CARCINOMA BILATERAL DO PLEXO CORÓIDE OPERADO
COM SUCESSO
GILBERTO M . DE A L M E I D A * ; CHARLES P. T I L B E R Y * * ; LUIZ G . GAGLIARDI-FERREIRA**
Os tumores do plexo coróide ( T P C ) são usualmente classificados em -carcinomas e papilomas, de acordo com o seu aspecto histológico; entretanto,
sabe-se que o prognóstico relaciona-se mais com o aspecto infiltrativo do que com as características de malignidade celular 2
> ,6 > 8
. Para Monteiro e Lopes 8 os carcinomas devem ser considerados como carcinomas papilíferos pré-inva-sivos.
A incidência de T P C é de aproximadamente 0,5% entre todos os tumores intracranianos *. 7
>1 0
mas, em crianças, atinge a 3,9% 7
. Em adultos os T P C são mais freqüentes no quarto ventrículo; em crianças são mais encontrados •
e m um dos ventrículos laterais, raramente em ambos.
Ray e Pech (1956) 9
relataram o caso de criança com hidrocéfalo por aumento da produção do líquido cefalorraqueano ( L C R ) , causado por papi-loma bilateral nos ventrículos laterais; após três tentativas frustadas de •
drenage m do L C R (para o ureter e peritônio) foram feitas duas craniotomias; a criança faleceu em choque, durante o transcurso da segunda craniotomia, após retirada do tumor; na necropsia não foram encontrados restos tumo-rais. Matson e Crofton (1960) 7
, em ampla revisão sobre T P C , encontraram 6 casos bilaterais; na casuística destes autores, entretanto, não há referência a tumores bilaterais. Baar e Galindo (1964) 3
apresentaram um caso no qual os papilomas dos dois ventrículos laterais foram encontrados mediante necropsia. Entre os 6 doentes de Teng e Papatheodorou (1966) 1 1
, um fa-leceu 6 meses após a intervenção cirúrgica devido à existência de tumor se-melhante no lado oposto.
Justifica-se a publicação deste trabalho pelo fato de não termos encon-trado, na literatura que esteve a nosso alcance, caso de carcinoma bilateral do plexo coróide operado com sucesso.
O B S E R V A Ç Ã O
N . P . S . , 11 anos, sexo masculino, branco, brasileiro, e x a m i n a d o no d i a 1 d e n o v e m b r o de 1969. O paciente q u e i x a v a - s e de cefaléias periódicas h á dois a n o s . N a s últimas s e m a n a s tornou-se confuso e a d ô r de cabeça intensificou-se. O e x a m e mostrou sonolência e p a p i l e d e m a b i l a t e r a l . Radiografias do crânio: disjunção d e s u t u r a s . Eletrencefalograma (EEG) n o r m a l . Angiografia pela artéria carótida
direita ( f i g . 1 ) : v i s u a l i z a ç ã o de a m b a s as a r t é r i a s cerebrais posteriores; sinais de d i l a
-t a ç ã o ven-tricular, principalmen-te do corno -t e m p o r a l ; a r -t é r i a c e r e b r a l an-terior des-v i a d a p a r a a e s q u e r d a e des-vasos sildes-vianos estirados e eledes-vados; n a r e g i ã o atrial, á r e a de c i r c u l a ç ã o p a t o l ó g i c a i r r i g a d a pelas a r t é r i a s coroidéias a n t e r i o r e posterior, m a i s evidente n a fase venosa; suspeita d a existência de o u t r o t u m o r no lado esquerdo, e m a l g u m a s chapas e m incidência antero-posterior. Angiografia cerebral pela artéria
respec-tivos tumores. Angiografia cerebral via carótida esquerda ( f i g . 3 ) : m e l h o r visibi-lização do tumor do lado esquerdo, a a r t é r i a coroidéia anterior contribui n a sua c i r c u l a ç ã o .
Intervenção cirúrgica — A m p l a craniotomia paríeto-occipital direita em
9-11--1969. M e d i a n t e incisão cortical foi exposto g r a n d e t u m o r no ventrículo l a t e r a l . N a impossibilidade de m o b i l i z a r a neoplasia p a r a c l i p a r o pedículo, o t u m o r foi r e t i r a d o por a s p i r a ç ã o . N o pós-operatório a criança ficou torporosa, mas sem sinal de l o c a l i z a ç ã o . A p ó s curto período de m e l h o r a o paciente voltou a piorar, p r o v a -v e l m e n t e pelo desiquilíbrio p r o -v o c a d o p e l a presença de t u m o r no lado oposto. A neoplasia do ventrículo esquerdo foi a s p i r a d a em u m a segunda craniotomia, r e a l i -z a d a em 3 de d e -z e m b r o . A p ó s o segundo ato cirúrgico o doente recuperou a cons-ciência p r o g r e s s i v a m e n t e . N o fim de dois meses a p r e s e n t a v a - s e apenas com déficit p a r c i a l de visão, q u e persiste a t é hoje ( u m ano de seguimento p ó s - o p e r a t ó r i o ) .
O estudo histopatológico de a m b o s os tumores confirmou a hipótese de T P C , sendo o diagnóstico de c a r c i n o m a f i r m a d o devido ao poimorfismo celular, às células m u l t i n u c l e a d a s e às mitoses e n c o n t r a d a s .
C O M E N T Á R I O S
Os sintomas de T P C variam de caso para caso; no nosso doente eram devidos apenas à hipertensão intracraniana. As radiografias simples do crâ-nio e o EEG não contribuíram para o diagnóstico.
A angiografia pela carótida direita mostrou aspecto típico de T P C , de acordo com Almeida e Barros 2
angio-grafias vertebral e carotídea esquerda, confirmou a presença de uma neopla-sia em cada lado, supridas pelas artérias coroidéias anteriores e posteriores. H á a possibilidade de não se fazer o diagnóstico, em outros casos de tumores bilaterais, se a angiografia fôr realizada apenas de um lado. Concluímos, pois, que é necessário o estudo angiográfico bilateral, quando há suspeita de T P C .
A pneumoventriculografia é recomendada por alguns a u t o r e s5 .1 0
para diagnóstico de T P C . Em trabalho anterior 2
um de nós já defendeu a opinião de que o estudo angiográfico é mais aconselhável. Em tumores bilaterais as angiografias contribuem melhor para completa elucidação diagnostica, como foi demonstrado no presente caso.
A mortalidade cirúrgica, mesmo nos casos com tumor unilateral, é ele-vada. Matson e Crofton7
relataram uma mortalidade de 28,5% em sua experiência mas, a revisão de literatura forneceu um índice de 50%. Bohm e S t r a n g4
apresentaram 8 casos, dos quais 5 faleceram (62,5%). Aicardi e c o l .1
, em revisão, encontraram 22 óbitos num grupo de 57 pacientes operados (38,6%), e mais 4 casos fatais devido à recorrência ( 7 , 0 % ) .
N o que se refere à técnica cirúrgica, Matson e Crofton 7
afirmam: "Na remoção destes tumores é feita uma tentativa de mobilizar a neoplasia e interromper imediatamente seu suprimento sangüíneo através do plexo co-róide. Desde que isto seja conseguido, o tumor diminui muito de volume e usualmente pode ser removido intacto. É importante não abordar a neo-plasia antes de individualizar seu pedículo; caso contrário a hemorragia tor-na-se de difícil controle". Para Lawrence, Hoare e T i l l5
o melhor método seria o de remover o tumor intacto, mas reconhecem a dificuldade de clipar os vasos do pedículo. Nós acreditamos que, em tumores grandes, a técnica utilizando aspiração é menos traumática.
R E S U M O
Os autores não encontraram na literatura caso de carcinoma bilateral do plexo coróide operado com sucesso. O trabalho consta da apresentação de uma criança de 11 anos com carcinoma dos plexos coróides nos dois ven-trículos laterais. São feitas considerações a respeito das dificuldades no diagnóstico, da importância dó estudo angiográfico completo e do tratamento
S U M M A R Y
Bilateral carcinoma of the choroid plexus operated successfully
only in one side. Therefore, it is necessary to perform a bilateral angio-graphic study when a tumor of the choroid plexus is suspected. The surgical treatment and the mortality rate are also discussed.
R E F E R Ê N C I A S
1 . A I C A R D I , J . ; G A R C I A , J . ; L E P I N T R E , J . ; C H E V R I E , J. J. & T H I E F F R Y , S t . — L e s p a p i l l o m e s des p l e x u s c h o r o i d e s c h e z l ' e n f a n t . A r c h . f r a n c . P é d i a t . 25:673, 1968.
2 . A L M E I D A , G . M . & B A R R O S , N . G . — D i a g n ó s t i c o a n g i o g r á f i c o d o s t u m o r e s d o p l e x o c o r ó i d e d o v e n t r í c u l o l a t e r a l . A r q . N e u r o - P s i q u i a t . ( S ã o P a u l o ) 2 4 : 103, 1966.
3 . B A A R , E . & G A L I N D O , J. — B i l a t e r a l p a p i l l o m a o f t h e c h o r o i d p l e x u s . J. M a i n e m e d . A s s . 55:95, 1964.
4 . B O H M , E . & S T R A N G , R . — C h o r o i d p l e x u s p a p i l l o m a s . J. N e u r o s u r g . 1 8 : 493, 1 9 6 1 .
5 . L A U R E N C E , K . M . ; H O A R E , R . D . & T I L L , K . — T h e d i a g n o s i s o f t h e c h o r o i d p l e x u s p a p i l l o m a o f t h e l a t e r a l v e n t r i c l e . B r a i n 84:628, 1 9 6 1 .
6. L E W I S , P . — C a r c i n o m a o f t h e c h o r o i d p l e x u s . B r a i n 90:177, 1967.
7 . M A T S O N , D . D . & C R O F T O N , F . D . — P a p i l l o m a o f t h e c h o r o i d p l e x u s i n c h i l d h o o d . J. N e u r o s u r g . 17:1002, 1960.
8 . M O N T E I R O , D . M . & L O P E S , Z . A . — N e o p l a s i a s p a p i l í f e r a s d o p l e x o c o r ó i d e na i n f â n c i a . R e v i s ã o da l i t e r a t u r a e a p r e s e n t a ç ã o d e 4 c a s o s . R e v . H o s p . C l í n . F a c . M e d . S ã o P a u l o 23:78, 1968.
9 . R A Y , B . & P E C K , F . C . — P a p i l l o m a o f t h e c h o r o i d p l e x u s o f t h e l a t e r a l v e n t r i c l e s c a u s i n g h y d r o c e p h a l u s i n a n i n f a n t . J. N e u r o s u r g . 13:405, 1956.
1 0 . T A V E R A S , J . M . & W O O D , E . H . — D i a g n o s t i c N e u r o r a d i o l o g y . W i l l i a m s & W i l k i n s C o . , B a l t i m o r e , 1964.
1 1 . T E N G , P . & P A P A T H E O D O R O U , C . — T u m o r s o f t h e c e r e b r a l v e n t r i c l e s i n c h i l d r e n . J. n e r v . m e n t . D i s . 142:87, 1966.