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Nomadismo feminino no campo religioso pentecostal

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

NOMADISMO FEMININO NO CAMPO RELIGIOSO PENTECOSTAL

Kelen Ribeiro Betim

São Paulo

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KELEN RIBEIRO BETIM

NOMADISMO FEMININO NO CAMPO RELIGIOSO PENTECOSTAL

Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito

para obtenção do título de Mestre em Ciências da Religião. .

Orientador: Dr. Edson Pereira Lopes.

São Paulo

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KELEN RIBEIRO BETIM

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA

EST

NOMADISMO FEMININO NO CAMPO RELIGIOSO

PENTECOSTAL

Dissertação apresentada à Universidade

Presbiteriana Mackenzie, como requisito para obtenção do título de mestre em Ciências da Religião. .

Aprovada em ___/___/___

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

Prof. Dr. Edson Pereira Lopes

Universidade Presbiteriana Mackenzie ( Orientador )

____________________________________________

Prof. Dr. João Baptista Borges Pereira

Universidade Presbiteriana Mackenzie

_______________________________________

Profa. Dra. Patrícia Pazinato

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Ao Deus que me criou e a Jesus Cristo que me salvou. Ao Espírito Santo que distribui os dos sem

diferenciação para que todas as pessoas tenham igual valor e possam receber e contribuir na vivência

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Agradecimentos

Primeiro ao Deus Trino sustentador da minha vida, que me faz caminhar sempre....

Ao meu esposo Riva que amo tanto o qual vivenciou cada etapa deste Mestrado, minha companhia incentivadora, paciente e sempre presente.

Aos meus filhos Renato, Camila e Victor pela paciência e carinho.

Ao meu Pai Orlando ( in memória ) e minha mãe Cida que investiu toda sua vida em mim, me sustentando e me educando para que chegasse até aqui.

Ao meu Pastor Celso Pereira da Silva, que me sustentou através da oração, do carinho e respeito por mim.

Ao meu Orientador Dr. Edson Pereira Lopes, pela paciência, pelo ensinamento, por estender sua mão amiga numa fase de crise financeira, ao qual me fez voltar a sorrir podendo concluir o sonho de se formar em Mestre das Ciências da Religião.

Ao Dr. Máspoli de Araújo Gomes, que me incentivou a fazer este curso, e por estender sua mão amiga também, concedendo-me uma bolsa de estudo.

Ao Prof. Dr. João Baptista Borges Pereira, que sempre com um sorriso no rosto me aconselhou, por várias vezes.

Aos meus colegas do Mestrado por termos aprendido juntos.

Aos professores por contribuírem com a minha formação.

As pastoras que entrevistei, grata sou a todas vocês.

A todos da Biblioteca e Secretaria Sr. Geraldo e Dagmar que vivenciaram todo este processo comigo.

A Universidade Presbiteriana Mackenzie por proporcionar-me a oportunidade de estudar em uma das mais conceituada Universidade teológica do País.

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Resumo

BETIM, Kelen R. Nomadismo Feminino no Campo Religioso Pentecostal.Dissertação de Mestrado, Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo, 2011.

O trabalho tem como objetivo discutir o nomadismo feminino no campo religioso Pentecostal, o pastorado feminino no pentecostalismo evangélico. A função das mulheres enquanto agente de liderança na esfera religiosa permite a discussão sobre a possibilidade do universo religioso como um espaço de alterações significativas no que se refere a uma diminuição das diferenças entre os gêneros da atualidade. A participação da mulher como agente de liderança das igrejas pentecostais, bem como à autonomia é interpretada como uma nova opção para as mulheres além do espaço doméstico, entretanto, pretendemos esclarecer a existência e ocorrência de estabelecimento de limitações impostas e inseridas na hierarquia de poder feminino dessas denominações religiosas, verificando se são frutos de uma estrutura hierarquizante pensada não na perspectiva do universo feminino, mas a partir do universo masculino.

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BETIM, Kelen R.. Nomadic Pentecostal Women in the Religious. Master's thesis, São Bernardo do Campo, Mackenzie Presbyterian University of São Paulo, 2011.

Abstract

This paper aims to discuss the role of the female pastor in Evangelical Pentecostalism. The role of women as agents of leadership in the religious sphere allows for the discussion of the possibility of the religious universe as a place of significant change in relation to a narrowing of differences between the sexes today. Women’s participation as leaders in the Pentecostal church as well as the autonomy of women in church leadership is interpreted as a new option for women beyond the domestic sphere. This paper intends to clarify the existence and occurrence of limitations on these establishments that are inserted into the hierarchy of female power in Pentecostal denominations, and to discuss if these limitations are being derived from the thought perspective of men or women.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO………09

Capítulo I. TRÂNSITO RELIGIOSO………..14

Capítulo II. GÊNERO E RELIGIÃO………38

Capítulo III. MULHER E AUTONOMIA...58

Considerações Finais...83

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação é fruto da análise realizada acerca da participação de lideranças femininas nas igrejas pentecostais, localizadas em vários municípios do Estado de São Paulo e municípios do Estado do Rio de Janeiro. Foi observado como essas mulheres estão inseridas no contexto histórico e em que situações inscrevem-se no âmbito familiar e social e especificamente no campo religioso ao qual pertencem.

Almejamos identificar os fatores que levaram tais mulheres a se tornarem lideranças religiosas; observar o trânsito religioso, e as relações de poder existentes nessas instituições e seus reflexos na vida familiar e social, uma vez que consideramos que o exercício ideológico tem seu início por meio dessas, e, finalmente, buscamos compreender como o processo está sendo vivenciado por elas e sua repercussão na vida pública e privada.

Logo, o presente estudo tem como problemática identificar a participação das mulheres enquanto lideranças nessas igrejas pentecostais, as conseqüentes transformações na vida familiar e social, bem como o seu o papel e grau de participação exercidos por tais mulheres nas tomadas de decisões e iniciativas nas igrejas em que atuam e congregam.

O fato de restringir a pesquisa a um grupo de mulheres que exercem funções de liderança, no caso, as pastoras evangélicas, apóia-se em várias razões: a condição específica da mulher na sociedade, no universo religioso, e, particularmente, no evangélico; ao fato de estarem vinculadas a executar trabalhos específicos de interesse da instituição ( igreja ) em que atuam; e a necessidade de perceber, compreender, por meio do fato social religioso, as relações entre os sexos e as condições que permitem que se estabeleça uma nova maneira de atuação da mulher nas instituições religiosas.

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Visando ao disciplinamento do pensamento e das ações para obtermos maior eficiência no que desejamos alcançar, adotamos para o estudo sobre aspectos da religião e a atuação da mulher nesse campo – liderança feminina pentecostal – a abordagem teórica sustentada em três eixos fundamentais: trânsito religioso, gênero e autonomia.

Uma questão subjacente a principal seria analisar se o fato de a mulher atualmente pode exercer o ministério pastoral no pentecostalismo evangélico contribui para mudar as representações tradicionais e patriarcais da imagem feminina na sociedade.

Para melhor perceber o significado da participação feminina na liderança de igrejas pentecostais evangélicas buscamos responder a seguinte indagação: o fato de mulheres poderem exercer a função de pastoras em algumas denominações religiosas pentecostais evangélicas permite alterações significativas no que se refere a uma diminuição das diferenças entre gêneros na atualidade?

Com base nesse aspecto surgiu a curiosidade de saber como e de que forma as atividades exercidas nas instituições religiosas influenciaram na forma de agir, na vida doméstica, no trabalho das mulheres pastoras e nas relações de gênero. Dessa forma, é necessária uma análise entre os discursos das mulheres pastoras e os discursos da doutrina religiosa na qual depositam suas crenças.

Desenvolvemos a hipótese de que sendo a religião uma esfera que se constitui na produção e reprodução das estruturas estruturantes da sociedade, de acordo com Bourdieu, o fato do exercício de mulheres pastoras em igrejas pentecostais evangélicas as coloca em posição de reprodutoras de representações e ações que revelam uma cultura de gênero desigual, binária e sexista.

Entretanto ocorre uma mudança na conduta conjugal, no caso de marido e mulher aderirem a uma mesma religião, diminuindo a possibilidade de conflitos familiares (MACHADO, 1996, p. 17 ), mas não podemos desconsiderar que ainda permanecem características da desigualdade de gênero, pautadas no machismo e patriarcalismo.

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divisão de papéis na família fortalecendo a posição da mulher e atenuando o comportamento aventureiro dos homens. ( MACHADO, 1996, p. 88 ).

Essa notória valorização, ao fim da assimetria dos papéis masculinos e femininos, de certa forma, é revestida de uma nova roupagem: o homem contrai sua dubiedade da moral sexual, associada ao masculino, e a mulher retrocede à submissão.

A ideologia pentecostal, mesmo quando combate e ajuda a romper alguns aspectos relacionados ao comportamento masculino, legitima as desigualdades de gênero, reforçando a autoridade dos homens no âmbito privado e na comunidade religiosa.

Nesse sentido, buscamos saber, por meio dos resultados de nossa pesquisa, se evidenciaríamos também a existência de paradoxos e tensões nas representações encontradas no campo de estudo que pudessem em determinadas situações, apontar para relações de gênero mais igualitárias e que pudessem, por vezes, tender a se manifestar de forma a reforçar uma hierarquia de gênero.

Para desenvolver essa investigação, com o objetivo de analisar a participação de lideranças femininas das igrejas pentecostais, e se o pastorado feminino contribui para a diminuição das desigualdades sociais entre os gêneros, realizamos uma pesquisa empírica que nos possibilitou constatar in loco a realidade do que propomos apresentar, ancorada no método de pesquisa qualitativa.

As denominações religiosas da amostragem foram escolhidas em virtude do seu reconhecimento como igrejas que aboliram a exclusividade masculina nas posições mais significativas de sua hierarquia, legitimando a possibilidade de alterações na estrutura do poder patriarcalista e dominante da sociedade atual.

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Para a seleção das pastoras, consideramos a função e /ou cargo inscritos e legitimados social e religiosamente, o percurso dessa mulher e a situação específica em que se encontra inserida. Para tanto, optamos pela técnica de entrevistas semi-estruturada, por deixar falar livremente as entrevistadas e possibilitar que o sujeito da ação seja agente do ato de narrar sua trajetória religiosa.

Para a operacionalização da pesquisa adotamos como procedimentos metodológicos, em primeiro lugar, a identificação das igrejas que possuem mulheres em seus cargos de liderança, ou seja, o exercício pastoral feminino.

Optamos por solicitar e agendar encontros para as entrevistas com hora marcada, em virtude de respeitar a disponibilidade dos sujeitos pesquisados e evitar possíveis interrupções e alteração das falas que pudessem ser provocadas pela presença de outros sujeitos.

Em concomitância à pesquisa de campo, fundamentamos nossas afirmações na experiência de vários teóricos clássicos e contemporâneos, a exemplo de Machado, Birman, entre outros que discorreram sobre os tema em questão na análise de documentos oficiais das igrejas pentecostais, em pesquisas, tais como dissertações, e outras publicações pertinentes ao tema.

Discutimos o fenômeno religioso inspirado no referencial teórico weberiano de denominação religiosa, associada a uma empresa e à questão da dominação. No intuito de dar maior amplitude à pesquisa, outros teóricos que também lidam com o assunto são discutidos, uma vez que é no debate de diferentes teorias que se consegue analisar com mais afinco os fenômenos sociais.

Logo, ao investigarmos o pastorado feminino, é indispensável a abordagem de campo religioso inspirado em Bourdieu, ou seja, um campo de disputas entre religiosos no qual as pastoras legitimam um capital religioso que almeja a consolidação de um espaço que por muito tempo lhe foi negado.

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conformidade, ou não, e se a esfera religiosa seria responsável por reproduzir as orientações determinadas pela estrutura dominante vigente no universo feminino.

A segunda parte aborda, uma discussão sobre a constituição do conceito de gênero e suas alterações conceituais e teóricas ao longo do tempo. Subseqüente apresentou uma caracterização e contextualização do campo empírico.

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Capítulo I – Trânsito religioso.

O trânsito religioso, visto como um fenômeno dentro do campo religioso brasileiro tem gerado um novo cenário e no que diz respeito à religião no Brasil. Esta afluência de pessoas é transparente no espaço religioso contemporâneo é nosso interesse entendê-lo melhor. Quão eminência que vive a sociedade brasileira beneficiando mudanças, vivendo uma inquietação religiosa é de vital acuidade quando se leva em conta que estão desgostosos no espaço sócio-religioso em que vivem, procurando novas possibilidades em outros lugares. A diversidade religiosa do Brasil exige levar em consideração a mudança decisiva do peso específico do catolicismo1 na sociedade. Embora a sociedade brasileira permaneça predominantemente católica, umas variedades de outros grupos religiosos tiveram expressivo crescimento nas últimas décadas. O êxodo progressivo e acelerado do catolicismo para o protestantismo2.

Uma espécie de vazio religioso refletindo em gêneros confusos, eles estão presentes em nosso dia a dia. A religião é um recurso na busca de bens simbólicos, Pierucci relata:“ a religião supre aquilo que o mundo profano não dá “. E a religião se repõe como conjunto de símbolos capazes não somente de redefinir o mundo, mas sobre tudo de transferir a eficácia da religião do exterior da pluralidade religiosa para o interior do próprio eu converso (...). A medicina oficial não é capaz de apagar o efeito terapêutico dessas religiões. ( Pieucci, 1996, p. 17 ).

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1- Catolicismo:A principal religião do Brasil, desde o século XVI, tem sido o catolicismo romano. Ela foi introduzida por missionários que acompanharam os exploradores e colonizadores portugueses nas terras do país recém-descoberto. O Brasil é considerado o maior país do mundo em número de católicos nominais, com 73,8% da população brasileira declarando-se católica, de acordo com o Censo do

IBGE de 2000. Porém, sua hegemonia deve ser relativizada devido ao grande sincretismo religioso existente no país.

2 – Protestantismo: têm sua origem no começo do século XVI, quando um monge alemão chamado Martinho Lutero se insurgiu contra Roma. No ano de 1517, revoltado com a venda de indulgências pelo papa, Lutero escreveu suas famosas 95 teses, que pregou na porta da catedral de Wittenberg. Foi o estopim da Reforma Protestante, que se tornaria uma das mais profundas transformações sócias da história humana.

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sociais que atingem as religiões provocando mudanças e rupturas. Estas mudanças ocorrem com o aumento significativo das alternativas religiosas em especial, entre os protestantes pentecostais3 e neopentecostais4, onde a fragmentação institucional é intrínseca à sua visão expansionista (BITUN, 2007, p. 98). A ênfase do movimento pentecostal está no dom da glossolalia5 “falar em línguas estranhas desconhecidas”. O movimento iniciado por Charles Fox Parham6.

Percebemos que os novos movimentos religiosos surgem a partir de um forte sentimento de necessidade de mudança. As religiões estabelecidas e as formas de vivências até então dominantes não satisfazem, provocando ruptura e dissidências. ( GUERRIERO, 2006, p.74 ).

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3 –Pentecostalismo: A expressão “pentecostalismo” procede do vocábulo grego pentekosté que significa qüinquagésimo. O Pentecostes era a segunda das três principais festais judaicas (Lv.23) e recebe esse no por ser comemorado cinqüenta dias após a Páscoa ( Lv.23:16). Era também conhecido como a Festa das Semanas, Festa das Primícias e Festa da Colheita ( Ex. 34:22 ). Foi durante o Pentecostes que os quase 120 que oravam no cenáculo receberam o batismo com o Espírito Santo ( At.1.3; 2.1-13). FILHO, Fernando Bortoleto. SOUZA, José Carlos e KILPP, Nelson.São Paulo.ASTE. 2008, p. 776.

4- Neopentecostalismo: é uma vertente do evangelicalismo que congrega denominações oriundas do pentecostalismo. FILHO, Fernando Bortoleto. SOUZA, José Carlos e KILPP, Nelson.São Paulo.ASTE. 2008, p. 706.

5 – Glossolália. Dom sobrenatural concedido pelo Espírito Santo, que capacita o crente a fazer enunciados proféticos em línguas desconhecidas. O objetivo da glossolalia é enunciar sobrenatural e extraordinariamente o crente a consolar-se no espírito, e a proclamar, com o auxílio do dom da interpretação, o conhecimento e a vontade de Deus à igreja ( 1 Co 14 ). ( ANDRADE, Claudionor Corrêa. Dicionário Teológico. 6.ed. Rio de Janeiro. CPAD, 1998, p. 167 ).

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Os fatores explicativos do crescimento dessas denominações pentecostais evangélicas no Brasil devem-se ao fato de se dirigirem às camadas empobrecidas da sociedade e à substituição do catolicismo devocional aos santos como mediadores à divindade, por uma religiosidade que anseia e vivencia dentro de si a presença do Espírito Santo. O catolicismo funciona como uma espécie de doador universal, a fonte de onde os demais segmentos recrutariam boa parte de seus fiéis; esses migram, preferencialmente para o “pentecostalismo”, e em segundo lugar, para os grupos dos “sem religião“. (COELHO, 2009, p.12). Analisar o avanço pentecostal numa proposição que diz respeito à modernidade, esta ampliação do universo religioso acontece devido à importância que a dimensão simbólico-religiosa tem para as camadas menos favorecidas da sociedade. Devido às instituições tradicionais distanciarem-se da visão de mundo dessas camadas, emergem novas formas de expressão de religiosidade que preenchem as lacunas de sentido geradas pela modernidade. O rolo compressor pentecostal tem passado por cima das fileiras de todos os movimentos cristãos tradicionais. Dá-se uma crescente subjetivação7 da religião e uma radicalização da pluralidade religiosa. Esta tende a transcender a dimensão institucional, conformando-se, sobretudo como consciência individual.

Talvez uma das coisas mais chocantes a respeito

da religião hoje em dia esta facilidade qualquer um pode mudar de uma religião

sem que o mundo caia ( ... ) no fundo, está mais muito interessado em defender

nenhum status quo religioso ( ...) ira à religião à procura de socorro mágico-religioso

no Brasil prática comum ( Prandi, 1996, p. 67).

O trânsito religioso é o indicador de que os modelos oficiais de religião têm sido substituídos, ou coexistem com referência “religiosos cambiantes“, respondendo a demanda dos sujeitos da fé encontra no andejo religioso sua atitude mais coerente. O zanzar das pessoas na religião e lá vão elas pra lá e pra cá.

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Estamos diante de um quadro que se move em torno da busca de auto-aperfeiçoamento e da auto-realização, em constantes experimentações, que incorpora caminhos próprios tanto para a dimensão espiritual, quanto para a psíquica, a corporal, a intuitiva, tratando caracterizar-se como uma busca holística. Imbricamento de terapêutica e de espiritualidade, onde a verdade última é construída e orquestrada pelo próprio sujeito, experimentador por excelência. Com o advento a modernidade as relações religiosas também sofreram mudanças. O que antes era considerado ponto de apoio e referência, agora é descentrado e um novo paradigma se revela na relação homem/Deus surge o mundo secularizado. A crença em Deus não desapareceu, mas

conforme acentua Figueiredo, Deus se distanciou e colocou-se sobre o mundo. (FIGUEIREDO, 2004, p.24).

A valorização da interioridade humana permite o surgimento da individualidade na manifestação de suas crenças. Nesse sentido a fé como um encontro pessoal com o sagrado, não só permite como instaura um jeito particular de ser, uma maneira própria de existir no mundo. Com as liberdades religiosas, surge um novo modo de existir do religioso uma nova subjetividade religiosa, solta, livre, das instituições e desprovida de padrões pré- estabelecidos. A religiosidade passa a ser vivida na interioridade do sujeito A noção de sujeito torna-se uma noção bastante ampla. É ao mesmo tempo, evidente e não-evidente. Em um mundo onde todos são convocados ao igual, pela via da padronização, do mercado como padrão de referência, ser sujeito e autor de sua história, e não expectador torna-se um desafio a ser encarado diariamente. Por isso, a noção de sujeito diz respeito àquele que escolhe e, conscientemente, se responsabiliza por suas escolhas. Considerada a partir da compreensão da religião, ela propicia o surgimento da subjetividade, uma vez que possibilitam também o contato com a subjetividade absoluta, nas suas mais, diferentes formas.

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(1997, p.17). Já para Parker, “a sincretização de crenças e suas rearticulações em formas diversas parece ser o modo como a religião se apresenta na pós-modernidade” (Parker, 1997, p.16). Estas transformações no modo de ver, sentir e viver a religiosidade demarca uma nova forma do existir religioso do homem moderno. A subjetividade se dá numa relação dialógica entre o secularismo e o sincretismo religioso. O homem/mulher religioso se torna plural, assim como sua subjetividade – sua maneira de ser e de encarar o mundo que se dá a partir de si mesmo.

A experiência da crise permite que o ser humano se constitua de forma individual e se volte para o transcendente, na busca e na expectativa de encontrar repouso e segurança para sua alma. O discurso religioso, frente ao mundo contemporâneo, impõe uma abertura que visa atender a uma necessidade de satisfação individual e não a formação de convicção teológica. O homem/mulher moderno não é afeito às complexidades filosóficas e teológicas, vive no mundo das superficialidades. Diante desse quadro, em que as grandes confissões se adaptam ao discurso “light’ ou “soft”, reforçando o sincretismo, a linguagem das emoções e dos afetos, não é de se estranhar, que o “fiel” perceba “cada vez menos os limites simbólicos entre os diferentes, e às vezes antagônicos, sistemas religiosos” (PACE, 1997, p.38).

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transformações substanciais no comportamento religioso, afetado por esta nova forma de lidar com o sagrado e as com a existência no cotidiano.

A compreensão da contemporaneidade como uma sociedade estruturada e ambientada pela religiosidade pode ser percebida na multiplicidade de formas de crenças. Multiplicam-se os credos e as igrejas. O espírito da ciência não pode barrar o anseio pelo transcendente, pelo sobrenatural. Dessa forma, podemos entender que esse período demarca uma nova maneira de ser e de estar no mundo – um mundo novo, que se faz no cotidiano da existência, trazendo a marca da crise em todas as suas dimensões. Este tempo, embora tão secularizado, dá lugar ao misticismo, sendo a experiência mística muitas vezes descrita como um retorno à origem, como sentimento de união, senso de totalidade, de saída de si, de reintegração do mundo em torno de um centro, já que o centro antropológico, instituído na modernidade, não conseguiu manter-se como eixo fundante neste novo momento. Busca-se, então, uma vida purificada ou renovada, um sentimento de satisfação e de alegria. Neste tempo de tantas possibilidades, o ser humano entra em contato com o Mais, com o Mistério, com o Todo, com o Abrangente, o Uno, numa tentativa de se encontrar e dar sentido à sua existência.

A crise pós-moderna é demarcada a partir da consciência de que a ciência não foi capaz de explicar e resolver todas as inquietações da humanidade. O homem/mulher se depara com seu próprio limite. Atinge o topo do “saber científico” em meio a tantas conquistas tecnológicas e, ao mesmo tempo, sente-se incapaz de responder a suas inquietações existenciais. A modernidade, com seu cientificismo8, levaram a humanidade a uma situação de falta de referências, a um vazio moral, embora tenha materialmente quase tudo. Diante de tanta prosperidade tecnológica, solidifica a cultura do TER, enfraquecendo a compreensão do SER. Mediante essa supervalorização da posse, dos bens materiais em vez do humano, instaura-se a crise, uma crise ontológica9, mística e existencial.

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8- Cientificismo Doutrina filosófica que considera definitivos os conhecimentos científicos. Filosofia que nega a importância dos problemas que estão fora do alcance da investigação científica. ( FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Língua Portuguesa.Rio de Janeiro. Nova Fronteira.2001.p.153.

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O homem está perdido em meio a tanta superficialidade. A cultura do prazer

imediato e a qualquer preço, como algo que pode ser encontrado na próxima prateleira, leva a humanidade ao aprofundamento dessa crise.

A violência, o desmantelamento das instituições – produtoras de sentido e o enfraquecimento dos valores humanos são provas cabais deste fenômeno. O materialismo leva a uma inversão dos valores. O sujeito é medido, instaura-se a cultura da aparência. O importante é parecer que tem algo. As pessoas querem impressionar quem não conhece, comprando aquilo de que não precisam, com o dinheiro que não possuem. O choque que essa dupla forma de estar causa no ser humano contribui, de forma profunda e significativa, para realçar o fato de que o homem vive uma falsidade, uma aparência – ele é e não é ao mesmo tempo. Essa incongruência do existir humano gera a crise e aprofunda mais e mais a distância entre o real e o imaginário. Viver na ilusão, contudo, conhecendo a realidade, massifica as distâncias e acelera as doenças. Em contrapartida, a cultura do prazer a qualquer custo se torna o novo código, isso “significa a morte dos ideais, a ausência de sentido e a busca de uma série de sensações cada vez mais novas e excitantes”, (ROJAS, 1996, p.14).

Tal situação é tremendamente explorada pelo mercado, que vende as mais diversas formas de prazer, possibilitando, assim, uma nova característica desse tempo – a permissividade. Tudo é permitido, desde que o fim seja alcançado – o prazer a todo custo. Como o prazer é algo que não pode ser satisfeito, uma vez que o fator gerador é o desejo, e o homem é um ser desejoso, sempre haverá uma nova busca, um novo “ideal” a ser perseguido. E assim caminha a humanidade, buscando no próximo “porto” algo que lhe atenda e a satisfaça. A ética deste tempo é uma ética permissiva, o que gera o relativismo sem medida.

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“vendem” a felicidade como um produto que o dinheiro pode comprar. Contudo, a descartabilidade mercadológica, faz com que o adquirido ontem perca o seu sentido, o seu significado hoje, gerando este círculo vicioso. Ante a esse estado de coisas, a humanidade encontra-se frente à triste realidade de que as aquisições materiais não satisfazem plenamente a existência humana. Convive com o fato de que há tantos que nada possuem. A desigualdade social reforça o sentimento de crise e a angústia humana frente a tais fatos.

Outro aspecto é que, como tudo depende única e exclusivamente do próprio homem, ele se vê diante de si mesmo, sozinho. E, desamparado, precisa construir seu caminho à busca da “sua” solução. Traçar o seu próprio caminho, construir sua própria história, escrever o enredo de sua própria vida, lança o ser humano diante de si mesmo, levando-o a se deparar com essa questão existencial. Um ser humano hedonista, permissivo, consumista e centrado no relativismo, tem pela frente um prognóstico ruim. Padece de uma espécie de ‘melancolia’ new look: instrumento de experiências apáticas. Vive na condição de objeto, manipulado, dirigido e tiranizado por estímulos deslumbrantes, mas que não gratificam, não o faz mais feliz. Sua paisagem interior está coberta por uma mistura de frieza impassível, de neutralidade, sem compromisso e, ao mesmo tempo, de curiosidade e tolerância ilimitada (ROJAS, 1966, p.21).

Essa condição humana traz, por si só, a crise. Mostra seu estado de perdição. A frieza impassível de que fala o autor citado torna-o mais e mais vulnerável. A humanidade, sem fundamento, sem rumo e sem direção, encontra-se vazia de religiosidade, nas suas mais diversas formas de expressão, se constitui num alento, numa luz no fim do túnel que tem sido agarrada com força e esperança. Na sociedade contemporânea, as instituições tradicionais, produtoras de sentido, têm se deparado com a precariedade do engajamento das pessoas com o seu sistema de crenças. Se por um lado, elas exigem do sujeito de fé um compromisso permanente, este tem feito suas próprias escolhas transitando por diversas expressões religiosas e apropriando-se de significantes específicos de acordo com a especificidade de suas necessidades. Em meio às muitas ofertas dos bens simbólicos, aumenta a mobilidade religiosa e sem vínculos permanentes.

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incertezas. Apesar de todo progresso e desenvolvimento científico e tecnológico – o qual, se supunha, conduziria o ser humano a um nível de conhecimento tal, possibilitando a afirmação e confirmação de seu posicionamento no mundo, o que se constata é justamente o contrário. Embora tenha crescido o conhecimento, não foi suficiente para dar a segurança que a humanidade tanto buscava. A insegurança humana se verifica em vários setores da vida e, em especial, no que tange às questões existenciais. No campo religioso, o terreno se torna profícuo. Assim como em outras áreas da existência humana, em que se verifica essa instabilidade, a religiosidade humana, fundamentação de crenças fixas, revela-se nômade e circula de um lado para o outro sem nenhum constrangimento. A religiosidade na contemporaneidade não se fixa em um credo, mas circula entre eles, justamente por lhe faltar a convicção e a certeza para ser defendida. Ocorre aqui o que salienta Prandi, “a religião passa a ser sem fronteira e sem território, sem, contudo ser universal ou única” (PRANDI, 1997, p.12). Esse fenômeno da chamada globalização permite uma maior circulação inter- religiosa, reforçando a falta de certezas e de convicções, comum aos credos religiosos. Esse novo paradigma religioso – o das incertezas – reflete o que se constata nesse tempo. O tempo vivido não se configura pela defesa dos grandes exacerbada nessa transição de século caracterizada pelas idéias. A única certeza é a da mudança, da transitoriedade. As grandes redes de significado se perderam e o sentido, agora, fica a cargo do sujeito. (PRANDI, 1997, p.21). Tal fato constitui a fragmentação da sociedade que, embora global, se perde no individualismo, criando o grande paradoxo desse tempo a destruição das perdas no individualismo, a destruição do inverso, o isolamento das pessoas, que se acentua cada vez mais, adota novos dogmas, práticas e doutrinas ambiente de hibridizações, mesmo sendo incongruente com outros sistemas simbólicos de fé.

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A insatisfação com alguma coisa particular, seja pessoal ou mesmo em nível de doutrina, faz o devoto buscar uma nova adesão, somando em sua biografia mais uma passagem por uma religião diferente. Entre os novos movimentos religiosos há uma rotatividade muito grande dos pertences. (GUERRIERO, 2006, p. 78).

Nota-se uma intensa circulação de pessoas diferentes espaços religiosos. Esses movimentos são perceptíveis a partir da análise de pesquisas demográficas oficiais, que visam atender o campo religioso nacional. A partir da década de 1980, este fenômeno começou a fazer-se notado no êxodo progressivo e cada vez mais acelerado do Catolicismo Romano para o Protestantismo, de missão ou pentecostal. Com a perda da hegemonia da Igreja Católica e o surgimento de novas denominações, houve um favorecimento à mobilidade dos fiéis. “A modernidade trouxe uma diminuição gradativa de força ao “compromisso religioso dos indivíduos como qualquer sorte de definição ou credo”, levando os “indivíduos“ a ligações cada vez mais passageiras” reduzindo a religião a um item de consumo (CAMURÇA, 2003, p. 59).

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Modernidade, desencantamento, reencantamento e secularização são conceitos que identificam uma mesma discussão no campo religioso brasileiro. Neste intercambio de opiniões a questão é a tentativa de compreender as variações da religião na contemporaneidade e a forma em que ela tem se inscrito na história; ainda mais, a maneira como ela modifica a realidade, forja comportamentos e instaura identidades no seio da sociedade brasileira. Tais interações são formadas por um hibridismo de concepções religiosas que no cotidiano reverberam em tensões e articulações de grupos religiosos; arranjos sociais, culturais e políticos além de adaptações e ganhos entre instituições religiosas aumentando assim o trânsito religioso.

O pensamento pós-moderno esvaziou a religião formal. Na Pós-Modernidade, a religião deixou a dimensão pública e restringiu-se à esfera privada. Na tentativa de se libertar de uma cultura religiosa com padrões morais absolutos, o indivíduo pós-moderno criou uma religiosidade interiorizada, subjetiva e sem culpa. As pessoas querem optar pela sua “preferência” religiosa sem ser importunadas por opiniões contrárias. Os critérios que orientam essas escolhas são todos íntimos e subjetivos. Semelhantemente, também não tentarão impor sua nova opção de fé a ninguém. Na Igreja, o que antes era convicção, hoje é opção. Os mandamentos divinos passaram a ser sugestões divinas. A igreja é orientada por aquilo que dá certo e não por aquilo que é certo. O pragmatismo missionário e o “novo poder” da igreja (político, econômico, tecnológico, etc) esvaziou o significado da oração e seu espaço na tarefa da igreja. Confiamos mais em nossos recursos e menos em Deus, superestimamos o poder de César e subestimamos o poder de Deus. As ferramentas ideológicas e tecnológicas tornaram-se mais eficientes que a comunidade e a comunhão.

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contraste, a diversidade de produtos e serviços religiosos tende a ser mais limitada, na medida em que uma única religião tem menor capacidade de diversificar sua oferta de bens de salvação sem comprometer sua mensagem e seus propósitos – para atender, satisfatória e concomitantemente à heterogeneidade dos interesses e preferências religiosos dos mais distintos grupos sociais de uma sociedade complexa e pluralista.

A forma plural de disseminação do que é tido como religioso como o conseqüente aumento da oferta de opções religiosas,

sua diversificação interna e a crescente demanda por ofertas,

configurando o que vem sendo chamado trânsito religioso resulta na autonomização do indivíduo, agora um “errante”

religioso, liberto das amarras da cultura religiosa tradicional. A conquista da liberdade religiosa funciona como garantia e

alternativa a qualquer mega encantamento, tradicionalismo e

fundamentalismo e como conduto para uma condição no limite laica, atitude socialmente legitimada. Ou seja, a liberdade de opção por uma religião em detrimento de outra enseja a liberdade de opção por nenhuma religião.

(PIERUCCI, 1997, p.257).

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A sociedade está em grande fervescência, com mudanças sociais

através de migrações internas e externas, é muito difícil uma instituição conseguir manter dogmaticamente os seus sistemas de sentido. Assim ocorre que estas pessoas que estão sujeitas a essas mudanças tremendas e rápidas destroem o sistema de sentido que

elas gradativamente vão conseguindo formar. É necessário um sistema religioso que seja, claro e sem segundo lugar, assimilável e mutável rápido. (MENDONÇA, 1994, p. 48).

Sociologicamente se fala de pentecostalismo como da "religião dos pobres". Com isso alude-se não só às pessoas que o iniciaram, mas também ao fato de que entre os pobres a fé cristã costuma ser entendida e vivida de maneira diferente da das classes acomodadas. Os pobres não possuem livros, e mesmo que os tivessem não disporiam de tempo e de preparação para estudá-los. Isso leva a uma religião que dá pouca importância ao fator intelectual e muita ao emocional, aos sentimentos. Os conceitos só são aceitos quando confirmados, convalidados e legitimados pelos valores da própria cultura. Se tais considerações estão corretas, em um continente em que a pobreza não cessa de crescer, as razões para o crescimento de tais movimentos e organizações religiosas parecem ser evidentes. Mas seria só o empobrecimento cada vez maior do continente o elemento chave para entendermos o crescimento da denominação pentecostal? Ainda, somente os pobres afastam-se de elaborações intelectuais em favor da percepção do mundo a partir das emoções? Essas inquietações nos conduzem a Max Weber, para quem a rotinização do carisma e a apropriação dos poderes que dela decorre, pode se constituir em fator explicativo para tal crescimento. Do outro lado indaga-se: o que aconteceu com os ideais religiosos dos segmentos médios da população? Os grupos que estão para além da faixa da pobreza tendiam a serem religiosamente orientados por determinações racionais, menos afeitos ao emocionalismo e mais aptos à reflexão. O que mudou nos horizontes culturais de um número considerável de membros desses grupos sociais que se deslocam aos recintos pentecostais a fim de consumir bens mágicos e encontrar no misticismo religioso subsídios para satisfação de demandas existenciais?

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dramas e temores do cotidiano nas ilhas de tranqüilidade em face de uma mar de turbulências, riscos e hostilidades. São trincheiras de segurança onde o risco vai ser disciplinado para lidar com as incertezas e aliviar a impotência do cotidiano. Templos içados como abrigo sagrado santificados que tem a tarefa de purificar e proporcionar alento, fermento da felicidade.

Nas favelas não há disputa com as igrejas tradicionais. O trânsito se dá onde a pessoa aumenta mais um pertence ligada com outra igreja, seriam os visitantes semanais, interessados em campanhas e ofertas que vão aparecendo com o intuito de aliviar ou solucionar os problemas cotidianos. Onde estariam as igrejas tradicionais? Seria a classe pobre desprovida de bens financeiros desprezadas pelas igrejas tradicionais? Seria possível pensar que as igrejas tradicionais estariam apenas preocupadas com as elites? O que seria das favelas sem a presença do pentecostalismo? A compreensão é de que as mudanças operadas no campo religioso e a conseqüente entrada e estabelecimento em nossa sociedade do mercado religioso promove um fenômeno de transito individual. A religião pentecostal possui duas qualidades: Em primeiro lugar, apresenta uma visão do mundo bastante clara, dividido entre o bem e o mal. Toda prática pentecostalista se resume na possibilidade de termos um instrumento de manejo e de gerenciamento desta realidade de um lado o bem, expresso por Deus, para o qual todas as coisas tendem, e de outro, o mal, expresso pelo demônio, cujo conceito fundamental é o pecado (MENDONÇA, 1994, p.49).

As Igrejas Históricas passam a ser com salas de aula: assépticas, monótonas e estrangeiristas. Há, portanto, necessidade de um elemento que vá romper esse tipo de identidade. Surge então o pentecostalismo que vai ser um questionamento às igrejas históricas. Sua presença causa impacto e passa a ser criticado, por vezes de forma superficial pelos cientistas da religião. Creio que, ao invés de nos preocuparmos tanto como os porquês dos métodos e das formas do pentecostalismo, deveríamos tentar entender porque ele tem grande significado para grande parte da população brasileira. A questão está aí, mas constantemente trabalhamos de forma inversa. Porque o Pentecostalismo encontra tanto significado na sociedade hoje? O que possibilita que sua proposta e seu sentido de vida sejam aceitos e recebido pela grande massa pobre da

sociedade brasileira, atingindo atualmente certos setores da classe média. Essa massa pobre introduz uma série de elementos novos no campo religioso e vai

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da igreja protestante histórica e colocar o pandeiro, o tambor e outros instrumentos de percussão. Rompe aquela ordem de culto semelhante a uma aula bem dada de um belo professor e dá lugar á emoção com a expansividade de um “Aleluia” ou do “Glória a Jesus”! (RAMALHO, 1994, p.51).

O pentecostalismo pode ser divido em três ondas. Na primeira onda, estão a Congregação Cristã do Brasil (1910) e a Assembléia de Deus (1911). A Segunda onda, a partir dos anos (1950), inclui a Igreja do Evangelho Quadrangular (1953). O Brasil para Cristo (1955), Deus é Amor (1962), Casa da Benção e outros de menor expressão. A terceira onda começa na segunda metade da década de (1970) e inclui a Igreja Universal do Reino de Deus (1980) a Cristo Vive (1986) Comunidade da Graça (1979), a Renascer em Cristo (1986), a Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, a

Comunidade Crista Paz e Vida (1996) e a Igreja do Avivamento Contínuo (2002). (ROMEIRO, p.50). E as igrejas não param de surgir, em (1993) a Igreja Bola de Neve,

em (1998) a Igreja Mundial do Poder de Deus. A Assembléia de Deus e a Congregação Cristã do Brasil reinaram absolutas por mais de quarenta anos no pentecostalismo brasileiro sem se preocupar com a concorrência. Até os anos 1950, os pentecostais não chamavam muita atenção. Entretanto, sua extraordinária expansão, a crescente visibilidade nos meios de comunicação e seu envolvimento com a política fizeram do movimento objeto freqüente de estudo dos pesquisadores da religião.

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As pessoas com o propósito de superar precárias condições de existência organizar a vida, encontrar sentido, alento e esperança diante de situação tão desesperadora, os estratos mais pobres, mais sofridos, mais escuros e menos escolarizados da população, isto é, os mais marginalizados -

distantes do catolicismo oficial, alheios a sindicatos, desconfiados de partidos e abandonados à própria sorte pelos poderes públicos, têm optado voluntária e preferencialmente

pelas igrejas pentecostais. (MARIANO 2010, p.12).

O Censo de 2000, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmou o significativo crescimento dos pentecostais no país nas últimas décadas. De acordo como os dados levantados, o número de evangélicos no Brasil chegou a 26 milhões de adeptos. Em 1991, os pentecostais e neopentecostais eram 8,1 milhões. Em 2000, esse número subiu para 17,6 milhões, assim distribuídos: Assembléia de Deus com 8,4 milhões, Congregação Cristã no Brasil com 2,4 milhões, Igreja Universal do Reino de Deus com 2,1 milhões, outras igrejas pentecostais com 1,8 milhão; Igreja do Evangelho Quadrangular com 1,3 milhão, Igreja Pentecostal Deus é Amor com 774,8 mil e o Brasil para Cristo com um milhão de membros (ROMEIRO, 2005 pp.34,35). Devido esse crescimento avassalador das igrejas pentecostais a igreja católica com a intenção de aplacar a perde de seus fiéis imita as igrejas pentecostais surgindo então o movimento carismático ou originalmente com Renovação Carismática Católica10 ( RCC ).

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Abordar o fenômeno religioso na pós-modernidade é tocar numa questão complexa e que se reveste de maior complexidade à medida que enfocamos os aspectos mais subjetivos dessa nova religiosidade. Diante da enorme diversidade verificada no fenômeno religioso atual, e das constantes transformações ocorridas em seu interior, uma vez que promove troca constante de idéias, ritos, símbolos e doutrinas, levadas de um lado para outro pela mídia, o que torna quase impossível atualmente se dizer com segurança quais elementos pertencem originariamente ou não a determinados grupos religiosos. O que temos como marca desse fenômeno são a diversidade, a heterogeneidade e a metamorfose. Além do misticismo, do hibridismo religioso e do pragmatismo “as coisas valem enquanto funcionam”. Esses novos movimentos religiosos são marcados por uma significativa autonomia religiosa dos nômades, que circulam entre os grupos, constroem em boa media, por conta própria, sua religiosidade, numa espécie de bricolagem “arranjo pessoal do religioso ou espiritualidade errante, religiões difusas, modelo holístico individual, coexistência de paradigmas” e por um crescente processo de destradicionalização da religião e de desistitucionalização da identidade religiosa. (SIQUEIRA, 1999, p.2 )

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moderno realizar-se-ia pela transformação das crenças em mercadorias a serem consumidas pelos adeptos que, volúveis, escolheriam os produtos segundo suas necessidades imediatas (ALMEIDA, 2001, p.98). Ainda assim, podemos destacar algumas marcas dessa manifestação religiosa, enfocando obviamente a religiosidade expressa no catolicismo popular e a que se manifesta no contexto protestante. Mais do que nunca, se verifica uma grande confusão nas crenças religiosas especialmente aquelas de matriz protestantes; vivemos em uma verdadeira babel religiosa. Encontramos atualmente, dentro das crenças e das práticas protestantes elementos oriundos do espiritismo, da magia, das religiões afro, da teosofia, da valorização dos sonhos; o uso de fórmulas mágicas, palavras que funcionam no estilo abracadabra, dentre outros, e o mesmo se verifica na direção contrária, idéias do catolicismo e do protestantismo também estão impregnadas na religiosidade desses grupos. Na verdade, já não se pode falar daquilo que sejam sinais distintivos de determinada manifestação religiosa. Vivemos atualmente um tempo de antropomorfização do sagrado “Deus concebido em termos humanos” e da divinização do humano “o culto voltado para agradar o homem”. É o fim da religião e o começo da pós-religiosidade, “para cunhar mais um termo novo“. Nesse contexto prevalece à privatização do divino, qualquer pessoa cria a qualquer momento uma nova religião, uma nova crença, forjada com retalhos de crenças outras, oriundas de diversas matrizes. Temos poucas opções para esse tempo: abandonar a religião ou nos preparar para viver esse novo tempo numa perspectiva a-religiosa.

A profunda nostalgia do homem religioso é habitar um mundo divino, ter casa semelhante à casa dos deuses, tal qual foi representada mais tarde nos templos e santuários. Em suma, essa nostalgia

religiosa exprime o desejo de viver num cosmos puro e santo, tal como era no começo quando saiu das mão do Criador. (Eliade, 1992, p. 61).

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exterior provocando mudanças significativas na visibilidade relativa dos vários movimentos. Apesar da religiosidade no plural lembrar primeiramente descentramento, superficialidade e inconsistência, há uma dimensão religiosa que me parece muito viva na nossa sociedade e que aponta para um caminho. “O desencantamento do mundo: a eliminação da magia como meio de salvação”. (WEBER, 2004, p. 106). O termo desencantamento do mundo tem dois sentidos. O primeiro é o sentido religioso de desencantar o mundo através da religião. O novo modelo religioso determina a maneira de viver das pessoas reformulando a sua visão e principalmente postura em relação ao mundo. O segundo sentido diz a respeito da ciência que não consegue dar sentindo ao todo do mundo e sim a cada parte de maneira causal, portanto tira o sentido do mundo como um todo, enveredando em explicações que apresentam causas e fenômenos que ocorrem. O desencantamento do mundo como eticização religiosa em seu ponto máximo. É possível afirmar que o protestantismo ascético conseguiu ali uma rejeição religiosa do mundo com uma ascese intra-mundana regida pela ética protestante amparada no deve ser, obedecendo aos desígnios de Deus através da profecia, palavra. Isso se traduz uma vida racional e santificada ao mesmo tempo. O cristianismo é o próprio Cristo. Dar testemunho significa trazer a público de forma apropriada algo experimentado e que não pode ser negligenciado. (COSTA, 2010, pp. 76,77).

A busca simbólica é que dá sentindo ao constante crescimento desse labirinto. São chamados para nelas participarem de modo individual segundo a natureza do seu problema e a importância dela para finalidades estratégicas (FAUSTO, 2004, p. 166). A religião, para muitos hoje se não para a maioria, não é mais herdada e, por isso mesmo, mais facilmente descartada, mas algo a ser buscado, a ser conquistado. Somos evangélicos, moldados por uma argamassa meio católica, meio espírita e pouco ou nada reformados. (NICODEMOS, 2008, p. 21).

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caminhos a descobrir, experiência que ele mesmo vai experimentar conforme vai percorrendo o novo caminho. O sagrado é apreendido como algo que salta para fora das rotinas normais do dia-a-dia, com algo de extraordinário e potencialmente perigosos, embora seus perigos possam ser domesticados e a sua fúria aproveitada para as necessidades cotidianas (BERGER, 1985, p.39). Deixam a segurança das igrejas, onde muitas vezes passaram parte da sua vida, segurança pelo duvidoso, rompe laços de lealdade com famílias, líderes, amigos e se entregam no mundo religioso e misterioso, onde as regras herdadas são substituídas pela liberdade de escolha e a vontade de descobrir e experimentar particularmente novos universos, concedendo assim novo sentido do sagrado. A herança religiosa fica raquítica e não se podem suprir as necessidades no novo vagante. Está cada vez mais freqüente o número de pessoas que ficam no “vai-e-vem” de religiões. A própria Divindade e o seu culto seriam relativos, dependentes da crença ou descrença, da devoção ou indiferença do homem e da mulher. Aqui está a causa final dos inúmeros grupos religiosos; sua diversidade se acentua pelo relativismo, pelo qual se repartem se multiplicam. A religiosidade está em toda parte: religiões “a Lá Carte“, religiosidade “flutuante”, crenças “relativas”, novas elaborações sincréticas: a religiosidade “vagante” (LÉGER ,2008, pg. 25).

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bom ou religiosamente verdadeiro: depende dos singulares, das culturas, das escolhas que cada um faz ou, como se diz, de suas perspectivas da vida.

O pensamento comum de hoje é, portanto, relativista, a sua filosofia é o relativismo ético e o relativismo religioso, ou seja, o bem e a verdade são, nestes âmbitos, relativos às escolhas pessoais e não podem pretender nada de absoluto. Por exemplo: casar-se na Igreja, casar-se no civil, conviver de fato, convívio entre homossexuais são apenas escolhas, nem mais nem menos verdadeira umas que outras. Também as religiões são todas iguais: ser cristão, budista ou muçulmano ou mesmo crer na yoga ou zen é no fundo o mesmo, sempre se trata de escolhas pessoais de salvação, ou ainda misturando um pouco de cada uma delas que são os múltiplos pertences. O crente moderno não se contenta mais em escolher sua fé, ele quer escolher ao mesmo tempo, sua comunidade ao menos que se sente a necessidade de pertencer a alguma. ( LÉGER, 2008, p.176 ).

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âmbito privado. A laicidade não deve associar-se a nenhuma escolha ética ou religiosa – irracionais ou subjetivas, portanto, deve transformar todos os desejos em direitos.

A distinção entre desejo e direito é que o primeiro é escolha subjetiva enquanto o segundo é reconhecida uma razoabilidade objetiva. Mas assim como a laicidade relativista não aceita mais a possibilidade de encontrar uma racionalidade objetiva nas escolhas morais ou religiosas, e se mantém neutra e indiferente a todas, deve reduzir-se a aceitar como lei todos os desejos transformando-os assim em direitos: ao filho a qualquer custo, a matar o feto, a ser pai sem ser homem e a ser feminino sem ser mulher, de ter um filho próprio sem pari-lo, a se tornar mulher por se sentir como tal, mesmo sendo homem ou vice-e-versa e assim por diante. É esta a ditadura do relativismo. Hoje quem se refere às verdades absolutas é considerado não confiável do ponto de vista da laicidade e, por fim, perigoso à democracia. Quem hoje disser que o homossexualismo é uma desordem é acusado de intolerância. O relativismo é hoje um dogma que se ensina de todos os modos e que se coloca de modo intolerante.

Quando penetra na consciência das comunidades cristãs, o relativismo religioso produz a impossibilidade da missão, impede a apologia, ou seja, a defesa e justificação o “dar razões“ da própria fé e separa a caridade da verdade, não dando mais condições para se perceber que propor a verdade é um grande ato de caridade. Na raiz dessas duas formas de relativismo, porém, está o relativismo filosófico, ou seja, a idéia de que não é possível encontrar uma verdade com a razão humana fora do âmbito científico. No âmbito da religião a capacidade do indivíduo para elaborar seu próprio universo de normas e de valores a partir de sua experiência esforços regulares das instituições. (LÉGER, 2008. p. 63).

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11- O laicismo é uma doutrina filosófica que defende e promove a separação do Estado das igrejas e comunidades religiosas, assim como a neutralidade do Estado em matéria religiosa. Os valores primaciais do laicismo são a liberdade de consciência, a igualdade entre cidadãos em matéria religiosa, e a origem humana e democraticamente estabelecida das leis do Estado.

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O campo religioso brasileiro não foge a esse contexto de descompromisso religioso explicitado no trânsito contínuo de fiéis que se movimentam em busca de significado, não tem raízes, não há prestação de contas com a igreja, não há compromisso entre o fiel e igreja, eles entram e saem sem ser percebido. Temos que "decidir para que lado virar e que destino seguir" ( BAUMAN, 2003, p.118). A cada instante em uma dada religião como em uma dada sociedade, se produzem correntes sociais determinadas, que marcam a queda ou nascimento de uma idéia ou de uma prática. Em suma a religião como todos os fenômenos sociais é um constante devir o número de suas segmentações ou procriações frustradas ou viáveis, é normalmente infinito. Para tais setores a religião

é muitas vezes o explicador “mais usual e, muitas vezes, o mais acreditado”. ( BRANDÃO, 1986, pp.16,17). Em meio a esses fiéis nem tão fiéis, a significativa

movimentação do mundo feminino nos chamou atenção, e o fato de quase todos os grupos religiosos serem formados por uma população com participação grande feminina, nos levou a uma pergunta pelo nível do compromisso das mulheres com as instituições religiosas das quais participam.

A visível atuação das mulheres nas mais diversas expressões religiosas nos sugere um forte vínculo com as mesmas. A ativa presença feminina tem garantido a longevidade dos grupos que freqüentam apesar de normalmente ocuparem posições de menos prestígios, talvez aí repouse a contradição. Se por um lado, as mulheres são a maioria e são os sujeitos mais ativos no grupo religioso, por outro, em termos proporcionais, são as que possuem menos acesso a posições de poder institucional (SOUZA, 2005, p.23). Isso pode sugerir que, paradoxalmente, as mulheres são as mais ativas em suas instituições, mas estão mais sujeitas ao trânsito religioso por não terem um compromisso formal com essas mesmas instituições. A menor presença de mulheres em situações de poder religioso institucional parece facilitar seu trânsito, devido a não estarem necessariamente comprometidas com um cargo eclesiástico tradicional específico. Até mesmo no âmbito das instituições religiosas a mulher ocupa um lugar marginal no círculo decisório e das relações de poder. Por não possuírem cargo de liderança nas comunidades que freqüentam, tal fato viabiliza o trânsito. Não precisando atuar como sujeito exemplar, pois em últimas instâncias quem representa a instituição,

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CAPÍTULO II

GÊNERO E RELIGIÃO.

Gênero e religiosidade são temas amplamente discutidos no âmbito das ciências humanas. Contudo, o fato da mulher poder exercer a liderança religiosa em algumas denominações evangélicas pentecostais faz emergir a necessidade de discussão e interpretação sobre esse fenômeno que ainda se constitui em algumas igrejas e gera debates nas que não adotaram essa prática. Ao historiarmos a categoria de gênero, verificamos alterações como o conceito surgiu e como atualmente é discutido e aplicado. Essas transformações no conceito de gênero se refletem em uma maior compreensão dos objetos de estudo, já que á abolida a visão de se analisar exclusiva e isoladamente o universo feminino. Somadas a essas tentativas de explicação do fenômeno, temos recente mudanças no campo, impulsionada pelo chamado universo relacional. Esses estudos privilegiam os efeitos das relações desiguais de gênero na sociedade, desprivilegiando as origens e causas e introduzindo o aspecto relacional.

O gênero passa a ser concebido como categoria de análise para se compreender as construções sociais e culturais estabelecidas que afetem as concepções de masculino e feminino visualizadas em conjunto. É adotada a postura teórica de se estudar o masculino e o feminino em uma visão pluralista e relacional. No século XX, berço da construção do feminino moderno, os estudos de Beauvoir ( 1949 ), Friedan ( 1963 ), Millet ( 1970 ) e outras alimentam o surgimento da terminologia patriarcado para discutir a construção de relações mais igualitárias entre mulheres e homens.

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homens e mulheres. Diversas temáticas, tais que feminismo, identidade, subjetividade, poder, dominação, violência, corpo, sexualidade, honra e religiosidade permite-nos, por meio da reflexão da categoria gênero, identificar porque as mulheres ainda são privadas de espaços de liderança institucional, de espaços de tomada de decisão e de formação teórica. No final da década de 1980, os estudos sobre mulheres perdem lugar e são paulatinamente substituídos pelos estudos voltados para a categoria de gênero, como é o caso de Franchetto ( 1981 ), Flax ( 1991 ), Scott ( 1990 ) Rosaldo ( 1994 ), Butler ( 2003 ) e outros.

Seguindo a teorização de Scott, verificamos que considera o gênero uma categoria empírica de pensamento e uma relação social que visa a desconstruir a universalização das dicotomias, binarismo, diferenças biológicas, etc. Pensar em gênero é pensar no relacional, em relações sociais que unem e separam masculino e feminino dentro de um contexto.

Desconstruir é atribuir flexibilidade à categoria de gênero, uma vez que o sexo é uma categoria imutável, mas o gênero se mostra capaz de oportunizar uma reflexão para a diversidade. Também são focadas nas diferenças culturais. A autora questiona as identidades globais e privilegiam as múltiplas identidades, as construções locais como prática performativa. Defende a necessidade de se historicizar o sexo e a natureza. Para ela, as diferenças biológicas são localizadas na natureza e pensadas como dado objetivo inquestionável. O sexo é considerado fator pré-cultural. Se olharmos apenas para as categorias universais de análise (natureza, cultura, gênero), caímos em uma esfera a - histórica sem significados culturalmente relativos.

No pensamento de Rosaldo defende a necessidade de se reconceitualizar as perspectivas tradicionais como a universalização da opressão feminina para diminuição das diferenças. Segundo a autora, as feministas tradicionais pensaram gênero de forma equivocada, derivado da fisiologia sexual e reprodutiva.

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bastião da civilização tal qual a conhecemos. “Um dos poucos titãs que remanescem no final do milênio.”

Ao contrário,

[...] sugere considerar os papéis das mulheres e dos homens como produto da ação humana em sociedades históricas e concretas. O gênero é importante para a organização de todas as formas institucionais humanas e,

reciprocamente, de todos os fatos sociais, para a compreensão do gênero. (ROSALDO, 1994, p. 17).

Nesse sentido, gênero deve ser pensado enquanto categoria de análise das diversas masculinidades e feminilidades. A autora enfoca que as mulheres exercem mais poder na esfera privada, só que essa é menos reconhecida culturalmente que a esfera pública, de domínio masculino. Não se deve pensar gênero apenas em termos funcionais, mas considerar questões sociológicas como desigualdade e poder.

[...] parece-me agora que o lugar da mulher na vida social

humana não é, diretamente, o produto daquilo que ela faz e (menos ainda da função do que, biologicamente, ela é) mas

sim do sentido que suas atividades adquirem através da interação social concreta...Gênero, em todos os grupos humanos, deve então ser entendido em termos políticos e sociais com referência não a limitações biológicas, mas sim as formas locais e específicas de relações sociais e

particularmente de desigualdade social. (ROSALDO, 1994, p.22).

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[...] o termo indivíduo engloba dois planos conceituais distintos: um como representante da espécie humana, realidade empírica por excelência e, portanto, presente em qualquer sociedade: o segundo como categoria, valor que

constrói a representação mesma dessa espécie humana, pensada no individualismo como anterior ao social [...] A

partir daí concebe-se dois tipos de sociedade, as de tipo hierárquico, ou tradicionais, onde a totalidade social prevalece sobre os indivíduos na acepção empírica, e as sociedades tipo moderno, onde a representação da totalidade se enfraqueceu concomitante com o

aparecimento da categoria como agente normativo das instituições. (FRANCHETTO, 1981, p. 36).

O individualismo, nome que esse sistema moderno toma pelo deslocamento da representação de totalidade para o indivíduo, agencia uma contínua fragmentação do todo social em domínios crescentemente autônomos. Demonstrar ter ressalvas sobre a visão de Dumont de individualismo e valoração das totalidades hierarquizada, uma vez que põem em risco a instituição familiar nuclear, devido ao fato do individualismo enfraquecê-la por meio do processo de autonomização da sexualidade (revolução ou liberação sexual), (FRANCHETTO, 1981, p. 36). Destaca ainda, que a causa feminista não se restringe à reivindicação da autonomia da sexualidade feminina, mas trata-se de uma combinação de luta política e substantivização da cidadania das mulheres. As contribuições teóricas dos diversos autores acima citados se correspondem no aspecto de desprivilegiar a busca de causas gerais e universais de opressão feminina. Contemplam uma explicação que articule sentido, sujeito individual e relações sociais e culturais.

Toda cultura utiliza os meios que encontra a sua disposição para obter dos indivíduos de ambos os sexos o comportamento mais adequado aos valores que lhe interessam conservar e transmitir. O elemento determinante da identificação sexual é a educação para considerar-se homem ou mulher. Mas, para compreendermos o papel designado à mulher na sociedade, é preciso levar em conta, além da questão cultural, a questão religiosa. A concepção de Geertz, sobre o indivíduo e o religioso refere-se a uma crítica a teoria do individualismo radical de Wiliam James e seu estudo The

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originalmente publicado em 1902, defende que “a religião parecia estar ficando cada vez mais subjetivada; parecia, pela própria natureza, estar-se enfraquecendo como força social, para uma questão inteiramente ligada aos afetos do coração”.

De acordo com Geertz, essa postura de James é um reflexo dos secularistas, para ambos “a religião parecia estar gravitando para seu lugar apropriado, longe da articulação das preocupações temporais”. (GEERTZ, 2001, p. 151). Este lugar seria a esfera privada, subjetivada e inflexivelmente particular. O local da religião não seria o público, o social e o cotidiano. O autor opõe-se firmemente a essa postura. A religião é força social e dificilmente privada e demarcada em um campo chamado “experiência”. “É preciso empregar termos mais firmes, mais decididos, mais transpessoais, mais extrovertidos – “Sentido”, digamos, ou “Identidade”, ou “Poder” – para captar as tonalidades da devoção em nossa época. (Geertz, 2001, p. 152).

Assim, associar a religião simplesmente à experiência não é suficiente para captar as multiplicidades de acontecimentos que vêm ocorrendo com os fiéis de hoje. A “experiência” individual do homem com o divino não é apropriada para definir a religião. O conceito de “sentido”, juntamente como de “identidade” e o de “poder”, cumpre mais apropriadamente tal função, do ponto de vista geertiziano. Geertz recupera o conceito de “sentido” das concepções teóricas weberianas. O objeto de investigação de Weber era a ação social, a conduta humana dotada de sentido, isto é, de uma justificativa subjetivamente elaborada. Compreender a ação humana para Weber é captar seu sentido subjetivo.

É o indivíduo que, por meio dos valores sociais e de sua motivação, produz o sentido da ação social. Por mais individual que seja o sentido da minha ação, o fato de agir levando em consideração o outro dá um caráter social a toda a ação humana. Assim, a ação social é uma ação com sentido e motivações dos indivíduos.

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