• Nenhum resultado encontrado

Escrever é pensar duas vezes: o mundo, o texto e eu

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Escrever é pensar duas vezes: o mundo, o texto e eu"

Copied!
183
0
0

Texto

(1)

Relatório de Estágio

Joana Rita Galucho Baião

Novembro de 2016

Relatório de Estágio de Mestrado em Ensino de Português no 3.º Ciclo

do Ensino Básico e no Secundário e do Espanhol no Ensino Básico e

(2)
(3)

iii Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ensino de Português no 3.º Ciclo do Ensino Básico e no Secundário e do Espanhol no Ensino Básico e Secundário realizado sob a orientação científica da Professora Doutora Maria Antónia Coutinho e da Mestre Beatriz Moriano.

(4)
(5)

v Para a Rita. Para o Henrique.

(6)
(7)

vii

“Sábete, Sancho, que no es un hombre más que otro si no hace más que otro”

(8)
(9)

ix

AGRADECIMENTOS

O presente relatório é a representação académica de um ano de intenso trabalho, de imensa dedicação e de equilíbrios difíceis de manter. Um especial agradecimento à minha família, que aceita e tenta compreender a minha perseverante entrega ao trabalho e ao estudo, apesar do tempo que isso lhes rouba.

Ao Miguel, pela paz, pela companhia, pela certeza e pela capacidade de me incentivar nos caminhos arriscados.

Às minhas colegas de mestrado – Catarina, Constança, Patrícia e Tânia – e ao meu colega de mestrado - Vítor - pelo ambiente de amizade, constante apoio e companheirismo.

Obrigada a todos os funcionários, docentes e não docentes, do Colégio Valsassina, por me acolherem como família e me fazerem sentir bem-vinda.

À Dra. Maria Alda Silva, pela contagiante paixão, pela sabedoria, pela generosidade, pelos conselhos perspicazes e orientadores.

Ao Dr. João Valsassina, pela confiança depositada.

À Dra. Paula Gonçalves e ao Dr. Juan Gago Prado, pela orientação, pelo acompanhamento e pelo espaço para criar e ser.

Às minhas alunas e aos meus alunos pelo sentido que acrescentaram a estes nove meses, por me fazerem recordar a importância do equilíbrio entre trabalho, dedicação e riso.

À Doutora Maria Antónia Coutinho, à Mestre Beatriz Moriano e ao Doutor Alberto Madrona, pelo permanente incentivo, pela confiança e fé em mim.

(10)
(11)

xi ESCREVER É PENSAR DUAS VEZES:

o mundo, o texto e eu

Joana Rita Galucho Baião

PALAVRAS-CHAVE: escrita, diário, leitura, projetos de leitura e escrita,

identidade, alteridade, afetividade.

RESUMO

O presente trabalho apresenta um cariz a um tempo descritivo e reflexivo. Relata as atividades realizadas e pretende levá-las a ser o mote para um trabalho crítico que nos permita construir, através da experiência, as bases do futuro. Encara-as como resposta a um “para quê?”, definidor de sentido da atividade docente.

A reflexão que realizamos tem como base o conjugar feliz de elementos e acontecimentos de um ano de PES. Pretendemos revelar, no tratar destes, a fertilidade dos desafios escritos, dos caminhos diarísticos e dos projetos de escrita, provocadores da nossa capacidade de reinvenção. Um trabalho deste teor implica a exploração de práticas e conteúdos não observados por metodologias exigidas no trabalho comum do quotidiano, deste modo convoca a capacidade de superação de professores e alunos.

Mais pretendemos evidenciar que os desafios de escrita relatados e explicitados se revelam particularmente eficazes para o desenvolvimento não apenas de uma competência de escrita técnica, mas também de competências de ordem sociocultural e socioafetiva, baseadas nas vivências dos alunos e na transfiguração das mesmas.

Trabalhá-lo em duas línguas permitiu-nos a localização do eu e do outro, possibilitou-nos compreender que a alteridade é definidora e reorganizadora. Levou-nos a estabelecer ainda diferentes metas e patamares, a testar os limites entre línguas. Compreendemos, afinal, que (e como) a articulação de objetivos decorrentes de competências linguísticas e de ordem socioafetiva se potenciam mutuamente.

(12)

xii

KEYWORDS:

Writing, diary, reading, reading and writing projects, identity, alterity, affectivity

ABSTRACT

This paper describes the activities executed and intends to make them the motto for a reflexive work that allows us to build, through experience, the basis of the future. It sees them as the answer to a “what for”, which defines the sense of teaching.

The reflexion we make has as basis the blissful union of elements and events of a year of a supervised teaching practice. We intend to reveal the fertility of the writing challenges, the diaries and the writing projects, that lead to our ability to reinvent. This kind of work implies exploring practices and contents not seen in methodologies demanded for day-to-day work and summons the ability to surmount oneself in both teachers and students.

We intend to show that the writing challenges that we present reveal themselves as particularly able to develop not only writing skills but also sociocultural and socio affective skills, based on the students experiences and their transfiguration.

To do this in two different languages has allowed us to locate the “I” and the “other”, it has allowed us to understand that alterity is defining and reorganizer. It has also taken us to establish different goals and levels, to test the limits between languages. We understood that (and how) articulating linguistic and socio affective objectives allows them to potentiate on another.

(13)

xiii ÍNDICE

NOTAS INTRODUTÓRIAS ... 1

I.CONTEXTO E ELEMENTOS BASILARES DE TRABALHO ... 1

II ... 3

i. A Prática de Ensino Supervisionada ... 3

Pressupostos práticos, condições e execução ... 3

Atividades desenvolvidas no âmbito de projetos do Departamento de Línguas: ... 5

Formação Contínua ao longo do ano de PES: ... 6

ii. Como nasce um projeto? - Das oficinas de escrita ao projeto dos diários ... 7

“Querido Diario” ... 8

Oficinas de escrita ... 10

O trabalho ao nível do ensino secundário ... 11

iii. A escrita e a articulação com o Programa e as Metas Curriculares ... 13

CAPÍTULO I - A IMPORTÂNCIA DA ESCRITA – OU COMO O VERBO ESCREVER SE CONVERTEU EM VERBO INTRANSITIVO. ... 16

CAPÍTULO II – ESCREVER A DUAS VOZES - O PROCESSO DE REESCRITA ... 22

CAPÍTULO III – CORRIGIR A ESCRITA ... 27

“Erros, para que vos quero?” ... 28

CAPÍTULO IV – PELOS CAMINHOS CONVERGENTES DA LEITURA E DA ESCRITA ... 31

Técnicas de incentivo à escrita ... 33

CAPÍTULO V - A ESCRITA EXIGE-NOS ALGO DE FANTÁSTICO ... 36

NOTAS CONCLUSIVAS ... 39

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 41

Documentos oficiais consultados: ... 45

ANEXOS ... 46

PARTEI ... 46

Anexos sobre “A Prática de Ensino Supervisionada: execução” ... 46

ANEXO 1 ... 47

ANEXO 2 ... 49

ANEXO 3 ... 51

ANEXO 4 - CARTAZ DA SESSÃO DE POESIA ... 54

ANEXO 5 – NOTÍCIA DA NEWSLETTER DE FEVEREIRO - SESSÃO DE POESIA ... 55

ANEXO 6 - PLANIFICAÇÃO E MATERIAIS SOBRE A LECIONAÇÃO DE FREI LUÍS DE SOUSA ... 56

ANEXO 7 - EXEMPLO DE PLANIFICAÇÃO E MATERIAIS – ESPANHOL ... 72

ANEXO 8 - TESTE DE 12º ANO, 1 º PERÍODO ... 77

ANEXO 9 - TESTE DE GRAMÁTICA, 12º ANO – PESO 2 ... 83

PARTEII ... 87

Anexos sobre “Atividades desenvolvidas no âmbito de projetos do Departamento de Línguas” ... 87

ANEXO 10 - PLANO DE ATIVIDADES PARA O ANO LETIVO 2015/2016 ... 88

ANEXO 11 - TEXTO Y FOTOS PUBLICADOS EN LA PÁGINA DEL COLEGIO SOBRE ... 91

EL ALTAR DE DON QUIJOTE ... 91

ANEXO 12 - CONTEXTUALIZAÇÃO DO INTERCÂMBIO ENTRE BADAJOZ E LISBOA ... 93

ANEXO 13 - NOTÍCIA SOBRE O PASSEIO À LISBOA QUINHENTISTA ... 94

ANEXO 14 - Comemoração do Dia Europeu das Línguas- 26 de setembro de 2015 ... 95

ANEXO 15 – DESAFIO DE FÉRIAS ... 97

(14)

xiv

ANEXO 17 - PUBLICAÇÕES NA GAZETA DO COLÉGIO, AO LONGO DO ANO LETIVO ... 101

ANEXO 18 - O ANO DE PRÁTICA DE ENSINO SUPERVISIONADA E A FORMAÇÃO CONTÍNUA: FORMAÇÃO CONTÍNUA NO ÂMBITO DO PROJETO DE RELATÓRIO DA PRÁTICA DE ENSINO SUPERVISIONADA ... 113

ANEXO 19 - JUEGO DE ROLES CREADO PARA LA CLASE DE 8ºB, A PROPÓSITO DEL TEMA “LA COMIDA” ... 115

ANEXO 20 - PARTICIPAÇÃO DO COLÉGIO NAS OLIMPÍADAS DE LÍNGUA PORTUGUESA – 1ª E 2ª FASES 116 ANEXO 21 - PARTICIPAÇÃO DO COLÉGIO NOS EXAMES DE LÍNGUA ESTRANGEIRA DELF (FRANCÊS) E DELE (ESPANHOL) ... 117

ANEXO 22 - COMUNICAÇÃO POR CORREIO ELETRÓNICO COM OS ALUNOS, NO ESCLARECIMENTO DE DÚVIDAS E NA PREPARAÇÃO PARA O EXAME NACIONAL DE 12ºANO ... 118

ANEXO 23 - MEMÓRIA DAS ATIVIDADES REALIZADAS NA DISCIPLINA DE ESPANHOL NO ANO LETIVO 2015/2016 ... 120

PARTEIII ... 132

Anexos relativos ao capítulo “Como nasce um projeto? - Das oficinas de escrita ao projeto dos diários” . 132 ANEXO 24 – TALLER DE ESCRITURA SOBRE EL TEMA LA FAMÍLIA EN LA CLASE DE 7º C ... 134

ANEXO 25 – Oficina de Escrita a propósito do poema “D. Sebastião”, turma 12º2... 135

ANEXO 26 – OFICINA DE ESCRITA DO CONCURSO DE ESCRITA CRIATIVA, TURMAS DE 8º ANO ... 136

ANEXO 27 – OFICINA DE ESCRITA A PROPÓSITO DO CONTO DE MÁRIO DE CARVALHO “A INAUDITA GUERRA DA AVENIDA GAGO COUTINHO”, TURMA 8ºA ... 138

ANEXO 28 – OFICINA DE ESCRITA A PROPÓSITO DE DOIS QUADROS DE VERMEER E DO ESTUDO DO TEXTO DESCRITIVO, TURMA 8ºA ... 140

ANEXO 29 – INSTRUÇÕES FORNECIDAS AOS ALUNOS NA PLATAFORMA DA ESCOLA (DOKEOS) PARA ESCREVER OS DIÁRIOS NA DISCIPLINA DE ESPANHOL ... 141

ANEXO 30 – INSTRUÇÕES FORNECIDAS AOS ALUNOS NA PLATAFORMA DA ESCOLA (DOKEOS) PARA ESCREVER OS DIÁRIOS NA DISCIPLINA DE ESPANHOL ... 142

ANEXO 31 – FOTOS DE ALGUMAS PÁGINAS DOS DIÁRIOS DOS 8º E 9º ANOS REALIZADOS NO 1º PERÍODO ... 143

ANEXO 32 – Fotos dos diários de Natal ... 143

ANEXO 33 – Texto para correccion ... 145

ANEXO 34 - Código de corrección de los diarios ... 146

ANEXO 35 - Código de corrección de los diarios II ... 146

ANEXO 36 – Aplicación del código de corrección de los diarios ... 148

ANEXO 37 – Correio eletrónico enviado pela Dr.ª Virginia Santos para o Colégio Valsassina data: 23 de janeiro ... 149

ANEXO 38 – Correio eletrónico enviado aos pais dos alunos do 8º A Data: 04 de fevereiro de 2016 ... 150

ANEXO 39 – Regulamento do concurso ler como quem joga, escrever como quem pinta ... 151

ANEXO 40 – Ficha de trabalho sobre o conto “Rosa Caramela” ... 154

ANEXO 41 – Fotos das vitrinAs e cartazes na Exposição do Dia da Escola ... 155

ANEXO 42 – Cartazes realizados para a exposição de dia 4 de junho - Dia da Escola ... 156

ANEXO 43 – Cartazes realizados para a exposição dos textos a concurso no Dia da Escola – 4 de junho ... 161

ANEXO 44 – Painel de vencedores ... 164

ANEXO 45 – Notícia no site do Colégio Valsasina ... 165

ANEXO 46 – Notícia na página da Universidade Nova de Lisboa ... 166

ANEXO 47 – Envio do Programa do dia da Entrega dos prémios no Colégio Valsassina ... 167

ANEXO 48 – Fotos do dia da cerimónia de entrega dos prémios, no Colégio Valsassina ... 168

ANEXO 49 – Convite para publicar os painéis sobre o projeto de leitura na revista l /atitude da direção de serviços e de ensino das escolas portuguesas no estrangeiro (dseepe) da dgae. ... 169

(15)

1

NOTAS INTRODUTÓRIAS

I. Contexto e elementos basilares de trabalho

O presente relatório visa descrever e sustentar cientificamente a Prática de Ensino Supervisionada (PES) que realizámos no Colégio Valsassina durante o ano letivo de 2015-2016. A PES realizou-se no âmbito do Mestrado em Ensino de Português e de Língua Estrangeira [Espanhol] nos Ensinos Básico e Secundário da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH), sob supervisão pedagógica da Dra. Paula Gonçalves, Professora Cooperante do Núcleo de Português, e do Dr. Juan Gago Prado, Professor Cooperante do Núcleo de Espanhol.

Iniciámos o primeiro contacto com o local de PES em julho de 2015, de modo a conhecer orientadores, coordenadores e direção da escola. O ambiente que encontrámos foi, desde o primeiro momento, acolhedor e estimulante. O espaço quinta do Colégio Valsassina1 permite ao professor sentir-se convidado a imaginar e a criar, pela relação próxima entre pessoas e Natureza, aprendizagem e brincadeira. As condições humanas e materiais para um trabalho fecundo mostraram-se desde cedo disponíveis. Sem dificuldade iniciámos a nossa relação com este novo meio, apesar de alguma expetativa e nervosismo, justificados pela exigência do trabalho no colégio e pelos resultados que este tem vindo a apresentar no panorama nacional.

A nossa postura inicial era a da surpresa. O nosso primeiro trabalho foi o do diagnóstico. Pretendíamos compreender, após oito anos a trabalhar em escolas e institutos públicos, as dinâmicas de um ensino privado. Iniciámos uma descoberta por duas vias: se não descurámos a leitura atenta do Projeto Educativo de Escola, do Regulamento Interno e do Plano Anual de Atividades do Colégio, sentíamo-nos mais curiosos pelas conversas com alunos, colegas e funcionários: Como era estudar num mesmo sítio durante treze anos? Como era dar aulas a ver o jardim e a ouvir os pássaros? O que era trabalhar ali? Porque se associava família e escola no colégio? Marcados por outros tipos de ensino e por experiências com menos recursos e diferentes afetividades, sentíamo-nos convidados a explorar potencialidades, algo em nós que fosse também diferente, de modo a que nos equilibrássemos com a peculiaridade do

(16)

2 local que se nos apresentava. O oscilar inicial entre o impulso e o medo foi inevitável, estava em causa uma nova forma de abordar o ensino.

O trabalho por nós realizado foi desenvolvido, de modo mais direto, em sete turmas - 8º A, 11º 2/3, 11º1A e 12º2, no Núcleo de Português - e 7º D, 8ºB e 9º B/D - no Núcleo de Espanhol -, embora tenham sido acompanhadas outras turmas e se tenham realizado trabalhos no âmbito da PES com outros alunos, conforme em seguida se especifica. As turmas que acompanhámos têm entre os vinte e quatro e os trinta e quatro alunos (estas últimas de língua estrangeira com junção de dois grupos), turmas, no nosso entender, com um número elevado de alunos, mas em conformidade com a realidade portuguesa geral. O ambiente de trabalho é bom, assim como o comportamento global dos alunos. De acordo com a caracterização das turmas que expusemos no Dossier da PES, podemos constatar que se verifica uma homogeneidade nos ritmos de trabalho, se comparados a alunos de outros contextos, o que marca e eleva, na nossa perspetiva, o patamar em que iniciamos o nosso trabalho, um patamar de exigência que nos permite ir mais além porque apetrechados dos elementos basilares à prática educativa.

O presente relatório pretende dar a ver o caminho realizado por nós no colégio no ano letivo de PES. Iniciámos o nosso texto procurando dar a entender o trabalho geral realizado, o trabalho quotidiano da vida de um professor, expondo as suas várias etapas, mas destacando as mais importantes: o processo de planificação e lecionação em sete turmas durante todo o ano letivo, o percurso de reflexão sobre técnicas, metodologias e trajetórias possíveis em sala de aula. O contexto do Colégio Valsassina é muito absorvente, pela carga de trabalho que um colégio de prestígio exige e pela invisível pressão que cada um coloca em si e, por consequência, naqueles que o rodeiam. Para estar à altura, foi necessário planificar com muita antecedência as aulas, de modo a que pudessem ser pensadas e discutidas, justificadas e colocadas à prova antes de levar materiais e estratégias aos alunos. O texto e documentos apresentados em seguida pretendem revelá-lo.

Também os anexos se organizam na mesma linha de raciocínio do relatório: de uma perspetiva mais geral, de como decorreu o ano letivo, para uma perspetiva mais específica, relacionada afinal com o decorrer do projeto das oficinas de escrita, da organização e correção dos diários de cinquenta e seis alunos, da participação no concurso do Plano Nacional de Leitura e na conclusão do trabalho após um ano dedicado à competência escrita. Deste trabalho, que se tornou ao longo do ano mais

(17)

3 especializado, surge uma reflexão maravilhada, que se tornou, pouco a pouco, desassossegada. Sentimos que ambas são consequência dos resultados alcançados, reveladores dos prémios da dedicação e do esforço, reveladores também do constante e exigente trabalho necessário.

II

i. A Prática de Ensino Supervisionada

Pressupostos práticos, condições e execução

O protocolo oficial firmado entre a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e o Colégio Valsassina, adaptado às circunstâncias dos horários do Colégio e ao Contrato Coletivo de Trabalho que rege o ensino particular e cooperativo, enquadrou as atividades a desenvolver ao longo da PES, estabelecendo:

 O desenvolvimento de um trabalho sólido de intervenção na escola/relação com o meio, orientado pela coordenadora do departamento e pela diretora dos departamentos didáticos.

 A participação em reuniões semanais, em cada um dos Núcleos da PES (Português e Espanhol), tendo em vista a planificação, discussão e avaliação do trabalho de forma sistemática e consistente.

 A participação nas reuniões do grupo disciplinar de Português, quinzenalmente, e do grupo disciplinar de Espanhol, semanalmente (ANEXO 1 – exemplo de uma ata realizada nas reuniões semanais de Espanhol/Francês).

 A participação nas atividades previstas nos projetos curriculares de turma: visitas de estudo, debates, colóquios, etc. (ANEXO 12 – Passeio pela Lisboa Quinhentista).

A participação e o desenvolvimento ativo de projetos no Departamento de Línguas (ANEXO 23 - Memória das Atividades realizadas no âmbito da disciplina de Espanhol)

 A elaboração de projetos e atividades no âmbito dos departamentos de Português e Espanhol: planificação e organização de um intercâmbio de informação cultural

(18)

4 com o Instituto Rodríguez Moñino, em Badajoz2 (ANEXO 2 – Projeto de

intercâmbio cultural com Badajoz, desde outubro de 2015 a junho de 2016).

 O cumprimento de dois blocos de 90 minutos de apoio na disciplina de Português, semanalmente, sendo um dedicado ao ensino secundário e outro ao ensino básico3 (ANEXO 3 – Fichas de Apoio de 12ºano).

 A organização de uma conferência dedicada à poesia, no dia 5 de fevereiro, com a duração de 90 minutos, que contou com a participação dos poetas e editores Diogo Vaz Pinto e David Teles Pereira, intitulada “A poesia é uma língua morta” (ANEXOS 4 e 5 – Cartaz e newsletter da sessão de poesia).

No âmbito específico do trabalho em aula e consequente avaliação foram por nós desenvolvidas ao longo do ano as seguintes atividades:

 Planificação e lecionação de aulas de 45 e 90 minutos de Português no 12º2.  Planificação e lecionação de aulas de 90 minutos de Português no 8ºA.

 Planificação e lecionação aulas de 90 minutos de Português no 11º1A e 11º2/3 - Área de Ciências e Tecnologia e turma conjunta na Área de Economia e Humanidades (ANEXO 6 – Planificação e materiais sobre a lecionação de Frei Luís de Sousa).

 Planificação e lecionação de aulas de 90 minutos de Espanhol, no 7º C, 8º B e 9º D (ANEXO 7 e 19 – Materiales sobre el tema Mi rutina diaria y Juego de Roles para la clase de Español).

 Elaboração de testes e critérios de avaliação para o 8º Ano de Português – no que concerne ao ensino básico – e para o 11º e 12º anos de Português – no que se refere ao ensino secundário - e para o 7º e 9º anos de Espanhol (ANEXO 8 – Teste e critérios de correção e ANEXO 9 - Teste de gramática).

2 O intercâmbio iniciou-se no início do ano letivo e durou até junho, apesar da sua duração e do interesse do projeto,

o mesmo não será alvo de uma maior exploração no contexto do presente relatório por falta de espaço para desenvolver a narrativa do seu percurso e pensar sobre as suas consequências. Será apenas importante sublinhar que o mesmo permitiu aos alunos de Espanhol do 9ºano realizar trocas de elementos culturais - músicas, tradições, espaços simbólicos, espaços preferidos - com os alunos de Badajoz, assim como corrigir erros e ver esses erros corrigidos na devolução dos trabalhos e postais enviados.

3 A professora Paula Gonçalves foi um elemento fundamental para a lecionação das aulas de apoio de Português no

12º ano, uma vez que os materiais utilizados foram sempre alvo de cuidadosa seleção conjunta e os métodos de revisão de conteúdos foram pensados e colocados em prática após reuniões para discussão dos mesmos. Para cada bloco de 90 minutos foi realizada uma ficha de apoio.

(19)

5  Participação nas reuniões do grupo disciplinar de Português e elaboração dos

respetivos registos.

 Participação nas reuniões de avaliação do 8ºA, do 8ºB, do 9ºB, do 11º1ª, do 11º2/3 e do 12º2 e realização das respetivas atas.

 Participação nas reuniões com os Encarregados de Educação realizadas no final de cada período.

Atividades desenvolvidas no âmbito de projetos do Departamento de Línguas:

 Participação na elaboração dos Planos Anuais de Atividades dos grupos disciplinares de Português e de Espanhol (ANEXO 10 - Plano de atividades de Espanhol).

 Organização da comemoração do Día de los Muertos (dia 2 de novembro), com elaboração de um altar a Don Quijote (ANEXO 11) com oferendas dos alunos e contextualização da comemoração nos países da América Latina.

 Organização e dinamização do intercâmbio cultural, ao longo do ano letivo, com o Instituto Rodríguez Moñino, em Badajoz, de modo a permitir aos alunos uma correspondência real com alunos nativos de Espanha (ANEXO 12).

 Visita de estudo pela Lisboa Quinhentista, com as turmas de 8ºAno, a propósito da qual se realizou a oficina de escrita “Um dia na Lisboa Quinhentista” (ANEXO 13).

 Visita de estudo a Sintra, para assistência à dramatização da obra Os Maias, em coprodução entre o Centro Olga Cadaval e a companhia de teatro ÉTER, e realização de roteiro queirosiano com os alunos do 11º 1A e 11º 2/3.

 Colaboração ativa na organização da Semana das Línguas, através da organização de exposições, concursos e oficinas em aula (ANEXO 14).

 Organização e gestão de Contratos de Leitura, nas turmas do 7ºA, do 8ºA e do 11º1A e 11º1B (ANEXOS 15 e 16 – Exemplo de ficha de leitura de férias e marcadores para livros).

 Criação de textos para a Gazeta do Colégio Valsassina ao longo do ano (ANEXO 17):

- Publicação de um artigo intitulado “Diários en Español” (dezembro de 2015); - Publicação do artigo “Benditas sejam as histórias” a acompanhar os resultados das

primeiras oficinas de escrita (dezembro de 2015);

(20)

6 - Publicação do artigo “O binómio fantástico”, a acompanhar textos os textos dos

diários de Espanhol inspirados nas técnicas de Gianni Rodari, (junho de 2016);  Organização da participação do Colégio Valsassina nas Olimpíadas da

Língua Portuguesa. Participação na 1ª fase de seleção a nível do Colégio e presença na 2ª fase de seleção no liceu Camões (ANEXO 20).

 Acompanhamento na preparação dos alunos de 9ºano, ao longo do ano letivo, para o exame de língua estrangeira DELE (Espanhol). Preparação das orais e auxílio aos alunos e professores do Cervantes no dia dos exames orais (ANEXO 21).

Formação Contínua ao longo do ano de PES:

Conscientes da necessidade de atualização e especialização constante, procurámos, ao longo da PES, frequentar ações de formação que nos permitissem realizar um trabalho mais seguro e consciente:

 8 de outubro de 2015 – Oficina sobre técnicas e métodos científicos para a realização de uma tese;

 21 de abril de 2015- Oficina sobre "El uso del cine en ELE: hacia una mayor motivación en el aula";

 23 de janeiro de 2016 - Jornadas Pedagógicas Santillana sobre o Novo Programa de Português para o Ensino Secundário;

 De fevereiro a maio de 2016 - Curso de Educação Literária: novas perspetivas sobre a Literatura Portuguesa (estudo do novo Programa de Português). A avaliação final foi Excelente (10 valores).

(cf. ANEXO 18 – indicação detalhada das diferentes formações realizadas ao longo do ano)

(21)

7 ii. Como nasce um projeto? - Das oficinas de escrita ao projeto dos

diários

A junção de fatores não controláveis foi feliz, deparámo-nos com alunos curiosos, num ambiente de liberdade pedagógica, e encontrávamo-nos cheios de vontade de lhes levar novas perspetivas, objetos, jogos e conteúdos. Descobrimos que iríamos trabalhar o texto como elemento-base da nossa PES quando, numa aula de Português de 8ºAno, propusemos, como se de um diagnóstico se tratasse, a realização de um texto sobre “A minha paixão”. A leitura dos textos, posteriormente, em casa, foi o abrir de um mundo novo. Se eles, na sua maioria, se davam a ler e se entusiasmavam daquela forma quando simplesmente direcionados e motivados, então, de modo mais orientado, poderiam utilizar a escrita para evoluir em várias esferas. Começámos a nossa pesquisa, primeiro pelos programas de Português e Espanhol, tentando compreender como poderíamos utilizá-los para potenciar capacidades, depois pelos manuais e, por fim, compreendendo que a nossa criatividade era essencial, iniciámos um caminho que durou nove meses e que fez nascer um pouco de tudo: textos criativos, literários, diarísticos, memorialísticos, técnicos, expositivo-argumentativos, comentários, cartas…

Dois elementos foram essenciais para a fertilidade da nossa PES: a diversidade de interesses e motivações que caracteriza os nossos alunos e a pesquisa constante de desafios e novas ideias.

O presente relatório de PES que apresentamos procura dar a conhecer um caminho reflexivo e prático, sem receio da arriscar novas experiências, sobre o desenvolvimento da competência escrita nas vertentes de Português (língua materna) e de Espanhol (língua estrangeira), nos níveis básico e secundário.

No que respeita à língua portuguesa, a competência escrita foi explorada e motivada através de oficinas de escrita (por exemplo, através da proposta de temas, de inícios de texto, de música para criação de ambientes de escrita) e de diários de leitura e criação textual; relativamente ao ensino secundário, a prática textual foi realizada com oficinas e exploração temática de conteúdos programáticos.

O desenvolvimento dos diários de leituras e de criação textual visou articular a progressão ao nível da escrita com a exploração de um género de texto portador da experiência social do aluno e da sua vivência individual como leitor. Pretendia-se que os alunos se revelassem leitores ativos e críticos diante dos textos que lhes eram dados a

(22)

8 analisar ou que escolheram livremente trazer aos seus diários. No nosso projeto inicial, considerámos que os textos para análise podiam ser diversificados: livros de contos, textos do manual, crónicas de jornal, letras de músicas ou quaisquer outros textos que lhes exigissem reflexão, mas, ao longo do ano letivo, acabámos por reconhecer que, se não os orientássemos passo a passo para esta escrita reflexiva, muitos deles não a fariam. Então, o projeto dos diários adaptou-se a algo diferente na disciplina de Português: constitui-se como um caderno que acolhia oficinas de escrita, desafios de escrita, criações de textos a partir de objetos artísticos, registo de pensamentos e emoções. Momentos menos coesos entre si, mas mais férteis porque mais direcionados.

“Querido Diario”

Apenas na disciplina de Espanhol pretendíamos, aquando do 1º período, levar a cabo o projeto dos diários na sua forma mais tradicional, como quem fala para uma entidade sobre a vivência quotidiana, num tom confessional e íntimo. Assim, e no que se refere à Língua Espanhola, a prática de estratégias motivadoras da escrita incidiu, maioritariamente, na elaboração de diários de escrita autobiográfica.

Os alunos de 8º e 9º ano de Espanhol como língua estrangeira iniciaram, com motivação e resultados gratificantes, a realização dos seus diários no âmbito da presente PES (ANEXOS 29 a 32). A justificação da escolha de uma escrita autobiográfica no ensino básico justifica-se pela pluralidade e variedade de temas quotidianos que se encontram no programa de Língua Espanhola para o ensino básico e que podem assim ser tratados (Cf. Programa de Espanhol, 3º ciclo, pp. 18-19). Articulando os temas do programa com o exercício, desejavelmente semanal, de um texto sobre o quotidiano de cada aluno é possível rever e consolidar, explorando os mais diversos assuntos, conteúdos gramaticais e temas culturais analisados nas unidades trabalhadas. O que importa é fazê-lo por desafios, propondo tarefas que exijam ao aluno que se coloque no seu diário de modo genuíno, confiante e criativo. A título de exemplo: de modo a consolidar a expressão de desejos, pedimos aos alunos que escrevessem textos utilizando o tempo verbal presente de subjuntivo. Esse desafio semanal concretizou-se assim no tema “Mi mayor deseo para esta navidad es que…”. Aliamos deste modo a aparente limitação de escrever com um tempo verbal específico ao espaço para a descoberta que um texto pode permitir ao aluno, abrindo afinal, aqui, o mundo dos

(23)

9 desejos para a época natalícia. Do nosso projeto destacamos o tempo dedicado à correção: a professora, única leitora do diário autobiográfico na sua totalidade, responde com comentários/pequenos textos às diferentes descrições/narrações da vida quotidiana dos alunos e corrige ou auxilia na sua correção, evidenciando os bons aspetos destes novos textos, o que pode ser melhorado e a progressão realizada desde a última entrega.

O diário permite ao aluno expor-se, mas também dominar-se, conhecer-se, ler-se. O aluno fala da sua vida, mas pode também recriá-la, de modo quase ensaístico e ficcional. Neste sentido, não foram colocadas ao aluno limitações para o âmbito da imaginação, poderiam reinventar-se, ficcionar-se, misturar-se com personagens ou outros, a correspondência com uma vida real não era um critério, a honestidade sim. A este propósito, leia-se o que afirma Carlos Reis sobre a entrada “Diário” no Dicionário de Narratologia: “Predominantemente, o diário é enunciado por um narrador autodiegético, que instaura um discurso de propensão autobiográfica: J. Rousset considera mesmo que o diário é um subgénero da autobiografia. Ao contrário, no entanto, de outros narradores autodiegéticos, o narrador do diário modeliza a história de forma tentativa, por vezes até com laivos ensaísticos” (REIS, C. & LOPES, A. C., 2011, p.106). De alguma forma, os diários vieram oferecer-nos a exploração de duas vertentes: a pessoal e a ensaística (cf. ANEXOS 31 e 32), revelando dos alunos elementos que, de outro modo, não alcançaríamos4.

Destacamos também o elemento afetivo neste tipo de prática diarística: os alunos de 8º e 9º anos, na disciplina de Espanhol, denominaram, de modo livre, os seus diários (nomes informais escolhidos pelos alunos) e o processo, com a maioria dos estudantes, foi transformando o diário num vínculo, num segredo e numa ligação entre alunos e professora5. O diário funcionou como responsabilidade e constituiu um novo elemento da relação em sala de aula. Os alunos sentiram que não escreviam sem objetivo e, mais do que isso, apostaram na escrita porque esta resultava numa ação de resposta afetiva por parte de outra pessoa.

Utilizámos os diários de Espanhol também para a escrita de textos criativos, potencializadores de um maior domínio lexical, sintático e semântico. Estes textos foram propostos considerando a linha de trabalho de Gianni Rodari e articulando as

4 O sentido de humor foi dos elementos mais surpreendentes nos diários. Sem limitação de palavras ou estilos de

escrita, surgiam várias passagens menos tradicionais, com apontamentos irónicos e sarcásticos.

5 É curioso “entrar nas casas dos alunos”, conhecer-lhes os animais de estimação, os hábitos, saber das viagens, e

compreender que, para além de tudo o que isto possa ter de pouco habitual, permite-nos um conhecimento mais sólido de algumas das fragilidades, afetivas, académicas, que o aluno revela em aula.

(24)

10 especificidades dos alunos com as técnicas de escrita que recorrem ao binómio fantástico (elementos que iremos explorar num capítulo específico).

Oficinas de escrita

As oficinas de escrita, ao nível do 8º Ano de Português, constituem um outro modo de desenvolvimento da prática textual que realizámos de modo frequente, no 1º período. Procurámos que os momentos de construção textual fossem partilhados no grupo turma e, frequentemente, o texto constituiu-se como campo de trabalho cooperativo (Cf. Fontes, A. e Freixo, O., 2004, p. 30). Os alunos puderam, assim, trabalhar, a partir da proposta de temas, metas e modos de escrita, em pequenos grupos ou individualmente, reescrevendo os seus textos ou (re)construindo partes de textos que outros colegas inicialmente redigiram6.

O nosso caminho de setembro a fevereiro foi sólido, mas a nossa PES esperava ainda iniciar um singular e definidor desafio. No final do mês de janeiro, chegou ao colégio um correio eletrónico que pretendia a divulgação de um concurso do Plano Nacional de Leitura, denominado Ler como quem joga – Escrever como quem pinta7,

que consistia, ao nível do 3º ciclo, na proposta de leitura de um de dois livros - o livro de contos Cada Homem é uma Raça, de Mia Couto, ou o livro de poemas Só, de António Nobre – e que nos convidava à realização do respetivo registo dessas leituras. Estes apontamentos poderiam “assumir a forma de diário ou de caderno de notas/registos, de natureza diversa, que servissem de complemento à leitura e que se desenvolvessem de forma espontânea e, assim, dessem origem a textos com potencialidade literária, capazes de merecer a sua partilha e divulgação”8. Pareceu-nos

impossível não abraçar o desafio pela sua inovação e criatividade, mas também pela adequação ao tema e objeto da nossa Prática de Ensino Supervisionada. Após a concordância da direção pedagógica do colégio, pedimos aos pais dos alunos (cf. ANEXO 38) que adquirissem o livro Cada Homem é uma Raça, de Mia Couto, de

6 Veja-se o que sublinha de modo pertinente, neste sentido, Carneiro (2000, p 94) quando diz que o trabalho

cooperativo influencia positivamente o resultado final do trabalho realizado, a motivação, o raciocínio e as competências sociais de cada aluno.

7Cf. Página do Plano Nacional de Leitura

http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/Concursos/index.php?s=concursos&tipo=1

8 Cf. Página do Plano Nacional de Leitura, Regulamento do Concurso Ler como Quem Joga, Escrever como Quem Pinta

(25)

11 modo a que o mesmo pudesse ser objeto de trabalho em aula e em casa. No âmbito deste novo projeto, os alunos do 8ºA realizaram, de fevereiro a maio de 2016, o registo das leituras “como se fosse um diário”9, num processo variado e contínuo de escrita,

leitura, interpretação e discussão que incentivou a reflexão crítica, pessoal e social exigida pelo texto. Ao início, não sabíamos muito bem o que conseguiríamos realizar com este desafio lançado aos alunos e, a meio do processo, considerámos que nos afastávamos do regulamento do concurso, mas que isso não seria o mais importante, uma vez que os diários pareciam evoluir de modo favorável e entusiástico. As técnicas que utilizámos foram também variadas e resultaram de processos de experimentação que exploraremos mais à frente nos capítulos teóricos. De qualquer modo, ultrapassámos o regulamento, extrapolámo-lo e divergimos nas técnicas de escrita, sem saber ainda a sua denominação teórica acabámos por recorrer a técnicas de reescrita de textos literários, realizando a sua transformação, fazendo “pastiche” dos textos literários que mais nos motivavam (aos alunos, à professora) à escrita livre. Essencialmente, procurámos o texto que nos poderia incentivar à reflexão, à criação e à emoção. Pedimos aos alunos a anotação de pensamentos, reflexões, sentimentos imediatos pós-leitura, o que facilitaria, defendemos, o conhecimento do aluno sobre si mesmo e a correção por parte da professora. Esta maior facilidade justifica-se pelo conhecimento do caminho que leva à escrita, pela presença no momento da origem do impacto imediato do texto nos alunos, a proximidade de todo o processo possibilita, acreditamos, uma maior compreensão dos alunos e dos seus caminhos de escrita.

Remetemos para os cartazes que realizámos sobre os diários em Português e que são elucidativos do que descrevemos: os pensamentos dos alunos, as críticas ao autor, as discordâncias, as alegrias e as frustrações.

O trabalho ao nível do ensino secundário

As especificidades do ensino secundário e, em particular, do 12º ano

relacionam-se, de modo necessário, com a escolha do método a desenvolver para potenciar a escrita neste grau de complexidade e exigência: a prática textual foi realizada através de oficinas de escrita e da exploração temática de conteúdos programáticos, pela prática de duas classes de texto: o comentário e o texto expositivo-argumentativo. Não

9 Cf. Anexos 39 - Regulamento do Concurso que nos incentivou a escrever “como se fosse um diário” as reflexões

(26)

12 possuindo a mesma margem temática e programática que o ensino básico possui, pretendeu-se ir ao encontro das grandes obras analisadas nos três anos do ciclo de estudos.

Assim, e a título de exemplo, utilizámos o estudo da obra Sermão de Santo António aos Peixes para realizar uma oficina de escrita orientada que incidisse sobre a comparação da violação dos direitos humanos na época de Padre António Vieira e na atualidade. Uma oficina deste género foi potenciada pela doação, aos alunos, de artigos jornalísticos atuais que lhes permitissem adquirir informação que pudessem articular de modo ajustado com o conhecimento já adquirido da obra estudada. Deste modo, tentámos levar os alunos a cumprir os parâmetros de trabalho de um texto expositivo-argumentativo, no que concerne a estrutura, coesão, exposição e confirmação de elementos culturais e sociais.

A prática recorrente destas oficinas promove o conhecimento do mundo nos alunos e, ao mesmo tempo, permite-lhes adequar estratégias de preparação para o texto final do exame de 12º ano, onde, necessariamente, lhes pedirão um comentário e/ou reflexão sobre um tema a desenvolver nos moldes já enunciados.

Pretendeu-se desenvolver, ao nível do secundário, uma prática frequente, em alguns pontos semelhante à prática já referida do ensino básico: a proposta de ferramentas não textuais para construção de texto. A título de exemplo: utilizámos a projeção do painel de azulejos “O encoberto”, de Lima de Freitas, para a realização da oficina de escrita sobre “D. Sebastião”, poema de Mensagem de Fernando Pessoa (cf. ANEXO 25). Os alunos puderam, deste modo, evocar os seus conhecimentos da obra estudada e transformar imagens em conceitos, conceitos em reflexões articuladas, reflexões em texto expositivo-argumentativo. Mostrar-lhes que este processo de ascendência reflexiva é composto por passos e que estes passos constituem o percurso necessário para a prática da escrita é mostrar-lhes que, a cada momento de redação que lhes é pedida, devem caminhar pelo trilho da construção planificada do que irão escrever. Defendemos que a planificação é, assim como a articulação de conceitos, pessoal e que, se algo tem que se domar, esse algo é a produção final da escrita e não a sua caótica apresentação inicial aos sentidos e à compreensão. O processo parte do campo do sensorial e pretende levá-los à absorção individual da necessidade de planificação, organização mental, para que alcancem o texto de modo organizado e claro.

(27)

13 O comentário de texto ocupa também o seu espaço de destaque na componente escrita, no ensino secundário. Nos moldes em que este surge, difere em muitos aspetos da realidade, baseada na vivência dos alunos e na articulação desta com uma argumentação clara, do texto expositivo-argumentativo. Este tipo de texto exige aos alunos uma bagagem de conteúdos teóricos sólida e a sua condensação, tarefa que se assume ainda mais difícil, num texto de 80 a 130 palavras. As capacidades de síntese, de articulação coerente e útil escolha de léxico são-lhes assim exigidas (cf. ANEXO 22). Em suma, como nos indica o Programa ao nível do Ensino Secundário, o trabalho de texto centra-se no alcançar com solidez o domínio dos “três grandes objetivos escolares a trabalhar: a escrita como forma de exprimir conhecimento, a exposição e a argumentação” (2014, p. 27). Logicamente esse trabalho já se encontra, ainda que de modo preparatório, visado no 3º ciclo, momento crucial de consolidação da escrita e de exploração de potencialidades.

Os capítulos que se seguem e que dedicámos à reflexão sobre os pressupostos programáticos e teóricos que orientaram a nossa PES pretendem ser o espelho de várias destas facetas da escrita que foram sendo articuladas ao longo do ano letivo. À medida que fomos trabalhando com os alunos e tornando mais complexo o nosso projeto de desenvolvimento da competência escrita fomos também alimentando novos desejos, criando novos desafios, encontrando novas dúvidas. Esperamos que a presente tese revele o processo, a progressão, o questionamento e o orgulho motivador que permitiram recriar, a cada momento mais trabalhoso, a vontade de continuar e de nos superarmos.

iii. A escrita e a articulação com o Programa e as Metas Curriculares

A abordagem que pretendemos fundamentar segue de perto os princípios programáticos das disciplinas de Português e de Espanhol para os ensinos básico e secundário, que orientaram e fundamentaram a prática letiva, tentando articular a competência escrita com as outras competências, na medida em que os Programas o aconselhavam de modo mais ou menos próximo.

Dos objetivos e finalidades constantes nas páginas 5 e 6 do Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, destacamos o ponto 8 - “Desenvolver a capacidade de adequar formas de escrita a diferentes situações de comunicação e em contextos específicos, fazendo uso reflexivo das diversas modalidades da língua”; o

(28)

14 ponto 12, “Consolidar os domínios da leitura e da escrita do português como principal veículo da construção crítica do conhecimento”; o ponto 18, “Construir um progressivo domínio do funcionamento da língua, na oralidade e na escrita, através da capacidade de reflexão sobre as suas regularidades, de modo a ganhar autonomia no uso dos códigos da mesma” e o ponto 21, “Compreender o português padrão e fazer uso adequado dele nas diversas situações de oralidade, de leitura e de escrita”.

Do Programa de Português para o Ensino Secundário, homologado em 2001, será de sublinhar que, na página 4, dedicada à apresentação do Programa (e pelo qual ainda nos guiámos nesta PES, uma vez que lecionámos 11º e 12º anos, anos com o Programa antigo ainda em vigor) os autores afirmam o desejo de introduzir as oficinas de escrita como instrumento fértil, potenciador da melhoria na capacidade de escrita:

Quanto à expressão escrita, pretende-se que seja instituída uma oficina de escrita, em que sejam trabalhadas as tipologias textuais previstas, a partir das quais se desenvolverão as competências naturalmente envolvidas neste tipo de actividade. Propõe-se que esta oficina seja entendida como um trabalho laboratorial, constituindo um espaço curricular em que a aprendizagem e a sistematização de conhecimentos sobre a língua e os seus usos se inscrevem como componentes privilegiadas.

Parece-nos importante destacar no texto programático a importância dada à criatividade e ao interesse do aluno, elementos fundamentais do nosso ponto de vista: “Importa, pois, que as actividades estimulem a criatividade, criem o desejo de ler e escrever e tornem o aluno um leitor activo que mobiliza os seus conhecimentos, coopera com o texto na construção de sentidos e desenvolve as suas potencialidades criativas” (Coelho, M., (Coord.), 2001, p. 20). A própria ordem de trabalho indicada pelo programa revela esta primazia dada ao aluno e à sua satisfação e interesse textual:

Os escritos expressivos deverão ser trabalhados em primeiro lugar, pelo facto de se centrarem no próprio escrevente. Seguem-se os informativos e os criativos, que envolvem capacidades muito diversas, embora equivalentes: saber sequencializar, sintetizar, definir, explicar, documentar-se, no caso dos primeiros; saber criar e exprimir-se de forma criativa, no caso dos segundos. Finalmente, virão os textos argumentativos, exigindo capacidades complexas: defender uma tese, determinar relações de causa-efeito, confrontar e classificar (Coelho, M., (Coord.), 2001, p.21).

(29)

15 A nossa prática pedagógica, durante o ano letivo de PES, foi ao encontro do Programa, na medida específica em que partilhamos com os seus autores crenças e perspetivas quanto aos métodos:

É, pois, necessário promover, nas aulas de Português, uma oficina de escrita que integre a reflexão sobre a língua e que, em interacção com as outras competências nucleares, favoreça, numa progressão diferenciada, a produção, o alargamento, a redução e a transformação do texto, bem como uma gestão pedagógica do erro (Coelho, M., (Coord.), 2001, p.21).

Consideramos que esta perspetiva potencia a evolução dos alunos, revelando o texto como elemento plástico e possibilitador de dar a conhecer o aluno as suas fragilidades e forças. A esta prática não pode ser alheio, como também refere o texto programático, o impulso da consciência crítica que se pretende no trabalho de escrita como elemento fulcral, revelador de um escritor empenhado e comprometido com a sua perspetiva do mundo.

(30)

16

CAPÍTULO I - A IMPORTÂNCIA DA ESCRITA – OU

COMO O VERBO ESCREVER SE CONVERTEU EM

VERBO INTRANSITIVO.

Escrever é complexo, podemos afirmá-lo pelo conjunto de destrezas que são exigidas quando escrevemos, uma vez que a escrita não se limita ao ato da escrita, a escrita pede, em relação a si e como contributo à sua qualidade, um aquém e um além. Assim, quando nos referimos à escrita adotamos a definição de Cassany, que afirma que um escritor é aquele que “es capaz de comunicarse coherentemente por escrito, produciendo textos de una extensión considerable sobre un tema de cultura general” (Cassany, D., Luna & M., Sanz, G, 1994, p. 258). Consideramos que a escrita pressupõe exigências que ultrapassam a passagem de palavras do pensamento para o papel, ou de uma linguagem oral para uma linguagem escrita. Ou seja, “as regras que regem as produções escritas são mais estritas e constritivas que as das produções orais, em particular a nível lexical e sintático” (Aleixo, C. A., 2001, p.61). A estes procedimentos que se colocam em funcionamento quando escrevemos podemos chamar-lhes microhabilidades que o escritor deve, necessariamente, dominar até alcançar a escrita.

Hoje em dia, quando nos referimos a um saber escrever, compreendemos que há muito nos afastámos de uma referência ao ato de usar palavras de forma gráfica. Se alguém souber escrever o seu nome e/ou alguns elementos dispersos que memorizou em aprendizagens elementares, não afirmamos que sabe escrever. Escrever implica saber, domínio desse saber e posicionamento desse saber, de modo a que este seja comunicável aos outros. Leia-se: “Se podría decir, parafraseando a Vygotski, que en la producción de textos escritos participan muchas de las funciones intelectuales más elementales para crear una combinación específica”, a destreza escrita exige-nos “encontrar los contenidos, adaptar el texto al contexto, elegir los elementos estilísticos adecuados entre las formas léxicas y gramaticales disponibles” (Schneuwly, 2009, p. 5). Ao aplicarmos esta definição a um contexto pedagógico, preocupa-nos a vasta amplitude da função escrita e, admitindo-a, defendemos que as tarefas devem ser orientadas e estruturadas à partida, de modo a que o aluno não se perca num exercício vazio de transposição verbal que escapará, de modo assustador, à exigência da competência escrita pedida na escola. O aluno deve estar munido a tal ponto das

(31)

17 referências, orientações e matéria de trabalho que lhe será fácil encontrar um caminho textual que apenas lhe ofereça como preocupação o modo de percorrer o caminho, isto é, de construir o sentido do texto, deixando de lado preocupações como “O que deveria estar a escrever?”, “Qual a forma mais correta de fazê-lo?”.

A escrita implica uma certa consciência, vertiginosa muitas vezes, de que o seu produto se posiciona sozinho perante o leitor. O que exige dois tipos de reação: primeiro, ver o que falta ao texto para que este não se encontre desprotegido, para que ele possa afirmar-se como representante fiel do que queria ser transmitido pelo seu autor; segundo, pensar que nenhum texto é definitivo ou se encontra morto para a reescrita e, que, por isso, quem o escreve poderá sempre resgatá-lo a um sentido equívoco ou impróprio. Há que ensinar aos alunos a antecipação à orfandade do texto, ainda que esta explicação não passe obrigatoriamente pela exploração de conceitos teóricos. Como nos diz Maria da Conceição Fernandes Aleixo em A vez e a voz da escrita, “Quem escreve tem de conseguir criar o contexto de interpretação através do próprio texto. Deve explicitar as condições e parâmetros em que o seu texto tem sentido para evitar possíveis ambiguidades e confusões no leitor ou no destinatário” (Aleixo, C. A., 2001, p.62). Há que recordar aos alunos a necessidade de apetrechar a escrita de tudo o que precisará para se fazer entender sem questões dúbias, quando estas não são o objetivo do texto, uma vez que não acompanha a escrita o conjunto de gestos, entoações e expressões corporais com que conta a oralidade. Assim, a escrita alia o trabalho textual com o trabalho de antecipação da interpretação alheia.

Surge-nos ainda como “una función psíquica compleja, social y culturalmente construida, como un nuevo conjunto de funciones antes separadas, reunidas y por este ello transformadas para constituir una nueva unidad” (Schneuwly, 2009, p.5). Veja-se que as esferas que a escrita trabalha e reflete são também elas complexas e que, por isso, a competência visada muitas vezes obriga a uma construção concetual que a preceda – conceção pessoal, social, cultural, económica, … - apesar de não considerarmos o que se escreve como a grande questão da escrita, admitimos a importância de acompanhar o aluno na sua preparação concetual, não deixando essa tarefa ao mundo além escola. Admitimos que o adquirir conceitos e mais mundo é um ponto prévio e um meio para alcançar melhores textos.

Para que o aluno resgate, aquando da criação escrita, conhecimentos do mundo e de si, será necessário apontar-lhe objetivos? Defendemos que sim, afinal o aluno é um aprendiz de escritor. Nesta perspetiva, na competência escrita entusiasmou-nos a dupla

(32)

18 vertente explorada por Miras (2000), que nos dá a conhecer a função interpessoal ou transacional da escrita e a sua função representativa ou ideacional. Leia-se a este propósito que a função interpessoal ou transacional se refere à produção de textos escritos com o objetivo de “interagir com outras pessoas, comunicar com elas pela mediação dos referidos textos” (Aleixo, C. A., 2001, p. 58), enquanto a função representativa ou ideacional remete para “a produção de textos escritos e permite-nos expressar conhecimentos, ideias, sentimentos, crenças, fantasias e, em geral, representar, criar ou recriar os objetos do nosso pensamento”. Mas, para que o aluno possa distinguir quando se centra numa ou noutra função ou quando se lhe exige que alcance um equilíbrio bem estruturado entre ambas, pensamos que a orientação e o direcionamento que o professor possa fazer é essencial. No nosso trabalho ao longo da PES pretendemos utilizar, na maioria das vezes, esta dupla função da escrita, considerando que a presente função encontra a sua riqueza precisamente na duplicidade: é porque a escrita comunica algo, de nós ou do mundo através de nós, a alguém (mesmo que esse alguém sejamos nós) que se revela meio de compreensão - do mundo e de quem escreve - e que ganha o lugar de afirmação de pensamento. A escrita é trabalho de comunicação e exegese: textual, interior e exterior.

Nesta perspetiva o essencial não será o que se escreve, mas sim que se escreve. Que a produtividade da escrita seja ampla, estilhace para todas as áreas onde ocorra. Os alunos podem compreender, a dado momento, que estamos perante um processo de trabalho concetual, de afirmação das ideias: o que penso sobre? O que faço com? Como organizo o mundo? e que para este trabalho a escrita enquanto ato é a origem. Ato que nos revela na medida em que (nos/lhes) diz as estruturas que se originam em nós, as estruturas de que somos filtros, ou as estruturas que estão em nós em mudança. A riqueza e o abismo da escrita é compreender que “as palavras que vão surgir sabem de nós o que não sabemos delas” (Char, R., 1983, p. 534), deixando antever que, ao apoderarmo-nos de um texto de alguém, mesmo que ficcional, mesmo que técnico ou académico, se verdadeiro, alcançamos também esse alguém em alguma medida. O escritor escolheu, apagou, voltou atrás, trabalhou sobre, trabalhou com, trabalhou apesar de, e isso revela-se na sua escrita. A escolha de léxico não é casual; o posicionamento face ao mundo não se esconde atrás das palavras, revela-se entre elas, impõe-se nelas; o modo mais ou menos complexo da nossa articulação textual revela o nosso acesso à leitura, à preocupação recorrente de transmitir mais ideias, novas ideias, um maior (de)grau de pensamento.

(33)

19 Deste modo, o trabalho na competência escrita através de textos diarísticos revelou-se extremamente elucidativo: o lançar de desafios foi necessário e estimulante, o gosto pela escrita foi, na generalidade dos alunos, crescente e o acesso aos escritores revelou-se. Os diários que propusemos aos alunos não se prenderam aos limites dos diários de aprendizagem, o nosso objetivo era, na disciplina de português, alcançar algo muito semelhante a um caderno de leituras, mas, considerando o grau de subjetividade e a desejável regularidade das anotações, preferimos denomina-lo de diário de leituras. No caso da disciplina de Espanhol, justifica-se de modo mais tradicional a escolha do nome diário porque o trabalho realizado visou, tal como um diário pretende, a escrita autodiegética, a escrita que, mais descaradamente, fala de nós. Em ambos os trabalhos foi fácil verificar o posicionamento dos alunos, a sua presença constante e marcada no texto. É interessante confirmar que o estudo dos diários nas aulas de línguas tem vindo a aumentar e revela, como temos vindo a defender, o aluno e o seu mundo. Leia-se a este propósito:

El estudio de los diarios aparece en los últimos años como instrumento alternativo, y complementario, en el marco de la investigación etnográfica en la clase de segundas lenguas, instrumento a través del cual emergen factores personales del aprendiente de lenguas en los que se hallan involucrados aspectos afectivos, socioculturales, de estilo cognitivo, etc.; aspectos, todos ellos, difícilmente observables de otro modo y que, sin embargo, están estrechamente implicados en los procesos de aprendizaje de la lengua. (Martínez, J., 1997, p.1)

Com a escrita diarística conseguimos aceder, pela recorrência, pelo desabafo, pela autenticidade do processo de transposição pessoal, a um aluno nas suas características múltiplas. Que vantagens nos pode trazer este acesso? Petitjean (1998) ajuda-nos a responder a esta questão, mostrando-nos que num ambiente de confiança, a escrita pode contribuir para tecer e entrelaçar os significados dos ambientes escolares com os da vida quotidiana, valorizando as tarefas realizadas na escola e a relação aí construída. A escrita tem, assim, a vantagem de nos permitir um maior conhecimento do aluno; uma relação afetiva efetiva, o acesso a um verdadeiro campo de trabalho, aberto, pela disponibilidade do estudante ao diálogo, à partilha e à receção de sugestões e melhorias. Quando escolhemos, para integrar o subtítulo do presente capítulo, a conceção de Roland Barthes do verbo escrever como verbo intransitivo justificamo-lo pela nossa

(34)

20 crença num ato de escrita suficiente em si mesmo. Não precisamos de escrever para, escrever o quê, escrever a quem, simplesmente precisamos de escrever para concretizar a escrita, é essa a sua essência e plenitude. E sabemo-lo quando alguém afirma: Escrevo. A dedicação total a um ato, sem as suas divergências de categoria. Ainda que todos os elementos anunciados existam e possam importar em determinados momentos, ainda que eles possam enriquecer ou modificar a nossa conceção deste ou doutro texto como leitores (por exemplo, Fernando Pessoa escreveu cerca de trinta poemas de pé, no quarto, de madrugada, criando assim o heterónimo Alberto Caeiro10 e este cenário

faz-nos recriar em nós o texto com determinadas características, este texto ganha algo deste cenário), mas não falamos de elementos essenciais à criação textual, não se afirmam como primários, basilares do ato de escrita. E sabemos bem que todas as perguntas realizadas a um texto têm respostas ficcionais, e são-no mesmo aquelas que parecem corresponder a um real. Isto porque a escrita, enquanto trama, é o entrecruzar de prismas localizados, nunca correspondentes a uma realidade existente.

Assim, livres de ter de cumprir algo estipulado sobre a escrita, uma questão textual a priori a que devemos responder quando escrevemos, somos livres de testar o texto. E, nesse sentido, apontamos apenas uma exigência: que esse ato seja sinónimo de prazer. Na linha de raciocínio de Cassany afirmamos que “en definitiva los alumnos tienen que pasárselo bien escribiendo, lo que les hará sentir más ganas de escribir, y poco a poco, empezar a apreciar la escritura.” (Cassany, D., Luna & M., Sanz, G, 1994, p.260). Para que os alunos se sintam motivados a escrever há que colocar também responsabilidade no professor, ele é o inventor, criador de tarefas, desafios, cabe-lhe a ele olhar o mundo e descobrir o modo de o mostrar atrativo, podendo usar as categorias da escrita para incentivar o processo. Escrever é ainda difícil, a intransitividade do verbo é a nossa meta, mas, ao início, os caminhos terão que ser os de escrever o quê, escrever a quem, escrever para quê, escrever como, … A passagem pelas várias tarefas parece-nos fundamental, no sentido em que todas elas têm o seu momento no caminho que se percorre, ou onde se para, para consolidar a escrita e evoluir nela. Até que, talvez, se chegue a um momento ideal, em que o texto assume um papel por si, deixando de servir a, como afirma Barthes, “é no momento mesmo em que escrever parece tornar-se intransitivo que o seu objeto, sob o nome de texto, assume particular

10 “Num dia em que finalmente desistira - foi em 8 de março de 1914 - acerquei-me de uma cómoda alta, e, tomando

um papel comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tal poema a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir”, Excerto de uma carta de Pessoa a Adolfo Casais Monteiro, 13.01.1935

(35)

21 importância” (1984, p.21), aos poucos, quando o entusiasmo da criação imaginária, ficcional, desafiante, se tornar um elemento familiar, não existirá a necessidade de sugerir vamos escrever?, acreditando o vínculo anteriormente criado será suficiente para que o façam.

(36)

22

CAPÍTULO II – ESCREVER A DUAS VOZES - O

PROCESSO DE REESCRITA

“Nunca ninguém escreveu a duas vozes. Foi possível cantar a duas vozes, ou fazer música também, e jogar ténis, mas escrever, não. Nunca.”

Marguerite Duras, 1914

Um dos aspetos mais difíceis da escrita em contexto escolar é conseguir alcançar o processo de reescrita. Em aula escrever um texto pode ser um processo complicado, pois, como afirma Cassany (1994, p.14), o processo é exigente, é necessário procurar e selecionar ideias, organizá-las, escrever um rascunho, lê-lo e revê-lo, mas levar os alunos a compreender que essa escrita, depois de já ser texto, precisa de ser pensada posteriormente, revista e trabalhada afirma-se como um processo trabalhoso. O Programa e metas curriculares de português do ensino básico refere a fase de revisão e a crescente exigência associada ao método de trabalho de texto ao longo dos ciclos de estudos:

Notar‐se‐á que a gradual exigência no âmbito da Escrita, tendo já em atenção o prolongamento do ensino obrigatório até ao 12.º ano, passa por etapas prévias à redação do texto (planificação por etapas); pela atenção dada à textualização, referente quer à correção linguística que o aluno deve demonstrar quer à intencionalidade comunicativa que deve incorporar; e pela revisão cuidada do texto produzido. Estes três momentos são comuns a todos os géneros textuais praticados no 3.º Ciclo. (Buescu, Morais, Rocha & Magalhães, 2015, p. 27).

Consideramo-los em todos os momentos de escrita que levámos a cabo.

Murray afirma que escrever é reescrever e Vigner acaba por propor o ensino e a aprendizagem da escrita numa ótica de pedagogia da reescrita, ao considerar que o processo de escrita consiste na procura de uma realização textual considerada satisfatória através de reformulações sucessivas” (Pereira, L., 2008, p.82), pensamos que os alunos poderão compreender melhor o processo de reescrita quando se

(37)

23 consciencializarem de que escrever não é um processo que derive diretamente de um dom ou de uma apetência nata. Pedimos a um aluno que se aventure numa aula de esgrima, não importa se é a primeira vez que o faz. Avaliamos agora a sua destreza para esta arte. Se for mais ou menos apto consideramos, desde logo, que nasceu para dominar o florete, se não tiver jeito para tal, julgamos que não tem o dom. Este tipo de raciocínio é tão ou mais injusto e perigoso quando aplicado à escrita, se transformarmos a nossa perceção sobre o processo de escrita numa avaliação sobre dons dificilmente conseguiremos passar ao aluno a noção de reescrita. Se não tenho o que é necessário, à partida, para ser um bom escritor, porque devo preocupar-me em reescrever o texto?

Por isso, começaremos por tentar mostrar-lhes que alcançar a competência da escrita implica trabalho, o trabalho de admitir que escrever é um processo e que, por isso, precisará de fases e de aperfeiçoamento. “Esta visión de la elaboración de textos como escritura y reescritura constituye uno de los principios fundamentales de la enseñanza de la expresión escrita” (Dolz, J. & Schneuwly B., 2009, p. 2). Devem ter ainda noção de que, a longo prazo, a escrita evoluirá e esse trabalho poderá pedir a aquisição de ferramentas necessárias a uma escrita mais sólida - a investigação prévia (ainda que simples) ou a reunião de dados concretos num esquema, uma maior abrangência cultural, um leque vocabular confortável. É bastante visível a progressão deste trabalho do ensino básico para o ensino secundário.

De qualquer modo, e em qualquer dos níveis, o trabalho de orientação e planificação da escrita que a própria produção exige é uma exigência para o aluno e para o professor, desde o momento em que qualquer um se senta em frente à folha, para preparar um exercício ou para realizá-lo. O aluno assume a sua responsabilidade quando inicia o texto e mantém-na até finalizá-lo e reconhecê-lo como seu. O professor responsabiliza-se a partir do momento em que imagina a sequência didática, a oficina de escrita, o desafio diarístico, passando pelo processo de escrita e reescrita a duas vozes, quando curioso passa pelas mesas, espia os cadernos, até que, sozinho, em casa pode rever, com calma, o tom, a coerência, a coesão, a tipologia, a imaginação, a sintaxe, a ortografia. Dizer, depois de tudo isto, que o texto é do aluno, é dizer pouco. O professor afirma-se como um escritor fantasma, também ele coloca lá elementos seus. Claro que o aluno pode ou não escutá-los, pode não aceitá-los, mas usufruiu da partilha que isso pressupõe e de um ponto de vista orientador. O inverso também é verdade. O professor recebe novas ideias, perspetivas, emoções, redescobre o que é ver o mundo aos treze anos, o que é apaixonar-se pela primeira vez, o que é ainda acreditar que se é imortal.

Referências

Documentos relacionados

De seguida, vamos adaptar a nossa demonstrac¸ ˜ao da f ´ormula de M ¨untz, partindo de outras transformadas aritm ´eticas diferentes da transformada de M ¨obius, para dedu-

Como já afirmamos, o acompanhamento realizado pelas tutorias é nosso cartão de visitas, nossa atividade em que o objeto social do Gauss se manifesta de forma mais

Otto: Este filósofo e teólogo toma como base para sua definição de religião a experiência religiosa e introduz na discussão um conceito que muito vai influenciar a compreensão

Apesar dos esforços para reduzir os níveis de emissão de poluentes ao longo das últimas décadas na região da cidade de Cubatão, as concentrações dos poluentes

Para analisar as Componentes de Gestão foram utilizadas questões referentes à forma como o visitante considera as condições da ilha no momento da realização do

Taking into account the theoretical framework we have presented as relevant for understanding the organization, expression and social impact of these civic movements, grounded on

I interpret the difference in the estimates obtained when using ordinary least squares (in column (i)) and instrumental variables (in column (ii)) as indicative

Our contributions are: a set of guidelines that provide meaning to the different modelling elements of SysML used during the design of systems; the individual formal semantics for