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Em busca do estar melhor do ser familiar e do ser-com aids

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CURSO DE MESTRADO EM ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM

EM BUSCA DO ESTAR MELHOR DO SIR - FAMILIAR

E DO SER - COM AIDS

Stefa

7

Ka/U&

Tfíetifo 'Padoùt

O ntettfadvta: 'D’î*' ‘l/ivina

de

(2)

EM BUSCA VO ESTAR MELHOR VO SER

-

FAMILIAR

E VO SER

-

COM AIVS

Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre. Curso de Pós - Graduação em Enfermagem, Mestrado em Assistência de Enfermagem, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina. Modalidade expandido, Polo III - Santa Maria - Universidade Federal de Santa Maria. Orientadora: Dr” Vivina Lanzarini de Carvalho.

FLORIANÓPOLIS 1998

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Modalidade Expandido - Polo III Universidade Federal de Santa Maria - RS

EM BUSCA DO ESTAR MELHOR VO SER - FAMILIAR

E DO SER -

COM AIDS

SfeCa THovtia, de IHeCia “Padoút

Esta dissertação foi submetida ao processo de avaliação pela Banca Examinadora para a obtenção do título de MESTRE EM

ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM, sendo aprovada em 08 de outubro de

1998, e atendendo às normas de legislação do Curso de Pós - Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC.

Dr8 Vivina Lanzarínf de Carvalho - Presidente

Dr" ívis Emilia Oliveira de Souza - Membro

_Q¿_Alac©<íue Lorenziné-Erdmann - Membro

Dr“ Vera Regina Real Lima Gíjcia - Suplente

V

Ju ^ c a c u (^joRortnrU,. /\lS Lç4c.- Dda Carmem Lúcia Colomé Beck - Membro

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LISTA DE FIGURA...v

LISTA DE QUADRO... ... vi

RESUMO ... víi ABSTRACT... viií PARTE 1. MINHA TRAJETÓRIA... 9

PARTE 2. DELINEANDO O ESTUDO E OS PROPÓSITOS... 15

PARTE 3. FUNDAMENTAÇÃO DO ESTUDO...21

Um olhar sobre a AIDS... 22

A inquietação no olhar - Estigma e preconceito na AIDS...25

A família de hoje e a compreensão de seus significados...30

Integrando os familiares à dinâmica do cuidado... 36

Algumas idéias acerca do existencialismo e da fenomenología... 47

O encontro de Martin Buber...52

A Enfermagem com diálogo vivido...55

PARTE 4.TRAJETÓRIA METODOLÓGICA... 62

Tipo de estudo... 62

O espaço e a temporalidade do estudo... 63

Coleta de dados e a Ética...64

Os sujeitos do estudo... 65

O desvelar do cuidado mediado por Paterson e Zderad...71

PARTE 5. EMPREENDENDO O ESTUDO FENOMENOLÓGICO... 74

Análise e descrição das significações e vivências... 74

Interpretação compreensiva...89

PARTE 6.CONSIDERAÇÕES FINAIS... 95

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 101

ANEXOS...111

Instrumento preparado para o ser-com AIDS... 111

Entrevista semi-estruturada aplicada ao ser-familiar do ser-com AIDS... 112

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Figura 1: Representação da situação de Enfermagem Figura 2: Família como ambiente de suporte na AIDS

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O estudo foi realizado com o propósito de compreender o que sente o ser-familiar do ser-com AIDS para que possa estar melhor, mediado pelos cuidados de enfermagem. A prática assistencial foi realizada tendo como cenário o Hospital-Dia do Hospital Universitário de Santa Maria - RS, onde aconteceram os trinta e quatro encontros que compõem a descrição ingênua. A Teoria de Enfermagem Humanística de Paterson & Zderad (1988) e os estudos de Luiz Osorio (1997) apoiaram a relação dialógica estabelecida, que permitiu a descrição das vivências e o partilhar do impacto da doença e das angústias, bem como dos momentos de alegria e de esperança do ser-familiar. A trajetória metodológica, inserida numa abordagem fenomenológica, foi amparada por idéias de Martin Buber e de Paterson e Zderad, que possibilitaram obter, analisar e interpretar os significados atribuídos pelo ser- familiar. Estes ^permeiam a percepção da família como um valor, com responsabilidades, necessidade de reorganizar-se e o estar disponível. O ser-familiar enquanto um ser-no-mundo-com-o-outro desvela-se com um certo grau de vulnerabilidade para a AIDS e aponta as questões éticas, o estigma e o preconceito que envolvem esta síndrome. Percebi que as situações de enfermagem ficam ampliadas em suas dimensões educacionais, éticas e humanas, reforçando-se assim o compromisso autêntico do enfermeiro junto do ser-familiar; e que a enfermagem pode, através da compreensão do que sente o ser-familiar, da apreciação em conjunto das escolhas, ação educativa, envolvimento e presença, desencadear o processo de estar melhor das pessoas em seu cotidiano.

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This study was made with the purpose o f understanding what the familiar-being o f the SIDA-being, feels in order to be better mediated by the Nursing Care. The assistant practice was made having as background the Day Hospital o f Santa Maria University Hospital where the thirty four meetings that compose the ingenuous description happened. The Humanistic Nursing Theory from Paterson & Zderad (1988) and Luiz Osorio's studies (1997) supported the dialogical relationship that was established, allowing the description o f the livings and the sharing o f both the disease and the anghish as well as the happiness and hope moments o f the familiar- being. The methodological career inserted in a fenomenological approach had the support o f Martin Buber and Paterson and Zderad ideas, making possible to get, to analyse and to interpret the meanings attributed by the familiar-being. These meanings permeate the familiar perception as a value, with responsabilities, the need o f reorganizing and being available. The familiar-being as a being-in-the-world-with- the-other-one is careful with a certain degree o f vulnerability to the SIDÀ and points out to the Ethic questions, the stigma and prejudice that involve this syndrome. I realized that the Nursing situations become wider in their educational, ethic and human dimensions, reinforcing the authentic compromise o f the nurse in conjunct to the familiar-being; and that the Nursing can, through the comprehension o f the familiar-being feelings, through the conjunct assessment o f the choices, the educative action, the presence and involvement, to unchain the process o f being better o f the people in their everyday life.

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MINHA TRAJETÓRIA

Considerei relevante descrever minha trajetória pessoal e profissional, compreendendo1 que é da instância da experiência ou do que é nosso conhecido, pela sensibilidade e por nossa visão de mundo, que emergem os significados das vivências e as inquietações que ocorrem frente aos cenários do nosso dia-a-dia. Através do eu-no-mundo-com-o-outro é possível desvelar o ser humano e o seu coexistir nos aspectos individuais e familiares.

Com este olhar é que procuro, inicialmente, pontuar os momentos significativos na minha própria construção como ser-no-mundo, colocando-me como pessoa com inquietações.

Para dar início busco nas minhas raízes familiares a contribuição marcante de minha formação pessoal e profissional. Minha família sempre foi o meu ancoradouro. É nela que encontro as minhas referências, a sensibilidade e o alento para vencer obstáculos. A sabedoria e o modo solidário de meus avós, meus pais e irmãos no agir e ver o mundo. É também junto de meu esposo e dos nossos filhos que encontro forças para estar melhor a cada dia.

Foi com esta família que iniciei minha formação profissional, no período de 1981 a 1985, na Universidade Federal de Santa Maria - RS, marcada pelo sentimento de conquista da profissão certa. Os ideais humanísticos da escola eram vistos com grande entusiasmo pelos professores, embora fossem também aprofundadas as questões de desenvolvimento de técnicas em um tempo e seqüências rigorosos, com ênfase no paciente hospitalizado e no aspecto curativo. Questões estas que eram envolvidas pelas concepções e paradigmas da época, especialmente marcadas pelo pragmatismo e o tecnicismo, que permeavam a prática profissional.

1 após a leitura do texto denominado - Fenomenología na linha heideggeriana - de autoria da Dr3 Ivis Emilia de Oliveira Souza (1998).

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Concomitantemente a AIDS ou SIDA (Síndrome da Imuno-deficiência Humana) surgía nos Estados Unidos da América, no inicio dos anos 80 (Montagnier, 1995), como nova entidade nosológica, era urna síndrome que destruía as defesas do organismo. Não trazia preocupações: além de ser pouco conhecida estava acontecendo e se difundindo em um mundo muito distante, geográfica e economicamente, “fora de nossa realidade” de terceiro mundo.

Imediatamente após a conclusão do curso de enfermagem, dei início ao Curso de Especialização em Pedagogia da Enfermagem Médico-Cirúrgíca, na Faculdade de Enfermagem Nossa Senhora Medianeira - FACEM, e em junho de 1986 concluí a monografia que tem como título - Reação dos pais frente ao filho dependente de Cannabis sativa, um estudo exploratório com familiares que procuravam o consultório psiquiátrico para consulta médica individualizada.

Foram sugestões daquele trabalho a educação para a prevenção das drogas, a informação para os pais sobre transformações, desenvolvimento fisiológico e psicológico do adolescente e principalmente que a enfermagem pode, através destas ações, diminuir a ansiedade dos pais, proporcionando-lhes mais segurança para tratarem do assunto (Padoin,1986). Percebi o quanto os familiares (pais, irmãos e outros parentes) podem contribuir junto de alguém que vive esta experiência, chamando por ajuda e presença.

Após o término deste trabalho e com a ansiedade de participação natural de recém - formados tive a minha primeira experiência profissional num Hospital Geral, em Rosário do Sul, o único daquela cidade do interior do Rio Grande do Sul, exercendo uma prática através do modelo biomédico já vivenciado na academia, onde o paciente era um ser total e único. Hoje me questiono, onde estava seu familiar durante aquele período? Esta prática incomodava-me muito, em virtude de intuir que a relação com os pacientes poderia ser diferente, mas o estereótipo de supervisora do serviço foi-me veementemente lembrado neste ano de experiência profissional pouco tranqüila.

Nesta época a AIDS já não era uma doença nova e estava mais próxima, aumentava o número de casos em São Paulo e Rio de Janeiro. Um comitê internacional, neste ano, 1986, recomendou o termo HIV para denominar o vírus da imuno-deficiência humana e reconhece ser este o vírus HTLV-III (vírus linfotrófico humano tipo III) isolado por Robert Gallo, nos EUA e também ser o LVA (vírus associado a linfoadenopatia), descoberto por Luc Montaigner, na França (Montaigner, 1995). Com certeza, a doença possuía uma forma de transmissão

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específica ou um “grupo de risco” e a maioria dos profissionais, como eu, acreditavam que para chegar ao Rio Grande do Sul levaria muito tempo.

Em 1987, morando no município de Cruz Alta - RS, iniciava minha experiência como docente no Curso Supletivo Para Formação Profissional de Auxiliares de Enfermagem, atividade que teve seguimento em Santa Maria - RS na Faculdade de Enfermagem Nossa Senhora Medianeira - FACEM, até o ano de 1994.

Durante este período aprendi ou deixei que emergisse o entendimento de que o paciente é um ser humano único, que possui sentimentos singulares, como a ansiedade e o medo de permanecer no anonimato. Partilhava estes sentimentos com os alunos do Curso de Auxiliar de Enfermagem, introduzindo nos conteúdos programáticos de minhas aulas aspectos sobre a hospitalização, a

V

comunicação em enfermagem, a humanização no fazer enfermagem e o paciente com um ser-no-mundo que possui um passado, uma história e uma família.

Na prática, o fazer as técnicas em tempo hábil ainda era o mais importante e o curto período de estágio ou do curso não permitiam aprofundamentos. Por outro lado, já se discutiam, em campo de estágio, as precauções universais para todos os pacientes, até mesmo porque a AIDS agora era uma “realidade” e seu diagnóstico não era revelado para a equipe de enfermagem. Isto era muito discutido entre nós, mas argumentavam, que o medo e a discriminação poderiam ser mais fortes, atuando como barreira à nossa disposição de fazer.

Em 1994, iniciei minhas atividades assistenciais no Hospital Universitário de Santa Maria, na Clínica Médica I, durante o turno da noite, é durante o dia continuava ministrando aulas, nesse momento para o Curso de Enfermagem na Faculdade de Enfermagem Nossa Senhora Medianeira - FACEM, na disciplina de Enfermagem Médico-cirúrgica.

Nesse cotidiano uma inquietação surge: o “fazer-com" que preconizava e ensinava em sala de aula, não era a realidade dos plantões que vivenciava. Além disso, as internações de pessoas com AIDS eram em média oito por semana, com um índice elevado de óbitos. No dia-a-dia da unidade, o fazer da enfermagem não era diferente daquele que conheço por tecnicista, e o estigma e preconceito em relação ao ser - com AIDS estavam fortemente marcados no cotidiano da enférmagem, da medicina e demais profissionais da equipe de saúde.

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Observava as pessoas que realizavam atividades junto do ser-com AIDS e identificava os profissionais médicos e residentes que faziam o diagnóstico, solicitavam exames, prescreviam a terapia medicamentosa e assinavam os atestados de óbito. Acompanhava o trabalho das nutricionistas que se responsabilizavam pela dietas e dos fisioterapeutas que, quando solicitados, realizavam exercícios terapêuticos. Também observava os técnicos do serviço de laboratório que coletavam material para exames e ou realizavam hemoterapia e o pessoal auxiliar de serviços de limpeza e alimentação.

Diante deste cenário, constatei que a única equipe que permanecia 24 horas contínuas na unidade de internação era a de enfermagem, onde os auxiliares de enfermagem, sob orientação e conjuntamente com os enfermeiros, realizavam cuidados de higiene, conforto, medicação, transporte e atendiam com dedicação e carinho a todos os chamados de ajuda, de dia e de noite.

Ao me inserir no cuidado do ser-com AIDS, surgiram inúmeras situações de enfermagem e também indagações. Entre as indagações surgem: Quem é aquela pessoa que esta junto do ser-com AIDS? O acompanhante é um familiar? E como ele está? Como se sente?

Encontrei em Becker (1995) algumas respostas e outras indagações em relação ao acompanhante, esta autora nos diz que o acompanhante, na maioria das vezes, é um familiar e ”sua presença não tem nos preocupado, ele simplesmente está lá” (p.02) e ela nos pergunta o motivo pelo qual nos esquivamos, se por medo do questionamento ou pelo temor de oferecer respostas vazias?

Estas questões cada vez mais me incomodavam, como poderia se fazer um cuidado mais voltado para o ser humano, além do biológico, e considerando a sua história de vida, o seu mundo junto com outros seres humanos? É sabido que o homem não está sozinho no mundo. Inserido em uma família, pertence a uma sociedade e possui uma cultura própria. É um ser livre, tendo possibilidades de escolhas que podem ser renovadas.

Nas singulares madrugadas de plantão nesta unidade, comecei a descobrir que o paciente possui um acompanhante e que este ser está angustiado, com medo da doença, (des) informado e, lembrando Becker (1995), não possui o mesmo preparo que a enfermagem para prestar o cuidado, mas é lembrado por esta que está ali também para isso - cuidar do ser-com AIDS. Naquele momento começava a perceber o familiar como um ser-no-mundo-com-o-outro.

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Ao ingressar no Mestrado e ao mesmo tempo (no mesmo dia) no quadro de pessoal do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria, como Professor Auxiliar, outros horizontes foram vislumbrados. O Curso de Mestrado em Assistência de Enfermagem teve papel relevante na ampliação de meus conhecimentos sobre Familiar, Família, Ser Humano, ser-com AIDS e, principalmente, no repensar a minha prática.

Foi durante a minha prática assistencial no Hospital Dia do Hospital Universitário de Santa Maria - HUSM, que o compartilhar das experiências vividas pelo ser-com AIDS e seus familiares me levaram a refletir sobre esta realidade. Surgiram, a partir daí alguns questionamentos que busco responder. Um deles é: compreender o que sente o familiar do ser-com AIDS e como a enfermagem, através do cuidado, pode ajudá-lo a alcançar o estar melhor nesta experiência existencial. Uma outra é a integração do ser-familiar no cuidado do ser-com AIDS, apesar das angústias ou medos e sem preconceito ou discriminação.

Estas inquietações são amenizadas no encontro com a filosofia do ser- com e fazer-com da Teoria de Enfermagem Humanística2 de Paterson & Zderad. Esta teoria foi editada pela primeira vez em 1976, período em que se colocava em evidência o valor do ser humano nos cuidados de enfermagem. Foi organizada, a partir das experiências das autoras como enfermeiras assistenciais e docentes, e publicada em 1988, no livro “Humanistic Nursing”.

A abordagem fenomenológica e existencialista contemplada no modelo conceituai das referidas autoras, veio me auxiliar nestas inquietações, porque favorecem reflexões que facilitam a busca de respostas à condição fenoménica que, segundo Abbgnano (1982), é a condição pela qual algo só existe na medida em que se manifesta e, por conseguinte, transcende e fundamenta o conhecimento que se tem dela. Ela pode levar os homens (Buber,1977) a descobrirem a realidade vital de suas existências e a abrirem os olhos para as situações concretas que estão vivendo.

Ao incluir na minha trajetória de vida a realização do presente estudo, fiz uma opção desafiadora e que, em alguns momentos, me deixou perplexa. Isto

As autoras são Josephine G. Paterson, especialista em Enfermagem Clínica em New York, Mestre pelo John’s Hopkins School o f Hygiene and Public Health, Baltimore, Maryland e Doutora em Ciências da Enfermagem pela Universidade de Boston e Loretta T. Zderad, Mestre em Ciências pela Catholic University de Washington (Praeger & Hogarth,

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ocorreu porque não tendo formação filosófica, precisei minimizar os efeitos desta minha limitação fazendo estudos independentes e pesquisa bibliográfica sobre a temática para encontrar o caminho que desejava trilhar.

Esse percurso não era uma volta a um intuicionismo simplista e nem uma pausa na utilização de procedimentos metodológicos pautados nas relações de causa e efeito, adequados a uma visão do ser como algo definido. A fenomenología põe em evidência que os seres humanos não são objetos e, mais ainda, nos ensina que suas atitudes não podem ser vistas como simples reações (Martins, 1992). Para Souza (1993) a fenomenología favorece os fenômenos humanos e sociais porque se fundamenta no fenomenal, na busca do em-si- mesmo, valorizando o mundo da vivência.

Queria voltar-me mais para os fenômenos do que para os fatos e vislumbrar mais os aspectos indefinidos do ser humano, procurando uma relação díalógica/existencial com o familiar do ser-com AIDS. Nesse sentido, as diretrizes de Paterson e Zderad foram de grande valia, pela aproximação com a abordagem humanística em enfermagem e pela aprendizagem da linguagem fenomenológica.

Corroborando com essas idéias, a relação dialógica ensinada por Martin Buber3, em sua obra denominada EU - TU#, permitiu-me delinear o estudo que espero, integre minha trajetória, não como algo pronto e acabado, mas como um estímulo para novas reflexões, minhas e de outras pessoas, sobre o que há de mais característico no ser humano - sua humanidade é o sentido de sua existência.

3 Martin Buber (1878 - 1965) - Considerado um pensador, desenvolveu a Filosofia do Diálogo como uma questão entre os diversos tipos de relações entre os homens, homens e homens e homens e coisas. Sendo fundamental a relação SUJEITO-SUJEITO que constitui o mundo do “TU” e a relação SUJE1TO-OBJETO, o mundo do “ISSO” (Mora, 1994 - Dicionário de filosofia).

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DÍLINIANVO O ÍSTUVO £ OS PROPÓSITOS

Creio que poderíamos estar falando de qualquer outra doença, mas, neste momento, procuro explicitar porque a minha escolha recaiu sobre a AIDS e pretendo pontuar as questões que indicam que a epidemia está ganhando novas dimensões. Além da contínua progressão mundial - a cada dia, 16 mil pessoas são infectadas no mundo - temos na África uma situação alarmante: no Zimbábue 25,8% dos adultos têm o vírus, o Programa das Nações Unidas para AIDS (UNAIDS) informa que a África negra tem mais que o dobro dos contaminados de todo o resto mundo (AIDS, 1998).

No Brasil tem-se 0,63% da população adulta soropositíva, o número de municípios com casos diagnosticados mais que triplicou nos últimos dez anos (AIDS, 1998). Desde a descoberta da síndrome, ocorreu um aumento significativo nas mulheres, na população de baixa renda e nos municípios com menos de 500 mil habitantes, o que se chama de “interiorização” da doença (Estratégia, 1998).

A vigilância epidemiológica mostra-nos um aumento acelerado na região Sul do Brasil, especialmente no Rio Grande do Sul e em cidades do interior, universitárias e/ou portuárias. O fenômeno, visto no início da epidemia no Rio de Janeiro e São Paulo, está acontecendo agora neste Estado, observando-se uma participação cada vez maior de indivíduos de baixo ou nenhum grau de escolaridade, com atividade heterossexual, mulheres e usuários de drogas injetáveis (Ferreira & Valente, 1997).

A realidade epidemiológica é uma incidência acumulada de 7.564 casos no Rio Grande do Sul e de 142 na cidade de Santa Maria (RS, 1998) o que me leva a acreditar que, a cada dia, um número maior de famílias passe pela experiência de ter um filho, irmão, pai ou mãe com AIDS em sua casa, pois não há um sujeito social isolado, elé sempre tem uma família.

Nascemos em uma familia e estamos destinados a viver dentro dela, numa interdependência que é inerente aos seres humanos, pois, necessariamente

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os indivíduos relacionam-se com os outros em um tempo e espaço. A família é para o indivíduo a manifestação mais expressiva de seu passado, presente e futuro.

Acredito que, se concebermos a família como um valor universal, sem analisar o tipo de família, se é nuclear, extensa ou abrangente, ou, ainda, se possui vínculos de laços sangüíneos, laços de amizade ou afetivos e, mais, se compreendermos que esta família tem um significado para cada pessoa, poderemos então entender que na AIDS, esta família de referência poderá dar o significado para o ser-com AIDS de querer continuar vivendo, quando encontra um ambiente de suporte ou, de não querer viver, quando é abandonado.

Esta vivência do ser-com AIDS poderá ser melhor compreendida ao considerarmos, junto com este e com seu familiar, que a doença desarticula a existência do ser humano, abala e fragiliza a estrutura familiar. Então iremos reconhecer que, ao vivenciar a enfermidade de seus familiares, o ser humano tem que se adaptar às mudanças já ocorridas e predispor-se a partilhar das expectativas futuras.

O ser familiar não sabe o que o tempo lhe reserva, ele terá que acompanhar alguém a quem é ligado por laços sangüíneos, de amizade ou afetivos num caminhar novo repleto de vivências, além de ter que contribuir com cuidados que em outros tempos, ou em outras situações estaria disposto a fazer ou não.

Esta pessoa, ou o ser - familiar, é entendido neste estudo como um ser humano singular, livre e com dimensões bio-psico-sociais, que possui um potencial humano para tomar-se mais ou para estar melhor, em uma determinada situação, através de escolhas responsáveis, com a possibilidade de sempre renovar as suas escolhas.

Para que tal concepção seja vivenciada no cotidiano da enfermagem, será necessário que o enfermeiro reconheça verdadeiramente as dimensões do ser, a começar pelo familiar, seu lar, sua situação de alfabetização, situação econômica e familiar, de trabalho e espirituais. Reconhecer que as pessoas podem ser mais é um exercício que exige a relação EU-TU, será a partir da reciprocidade, da presença e do encontro, que poderá ser oferecido ou mediado o desenvolvimento de possibilidades institucionais, sociais ou pessoais de escolhas.

Ao mediar este encontro de enfermagem, entendo que esta situação , nova - um familiar com AIDS - traz para o ser-familiar inúmeras inquietações,

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em casa ou no hospital, que requerem ajuda e orientação da enfermagem para possível enfrentamento e o estar melhor.

Com este entendimento, a enfermagem como profissão, nas idéias de Paterson & Zderad (1988) tem de buscar os conhecimentos científicos e técnicos e, principalmente, conhecimento do Outro para ser possível desenvolver relações interativas e humanas e, ainda, contribuir para o bem estar das pessoas individualmente ou em grupo, caracterizando esta conduta um compromisso autêntico.

Nesta perspectiva, a situação de enfermagem é entendida como toda e qualquer situação que envolva um ser humano com necessidade de ajuda e outro que quer ajudar, onde o ser-enfermeira e o ser-com AIDS trocam experiências em um relação dialógica que subentende encontro. Para Buber (1977), a presença e o diálogo são a base para que ocorra a relação que “acontece” com o encontro.

Para mim, este entendimento amplia em muito as ações de enfermagem, além de valorizar o respeito à vida e ao ser humano, engloba as situações que poderiam ser ditas somente educativas ou éticas, aumentan do as responsabilidades do enfermeiro, como um ser que deve seguir com responsabilidade e autenticidade na escolha de ajudar outra pessoa na sua experiência existencial.

Frente às diferentes situações de enfermagem que irão aparecer em nosso cotidiano, seria importante entender que a evolução da doença e as reações emocionais que esta situação pode trazer nos leva a reconhecer, corroborando com Lima et al (1996), que a família adoece conjuntamente e a relação entre o familiar e o ser que está enfermo dependerá da estrutura e relações estabelecidas anteriormente á doença.

A experiência de (Koller, 1992) em cuidar de pessoas com AIDS e sua família traz considerações de que a família para o ser - com AIDS, além das suas características próprias, deveria ser, acima de tudo, a fonte de amor, encorajamento e dedicação, complementando serem estes sentimentos necessários e imprescindíveis na trajetória da família da pessoa com AIDS.

Idéia esta que acredito ser uma premissa importante para se desenvolver o processo de estar melhor do ser - com AIDS e seus familiares que, no meu entendimento, será aquele que possui laços afetivos, de amor, de amizade, seja consanguíneo ou não. Mas sabemos que isso, às vezes, não acontece e o que

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encontramos são situações onde existe o abandono, o desprezo, a raiva e o desamor.

A mesma autora salienta a necessidade de o profissional de enfermagem estar preparado para trabalhar e prestar cuidados à família, com vistas à diminuição do medo e dos preconceitos. Acredito que não é só isso, mas além de não ter medo, não ter preconceito, o enfermeiro deve estar preparado para enfrentar situações que podem ser vistas como críticas, entre elas a piora do quadro clínico, que traz a desesperança para o familiar e também preparar para o luto e que para isso ser possível é necessário este profissional estar presente.

Tal presença, que é chamada de genuína ou autêntica por Paterson & Zderad (1979) é uma questão central no atendimento ao ser humano em sua totalidade e também significa estar no mesmo tempo, ou em sincronia com a pessoa que tem necessidade de ajuda, o que equivale dizer estar no mesmo tempo e espaço com o ser.

Apoiada nas idéias das autoras, que desenvolveram e divulgaram a Teoria de Enfermagem Humanística, percebi a necessidade de buscar maior conhecimento de nós mesmos e dos outros para ser possível oferecer um cuidado com humanização. O que, para elas, só será alcançado com o desenvolvimento de reflexões ligadas aos nossos valores, à nossa profissão e à essência de ser enfermeiro, baseadas na descrição da experiência existencial da enfermeira e do cliente, que neste estudo é o ser-com AIDS.

A Enfermagem Humanística não pode ocorrer sem um compromisso autêntico do enfermeiro de, estar - com e de agir - com o ser humano. É baseada em uma filosofia que propõe melhorar a qualidade do cuidado e partilhar a vivência. Vê o homem na sua essência de ser e considera suas potencialidades, sua totalidade e temporalidade.

Foi com este entendimento da situação de enfermagem, como sendo qualquer situação de necessidade de ajuda de uma ou mais pessoas e buscando um encontro entre quem quer ajudar e quem será ajudado, que busquei realizar cuidados de enfermagem junto aos familiares do ser-com AIDS.

Em face do exposto, é possível compreender que o foco do estudo é o familiar do ser-com AIDS e os propósitos são:

s compreender como o ser- familiar do ser-com AIDS se

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s levantar a perspectiva de integrar os familiares do ser-

com AIDS à dinâmica do cuidado de enfermagem, buscando o estar

melhor do ser-com AIDS.

A proposta de encontrar o Estar Melhor deve entender este como uma condição ou processo, capaz de ser alcançado por qualquer pessoa, individual ou coletivamente, através de escolhas responsáveis e com a ajuda da enfermagem. Deve ser entendido como um processo onde a soma de várias possibilidades é que irá proporcionar uma condição de estar melhor.

Entendo que o Estar Melhor é uma condição extremamente limítrofe, envolvendo questões que fogem á responsabilidade do familiar do ser-com AIDS. Esta condição pode, de uma hora para a outra, inverter-se e o processo e a pessoa necessitará de novas possibilidades e também de ajuda de outras pessoas, inclusive da enfermagem, para alcançar uma nova condição de estar melhor.

Este processo retoma os conceitos de enfermeiro e situação de enfermagem, bem como o de pessoa com potencial para estar melhor e também carrega alguns pressupostos básicos ou crenças, fundamentados na Teoria de Enfermagem Humanística que adotei para orientar meu trabalho pois atendiam à proposta deste, são eles:

s o ser humano é único e possui dimensão biopsicossocial e potencial para tornar-se mais, ou o ser humano é inacabado;

s a Família é um valor universal presente em todas as sociedades;

s todo ser humano tem liberdade natural de escolha com responsabilidade e deve empenhar-se na possibilidade de renovar suas escolhas;

s a escolha responsável possibilita o estar melhor onde uma, ou a soma das experiências abre as portas para outras;

s o sofrimento é uma experiência singular de cada ser humano onde a presença genuína é um valor e faz diferença na situação de enfermagem; s em uma situação de enfermagem e para prestar um cuidado humanizado é necessário acontecer o Encontro, pois os atos de enfermagem influenciam na vida de uma pessoa.

No esquema que segue busco esclarecer meu entendimento sobre a situação de enfermagem, mediada pelos pressupostos estabelecidos como norteadores deste estudo.

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F ig u ra i: R epr esentação da si tu a çã o de e n fe

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FUNDAMENTAÇÃO VO ESTUVO

Ao buscar a fundamentação teórica para este estudo, procurei rever e ampliar meus conhecimentos sobre quatro temas:

s a AIDS, enquanto enfermidade que afeta o ser humano em sua convivência familiar e social, velada pelo preconceito e estigma, advindos da construção social e cultural. Para compreender as dificuldades que esta situação imposta traz para a família e para as situações de enfermagem;

s a família de hoje, que é diferente da de ontem devido as suas transformações, e as conseqüências que a AIDS traz para esta família. Para poder chegar à compreensão do que sente o ser-familiar do ser - com AIDS;

s a Teoria de Enfermagem Humanística, que traz uma abordagem teórico-metodológica e filosófica da Fenomenología, para poder voltar meus olhos para o ser humano - familiar do ser-com AIDS, na singularidade do seu existir e cuidá-lo numa situação de diálogo vivido;

s as idéias de Martin Buber, sobre o fenômeno da relação EU - TU descrita por ele, entendida como relação ontológica a EU - TU e a experiência objetivante a EU - ISSO, sendo o conceito de totalidade que determina a relação ontológica EU - TU. Para entender o significado do diálogo e do encontro nas situações de enfermagem vivenciadas neste cenário.

Essas concepções teóricas fornecem embasamento para o cuidado de enfermagem numa relação dialógica, mediada pela ação educativa e ética e pelo encontro com o ser-familiar, para que ele possa tornar-se, ser-mais e estar melhor, desenvolvendo seus potenciais como ser humano, e a partir daí, tornar-se um parceiro, integrando-se á dinâmica do cuidado buscando o estar melhor do ser- com AIDS. Os temas relacionados para esta fundamentação serão analisados criticamente conforme sua aderência com os propósitos deste estudo.

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UM OLHAR SOBRE A AIVS

Nesse momento procuro relatar o que busquei nos estudos sobre o enfrentamento da AIDS no Brasil, para chegar a algumas respostas relacionadas com as dificuldades das famílias e a assistência de enfermagem que é prestada para a família e a pessoa com AIDS, nos dias de hoje.

A AIDS ou SIDA está posta como o grande enfrentamento da humanidade, em se falando de doença e de problema social, estimando-se que até o ano 2000, cerca de 30 a 40 milhões de pessoas estarão contaminadas no mundo, desta forma considerada como sendo hoje um dos grandes desafios do terceiro milênio, devido, principalmente, a sua magnitude social.

No Brasil foram registrados, até 1997, 110.845 casos de AIDS dado divulgado pelo Programa das Nações Unidas para AIDS (UNAIDS) durante o Simpósio da Rede de Monitoramento da Pandemia de AIDS (MAP) que aconteceu no Rio de Janeiro - RJ, no mês de novembro de 1997 (AIDS, 1997).

Conforme Lima et al (1996), o Brasil apresenta hoje uma epidemia em expansão, com tendência a atingir, principalmente, aqueles de menor renda - pauperização e/ou menor nível educacional. Para Chequer (1997) esta queda no nível de escolaridade dos infectados, associada sempre à baixa renda, está ligada diretamente à situação sócio-econômica da população, sendo um problema social que envolve toda a nação. Refere que, quando sairmos da esfera exclusiva da saúde e nos transportarmos para a esfera sócio-cultural, estaremos aceitando como sendo inegável, o acesso à educação e à prevenção como parâmetros para alcançar uma melhor qualidade de assistência.

Além destas mudanças que a epidemia vem apresentando no Brasil, Castilho & Chequer (1997) nos apresentam uma análise, onde se tem a notificação de 74% dos casos de AIDS entre homo/bissexuais masculinos em 1984, sendo sua participação progressivamente diminuída, atingindo, em 1996/97, a participação de 24% dos casos notificados. O aumento de casos entre heterossexuais, além de interiorizar a doença, faz-se acompanhar da expressiva inserção das mulheres no quadro epidemiológico. Este fato nos leva a uma constatação, a redução da razão por sexo entre todas as categorias - para 23 homens tinha-se 1 mulher em 1984 e para 3 homens tem-se hoje (1996/97), 1 mulher.

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O aumento da ocorrência de casos de AIDS em mulheres em idade reprodutiva nos leva a refletir sobre a possibilidade de aumento na transmissão vertical, ou AIDS em recém-nascido ou em crianças. Uma pesquisa* realizada no Hospital de Clínicas de Porto Alegre - Rio Grande do Sul, nos revela que 43% de mulheres que sabem ter o vírus engravidam. O estudo constatou que, em 25% a 35% dos partos de mulheres, que não usaram medicação anit-retro virai (AZT), os bebês forma contaminados pelo vírus, sendo que, em sua ultima análise 25 mulheres que foram tratadas, nenhum bebê foi contaminado (Naud & Barcellos, 1998). Tal dado reforça a idéia de se buscar diagnóstico precoce e que o uso do medicamento possa estabilizar os índices de transmissão vertical.

Em um segundo momento, Castilho & Chequer (1997) referem-se à progressão observada entre os usuários de drogas injetáveis, um meio de transmissão que se difunde de forma rápida e extensa, e que, no meu entendimento, gera uma inquietação: se adicionada á situação da feminilização poderá tomar uma dimensão social que ainda não temos sequer noção de como poderá atingir a sociedade e as famílias.

Para entendermos porque se fala hoje em mudanças faz-se necessário rever como a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS) surgiu. A AIDS começa a ser percebida como uma nova síndrome e uma epidemia em 1981 (Montagnier,1995; Jackson & Lynch, 1991), porque algumas pessoas estavam sendo acometidas de um tipo raro de pneumonia, enquanto outras desenvolviam um tipo de câncer chamado Sarcoma de Kaposi, sempre acompanhados de perda da resistência do sistema imunológico e com uma freqüência maior em pessoas do sexo masculino, jovens e homossesuais.

Nichiata, Shima & Takahashi (1995) ao buscarem a compreensão do enfrentamento da AIDS no Brasil, considérant que a forma como emergiu a doença - detectada em homossexuais masculinos e usuários de drogas - associado a visualização em "grupos de risco”, fez com que a resposta da sociedade permanecesse por muito tempo alienada em relação à síndrome. Riscado (1998) acrescenta também o preconceito e os reflexos da homofobia, isto é, para muitos â prevenção da AIDS está ligada à eliminação da homossexualidade.

* apresentada na 12a Conferência Mundial sobre AIDS, em Genebra, julho de 1998 ((Naud & Barcellos, 1998).

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Concordo com as autoras (Nichiata, Shima & Takahashi.1995) e acrescento que a limitação da transmissão em um grupo de risco leva a um julgamento equivocado de que, um tipo específico de comportamento irá condenar ou livrar as pessoas da síndrome, o que muitas vezes impede que as pessoas se protejam adequadamente, sendo considerados, a partir daí, seres vulneráveis.

A alienação e o medo que a sociedade tem são reforçados pelos meios de comunicação que, através da mídia e/ou tipos de propaganda ligam a doença aos “grupo de risco”, ao fato de não ter cura e á morte. Além disso, as atitudes indesejáveis de alguns segmentos da sociedade, incluindo os profissionais de saúde, tiveram papel fundamental na construção social e cultural da AIDS, como uma doença que veio para quem "merece” ou “procura” ou ainda a "Peste Gay” e o “Castigo de Deus”.

Compreende-se assim que o preconceito permeia muitas das atitudes na prática do cuidado de enfermagem, sendo manifestado pelo comportamento discriminatório, medo, insegurança e desconhecimento. Estas situações, entre outras, são referenciada' nos estudos de Menegin (1996), Figueiredo & Morais (1994), Dresler & Boemer (1991), Dessunti (1989) e Vieira (1987), o que, no meu entendimento, é incongruente com concepções humanísticas que a enfermagem preconiza, sendo assim uma inquietação.

Considerando que os profissionais da saúde são parte da sociedade e, que esta possui valores decorrentes da cultura na qual estão inseridos, eles carregam consigo uma conotação sócio-cultural da AIDS. Por conseguinte e de acordo com Rosenthal (1987), conclui-se que o profissional de saúde carrega uma bagagem de preconceitos que vem da sua formação cultural, moral e religiosa.

O mesmo autor prossegue dizendo que o profissional, ao se deparar com um paciente com AIDS - depositário de tudo que aprendeu a condenar - deverá estar com um mínimo de preparo para enfrentar tal contradição: prestar ajuda a quem rejeita ou discrimina, em função de seus hábitos sexuais, vícios ou profissão. Paterson & Zderad (1988) salientam, ainda, ser necessário deixar de lado ou em suspenso todo e qualquer julgamento ou noção pré-concebida quando se encontrar em uma situação de enfermagem, onde o diálogo vivido com o ser- enfermo é facilitado pela presença do enfermeiro, tendo em vista se alcançar o estar melhor.

Acrescento que a enfermagem deve cultivar a sensibilidade como um bem, um valor, lembrando que, na luta contra a AIDS não existem culpados ou

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inocentes, mas seres humanos tentando sobreviver. O enfermeiro, como ser humano que é, antes de tudo, será melhor na sua essência, se lembrar disso durante qualquer situação de enfermagem.

Será também através da busca do conhecimento e da promoção de informações, que a enfermagem, frente a luta contra a epidemia ideológica da AIDS (Riscado, 1998), a não-discriminação e a desconstrução do preconceito, encontrará o princípio da solidariedade. Para Pessini apud Pessini & Barchifontaine (1991a), a solidariedade no contexto da AIDS é

estar cóm a pessoa e deixá-la ser, não como gostaríamos que ela fosse, mas como ela é na realidade nua e crua de suas escolhas de suas opções e vida. Nem rir, nem chorar, mas compreender com empatia ... e se comprometer fazendo algo. (p.419)

Acredito ainda, que encontraremos os caminhos para o enfrentamento da AIDS, ao considerarmos a cidadania e a liberdade do ser - com AIDS e seus familiares. Entendo que o ser humano, enquanto ser livre, único e inacabado, tem potencial para tomar-se mais ou para estar melhor, nesta experiência existencial, e isso poderá ser mediado pelas escolhas responsáveis e a educação em uma relação dialógica, EU - TU.

A INQUIETAÇÃO NO OLHAR - ESTIGMA E PRECONCEITO NA AIDS

Diante de algumas inquietações, procurei encontrar na ética uma forma de equilíbrio entre os comportamentos ditos "certos” ou "errados", buscando em alguns autores conceitos ou idéias que me auxiliem na compreensão de algumas questões pontuais. Em Germano (1994), a dinâmica da ética conduz às ações do homem e este é influenciado ou condicionado sócio - historicamente.

Sob este ponto de vista a ética é comprometida com a vida, com os valores morais, a responsabilidade, com as questões dos meios para se chegar

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aos fins, do absoluto e do relativo logo, não é individualizada, é coletiva, não sendo suficiente um ser - ético, mas um ser com consciência ética de grupo.

Acredito que ser ético seja bom para mim e para meus pares. Ao falarmos de AIDS, encontramos seres humanos em situação de abandono e/ou isolamento, situações que permeiam estigmas e preconceitos, condutas ditas perniciosas no fazer humano, logo estar-se-á falando de ética e ser a-ético.

O fato da AIDS ser considerada uma doença estigmatizante parte de um processo de simbolização construído socialmente (Pádua,1986), onde marcas físicas e o diagnóstico médico constituem as manifestações perceptíveis. Na medida em que estas marcas funcionam como um sinal desencadeador de uma emoção que se manifesta numa conduta de afastamento imediato, temos o estigma.

Desencadeado o processo emocional, manifestam-se as condutas de afastamento que irão implicar em rompimento de solidariedade voluntária ou institucional. Este rompimento certamente adquire maior gravidade quando produz uma situação de isolamento, que conforme Pádua\(1986) poderá ser avaliado como:

s evitamento - afastamento sutil ou não declarado

v' discriminação - implica na impossibilidade de interação social ou negação de igualdade de trato

s segregação - inclui a discriminação e consiste no estabelecimento de limites espaciais.

O mesmo autor observa que, no caso da AIDS existe uma ameaça muito forte a valores culturais nucleares da sociedade como - a vida, a sexualidade e a beleza da forma do corpo. Considera que, em uma sociedade capitalista a morte foi se tornado tema proibido, logo a AIDS possui um desfecho indesejável, além de precoce e indigno. Este último, o indigno, ligado a outra questão que não é discutida na sociedade ou a outro valor cultural que a sociedade nega, a sexualidade masculina e feminina. Sendo a beleza da forma do corpo, percebida pelo autor, também como valor negado pela doença. Assim as modificações na forma do corpo se tornam uma marca da doença, tornando a pessoa portador de um estigma.

Conforme Seffner (1995) a característica sociológica da situação de portador de um estigma é a de possuir um traço que se pode impor à atenção, uma impressão ou marca que pode afastar aqueles com quem encontra, destruindo a

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possibilidade de atenção para outros atributos seus, fazendo com que a pessoa portadora perceba que os outros não o aceitam.

Entende, o mesmo autor, que as pessoas com AIDS encontram-se numa situação de morte anunciada, pois ao saber que é um indivíduo soropositivo, este passa a conviver com a percepção da morte mais próxima. Complementa que a pessoa também se encontra em "morte civil”, refletida na diminuição dos direitos da cidadania e sentida com a perda do emprego, a discriminação e o preconceito. Considera que o uso da designação "aidético" para a pessoa com AIDS, talvez cumpra o papel de reduzir e marginalizar a totalidade das qualidades da pessoa. O termo está carregado de estigma, sendo esta uma das razões de utilizar neste estudo o termo ser-com AIDS.

Afirma-se ainda que, associada a estes fatores temos a vinculação da doença com o sexo (uma doença sexualmente transmissível), a marginalidade e a promiscuidade, o que no entender de Pádua (1986), significa um reforço no processo de estigmatização.

O ser-com AIDS, muitas vezes, passa a viver num estado que é pior que a própria doença, com medo da denúncia decorrente da ignorância e principalmente do preconceito. Como diz Chacon (1996), as pessoas ficam acuadas e muitos passam a ser clandestinos, terminando por abandonar seus filhos, amantes e amigos. Acrescento que, muitas vezes, trocam de cidade para que seus vizinhos e amigos não percebam a presença da doença e de seus “sinais”, gerando a migração interna.

Para Jones (1973), o termo preconceito que é derivado do latim = praejudicium. Seu prefixo prae significa anterior, e judicium - significa julgamento - logo o autor refere ser preconceito - um julgamento prévio e negativo das pessoas , sendo mantido, mesmo que alguns fatos o contradigam, isto é, o julgamento é formado antes do conhecimento dos fatos.

Prossegue o autor explicando que a manifestação comportamental que provém do preconceito é a discriminação, concluindo que o comportamento é mais importante para nós do que a atitude de preconceito.

Será necessário refletir se a pessoa pelo menos tentou conhecê-los antes do julgamento e considerar se elés podem, ser verificados. Tais questões são sugeridas pelo autor por ser muito difícil verificar se os julgamentos são preconceituosos, pois existem atitudes, comportamentos e conseqüências de comportamentos que são muito significativos.

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Festinger (1954), ao descrever o processo de comparação social, refere que o ser humano, ao avaliar uma opinião ou habilidade, irá depender da avaliação própria que ele tem sobre aquela opinião, e quando não houver uma base social objetiva para a avaliação esta será a comparação. Tal conclusão o levou a considerar que o preconceito irá surgir, quando usamos nosso grupo para comparação em relação a alguém de outro grupo, sendo que o nosso grupo é sempre o "pólo positivo” no processo de comparação.

Nesta perspectiva, as pessoas tendem a mover-se em grupo, mantendo julgamentos e opiniões que concordem com os seus e justificando habilidades que estão próximas de si mesmo. Esta tendência seletiva forma a segmentação em grupos e surge o “status” onde a comparação de grupos diferentes poderá ser mantida, no sentido de ignorar as diferenças, pela hostilidade e pelo menosprezo. Os modos de influência social e algumas espécies de comportamentos competitivos são manifestações do mesmo processo sociopsicológico.

O preconceito, para Japiassu & Marcondes (1993), possui um sentido eminentemente pejorativo, sendo a opinião admitida sem ser discutida, constituída pela visão de mundo ingênua que se transmite culturalmente e que é internalizada pelos indivíduos, influenciando seu modo de agir e de considerar as coisas. Neste entendimento reflete as crenças, valores e interesses de uma sociedade ou grupo social.

Os modos de agir ou comportamentos manifestam-se nas relações interpessoais como maneira formal de relacionamento, que, para Marques (1986), são um mundo de impessoalidade, onde se buscam alcançar os objetivos sem envolvimento, com supressão dos sentimentos e dando lugar às idéias e ao racional.

Esta forma de relacionamento reforça o padrão dominante do mundo das idéias impessoais, o que mantém o “status quo”. Sendo também um obstáculo à eticidade no exercício profissional de enfermagem, como reforça Roszak, citado por Pessini & Barchifontaíne (1991b), a consciência objetiva é própria dos tecnocratas e consiste em afastar os sentimentos.

Entendo que a tecnologia e a burocracia quando vêm sob a forma de códigos, processos e regulamentos, em nome da eficiência e da eficácia poderão deixar de lado os aspectos humanos. Estas questões, para Buber (1977), encontram-se no mundo do ISSO, ou na relação EU - ISSO, onde o TU (que poderá ser um ser humano ou não) será coisificado ou objetivado, ou a relação será

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desprovida de valor dialógico. Ele afirma que o homem se torna EU na relação com o TU. O homem que se conforma com o mundo do ISSO, como algo a ser utilizado, faz malograr a realização deste destino: em lugar de liberar o que está ligado a este mundo ele o reprime; em lugar de contemplá-lo ele o observa, em lugar de acolhê- lo serve-se dele (Buber, 1977).

No entanto, se conseguirmos suspender ou deixar entre parênteses o racional e olharmos o ser humano na sua unicidade, sua inteireza e que este detém um significado para suas vivências, compreenderemos que, diante da constatação da enfermidade, em pauta, cada ser humano terá uma experiência Impar com a dor, com o abandono, com a vergonha, com a culpa e com muitos outros sentimentos, além de experienciar relações desprovidas de valores ou relações EU - ISSO.

Existem várias mobilizações contra a impessoalidade e o preconceito, organizações formadas por pessoas que, direta ou indiretamente estão atingidas pelo vírus HIV, poderíamos citar as Organizações Não Governamentais (ONGs), Grupo pela VIDA, Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) entre outras, todas concordando que contra o pânico, os preconceitos e a discriminação, a prática da solidariedade é ingrediente essencial, acredito ainda ser outra forma de enfrentamento onde a enfermagem, em uma ação coletiva, poderá ser uma articuladora e ter como propósito a discussão destas questões.

Deve-se admitir que o ser - enfermeiro ao contemplar o ser - com AIDS não pode ficar inerte, como se não estivesse vendo nada. Interagir com o ser- familiar que compartilha dessa vivência, com maior ou menor intensidade, é a forma de encontrar, pela humanização, um caminho para melhor cuidar do ser humano em sua totalidade, numa situação tão singular como ser um portador do vírus da AIDS, ou como ser um familiar deste. Ao mesmo tempo, considerando que todas as pessoas têm direito a informações, ao tratamento, à participação da vida social e que ninguém tem o direito de submeter o portador do vírus ao isolamento, restringir sua liberdade e os direitos à cidadania *.

Para Paterson & Zderad (1988) uma pessoa existe e está sempre no estado de vir-a-ser, sendo o foco da enfermagem o ser único e o tornar-se. O aspecto inacabado do homem a que se referem são também discutidos por Pessini & Barchifontaine (1991b), que ao discorrer sobre a dimensão ética da existência

* Declaração aprovada no II Encontro Nacional de ONGs/AIDS em Porto Alegre - RS, 1989. (Rio Grande do Sul,1996.In: Relatório Azul).

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humana, entende que o ser humano se descobre como não sendo ainda aquilo que deve ser, ou ainda, “o ser acabado se encontra no futuro” (p.70). Sendo uma tarefa moral, um dever, o homem crescer, criar-se e realizar-se.

Corroborando com os autores, entendo que o homem sendo um ser-no- mundo-com-o-outro é também um ser-na-sociedade, que, por inacabada, pode ser transformada, será seu relacionamento com ela uma dimensão ética. Então o s e r- enfermeiro e a enfermagem possuem o potencial e a responsabilidade de tomar-se através de suas escolhas.

Assim, o estigma e o preconceito são ligados ao mundo da ética, que deverá ser amplamente discutida pela sociedade, pela família e, principalmente, pelo profissional enfermeiro, um cidadão que está inserido na sociedade.

A FAMÍLIA VE H OJE E A COMPREENSÃO DE SEUS SIGNIFICADOS

Na intenção de compreender a família, será necessário, primeiramente, aceitar que esta possui diferentes significados para as pessoas, apresenta diversas definições em diferentes correntes de pensamento, estando vinculada com as dimensões social e cultural que representa.

Para Osorio4 (1996), a estrutura familiar varia conforme a época, história, os fatores sócio-políticos-econômicos ou ainda religiosos que marcam uma determinada cultura. Considera ser a família a unidade básica para a interação social. Concordo com ele quando nos diz que esta unidade básica nos dias de hoje é diferente da de ontem, vem passando através dos tempos por transformações na sua dinâmica e estrutura.

Estas transformações permeiam discussões sobre o movimento feminista da década de 70, do ato sexual desvinculado da função de procriar, a partir da inseminação artificial e do bebê de proveta, bem como o consumo de

4 Luiz Carlos Osório é médico psiquiatra, psicanalista, grupoterapeuta, especialista em

adolescentes e família. Trabalha com terapia familiar e dinâmica de grupo em Porto Alegre - RS (Osorio, 1996).

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pílulas advindo da revolução sexual. Sapeta (1997), salienta alterações na família devido também, a inserção da mulher no mundo do trabalho assalariado e da vida social.

Estas, entre as várias outras situações que as pessoas têm vivenciado nos tempos de hoje, são experiências de uma sociedade em transformação, que transita por um período de mudança de valores, exemplificado por Osorio (1996) quando refere que nos dias atuais, questionam-se os papéis do homem e da mulher, os direitos das crianças e dos adolescentes; observa-se os avanços da tecnologia onde o clone e o útero artificial são possíveis.

Inserida nesta mesma sociedade surge a AIDS como uma doença nova e com inúmeras inquietações que passam por discussões como o direito às cirurgias reconstrutivas (transsexualismo), casamentos de homossexuais e a prostituição feminina e masculina como uma profissão (Cruz Neto, 1997). Estes são exemplos de situações que vem pondo à prova a estrutura familiar tradicional e acredito que, por vezes, dificultando o relacionamento humano e fragilizando a dinâmica familiar.

Considerada por Osorio (1996) como a viga mestra no processo evolutivo do ser humano e ainda guardiã de nossas ansiedades e medos, será a família o suporte para melhorar o relacionamento humano entre seus membros e também superar tabus. Para isso, será imprescindível revitalizá-la e repensá-la para transcender a condição humana. Buscar na família as saídas para o mal- estar em que vivemos, parece ser uma tendência contemporânea.

Hoje contamos com uma diversidade de maneiras de conceituar Família. Alguns autores consideram-na como desempenhando papéis básicos em todas as culturas e definem família nuclear como aquela que apresenta três tipos de relações pessoais: aliança, representada pelo casal; filiação, relação de pais com os filhos; e consangüinidade, relação com irmãos (Lévi-Strauss apud Osorio, 1996); ou o parentesco que esta'vinculado no casamento ou em relações que geram filhos, assim, marido e mulher são parentes.

A família nuclear ou o núcleo familiar será responsável pelo cuidado nos primeiros anos de vida do ser humano, no sentido de perpetuação da espécie. Ainda se entende por família extensa, aquela que possui laços de consangüinidade como, avós e tios ou parentesco entre os membros; e será considerada família abrangente a que incluí os não parentes que coabitem numa mesma casa (080^0,1996: Black & Matassarin-Jacobs,1996; Falceto & Aerts,1990).

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Sob qualquer forma de constituição, a família é dita como uma célula primordial de toda e qualquer cultura, unidade básica da interação social ou definida operacionalmente como:

Família é uma unidade grupal onde se desenvolvem três tipos de relações pessoais - aliança (casal), fíliaçâo (pais/fílhos) e consangüinidade (irmãos) - e que a partir dos objetivos genéricos de preservar a espécie, nutrir e proteger a descendência e fomecer-lhes condições para aquisição de suas identidades pessoais, desenvolveu através dos tempos funções diversificadas de transmissão de valores éticos, estéticos, religiosos e culturais (Osório,1997, p.50).

Ao definir papéis familiares, o autor lembra que são determinados pela cultura, e ainda, que nem sempre têm correspondência entre o personagem designado e o papel que representa. Exemplificando: nem sempre a mãe reprodutora tem papel nutricio, que poderá ser desempenhado pela avó ou tia.

O autor define, ainda, o papel conjugal como o de cooperação, competição, simbiose e reciprocidade, acredita que está desvinculando da identidade sexual, ou seja, ser homem ou ser mulher já não define por si só a disponibilidade para o exercício dos papéis conjugais, da mulher que cuida dos filhos e o homem que sai de casa para trabalhar, logo, o papel conjugal está condicionado às circunstâncias do mundo contemporâneo e condição humana, ou seja, a mulher sai de casa para trabalhar e o homem fica cuidando dos filhos e nas lidas domésticas.

O papel materno e paterno, ou parental, passou e ainda passará por profundas transformações, mas reforça a consonância com a representação simbólica do corpo feminino e anatomofisiologia sexual; considera as tarefas de nutrição, agasalho e proteção dos filhos como sendo maternas e o de facilitador no processo de identidade como sendo papel paterno.

Para o papel fraterno, que pode estar dentro ou fora do contexto familiar, revela que este oscila entre rivalidade e solidariedade, como comportamentos antagônicos. Ficando o papel filial centrado na dependência.

A família possui atribuições, como entidade intimamente relacionada a sua origem e estrutura, que por vezes podem ser confundidas. Dentre as atribuições descreve-se a função biológica, de prover cuidados que assegurem a

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sobrevivência; função psicológica, de prover alimento afetivo para manter o equilíbrio psíquico, sendo o ancoradouro para as ansiedades existenciais, função esta que pode ser confundida com as funções sociais de transmissão da cultura e preparação para o exercício da cidadania (Osorio, 1996).

Já Nitschke et al (1992), em seu trabalho sobre família saudável, consideram alguns outros fatores como sendo: biológicos, sociais e psicológicos. Para as autoras, que são enfermeiras, os fatores biológicos são a rede familiar biológica e a família de procriação; definem sociologicamente a família ou um grupo de pessoas que vivam juntas (exemplo: pessoas que vivam em um convento ou pensão). Finalmente, qualquer grupo que possui laços emocionais muito fortes e que se considere uma família, definem psicologicamente.

Motta (1997), enfermeira pediátrica, ao buscar a compreensão dos significados percebidos pela criança e sua família, afirma que a doença afeta e desarticula o mundo familiar e os sonhos de futuro, refere ser a familia

constituída pela comunhão do ser-com-o-outro, cujas premissas básicas da relação são o afeto, a lealdade, a responsabilidade com-o-outro, caracterizando-se como uma relação social dinâmica, permeada por crenças, valores e normas da sua tradição sócio-cultural e pelo seu momento histórico de vida (p. 176),

sendo este momento, para a autora, o impacto de uma doença, será o - enfrentamento que levará esta família a redimensionar sua vida.

Para Elsen & Althoff (1998) a família faz parte de nossa vida cotidiana, construída dentro de uma realidade social onde a variabilidade nas estruturas e organizações nos leva a pensar em famílias com múltiplas composições, o que para as autoras parece um desafio à formulação de qualquer definição de família. Referem-se â família como uma unidade dinâmica, constituída por pessoas que, primeiramente se percebem como família, além disso, convivem por um espaço de tempo com uma estrutura e organização em transformação, estabelecendo objetivos comuns, e construindo uma história de vida.

Para as autoras, os membros da familia poderão estar unidos por laços consangüíneos, de interesses ou afetividade. Possuem uma identidade própria, e além de criar, também transmitem crenças, valores e conhecimentos, Influenciados

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pela cultura e nível sócio-económico. A familia vive em uma sociedade ou num ambiente em interação com outras pessoas e famílias, acrescentam a escola, posto de saúde e outras. Define seus objetivos, tem direitos e responsabilidade e promove meios para o crescimento de desenvolvimento de seus membros e da comunidade.

A partir de minha vivência e experiência na prática, ao reconhecer a dimensão bio-psico-social do ser humano e suas influências no processo saúde- doença, entendo família como: um grupo social formado por seres humanos unidos com objetivos particulares, com co-responsabilídades, possuindo relacionamentos significativos, que podem ser laços de consangüinidade, de amizade, afetivos ou laços emocionais fortes como o amor e, estando inseridos e interagindo em uma sociedade e cultura, cria e transmite valores para seus membros. E ainda, independente de qualquer estrutura em que a familia esteja formada, concordo com Elsen & Althoff (1998), que ela se organiza para exercer as funções e os papéis a ela destinados.

Na prática, encontrei laços emocionais fortes entre pessoas que não possuem laços de consangüinidade e também nem moram juntas, como também encontrei pessoas que moram juntas e possuem relacionamento pouco significativo. O que me leva a concordar com Osorio (1997), quando diz que familia não é um conceito unívoco, somente será possível descrever as várias estruturas ou modalidades assumidas por esta através dos tempos.

Como vemos, a família pode ser formada e estruturada de diferentes formas, devido às tantas variáveis que podem determinar as distintas composições das famílias de hoje, entre elas Osorio (1997) cita as variáveis ambientais, sociais, econômicas, culturais, políticas e religiosas daquele dado momento. Estas irão influenciar a forma como a criança se integra no mundo do adulto, no meio familiar ela aprende a avaliar e selecionar suas relações. Para Prado (1995), a família na tentativa de reproduzir-se a si própria em todos os sentidos (hábitos, costumes e valores), estimula e orienta a criança para ocupar seu lugar na sociedade, podendo ser este determinado pelo seu sexo, raça, crenças e condição sócio-econômica e pelo cenário dos dias de hoje.

Assim, para enfrentar o mundo competitivo de hoje, a família busca um novo equilíbrio em função da nova ordem sexual, da redistribuição dos papéis na própria sociedade e entre os filhos e os pais. A sociedade entende que há uma necessidade de substituir posturas de rivalidade por solidariedade e cumplicidade,

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