inclusão, foi largamente ultrapassada pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva de Educação Inclusiva.

Ainda no que diz respeito às propostas nacionais para a Educação Especial, vale ressaltar que a Política foi formulada e publicada pelo Ministério da Educação durante o segundo mandato do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva - 2007/2010. Cabe, portanto, considerarmos o Programa de Governo apresentado à época das eleições. Isso porque, como discute Zacarias Borges, a “definição de políticas sociais dá-se mediante os programas partidários, [...] elaborados por integrantes dos partidos [...].” (BORGES, 2002). As passagens do Programa de Governo que tratam das propostas para as pessoas com deficiência anunciam uma visão de Garantia de Direitos:

Continuarão a ser implementadas medidas que garantam e ampliem mecanismos de combate ao racismo e à homofobia, proteção dos idosos e da superação da discriminação a pessoas com deficiência, dedicando-se ênfase especial aos direitos das crianças e dos adolescentes. Essa dimensão da inclusão social é fundamental para uma maior abrangência da política de Direitos Humanos do Governo. [...]

(27)

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Articular as três esferas de governo e sociedade civil para o cumprimento da legislação de acessibilidade das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, elaborando as regulamentações complementares.

Dar continuidade ao Programa de Educação Inclusiva. [...]

Fortalecer o caráter inclusivo e não-discriminatório da educação, aumentando investimentos na educação especial e indígena e na valorização da diversidade étnico-racial e de gênero. (GARCIA, [2006?])

Fica evidente, então, que a formulação de uma Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva alinha-se adequadamente ao Plano Nacional de Educação 2001-2011 (BRASIL, 2001b) e ao Programa de Governo do Partido dos Trabalhadores - PT - para o segundo mandato de Lula (GARCIA, [2006?]).

2.1.3. O Modelo Social e seus desdobramentos: a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas Com Deficiência

Vejamos, agora, um último documento antes de adentrarmos profundamente nas propostas da referida Política.

Posterior ao PNE, mas ainda anterior à Política, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006) não poderia ser preterida nesta discussão. O Brasil é signatário desta Convenção e, conforme dispositivo Constitucional previsto no Artigo 5º da CF (BRASIL, 1988), o texto discutido na ONU tem valor de Emenda Constitucional em nosso país (BRASIL, 2009)2. A relevância do documento no cenário internacional de garantia de direitos das PCDs é ingente. Seria exercício bastante interessante analisar o

2

Como no que diz respeito à Convenção da Guatemala, as datas relativas à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência também podem parecer confusas. Novamente, explico: O documento começou a ser discutido na Organização das Nações Unidas em 2000; em 2006, foi aprovado pela Assembléia Geral da ONU, nas línguas oficiais da ONU; em Março de 2007, foi aberto para adesão dos Estados Parte, quando o Brasil assinou o documento; em 2008 o Congresso Nacional aprovou o Decreto Legislativo Nº 186, de 2008, aprovando uma tradução do texto da Convenção para o âmbito nacional; em 2009 a Presidência da República publicou o Decreto Nº 6.949, De 25 De Agosto De 2009 que, finalmente, Promulga esta mesma tradução da Convenção original. Neste trabalho, portanto, a Convenção pode ser citada como ONU (2006), quando no original em inglês ou quando discutida no nível internacional, ou como Brasil (2009), quando na versão em português ou discutida no nível nacional.

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documento inteiro. Contudo, isso também renderia um trabalho por si só - como, ainda mais uma vez, já rendeu (PALACIOS, 2008). Para este trabalho, parece suficiente atermo-nos a dois pontos desta Convenção: o que diz respeito à definição de deficiência; e o que diz o texto sobre o direito à educação.

Comecemos pela definição de deficiência. Ainda em seu preâmbulo, a Convenção diz o seguinte:

Reconhecendo que a deficiência é um conceito em evolução e que a

deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, (BRASIL, 2009).

Cabe um alerta rápido, antes de dar seguimento à argumentação. A versão original, em Inglês3, deste trecho tem uma redação importante, que se perdeu na tradução. Não há, em Português, uma palavra precisa para a tradução do sentido de “impairments”. Com certa dose de licença poética, poderia dizer-se

desabilidades. Este destaque é relevante porque parte da inovação trazida pela

definição discutida na ONU vem justamente da separação entre deficiência - consequência de uma sociedade excludente e segregadora que cria barreiras à plena participação de todos - e desabilidade - uma característica funcional (OMS, 2003) da pessoa. Aplicando o termo que propus, poder-se-ia reescrever o trecho da seguinte forma: Reconhecendo que a deficiência é um conceito em evolução e que a

deficiência resulta da interação entre pessoas com desabilidades e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Feita a observação, pode-se voltar à linha de raciocínio. Vê-se que esta definição proposta pela ONU retira da pessoa a causa de sua exclusão. Há não muito tempo era amplamente aceito na sociedade, a partir de um modelo de representação médico-reabilitador da deficiência, que as pessoas “deficientes” ou

3

N.a.: Original, em inglês: Recognizing that disability is an evolving concept and that disability results from the interaction between persons with impairments and attitudinal and environmental barriers that hinders their full and effective participation in society on an equal basis with others (ONU, 2006)

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29

“portadoras de deficiência” tinham um “problema” passível de ser resolvido ou amenizado a partir de técnicas reabilitadoras do corpo (LEPRI, 2012; PALACIOS, 2008). Esta visão ainda está bastante difundida na sociedade, e é especialmente respaldada por profissionais e instituições - majoritariamente ONGs (CAVALCANTE, 2012) - incapazes de promover ou acompanhar os avanços sociais relativos as suas áreas de atuação.

Contudo, ao menos desde a década de 1970 (UPIAS; DA, 1997) vem sendo construído este novo modelo de representação da deficiência, que se consolida no plano do direito internacional com a Convenção da ONU: o modelo Social. A partir desta nova visão, acertadamente, operamos para a Garantia dos Direitos das pessoas com deficiência, e localizamos nas barreiras socialmente colocadas e mantidas a causa da segregação (ONU, 2006; LEPRI, 2012; PALACIOS, 2008).

Para uma educação especial que se propõe inclusiva, este modelo traz implicações claras: as pessoas tidas como com deficiência devem ter garantido o seu direito à educação. Para tanto, deverão ser identificadas e superadas ou destruídas as barreiras - atitudinais, comunicacionais, processuais, arquitetônicas etc. - que de alguma forma atrapalham ou impedem a plena participação dos sujeitos nos processos relativos à escolarização.

Em um trabalho que versa sobre a educação inclusiva, parece necessário destacar que a identificação da deficiência como consequência da organização social não é aquilo que já fora afirmado por Silva (2013) sobre as identidades não serem “criaturas do mundo natural ou de um mundo transcendental, mas do mundo cultural e social.”. A visão do modelo Social dá passos além desta proposição, dizendo que a deficiência, além de ser produzida socialmente nas performatividades

discursivas (SILVA, 2013), está localizada na forma como a própria sociedade

(des)organiza-se e opera de forma a impedir ou dificultar a plena fruição de espaços e direitos de algumas pessoas, e não na constituição da própria pessoa.

Tendo discutido o entendimento de deficiência no modelo Social, e lembrando que ainda falávamos sobre a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), podemos passar ao segundo ponto do documento que é relevante para este trabalho. Trata-se do Artigo 24, que versa

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30

sobre o direito à educação, desta Convenção. Apresento-o em sua totalidade, quebrando seu texto em momentos nos quais é relevante pontuar algo:

Artigo 24 Educação

1.Os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, com os seguintes objetivos:

a) O pleno desenvolvimento do potencial humano e do senso de dignidade e auto-estima, além do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades fundamentais e pela diversidade humana;

b) O máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos talentos e da criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas habilidades físicas e intelectuais;

c) A participação efetiva das pessoas com deficiência em uma sociedade livre. (BRASIL, 2009)

Neste primeiro parágrafo do Artigo 24, vemos que os Estados Partes signatários da Convenção - dentre os quais temos os Brasil - comprometem-se a garantir um sistema educacional inclusivo, no qual PCDs possam se desenvolver ao máximo de suas potencialidades, visando uma participação efetiva na sociedade.

2.Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que:

a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência; b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao ensino secundário, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem; (BRASIL, 2009)

No trecho acima, temos que nenhuma PCD poderá ser excluída da rede comum de ensino por sua deficiência, e que todos devem ter igualdade de condições para o acesso à educação. Com isso, e retornando à pergunta que coloquei há

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pouco, vemos claramente que não se pode mais aceitar a manutenção das escolas ou classes especiais que, por sua própria natureza, criam condições diferenciadas - exclusivas e, por isso, excludentes - de acesso ao conhecimento.

c) Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas;

d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação;

e) Medidas de apoio individualizadas e efetivas sejam adotadas em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena. (BRASIL, 2009)

A partir destas três alíneas do segundo parágrafo vemos que o Brasil, enquanto signatário do documento, comprometeu-se a encontrar meios para identificar e oferecer as medidas de apoio que cada PCD, olhada individualmente, de fato precisa para que possa estudar e desenvolver-se plenamente, segundo suas capacidades.

3.Os Estados Partes assegurarão às pessoas com deficiência a possibilidade de adquirir as competências práticas e sociais necessárias de modo a facilitar às pessoas com deficiência sua plena e igual participação no sistema de ensino e na vida em comunidade. Para tanto, os Estados Partes tomarão medidas apropriadas, incluindo:

a) Facilitação do aprendizado do braille, escrita alternativa, modos, meios e formatos de comunicação aumentativa e alternativa, e habilidades de orientação e mobilidade, além de facilitação do apoio e aconselhamento de pares;

b) Facilitação do aprendizado da língua de sinais e promoção da identidade lingüística da comunidade surda;

c) Garantia de que a educação de pessoas, em particular crianças cegas, surdocegas e surdas, seja ministrada nas línguas e nos modos e meios de comunicação mais adequados ao indivíduo e em ambientes que favoreçam ao máximo seu desenvolvimento acadêmico e social. (BRASIL, 2009)

Aqui vemos nominalmente alguns exemplos de recursos e/ou formas de organização do trabalho pedagógico que deverão ser garantidos pelos signatários para os estudantes com deficiência que deles precisem. O trabalho com estes

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recursos, vê-se pela redação do parágrafo, não substitui a escolarização comum ou a vida em comunidade.

4.A fim de contribuir para o exercício desse direito, os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para empregar professores, inclusive professores com deficiência, habilitados para o ensino da língua de sinais e/ou do braille, e para capacitar profissionais e equipes atuantes em todos os níveis de ensino. Essa capacitação incorporará a conscientização da deficiência e a utilização de modos, meios e formatos apropriados de comunicação aumentativa e alternativa, e técnicas e materiais pedagógicos, como apoios para pessoas com deficiência. (BRASIL, 2009)

Neste parágrafo 4º vemos que o próprio documento da ONU anuncia claramente parte do Enigma que discutimos neste trabalho: há a necessidade de que professores sejam devidamente formados para que atuem no sentido inclusivo proposto. Evidentemente, não parece razoável imaginar que toda esta perspectiva, ainda mais enquanto política pública, possa concretizar-se sem que os agentes de execução do trabalho educativo, os professores, recebam formação inicial e/ou continuada para tanto.

5.Os Estados Partes assegurarão que as pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino superior em geral, treinamento profissional de acordo com sua vocação, educação para adultos e formação continuada, sem discriminação e em igualdade de condições. Para tanto, os Estados Partes assegurarão a provisão de adaptações razoáveis para pessoas com deficiência. (BRASIL, 2009)

Finalmente, o último parágrafo do Artigo 24 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência afirma que as PCDs, como qualquer outra pessoa, têm direito a quaisquer formas e níveis de educação, não apenas à educação básica. Isso é especialmente relevante para que seja possível a concretização de outros direitos expressos no documento, como o direito das PCDs ao Trabalho e à Vida Independente. Não caberia discorrer longamente sobre este ponto, já que ele foge do escopo deste trabalho. Mas vale destacar que a educação inclusiva de qualidade é uma necessidade para a plena participação/inclusão nos mais diferentes âmbitos da vida.

Após este breve panorama geral sobre os principais documentos que discutem a inclusão e antecederam a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, convido o leitor à análise desta Política. Com

(33)

33

isso, teremos uma visão geral das demandas específicas à formação de professores de AEE, e será possível entender melhor a Resposta dada ao Enigma com o desenvolvimento do TNR.

2.1.4. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva

da Educação Inclusiva

Com a Portaria 555, de 5 de Junho de 2007, o então Ministro da Educação Fernando Haddad instituiu um Grupo de trabalho que tinha a missão de

rever e sistematizar a Política Nacional de Educação Especial, debatendo junto às instituições de educação superior e no âmbito da educação básica nos estados, municípios e instituições não-governamentais. (MEC, 2007)

Como já discutimos, a instituição deste Grupo de Trabalho está inserida em um contexto nacional e internacional de avanços técnicos e políticos das práticas e conceitos relativos à inclusão das pessoas com deficiência. No início de 2008, o Ministério da Educação publicou o resultado do trabalho deste grupo: A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008). O objetivo da referida Política é assim estabelecido no próprio documento:

assegurar a inclusão escolar de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, orientando os sistemas de ensino para garantir: acesso ao ensino regular, com participação, aprendizagem e continuidade nos níveis mais elevados do ensino; transversalidade da modalidade de educação especial desde a educação infantil até a educação superior; oferta do atendimento educacional especializado; formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão; participação da família e da comunidade; acessibilidade arquitetônica, nos transportes, nos mobiliários, nas comunicações e informação; e articulação intersetorial na implementação das políticas públicas. (MEC, 2008)

Em outras palavras, vemos que, a partir desta Política, define-se a Educação Especial como algo que

perpassa todos os níveis, etapas e demais modalidades de ensino, sem substituí-los, oferecendo aos seus alunos serviços, recursos e

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34

estratégias de acessibilidade ao ambiente e aos conhecimentos escolares. Nesse contexto, deixa de ser um sistema paralelo de ensino, com níveis e etapas próprias. (ROPOLI et al., 2010)

Estas passagens colaboram com a afirmação anterior de que a Educação Especial, a partir da Política, passa a ter um claro papel complementar/suplementar à educação dos alunos que são seu público alvo, inseridos na escola regular. Com isso, mais uma vez, vemos que discussões ou discursos que defendem a educação especial enquanto substitutiva da educação comum são incompatíveis com a Política e com uma perspectiva inclusiva sobre a educação.

De fato, na perspectiva inclusiva trazida pela Política entende-se que a educação comum, a atividade pedagógica desenvolvida na sala de aula regular, é destinada a todos os alunos, sem quaisquer distinções. Diz a Política que a escola comum deve “assumir o desafio de atender as necessidades educacionais de todos os alunos” (MEC, 2008). Para tanto, todos devem ter acesso à escola comum. Porém, o acesso em si não garante uma educação inclusiva de qualidade. Isso porque, como vimos, há as barreiras arquitetônicas, comunicacionais, processuais e atitudinais que podem impedir o pleno aproveitamento de certos alunos nos processos escolares.

O público-alvo da educação especial é definido pela Política como: “os alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.” (MEC, 2008). Contudo, logo em seguida a Política ressalva:

As definições do público alvo devem ser contextualizadas e não se esgotam na mera categorização e especificações atribuídas a um quadro de deficiência, transtornos, distúrbios e aptidões. Considera-se que as pessoas Considera-se modificam continuamente transformando o contexto no qual se inserem. (MEC, 2008)

Considerando tal realidade, e concordando com conceitos e fundamentos já expostos até aqui, a Política assegura aos alunos que constituem seu público alvo o direito de receberem o Atendimento Educacional Especializado - AEE. Este atendimento, que “deve ser realizado no turno inverso ao da classe comum” (MEC, 2008) para não atrapalhar o desenvolvimento das atividades regulares, constitui “oferta obrigatória dos sistemas de ensino” (ibidem). Aqui, inclusive, quero insistir:

(35)

35

as particulares - insistem em argumentar, erroneamente, que não estão obrigadas a oferecer este serviço4.

Além das implicações e consequências legais desta posição de resistência em cumprir com o que está previsto na Política, são enormes as consequências de tal negação para o oferecimento de uma educação de qualidade para todos. Afinal, o AEE “[...] identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos” (MEC, 2008). Em outras palavras, pode-se dizer que o AEE, de forma geral, não lida com questões curriculares - próprias do ensino comum -, mas cuida da garantia da plena participação de todos os alunos-alvo da educação especial nos processos escolares. Cabe, contudo, ressalvar que o AEE poderá debruçar-se sobre questões curriculares no apoio às pessoas com altas habilidades/superdotações que, tendo esta característica, podem beneficiar-se do acesso a níveis mais avançados de determinados conhecimentos antes de suas turmas. E.g.: um aluno com altas habilidades na aula de música pode ser apoiado pelo AEE no encaminhamento para um Conservatório.

Parece evidente, considerando que o objetivo do AEE é garantir a plena participação do alunado nos processos escolares, que o bom funcionamento deste atendimento demanda que ele esteja sempre “articulado com a proposta pedagógica do ensino comum.” (MEC, 2008). Ora, se o que se objetiva é garantir a participação de alguém em algo, a atuação deve ser pautada junto destes mesmos “alguém” e “algo”, considerando as reais demandas de cada contexto. Até por isso, o funcionamento e as bases da educação especial e do AEE devem estar “presentes nos projetos pedagógicos construídos com base nas diferenças” (MEC, 2008) de cada escola. Afinal, não se trata de algo externo ou alheio à escola. Com efeito, a partir da Política, a Educação Especial e o AEE constituem algo que

4

De fato, a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, em 2015, chegou a ajuizar junto ao Supremo Tribunal Federal - STF - uma Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIN - contra dispositivos da lei 13.146/2015. Tais dispositivos diziam respeito, entre outras questões, justamente à obrigatoriedade das escolas particulares oferecerem o AEE, sem custos adicionais aos alunos público-alvo da Educação Especial. A ADIN foi julgada improcedente, e seu Acórdão insiste em esclarecer “que não apenas as escolas públicas, mas também as particulares deverão pautar sua atuação educacional a partir de todas as facetas e potencialidades que o direito fundamental à educação possui.”. (STF, 2017)

(36)

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perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional especializado, disponibiliza os serviços e recursos próprios desse atendimento e orienta os alunos e seus professores quanto a sua utilização nas turmas comuns do ensino regular. (MEC, 2008)

Elencando como opera este Atendimento em tópicos sucintos, Mantoan, Ramos e Barreto ([2016]) dizem que ele:

 Apoia o desenvolvimento do aluno com deficiência, transtornos do espectro autista e com altas habilidades/superdotação;

 Disponibiliza o ensino de linguagens e de códigos específicos de comunicação e sinalização;

 Oferece Tecnologia Assistiva – TA;

 Faz adequações e produz materiais didáticos, tendo em vista as necessidades específicas dos alunos;

 Oportuniza o enriquecimento curricular (para alunos com altas habilidades/superdotação). (MANTOAN; RAMOS; BARRETO, [2016])

Para tanto,

O atendimento educacional especializado é realizado mediante a atuação de profissionais com conhecimentos específicos no ensino da Língua Brasileira de Sinais, da Língua Portuguesa na modalidade escrita como segunda língua, do sistema Braille, do soroban, da orientação e mobilidade, das atividades de vida autônoma, da comunicação alternativa, do desenvolvimento dos processos mentais superiores, dos programas de enriquecimento curricular, da adequação e produção de materiais didáticos e pedagógicos, da utilização de recursos ópticos e não ópticos, da tecnologia assistiva e outros. (MEC, 2008)

É importante dar destaque ao final desta última passagem: “e outros”. Digo isso porque, se o trabalho junto ao público-alvo da Educação Especial deve ser realizado sempre “considerando as suas necessidades específicas” (MEC, 2008), parece inalcançável a construção de uma lista fechada e definida de ações possíveis. Haverá sempre alguma realidade, alguma demanda e possibilidade de ação não listada.

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37

Considerando esta multiplicidade nas possibilidades de intervenção, o próprio Ministério da Educação publicou a Coleção "A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar" (MEC, 2010), dividida em 10 Fascículos. Ao longo desta coleção, diversos autores discutem questões específicas sobre as possibilidades de atuação do AEE. Contudo, todas estas questões são discutidas a partir daquilo que já está expresso no primeiro volume da coleção (ROPOLI et al., 2010): cada caso deve ser estudado com cuidado e em profundidade para a identificação de demandas e possíveis intervenções. Para isso, este primeiro Fascículo da coleção apresenta um possível roteiro para o Estudo de cada Caso, além da sugestão de que este processo gere sempre um Plano Individual de Atendimento Educacional Especializado. Diz o documento que:

As observações em sala de aula, as trocas com o aluno, com o professor responsável pela sala, entrevista com os pais e avaliação do aluno na sala de recursos multifuncionais são relacionadas entre si, para que o professor compreenda melhor as causas do problema do aluno, no âmbito do AEE. (VERDE; POULIN; FIGUEIREDO In: ROPOLI et al., 2010)

Para que todo este trabalho possa de fato perpassar e apoiar aquilo que é desenvolvido nas salas de aulas comuns, parece evidente que o profissional que trabalha como professor de AEE deve ser capaz de trabalhar junto a toda a comunidade escolar, colaborando com seus colegas, professores regulares, com o corpo discente como um todo, e com demais funcionários da escola, além de conduzir articulações necessárias com outros atores e equipamentos públicos e privados pertinentes a cada caso. Todo este trabalho colaborativo tem por meta justamente a condução do Estudo do Caso de cada aluno em atendimento, de forma que seja possível identificar e superar quaisquer barreiras que estejam interferindo nos processos escolares dos mesmos.

Fica exposto, então, que a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008), ao explicitar o caráter complementar/suplementar da Educação Especial, e o papel do Atendimento Educacional Especializado, acaba gerando a demanda de formação inicial e/ou continuada para os professores que atuarão no AEE. Afinal, esta nova configuração da Educação Especial depende de profissionais capacitados para conduzi-la com efetividade.

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2.2. O Enigma

Relembrando que o Enigma que propus indagava como promover uma formação docente que dê conta das proposições e transformações trazidas pela Política Nacional de Educação Especial Na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008), proponho que uma Resposta possível, tendo em conta seu contexto social, político e científico, precisaria dar conta das seguintes demandas relativas à atuação cotidiana dos Professores de AEE:

● trabalhar colaborativamente com comunidades escolares, atuando ativamente na análise e solução de problemas;

● conduzir Estudos de Caso, levantando e ponderando informações necessárias para poder trabalhar sempre e apenas com as demandas reais apresentadas por cada estudante.

● operar sempre na lógica do modelo Social de representação da deficiência, isto é, localizando nas barreiras socialmente construídas as causas da exclusão das pessoas com deficiência;

● propor e conduzir Planos de Atendimento Educacional Especializado individualizados que ajudem a eliminar ou superar quaisquer barreiras que impeçam a plena participação dos alunos que compõem o público-alvo da Educação Especial.

2.3. A Resposta

Diante destas demandas, em 2010, membros do Leped e do Departamento de Sistemas de Informação do Instituto de Computação da Unicamp5 juntam-se para pensar uma estratégia de formação continuada à distância que fosse capaz de oferecer respostas estas questões ou, como brinquei anteriormente, de encarar este Enigma, a nível nacional. Parece claro, mesmo à primeira vista, que uma proposta de EaD como normalmente se vê, com currículo modular e avaliações

5

O processo de Design e Desenvolvimento do TNR foi complexo e contou com a participação de professoras de AEE que usariam a rede. Esta prática, que leva o nome de co-design ou design participativo, foi apresentada e discutida por: (HORNUNG; PEREIRA; BARANAUSKAS, 2016). Neste trabalho, não nos ateremos aos detalhes do processo de criação da rede, apenas a como ela está estruturada.

Referências

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