• Nenhum resultado encontrado

Data do documento. 20 de março de 2012

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Data do documento. 20 de março de 2012"

Copied!
29
0
0

Texto

(1)

Processo 7279/08.8TBMAI.P1.S1 Data do documento 20 de março de 2012 Relator Fonseca Ramos

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Garantia bancária on first demand > Recusa de

pagamento > Caducidade > Contrato-base > Revogação > Boa fé

SUMÁRIO

I) O contrato de garantia autónoma é um negócio atípico, inominado, que o princípio da liberdade contratual – art. 405º, nº1, do Código Civil – consente. Com base nesse contrato, o garante, em regra um Banco, obriga-se a pagar a um terceiro beneficiário certa quantia, verificado o incumprimento de um contrato-base, sendo mandante ou ordenante o devedor nesse contrato.

II) A independência do contrato de garantia autónoma em relação ao contrato-base é um dos traços distintivos da garantia bancária e uma das características que lhe conferem autonomia, que na fiança não existe por esta ser caracterizada pela acessoriedade. A característica da autonomia é mais patente quando a garantia deva ser prestada à primeira solicitação, “on first demand”.

(2)

(beneficiário) os meios de defesa ou excepções decorrentes das relações credor-devedor no contra-base, ao invés do que sucede na fiança, aí o fiador pode opor ao credor, não só os meios de defesa que lhe são próprios, como também os que competem ao devedor/afiançado.

IV O pagamento à 1ª solicitação (on first demand), assumido pelo garante, implica a sua obrigação de pagar ao beneficiário a indemnização objecto da garantia, não podendo opor-lhe quaisquer excepções reportadas à relação principal (contrato-base), a menos que haja evidentes e graves indícios de actuação de má fé, nela se incluindo a conduta abusiva do direito.

V Valendo a garantia autónoma durante o período de vigência do contrato-base e não podendo o garante invocar, as relações entre credor e devedor nesse contrato, não se compreende que o garante, quando interpelado pelo beneficiário possa invocar que a garantia caducou pelo simples facto deste, ante o incumprimento do devedor/ordenante, tenha exigido o pagamento da garantia após a cessação do contrato-base.

VI. In casu a exigência da garantia, depois de cessado o contrato-base, está justificada pela necessidade de, entre o credor e o devedor no contrato-base ter sido acordado que haveria um prazo para acerto de contas, após a revogação do contrato, o que seria decisivo para que o credor/beneficiário da garantia pudesse exigir ao garante a quantia devida pelo incumprimento.

VII. Não se afigura lesiva da boa fé, que na ausência de qualquer prazo para que o beneficiário reclamasse do garante o seu direito, se deva considerar que existe um prazo de caducidade no contrato de garantia para o exercício do direito do beneficiário, sobretudo, se, como é inerente aos contratos em causa (credor-devedor no contrato-base, e na relação entre o ordenante e o garante),

(3)

o beneficiário, além de ter um fundamento para não reclamar logo o quantum da garantia, mais não pede que aquilo que, inquestionavelmente, resulta do incumprimento pelo devedor no contrato-base reportado ao tempo por que este vigorou.

VIII. Com a celebração do contrato de garantia autónoma, nenhum crédito nasce no momento da celebração do contrato para o beneficiário, mas não deixa de existir um seu direito subjectivo logo que verificado o incumprimento do ordenante/devedor, o que implica a sua protecção, ainda que no mero domínio da expectativa jurídica do seu potencial direito de crédito, pois o beneficiário sabe que, em caso de incumprimento pelo ordenante seu devedor, obterá imediatamente do garante o pagamento do crédito tão logo o solicite, fazendo prova, em regra, documental do inadimplemento.

IX. O não exercício do direito pelo beneficiário em relação ao garante, na vigência do contrato, ante o incumprimento evidenciado pelo devedor-ordenante que só pôde ser quantificado após a cessação do contrato-base, não demonstra ter havido por parte de beneficiário abuso evidente, nem manifesta fraude ou lesão do princípio da boa fé, pelo que a recusa do garante exprime incumprimento do contrato de garantia.

(4)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

AA – Comércio de Combustíveis e Lubrificantes, S.A., intentou, em

25.7.2008, pelo Tribunal Judicial da Comarca da Maia – 2º Juízo Cível – acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra:

“BB, Unipessoal, Lda.”, e;

“CC, S.A.”.

Pedindo a condenação solidária das rés a pagarem-lhe a quantia de € 94 000,00, e da primeira ré a pagar-lhe ainda a quantia de € 2 366,65, acrescidas dos juros vencidos desde a data da citação.

Invoca, para fundar a sua pretensão, em síntese, que:

- a “AA Portuguesa, S.A.”, sociedade que a autora incorporou, e a 1ª ré celebraram contrato de exploração de estabelecimento comercial, através do qual a primeira cedeu à segunda a exploração do estabelecimento AA, sito na Av. D. Manuel II, na Maia;

- acordaram as partes que o preço da cedência seria constituído por duas verbas, uma fixa no montante de 71.228,34€, e outra variável, a pagar mensalmente;

(5)

entregar à autora uma garantia bancária, no montante de 94.000,00€;

- em 05/05/2003, a pedido da 1ª ré, a 2ª ré emitiu a favor da autora, uma garantia bancária à primeira interpelação;

- em 28/09/2007, a autora e a primeira ré revogaram o supra referido contrato por mútuo acordo, com efeitos a partir de 30/09/2007;

- durante a vigência do contrato a autora emitiu à primeira ré diversas facturas e notas de débito para pagamento de combustíveis e taxas de exploração que a ré não pagou, sendo o montante em dívida de 96.366,65€;

- a 2ª ré recusou o pagamento de tal quantia.

A 1ª ré, pessoal e regularmente citada, não apresentou contestação.

A 2ª ré contestou, impugnando parcialmente os factos alegados pela autora. Invocou ainda que a garantia bancária se extinguiu automaticamente no fim do período de vigência do contrato celebrado entre a autora e a 1ª ré, por caducidade.

A autora replicou, concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador e fixados os factos assentes e a base instrutória.

Procedeu-se, depois, à audiência de julgamento com observância do formalismo legal, tendo o Tribunal respondido à matéria constante da base instrutória através do despacho de fls. 188/9, que não teve qualquer reclamação.

(6)

***

A final foi proferida sentença que julgou procedente a acção e, em consequência:

I – condenou solidariamente as Rés a pagar à Autora a quantia de €

94.000,00, acrescida dos juros vencidos desde a data da citação até integral

pagamento, às sucessivas taxas de juro vigentes para as obrigações comerciais;

II – condenou a Ré “BB Unipessoal, Lda.” a pagar à autora a quantia de

€ 2.366,65 acrescida dos juros vencidos desde a data da citação até integral

pagamento, às sucessivas taxas de juro vigentes para as obrigações comerciais.

***

Inconformada, a Ré “CC, S.A.” recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 7.11.2011 – fls. 260 a 277 –, julgou procedente o recurso, revogando parcialmente a sentença recorrida, absolvendo a recorrente CC do pedido.

***

Inconformada, a Autora recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões:

1. A Recorrida emitiu a favor da Recorrente uma garantia bancária on first demand para caucionar o cumprimento de todas e quaisquer obrigações decorrentes de um contrato de exploração de um posto de abastecimento de

(7)

combustíveis.

2. A garantia prevê o pagamento à Recorrente “sem qualquer reserva, restrição ou condição” tendo a Recorrida renunciado a “todos os meios de defesa próprios ou que possam competir ao Cliente e que de algum modo possam obstar à execução total ou parcial desta garantia”.

3. A obrigação assumida pela Recorrida está delimitada temporalmente, mas apenas quanto ao período de constituição das responsabilidades garantidas. A caducidade da garantia só opera com a cessação das obrigações contraídas na vigência do contrato.

4. A garantia bancária é omissa quanto ao prazo para o respectivo accionamento, apenas o prevendo para a constituição das obrigações asseguradas.

5. Ficou provado que a dívida decorre do acordo cujo cumprimento foi garantido pela Recorrida, assim como ficou provado que o acordo de revogação prevê a obrigação da devedora liquidar à Recorrente a dívida contraída no âmbito dessa exploração.

6. A dívida foi contraída na vigência do contrato, mantém-se e é exigível independentemente da revogação contratual efectuada.

7. Persistindo tal dívida, a Recorrida, enquanto prestadora de uma garantia on first demand tem que assegurar o respectivo pagamento “sem discutir” e sem que possa opor à Recorrente qualquer excepção.

(8)

todos do Código Civil.

Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida.

A Ré contra-alegou, pugnando pela confirmação do Acórdão.

***

Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação

considerou provados os seguintes factos:

1. A autora dedica-se à importação e comércio de produtos petrolíferos e seus derivados, bem como ao exercício das actividades industriais e comerciais conexas, nomeadamente a exploração de abastecimento e áreas de serviço.

-(A) dos factos assentes);

2. A AA adquiriu o capital social da DD, tendo, posteriormente, ocorrido as seguintes alterações:

em 13/12/2000, a DD Oil Portuguesa, Lda., mudou a sua firma para AA L... -Companhia de Lubrificantes e Combustíveis, Lda.;

em 1/4/2003, a AA Portuguesa, S.A. foi incorporada, por fusão, na AA L... -Companhia de Lubrificantes e Combustíveis, Lda.;

- a AA L...-Companhia de Lubrificantes e Combustíveis, Lda. passou a sociedade anónima, mudando a sua designação para AA L... - Companhia de Lubrificantes e Combustíveis, S.A;

- em 20/8/2003, a AA L... - Companhia de Lubrificantes e Combustíveis, S.A. passou a girar sob a actual designação deAA – Comércio de Combustíveis e Lubrificantes, S.A. – (B) dos factos assentes);

(9)

3. A ré BB Unipessoal, Lda. dedica-se à exploração de postos de abastecimento de combustível – (C) dos factos assentes);

4. Em 5/6/2002, no âmbito das suas actividades, a então AA Portuguesa, S.A. e a ré BB Unipessoal, Lda. celebraram um acordo escrito, denominado “contrato”, conforme documento junto a fls. 17 a 35 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido – (D) dos factos assentes);

5. Nos termos do acordo aludido em D), a autora cedeu à ré BB Unipessoal, Lda. a exploração do estabelecimento AA sito na Avenida D. Manuel II, Maia, o qual é composto por um local de abastecimento de combustíveis, loja de conveniência e uma unidade de lavagem – (E) dos factos assentes);

6. Nos termos do acordo aludido em D), ficou acordado que a referida exploração era efectuada pelo prazo de três anos, renovando-se automaticamente por um período de três anos (salvo comunicação em contrário efectuada por qualquer uma das partes), caducando no final dessa renovação –

(F) dos factos assentes);

7. Mais ficando acordado que o preço da cedência seria constituído por duas verbas, uma fixa, no valor de € 71.228,34, e outra variável, a pagar mensalmente, constituída pelo somatório de diversas taxas a rever anualmente – (G) dos factos assentes);

8. Nos termos do acordo aludido em D), a ré BB Unipessoal, Lda. ficou autorizada a utilizar o logótipo AA, bem como as marcas, insígnias e sinais distintivos do comércio da autora, desde que fossem observadas determinadas regras por ela indicadas – (H) dos factos assentes);

(10)

9. Nos termos do acordo aludido em D), a ré BB Unipessoal, Lda. ficou obrigada a ter em exposição e em stock no Estabelecimento AA produtos derivados do petróleo ou outros comercializados pela autora – (I) dos factos assentes);

10. Ficando ainda obrigada a receber os produtos da autora, não podendo, em caso algum, “recusar a recepção de, pelo menos, uma quantidade de produto que, somada às existências em tanque, corresponda ao volume de vendas médio correspondente ao prazo de pagamento concedido pela 1ª Contratante para cada produto” – (J) dos factos assentes);

11. E ficando ainda convencionado que o preço e o prazo de pagamento dos produtos fornecidos pela autora à ré BB Unipessoal, Lda. constavam das condições comerciais anexas ao contrato, podendo a autora, mediante aviso enviado por fax ou carta à ré, alterar essas condições caso se verificassem modificações no custo ou no modo de fornecimento do produto ou operação –

(L) dos factos assentes);

12. Nos termos do acordo aludido em D), e para garantia do cumprimento do mesmo, a ré BB Unipessoal, Lda. obrigou-se a entregar à autora uma garantia bancária, no montante de € 94.000,00, que assegurasse o pagamento de quaisquer valores devidos pela 2ª contratante à primeira contratante durante toda a vigência do contrato – (M) dos factos assentes e doc. de fls. 17 a 35

dos autos);

13. Em 5.5.2003, a pedido da ré BB Unipessoal, Lda., a ré CC, S.A. emitiu a favor da autora uma garantia bancária à primeira interpelação, garantia essa que tem o n.º ..., conforme documento junto a fls. 36 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, e da qual consta:

(11)

“A CC, S.A. (...), vem, por este meio e por ordem de BB, Sociedade Unipessoal, Lda. (...) prestar irrevogável e incondicionalmente à AA Portuguesa, S.A. (....) uma garantia bancária no montante de € 94.000,00 (noventa e quatro mil euros), à primeira interpelação, nos termos seguintes:

1 - A presente garantia destina-se a caucionar o cumprimento de todas e quaisquer obrigações assumidas pela peticionária desta garantia perante a AA, nomeadamente as decorrentes do contrato de exploração de um posto de abastecimento de combustíveis celebrado entre a AA e a peticionária em 5 de Junho de 2002, declarando a CC conhecer o referido contrato.

2 - A CC obriga-se a pagar imediatamente à AA mediante simples interpelação escrita desta, enviada por carta registada com aviso de recepção ou por fax para a CC, toda e qualquer quantia que seja devida pelo Cliente à AA, por força do disposto no número anterior.

3 - Em particular, a CC declara-se principal pagador perante a AA de todas e quaisquer quantias que possam ser devidas ao abrigo da presente garantia, e declara igualmente renunciar ao benefício de excussão prévia, bem como a todos os meios de defesa próprios ou que possam competir ao Cliente e que de algum modo possam obstar à execução total ou parcial desta garantia.

4 - A garantia poderá ser executada pela AA total ou parcialmente e, neste caso, numa ou mais vezes.

5 - A CC não poderá recusar, sob qualquer alegação, o pagamento de qualquer quantia reclamada pela AA ao abrigo desta garantia, designadamente a CC não poderá alegar não se encontrar demonstrado o incumprimento total ou parcial do Cliente.

Os pagamentos deverão, assim, ser efectuados pela CC sem qualquer reserva, restrição ou condição, devendo tão só a AA invocar a presente garantia e indicar a quantia a pagar.

(12)

efectuado através de transferência para a conta bancária que a AA indicar para o efeito quando da reclamação apresentada, devendo essa conta ser creditada dentro de 48 horas que se sigam à reclamação, sem o que serão devidos pela CC juros moratórios, até efectivo e integral pagamento, à taxa legal supletiva que na altura estiver em vigor (...)”.

[…]

8 - A presente garantia é válida por todo o prazo de vigência do contrato melhor identificado no nº1 da presente garantia bancária. - (N) dos factos assentes);

14. Em 28/9/2007, a autora e a ré BB Unipessoal, Lda. subscreveram o documento junto a fls. 53 a 55 dos autos, denominado “Revogação Por Mútuo Acordo”, cujo teor se dá por reproduzido, mediante o qual declararam cessar os efeitos do acordo mencionado em D), a partir de 30 de Setembro de 2007 – (O)

dos factos assentes);

15. Nos termos do acordo aludido em O), a ré BB Unipessoal, Lda. comprometeu-se a restituir à autora o estabelecimento aludido em D) – (P) dos

factos assentes);

16. Bem como a liquidar, na data da devolução do estabelecimento “ (...) os valores que forem devidos à AA, constantes da respectiva conta corrente, bem como os resultantes da previsão correspondente a documentos por processar, que constarão de um anexo a juntar ao presente Acordo quando da entrega do Posto de Abastecimento.

O valor da previsão referida será rectificado pela AA, promovendo as partes os respectivos créditos ou débitos, consoante os casos, no prazo de 30 dias a contar desta data (...)” – (Q) dos factos assentes);

(13)

entrega do estabelecimento, a autora entregaria à ré BB Unipessoal, Lda. a quantia de € 36.000,00, acrescida de IVA à taxa de 21%, no total de € 43.560,00 – (R) dos factos assentes);

18. A autora remeteu à ré CC, S.A., que a recebeu, a carta junta a fls. 56 dos autos, datada de 13.3.2008, cujo teor se dá por reproduzido – (S) dos factos

assentes);

19. A ré CC, S.A. remeteu à autora, que a recebeu, a carta junta a fls. 57 dos autos, datada de 28/4/2008, cujo teor se dá por reproduzido – (T) dos factos

assentes);

20. A autora remeteu à ré CC, S.A., que a recebeu, a carta junta a fls. 58 dos autos, datada de 16/5/2008, cujo teor se dá por reproduzido – (U) dos factos

assentes);

21. A autora remeteu à ré CC, S.A., que a recebeu, a carta junta a fls. 59 dos autos, datada de 14/7/2008, cujo teor se dá por reproduzido – (V) dos factos

assentes);

22. A ré CC, S.A. remeteu à autora, que a recebeu, a carta junta a fls. 60 dos autos, datada de 16/7/2008, cujo teor se dá por reproduzido – (X) dos factos

assentes);

23. A ré CC, S.A. remeteu à ré BB Unipessoal, Lda., que a recebeu, a carta junta a fls. 78 dos autos, datada de 24/3/2008, cujo teor se dá por reproduzido – (Z)

dos factos assentes);

(14)

junto a fls. 79 dos autos, datado de 1/4/2008, cujo teor se dá por reproduzido –

(AA) dos factos assentes);

25. No âmbito do acordo aludido em D), a autora forneceu à ré BB Unipessoal, Lda. diversos combustíveis, no valor total de € 240.788,83, conforme documentos juntos a fls. 38 a 43 dos autos, cujo teor se dá reproduzido –

(resposta ao quesito 1º);

26. Para pagamento de taxas respeitantes ao preço da cessão e despesas respeitantes ao mês de Setembro de 2007, a autora emitiu à ré BB Unipessoal, Lda. as notas de débito juntas a fls. 43 a 52 dos autos, no valor global de € 7.893,44, cujo teor se dá por reproduzido – (resposta ao quesito 2º);

27. A autora emitiu notas de crédito a favor da ré BB Unipessoal, Lda. –

(resposta ao quesito 3º).

Fundamentação:

Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso – importa saber se a recorrida CC se encontra desvinculada da garantia prestada, por não ter sido atempadamente exercida pela garantida ora recorrente.

As partes não discutem que para garantia do cumprimento do contrato celebrado entre a Autora e a 1ª Ré – um contrato de fornecimento de combustível – a Ré CC e a Autora celebraram um contrato de garantia bancária autónoma, comprometendo-se a pagar à Autora, em caso de incumprimento do contrato pela 1ª Ré, a quantia de € 94 000,00.

(15)

Tendo cessado, por acordo, o contrato entre a Autora e a Ré BB Unipessoal, Lda. (1ª Ré), a CC recusou o pagamento reclamado ao abrigo do contrato de garantia bancária, alegando que o contrato entre a AA e a 1ª Ré já tinha cessado sem que, na vigência dele, a Autora tivesse exigido o cumprimento da garantia que assim teria caducado já que apenas se vinculara pelo período temporal por que vigorou o contrato entre a AA e BB Unipessoal, Lda.

Tendo em conta o teor do contrato referido em 13) dos Factos Provados, há que concluir – no que as partes e as Instâncias não dissentem – que a CC prestou garantia bancária on first demand à Autora, garantindo o incumprimento pela 1ª Ré do contrato que as vinculava.

O contrato de garantia autónoma é um negócio atípico, inominado, que o princípio da liberdade contratual – art. 405º do Código Civil – admite, porque não violador das normas abertas dos art. 280º e 294º do Código Civil. Com base nesse contrato, o garante, em regra um Banco obriga-se a pagar a um terceiro beneficiário certa quantia, verificado o incumprimento de um contrato-base, sendo mandante ou ordenante o devedor nesse contrato, sem que o garante possa opor ao beneficiário (credor no contrato-base) quaisquer excepções reportadas ao contrato fundamental.

A autonomização em relação ao contrato-base é um dos traços distintivos da garantia bancária e uma das características que lhe conferem autonomia, que na fiança não existe por esta ser caracterizada pela acessoriedade. Esta característica da autonomia é mais patente quando a garantia deve ser prestada à primeira solicitação, “on first demand”

Na revista “O Direito”, Ano 120, pág. 275 e seguintes, o Professor Galvão Telles, aborda com mestria, o regime de tal figura.

(16)

Na definição dada por este tratadista:

“A garantia autónoma é a garantia pela qual o banco que a presta se obriga a pagar ao beneficiário certa quantia em dinheiro, no caso de alegada inexecução ou má execução de determinado contrato (o contrato-base), sem poder invocar em seu benefício quaisquer meios de defesa relacionados com esse mesmo contrato.

Estamos a pensar na hipótese, de longe a mais frequente, de a garantia autónoma se reportar a obrigações contratuais, mas nada obsta a que verse sobre obrigação de diversa índole.

O garante paga ao credor sem discutir; depois o devedor tem de reembolsar o garante, também sem discutir.

E será, por último, entre o devedor e o credor que se estabelecerá controvérsia, se a ela houver lugar, cabendo ao devedor o ónus de demandar judicialmente o credor para reaver o que houver desembolsado, caso a dívida não existisse e ele portanto não fosse, afinal, verdadeiro devedor.”- pág.283.

O Civilista afirma serem inconfundíveis, a garantia autónoma e a fiança, nos seguintes termos:

“Existe tendência para confundir a garantia autónoma com a fiança; mas essa tendência é errónea.

Sem dúvida, as duas correspondem a preocupações semelhantes, na medida em que ambas têm uma função específica de garantia; não podem, todavia, assimilar-se, porque as separam traços fundamentais.

A fiança é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga para com o credor a cumprir a obrigação de outra pessoa, no caso de esta o não fazer. O fiador compromete-se a pagar a dívida de outrem – o devedor principal.

(17)

O seu compromisso é acessório.

No caso de garantia autónoma, o garante não se obriga a satisfazer uma dívida alheia. Ele assegura ao beneficiário determinado resultado, o recebimento de certa quantia em dinheiro, e terá de proporcionar-lhe esse resultado, desde que o beneficiário diga que não o obteve da outra parte, sem que o garante possa entrar a apreciar o bem ou mal fundado desta alegação.

O objecto da fiança confunde-se com o objecto da dívida afiançada, no sentido de que o fiador tem de pagar o que o afiançado deixou de satisfazer.

O objecto da garantia autónoma é distinto do objecto da obrigação decorrente do contrato-base.

Daqui resulta que o garante autónomo ou independente, ao contrário do fiador, não é admitido a opor ao beneficiário as excepções de que se pode prevalecer o garantido. (...) -págs.284-285 (sublinhámos).

Como resulta claro e ao invés do que sucede na fiança, onde a obrigação do fiador é acessória da do afiançado – art. 627, nº2, do Código Civil – e, por isso, não pode ser mais onerosa que a deste – art. 631º – implicando a invalidade da obrigação garantida a invalidade da fiança – art. 632º; nº1; e a extinção daquela, a desta – art. 651º; na garantia autónoma o garante não pode opor ao garantido (beneficiário) os meios de defesa ou excepções decorrentes das suas relações com o devedor.

Na fiança, o fiador pode opor ao credor, não só os meios de defesa que lhe são próprios, com também os que competem ao afiançado – art. 637º do C. Civil.

O pagamento à 1ª solicitação (on first demand), assumido pelo garante, implica a sua obrigação de pagar ao beneficiário a indemnização objecto da garantia, não podendo serem-lhe opostas quaisquer excepções reportadas à relação principal a menos que haja evidentes indícios de má fé.

(18)

No “Manual de Direito Bancário” do Professor Menezes Cordeiro, 4ª edição – 2010 – págs. 763/764, o regime da garantia é assim caracterizado:

“A garantia autónoma é, no essencial, um contrato celebrado entre o interessado — o mandante — e o garante, a favor de um terceiro — o garantido ou beneficiário. Por vezes, ela é configurada como um contrato celebrado entre o garante e o beneficiário; porém, é do mandante que o garante recebe a comissão.

A interpretação do texto da garantia é essencial para determinar o seu alcance. No entanto, toda a garantia autónoma comporta alguns traços essenciais comuns que surgem, de modo pacífico, na doutrina e na jurisprudência.

Na garantia autónoma, o garante obriga-se a pagar ao beneficiário uma determinada importância.

Tal pagamento operará à primeira solicitação (auf ersies Anfordern, on first demand), isto é: o garante pagará ao beneficiário determinada importância, assim que este lha peça.

Melhor seria dizer: garantia a mera solicitação, uma vez que não há segunda. Normalmente, porém, a garantia exige que o garante, antes de efectuar qualquer pagamento, proceda à breve análise de determinados documentos: facturas, ordens de fornecimento, boletins de transporte ou de embarque […]. Tal exame não se confunde porém, de modo algum, com um juízo de cumprimento ou de incumprimento da relação principal. As novas normas uniformes da Câmara de Comércio Internacional […] determinam que o garante examine todos os documentos especificados no texto da garantia com um cuidado razoável […].

As partes podem, porém, acordar se a garantia é automática, isto é: verdadeiramente a mera solicitação ou automática ou se, pelo contrário, o garante deve fazer verificação e qual a sua extensão (não automática).

(19)

[…] Exigida a garantia – os textos das garantias invariavelmente requerem que o seja por escrito, o garante só poderá opor ao beneficiário as excepções literais que constem do próprio texto da garantia: nunca as derivadas da relação principal.

Tão-pouco se pode reagir a ela com pretensões de enriquecimento. Naturalmente: cabe ao próprio beneficiário demonstrar que a garantia invocada se reporta a determinada dívida.

O regime da garantia autónoma e, sobretudo, o facto de ela não poder ser detida com recurso a excepções derivadas da relação básica obrigam a repensar a sua função”.

Por via da autonomia, o garante à primeira solicitação deve pagar não podendo, salvo em casos excepcionais, reportar-se ao contrato-base para recusar o pagamento.

Menezes Leitão, in “Garantias das Obrigações”, pág. 153, acerca desta modalidade da garantia autónoma “à primeira solicitação”, ensina. – “ Em qualquer caso, verificados os pressupostos do da garantia, o garante terá que satisfazer imediatamente a correspondente obrigação, sendo extremamente limitadas as excepções que pode invocar, que praticamente se reconduzem à extinção da garantia por cumprimento, resolução ou caducidade, e ainda à existência de fraude manifesta e abuso de direito por parte do credor”.

Dada a característica da autonomia, o garante não pode socorrer-se de meios de defesa senão os decorrentes do próprio contrato de garantia.

Miguel Pestana de Vasconcelos, in “Direito das Garantias”, pág. 132-133, sobre o “levantamento da autonomia”, escreve:

(20)

“Por isso entendemos que aqueles casos em que se admite que o garante pode, e deve, recusar o pagamento devem ser restritos. Tem que se tratar de casos de abuso do direito por parte do beneficiário ou de fraude por banda deste. Esse aspecto é relativamente pacífico na doutrina. Mas mais do que isso: na linha de Almeida Costa e Pinto Monteiro, entendemos que é necessário que os casos de abuso ou de fraude sejam verdadeiramente “inequívocos”.

Não é excessivo sublinhar este ponto: para que o banco/garante deixe de pagar é necessário que seja colocada à sua disposição prova “líquida e inequívoca” da “má fé patente”, da “fraude evidente” ao ponto de “entrar pelos olhos dentro”. Caso contrário, estar-se-ia a atentar contra a essência da própria garantia. Havendo causa de discussão sobre os factos que o ordenante avança como demonstrando o abuso do direito, o garante deve pagar. A questão deverá ser discutida depois entre as partes do contrato base”.

A recorrida sustenta que não está adstrita ao pagamento reclamado pelo beneficiário porquanto este reclamou o pagamento do valor garantido em momento em que o contrato-base já tinha cessado os seus efeitos entre os respectivos contraentes, ou seja, a recorrida considera que existiu caducidade do direito do beneficiário.

No acórdão recorrido, citando a “A Garantia Autónoma”, de Mónica Jardim, págs. 108 e 275, afirmou-se – “O fim do prazo de validade da garantia pode ser marcado com uma data ou com a verificação de um evento, sendo que este elemento é muito importante, porquanto o beneficiário deve fazer apelo à garantia antes do fim do prazo e tal apelo deve chegar ao garante também antes do fim do prazo.

Deste modo, se a solicitação de pagamento for feita após a data da expiração da garantia, de nada serve ao beneficiário argumentar que os factos que estiveram na base da solicitação ocorreram antes da referida data.

(21)

Por seu turno, o garante pode recusar a soma objecto da garantia sempre que a solicitação de entrega não seja feita nos termos do contrato, como sucede, por exemplo, quando o beneficiário solicita a garantia após o termo de validade desta”.

A tratadista defende, na obra citada págs. 111 e segs., que, caso nada se tenha convencionado acerca da duração da garantia, - “O art. 4º Das Regras Uniformes da Câmara do Comércio Internacional para as garantias contratuais fornece disposições supletivas aplicáveis a estes casos, segundo as quais: a garantia de oferta expira seis meses após a data da sua emissão; a garantia de boa execução expira seis meses ou depois do fim do prazo de prorrogação, ou um mês após a expiração de qualquer maintenance period estipulado no contrato base, se esse período for expressamente coberto pela garantia de boa execução; a garantia de reembolso expira seis meses após a data prevista no contrato base para a entrega ou conclusão dos trabalhos, ou depois do fim do prazo de prorrogação”.

Depois de afastar o recurso pelo beneficiário ao regime legal do art. 777º, nº1, do Código Civil, e não tendo sido estabelecido prazo de vigência da garantia por via do contrato, afirma que do contrato de garantia não emerge qualquer direito de crédito para o beneficiário, afirmação de que se discorda já que se nenhum crédito efectivamente existe no momento da celebração, não deixa de existir um direito subjectivo do beneficiário, verificado o incumprimento do ordenante/devedor, o que desde logo implica a protecção, ainda que no mero domínio da expectativa jurídica do seu potencial direito de crédito, pois o beneficiário sabe que, em caso de incumprimento pelo ordenante, obterá do garante o pagamento do crédito tão logo o solicite, fazendo prova em regra documental do inadimplemento.

(22)

A fls. 113/114, afirma a tratadista Mónica Jardim:

– “Justa e conforme com a natureza da garantia autónoma parece-nos ser a solução apresentada por Duarte Pinheiro[2] segundo a qual, nada se estabelecendo sobre a duração do contrato de garantia, o garante não tem o direito de denúncia, como não o tem o fiador, o garante tem sim o direito de exigir que o dador da ordem lhe preste (substitua ou reforce) uma caução destinada a assegurar a obrigação de reembolso, ou que, por exemplo, diligencie no sentido do beneficiário acordar na extinção da garantia (acordo que, muito provavelmente, o beneficiário fará depender da oferta, pelo dador da ordem, de adequadas contrapartidas s, v.g., depósito de valores no montante da garantia).

Quanto a esta questão há ainda a referir que segundo o art. 12.° c) da Convenção da Nações Unidas sobre garantias independentes e letras de crédito stand-by, sempre que nada seja convencionado acerca da duração da garantia, esta extinguir-se-á decorridos seis anos sobre a data da sua emissão”.

O Professor Pedro Romano Martinez, em Garantias Bancárias, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, vol. II, 2, pág. 280 – ensina:

“ A recusa de cumprimento será, contudo, lícita sempre que o garante possa opor ao credor beneficiário, que reclama o pagamento da garantia, excepções ao cumprimento. O garante poderá opor ao beneficiário as excepções que resultem directamente do contrato de garantia.

Tais como a sua invalidade (nomeadamente, por indeterminabilidade do objecto), a caducidade (verbi gratia, interpelação feita após o prazo de vigência) ou divergências relativamente ao clausulado (por exemplo, a reclamação feita por entidade diversa da beneficiária ou por montante distinto

(23)

do devido, designadamente, por não ter sido tomado em conta algum pagamento parcial já realizado).”

No caso, importa ponderar que o contrato de garantia só alude a prazo de vigência do contrato na Cláusula 8ª que encerra – “A presente garantia é válida por todo o prazo de vigência do contrato melhor identificado no nº1 da presente garantia bancária”.

As partes, a Autora e 1ª Ré puseram termo ao contrato por “Revogação por Mútuo Acordo” – fls. 53 a 54, em 28.9.2007. A Autora não reclamou de imediato o pagamento da garantia como antes não o tinha feito na vigência do contrato.

Mas há um aspecto que, salvo o devido respeito, a Relação não ponderou quando considerou ter caducado o direito de pedir o cumprimento da garantia à CC pelo facto de só ter sido peticionada pela Autora, depois de cessado o contrato-base, por via consensual.

Com efeito, essa exigência não poderia ser imediata desde logo pela razão que do acordo de rescisão. consta – na Cláusula terceira – “1. O Segundo Contratante obriga-se a liquidar, na data de devolução de posto de abastecimento prevista no número um da Cláusula anterior, os valores que forem devidos à AA, constantes da respectiva conta corrente, bem como os resultantes da previsão correspondente a documentos por processar, que constarão de um anexo a juntar ao presente Acordo quando da entrega do Posto de Abastecimento.

O valor da previsão referida será rectificado pela AA, promovendo as partes os respectivos créditos ou débitos, consoante os casos, no prazo de 30 dias a contar desta data”.

(24)

A Autora solicitou o pagamento de € 94 000,00, o valor da garantia prestada pela CC em 13.3.2008 – doc. de fls. 56.

A CC recusou esse pagamento por carta datada de 28.4.2008, afirmando que o contrato tinha sido revogado com efeitos a partir de 30.9.2007.

A Autora respondeu, pela carta de fls. 58 de 16.5.2008, onde afirma - “Por outro lado, nos termos da Revogação por Mútuo Acordo invocada por V. Excia. foram mantidas várias obrigações decorrentes do contrato de exploração do Posto de Abastecimento de Combustíveis da Maia, nomeadamente, as obrigações de pagamento das quantias apuradas nos termos descritos no Anexo à referida revogação, e que da mesma faz parte integrante, conforme se pode ver pelo documento anexo. Assim, aguardamos o pagamento imediato da quantia reclamada, sem prejuízo dos juros moratório que sejam devidos até efectivo e integral pagamento.”

Depois de referir o silêncio de quase dois meses da CC, a Autora escreveu a carta de fls. 59 – de 14.7.2008 – afirmando – “Assim, caso não seja efectuado o referido pagamento até ao próximo dia 21 de Julho de 2008,ver-nos-emos forçados a accionar os competentes meios judiciais”.

A CC respondeu por carta datada de 16.7.2008 – afirmando:

“1 – Conforme já referido na n/carta de 28/04/2008 a CC não pode satisfazer o pedido de pagamento, fundamentalmente porque nos termos da “Revogação por Mútuo Acordo” formalizado entre a AA e BB Unipessoal, Lda. o contrato objecto da prestação da garantia bancária emitida pela CC foi revogado expressamente com efeito a partir de 30 de Setembro de 2007 e, muito embora, estivesse previsto na Clª. 3ª um acerto de contas, tal deveria ocorrer

(25)

no prazo de 30 dias, pelo que no limite todas as obrigações decorrentes do contrato garantido deveriam estar cumpridas até 30 de Outubro de 2007.

2 – A interpelação da CC para pagamento da G.B. foi efectuada pela AA por carta de 13 de Março, recebida a 17/03/2008, portanto muitos meses depois do prazo de validade da mesma previsto no ponto 8. do respectivo termo, pelo que não pode ser aceite pela CC, tanto mais que já em 09 de Novembro de 2007 a Ordenadora havia solicitado à CC o cancelamento da garantia”.

Valendo a garantia autónoma durante o período de vigência do contrato-base e não podendo o garante invocar, salvo casos excepcionais, as relações entre credor e devedor nesse contrato-base, não se compreende que o garante, face à não existência de prazo de validade da garantia expressamente acordado com o ordenante (a não ser, como no caso, que a garantia vigorava enquanto vigorasse o contrato-base), possa invocar que a garantia caducou pelo simples facto do beneficiário, ante o incumprimento do devedor ordenante, apenas tenha exigido o pagamento após a cessação do contrato-base.

Por um lado, a exigência da garantia depois de cessado o contrato está justificada pela necessidade de, entre o credor e o devedor no contrato-base, ter sido acordado que haveria um prazo para acerto de contas, prazo decisivo para que o credor beneficiário da garantia pudesse exigir ao garante a quantia resultante do incumprimento que a CC garantia.

Depois, não se afigura lesiva da boa fé, que na ausência de qualquer prazo para que o beneficiário reclamasse do garante, o seu direito, se deva considerar que não existe um prazo de caducidade no contrato de garantia para o exercício do direito do beneficiário, sobretudo, se, como é inerente aos contratos (credor-devedor no contrato-base, e na relação entre o ordenante e o garante com benefício para o credor), aquele, além de ter um fundamento para não reclamar

(26)

logo o quantum da garantia, mais não pede que aquilo que, inquestionavelmente, resulta do incumprimento pelo devedor no contrato-base durante o tempo por que este vigorou.

Ademais, a CC sabia do referido Acordo de rescisão e reportou-se a ele para alegar a caducidade da garantia, o que lhe era defeso, pela autonomia do contrato de garantia autónoma em relação ao contrato-base.

Se o atraso na reclamação pelo beneficiário causava prejuízo, poderia o garante interpelar o beneficiário para exercer o seu direito num prazo considerado razoável, ou exigir do ordenante o reforço de garantias sob pena de se considerar que o não fazendo no prazo concedido, renunciaria à garantia.

Não o tendo feito, é duvidoso, no mínimo, que o direito da Autora tenha sido afectado por um prazo de caducidade não estabelecido, repete-se no contrato de garantia.

No citado Estudo do Dr. Jorge Duarte Pinheiro, o tratadista, a fls. 49/450, responde à interrogação:

“Quid juris se nada se convencionou acerca da duração da garantia?

O art. 777.°, nº1, do Código Civil, parece conferir ao beneficiário o direito de exigir o cumprimento da garantia a todo o tempo.

Ao entregar ao banco a carta de garantia, o beneficiário renunciaria aos seus direitos sobre o garante.

Noutra óptica, o silêncio sobre o prazo faria do contrato de garantia um contrato de duração indeterminada.

Consequentemente, ao banco caberia um direito de denúncia, implícito na generalidade dos contratos de duração indeterminada, em virtude de ao Direito

(27)

desagradar a perpetuidade das obrigações (…). A denúncia, pelo banco, do contrato de garantia marcaria o momento a partir do qual a solicitação do beneficiário poderia ser desatendida.

Por nosso lado, ao banco aproveitam, para efeitos de desvinculação, duas situações (o cumprimento da obrigação principal, invocável logo que o banco possua “prova líquida” ou equivalente (…); a prescrição da garantia.

O garante não tem um direito de denúncia, tal como não tem o fiador no caso de obrigação principal sem termo.”[3]

No Parecer dos Professores Almeida Costa e Pinto Monteiro sobre “Garantias Bancárias”, publicado na CJ, Ano XI-1986, Tomo V, págs. 15 a 34, afirma-se - “O garante só pode recusar-se a pagar a garantia, logo que solicitada, se possuir provas inequívocas de abuso evidente ou de fraude manifesta do beneficiário”.

O não exercício do direito pelo beneficiário em relação ao garante não exercido na vigência do contrato de garantia e do incumprimento evidenciados durante o período por que vigorou o contrato-base, não evidenciando por parte de beneficiário abuso evidente e manifesta fraude para lesar o garante, não exonera este do pagamento da garantia.

Ao findar, importa dizer que nos autos de Insolvência que correram termos pelo Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, sob nº319/08.2 TYVNG – 3° Juízo –, foi declarada, por sentença de 30.10.2008, com trânsito em julgado em 5.1.2009 (certidão permanente a fls. 244 a 247), a insolvência de “BB Unipessoal Lda.” – ut. certidão de fls. 178 a 190 – razão pela qual, nem sequer tendo intervindo na acção, a Massa Insolvente daquela Sociedade não pode a sociedade extinta ser condenada nos termos em que o foi na 1ª Instância (solidariamente com a Ré CC).

(28)

Decisão.

Nestes termos, concede-se a revista, revogando-se o Acórdão recorrido, ficando a valer, apenas quanto à recorrida CC, S.A., o sentenciado na 1ª Instância, ou seja, a condenação desta Ré a pagar à Autora a quantia de € 94.000,00, acrescida dos juros vencidos, desde a data da citação até integral pagamento, às sucessivas taxas de juro vigentes para as obrigações comerciais.

Custas pela recorrida.

Supremo Tribunal de Justiça, 20 de Março de 2012.

Fonseca Ramos (Relator) Salazar Casanova

Fernandes do Vale

---[1] Relator – Fonseca Ramos. Ex.mos Adjuntos:

Conselheiro Salazar Casanova. Conselheiro Fernandes do Vale.

[2] Cfr. Jorge Duarte Pinheiro, “Garantia Bancária Autónoma”, in, Revista da Ordem dos Advogados, ano 52, 1992, pág. 450,nota 96.

[3] Em nota de rodapé acrescenta – “Não tendo a obrigação principal um termo, é permitido ao fiador, se houverem decorrido cinco anos, exigir a sua liberação ou a prestação de caução para garantia do seu direito eventual contra o devedor (art. 648.º alínea e), do Código Civil). A posição do fiador é acautelada no plano das relações com o devedor principal. Solução análoga valerá para

a garantia autónoma. Nada se estabelecendo sobre a duração do contrato de

(29)

(substituição ou reforço) de caução destinada a assegurar a obrigação de reembolso ou que, p.e., diligencie no sentido do beneficiário acordar na extinção da garantia (acordo que, previsivelmente, o beneficiário fará depender da oferta, pelo dador da ordem, de adequadas contrapartidas. v. g., depósito de valores no montante da garantia)”. (destaque nosso)

Referências

Documentos relacionados

(trinta e cinco milímetros) de.. comprimento em cada segmento da cor branca do retrorrefletor, incorporada na construção da película, não podendo ser impressa superficialmente. 10

Solução. João vai à praia se, e somente se, Marcelo joga basquete.. Negação de “Ou… Ou…” é “se, e

Quando especificado pela Enel Distribuição Rio, o retificador deve ser provido de unidade retificadora totalmente redundante de mesma capacidade da principal, em

O pleno exercício de direitos políticos por seus titulares (eleitores, candidatos e partidos) é assegurado pela Constituição por meio de um sis- tema de normas que conformam o que

ESTABELECIMENTO DE COMIDAS CHARMING GOURMET CAFÉ (Rua de Seng Tou). 14 鮨味亭日本料理美食 ESTABELECIMENTO DE COMIDAS CHI

Premir o botão PROGRAM, depois aparecerá no ecrã o MENU PROGRAMAR, agora pode usar a tecla numérica para inserir directamente os números do títulos, capítulos ou faixas e

Tra- balhou, gastou sola de sapato, bateu de porta em porta e, mais uma vez, deu como cumprida a meta que lhe foi designada: a de levar a Universal novamente para a Câ-

O modelo Booleano baseia-se na combinação de vários mapas binários, em cada posição x,y para produzir um mapa final, no qual a classe 1 indica áreas que