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2011 FREZ - O PRINCIPIO DO CONTRADITORIO E SUA APLICABILIDADE NA PROVA EM SEDE DE INQUERITO POLICIAL

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

CAMPUS DE CACOAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO

ADEILDO FREZ

O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E SUA APLICABILIDADE NA

PROVA EM SEDE DE INQUÉRITO POLICIAL

Trabalho de Conclusão de Curso Monografia

Cacoal - RO 2011

(2)



 

O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E SUA APLICABILIDADE NA

PROVA EM SEDE DE INQUÉRITO POLICIAL

Por:

ADEILDO FREZ

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Universidade

Federal de Rondônia - Campus Cacoal como requisito final para o grau final de Bacharel em Direito, elaborado sobre a orientação do

Professor Mestre Bruno

Milenkovich Caixeiro.

Cacoal - RO 2011

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ADEILDO FREZ

O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E SUA APLICABILIDADE NA PROVA EM SEDE DE INQUÉRITO POLICIAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado aprovado para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR – Campus de Cacoal, mediante apresentação à Banca Examinadora, formada por:

_____________________________________________________ Professor Ms. Bruno Milenkovich Caixeiro – Orientador/UNIR

____________________________________________________ Professora Ms. Simone Maria Gonçalves de Oliveira – Membro/UNIR

___________________________________________________ Professora Ms. Viviani Gianine Nikitenko – Membro/UNIR

Cacoal – RO 2011

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RESUMO

FREZ, Adeildo. O princípio do contraditório e sua aplicabilidade na prova em sede de inquérito policial. 76 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso. Fundação Universidade Federal de Rondônia – Campus de Cacoal – 2011.

O objetivo deste trabalho será examinar a possibilidade de incidência do princípio do contraditório no inquérito policial, refletindo sobre a obrigatoriedade e a utilidade de se fazer informar o procedimento investigatório por tal princípio, mormente durante a produção da prova pericial. Embora não haja hierarquia dentre as provas admitidas no ordenamento jurídico brasileiro, a prova pericial, por estar calcada em bases científicas, acaba por ganhar ressalto em relação às demais, dando, se adequadamente produzida, maior suporte à decisão. Todavia, mesmo estando alicerçada na ciência, a prova pericial não pode, e nem deve, ficar alheia à contestação (contraditório), ainda que esta seja feita durante a fase investigativa da persecução penal onde sequer exista um processo em andamento. Nesse sentido, o legislador por meio da recente Lei nº 11.690/08, inspirado no Direito Processual Civil, procurou alargar o poder de contestação das partes em relação à prova pericial. O método empregado será o método dedutivo, com abordagem exploratória teórico-bibliográfica.

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ABSTRACT

FREZ, Adeildo. The adversarial principle and its application in the evidence in the seat of the police investigation. 76 pages. Completion of work the course. Federal University from Rondônia – Campus from Cacoal – 2011.

This paper will examine the possibility of incidence of the principle of contradiction in the police report, reflecting on the obligation and usefulness of the investigation procedures to inform such a principle, especially during the production of expert evidence. Although there is no hierarchy among the admissible evidence in the Brazilian legal system, the expert evidence, to be grounded on a scientific basis, eventually winning over the other shoulder, giving, if properly produced, increased support for the decision. However, despite being grounded in science, expert evidence cannot and should not, remain aloof to the opposition (contradiction), even if it is made during the investigative phase of criminal prosecution even where there is an ongoing process. In this sense, the legislature through recent Law No. 11.690/08, inspired by the Civil Procedure Law, sought to extend the power of contending parties in relation to expert evidence. The method used was the deductive method, with theoretical and exploratory approach to literature.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

1 O ESTADO E O DIREITO DE PUNIR ...14

1.1 INTRÓITO ...15

1.2 SOCIEDADE E TUTELA JURÍDICA...16

1.3 DA AUTOTUTELA À JURISDIÇÃO...17

1.4 FUNÇÃO ÉTICO-SOCIAL DO DIREITO PENAL...19

1.5 CARACTERÍSTICA DO JUS PUNIENDI: FUNÇÃO SOCIAL?...21

2 CONTRADITÓRIO: DIREITO FUNDAMENTAL...24

2.1 ELEMENTOS DO CONTRADITÓRIO...25 2.1.1 Direito à informação...27 2.1.2 Direito à participação...28 2.2 DIREITO AO CONTRADITÓRIO...28 2.2.1 Conceito de contraditório...29 2.3 FORMAS DE CONTRADITÓRIO...30 2.3.1 Contraditório de fatos...30 2.3.2 Contraditório de direito...31 2.3.3 Contraditório de provas...32

2.3.4 Contraditório de alegações e requerimentos...32

3 CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL...34

3.1 DA POSSIBILIDADE...34

3.1.1 No inquérito policial...35

3.1.2 Do atingimento de finalidade...39

3.2 DA CRISE DE INTERPRETAÇÃO...42

3.2.1 Valor probatório...45

3.2.2 Autores e argumentos favoráveis à aplicação do contraditório no Inquérito Policial...46

3.2.3 Argumentos contrários à adoção do princípio do contraditório no inquérito policial...48

3.3 O PROBLEMA DOS “EXTREMOS”...49

4 A PROVA NO PROCESSO PENAL: CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA, OBJETO E CLASSIFICAÇÃO...51

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4.1.1 Limites à atividade probatória...55

4.2 ÔNUS DA PROVA E PROCEDIMENTO PROBATÓRIO...56

4.3 A PROVA PERICIAL E O CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO...57

4.3.1 Envolvimento da Criminologia...57

4.3.2 Conceito de prova pericial...59

4.3.3 Exame de corpo de delito...60

4.3.4 Meios de produção da perícia...60

4.4 DISCIPLINA LEGAL...61

4.4.1 Formalidades genéricas...61

4.4.2 Contraditório e direito de defesa na prova pericial...63

4.4.3 Limitações na fase pré-processual...64

4.4.4 Admissão do contraditório à prova pericial...65

4.4.5 Aplicação do "contraditório tardio" às provas periciais...66

CONSIDERAÇÕES FINAIS...68

REFERÊNCIAS...71

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INTRODUÇÃO

A prova pericial de natureza criminal é de fundamental, de suma importância a fim de se reconstruir a maneira como se deram os fatos, ou seja, a dinâmica dos acontecimentos no local da infração penal.

No processo penal sua importância se ressalta, sendo, através do exame de corpo de delito, considerada indispensável em infrações que deixam vestígios.

De acordo com o princípio de imediação, cada ato que fará parte da instrução probatória deverá ser feito perante um juiz natural.

O referido princípio apresenta estreito vínculo com o princípio da ampla defesa, concluindo-se como condição sine qua non a participação das partes na formação probatória perante o juízo.

A perícia possui características peculiares que a definem como meio de prova. Além disso, algumas perícias apresentam natureza cautelar, sendo feitas durante a fase inquisitorial – ou seja, no inquérito policial –, anteriormente ao processo, necessitando, consequentemente, peculiaridades no contraditório, o qual nem sempre permite participação efetiva e suficiente das partes envolvidas, devido ao conteúdo técnico-científico das provas ou pelo modo de seu exercício, ressaltando interesse por parte dos operadores de direito e dos doutrinadores do direito processual.

Ao percorrer, observando e examinando, o texto da Lei nº. 11.690, de 2008, o intérprete percebe de imediato a tônica da reforma, que é prestigiar o garantismo penal, reforçando o poder de participação das partes na fase instrutória do processo.

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O tema da prova se refere à satisfatória apuração dos fatos relevantes do caso investigado pelas autoridades policiais, judiciais ou Ministério Público, pois ninguém sustentará a justiça de uma decisão que, em medida considerável, afastou-se da realidade concreta que lhe afastou-serviu de baafastou-se empírica.

Analisando-se de forma minudente, percebe-se que o direito à prova está intimamente vinculado ao emprego do procedimento regular, válido e justo para se chegar a uma decisão judicial com os mesmos adjetivos.

Efetivamente, as provas somente serão úteis em seu mister de convencimento judicial e justa, no sentido de ser legitimamente inserida no processo, se o seu procedimento de admissão, produção e valoração, foram orientados pela participação efetiva dos sujeitos processuais, ou seja, das partes, autora e réu(s) e do magistrado.

Nesse contexto, os dispositivos alterados pela Lei nº. 11.690, de 09 de junho de 2008, alterou o Código de Processo Penal (CPP) brasileiro convergem para esse sentido axiológico, da maior participação possível das partes na produção das provas, mormente na produção da prova pericial no processo penal, que já era possível em sede de processo civil, não, porém, naquele.

No que concerne à produção e à apreciação da prova, o legislador buscou dar efetividade ao direito de defesa, e também ao contraditório, ambos assegurados na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Dentre as várias inovações, o legislador ordinário realçou a importância do contraditório com a recente reforma do CPP, que trouxe limitação ao livre convencimento do juiz na apreciação das provas, ao vedar a fundamentação de decisão baseada exclusivamente nos elementos informativos obtidos na investigação policial em procedimento de inquérito policial, exigindo-se prova produzida em contraditório judicial, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Conforme disposto em entendimentos nos referenciais teóricos utilizados no presente trabalho, o conflito de nossa Constituição com o Código de Processo Penal produziu um sistema híbrido, em que temos um Código de forte alma inquisitiva, iluminado por uma Constituição Federal imantada pelos princípios democráticos do sistema acusatório.

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Por essas causas, o presente trabalho dedica-se a entender esse problema, mostrando a necessidade de constitucionalizar, ou judicializar, a fase inquisitorial (o inquérito policial), sem, contudo ser abolido tal procedimento administrativo.

O método científico a ser utilizado no presente trabalho de conclusão de curso é o método dedutivo, com uma abordagem exploratória teórico-bibliográfica sobre o tema.

Segundo Gil (1999), método é um conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos necessário à investigação científica. Como o conhecimento científico fundamenta-se na razão, precisa ser sistemático, a fim de que possa ser testado e comprovado por outros membros da comunidade científica, daí a necessidade do método. Dentre os métodos consolidados da pesquisa científica estão o dedutivo e o indutivo.

O método dedutivo, de base racionalista, pressupõe que apenas a razão pode conduzir ao conhecimento verdadeiro. Partindo de princípios reconhecidos como verdadeiros e inquestionáveis (premissa maior), o pesquisador estabelece relações com uma proposição particular (premissa menor) para, a partir de raciocínio lógico, chegar à verdade daquilo que propõe (conclusão) (LAKATOS; MARCONI, 1993).

Inicialmente será analisado o poder estatal de punir (jus puniendi), composto de três elementos: o poder de ameaçar com pena e o direito de aplicar e também de executar a pena aplicada. Também se verificará que o direito de punir passou por várias fases, desde a vingança privada, passando pela autocomposição, pela arbitragem, até o Estado absorver o poder de ditar soluções para os conflitos.

Em seguida, será examinado o princípio do contraditório, seus elementos, a sua conceituação e suas formas de exercício, chegando à conclusão de que tal princípio se trata de um direito fundamental.

O terceiro capítulo se dedica a analisar a possibilidade de aplicabilidade do princípio do contraditório em sede de inquérito policial, se realmente tal princípio atende sua finalidade, bem como serão vistos os argumentos e autores favoráveis e contrários à aplicação do contraditório ao procedimento do inquérito policial.

Por fim, surge o tema da prova no processo penal, em especial a prova pericial e a admissão do princípio do contraditório em sede de inquérito policial.

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1 O ESTADO E O DIREITO DE PUNIR



É com a prática de uma infração penal por um indivíduo que nasce para o Estado o seu direito, ou poder-dever, de punir (jus puniendi).

Nos dizeres de Beccaria (1997) o direito do soberano de punir os delitos se funda sobre a necessidade de defender o depósito da salvação pública das usurpações particulares.

Ensina Dalari (2007) que a partir da análise da grande variedade de conceitos de Estado, revelam-se duas orientações fundamentais: ou se dá mais ênfase a um elemento concreto ligado à noção de força, ou se realça a natureza jurídica, tomando-se como ponto de partida a noção de ordem.

Veja-se o que diz Dalari (2007, p. 117):

Entre os conceitos que se ligam mais à noção de força e que poderiam ser classificados como políticos não está ausente a preocupação com o enquadramento jurídico, mas o Estado é visto, antes de mais nada,

como força que se põe a si própria e que, por suas próprias virtudes, busca a disciplina jurídica (grifo nosso).

Duguit (apud Dalari, 2007, p. 117) conceitua o Estado como “uma força material irresistível [...] limitada e regulada pelo Direito”.

No mesmo sentido pode ser colocada a conceituação de Burdeau (apud Dalari, 2007, p. 110) para quem o Estado é “uma institucionalização do poder”.

Tais conceitos mantêm a tônica da ideia da força, mesmo que associada a outros elementos e disciplinada parcialmente pelo Direito.

As teorias que realçam a natureza jurídica “[...] não ignoram a presença da força do Estado, nem que este, por suas finalidades, é uma sociedade política” (Dalari, 2007, p. 118).

Essa preocupação em fixar uma noção jurídica de Estado, segundo Dalari (2007, p. 118):

Surge no século XIX, na Alemanha, com Gerber e seus seguidores procurando estabelecer o conceito de Estado como pessoa jurídica e subordinar a regras jurídicas o seu funcionamento. É Jellinek, porém, quem vai fixar esse conceito basicamente jurídico, chegando à noção de Estado como corporação territorial dotada de um poder de mando originário. Como fica evidente, a base do conceito é a idéia de corporação, que é uma ordenação jurídica de pessoas. Essa corporação é territorial, por se fixar a determinado território e, além disso, é dotada de poder de mando. Este poder, ainda que originário, isto é, existindo desde o momento de

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constituição da corporação, é um componente dela, não sendo, porém, o fator central, unificador, que deva ser tomado como ponto de partida para a conceituação.

Kelsen (apud Dalari, 2007, p. 119), preocupado em fixar uma noção puramente jurídica de Estado, considerando exteriores a ele todos os fatores não-jurídicos, chega à noção de “Estado como ordem coativa normativa da conduta humana”.

Vê-se que o poder é um elemento essencial do Estado e que, entre as formas de poder estatal tem-se o poder de punir (jus puniendi), oriundo do poder de império exercido sobre as pessoas.

1.1 INTRÓITO

Segundo Almeida (2008), o Estado é um ente político o qual, dotado de soberania, detém, de forma exclusiva, o direito de punir (jus puniendi). O jus puniendi deve ser compreendido como o direito de punir do Estado, revelando-se no Direito Penal Subjetivo, que se compõe de três elementos: a) poder de ameaçar com pena; b) direito de aplicar a pena; c) direito de executar a pena. Nesse momento, devemos observar as duas facetas do jus puniendi. De um lado, temos a punibilidade abstrata, revelada no poder pertencente ao Estado de, abstratamente, prever determinada pena e também de ameaçar de aplicá-la. De outro lado, a punibilidade concreta, que nada mais é que o poder-dever que o Estado tem de aplicar a pena de modo concreto, efetivo, quando do cometimento da infração penal (ALMEIDA, 2008).

Capez (2008, p. 582), assevera que:

Mesmo na ação de iniciativa privada, o particular possui apenas a prerrogativa de dar início ao processo, por meio da queixa. No entanto, o jus puniendi continua com o Estado, tanto que é possível a este conceder anistia em crime de ação privada (ora, só quem detém o jus puniendi pode a ele renunciar). Esse direito existe abstratamente, independente de vir a ser praticada a infração penal, e se impõe a todos indistintamente. O Estado não tem o poder de punir fulano ou beltrano, mas simplesmente tem o poder de punir (qualquer eventual infrator). No momento em que um crime é praticado, esse direito abstrato e impessoal se concretiza e se volta especificamente contra a pessoa do delinqüente.”

Assim, percebe-se que o Estado, soberano, pode ameaçar com pena possíveis transgressores da lei, aplicá-la aos que cometem crime, além executá-la, depois de aplicada.

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1.2 SOCIEDADE E TUTELA JURÍDICA

Inicialmente, devemos reconhecer que, no atual estágio de conhecimentos científicos sobre o Direito, predomina o entendimento de que “ubi societas ibi jus”, ou seja, não há sociedade sem direito. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2008)

Ao iniciar capítulo sobre o tema, Cintra, Grinover e Dinamarco (2008, p. 25) indagam: “qual a causa dessa correlação entre sociedade e direito?”.

Em seguida, mencionam os autores que

[...] a resposta está na função que direito exerce na sociedade: a função ordenadora, isto é, de coordenação dos interesses que se manifestam na vida social, de modo a organizara a cooperação entre pessoas e compor os conflitos que se verificarem entre os seus membros (op. cit, p. 25).

Continuam os autores (2008), dizendo que a tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste, devendo orientar essa coordenação ou harmonização o critério do justo e do eqüitativo.

Exatamente por isso, pelo aspecto sociológico, o direito é geralmente apresentado como uma das formas do chamado controle social, o qual é entendido como:

[...] o conjunto de instrumentos de que a sociedade dispõe na sua tendência à imposição dos modelos culturais, dos ideais coletivos e dos valores que persegue, para a superação das antinomias, das tensões e dos conflitos que lhe são próprios (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2008, p. 26).

Ocorre que a existência do direito, como forma de controle social, não é suficiente para evitar ou eliminar os conflitos.

E os conflitos geram, por si só, insatisfação e, ainda no dizer Cintra, Grinover e Dinamarco (2008, p. 26):

[...] a experiência de milênios mostra que a insatisfação é sempre um fator anti-social, independentemente de a pessoa ter ou não ter direito ao bem pretendido. A indefinição de situação das pessoas perante outras, perante os bens pretendidos e perante o próprio direito é sempre motivo de

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angústia e tensão individual e social. Inclusive quando se trata de indefinição quanto ao próprio jus punitionis do Estado em determinada situação concretamente considerada: sendo o valor liberdade uma inerência da própria pessoa humana, a que todos almejam e não pode ser objeto de disposição da parte de ninguém, a pendência de situações assim é inegável fator de sofrimento e infelicidade, que precisa ser debelado. Os conflitos podem ser eliminados por obra de um ou de ambos os sujeitos dos interesses em jogo, ou por um ato de terceiro. Na primeira hipótese (autocomposição), um dos sujeitos – ou ambos – sacrifica, total ou parcialmente, o próprio interesse ou, ainda, impõe o sacrifício do interesse alheio (autodefesa ou autotutela). Na segunda, enquadram-se a defesa de terceiro, a conciliação, a mediação e o processo (estatal ou arbitral).

Destarte, resta claro que onde houver uma sociedade, há que existir o Direito, em razão da função ordenadora por este exercida, tendo a ordem jurídica a missão de harmonizar as relações entre os sujeitos da sociedade, exercendo, assim, o controle social.

1.3 DA AUTOTUTELA À JURISDIÇÃO

As formas de eliminação de conflitos, tal como as conhecemos hoje, não foram, contudo, sempre assim.

Primitivamente, não existia um Estado com força suficiente para superar o individualismo dos homens e impor o direito acima da vontade dos particulares. Não havia um órgão estatal que garantisse o cumprimento do direito, como ainda não havia sequer as leis.

Aquele que pretendia algo que outrem o impedisse de obter teria de conseguir, com suas próprias forças, a satisfação de sua pretensão.

Até mesmo a repressão aos crimes se fazia, no que trata a lição de Cintra, Grinover e Dinamarco (2009, p. 27),

[...] em regime de vingança privada e, quando o Estado chamou a si o jus punitionis, ele o exerceu inicialmente mediante seus próprios critérios e decisões, sem a interposição de órgãos ou pessoas imparciais independentes e desinteressadas. A esse regime chama-se autotutela (ou autodefesa) e hoje, encarando-a do ponto de vista da cultura do século XX, é fácil ver como era precária e aleatória, pois não garantia a justiça, mas a vitória do mais forte, mais astuto ou mais ousado sobre o mais fraco ou mais tímido.

Como explica Alonso (apud LOPES JÚNIOR, 2011, p. 3), resumindo brevemente a evolução da pena:

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[...] inicialmente a reação era eminentemente coletiva e orientada contra o membro que havia transgredido a convivência social. A reação social é, na sua origem, basicamente religiosa, e só de modo paulatino se transforma em civil. O principal é que nessa época existia uma vingança coletiva, que não pode ser considerada como pena, pois vingança e pena são dois fenômenos distintos. A vingança implica liberdade, força e disposições individuais; a pena, a existência de um poder organizado.

Lopes Júnior (2011) nos ensina que com a evolução da estrutura e da organização da coletividade, surge o sistema de composição, sucedendo a vingança, e que consistia no pagamento de um determinado valor à comunidade. A princípio, eram os parentes da vítima que tinham o direito de aplicar tais sanções e aceitar os pagamentos. Posteriormente, o Estado assume tal papel.

Cintra, Grinover e Dinamarco (2009), ministram que além da autotutela, a outra solução possível nos sistemas primitivos seria a autocomposição: uma das partes em conflito, ou ambas, abrem mão do interesse ou de parte dele. Para eles, são três as formas de autocomposição, a saber: a desistência, que é a renúncia à pretensão; a submissão, que é a renúncia à resistência oferecida à pretensão; e a transação, que são concessões recíprocas.

Aos poucos, os indivíduos foram se apercebendo dos males de tal sistema e passaram a preferir uma solução amigável e imparcial através de árbitros, pessoas de sua confiança mútua em que as partes confiam a resolução de seus conflitos, em geral, aos sacerdotes ou aos anciãos, os quais conheciam os costumes do grupo social integrado pelos interessados. Posteriormente, e conforme o Estado foi se afirmando e conseguiu se impor aos particulares mediante a invasão de sua esfera de liberdade, nasceu, também de forma gradativa, a sua tendência em absorver o poder de ditar as soluções para os conflitos. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2009).

No direito romano arcaico (até o século II a.C.), já participava o Estado dessas atividades destinadas a indicar qual o preceito a ser aplicado à solução do caso concreto em um conflito de interesses. Os cidadãos em conflito compareciam perante o pretor, comprometendo-se a aceitar o que viesse a ser decidido. Em seguida, então, escolhiam um árbitro de sua confiança, que recebia do pretor o encargo de decidir a causa. Esse sistema perdurou ainda durante todo o período clássico do direito romano (séc. II a.C até o séc. II d.C.), sendo que, correspondentemente ao fortalecimento do Estado, aumentou a participação através da conquista do poder de nomear o árbitro (o qual era de início nomeado pelas

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partes e apenas investido pelo magistrado). Vedada que era a autotutela, o sistema então implantado consistia numa arbitragem obrigatória, que substitui a anterior arbitragem facultativa (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2009).

Os autores afirmam ainda que, além disso, para facilitar a sujeição das partes às decisões de um terceiro, a autoridade pública começa a preestabelecer, em forma abstrata, regras destinadas a servir de critério objetivo e vinculativo para tais decisões, afastando assim os temores de julgamentos arbitrários e subjetivos. Surge, então, o legislador. Após esses dois períodos, seguiu-se outro que se caracterizou pela invasão de área que antes não pertencia ao pretor. Contrariando a ordem estabelecida, passou este a conhecer ele próprio do mérito dos litígios entre os particulares, proferindo sentença, inclusive, ao invés de nomear ou aceitar a nomeação de um árbitro que o fizesse. Com essa nova fase, iniciada no século III d.C., completou-se o ciclo histórico da evolução da chamada justiça privada para a justiça pública: o Estado, já suficientemente fortalecido, impõe-se sobre os particulares e, prescindindo da voluntária submissão destes, impõe-lhes autoritativamente a sua solução para os conflitos de interesses. À atividade mediante a qual os juízes estatais examinam as pretensões e resolvem conflitos dá-se o nome de jurisdição. Pela jurisdição, os juízes agem em substituição às partes, que não podem fazer justiça pelas próprias mãos. Às partes resta a possibilidade de provocar o exercício da função jurisdicional, por meio de seu instrumento, que é o processo.

1.4 FUNÇÃO ÉTICO-SOCIAL DO DIREITO PENAL

A função do direito penal é a proteção de valores fundamentais, essenciais à subsistência da sociedade, tais quais a vida, a saúde, a liberdade, a propriedade, entre tantos outros, denominados bens jurídicos.

Tal proteção, segundo Capez (2008, p. 1),

[...] é exercida não apenas pela intimidação coletiva, mais conhecida como prevenção geral e exercida mediante a difusão do temos aos possíveis infratores do risco da sanção penal, mas sobretudo pela celebração de compromissos éticos entre o Estado e o indivíduo, pelos quais se consiga o respeito às normas, menos por receio de punição e mais pela convicção da sua necessidade e justiça.

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ϮϬ 

Qualquer lesão aos bens jurídicos resguardados pelo Direito Penal finda em um resultado indesejado, que é valorado negativamente, afinal foi ofendido um interesse relevante para a coletividade, não significando, porém, que aquela seja, necessariamente, em si mesma sempre reprovável, pois devemos lembrar daqueles eventos danosos oriundos de caso fortuito, força maior e até mesmo os causados involuntariamente.

Assim, segundo Capez (2008), assumindo o Direito Penal o papel de mero difusor do medo e da coerção, deixa de preservar os valores básicos necessários à coexistência pacífica entre os integrantes da sociedade política. E assim, complementa:

A visão pretensamente utilitária do direito rompe os compromissos éticos assumidos com os cidadãos, tornando-os rivais e acarretando, com isso, ao contrário do que possa parecer, ineficácia no combate ao crime. (...) Estabelece-se um compromisso de lealdade entre o Estado e o cidadão, pelo qual as regras são cumpridas não apenas por coerção, mas pelo compromisso ético-social que se estabelece, mediante a vigência de valores como o respeito à vida alheia, à saúde, a liberdade, à propriedade, etc (CAPEZ, 2008, p. 2).

Quando tipifica e castiga qualquer eventual ou real lesão aos deveres ético-sociais, o Direito Penal exerce função de formação do juízo ético dos cidadãos, que passam a ter bem definidos quais os valores precípuos para a convivência em sociedade.

À guisa de exemplo, todos sabemos que a ordem jurídica tutela, resguarda o direito à vida, proibindo qualquer lesão ou ameaça de lesão a tal direito, consistente no dever ético-social de “não matar”. Ocorre que, ao se infringir tal norma proibitiva, tem o Estado o dever (na verdade, o poder-dever) de acionar prontamente os seus mecanismos legais para, efetivamente, impor a sanção penal à transgressão no caso concreto, esclarecendo à sociedade de um modo geral, o valor que se dá ao interesse (bem jurídico) violado. Por outro ângulo, à medida que o Estado se torna moroso, omisso ou atém mesmo injusto, tratando diferentemente situações semelhantes, incute na consciência coletiva a pouca importância que dedica aos valores éticos e sociais, afetando a crença na justiça penal e propiciando que a sociedade deixe de respeitar tais valores, pois ele próprio se incumbiu de demonstrar sua pouca ou nenhuma vontade no acatamento a tais deveres, através de sua morosidade, ineficiência ou omissão (CAPEZ, 2008).

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Finalmente, deve-se concordar com Welzel (apud CAPEZ, 2008, p.3), quando diz: “[...] mais essencial que o amparo aos bens jurídicos particulares concretos é a missão de assegurar aos cidadãos o permanente acatamento legal ante aos bens jurídicos; é dizer, a fidelidade frente ao Estado, o respeito à pessoa.”

1.5 CARACTERÍSTICAS DO JUS PUNIENDI: FUNÇÃO SOCIAL?

Como se trata de uma manifestação do poder soberano estatal, o direito de punir apresenta as seguintes características: exclusividade e indelegabilidade. Ou seja, por exclusividade se entende que só e tão somente o Estado poderá – e deverá –, nos termos da lei, exercê-lo; por indelegabilidade, em uma decorrência lógica da exclusividade, que tal direito de punir não pode ser atribuído a nenhum outro ente de natureza privada.

Deve-se sempre ter em mente, e que deve prevalecer mesmo ante à acusação do cometimento de um delito, que a regra é a plena liberdade, sendo o enclausuramento, a segregação, uma exceção a essa regra.

Tanto isso é verdade que a Constituição Federal da República (BRASIL, 1988), em seu art. 5º., enumera diversos incisos, os quais corroboram tal entendimento. Veja-se:

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

[...]

LXI – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente [...];

[...]

LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

LXVI – ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

[...]

LXVIII – conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder;

Dalari (2007, p. 10), diz que “assim com Aristóteles dissera que só os indivíduos de natureza vil ou superior procuram viver isolados, São Tomás de Aquino afirma que a vida solitária é uma exceção [...]”. Cícero (apud Dalari, 2007, p. 10) ensina que “a espécie humana não nasceu para o isolamento e para a vida

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errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundância de todos os bens, a leva a procurar o apoio comum”.

Já Rousseau (apud DALARI, 2007), partindo da existência de uma liberdade natural, que a sociedade deve proteger, não aniquilar, chega à conclusão de que “se indagarmos em que consiste precisamente o maior bem de todos, que deve ser o fim de toda legislação, encontraremos dois objetos principais: liberdade e igualdade”.

Tavares (apud LOPES JÚNIOR, 2011, p. 8) ensina que nessa questão entre liberdade individual e poder de intervenção do Estado não se pode esquecer que “a garantia e o exercício da liberdade individual não necessitam de qualquer legitimação, em face de sua evidência”.

Lopes Júnior (2011, p. 8) complementa:

Parece, essa, uma afirmação simples, despida de maior dimensão. Todo o oposto. A perigosa viragem discursiva que nos está sendo (im)posta atualmente pelos movimentos repressivistas e as ideologias decorrentes faz com que, cada vez mais, a “liberdade” seja “provisória” (até o CPP consagra a liberdade provisória...) e a prisão cautelar (ou mesmo definitiva) uma regra. Ou ainda, aprofundam-se a discussão e os questionamentos sobre a legitimidade da própria liberdade individual, principalmente no âmbito processual penal, subvertendo a lógica do sistema jurídico-constitucional.

E para Lopes Júnior (2011), deve ser destacado que:

[...] o que necessita ser legitimado e justificado é o poder de punir, é a intervenção estatal e não a liberdade individual, sendo uma premissa básica da obra do autor o questionamento da legitimidade do poder de intervenção, por conceber a liberdade individual como valor primevo do processo penal, e que esta, por decorrer necessariamente do direito à vida e da própria dignidade da pessoa humana, está amplamente consagrada no texto constitucional e em tratados internacionais, sendo mesmo um pressuposto para o Estado Democrático de Direito em que vivemos.

Para o autor, o processo não pode mais ser visto como um simples instrumento do poder punitivo, senão que desempenha o papel de limitador do poder punitivo e garantidor do indivíduo submetido à prática arbitrária do Estado em punir (LOPES JÚNIOR, 2011).

Um argumento recorrente em matéria penal é o de que os direitos individuais devem ceder (e, portanto, ser sacrificados) frente à “supremacia” do interesse público. Trata-se de uma manipulação discursiva que faz um maniqueísmo

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grosseiro e interesseiro para legitimar e pretender justificar o abuso de poder. Isso está plenamente superado e, além disso, em matéria penal, todos os interesses em jogo (principalmente os do réu) superam a esfera do privado, situando-se na dimensão de direitos e garantias fundamentais (LOPES JÚNIOR, 2011).

Os direitos fundamentais, como explica W. Goldschmidt (apud LOPES JÚNIOR, 2011), dirigem-se contra o Estado e pertencem, por consequência, à seção que trata do amparo do indivíduo contra o Estado.

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2 CONTRADITÓRIO: DIREITO FUNDAMENTAL

Um dos mais importantes princípios, no sistema acusatório, é o princípio do contraditório (ou da bilateralidade da audiência), sendo garantido constitucionalmente com fundamento no art. 5º., LV, da Constituição Federal:

Art. 5º, LV – Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (BRASIL, 1988).

Silva (2002, p. 91), ao discorrer sobre os Princípios Constitucionais Fundamentais), diz que “Princípio aí exprime a noção de mandamento nuclear de um sistema”.

Bandeira de Mello (apud SILVA, 2002, p. 91) define princípio jurídico como:

[...] mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.

Para Canotilho e Moreira (apud SILVA, 2002, p. 92):

[...] os princípios, que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípio e constituindo preceitos básicos da organização constitucional.

Conforme leciona Silva (2002), os princípios constitucionais são basicamente de duas categorias: os princípios político-constitucionais e os princípios jurídico-constitucionais, sendo que os primeiros se constituem daquelas decisões políticas fundamentais concretizadas em normas conformadoras do sistema constitucional positivo e são normas-princípio, que traduzem as opções políticas fundamentais conformadoras da Constituição ou sobre a particular forma de existência política da nação (arts. 1º. a 4º. do Título I da Constituição Federal). Os princípios jurídico-constitucionais são princípios constitucionais gerais informadores da ordem jurídica nacional. Eles decorrem de certas normas constitucionais e não raro constituem desdobramentos (ou princípios derivados) dos fundamentais, como o princípio da supremacia da constituição e o conseqüente princípio da

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constitucionalidade, o princípio da legalidade, o princípio da isonomia, entre outros, além dos chamados princípios-garantias (o do nullum crimen sine lege e da nulla poena sine lege, o do devido processo legal, o do juiz natural, o do contraditório entre outros, que figuram nos incisos XXXVIII a LX do art. 5º).

Ainda, no dizer de Canuto (apud BEDÊ JÚNIOR; SENA, 2009, p. 129), é delineado como a “ciência bilateral dos atos ou termos do processo e possibilidade de contrariá-los”.

Desta forma, segundo clássica lição:

[...] a essência do princípio do contraditório residiria na discussão dialética dos fatos da causa, o que torna necessário que se assegure no processo a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos praticados pelas partes. Daí por que também se fala em ‘audiência bilateral’, traduzida na expressão latina audiatur et altera pars (seja ouvida também a parte adversa), norma pela qual há de se assegurar a concessão de vista à parte contrária dos pedidos e alegações formulados pela outra parte, bem como dos documentos que uma delas junte aos autos, a fim de que o ex adverso possa refutar os argumentos expendidos ou fazer prova em contrário (BEDÊ JÚNIOR; SENNA, 2009, p. 129-130).

Logo, em uma primeira conclusão que se extrai do que até aqui foi dito é que o princípio do contraditório deverá ser observado em relação à acusação e à defesa, constituindo-se um equívoco restringir sua abordagem somente ao ponto de vista da defesa.

Dessa forma, resta concluir que o princípio do contraditório é garantido a ambas as partes no processo penal, tanto ao órgão acusatório quanto à defesa, pois, do contrário, haveria uma proteção deficiente quanto aos direitos da vítima e da própria coletividade (BEDE JÚNIOR; SENNA, 2009).

Nucci (2010, p. 286) diz que “embora [o princípio do contraditório] tenha algumas distorções, [estas] merecem ser limitadas.”

2.1 ELEMENTOS DO CONTRADITÓRIO

Para saber qual é o seu real alcance, descobrir quais são os elementos do contraditório representa uma tarefa importante.

A doutrina, nesse ponto, varia. No entanto, são oportunas as observações de Mendonça (apud BEDE JÚNIOR; SENA, 2009, p. 131), que, muito embora aborde tal princípio sob a ótica do processo civil, trazem importante síntese das

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posições existentes sobre o tema, que são perfeitamente aplicáveis ao processo penal. Desta forma, na síntese do autor:

Dinamarco aponta informação e participação como elementos do contraditório. Já Nelson Nery Jr., na esteira de Sérgio de La China, fala em informação e ‘reação’. Joaquim Canuto Mendes de Almeida se refere à informação e ‘contrariedade’. Rogério Lauria Tucci aduz informação e ‘manifestação’. Vicente Greco Filho se refere a informação e contraposição.

Entretanto, atualmente, o princípio do contraditório deve ter uma concepção mais alargada. A sua adoção deverá garantir uma efetiva participação daqueles envolvidos no desenvolvimento regular do processo.

Essa participação efetiva dar-se-á mediante a plena igualdade (real) para que, influindo na apuração dos fatos, na produção das provas, em questões de direito material ou processual, que, ligadas diretamente com o objeto da causa, sejam potencialmente relevantes para uma futura decisão.

Assim, “é inquestionável que o princípio do contraditório também deve assegurar às partes a paridade no tratamento.” (BEDÊ JÚNIOR; SENNA, 2009, p. 131).

Modernamente, além dos elementos do direito de manifestação (informação e participação), possui um terceiro elemento que é o direito de ver seus argumentos considerados. Isso traz como consequência o dever de o juiz tomar conhecimento, bem como de considerar os argumentos alegados pela parte, isso tudo derivado do princípio da necessidade de fundamentação de todas as decisões judiciais, consubstanciado no art. 93, IX, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).

Quanto ao tema da publicidade e motivação das decisões judiciais, Silva (2002) aponta que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas as decisões, sob pena de nulidade.

Portanto, resta induvidoso que o princípio estudado é essencial ao devido processo legal e só assim teremos, também, um processo realmente justo, à medida que não há processo justo que não se realize em contraditório, ou que, segundo moderna doutrina, não existe processo sem contraditório. Neste ponto, invocamos o pensamento de Fazzalari (apud LOPES JÚNIOR, 2006, p.42), que entende o processo como sendo “todo procedimento realizado em contraditório”.

Dito de outra forma, exige-se que haja um contraditório real, efetivo, e não meramente formal, ainda mais frente a um processo penal, onde estão em jogo

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valores fundamentais da pessoa humana, que merecem ser tutelados, ainda que o agente tenha cometido um crime, pois ao Estado, mormente que se diz “Democrático” e de “Direito”, também interessa a preservação da liberdade e o respeito aos postulados do devido processo legal.

O contraditório, ao passo que deixa de ser meramente um princípio para constituir, em si mesmo, uma garantia fundamental, é o grande salto de nosso tempo, consubstanciando-se em uma ponte de mão dupla entre as partes e o juiz, de modo que, conjuntamente, cheguem à solução da causa, da forma mais efetiva e justa.

Dessa forma, ensina Greco (2005) que o juiz passa a integrar o contraditório, assegurando às partes os meios necessários para influenciar eficazmente a decisão judicial e, conseqüentemente, a observância do princípio político da participação democrática.

Lopes Júnior (2006) destaca que o contraditório é imprescindível para a própria existência da estrutura dialética do processo.

Apesar de concordar com a posição dos que consideram ser três os elementos do contraditório, a abordagem doravante realizada se restringirá a apenas dois de seus elementos: o direito à informação e o direito de participação.

2.1.1 Direito à informação

Tal direito é inerente ao princípio do contraditório, haja a impossibilidade de defesa de direitos sem o conhecimento da existência da demanda e de seu conteúdo, dos argumentos dos contendores, inclusive da intervenção da parte contrária. É a informação, portanto, pressuposto para a efetiva participação.

No processo, a participação ocorre por meio das comunicações dos atos processuais, realizadas pelas citações, intimações e notificações, que devem se revestir de idoneidade. Do contraditório decorre o direito à informação dos atos e pronunciamentos das partes, mas não só isto, também dos atos realizados pelo magistrado e dos serventuários da justiça, durante toda a duração do processo.

Como ressaltam Bedê Júnior e Senna (2009, p. 133):

A importância do direito à informação é tamanha no processo penal que, desde 1996, com a alteração do art. 366 do CPP, não é mais

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possível prosseguir com o processo quando o réu for citado por edital, não comparecer ao interrogatório e não constituir advogado para sua defesa. [...] presentes tais requisitos impõe-se a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, o que representa uma clara observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Assim, para que o princípio do contraditório seja concretizado de forma efetiva, é mister que as partes sejam informadas de todos os atos realizados durante o curso do processo criminal.

2.1.2 Direito à participação

Conforme dito anteriormente, é pressuposto da participação o direito à informação, o que não quer dizer que aquele elemento seja menos importante, pois “inexiste contraditório e, portanto, processo justo, se não se assegura o direito à participação, que [...] engloba os termos reação, manifestação, confrontação, contrariedade e contraposição.” (BEDÊ JÚNIOR; SENNA, 2009, p. 134)

É de fundamental importância que seja garantida a participação, porque se exige que o processo em contraditório seja dialético (tese, antítese e conclusão) para se chegar à verdade e para uma melhor prestação jurisdicional.

Desta forma, o princípio não se esgota com a mera oitiva da(s) parte(s), sendo imprescindível dar oportunidade de rebater os argumentos contrários, de manifestar oposição, isso com argumentos e provas.

Não tem sentido o contraditório se é oportunizado a oitiva, mas não lhe é dada a mesma oportunidade para provar o alegado.

Assim o fazendo, assegurar-se-á às partes um contraditório efetivo e real, e não puramente formal.

Efetivamente, este é o ponto nuclear do trabalho ora desenvolvido, em que se busca demonstrar a necessidade de sua aplicação ao procedimento administrativo do inquérito policial.

2.2 DIREITO AO CONTRADITÓRIO

Como já dito anteriormente, o princípio ora em comento, verdadeiro princípio jurídico-constitucional (SILVA, 2002), a par do princípio da ampla defesa,

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possui o status de cláusula pétrea e, por isso, nenhuma proposta de emenda constitucional tendente a aboli-lo será objeto de exame ou deliberação pelo Poder Legislativo, conforme se depreende do art. 60, §4º, IV, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).

2.2.1 Conceito de Contraditório

Teve surgimento o inquérito policial entre nós com o advento da Lei nº. 2.033/71 (BRASIL, 1971 a), regulamentada pelo Decreto-Lei nº. 4.824/71 (BRASIL, 1971 b), sendo que o artigo 42 da referida lei assim o definia:

O inquérito policial consiste em todas as diligências necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito.

Assim, pode-se conceituar o inquérito policial como sendo

[...] o procedimento administrativo, preparatório e inquisitivo, presidido pela autoridade policial, e constituído por um complexo de diligências realizadas pela polícia judiciária com, vistas à apuração de uma infração penal e à identificação de seus autores. (TOURINHO FILHO, 2004, p. 192)

Lopes Júnior (2011), entretanto, afirma que é infundada a afirmação genérica, comumente adotada pela maioria dos doutrinadores de que não existe direito de defesa e contraditório no inquérito policial.

Destaca-se que Lopes Júnior (2011, p. 229), em sua obra Introdução Crítica ao Processo Penal, assevera que o contraditório pode ser tratado, como:

[...] um método de confrontação da prova e da comprovação da verdade, fundando-se não mais sobre um juízo potestativo, mas sobre o conflito, disciplinado e ritualizado, entre partes contrapostas: a acusação (expressão do poder punitivo do Estado) e a defesa (expressão do interesse do acusado [e da sociedade] em ficar livre de acusações infundadas e imune a penas arbitrárias e desproporcionadas).

Greco (2008, p. 72) define o contraditório como o princípio que “impõe ao juiz a prévia audiência de ambas as partes antes de adotar qualquer decisão (audiatur et altera pars) e o oferecimento a ambas das mesmas oportunidades de acesso à Justiça e de exercício do direito de defesa”.

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Não se deve esquecer que Ministério Público e Defesa existem mesmo para se contraditarem. Tanto isso é verdade que Carnelutti (apud Lopes Júnior, 2011, p. 115), afirma que

[...]sua contradição é necessária ao juiz como o oxigênio do ar que respiramos. A dúvida é uma passagem obrigatória pela via da verdade. Ai do juiz que não duvida! Não tanto a possibilidade de que a eficácia de um processo contraditório é uma garantia imprescindível à instrução, quanto mais garantido o equilíbrio de força entre os dois lutadores.



E as possibilidades de aplicação do contraditório ao inquérito policial decorrem da interpretação que se dá ao direito, e como informa Kelsen (2006, p.387):

A interpretação é, portanto, uma operação mental que acompanha o processo de aplicação do Direito no seu progredir de um escalão superior para um inferior. Na hipótese em que geralmente se pensa quando se fala de interpretação, na hipótese de interpretação da lei, deve responder-se a questão de saber qual o conteúdo que se há de dar à norma individual de uma sentença judicial ou de uma resolução administrativa, norma essa a reduzir da norma geral da lei na sua aplicação a um caso concreto.”

Como método de confrontação da prova e de comprovação da verdade (esta, real, no processo criminal), deve ser seguido pelo magistrado que examina e deverá julgar a ação penal, a fim de garantir às partes a igualdade de forças, ou seja, que as mesmas condições oferecidas a uma delas sejam ofertadas, também, à outra.

2.3 FORMAS DE CONTRADITÓRIO

O contraditório, como já dito, pode se dar de várias formas. Nucci (2010, pp. 288-290), em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais, demonstra que o contraditório pode ser: de fatos, de direito, de provas e de alegações e requerimentos, conforme abordagem a seguir.

2.3.1 Contraditório de fatos

A oposição a fatos consiste na manifestação contrária aos argumentos de uma parte pela outra. Ou seja, se o órgão acusatório alega que uma pessoa

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cometeu um crime de homicídio, devendo, portanto, ser condenada, o acusado poderá contrariar tal fato, alegando alguma das excludentes de ilicitude (legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal, etc.), requerendo, inclusive, sua absolvição.

E como regra, o autor imputa ao réu a prática de um crime, cabendo a este, exercitando o contraditório, negá-lo na integralidade ou apenas parcialmente, podendo ainda oferecer uma versão diferenciada sobre os fatos (NUCCI, 2010).

Diz ainda Nucci (2010, p. 288):

No processo penal, os fatos alegados na peça acusatória inicial são sempre controversos, pois o direito de defesa é indisponível. Noutros termos, não pode haver o efeito da revelia, implicando na citação e ausência de impugnação, gerando a presunção de verdade dos fatos narrados. Entretanto, não se pode levar ao extremo a ideia de contrariedade absoluta, pois o que se pretende evitar é a assunção integral de culpa, sem extração de qualquer benefício para o réu. Por vezes, torna-se válida a aceitação da ocorrência de determinados fatos para que possa haver efetiva defesa (ex.: para alegar o estado de necessidade torna-se indispensável aceitar a realização do fato).

Na verdade, o que não se pode aceitar é a falta de impugnação integral ao crime e seus efeitos. Não bastasse isso, aquilo que não foi impugnado pela defesa deve ser adequadamente provado pela acusação, em razão do princípio da presunção de inocência.

Resumindo, fatos atribuídos ao denunciado na exordial acusatória devem ser cabalmente provados, pois tal ônus cabe à acusação. De outra forma, também lhe cabe acolher a impugnação feita pelo réu, contradizendo os fatos que forem convenientes.

2.3.2 Contraditório de direito

De acordo com o pensamento de Nucci (2010, p. 288) “contradizer o direito, como regra, não é a meta do princípio do contraditório.”

Contestar os fatos é possível, negando a sua ocorrência ou que foram praticados de outra forma, no entanto, contestar ou impugnar o direito posto é uma atitude excepcional, quando se ingressa no campo da inconstitucionalidade ou da aplicação de princípios gerais penais ou processuais penais. Muitas vezes o contraditório de direito envolve a discussão sobre a interpretação dada ao direito

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positivo, quando existirem determinados fatos, algo diverso de contrariar diretamente a norma (NUCCI, 2010).

 

2.3.3 Contraditório de provas

Deve-se salientar que a prova é, no processo, o meio hábil de se demonstrar ao julgador a verdade dos fatos alegados. Refutá-la é outra das facetas relevantes do contraditório, pois estas fazem parte do universo dos fatos.

Desta forma, a oitiva das testemunhas deve contar sempre com a intervenção das partes, a fim de exercer, no momento em que é realizada (por meio da repergunta), o direito ao contraditório. Esta é a finalidade maior da repergunta, haja visto caber à parte interessada questionar o que foi alegado para esclarecer eventuais pontos negativos sob seu ponto de vista.

Isso também se aplica em relação à prova pericial, por meio da intervenção de assistentes técnicos, indicados pelas partes.

Até mesmo os documentos apresentados e anexados aos autos deve-se provocar a manifestação da parte oposta. De interessante ponto trata Nucci (2010, p. 289):

Algumas provas, consideradas sigilosas, por sua própria natureza, admitem apenas o contraditório diferido. Não teria sentido promover a interceptação telefônica, mediante autorização judicial, ao mesmo tempo em que se avisa ao advogado do suspeito. Por óbvio, nada seria coletado. Nessas hipóteses, colhida a prova, a parte terá como contrariá-la em estágio posterior à sua produção.

2.3.4 Contraditório de alegações e requerimentos

O contraditório de alegações e requerimentos deverá ser realizado de forma controlada, pois este pode representar procrastinação indevida do andamento processual. Alguns requerimentos espelham simplesmente o cumprimento da lei, v.g., o que solicita a realização de audiência ou vista dos autos fora do cartório. Nestes não cabe o contraditório. As alegações finais não dependem do contraditório indefinido. Ou seja, cada parte apresenta sua manifestação: primeiro, a acusação;

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em seguida, a defesa. Não se ouve novamente a acusação, porque ambas as partes estão analisando a prova e dando a sua interpretação, conforme seus interesses.

Só excepcionalmente se utiliza o contraditório para questões de direito alegadas, desde que se prestem a promover a finalização anormal do processo. Por exemplo, ingressando com pedido de extinção de punibilidade, deve-se ouvir a parte contrária.

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3 CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL



No Brasil, examinando o Código de Processo Penal, assegura-se a adoção do sistema processual misto, ou sistema acusatório moderno, na medida em que sua composição é mista, com uma primeira fase (pré-processual), do inquérito policial, inquisitiva, sigilosa e não contraditória; e uma segunda fase (judicial), após o encerramento do inquérito e com a instauração da relação processual com o oferecimento da denúncia ou queixa, quando passariam a vigorar as garantias constitucionais das partes, de acordo com o sistema acusatório (LOPES JÚNIOR, 2006).

No Brasil, na fase pré-processual ou inquisitiva preliminar, o modelo adotado é o policial, por meio do inquérito, em que devem ser apurados o fato criminoso e os indícios que levem à sua autoria e materialidade, com a finalidade de ofertar elementos ao representante do Ministério Público – a quem cabe privativamente o oferecimento da denúncia – que justifiquem o exercício da ação penal ou o arquivamento das peças de informação.

3.1 DA POSSIBILIDADE

Após breve introdução sobre a fase pré-processual e sua finalidade, passa-se agora a refletir acerca da aplicação da regra contida no art. 5º, LV da Constituição Federal à fase do inquérito policial, revelando a possibilidade ou não de sua aplicação.

Inicialmente, Aguiar (2000) esclarece que há que analisar a natureza jurídica do inquérito policial. Sabe-se que uma característica inerente ao inquérito policial é o seu caráter inquisitivo, ou seja, as atividades nele desenvolvidas são presididas por uma única autoridade (Delegado de Polícia), agindo esta de ofício ou provocada, empregando os meios necessários para a execução do fim primário de todo inquérito policial – o esclarecimento do crime e da sua autoria. Diante disso, percebe-se que no inquérito policial predominam as atividades probatórias, a fim de embasar uma futura e eventual ação penal, tornando dissociada, desta fase, a figura do "acusado", existindo apenas o "indiciado".

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ϯϱ 

Como foi dito outrora, a garantia do contraditório é formada pelo binômio reação-ciência. Apesar, de no inquérito policial está o indiciado incapaz de exercê-lo, na sua forma comissiva, deve ele, quando privado de sua liberdade, ser aplicado no seu segundo elemento – a ciência, através da Nota de Culpa.

Apesar de não mencionada expressamente no art. 5º, LXIV, leciona Marques (1998, p. 76)

[...] que este artigo assegura os mesmo direitos contidos no referido documento. Esta [nota de culpa] consiste em ciência dos motivos da prisão imposta ao indivíduo colocado em custódia durante a fase investigatória, ou por motivo de prisão em flagrante delito [...]

3.1.1 No Inquérito Policial

A ausência do contraditório e da ampla defesa no inquérito policial é doutrinária e jurisprudencialmente aceita. Por isso, afetado está o valor probatório da investigação policial, embora o tenha, mas tão-somente de valor relativo, por exatamente, ter seus elementos colhidos na ausência da garantias constitucionais em estudo, e como complementa Capez (2009), de um juiz de direito.

Assim sendo, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

[...] para que seja respeitado integralmente o princípio do contraditório, a prova obtida na fase policial terá, para ser aceita, de ser confirmada em juízo, sob pena de sob pena de sua desconsideração. Tal significa que, acaso não tipificada na fase judicial, a solução será absolver-se o acusado (BRASIL, 1998).

Por ser desprovido do contraditório, o inquérito policial, peça informativa dos elementos necessários para a propositura da ação penal, não justifica por si só decisão condenatória, devendo, pois, no decorrer do processo-crime, serem colhidos elementos que a justifiquem sob pena de ferir o art. 5º, LV da CF/88.

Aqui, buscando exaurir o tema proposto, torna-se necessário analisar a questão da garantia do contraditório e as provas irrepetíveis a se realizarem no inquérito policial.

Acerca do tema já se manifestou o STF, da seguinte forma:

O dogma deriva do princípio constitucional do contraditório de que a força dos elementos informativos colhidos no inquérito policial se esgota

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com a formulação da denúncia tem exceções inafastáveis nas provas - a começar pelo exame de corpo de delito, quando efêmero o seu objeto, que, produzidas no curso do inquérito, são irrepetíveis na instrução do processo, porque assim verdadeiramente definitivas, a produção de tais provas, no inquérito policial há de observar com vigor as formalidades legais tendentes a emprestar-lhe maior segurança sob pena de completa desqualificação de mera idoneidade probatória (BRASIL, 1997).

Demonstra-se, então, segundo Aguiar (2000), que, apesar de ausente no inquérito policial as garantias do contraditório e da ampla defesa – que informam todo o processo penal –, é imperioso que, durante a investigação policial, sejam observadas algumas formalidades legais que, se ausentes, são capazes de contaminar todo o ato, sob pena de saneamento ou desconsideração judicial, a exemplo da nota de culpa e da produção de provas quando irrepetíveis.

Através da Lei nº 10.792/03 (BRASIL, 2003) foram adicionadas ao ordenamento jurídico substanciais mudanças, no que tange ao regime jurídico do interrogatório judicial do acusado, as quais deverão ser aplicadas, também, em sede de inquérito policial, por força determinante do disposto do art. 6º, inciso V, do Código de Processo Penal.

Esta nova legislação impõe a presença do advogado, constituído ou nomeado, para o indiciamento do investigado, especialmente quando preso em flagrante delito.

A atuação do advogado nesta fase, no entendimento de Ribeiro (2010) é nada menos que o reconhecimento do contraditório neste procedimento administrativo, tendo em vista que fora assegurado ao indiciado, conhecimento das provas produzidas na investigação preliminar, o direito de contrariá-las, arrolar testemunhas, bem como o direito de não ser indiciado com base em provas ilícitas. A presença deste contraditório, no indiciamento, não desnatura o êxito das investigações, como pensam alguns, muito pelo contrário, abaliza e dar maior legitimidade às conclusões da investigação. A adoção deste princípio remete a esta fase processual outra natureza, não de mera peça informativa, mas de valor de prova na instrução.

Isso tem por finalidade potencializar e inserir definitivamente a prevalência dos direitos fundamentais dentro do ordenamento vigente, afirmando-se a justiça dentro do Estado democrático de direito, assegurando o direito a dignidade da pessoa humana.

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É de conhecimento comum, que cerca de noventa por cento, das ações penais em cursos são precedidas de investigação criminal, repetindo-se praticamente todas as provas obtidas no inquérito policial, com exceção dos exames periciais, entres outros irrepetíveis na ação penal. Pode-se assim, concluir, que o inquérito só é informativo nas nuances doutrinárias, uma vez que na prática é ele, de fato, a alma da ação penal.

Diante disso, a doutrina brasileira, tem divergido a respeito da aplicabilidade dos princípios do contraditório e da ampla defesa no inquérito policial, com predominância das posturas que refutam tal possibilidade.

No que diz respeito a ampla defesa, esta é perfeitamente exercitável no inquérito policial. Além de logicamente com ele compatível, tem sua aplicação no inquérito indicada pelos incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição Federal. O seu exercício, nesta fase, contudo, não tem o caráter obrigatório, estando diante de mera faculdade, colocada ao alcance do indivíduo envolvido, podendo ou não ser por este exercida.

A atuação defensiva, ao logo do inquérito policial, inclui um amplo espectro de possibilidades, que vai muito além das medidas normalmente apresentadas pela doutrina (em especial, pedido de fiança, liberdade provisória, relaxamento de flagrante). A plenitude da ação defensiva ao longo deste não compromete a eficiência da persecução penal, além do que serve à importantíssima proteção aos direitos fundamenteis do homem.

Diversamente, entretanto, grande parte da doutrina não cede espaço ao contraditório nesta fase preliminar da persecução criminal.

Barbosa (1993) e Tucci (1993), não aceitando tal pensamento, entende, em dissertação de mestrado na Universidade Presbiteriana Mackenzie intitulada “Garantias Constitucionais de Direito Penal de Processo Penal na Constituição de 1988”, que o texto constitucional quando menciona as expressões “acusado” e “processo administrativo”, engloba toda pessoa e situação passível de restrição de direitos individuais. Para estes, o contraditório seria aplicado aos “acusados em geral”, o qual engloba o indiciado, que é considerado um tipo de acusado.

A esse respeito Tucci (1993, p. 86) descreve, ainda, que:

[...] à evidência que se deverá conceder ao ser humano enredado numa persecutio criminis todas as possibilidades de efetivação de ampla defesa, de sorte que ela se concretize em sua plenitude, com a participação

Referências

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