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O desafio da integralidade segundo as perspectivas da vigilância da saúde e da saúde da família.

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Academic year: 2017

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O desafio da integralidade segundo as perspectivas

da vigilância da saúde e da saúde da família

In tegrality ( com preh en siven ess) :

fr om th e viewp oin t of h ealth car e an d th e r ecen t

p r op osals r egar d in g basic assist an ce in Br azil

1 Departamento de Medicin a Preven tiva da Faculdade de Medicina e Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva/UFRJ. Edifício do H ospital Un iversitário Clem en tin o Fraga Filho. Av. Brigadeiro Trom powsky s/n, 5o andar, Ala Sul, sala 33, Ilha do Fundão, 21941-590,

Rio de Janeiro RJ. cadu@vetor.com .br

Carlos Edu ardo Agu ilera Cam pos1

Abstract M ultiple facets, related to the de-finition of policies, the structuring of knowl-edge an d t he im plem en t in g of pract ices in t he healt h services, in t eract am on g t hem -selves. T his brings to light, as a final resu lt ( ou tpu t) , the m an n er in which health ser-vices are ren dered within a certain histori-cal con t ext ( con cept ) , an d t he availabilit y or the scarcity of certain groups of activities and health services (in this country). It is es-sen tial to u n derstan d these in teraction s in order to be able to evaluate the course of ac-t ion ac-t o be follow ed by h ealac-t h policies in Brazil. Considering, as our reference point, t he Con st it u t ion al prin ciple of in t egralit y ( com prehensiveness) of health care, and the challenges posed by its im plem entation, we analyze the theoretical form ulations related to the concept of health care and the changes that have been im plem ented by the M inistry of H ealt h in t h e areas of Basic A ssist an ce and Fam ily Health (Program s). W e also put on the discussion table to what extent (m ea-sures) these form ulations, propositions and in itiatives have effectively been con tribu t-in g, t oday, t o t he developm en t of t he Un i-fied Health System (SUS).

Ke y wo rd s H ealt h policy, H ealt h Syst em Organization, Unified H ealth System , Pri-m ary care

Resum o M ú ltiplos aspectos relacionados à form ulação de políticas, à construção do co-n hecim eco-n t o e à im plem eco-n t ação das prát i-cas n o set or saú de in t eragem m u t u am en t e e têm com o produto a m aneira com o se pres-t am os serviços de saú de em depres-t erm in ado contexto histórico ou ainda resultam na dis-ponibilidade ou na escassez de um determ i-n ado coi-n ju i-n to de ações e serviços de saú de. Com preen der essas relações é fu n dam en tal para se avaliar a t rajet ória da polít ica de saúde no país. Tom ando- se com o referência o princípio constitu cional da integralidade da aten ção à saú de e os desafios de su a im -plem en t ação, an alisam - se as form u lações t eóricas relacion adas ao con ceit o de V igi-lância da Saúde e as m udanças im plem enta-das pelo M in istério da Saú de n o cam po da Atenção Básica e da Saúde da Fam ília. Bus-ca- se ain da an alisar em qu e m edida essas proposições con tribu em atu alm en te para o desen volvim en to do Sistem a Ún ico de Saú-de.

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A separação entre a m edicina exclusivam ente curativa e as ações essencialm ente preventivas sobre o am bien te e sobre hábitos de vida n ão parece m ais t er fu n dam en t ação. A m elhoria da saú de da popu lação depen de, assim , em proporções descon hecidas, da qu alidade do am biente, da prosperidade geral do país e dos serviços de saú de realizados pelo sist em a de tratam ento. (Contandriopoulos, 1995)

Introdução

É propósito deste capítu lo bu scar com preen der as relações que se estabelecem en tre a for -m u lação de políticas, a con stru ção do con he-cim en to e a im p lem en t ação d as p r át icas n o set or saú d e. Q u an d o se bu sca solu ção p ar a u m p r oblem a d e saú d e, qu an d o se r ecor r e a um m édico, a um posto de saúde, a um hospi-tal, o resultado obtido é fru to dessa com plexa e im br icad a r elação. O s m ú lt ip los asp ect os qu e in t er agem m u t u am en te con correm , por um lado, para a dispon ibilidade de u m deter -m in ado con ju n to de ações e serviços ou , por ou t r o, p ar a o su r gim en t o d e d ificu ld ad es d e acesso aos m esm os.

Com o se dá a con stru ção coletiva e social da prática san itária? Este é um processo dialé-t ico e p od e- se su p or qu e esdialé-t ejam en volvid as in stân cias distin tas, ligadas às dim en sões po-lítica e técn ica. A prim eira refere-se às con dições in stitucionais, com o surgim ento de con -sen sos, qu e, at r avés d o p r ocesso p olít ico, se est r u t u r am em p r in cíp ios con st it u cion ais, p assan d o p ela r egu lam en t ação d e d isp osit i-vos legais e seu s r esp ect ii-vos m ecan ism os d e fin an ciam en to. A segu n da é aqu ela ligada ao con h ecim en t o qu e, segu n d o m od elos t eór cos, passa a dar con cretude e a reger a organ i-zação e a gestão do sistem a de saú de e, fin al-m en t e, a d efin ir o con ju n t o d e t ecn ologias que as ciências oferecem . Estas, um a vez com -bin adas, segun do sua relação de custo-efetivi-d acusto-efetivi-d e, r esu lt am em p r át icas custo-efetivi-d e saú custo-efetivi-d e e assis-tên cia voltad as p ar a as n ecessid ad es d e in d i-víduos, fam ílias e com unidades.

Devid o a u m a p r em issa fu n d am en t al – trata-se de u m fen ôm en o social e h istórico – essa r ealid ad e n ão p od e ser vist a com o u m processo lin ear. Assim a trajetória da política d e saú d e t em com o p on t o d e p ar t id a u m a con stru ção de propósitos de gru pos em lu ta, os qu ais, a cada m om ento, influenciam a con -for m ação d o sist em a. Esse sist em a r esu lt a,

portan to, dos em bates e dos con sen sos e dis-sen sos que ocorrem en tre os grupos. E por ser h ist ór ico leva- se sem p r e em con sid er ação a h er an ça r ecebid a, d esd e a exist ên cia d e u m a cu ltu r a in stitu cion al ar r aigad a em u n id ad es d e saú d e com d ifer en t es con for m ações e es-paços de prática, a refletirem um a determ in a-da con cepção histórica. Tu do isso, se n ão de-term in a, ao m en os con dicion a os propósitos futuros.

A análise de um sistem a de saúde deve ini-ciar-se por desvelar a lógica da sua estrutura-ção e de seu fu ncionam ento, bem com o as art icu lações in sart iart u cion ais qu e apresen art a, art en -do- se em m ente as qualificações em relação à população abrangida, m odelo assistencial im -plem entado, e principalm ente as form as de fi-nanciam ento adotadas(Elias, 1996).

N osso objet ivo é an alisar o p r ocesso d e con str u ção e im p lem en tação d a in tegr alid a-d e, p r in cíp io con st it u cion al qu e t alvez seja, n os dias de hoje, o m aior desafio da saú de n o Brasil. A partir daí preten dem os apresen tar as p r op ost as d a vigilân cia d a saú d e com o u m a via para ven cer este desafio.

A busca de soluções para os problemas de atenção à saúde da população

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-ção à saúde de algum a n atureza. Essa situa-ção é incom patível com o direito constitucional.

At en d er às n ecessid ad es e aos an seios d a popu lação foi a m otivação básica para a cria-ção do Sistem a Ún ico de Saú de. As dificu ldades não residiam apenas no arcabouço institu -cion al, isto é, n o con ju n to de leis existen tes à época, que dava prioridade ao m odelo em que a aten ção previden ciária era o prin cipal foco da política pú blica. H á qu e se con siderar en -tre as h eran ças recebidas pelo SUS, em déca-das de estru tu ração do setor saú de, a cu ltu ra or gan izacion al, os d iver sos in ter esses fin an -ceiros e com erciais in com patíveis com o interesse público, e um a prática m édica fragm en -tada e descon textu alizada da realidade dos cidadãos. Esses padrões in stitu cion ais con for -m ar a-m u -m con ju n to de pr essu postos e valo-res de difícil, e len ta, tran sform ação, a despeito d e existir em p r op ósidespeitos p olíticos d e m u -d an ça -d a p ar t e -d a m aior ia -d os at or es sociais en volvidos n o setor. Daí se con siderar, atu al-m en te, qu e o SUS estar ia ain d a eal-m gestação, esp ecialm en te p or existir h á p ou co m ais d e u m a d écad a. Em se tr atan d o d o setor saú d e porém , é ju stificável a im paciên cia verificada com relação à len tidão com que se dão as m u -dan ças, fren te às u rgên cias da popu lação por m ais saúde.

Mesm o qu an do se con sider am dificu lda-d es com o as acim a lda-d escr itas, vár ios p r ogr es-sos t êm sid o alcan çad os. Um d os p on t os a destacar é o desen volvim en to da aten ção pri-m ár ia à saú d e, for pri-m ad a p or u pri-m a r ed e qu e se con solid ou em tod o o p aís. Cen tr os e p ostos de saú de, os estabelecim en tos san itários des-t in ad o s a p r esdes-t ar ser viço s básico s à p o p u lação, experim en taram um crescim en to bastan -t e exp r essivo, -t an -t o em n ú m er o absolu -t o qu an t o em p r od u ção d e ser viços e au m en t o d e cober t u r a assist en cial, esp ecialm en t e em ár eas an t es d esassist id as. Cr iad as n a década de 1930, essas u n idades se m u ltiplicar am p or todo o país, e se expan diram , de form a acele-rada, a partir dos an os 80. Esse foi um dos ga-n h os oriu ga-n dos do processo de descega-n traliza-ção da saúde previden ciária e da subseqüen te m un icipalização do sistem a de saúde brasilei-ro.

Essa r ed e básica am p liou su a ofer t a d e ser viços segu n d o d ois eixos fu n d am en tais: a prestação de aten dim en to m édico am bu lato-rial n as especialidades básicas ( pediatria, gi-n ecologia e obstetrícia, clín ica m édica) e a oferta de ações de caráter preventivo, segundo

a lógica da program ação em saú de. Esta pode ser definida com o: o conjunto de práticas que, a partir de um referencial epidem iológico, to-m a coto-m o seu objeto de in terven ção a saú de e a doença no coletivo, utilizando com o instru-m ento de intervenção diversas atividades que são art icu ladas e organ izadas n o sen t ido de produ zirem u m efeito sobre a saú de no plano coletivo (Sala, 1993).

O s p r ogr am as d e saú d e bu scam , em ou -tras palavras, com base em prioridades, elei-t as segu n d o cr ielei-t ér ios com o m agn ielei-t u d e, vu l-n er abilidade, tr al-n scel-n dêl-n cia, com bil-n ar tec-n ologias e intervenções de caráter clínico-epi-dem iológicas calcadas em m edidas de im pac-to, eficácia, efetividade e eficiência com prova-d as. Essas ações são a p ar t e m ais visível prova-d o t r abalh o d as u n id ades básicas. É in egável te-rem alcançado progressos, que se refletem em m elhorias de determ in ados in dicadores san it ár ios. Além d isso, em d iver sos seit or es so -ciais, existe o apoio necessário à sua continui-dade. En tre as ações, destacam -se os progra-m as de coprogra-m bate à desn u trição e à diarréia n a in fân cia, d e p r even ção d a Aid s, d e im u n iza-ções, de preven ção do cân cer de m am a, do aleit am en t o m at er n o, d o con t r ole d a h ip er -tensão, de diabetes, etc.

Ain d a assim n ão se p o d e afir m ar qu e o sistem a com o u m todo sofreu as tran sform a-ções su bst an ciais esp er ad as, n em qu e t en h a cor r esp on d id o aos an seios d a p op u lação. Muitos problem as ainda persistem . Com rela-ção aos program as de saúde, a oprela-ção feita por operá-los tom an do por base as especialidades de cada área acarretou a fragm en tação do tra-balho desen volvido n as un idades básicas. Ge-ralm en te, on de existe o recu rso dispon ível, o car d iologist a at u a n o p r ogr am a d e con t r ole da hiperten são; o pn eu m ologista, n o progra-m a de con trole da tu bercu lose; o derprogra-m atolo-gista, n o program a de con trole da han sen íase e assim p or d ian te. O s im p asses d ecor r en tes d essa for m a d e at u ar são evid en t es. Rep r o -du z-se u m aten dim en to especializado, m u ito próprio do am bien te h ospitalar, com prom eten do as prem issas da aeten ção prim ária à saú -de. Além disso, as dificuldades em se dotar ca-d a u m ca-d os p ost os ca-d e saú ca-d e ca-d e r ecu r sos aca-d e-quados é eviden te n este m odelo. De tal form a qu e, p or exem p lo, p ost os p ossu em at en d i-m en to de pediatria, às segu n das e sextas pela m an hã, de clín ica m édica; às terças e quin tas, de ginecologia e pré-natal; às quartas, etc.

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fr agm en t ação as m ed id as, sem p r e u r gen t es, de esten der a cobertu ra assisten cial, lotan do-se p r ofission ais p ar a r ealizar , n as u n id ad es básicas, con sultas m édicas am bulatoriais sem n en h u m p lan ejam en to ou estu d os p ar a ad e-qu á- las às n ecessid ad es locais. Est as for am , freqü en tem en te, organ izadas n a m odalidade d e p r on to aten d im en to, sem p r e em n ú m er o in su ficien t e e sem n en h u m vín cu lo en t r e as equipes e os in divíduos. Assim realizou-se um trabalho paralelo à lógica da program ação em saú de, bu scan do r esp on d er às d em an d as d os in d ivíd u os qu e n ão er am at en d id os p elas ações p r ogr am át icas. A esses p r oblem as acr escen t a- se, ain d a, a falt a d e t r ein am en t o d os p r ofission ais p ar a t r abalh ar segu n d o os p r in cíp ios d a at en ção p r im ár ia à saú de, e a baixa rem u n eração. Em con seqü ên cia, ao in -vés do espaço com u n itário em qu e se bu sca a in tegração da ação curativa com as de prom o-ção e d e p r even o-ção à saú d e, é com u m a exis-tên cia de filas de pacien tes, desde a m adru gada, em busca de “um a ficha” para aten dim en -to com u m esp ecialista. Par ece h aver , n esses casos, a im portação da lógica dos serviços de em ergên cia e de urgên cia ao trabalho da aten -ção prim ária à saúde.

O trabalho nos estabelecim entos de saúde e entre eles, na Unidade Básica, é organizado, t radicion alm en t e, de form a ex t rem am en t e parcelada. Em eixo verticalizado, organiza-se o trabalho do m édico e en tre estes, o de cada especialidade m édica. Assim , sucessivam ente, em colunas verticais vai se organizando o tra-balho de outros profissionais. Essa divisão do trabalho se dá, de u m lado pela consolidação n os serviços de saú de das corporações profis-sionais, e por outro, no caso dos m édicos, pela especialização do saber e, conseqü entem ente, do trabalho em saúde. A organização parcelar do trabalho fixa os trabalhadores em um a determ inada etapa do projeto terapêutico. A su -perespecialização, o trabalho fracion ado, fa-zem com que o profissional de saúde se aliene do próprio objeto de trabalho. Desta form a, fi-cam os t rabalhadores sem in t eração com o produ to fin al da su a atividade laboral, m es-m o qu e t en haes-m dele part icipado, pon t u al-m en te. Coal-m o n ão há in teração, n ão haverá com prom isso com o resultado do seu trabalho

(Franco et al., 1997).

Segun do Mehry, além da segm en tação, há ain da o problem a da atitu de do m édico, cu jo trabalho é m arcado pelo distan ciam en to com r elação aos in ter esses dos u su ár ios, pelo

isolam en to com r elação aos ou tr os tr abalh ad o -res da saú de e pelo predom ín io de m odalida-des de in terven ção cen tradas n as tecn ologias du ras, isto é, por u m m odelo assisten cial vol-t ad o p ar a a p r od u ção d e ações basead as em m áquin as e procedim en tos: O trabalho m édico orien tado por este m odelo se isola dos ou -tros trabalhos em saúde, vai se especializando à introdu ção de cada novo tipo de associação entre procedim entos e m áquinas, vai necessi-tando de um a autonom ia que o separa das ou-t ras m odalidades de abordagem em saú de, e alim enta- se de um a organização corporativa poderosa, voltada, eticam ente, para si m esm a. Dest a m an eira, est as in t en ções qu e com an -dam o trabalho m édico com prom etido com a produção de procedim entos estão articuladas com u m exercício da au ton om ia n o trabalho clínico totalm ente voltado para interesses pri-vados estranhos aos dos usuários, e isolado de u m t rabalho m ais colet ivo n o in t erior das equipes de saúde, fechado e protegido no espa-ço físico dos con su lt órios, em n om e de u m a eficácia e de u m a ética qu e n ão se su sten tam em nenhum dado objetivo, em term os da pro-dução da saúde(Merhy, 1997).

Mu it as d essas d ist or ções n ão acon t ecem ap en as n o Br asil. Em vár ios p aíses, o d ilem a com qu e se deparam os sistem as n acion ais de saú de se circu n screve en tre a n ecessidade de tor n ar u n iversal a assistên cia m édica de qu a-lid ad e e a con st an t e bu sca d e con t en ção d o gast o p ú blico e p r ivad o n o set or . Pois o m o -delo atual de atenção m édica leva, inexoravel-m ente, ao probleinexoravel-m a do auinexoravel-m ento seinexoravel-m pre cres-cen te d e cu stos ( Labr a e Bu ss, 1995) . O m ito d a im or talid ad e e d o p od er m ágico d a m ed i-cin a se m an t ém n o in con scien te coletivo, a despeito de todas as evidên cias ao con tr ár io. O lequ e d e op ções p or n ovas t ecn o lo gias e produ tos, sem pre em evolu ção, estim u la u m con su m o in dividu al sem preceden tes, de for -m a acr ítica, se-m qu e h aja u -m a com provação clara de su a efetividade com relação a pr oce-dim en tos an teriorm en te adotados.

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a dissem in ação da rede básica, de respon sabi-lidade do poder m u n icipal. E m u itas vezes se d escon fia ser essa for m a d e atu ação d o setor pú blico u m a política de focalização, u m a es-p écie d e cest a básica san it ár ia, d est in ad a a aten d er , com o m ais u m p r ogr am a social, os gru pos m ais caren tes e desvalidos da popu la-ção.

É im portan te esclarecer qu e dar priorida-d e à p r even ção n ão é, n ecessar iam en te, u m a estratégia de con ten ção de custos. Pois n ão se p od e d escu id ar d o at en d im en t o d as d em ais n ecessid ad es d e saú d e, n os n íveis m ais com -plexos do sistem a, quan do se tem em m en te o cum prim en to dos objetivos e pressupostos do Sistem a Ún ico de Saúde. Estes são, segun do a Lei O r gân ica d a Saú d e, assegu r ar o acesso u n iversal e igu alitário a todos os n íveis de as-sistên cia e prest ar ações e ser viços p r even t i-vos e curatii-vos, individuais e coletii-vos.

Recen tem en te teve in ício um debate en tre os gestores federais e estaduais, sobre a region alização d o sist em a d e saú d e. E em d ocu -m en tos relativos à region alização lê-se qu e a exp an são d a r ed e básica e o p r ocesso d e d es-cen tralização n ão podem prescin dir de m eca-n ism os qu e dêem aos m u eca-n icípios a capacida-de capacida-de oferecer ações capacida-de caráter abran gen te, se-gu n do os diversos n íveis de assistên cia capazes de aten der em todas as dem an das. H á u r -gên cia de se corrigir a ten dên cia a u m a assis-tên cia exclu sivam en te voltada para a aten ção básica, em vir t u d e d a p equ en a cap acid ad e, dos m u n icípios, de proverem os in vestim en -tos n ecessários para se prestar serviços de as-sistên cia h osp italar , ou ser viços esp ecializa-dos. Con clu i-se, assim , h aver n ecessidade de se co n st r u ír em r ed es ar t icu lad as segu n d o plan os region ais, sob risco de u m processo de desintegração organizacional e da com petição entre órgãos gestores e da conseqüente atom i-zação do SUS em m ilhares de sistem as locais, ineficientes, iníquos e não resolutivos (Minis-tério da Saúde, 2001).

Essa proposta de region alização bu sca as-sim in t egr ar as in iciat ivas e os r ecu r sos d is-poníveis em cada m unicípio, organizando pó-los d e r efer ên cia p ar a os at en d im en t os d e m aior com plexidade ou para procedim en tos de alto custo. Assim possibilita-se um a oferta m ais equ ân im e dos serviços con siderados de r efer ên cia. Bu sca- se com isso evit ar qu e os sist em as locais p ad eçam d as d ificu ld ad es d e en cam in h am en to aos n íveis m ais com plexos d o sist em a. Est a p r op ost a vem ao en con t r o

das in iciativas de form ação de con sórcios in -term u n icipais, con stitu ídos n o país ao lon go da últim a década.

A integralidade como princípio norteador do sistema de saúde

O con ceito de in tegralidade é um dos pilares a su sten tar a criação do Sistem a Ún ico de Saú -de. Princípio consagrado pela Constituição de 1988, seu cum prim en to pode con tribuir m uito para garan tir a qualidade da aten ção à saú -de.

Em prim eiro lu gar prevê-se n esse con cei-t o qu e, d e for m a ar cei-t icu lad a, sejam ofer cei-t ad as ações d e p r om oção d a saú d e, p r even ção d os fatores de risco, assistên cia aos dan os e reabi-litação – segundo a dinâm ica do processo saú -de-doença. É im portan te ressaltar que os dife-ren tes m om en tos da evolu ção da doen ça e as respectivas m edidas a serem tom adas seguem o m odelo da história n atu ral da doen ça, teo-r ia con sagteo-r ad a por White n a década de 1960. Segu n d o essa teor ia, o est ágio em qu e se en -con tra determ in ado agravo à saú de está dire-t am en dire-t e r efer id o a n íveis d e in dire-t er ven ção se-gu n do con hecim en tos e tecn ologias dispon í-veis p ar a at u ação em âm bit os in d ivid u ais e colet ivos. Est es p r ecisam est ar ar t icu lad os e in tegrados em todos os espaços organ izacio-n ais do sistem a de saúde.

Q u an d o se con sid er a a abr an gên cia d o con ceito d e in tegr alid ad e, tal com o d escr ito acim a, pode parecer uma contradição a defini-ção transcrita n o texto con stitucion al: Atendi

-m ento integral, co-m prioridade para as ativi-dades preven t ivas, sem preju ízo dos serviços assistenciais (Brasil, 1988).

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relativas ao conhecim ento clínico e epidem io-lógico.

Note-se ain da a au sên cia, n o texto con sti-tu cion al, de referên cias à prom oção da saúde. Isso p od e ser at r ibu íd o à p ou ca d ifu são d o con ceito à época dos trabalhos da Assem bléia Nacion al Con stitu in te. A ên fase d ad a à p r o-m oção da saúde é portan to m ais recen te e n ão foi sequer citada quan do da votação da Con s-tituição.

O p r im eir o d esafio n a bu sca d o at en d i-m en t o in t egr al é r eest r u t u r ar a for i-m a coi-m o os distin tos estabelecim en tos e organ izações do setor saú de trabalham ain da até os dias de h oje. A m u d an ça d as p r át icas d e saú d e d eve ocor r er em d ois n íveis. O p r im eir o, in st it u cion al, d a or gan ização e ar ticu lação d os ser -viços d e saú d e. O segu n d o, d as p r át icas d os p r ofission ais d e saú d e, n o qu al o m éd ico é o su jeit o, at or p r im or d ial, d et er m in an t e d o p r ocesso d e est r u t u r ação d as p r át icas in t e-grais à saúde.

O s saber es e p r át icas a con for m ar em o cam po da epidem iologia se estru tu raram em organ izações que desen volveram , tradicion al-m ente, ações de vigilância epideal-m iológica, vigilân cia san it ár ia e p r o gr am as d e saú d e p ú -blica. Desde o in ício do sécu lo passado, esses est abelecim en t os for am r esp on sáveis p elo trabalh o n o cam po da saú de coletiva. E atu a-r am , p a-r ed om in an t em en t e, soba-r e os p a-r oble-m as d as colet ivid ad es, eoble-m ár eas cooble-m o a d a ed u cação em saú d e, o con tr ole d e d oen ças con tagiosas e de vetores, o san eam en to, as in -terven ções sobre o m eio am bien te e, m ais re-cen tem en te, a preven ção de fatores de risco e a p r om oção à saú d e. O s cen t r os e p ost os d e saúde foram a parte m ais visível da ação.

Já a assistên cia clín ica se organ izou , n ota-d am en te a partir ota-da ota-décaota-da ota-de 1950, em h os-p it ais d a os-p r evid ên cia so cial vo lt ad o s os-p ar a a at en ção aos t r abalh ad or es d o m er cad o for -m al. Sua tarefa pri-m ordial era o aten di-m en to m éd ico, esp ecializad o e in d ivid u al, em t er -m os de trata-m en to e reabilitação.

Só n o fin al da década de 1970, se in iciaram esforços, ain da que tím idos, para a in tegração d o sist em a d u alist a. Exist iu , p o r t an t o , u m a h istórica dicotom ia en tre as ações de caráter h osp it alar e cu r at ivo, d e u m lad o, e as ações d o cam p o d a saú d e colet iva, d e cu n h o m ais preven tivo e coletivo, de outro. E essa divisão n ão se deu apen as n as estru tu ras adm in istra-tivas.

A assist ên cia m éd ica h osp it alar con t ava

com vu ltosos recu rsos da m áqu in a previden -ciária, en qu an to a saú de pú blica era fin an cia-da por escassos recursos do Tesouro Nacional ou fom en t os or iu n d os d e or gan ism os in t er -n acio-n ais. Assim , o Sist em a Ú-n ico d e Saú d e herdou um a rede de saúde que represen ta um desafio para a assistên cia in tegral. Em que pe-se o gr an d e n ú m er o d e cen tr os e p ostos d e saú d e em n osso p aís, est es sofr er am com as restrições orçam en tárias, as solu ções de con -tin u idade n a reposição de recu rsos hu m an os e sem pre estiveram em segu n do plan o dian te d a r ed e h osp it alar . N em ao m en os h avia u m sist em a d e fin an ciam en t o p ar a as ações m u -n icipais que -n ão estivessem ligadas ao ate-n di-m en t o e aos p r oced idi-m en t os di-m éd ico- in d ividuais. O financiam ento por produção de con -sultas, exam es, internações lim itava, decisiva-m en te, a exp an são d a ativid ad e p r even tiva e coletiva. O país dispõe de u m a r ede de saú de m uito m ais centrada na produção de procedi-m en t os procedi-m éd icos e d iagn óst icos, p ou co in t e-grada e m al distribuída, segun do as regiões. O processo de m u n icipalização d a saú d e br asi-leir a abr iu , p or ém , n ovas p er sp ectivas n esse cam po, e é fru to da participação das com u n i-dades e dos m ovim en tos sociais. E, com o tem sid o ch am ad a at u alm en t e, a at en ção básica passou a ser m ais discu tida e priorizada pelos gestores da área.

Leis e d ecr et os m ais r ecen t es, r elat ivos a n ovas form as de fin an ciam en to e de gestão do sist em a d e saú d e br asileir o, m elh or ar am as cond ições para qu e o gestor m u n icipal possa cum prir o preceito con stitucion al da in tegra-lid ad e. As m u d an ças n a lógica d e fin an cia-m en to se con su bstan ciaracia-m n a procia-m u lgação da Norm a Operacional Básica-96. A exigência de haver setores respon sáveis por cada ação e ativid ad es d e con t r ole e avaliação for am r e-qu isitos para a h abilitação de m un icípios em “gestão plena do sistem a de saúde”. As resolu -ções con cern en tes à im plan tação, por u m la-do, do Piso Assistencial Básico (PAB), em seus com p on en tes fixo e var iável e, p or ou tr o, d a Pr ogr am ação Pact u ad a d a Ep id em iologia e Con t r ole d e Doen ças ( PPI- ECD) for am os prin cipais m ecan ism os dessa m udan ça.

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recursos globais, segun do aspectos com o per -fil popu lacion al, in dicadores san itários e epi-dem iológicos, desigualdades region ais, m etas d e cober tu r a, d esem p en h o, etc. Passou - se a exigir qu e o gestor plan eje ações voltadas para a m elhoria das con dições de saú de, segu n -do a evolução de in dica-dores san itários e epi-dem iológicos. Assim , cabe ao gestor m u n ici-pal pactuar, por exem plo, a redução da prevalên cia de determ in adas doen ças ou o au m en -t o d a cober -t u r a vacin al ou p r é- n a-t al. Bu scase, em sum a, estabelecer um sistem a de fin an -ciam en to cen trado m ais em m etas de im pacto ep id em iológico d o qu e n a p r od u ção d e con -sultas ou in tern ações.

O p r ocesso d e p actu ação d e m etas d e co-bertura e desem pen ho e de repasse fin an ceiro exige a p ar t icip ação d os con selh os m u n icipais de Saúde. Esses con selhos devem referen dar e registrar em ata os com prom issos assu -m idos pelos gestores -m unicipais. Dessa for-m a existe u m a m aior tran sparên cia das ações do governo no setor. Em seguida os pleitos m

uni-cip ais são su b m et id o s à in st ân cia est ad u al; an alisad os ( ap r ovad os ou n ão) n a Com issão In ter gestor a Bipar tite, qu e r eú n e o con selh o de gestores m un icipais e a secretaria de saú de do estado. O m esm o p r ocesso se d á n o n ível federal, n a Com issão In tergestora Tr ip ar t it e. N os exem p los qu e se segu em , ap r esen t am os algu n s com p r om issos fir m ad os p or gestor es m u n icipais do Estado do Rio de Jan eiro para o recebim ento de recursos do Piso de Atenção Básica e da Program ação Pactu ada e In tegra-da tegra-da Epidem iologia e Con tr ole de Doen ças. Com o já m encionado, ao invés de se firm arem con vên ios com m u n icíp ios p ar a a p r od u ção d e con su lt as, exam es ou in t er n ações, r ep as-sam - se r ecu r sos, fu n d o a fu n d o, m ed ian t e a assin atu r a d e u m p acto. Segu n d o esse p acto, vár ias m etas de desem pen h o do sistem a m u -n icipal serão avaliadas por m eio da a-n álise da m elhoria de in dicadores relacion ados, direta ou in diretam en te, à estrutura, ao processo ou ao r esu lt ad o d as ações d e saú d e, ger alm en t e voltados para a saúde coletiva.

Quadro 1

Metas pactuadas pelos m unicípios do Estado do Rio de Janeiro – 2000 Piso da Atenção Básica – PAB

Atin gir e/ou m an ter cobertura de 95% para o esquem a vacin al de rotin a;

Reduzir o núm ero de internações por tétano neonatal, por tétano, saram po e difteria; Reduzir o núm ero de óbitos em m enores de 1 ano;

Oferecer, no m ínim o, quatro consultas de pré-natal por gestação; Organ izar ações de preven ção de gravidez n a adolescên cia;

Reduzir as in tern ações por in fecções respiratórias agudas em crian ças e idosos; Reduzir as in tern ações por desidratação aguda em m en ores de cin co an os; Reduzir as in tern ações por AVC, infarto e com plicações da diabetes em adultos; Alcançar 95% dos anim ais dom ésticos com a vacinação anti-rábica.

Fonte: SES-RJ, 1999

Quadro 2

Metas pactuadas pelos m unicípios do Estado do Rio de Janeiro – 2000

Program ação Pactuada e Integrada – Epidem iologia e Controle de Doenças – PPI-ECD

Detectar 1,3 casos de hanseníase por 10.000 habitantes; Cadastrar 100% das fon tes de abastecim en to de água;

Investigar 100% das notificações com pulsórias de tuberculose, hepatite, m eningite; Vacin ar con tra o saram po 95% da população m en or de 1 an o;

Im plantar o m onitoram ento das doenças diarréicas agudas (MDDA); Im plantar o program a de tuberculose. Detectar 100/100.000 hab.; Im plantar e executar as ações pactuadas no PEAa (controle da dengue).

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N os qu ad r os 1 e 2 bu scou - se d est acar al-gum as das m etas, de um total de 132. E, assim , é possível perceber a im portân cia do processo de com prom isso m ú tu o en tre os diversos n í-veis de govern o. Para defin ir os n ú m eros, to-m a-se a base h istórica e o n ível atu al da in ci-d ên cia e ci-d a p r evalên cia, ou a sit u ação ci-d os program as em execu ção n o m u n icípio. Cabe ao n ível est ad u al o acom p an h am en t o e a as-sessor ia técn ica par a qu e os m u n icípios pos-sam desem pen har su as tarefas e alcan çar êxi-to.

O quadro 3 ilustra o volum e total de repasse de recursos ao longo do ano de 1999, a m u n icípios do Estado do Rio, segu n do as popu -lações dos m esm os. Incluiu-se, além do PAB e d a PPI- ECD, os valor es t r an sfer id os p ar a o com bate à den gue. Este últim o valor varia em d ecor r ên cia d o gr au d e in fest ação d e cad a m u n icíp io. O s valor es, ap esar d e ap r esen t a-r em u m a evolu ção ca-r escen te, ain d a n ão ch e-gam a 10% dos recu rsos destin ados pelo SUS à assist ên cia m éd ica h osp italar e am bu lato-rial. Mas, com o os valores d est in ad os à at en -ção básica e ao controle de doen ças sem pre fo-ram in feriores a 2%, podem os con siderar u m avanço. Não estão incluídos percen tuais, a se-r em obse-r igat ose-r iam en t e ap licad os p elos est a-dos e m u n icípios, de recu rsos de seu s respec-tivos orçam entos fiscais. Estes percentuais deverão alcançar, segundo a nova legislação, cer -ca de 30% do repasse federal. Dessa form a, o

fin an ciam en to à saúde passa a en volver recur -sos dos três n íveis de govern o.

O qu ad r o 3 r evela u m a p r eocu p ação d os gestores federal, estadual e m un icipal em pro-m over u pro-m pro-m ecan ispro-m o copro-m pen satório epro-m fa-vor d e m u n icíp ios m en or es, d e for m a a lh es destinar ao m enos o m ontante de recursos in -disp en sável p ar a a execu ção d o con t r ole d e doenças (PPIECD). Isso significa prover m u n icípios m en ores com um adicion al de recur -so s e se r evela qu an d o se o bser va a var iação dos valores per capita, que receberam valores m aiores. Com o já referido, o grau de in festa-ção p elo Aedes aegypt it am bém d et er m in ou algu m as diferen ças n o valor per capita. Nova Fr ibu r go e Pet r óp olis, p or exem p lo, r ecebe-ram repasses m en ores dessa fon te.

Com o já d escr it o an t er ior m en t e, o sist e-m a d e fin an ciae-m en to d os r ecu r sos or iu n d os d o PAB, esp ecialm en t e aqu eles p r evist os n a p ar t e var iável e d a PPI- ECD, in d u z a u m a r eor gan ização d a for m a d e at en ção. E con -tem pla com m ais recu rsos os m u n icípios qu e im plan tar em for m as de assistên cia in ovado-ras tais com o as equipes de saúde da fam ília, a assistên cia ao d esn u tr id o, a far m ácia básica, os cen tr os d e con tr ole d e zoon oses, etc. Essa n ova m etodologia de repasse de recu rsos exige u m a m aior p ar t icip ação d e exigest or es e co -m u n id ad es n o p lan eja-m en t o e n a avaliação d as ações d e saú d e m u n icip ais. E con t r ibu i p ar a am p liar e qu alificar , atr avés d os con

se-Quadro 3

Recursos federais do SUS/Transferências em 1999 Municípios do Rio de Janeiro

Atenção Básica/PPI-ECD/Controle de Vetores

Município População Transferência Valor per capita

São José de Ubá 5.862 01.534,54 34,38

Areal 9.596 295.113,69 30,75

Sum idouro 14.118 424.105,52 30,71

Pin heiral 19.958 408.919,87 20,49

São João da Barra 29.861 731.667,31 24,50

Rio Bonito 47.670 888.414,21 18,64

Maricá 68.728 1.145.711,30 16,67

An gra dos Reis 98.229 1.938.010,52 19,73

Nova Friburgo 171.154 2.169.871,51 12,65

Petrópolis 282.182 4.252.923,04 15,07

Niterói 462.884 7.641.005,01 16,51

Duque de Caxias 758.738 11.415.824,44 15,09

Rio de Janeiro 5.613.897 82.971.512,66 14,78

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lh os m u n icip ais d e Saú d e, o con t r ole social exer cid o p or estes fór u n s, e p ar a con for m ar , através desses con selh os, o in teresse coletivo pela garan tia de aten ção in tegral.

Um segu n do aspecto ligado à in tegralida-d e r efer e- se à gar an t ia tegralida-d e acesso, tegralida-d o in tegralida-d iví-duo, aos diversos n íveis de aten ção, prim ário, secundário e terciário. A idéia de que níveis de com p lexid ad e est ejam r elacion ad os d ir et a-m en te, coa-m a-m en or ou a-m aior grau de especia-lização, leva à id éia d e a at en ção p r im ár ia à saú d e ap r esen t ar m en or grau de dificu ldade ou exigir m en or grau de conhecim ento ou ha-bilitação. Isso é u m equ ívoco, pois o n ível de com plexidade m ais básico do sistem a está relacion ado com a n ecessidade de con hecim en -tos m ais abr an gen tes, en qu an to os n íveis se-cu n d ár io e t er ciár io são m ais esp ecíficos ou parcelados/ especializados, e u sam in ten siva-m en te procedisiva-m en tos baseados esiva-m aparelhos e exam es. No n ível prim ário são utilizadas in -terven ções com en foque preven tivo, com un i-tário e coletivo, destin adas a aten der aos problem as m ais com u n s d a p op u lação. Por en -volverem determ in ação m ú ltipla, n ecessitam de um con hecim en to m uito diversificado dos profission ais, pois, n esse n ível, trabalha-se se-gun do a lógica da m ulticausalidade.

Ain da segu n do o con ceito de in tegralida-de, as pessoas são en caradas com o su jeitos. A aten ção deve ser totalizadora e levar em con ta as d im en sões biológica, psicológica e social. Este m odo de en ten der e abordar o in divídu o baseiase n a teoria h olística, in tegral, segu n -do a qu al o hom em é u m ser in divisível e n ão p od e ser exp licad o p elos seu s com p on en tes, físico, psicológico ou social, con siderados se-paradam en te.

A gar an tia d o p r in cíp io d a in tegr alid ad e, em su m a, im p lica d ot ar o sist em a d e con d i-ções relacion adas às diversas fases da aten ção à saú de, ao processo de cu idar, ao relacion a-m en to do p r ofission al d e saú d e com os p a-cientes. Indivíduos e coletividades devem dis-por de um atendim ento organizado, diversifi-cado e hum an o. Esse prin cípio, portan to, n ão exclu i n en hu m a das possibilidades de se pro-m over, preven ir, restaurar a saúde e reabilitar os indivíduos.

Par a se alcan çar a in t egr alid ad e n o sist e-m a de saúde faz-se n ecessário que os gestores m u n icipais, estadu ais e federais passem a dar prioridade a este princípio. Im plica perguntar se, n a prática cotidian a da gestão e da opera-ção d o sist em a d e saú d e, seu s p r essu p ost os

têm sido respeitados. Existem diversos m eca-n ism os os qu ais o gestor pode lan çar m ão pa-r a qu e est e p pa-r in cíp io seja cu m p pa-r id o. N esse sen tido, Giovan ella (2000) bu scou sistem ati-zar e apresen tar u m a m etodologia in ovadora para avaliar se os sistem as m u n icipais de saú de são m ais, ou m en os, in tegrais. Com o pon -t o in icial est a form a de organ izar o sistem a depen de da von tade política, ao se defin irem prioridades, e t am bém de m u dan ças organ i-zacion ais e da form a de gestão do sistem a de aten ção. Em su m a, o s sist em as in t egr ais d e saú de deveriam aten der a algu m as prem issas básicas, qu ais sejam : a pr im azia das ações de prom oção e preven ção; a garan tia de aten ção n os t r ês n íveis d e com p lexid ad e d a assist ên -cia m édica; a articu lação da ações de prom o-ção, preven o-ção, cura e recuperação; a aborda-gem in tegral do in divídu o e fam ílias ( Giova-nella, 2000).

Eixos reestruturantes do SUS: a vigilância da saúde e a estratégia da saúde da família

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saú-de-doença, especialmente do ponto de vista da sua determinação social. A partir daí busca desen-volver novas propostas de operacionalização dos sistemas de saúde, de forma a se respeitar uma vi-são que se pretende mais totalizadora.

O primeiro desafio a ser superado refere-se à dicotomia das ações dos setores envolvidos na as-sistência à saúde. O modelo de vigilância da saú-de posaú-de ser consisaú-derado um eixo reestruturante da m aneira de se agir em saúde. Seguindo esse modelo, os problemas de saúde passam a ser ana-lisados e enfrentados de forma integrada, por se-tores que historicamente têm trabalhado de ma-neira dicotomizada. Consideram-se os determi-nantes sociais, os riscos ambientais, epidemiológicos e sanitários associados e os desdobramen -tos, em termos de doença. Esse novo olhar sobre a saúde leva em conta os múltiplos fatores envolvi-dos na gênese, no desenvolvimento e na perpetua-ção dos problemas. Propõe ainda o envolvimento de todos os setores inseridos naquela realidade e vê o indivíduo e a comunidade como o sujeito do processo.

A vigilância da saúde tem no princípio de ter-ritorialidade sua principal premissa. O trabalho em saúde deve estar imerso no contexto territo-rial. Assim consegue-se definir problemas, e um conjunto de prioridades, bem como obter os re-cursos para atender às necessidades de saúde da comunidade considerando cada situação especí-fica. O território é entendido como o espaço onde vivem grupos sociais, suas relações e condições de subsistência, de trabalho, de renda, de habitação, de acesso à educação e o seu saber preexistente, como parte do meio ambiente, possuidor de uma cultura, de concepções sobre saúde e doença, de família, de sociedade, etc. Além de mudanças teó-ricas e metodológicas que permitem a ampliação de tecnologias para fazer frente aos problemas de saúde, a vigilância da saúde propõe que os agen-tes sociais sejam os responsáveis pelo processo de definição de problemas e pelo encaminhamento das soluções. O indivíduo é o objetivo final da vi-gilância da saúde, mas deve ser considerado parte da família, da comunidade, do sistema social, do ambiente. Qualquer ação de saúde que se preten-da realizar deverá incidir sobre este conjunto. Um indivíduo não existe sozinho, isolado. Todo ho-mem é resultado das relações que estabelece. O indivíduo autônomo, independente, é uma abs-tração ideológica, ligada a uma determinada vi-são de mundo. É preciso compreender que me-lhorar a qualidade de vida, promover a saúde de um indivíduo implica agir no contexto em que ele se insere, no espaço em que ele vive.

Para facilitar a compreensão das múltiplas di-mensões da proposta da vigilância da saúde, ire-m os abordar esta proposta segundo três níveis, quais sejam, os determinantes do processo saúde-doença, os riscos e os danos à saúde. Utiliza-se es-ta estratégia apenas para fins didáticos, já que en-tender a indissociabilidade da atuação sanitária é fundamental para as mudanças propostas. Utili-za-se como referencial teórico o modelo proposto por Teixeira, Paim e Vilasbôas (1998).

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sociais necessitam, para o seu sucesso, de uma abrangência e compromissos que extrapolam o território m unicipal. É necessário que se discu-tam novas formas de relações sociais, de organi-zações e estabelecimentos que atendam melhor às necessidades de saúde e de qualidade de vida dos idosos, das crianças, ou ainda, dos portadores de deficiência, dos trabalhadores e não só a assis-tência às suas doenças.

A 1aConferência Internacional sobre Promo-ção à Saúde, realizada em Ottawa, em 1986, emi-tiu a Carta de Ottawa, assim definindo a promo-ção à saúde: A promoção à saúde consiste em pro-porcionar aos povos os meios necessários para me-lhorar sua saúde e exercer um m aior controle so-bre a mesma. Para alcançar um estado adequado de bem-estar físico, mental e social um indivíduo ou grupo deve ser capaz de identificar e realizar suas aspirações, de satisfazer suas necessidades e de m odificar ou adaptar-se ao m eio am biente. A saúde se percebe, pois, não como o objetivo, senão como a fonte de riqueza da vida cotidiana. Trata-se, portanto, de um conceito positivo, que acentua os recursos sociais e pessoais assim como as atitu-des. Por conseguinte, dado que o conceito de saúde com o bem -estar transcende a idéia de form as de vida saudáveis, a promoção da saúde não concer-ne exclusivamente ao setor saúde(WHO, 1986).

A ampliação da definição de causa dos proble-mas de saúde exige a incorporação de novos sabe-res, tradicionalmente presentes em menor peso, no setor. As ciências sociais, o planejamento ur-bano, o planejamento estratégico, a geografia, a educação para a saúde, as ciências do meio am -biente, a comunicação social são algumas das dis-ciplinas necessárias.

O estabelecimento de ações intersetoriais de-ve permitir que, em cada área, surjam contribui-ções para a solução dos problemas de saúde. Esses problem as devem ser aqueles que em ergem de discussões comunitárias. As prioridades poderão assim transform ar-se em pautas positivas, pro-motoras de saúde. E a educação e a informação para a saúde passam a ser fundam entais nesse processo, na medida em que aumentam a cons-ciência sanitária dos cidadãos e intensificam a participação dos mesmos na definição de prioridades. O desenvolvimento sustentável vê o am -biente como realidade e totalidades integradas, e vê o homem como parte das mesmas, que são vi-venciadas segundo lugares singulares, segundo um a base territorial, segundo processos sociais vividos localmente. Assim é possível constituir-se um processo de reflexão coletiva sobre as condi-ções de vida das comunidades e sobre como estas

condições contribuem para o estado de saúde e para a qualidade de vida.

No processo de construção de ambientes/ in-divíduos/comunidades saudáveis são fundamen-tais conceitos como direitos de cidadania (lazer, moradia, trabalho, eqüidade, responsabilidade social pela saúde, participação, etc.). Essa dinâmi-ca necessita de determinadas ferramentas técni-cas, como o acesso à informação, à educação, à gestão dos recursos disponíveis, etc. É fundamen-tal um esforço de participação no planejamento, na análise das relações sociais e as condições obje-tivas de vida, reprodução e sobrevivência. É preci-so definir as possibilidades de cada ator preci-social e de todos para superar dificuldades, estabelecer compromissos e pactuá-los politicamente. É bom lem brar que pacto pressupõe um diálogo entre atores que se disponham a reconhecer a força uns dos outros, e não uma relação em que se busca o domínio e a imposição de um ator sobre o outro.

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Grupos técnicos que controlam roedores, mos-quitos, qualidade da água, alimentos, estabeleci-mentos, tuberculose, meningite, Aids, diarréia, sa-rampo, hanseníase, câncer, tabagismo, diabetes, hipertensão, DST, todos a atuar segundo suas próprias rotinas, sem nenhum a articulação ou planejamento, duplicando e segmentando uma realidade que é indivisível e inter-relacionada. Va-le ressaltar que, em alguns casos, essas equipes es-tão constituídas de m aneira desigual e algum as delas sequer atuam. Devido à ausência de recur-sos para financiá-las limitam-se a “contar carecur-sos”. Dentre muitos exemplos deste problema a supe-rar pode-se destacar o caso da dengue. Seu ressur-gimento é resultado da ocupação urbana mal planejada, da falta de saneamento, do aumento in -discriminado da produção de embalagens descar-táveis e pneus, sem coleta e de destinos adequa-dos, da degradação do meio ambiente, das condi-ções de habitação, de hábitos de famílias e comu-nidades sobre a existência de focos e do modo de transmissão, da capacidade de adaptação do vetor às novas condições, etc. A destinação de, por ve-zes, vultosos recursos para a contratação de “ma-ta-mosquitos” e “fumacês” em época de epide-mias está diretamente relacionado à ausência de recursos e ações sobre os riscos que as provoca-ram. Ao contrário, cada comunidade deveria es-tar sendo orientada e provida de meios para me-lhorar as condições sanitárias e ambientais e a re-duzir os riscos de transmissão. Para isso seria im-prescindível que se promovesse a consciência sanitária por meio da educação para a saúde, a in -tervenção sobre o lixo domiciliar, sobre a qualida-de da água, do saneamento e das condições qualida-de moradia. Os agentes responsáveis por essa atua-ção não poderiam, como ocorre hoje, estar exclu-sivamente voltados para um vetor, um mosquito, mas para as condições de risco social, sanitário, epidemiológico e ambiental como um todo. Esta-riam assim contribuindo para a redução efetiva de inúm eras outras doenças associadas e essas condições, como a leptospirose, as hepatites, a diarréia, etc.

O terceiro nível de atuação refere-se à assis-tência propriamente dita. Que modelo assisten-cial poderia atender satisfatoriamente ao conjun-to de pressuposconjun-tos e desafios colocados pela inte-gralidade? Como já foi abordado aqui, apesar de concebidos para esse fim, a existência de postos e centros de saúde não garante necessariamente es-sa atuação transformadora. São necessárias algu-mas condições prévias para que os princípios da promoção e da prevenção passem a reger o fun -cionamento dos serviços de saúde. Mais uma vez

a vinculação das equipes ao território e a conti-nuidade da atenção são imprescindíveis. Permi-tem o estabelecimento, a partir da identificação de problemas e da eleição de um conjunto de prioridades, do planejam ento do trabalho em saúde. As equipes locais devem trabalhar dessa forma, exercendo o papel de coordenação das ações de saúde em cada microárea do município. São esses os responsáveis pelo atendimento pri-mário, pela decisão de se acessar os recursos dis-poníveis pelo atendimento primário, pela decisão de se acessar os recursos disponíveis no sistema m unicipal de saúde e de outras instâncias para atender aos problemas detectados. Contribuir pa-ra a organização da comunidade no esforço de melhorar as condições de saúde. A equipe local é, portanto, responsável por todos os aspectos im -plicados com a saúde e tem por objetivo partilhar com a comunidade os possíveis caminhos e as de-cisões a respeito da promoção, da prevenção e do atendimento à saúde das famílias a ela referidas. Note-se ainda que o papel exercido por tais equi-pes evita que o próprio indivíduo, ou a família, to-me para si, a responsabilidade de decidir a respei-to da busca por serviços, atendimenrespei-tos, exames, etc. É comum constatar que, por falta dessa equi-pe local que a oriente, a população procura os ser-viços, em busca de atendimentos especializados, a partir de sua própria percepção de necessidades. A partir de um sinal e sintoma, elege um suposto especialista que possa resolver o problema. O re-sultado desse comportamento pode ser verifica-do na porta verifica-dos serviços de saúde, com filas inter-mináveis desde a madrugada.

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pa-cientes, nos consultórios, com suas queixas recor-rentes, diante das quais os profissionais se sentem impotentes, incapazes de agir de forma eficaz. É indispensável que o profissional tenha mais sen-sibilidade, escute o outro, saiba o que ele pensa, numa postura que não seja distante e impessoal. E talvez esta postura o leve a expor, clara e direta-mente ao paciente, as possibilidades e os limites da intervenção através do serviço de saúde e passe a buscar, de forma criativa, novas possibilidades de superação dos problemas identificados.

Em diversos países do mundo, como a Ingla-terra, Canadá, Espanha, Holanda, Cuba, México, entre outros, cabe ao médico de família o papel de prestar o primeiro atendimento e coordenar as ações de saúde para um conjunto específico e fa-mílias de uma comunidade. No Brasil, desde a dé-cada de 1980 foi criado program a de residência médica em medicina geral comunitária assim co-mo a Sociedade Brasileira de Medicina Geral Co-munitária. Apesar do movimento de mudanças curriculares voltado para a formação de médicos generalistas, os impasses advindos da indefinição de uma política de atenção básica no país resulta-ram em grande prejuízo ao ensino de pós-gra-duação, especialmente devido à baixa procura desse profissional pelos sistemas locais de saúde.

Essa tendência começou a ser revertida devi-do à iniciativa de municípios em implantar Pro-gram as de Agentes Com unitários de Saúde e de Medicina de Família. Esses projetos, inicialmente isolados, se dissem inaram e resgataram , para a sociedade e para os sistemas locais de saúde, a fi-gura do médico da família e comunidade. Passou-se então a questionar a estratégia anteriormente adotada, de organização das unidades básicas de

saúde, baseada no trabalho de assistência médica por especialidades básicas. A partir de 1995 o Mi-nistério da Saúde assumiu o compromisso de im-plantar o Programa de Saúde da Família em todo o território nacional. Ocorreu então a aceleração do processo de constituição de equipes, tornan -do-se um consenso a importância do médico de família para compor e liderar as ações previstas na Atenção Básica à Saúde (UERJ, 1998).

Atualmente o Programa de Saúde da Família tornou-se a estratégia prioritária de reformulação do modelo assistencial da atenção básica, estando já implantadas cerca de 10.000 equipes de saúde da fa-mília no país. Esse número encontra-se em constan-te evolução, dado o ritmo de crescimento do total de equipes no país. Estas são, geralmente, compostas por um médico, uma enfermeira, um auxiliar de en-fermagem e entre 6 e 8 agentes comunitários de saú-de. Recentemente foram incluídos na equipe profis-sionais de saúde bucal.

No quadro 4 estão listadas as principais atribui-ções das equipes de saúde da família, segundo o Mi-nistério da Saúde.

Como pode ser verificado, as atribuições das equipes guardam grande coerência e sintonia com os princípios da vigilância da saúde. A saúde da fa-mília pode, portanto, ser considerada o espaço das práticas de um novo modo de conceber o sistema de saúde. Essa nova lógica de atuação não deve se limi-tar à saúde da família, mas, sim, disseminar-se por todos os serviços, desde as unidades básicas até as unidades hospitalares. Outros aparelhos sociais pre-sentes em cada local devem estar também contribu-indo para essa lógica assistencial. Deve-se buscar, nos programas de saúde coletiva, o estabelecimento de propostas de ação conjunta voltadas para

solu-Quadro 4

Atribuições das equipes de saúde da fam ília segun do o Min istério da Saúde

• Conhecer a realidade das fam ílias (socioeconôm ica, psicológica, cultural, dem ográfica e epidem iológi-ca)

• Iden tificar problem as de saúde e situações de risco • Elaborar plan os locais de saúde

• Valorizar o vínculo, a continuidade e a relação de confiança • Executar ações de vigilân cia epidem iológica, am bien tal e san itária

• Desenvolver ações voltadas para o controle da hanseníase, tuberculose, DST/Aids, doenças crônicas, ligadas ao trabalho e ao m eio am bien te

• Resolver a m aior parte dos problem as e garan tir a referên cia

• Prestar assistên cia in tegral e prom over a saúde através da educação para a saúde • Desenvolver a auto-estim a, o apoio m útuo, o autocuidado, a troca de experiências

• Prom over ações in tersetoriais e parcerias com organ izações para a m elhoria da qualidade de vida e do m eio am biente

• Incentivar a form ação e a participação nos conselhos de Saúde.

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cionar problemas relevantes e particulares de cada território, agregando contribuições de diversas áreas técnicas, contribuindo assim para que as equi-pes locais possam estar capacitadas a tratar proble-mas de forma integral.

A título de ilustração podemos descrever um ca-so ocorrido no interior do Estado do Rio de Janeiro. Em determinada região começaram a surgir casos de infecção de pele, em membros superiores, em ho-mens adultos. Em um modelo convencional de as-sistência à saúde, provavelmente esses indivíduos te-riam procurado um pronto atendimento de um ser-viço municipal e solucionado o problema através de antibióticos. Até porque, segundo uma demanda es-pontânea dos indivíduos a locais distantes de sua moradia, não haveria porque suspeitar, a não ser que o problema tomasse um vulto maior, de associações

causais ligadas ao território específico a que esses in-divíduos pertenciam. Não foi esta a dificuldade da equipe de saúde da família que atuava no local onde surgiram estes casos (Figura 1).

Tão logo surgiram as primeiras infecções, os in-tegrantes da equipe de saúde da família imediata-mente perceberam a relação entre a ocorrência dos sintomas e o fato de esses indivíduos serem orde-nhadores. A facilidade de acesso ao território permi-tiu-lhes identificar que as vacas sofriam de uma zoo-nose, na região das tetas. Para o homem, essa infec-ção não acarretaria maiores prejuízos, mas teria gra-ves conseqüências para a produção de leite e, por sua vez, para a sobrevivência das famílias. Caso aquele vírus não fosse controlado, toda a região sofreria gravemente, pois haveria queda da produção de leite em virtude da infecção dos animais.

As equipes foram capazes de mobilizar a comu-nidade e acionar setores ligados à vigilância sanitá-ria, agricultura, epidemiologia, associações e grupos de produtores rurais e isolaram os animais infecta-dos. Este é um caso exemplar de como as equipes de saúde devem trabalhar segundo o contexto social, econômico, sanitário, assistencial, a partir de um no-vo pensar e um nono-vo agir em saúde. Mostra ainda que a equipe não tem necessariamente de dominar todo o conhecimento sobre as múltiplas ocorrên-cias e agravos que acometem a comunidade, mas sim estar atenta às possíveis relações existentes entre o adoecer e a vida cotidiana de seus integrantes. Ao tomar para si essa gestão da saúde local, a equipe po-de acionar os diversos setores e especialistas que ca-da caso requer.

Conclusão

Este capítulo buscou definir o Sistema Único de Saúde como um processo em construção. Con -ceitos e concepções acerca das análises e práti-cas da saúde são frutos de construção coletiva, em que as vertentes técnica e política se entre-laçam. Se a Constituição brasileira possibilitou a conformação de um modelo para o sistema de saú de, ou tras m edidas devem tran sform ar o cotidian o das organ izações e do trabalho em saúde. Novas form as de financiam ento, novos in stru m en tos de an álise da realidade, n ovos modos de estruturação de equipes que vão agir em saúde devem ser pen sadas para se alcan ça-rem prin cípios com o eqüidade, in tegralidade, participação da com u n idade. Se por u m lado, criaram -se diversos espaços de pen sam en to e de práticas in ovadoras, por outro, assiste-se a ten tativas, às vezes in con fessáveis, de

terceiri-Figura 1

Seqüên cia após diagn óstico de in fecção de pele por um a equipe de saúde da fam ília

Infecção de pele diagn óstico e tratam en to

Associação causal investigação/cenário ordenhadores

Vigilância epidem iológica e ambiental (Zoonose/ Cowpox)

Im pacto social e econôm i-co

Redução produção leiteira Desem prego

Vigilân cia san itária isolam ento/elim inação gado contam inado

In form ação e educação para a saú de

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zação e privatização da rede pública, do avanço da cobertura dos plan os de saúde privados, da idéia de atenção básica com o um pacote m íni-m o de ações voltadas para a assistência aos po-bres. Evidentemente que se buscou demonstrar a viabilidade de se alcan çar um Sistem a Ún ico de Saúde calcado n a resolutividade de proble-m as de saúde coproble-m o uproble-m beproble-m público. Especialm en te afirEspecialm ase aqu i a factibilidade de se en -fren tarem os problem as de saúde vividos pela sociedade brasileira com o u m a totalidade so-cial, am biental, sanitária, epidem iológica e as-sistencial. Essas idéias e utopias foram vividas, em outras dim en sões e circun stân cias históri-cas, por m u itos dos qu e n os an tecederam n o serviço público de saúde. En tre eles, podem os

Figura 1

Aspectos conceituais, princípios e características do SUS, 11aCNS/MS, 2001

Reforma Proposta para a dem ocratização do país

Resultado das con dições de vida das pessoas

Não con seguida apen as com assistên cia m édica m as prin cipalm en te pelo acesso das pessoas a:

• Em prego • Salário justo • Educação • H abitação • Saneam ento • Tran sporte • Alim entação • Cultura • Lazer

Acesso a um sistem a de saúde digno e de qualidade

Direito de todos e dever do Estado

Saúde

citar Osvaldo Cruz, Miguel Couto, Afrânio Pei-xoto, Carlos Chagas, J. P. Fontenelle, Carlos Gen tille de Melo, Cecília Don n ân gelo, David Capistrano.

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Artigo apresentado em 17/12/2002 Aprovado em 20/1/2003

Referências

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