CISTO EXTRADURAL CONGÊNITO
NUBOR O . FACURE*; F . J . MONTEIRO SALLES**;
JOSÉ J . FACURE*; JOSÉ ZACLIS***
A compressão medular por cisto extradural congênito é de ocorrência
rara, tendo sido considerada como entidade clínica definida por Elsberg, Dyke
e Brewer (1934)
2que descreveram seus sinais e sintomas. Em 1955 Cuneo
1relatou um caso pessoal e fêz referências a 20 observações que encontrou em
revisão da literatura. Porisso é justificável a apresentação deste caso que
serve também para mostrar que a intervenção cirúrgica precoce evita as
alterações irevesíveis da medula.
N . S .( brasileira, branca, 16 anos, s e x o f e m i n i n o , foi a t e n d i d a e m a m b u l a t ó r i o e m 22-10-1969 q u e i x a n d o - s e de perda de força n o s m e m b r o s inferiores i n i c i a d a 6 m e s e s a n t e s ; n o princípio h a v i a a p e n a s r e d u ç ã o da força m u s c u l a r a o s esforços p a r a a m a r c h a o u para corrida; p o u c o a p o u c o a r e s i s t ê n c i a d i m i n u i u a t é que ficou reduzida à m a r c h a c o m apôlo, c h e g a n d o por fim, à impossibilidade t o t a l de l o c o m o ç ã o . N ã o a c u s a a l t e r a ç õ e s e s f i n c t e r i a n a s , n e m p e r t u r b a ç õ e s s u b j e t i v a s d a s e n s i -b i l i d a d e . Exame clínico-neurológico — P a r a p a r e s i a crural s e n s i t i v o - m o t o r a flácida c o m s i n a l de B a b i n s k i b i l a t e r a l ; r e f l e x o s c u t â n e o - a b d o m i n a i s a b o l i d o s ; h i p o r r e f l e x i a p a t e l a r e a q u i l e a n a . H i p o e s t e s i a t é r m i c a e dolorosa c o m n í v e l e m T 5 . Sensibili-d a Sensibili-d e s a r t r e s t é s i c a e p a l e s t é s i c a c o m p r o m e t i Sensibili-d a s n o s m e m b r o s i n f e r i o r e s . Exame
ra-diológico — A l a r g a m e n t o do c a n a l r a q u e a n o n o s s e u s d i â m e t r o s t r a n s v e r s a l e
a n t e r o - p o s t e r i o r e m T5, T6 e T 7 . E r o s ã o dos p e d í c u l o s d e s s a s v é r t e b r a s . Mediante i n j e ç ã o de lipiodol por v i a cisternal, foi v e r i f i c a d o b l o q u e i o t o t a l por e s t r e i t a m e n t o do s a c o m e n í n g e o n o s e n t i d o d o r s o - v e n t r a l desde a f a c e c a u d a l de T4 a t é a f a c e c r a n i a l de T 7 . U m a c a v i d a d e , n a p o r ç ã o dorsal do c a n a l r a q u e a n o , e n c h e u - s e p r o g r e s s i v a m e n t e , n a s e q ü ê n c i a das radiografias, a p r e s e n t a n d o c o m o l i m i t e c a u d a l o e s p a ç o i n t e r v e r t e b r a l T7, T8; n a ú l t i m a radiografia, o l i m i t e c r a n e a l da c o l u n a r a d i o p a c a c h e g a v a a o m e i o do corpo de T 6 . E n c o n t r a - s e i m a g e m a r r e d o n d a d a de 2 m m de d i â m e t r o a o n í v e l da f a c e c r a n e a l de T6, l i g a n d o - s e à i m a g e m d o e s p a ç o s u b a r a c n ó i d e o por u m curto c a n a l . Foi possível, p o r t a n t o , d i a g n o s t i c a r cisto e x t r a -d u r a l c o m p r i m i n -d o o s a c o m e n í n g e o , e m c o m u n i c a ç ã o c o m o e s p a ç o s u b a r a c n ó i -d e o a o n í v e l de T6 ( F i g . 1 ) .
* M é d i c o a s s i s t e n t e do D e p a r t a m e n t o d e N e u r o l o g i a , F a c u l d a d e d e M e d i c i n a d a U n i v e r s i d a d e d e C a m p i n a s ; ** P a t o l o g i s t a ; *** C h e f e d a S e c ç ã o d e N e u r o r r a d i o l o g i a , D e p a r t a m e n t o d e N e u r o l o g i a , F a c u l d a d e d e M e d i c i n a d a U n i v e r s i d a d e d e S ã o P a u l o .
Intervenção cirúrgica — E m 24-10-69 foi f e i t a l a m i n e c t o m i a desde T5 a t é T7,
sendo e n c o n t r a d o v o l u m o s o c i s t o e x t r a d u r a l desde T5 a T7, e s t a n d o o c a n a l r a q u e a n o a l a r g a d o n e s t a á r e a . T r a ç ã o l a t e r a l do cisto e v i s u a l i z a ç ã o da d u r a - m a t e r n o r m a l recobrindo a m e d u l a . T e c i d o gorduroso n a s e x t r e m i d a d e s do cisto que n ã o apre-s e n t a v a a d e r ê n c i a apre-s c o m a d u r a - m a t e r ; p e q u e n o colo c o m u n i c a n d o o c i apre-s t o c o m o e s p a ç o s u b a r a c n ó i d e o foi l i g a d o n a a l t u r a de T6. R e m o ç ã o t o t a l do cisto q u e m e d i a 8 c m de c o m p r i m e n t o por 3 c m no d i â m e t r o t r a n s v e r s a l e 2 c m no a n t e r o -p o s t e r i o r ; c o n t e ú d o r e -p r e s e n t a d o -por fluído t r a n s -p a r e n t e e i n c o l o r .
Exame histopatológico — F i x a ç ã o e m formol, i n c l u s ã o e m p a r a f i n a e c o l o r a ç ã o
por H . E . , t r i c r ó m i c o e r e t í c u l o de Gomori, e G a l l e g o . T r a t a s e de f o r m a ç ã o s a -c u l a r o v o i d e v a s i a -c u j a l u z e s t á r e v e s t i d a por m e m b r a n a lisa b r i l h a n t e e -c u j a p a r e d e é s e m i - t r a n s p a r e n t e , de a s p e c t o f i b r o s o . A o e x a m e microscópico e n c o n t r a - s e t e x t u r a f u n d a m e n t a l m e n t e c o n e t i v o - f i b r i l a r h i a l i n i z a d a n a f a c e e x t e r n a o n d e e x i s t e "tecido e e t u l o - g o r d u r o s o c o m a l g u m a s fibras n e r v o s a s m i e l i n i z a d a s ; a f a c e i n t e r n a t e m r e v e s t i m e n t o e n d o t e l i f o r m e d i s c o n t i n u o q u e r e p o u s a sobre f a i x a v a s c u l a r i z a d s . de t e x t u r a f r o u x a m u i t o rica e m fibras r e t i c u l í n i c a s ( F i g . 2 ) . D i a g n ó s t i c o : Cisto c o n g n ê i t o e x t r a d u r a l .
Evolução — Melhora i m e d i a t a da p a r a p a r e s i a , c o m a u m e n t o do t o n u s m u s c u l a r .
C O M E N T Á R I O S
intensi-dade; mais freqüentes são as alterações da sensibilidade profunda; distúrbios
esfincterianos podem ocorrer. A remissão dos sintomas já foi observada
tam-bém espontaneamente por esvasiamento eventual do cisto. O quadro clínico
se inicia na adolescência, sendo de dois meses a 13 anos a duração do
qua-dro clínico, quando não fôr feita a extirpação cirúrgica.
O exame radiográfico é fundamental para o diagnóstico que algumas
vezes já pode ser feito mediante radiografias simples da região dorsal. O
quadro radiológico característico foi descrito por Elsberg e c o l .
2: há
compro-metimento de vértebras torácicas com aumento da distância interpedicular
e erosão dos arcos e dos pedículos, disso resultando alargamento do canal
raqueano nos seus diâmetros ântero-posterior e transversal. Essas alterações
se localizam com maior freqüência entre T4 a TIO, podendo haver cifose ou
escolióse dorsal associada. As radiografias contrastadas quasi sempre
mos-tram bloqueio total ou parcial do canal raquano. A identificação radiológica
da comunicação entre o cisto e o espaço subaracnóideo foi feita pela primeira
vez por Jacobs-Smith e Van Horn (citados por Cuneo
1). O exame do líquido
cefalorraqueano nos casos referidos na literatura, revelou a síndrome liquórica
de bloqueio do canal raqueano.
Do ponto de vista etiológico a maioria dos autores considera o cisto
extradural congênito como um divertículo do saco meníngeo. Porém como
a comunicação entre o cisto e o espaço subaracnóideo só é identificável,
direta ou indiretamente, em apenas 1/3 dos casos (Hanraets
3), foi
admi-tida, por outros, a formação do cisto a partir de células ectópicas (Hindman-*).
Cuneo
1cita a opinião de Cloward e Buey que procuram explicar a ausência
da comunicação pela obliteração do pedículo no decorrer do desenvolvimento,
continuando o crescimento do cisto por secreção intrínseca.
No que respeita ao diagnóstico diferencial têm sido relatados casos cuja
sintomatologia pode fazer pensar em esclerose em placas ou em siringomielia
(Elsberg
2). Por outro lado, já foi encontrado tumor intra-medular
^spon-gioblastoma) previamente diagnosticado como cisto extradural (Hindman
4).
Os lipomas devem ser lembrados porque mostram quadro radiográfico
seme-lhante àquele encontrado nos cistos; contudo os lipomas são mais
freqüen-tes na região cervical. O comprometimento de três ou mais vértebras
torá-cicas, apresentando as alterações acima referidas no exame radiográfico, é
quasi patognomônico do cisto extradural. Cistos de raízes nervosas,
confor-me foi descrito por Tarlov (citado por Hanraets
3), se localizam ao nível de
S3; eles podem ser múltiplos e emergem entre o endoneuro e o perineuro
da porção extradural das raízes ou, então, da cápsula do gânglio.
R E S U M O
S U M M A R Y
Congenital extradural cyst: a case report
A case of congenital extradural cyst successfully operated is reported.
The value of the radiographic examinations of vertebral colum is emphazised.
Comunication betwen the cyst and subarachnoidal space was detected
mielographically. Early diagnosis followed by prompt surgery may prevent
permanent spinal cord damage.
R E F E R Ê N C I A S
1 . C U N E O , H . M . — S p i n a l e x t r a d u r a l c y s t s . J . N e u r o s u r g . 12:176-180, 1 9 5 5 .
2 . E L S B E R G , C . A . ; D Y K E , C . G . & B R E W E R , E . D . — T h e s y m p t o m s a n d d i a g n o s i s of e x t r a d u r a l c y s t s . B u l l . N e u r o l . I n s t . N e w Y o r k 3:395-417, 1 9 3 4 .
3 . H A N R A E T S , P . R . M . J . — C o n g e n i t a l e x t r a d u r a l s i v e e p i d u r a l c y s t s . In T h e D e g e n e r a t i v e B a c k , 1959, p p . 1 8 3 - 1 8 6 .
4 . H Y N D M A N , O . R . & G E R B E R , W . F . — S p i n a l e x t r a d u r a l c y s t s , c o n g e n i t a l a n d a c q u i r e d . J . N e u r o s u r g . 3:474-486, 1 9 4 6 .