R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 7 (2 ):7 9 -8 1 , a b r-ju n , 1 9 9 4 .
E ST U D O D O S N EU RÔ NIO S D O PLEX O C AR DÍA CO N A
IN FEC Ç Ã O A G U D A PELO TRYPANOSOMA CRVZ1 EM RATO S
ALBINOS
E d m u n d o C h ap ad eiro, P au lo Sérgio S . B era ld o , P au lo C esar J esu s, P a trícia D ia s F ernan d es e L u iz F ern an d o Ju n q u eira Jú n ior
O e stu d o h is to ló g ic o d o p le x o n erv o so a u ton ôm ico d o c o r a ç ã o d e r a to s a lb in o s, na f a s e a g u d a d a in fe cç ã o p e l o Trypanosom a cruzi, m o stro u ga n g lio n ite, p e r ig a n g lio n ite e n eu rite d e in te n sid a d e s v a riá ve is . E n tre ta n to , a co n ta g em d o s n eu rôn ios d o s g â n g lio s n ã o re ve lo u re d u ç ã o (d en erv a çã o ) sig n ifica tiva d o s m esm os.
P a la v ra s-c h a v es: Infecç ão ch a g á sica a g u d a experim ental. D e n e rv a ç ã o ca rd ía ca . C on tagem neu ron al.
Na tentativa de correlacionar a denervação parassimpática com a disfunção autonômica cardíaca do rato, cronicamente infectado pelo Trypanosoma cruzi (T. cruzi), não se observou destruição significativa dos neurônios do plexo cardíaco2. Este achado sugere que na infecção chagásica aguda do modelo em estudo não ocorreria denervação do coração como admite Alcântara (1961)1.
A finalidade deste trabalho é a de analisar o comportamento do citado plexo, através da análise histológica e da contagem dos neurônios dos gânglios cardíacos do rato na fase aguda da infecção pelo T. cruzi.
MATERIAL E MÉTODOS
Consta de cinco ratos albinos Wistar, infectados intraperitonealmente com 2.000 a 6.000 formas sanguícolas das cepas Y e São Felipe (12SF) do T. cruzi e de cinco ratos, não infectados, nas mesmas condições, que serviram de controle.
Os animais infectados e os controles foram sacrificados entre o 21° e 30° dias do experimento (fase aguda).
Cortes histológicos do coração, de 7^m de espessura, foram obtidos e montados segundo a
Laboratório Cardiovascular da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, Brasília, DF e Curso de Pós- graduação em Patologia Humana da Faculdade de Medicina do Triângulo M ineiro, Uberaba, MG.
Endereço para correspondência: Prof. Edmundo Chapadeiro. Curso de Pós-graduação em Patologia Hum ana/FM TM . Av. Getúlio Guaritá 130, 38025-440 Uberaba, M G, Brasil. Recebido para publicação em 21/12/93.
técnica do trabalho anterior2 e corados pela hematoxilina-eosina (HE) para análise microscópica e contagem dos neurônios. A contagem destes, incluiu neurônios íntegros e aqueles com sinais degenerativos; neurônios com sinais de morte não foram computados.
Para comparação estatística entre os valores obtidos foi aplicado o teste não paramétrico de K ruskall-W allis, adotando-se, para fins de conclusão, o nível de significância p = 0,05.
RESULTADOS
A análise histológica dos corações dos animais infectados revelou cardite aguda multifocal ou difusa, atingindo simultaneamente o epicárdio, endocárdio emiocárdio, comparasitismo variável. Os gânglios e filetes nervosos do plexo cardíaco, situados principalmente na parede dos átrios eram também atingidos pelo mesmo processo inflam atório, caracterizado por infiltrado de mononucleares e raros granulócitos. Alguns neurônios apresentavam fenômenos degenerativos (vacuolização, retração, hipo e hipercromasia citoplasmática) e atrofia de intensidade variáveis; sinais de necrose e substituição por células satélites (satelitose) eram escassos; entretanto, a maioria dos neurônios parecia normal (Figuras 1 e 2).
O resultado da contagem do número total dos neurônios (íntegros e degenerados), do coração dos animais infectados e dos controles, encontra-se na Tabela 1. A análise estatística não mostrou diferença significativa entre o número de neurônios nos dois grupos (p = 0,437274).
C h a p a d e ir o E , B e r a ld o P SS, J e s u s P C , F e rn a n d e s P D , J u n q u eir a J ú n io r LF. E stu d o d o s n e u rô n io s d o p le x o c a r d ía c o n a in fe c ç ã o a g u d a p e lo Try pano som a cruzi em ra to s a lb in o s. R e v is to d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T r o p ic a l 2 7 :7 9 -8 1 , a b r-ju n , 1 9 94 .
T a b ela 1 - C o n ta ge m d o s n eu rô nio s in tr a c a rd ía co s d e ra to s infe ctado s p e l a s c e p a s Y e S ão F e lip e (12SF) e d e co n tr o les.
Ratos chagásicos Ratos controles
protocolo ganglionite n ° neurônios protocolo ganglion ite n ° neurônios
Y 7 D V 2 .4 6 + + + 1962 N 1 E T 3 .2 0 0 2258
Y 7D E T 2.4 1 + + 4030 N 2D P E A 3 .2 2 0 3 4 4 4
Y 7 E T 2 .1 5 + + 3696 N 2 D T 3 .2 4 0 2418
S F 6 D T E A 1.29 + + + 3301 N 2E V 3 .1 8 0 5350
S F 6E P 1.3 2 + + + 2163 N 2D E V 3 .2 9 0 4 9 0 9
M édia 3248 3 6 7 6
P = 0 ,4 3 7 2 7 4
DISCUSSÃO
Embora as lesões do sistema nervoso autônomo cardíaco (ganglionite, periganglionite e neurite) fossem intensas nos animais infectados pelo T. c r u z i , não houve destruição (denervação) significativa dos neurônios dos gânglios. A escassa destruição neuronal na fase aguda, da infecção do rato albino, explica porque tal fenômeno não foi ■ constatado na fase crônica2 7.
A diferença éntre nossos achados e os de Alcântara1 parece depender da metodologia empregada: no trabalho desse autor foram com putados, separadam ente, “neurônios aparentemente normais” e “neurônios lesados (degenerados e n ecro sad o s)” , enquanto computámos, simultaneamente, neurônios normais e neurônios com sinais degenerativos, mas não necrosados. A presença de neurônios com sinais de degeneração não significa perda neuronal e da função do coração, visto que, como se sabe, células 80
degeneradas são capazes de manter suas funções normais (p. ex., os hepatóci tos na esteatose hepática); ressalte-se que na cardite chagásica do camundongo6, neurônios degenerados ou com sinais de necrose, podem coexistir ao lado de neurônios hipertróficos e, portanto, capazes de compensar o déficit da função. De fato, na fase aguda deste mesmo modelo, o átrio do coração não mostrou hipersensibilidade do tipo pós-denervação à acetilcolina exógena8. A diferença dos achados poderia ainda ser explicada pelo não tratamento estatístico dos dados de Alcântara1.
C h a p a d e ir o E, B e r a ld o P S S , J e s u s P C , F e rn a n d e s P D , J u n q u e ir a J ú n io r L F . E s tu d o d o s n e u rô n io s d o p le x o c a r d ía c o n a in fe c ç ã o a g u d a p e l o T ry p a n o so m a cr u z i em r a to s a lb in o s. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T r o p ic a l 2 7 :7 9 -8 1 , a b r-ju n , 1 9 9 4 .
SUMMARY
M ic ro sc o p ic in ve stig a tio n o f p a ra sy m p a th e tic h e a rt n erv o u s p le x u s o f th e a lb in o r a t in th e a cu te p h a s e o f T ry p a n o so n a cru zi in fe c tio n s h o w e d g a n g lio n itis , p e r ig a n g lio n itis a n d n eu ritis o f v a ria b le d e g r e e ; d e s p ite the d e g e n e ra tiv e ch a n g es, n o sig n ific a n t re d u ctio n o f g a n g lio n n eu ro n s w a s o b s e r v e d , w h en c o m p a re d w ith co n tro ls.
K e y -w o r d s : E x p e rim e n ta l a cu te c h a g a sic infection. C a rd ia c d en erva tio n . N eu ro n a l count.
AGRADECIMENTOS
A Alessandra Scoda, Luzia Helena Gonçalves dos Santos e Valéria Ramos, pelo valioso auxílio prestado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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