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Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica

Camila Portella Neves

TELEVISÃO E DEFICIÊNCIA VISUAL:

O sonoro na produção de imagens mentais

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Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica

Camila Portella Neves

TELEVISÃO E DEFICIÊNCIA VISUAL:

O sonoro na produção de imagens mentais

Dissertação de Mestrado apresentada para obtenção de título de Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC / SP.

Orientador: Prof. Dr. Jorge de Albuquerque Vieira

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NEVES, Camila Portella.

Televisão e Deficiência Visual: O sonoro na produção de imagens mentais.

São Paulo, 2012, 81 f.

Dissertação de Mestrado em Comunicação e Semiótica – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Orientador: Jorge de Albuquerque Vieira

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Folha de Aprovação da Banca Examinadora:

______________________________________________ Prof. Dr. Jorge de Albuquerque Vieira - Orientador

______________________________________________ Profª. Drª. Lucrécia D'Alessio Ferrara (PUC-SP)

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Agradeço primeiramente ao Professor Dr. Jorge de Albuquerque Vieira pelo tempo dedicado a minha orientação e pela paciência diante de minhas emergências.

Às professoras Dra. Lucrécia D'Alessio Ferrara e Dra. Lúcia Isaltina Clemente Leão, cujos cursos e conversas expandiram a minha compreensão sobre o tema desta dissertação, bem como por sua disposição em me orientar no período de pesquisa.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa que financiou meus estudos.

Aos membros da banca de qualificação, professora Dra. Lucrécia D’Alessio Ferrara e professor Dr. Gerson Tenório dos Santos, pela disponibilidade, leitura atenta e boas sugestões.

Ao professor Dr. Sergio Roclaw Basbaum, por me permitir acompanha-lo por todo um semestre no estágio docência e por seu incentivo, leitura e discussões do tema aqui apresentado.

À secretária do Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP, Cida Bueno, por mostrar-se sempre prestativa em manter-me informada sobre prazos e documentações referentes ao mestrado.

À minha mãe Márcia, maior incentivadora deste sonho, e meu irmão Felipe pela alegria que sempre acontece quando estamos juntos.

Aos meus eternos amigos Aline, Nathalie e Daniel, que tornaram esses anos de pesquisas mais leves!

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“A linguagem, a mais humana das invenções, pode possibilitar o que, em princípio, não deveria ser possível. Pode permitir a todos nós, inclusive os cegos congênitos, ver com os olhos de outra pessoa”

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assistir televisão. O objetivo da pesquisa é analisar o som como formador de imagens mentais no sentido de compreender e gerar um conhecimento do mundo através do que é repassado pela televisão aos deficientes visuais. Como objetivos específicos, pretende-se verificar o papel da TV na compreensão do mundo e como meio de informação para os deficientes visuais, constatando também em que medida o som substitui a imagem na apreensão do que é repassado pela TV. Pretende-se ainda analisar em que medida o deficiente visual consegue reproduzir o mundo através do som e identificar que tipo de visualidade produzem os deficientes visuais ao assistirem TV. Na programação da TV, observa-se o perfeito casamento entre a imagem e o som, desempenhando no Brasil um papel central no conhecimento dos indivíduos. Contudo, essa característica singular da TV na união entre imagem e som, ao mesmo tempo em que consegue atingir um maior percentual de adeptos, também limita àqueles que não possuem acesso do recurso imagético. É o caso dos deficientes visuais, os quais apenas recebem o caráter sonoro do que é transmitido. Em vista disto, a presente pesquisa parte do seguinte problema: considerando os olhos um sentido por excelência na mediação massiva das imagens, como os deficientes visuais experimentam imagens mentais ao assistirem televisão? Parte-se das hipóteses de que a visualidade mental produzida pelo deficiente visual pode levar a compreender o que é transmitido pela televisão. Assim, acredita-se que através da percepção e discriminação do som, o cego consegue elaborar imagens mentais. Outra hipótese é de que, através de uma discriminação polissensível, o deficiente desenvolve outro tipo de aprendizagem apoiada no sistema de analogias. A quarta hipótese é de que através do som o cego consegue elaborar imagens pela expansão de operações cognitivas. Trata-se de uma pesquisa qualitativa cujo método utilizado é o abdutivo-indutivo, e para o seu desenvolvimento, pretende-se realizar uma exemplificação empírica junto às pessoas com deficiência visual. Assim, discute-se acerca da representação como relação sígnica (Charles Sanders Peirce); sobre as representações mentais elaboradas pelos cegos (Antônio Damásio), entrando no cerco das Ciências Cognitivas; sobre a percepção (Lúcia Santaella), passando pela questão da maneira em que o som é utilizado pelos deficientes visuais como modo de pensar na ausência da imagem, abordando, diante disto, o conceito de compensação (Lev Semionovitch Vigotski).

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television. The objective of this research is to analyze the sound as a resource to forming mental images to understand and generate knowledge of the world passed through what is on television for the visually impaired. As specific objectives, intends to examine the TV as a way of understanding the world and as a means of information for the visually impaired, also noting the extent to which the sound replaces the image in the apprehension of which is transmitted by TV. It also aims to analyze to what extent the visually impaired can reproduce the world through sound and identify what kind of visuality is produced by the visually impaired while watching TV. In TV programming, there is a perfect union of image and sound, playing a central role in Brazil in the knowledge of individuals. However, this unique feature in the union of the TV picture and sound, while it can reach a higher percentage of fans, also limits access to those who do not have the feature imagery. This is the case of the blind, which receive only the character of the sound that is transmitted. In view of this, this research has the following problem: being the eyes a sense of excellence in the mass mediation of images, how the blind people experience mental images while watching television? It starts with the hypothesis that the mental visuality produced by blind people can lead to understanding what is televised. In such case, it is believed that through the perception and discrimination of sound, the blind people can produce mental images. Another hypothesis is that, through a polisensitive discrimination, the visually impaired are developing another kind of learning supported by a system of analogies. In view of this, the fourth hypothesis is that through the sound the blind people can elaborate images by expansion of cognitive operations. It is a qualitative research which uses the abductive-inductive method, and for its development, we intend to conduct an empirical illustration with people

with visual impairments. For the development of this dissertation will be discussed

about the representation as a sign (Charles Sanders Peirce); about the mental representations produced by the blind (Antonio Damasio), entering the enclosure of Cognitive Sciences; on perception (Lucia Santaella), and how the sound is seen by the blind people as a way of thinking in the absence of the image, passing in front of it, by the concept of compensation (Semionovitch Lev Vygotsky).

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Ilustração 1 – Principal mídia utilizada pelo DV no intuito de manterem-se informados 14

Ilustração 2 – Deficientes Visuais que assistem TV 15

Ilustração 3 – Horas diárias dispendidas pelos DV assistindo TV 15

Ilustração 4 – Período em que os DVs assistem TV 16

Ilustração 5 – Deficientes Visuais que assistem jornal na TV 16

Ilustração 6 – Deficientes Visuais que assistem TV desacompanhados 17

Ilustração 7 – Deficientes Visuais que se sentem influenciados pelo conteúdo televisivo 17

Ilustração 8 – Deficientes que se sentem participante da sociedade através do debate da TV 19

Ilustração 9 – DV que consideram a TV importante em sua formação pessoal 19

Ilustração 10 – DVs que sentem dificuldade em entender o que passa na TV 21

Ilustração 11 – Entrevistados que acreditam que a TV precisa aprimorar seus recursos 21

Ilustração 12 – Deficientes que conhecem a audiodescrição 22

Ilustração 13 – DVs que utilizam o recurso da audiodescrição 22

Ilustração 14 – Deficientes que alegam ter aprimorado sua capacidade auditiva 24

Ilustração 15 – Melhora na capacidade auditiva ajudou na compreensão do que assiste na TV 24

Ilustração 16 – Consegue imaginar o que é repassado pela TV? 25

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INTRODUÇÃO 03

CAPÍTULO I 06

CAPÍTULO II 13

01. UM MERGULHO NO COTIDIANO TELEVISIVO DOS DEFICIENTES VISUAIS 13

CAPÍTULO III 27

01. REFLETINDO SOBRE A QUESTÃO DA CEGUEIRA 27 1.1. O deficiente visual: cegueira e baixa visão 27 1.2. Cegueira e seus efeitos na produção do conhecimento 29 1.2.1. Teorias Sistêmicas e a questão da Umwelt dos deficientes visuais 29

1.2.2. Construção Sígnica 37

1.2.3. A Percepção do deficiente visual 47 1.2.4. A construção de mapas mentais 51 1.2.5. A ideia de compensação (Vigotski) 54 02. SOBREVIVENDO AO MUNDO DAS IMAGENS 57 2.1. Som como instrumento para vencer a cegueira 57

2.2. TV: O império das imagens 60

CAPÍTULO IV 64

01. O CARÁTER POLISSENSÍVEL DO SOM 64

CONCLUSÃO 70

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 72

APÊNDICES 78

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INTRODUÇÃO

A sociedade contemporânea, com a globalização, contribuiu para a mudança cultural na qual o conhecimento da informação se transformou em um bem de grande valor.

A realidade social não tem outra maneira de se expressar a não ser em forma de comunicação. E neste sentido, a TV transformou-se no principal veículo para esta comunicação, devido à proximidade que cria com seus telespectadores, que se veem por ela representados nos noticiários diários que são transmitidos. “A televisão entrou na corrente sanguínea do brasileiro. Ele passa, em média, quase quatro horas diárias com olhos vidrados na televisão” (PEREIRA, 2005, p. 15).

Sabe-se que a mídia possui um importante papel na integração de pessoas portadoras de deficiência na sociedade. Mas para que tal integração de fato aconteça, a iniciativa precisa partir da própria mídia, no modo como a comunicação chega ao receptor.

Mas não apenas isto é o suficiente para que a informação chegue sem falhas ao deficiente.

Por não possuírem acesso à imagem, outro recurso precisará ser levado em consideração na interpretação da informação pelo DV: o som1. Este recurso aparece como linguagem da mente, importante na compreensão do mundo pelo deficiente. Ou seja, o som, como maneira de pensar, acaba se tornando uma interface do DV com o mundo externo.

Neste cenário, esta pesquisa estuda o seguinte problema: considerando os olhos um sentido por excelência na mediação massiva das imagens, como os deficientes visuais experimentam imagens mentais ao assistirem televisão?

Em vista disto, tem-se como objeto da presente pesquisa, a visualidade formada pelo deficiente visual ao assistir TV.

Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar o som como formador de imagens mentais no sentido de compreender e gerar um conhecimento do mundo através do que é repassado pela televisão aos DVs.

1 A partir deste momento, a pesquisadora utilizará a palavra “som” no sentido de

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Como objetivo específico, busca-se verificar o papel da TV na compreensão do mundo e como meio de informação para os deficientes visuais. O segundo objetivo específico consiste em verificar em que medida o som substitui a imagem na apreensão do que é repassado pela TV. Visa ainda analisar em que medida o DV consegue reproduzir o mundo através do som.

E por fim, o último objetivo pretende identificar que tipo de visualidade produzem os deficientes visuais ao assistirem TV.

As hipóteses são de que a visualidade mental produzida pelo DV pode levar a compreender o que é transmitido pela televisão. Assim, acredita-se que através da percepção e discriminação do som, o DV consegue elaborar imagens mentais.

Podendo apenas atentar para a questão sonora para compreender não apenas o que é repassado pela televisão, mas para guiar seu dia-a-dia, o deficiente visual vai aprendendo a discriminar os sons, relacionar tais sons com as imagens transmitidas. Ou seja, existe uma outra alfabetização, a qual opera através de elementos analógicos.

Assim, a terceira hipótese é de que, através de uma discriminação polissensível, o DV desenvolve outro tipo de aprendizagem apoiada no sistema de analogias.

Em vista disto, a quarta hipótese é de que através do som o DV consegue elaborar imagens pela expansão de operações cognitivas.

Para o desenvolvimento desta dissertação foi realizada uma análise

empírica junto às pessoas com deficiência visual. Esta metodologia

proporciona o contato direto da pesquisadora com o grupo selecionado, uma forma de sistema aberto que leva a observação, a análise e a utilização de diferentes técnicas de coleta de dados.

O questionário foi aplicado diretamente a 30 (trinta) deficientes visuais que residem em Belém/PA. A amostra ficou restrita apenas aos indivíduos totalmente cegos, excluindo aqueles portadores de baixa visão. Essa escolha se deu para que o estudo se desenvolvesse com quem não pode contar com nenhuma espécie de imagem no seu dia-a-dia.

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O método utilizado é o abdutivo-indutivo, objetivando estudar os fatos, a experiência, para que, a partir deles, se possa traçar interpretações que os expliquem.

Assim, ao analisar a visualidade produzida através do som pelo deficiente visual ao assistir televisão, este trabalho fará uma abordagem acerca da mediação da televisão no que diz respeito a estes sujeitos no município de Belém/PA.

Em vista disto, esta pesquisa insere-se no âmbito da Linha de Pesquisa I do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica.

O primeiro capítulo é encarregado de traçar um panorama geral sobre dois pontos chave desta pesquisa: a deficiência visual e a televisão. O segundo capítulo, por sua vez, traz os dados empíricos resultantes de pesquisa realizada através de aplicação de questionário aos deficientes visuais.

Em seguida, o terceiro capítulo comporta todo o escopo teórico desta pesquisa, apontando, ainda, uma análise com a questão da deficiência. A discussão neste capítulo trará à tona a questão da representação como relação sígnica (Charles Sanders Peirce); abordará ainda sobre as representações mentais elaboradas pelos cegos (Antônio Damásio), entrando no cerco das Ciências Cognitivas; apontará a questão da percepção (Lúcia Santaella), passando pela questão da maneira em que o som é utilizado pelos deficientes visuais como modo de pensar na ausência da imagem, abordando, diante disto, o conceito de compensação (Lev Semionovitch Vigotski).

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CAPÍTULO I.

Durante o desenvolvimento desta pesquisa, constataram-se dificuldades no levantamento de dados numéricos que pudessem retratar a situação dos deficientes visuais no estado do Pará e no Brasil.

Os últimos dados neste sentido era do ano de 2000, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)2 e não refletia a realidade

de cada estado da federação. Apenas em novembro de 2011 o IBGE divulgou dados ainda preliminares sobre o Censo 20103, o qual novamente veio abordar

a questão da deficiência visual no país.

O intervalo de onze anos entre as pesquisas é mais um exemplo da exclusão desses indivíduos na sociedade, não somente no que diz respeito às dificuldades enfrentadas no dia-a-dia, mas também quanto à escassez de pesquisas sobre o tema.

O Censo 2010 mostrou um aumento no índice de pessoas que declaram ter alguma deficiência. A deficiência visual severa foi a que apresentou maior incidência: 3,5% declararam possuir grande dificuldade ou nenhuma capacidade de enxergar, ante 1,5% em 2000.

No Brasil, são 35.791.488 deficientes visuais, destes, mais de 700 mil são impossibilitados permanentemente de enxergar, mesmo com o uso de óculos, segundo o Censo de 2010. O Estado do Pará é o líder na Região Norte em número de deficientes que não conseguem ver, totalizando mais de 21 mil.

Como se nota, apesar de constituírem minoria na população, os DV, em números reais, representam milhões e seus problemas não são unicamente de

2A partir desta citação a identificação dos deficientes visuais se fará com a sigla DV. 3 Os dados do IBGE foram divulgados no dia 16 de novembro de 2011. As tabelas que

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ordem física, mas de enfrentamento de problemas intelectuais, morais e sociais, como sua representação e integração na sociedade.

Paralelamente a este cenário cumpre destacar a importância dos meios de comunicação, que possibilitam a construção de ligações sociais e comunitárias, pautando as relações quotidianas.

A sua compreensão é básica para não apenas reconhecer ou avaliar as mudanças ocorridas, mas para se dedicar conscientemente à construção da sociedade – de famílias, escolas, empresas, instituições políticas – e de participar dela.

Em todo o mundo, a televisão ocupa um lugar de destaque entre os meios de comunicação. Ela desfruta de um prestígio que a torna única condição de acesso às notícias e ao entretenimento para grande parte da população4.

Segundo Rezende (2000, p. 23):

Vários fatores contribuíram para que a TV se tornasse mais importante no Brasil do que nos outros países: a má distribuição da renda, a concentração da propriedade das emissoras, o baixo nível educacional, o regime totalitário nas décadas de 1960 e 70, a imposição de uma homogeneidade cultural e até mesmo a alta qualidade da nossa teledramaturgia.

A importância da televisão é tamanha que, em todos os Estados brasileiros e em todas as faixas de renda, há mais moradores em domicílio com televisor do que com saneamento, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio 2005 (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São dados que retratam claramente a importância da televisão no cotidiano brasileiro, bem como o reflexo que o crescimento do seu uso vem deixando na sociedade.

Vale lembrar que a mesma pesquisa realizada pelo IBGE, no ano de 2009, constatou que em 95,7% das residências do país há pelo menos um aparelho de TV, tendo esta maior incidência inclusive do que as geladeiras.

4 Apesar da crescente expansão da internet na sociedade, esta ainda não atingiu a

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A pesquisa “Síntese de Indicadores Sociais 2010”, também realizada pelo IBGE, apurou a presença de TV em cores em 95,2% dos lares no estado do Pará, à frente da geladeira, com 89,8% e do computador, com 19,7%.

Os DV também estão inseridos entre os que fazem da televisão o seu meio de informação e de apreensão de realidade. “Todos eles vêem TV, mesmo que só ouvindo, seja para acompanhar a novela, seja para informar-se – garante Antonio Menescal, chefe de gabinete do Instituto Benjamin Constant, do Rio, referência no assunto” (PEREIRA, 2005, p. 30).

Assevera Thompson (1998, p. 45) que a recepção da mensagem repassada pelos meios de comunicação é um processo hermenêutico, ou seja, de interpretação:

A tradição hermenêutica chama a nossa atenção para um outro aspecto da interpretação que é relevante aqui: ao interpretar as formas simbólicas, os indivíduos as incorporam na própria compreensão que tem de si mesmo e dos outros. Eles as usam como veículos para reflexão e auto-reflexão, como base para refletirem sobre si mesmos, os outros e o mundo que pertencem. Usarei o termo “apropriação” para me referir a este extenso processo de conhecimento e autoconhecimento. Apropriar-se da mensagem é apoderar-se de um contexto significativo e torná-lo próprio. É assimilar a mensagem e incorporá-la à própria vida.

A TV tornou-se para todos, inclusive para os deficientes visuais, um meio de extensão dos sentidos humanos, tal como assevera McLuhan (2005, p. 88):

Este poder da tecnologia em criar o seu próprio mercado de procura não pode ser desvinculado do fato de a tecnologia ser, antes de mais nada, uma extensão de nossos corpos e de nossos sentidos. Quando estamos privados do sentido da visão, os outros sentidos, até certo ponto, procuram supri-lo. Mas a necessidade de utilizar os sentidos disponíveis é tão premente quanto respirar.

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normalmente não são vistos como um público alvo em potencial pela grande mídia, principalmente no que se refere à TV.

Um dos motivos agravantes é o fato de que a informação repassada pela televisão é composta não somente do som, como também da linguagem visual, com a qual nem todos podem contar, como é o caso do público aqui estudado (portadores da cegueira).

Todos os detalhes acabam ganhando maior importância dentro do contexto daqueles que não podem contar com a imagem. Neste sentido, a televisão aparece mais uma vez como agente que pode fazer a diferença. Primar sempre pela qualidade dos recursos utilizados, obedecer as regras e investir na informação são metas que auxiliam na inclusão nesta sociedade midiática.

A exclusão sofrida pelos deficientes visuais não é assunto recente e ocorre nos diversos setores como trabalho, vida social, lazer, inclusive na comunicação. O DV, portanto, faz parte de uma minoria, pois é dotado de certa vulnerabilidade social.

No que tange a televisão, os DV são excluídos não apenas porque fogem de um padrão social dos receptores de tal meio de comunicação, já que não possuem acesso às imagens, mas são também excluídos porque, apesar de já terem conquistado certo espaço na mídia, este ainda apresenta-se de maneira bastante tímida.

Os meios de comunicação, enquanto agentes influenciadores do comportamento humano, podem intervir no processo de inclusão das pessoas com deficiência, investindo seus recursos no combate ao desconhecimento sobre o tema, através da contextualização da deficiência como parte integrante de uma sociedade marcada pela diversidade. Essa contextualização poderá se dar através da inclusão da pessoa com deficiência nas diversas formas de expressão: a TV, o rádio, a imprensa e a propaganda. (YNGAUNIS, 1999, p. 12)

Mesmo sendo parte de uma minoria, os DV também se utilizam dos recursos televisivos e assim como os demais, procuram se identificar, sentir-se representados pela televisão.

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atuaram em domínios públicos ou privados, mas ele também possibilitou a publicidade dos acontecimentos ou de pessoas para que pudessem ser experienciados ou, de qualquer modo, assistidos em situações domésticas de domínio privado. (THOMPSON, 1995, p. 318)

A Organização das Nações Unidas (ONU) também destaca a importância dos meios de comunicação na inclusão dos deficientes na sociedade:

A mídia possui um papel fundamental na promoção de atitudes positivas frente a integração de pessoas portadoras de deficiência na sociedade. Superando preconceitos e má-informação, e difundindo um maior otimismo e imaginação sobre as capacidades das pessoas portadoras de deficiência. A mídia pode promover atitudes positivas em empregadores com relação ao emprego de pessoas portadoras de deficiência. A mídia deveria acostumar-se a informar o público a respeito de novas abordagens em educação, particularmente no que diz respeito à provisão em educação especial nas escolas regulares, através da popularização de exemplos de boa prática e experiências bem-sucedidas. (ONU, 1994, apud YNGAUNIS, 2001, p. 5)

Mas no Brasil isso é uma realidade distante. Quanto à inclusão de portadores de deficiência, o cenário ainda é complicado, pois não se tem nenhum programa que leve em consideração as limitações dos deficientes visuais e trate a informação de forma que possa ser entendida com maior facilidade por este público.

Nos últimos anos, os deficientes obtiveram certas conquistas na mídia, a exemplo das legendas em propagandas políticas e anúncios publicitários do governo federal. Ou mesmo foram personagens de algumas novelas.

Recentemente, os deficientes visuais alcançaram grande avanço na TV: uma determinação do Ministério das Comunicações exigiu que as emissoras de televisão brasileiras, incluíssem, a partir de 1º de julho de 2011 em suas transmissões, pelo menos duas horas semanais de programação com audiodescrição - modalidade de tradução que tem como objetivo ajudar pessoas com deficiência visual a entender melhor os programas exibidos.

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Esta pesquisa, portanto, analisa o som como substituto da imagem, no sentido de formar uma representação mental – visualidade – do que é repassado pela TV.

Como receptores, os DV integram as mensagens transmitidas pela televisão em suas vidas, construindo suas realidades ao analisar o que é transmitido através de uma elaboração discursiva. Neste sentido, Thompson (1995, p. 408) assevera que a compreensão das mensagens transmitidas é um processo de autocompreensão e autoformação:

A idéia de que os receptores de mensagens são espectadores passivos, esponjas inertes que simplesmente absorvem o material jogado sobre eles, é um mito enganador que não condiz com o caráter real da apropriação, como um processo contínuo de interpretação e incorporação.

Tornando-se acessível à grande maioria das pessoas, a TV constitui

uma forma de companhia, de diversão, de informação e de formação. Ela

passou a ser vista como uma instituição, ao lado das famílias, escolas, etc, como instrumento para a formação e apreensão de realidade das pessoas.

(...) a televisão, com meio século de presença entre nós, compartilha com a escola e a família o processo educacional, tendo-se tornado um importante agente de formação. Ela até mesmo leva vantagem em relação aos demais agentes: sua linguagem é mais ágil e está muito mais integrada ao cotidiano: o tempo de exposição das pessoas à televisão costuma ser maior do que o destinado à escola ou à convivência com os pais. (BACCEGA, 2000, p. 95 apud BERNO, p. 6)

O avanço da comunicação elevou o papel da imagem, em especial a televisiva. Na programação da TV, observa-se o perfeito casamento entre a imagem e o som, desempenhando no Brasil um papel central no conhecimento dos indivíduos. Funcionam como uma forma de conhecimento do cotidiano.

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exemplo, o quão relativa é a força das imagens técnicas e todo o peso da palavra na conformação da notícia. Nessa perspectiva, um telejornal revela-se composto por textos complexos, resultados da combinação de diferentes linguagens e procedimentos. (LEAL; VALLE, 2009, p. 2)

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CAPÍTULO II.

01. UM MERGULHO NO COTIDIANO TELEVISIVO DOS DEFICIENTES VISUAIS

A apuração dos dados desta pesquisa foi realizada no mês de outubro de 2011, na cidade de Belém-PA, através de aplicação de questionário (apêndice 1) e a amostra ficou restrita apenas aos indivíduos totalmente cegos, excluindo aqueles portadores de baixa visão. Esta escolha intencional aconteceu para que o estudo se desenvolvesse com quem não pode contar com nenhuma espécie de imagem no seu dia-a-dia.

Não se fez distinção dentre os deficientes que nunca enchergaram daqueles que um dia chegaram a possuir o sentido da visão e posteriormente o perderam visto que a pesquisadora objetivou analisar ambos os casos e constatar se haveria diferenças de percepção e quais seriam elas.

A escolha da cidade de Belém, situada no estado do Pará, norte do Brasil, ocorreu por dois principais motivos. O primeiro é que a autora nasceu na referia cidade e sempre constatou a ausência de pesquisas e informações voltadas aos deficientes. Daí decorre o segundo motivo: diferentemente de grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, que vem trabalhando diariamente, ainda que de maneira tímida, para a contribuição da acessibilidade e inclusão da pessoa deficiente, pode-se dizer que Belém ainda é uma cidade totalmente despreparada em relação a estes pontos.

Grande parte das calçadas construídas com pedras portuguesas sofreu tombamento e hoje comportam buracos que prejudicam a mobilidade do deficiente. Para agravar ainda mais a situação, transportes públicos e semáforos também não são adequados. Escolas e universidades públicas também não possuem qualquer estrutura educacional para receber um aluno deficiente. E os problemas não páram nestes ítens.

Por toda essa dificuldade encontrada no dia-a-dia dessas pessoas, a pesquisadora considerou importante abordar a relação das mesmas, e por que não dizer, suas possíveis limitações, também na questão midiática.

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visuais. Com 58%, a televisão liderou o ranking do meio mais utilizado pelo grupo estudado, seguida do rádio, com 29% e da internet, com 13%.

Nenhum entrevistado afirmou utilizar o jornal impresso ou meio semelhante como principal veículo para obter informações. A justificativa é de que os meios impressos não possuem grande público no meio dos deficientes visuais, uma vez que o custo para a reprodução do material em braile seria elevado e não se vê interesse em disponibilizá-los para o público em questão.

Ilustração 1 – Principal mídia utilizada pelo DV no intuito de manterem-se informados

A importância da televisão aos DVs é demonstrada através do grande percentual de entrevistados, 97%, os quais utilizam tal mídia todos os dias. Destes, 47% passa de 2 a 4 horas diárias em frente à TV e 30% gasta entre 1 a 2 horas aproveitando a programação televisiva.

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Ilustração 2 – Deficientes Visuais que assistem TV.

Ilustração 3 – Horas diárias dispendidas pelos DV assistindo TV.

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Ilustração 4 – Período em que os DVs assistem TV

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A maioria, 53%, alegou assistir televisão na companhia de amigos e familiares. Contudo, todos os que dizem assistir TV sozinhos apresentam a mesma justificativa: sem a companhia de outra pessoa, conseguem se concentrar melhor no que está sendo transmitido, facilitando o entendimento do deficiente, o qual precisa estar bastante atento à sonoridade emitida pelo aparelho de TV.

Ilustração 6 – Deficientes Visuais que assistem TV desacompanhados.

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A maioria dos entrevistados, 87%, também admitiu ser influenciada pelo que passa na televisão. Este dado pode demonstrar a importância do conteúdo do que é passado na TV, uma vez que está ligado diretamente ao comportamento da população.

“A TV influencia não só a minha vida, mas a de todos nós, videntes e não videntes. Não apenas no setor profissional e social, mas em todos os setores da vida”. PSN, 55 anos.

Muito se discute a respeito da inclusão dos portadores dos mais variados tipos de deficiência visual na sociedade. Por outro lado, quando se fala dos assuntos veiculados na TV, os cegos se consideram inclusos no debate não somente quando o assunto é sobre sua deficiência, mas também quando se fala dos acontecimentos diários no mundo.

Assim, 60% dos pesquisados alega que se sente participante da sociedade através do debate estabelecido através da televisão. Para grande parte dos entrevistados, a TV consegue incluir o deficiente visual em um quadro de raciocínio e elaboração de conhecimentos.

“Ora, se é a através da televisão que conseguimos adquirir uma parte de nossa cultura, informação, e demais informações, é claro que devo me sentir participante da sociedade através do debate que a TV que propicia. É óbvio que ela ainda apresenta muitas falhas, ainda mais no que se refere aos deficientes, mas mesmo assim me sinto participante!” PSN, 55 anos.

“A televisão me permite conhecer o que está acontecendo em volta do mundo e isso me permite comentar com os amigos, fazendo com que me sinta participante dessa sociedade veiculada pela TV” JSR, 48 anos.

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Ilustração 8 – Deficientes que se sentem participante da sociedade através do debate da TV.

Ilustração 9 – DV que consideram a TV importante em sua formação pessoal.

Reforçando este pensamento, 83% dos entrevistados comentaram acerca da importância da televisão em sua formação pessoal.

“A televisão me dá base e auxílio para o que aprendo na escola” ESS, 19 anos.

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com uma abordagem mais direcionada do que os outros meios de comunicação”. JMCS, 41 anos.

“A TV é importante não só na minha formação pessoal. Sem ela, sinto que estou sozinho, fico sem companhia”. MRG, 40 anos.

“A televisão nos influencia e nos dá muitas dicas, servindo como um alinhamento de vida” ANBB, 60 anos.

Contudo, ainda que com tanta importância imposta à televisão, 43% relatou sentir dificuldade em entender o que é repassado pela TV. Em decorrência de tal dificuldade, 93% acredita que a televisão ainda precisa aprimorar seus recursos auditivos com o objetivo de que os DVs compreendam melhor o que está sendo veiculado.

“No caso dos noticiários, sentimos maior facilidade de compreensão do que é repassado porque o próprio texto dos jornais ajuda a entender. Mas quando se fala em filmes, a complicação aumenta, em especial quando se transmitem cenas longas exclusivas de imagens, quando, neste caso, perdemos toda a informação. Isto poderia ser facilmente resolvido se implantassem o recurso da audiodescrição em tempo integral”. EBV, 31 anos.

“Por não conseguir ver, às vezes me perco nas informações, mas com um pouco de concentração logo recupero”. JSR, 48 anos.

“Cenas em que apenas tocam músicas, ou entrevistas com traduções em baixo da tela em forma daquelas pequenas letrinhas, ou quando o apresentador diz para enviarmos um e-mail para o programa, conforme demonstram no canto da tela; nestes casos, se não houver alguém do lado, não temos como compreender o que se passa na TV. Portanto acredito que a TV ainda precisa melhorar seus recursos nesse sentido.” FOV, 43 anos.

“Os DV estão buscando se equiparar com os videntes para o acesso às informações. As tecnologias vem para diminuir essa distância para que nós, deficientes, possamos captar melhor as informações. A TV precisa encurtar esse acesso à informação pra que o deficiente tenha acesso auditivamente”. RARC, 46 anos.

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rapidamente, colocadas no vídeo apenas como imagem ou até mesmo vocabulário desconhecido:

“Entendo a maioria das coisas, outras que tenho dificuldade pergunto para alguém que assiste TV comigo, geralmente algum familiar, como o significado de uma palavra difícil. Com a explicação deles, tenho uma visão mais clara da notícia e consigo, dessa forma, entender o que acontece no mundo”. RARC, 46 anos.

Ilustração 10 – DVs que sentem dificuldade em entender o que passa na TV.

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Mesmo falando em recursos que a televisão deveria utilizar no sentido de melhorar a transmissão aos DVs, 43% desconhece a audiodescrição e a grande maioria, 84%, nunca utilizou tal recurso.

Ilustração 12 – Deficientes que conhecem a audiodescrição.

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Ratificando o conceito de compensação de Vigotski a ser debatido nesta dissertação, 87% dos deficientes entrevistados dizem ter aprimorado sua capacidade auditiva após a perda da visão.

“Com a deficiência, obtive perdas e ganhos ao mesmo tempo. Não é que ouço melhor que você, mas eu consegui aprimorar melhor meu recurso auditivo que você. Até mesmo nossa concentração para ouvir é melhor. A verdade é que a visão acaba desconcentrando a pessoa em sua audição. Mas tudo isso se baseia, inicialmente, na aceitação de que se está cego e de que então precisamos ainda mais da audição” PSN, 55 anos.

“De tanto você utilizar a audição, e apenas ela em alguns casos, acaba aprimorando tal recurso, com certeza!” EBV, 31 anos.

“Quando se perde a visão, a audição passa a ser a nossa nova visão. Por isso, com o tempo vamos nos adaptando e se acostumando a trabalhar mais com a audição.” ANBB, 60 anos.

“Quem vê, confia muito na visão!” DJRM, 37 anos.

“Perdi minha visão com 13 anos de idade. Para quem já enxergou um dia, é mais fácil, pois o áudio sempre traz algo à nossa mente. O DV toma como capacidade visual o tato e a audição para elaborar o formato das coisas em nossas mentes. Mas digamos que esses dois sentidos preenchem em 80% a perda que a visão me faz, já que não possuem a exatidão da visão. As memórias visuais auxiliam na formação de imagens mentais. A mente capta a mensagem e reproduz a imagem”. PERT, 38 anos.

“É uma questão de sobrevivência: usamos nossa audição para suprir a falta da visão”. JMCS, 41 anos.

“O que você faz olhando, nós fazemos ouvindo! Passamos a perceber melhor o que é sonoro. Qualquer ruído é uma informação. Assim, temos uma informação a mais que geralmente os videntes não se dão conta”. RARC, 46 anos.

E já que não podem contar com o recurso imagético fortemente repassado pela televisão, 96% dos DVs alegam que é graças a sua capacidade auditiva aprimorada que conseguem compreender melhor o que é repassado pela TV.

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para o entendimento das notícias que relatam a realidade do mundo atual. Para tanto, os DVs se utilizam de outros recursos a fim de aprimorar a recepção da notícia.

A imagem que se constrói a partir de sons, como músicas, efeitos sonoros, silêncio e ruídos, se distingue da estruturada por elementos visuais e são resultado de um processo perceptivo entre impressões pessoais e representações sensoriais sonoras apreendidas pela audição.

Ilustração 14 – Deficientes que alegam ter aprimorado sua capacidade auditiva.

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Todos os entrevistados informaram que, ao assistir televisão, conseguem imaginar o que está sendo repassado, ou seja, elaboram imagens mentais através da sonoridade emitida pela TV.

Ilustração 16 – Consegue imaginar o que é repassado pela TV?

Assim, 97% aponta que tal processo de imaginação é o responsável pela compreensão do que é transmitido.

“Além da televisão, um recurso que nos ajuda bastante a construir imagens mentais são as leituras auditivas. De fato, através do som conseguimos formar imagens mentais.” EBV, 31 anos.

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Ilustração 17 – A imaginação ajuda na compreensão do que assiste na TV?

Finalizando a aplicação do questionário aos deficientes, ainda com interesse em descobrir um pouco mais acerca da formação de imagens mentais pelo grupo estudado, foi realizada uma experiência empírica.

Sem que os entrevistados soubessem o que estava sendo colocado em suas mãos, a pesquisadora os fez apalpar uma caneta esferográfica tradicional. Em seguida foi feita a seguinte pergunta: “Ao segurar este objeto, você consegue imaginar o que é”? Todos os entrevistados conseguiram identificar a caneta como o objeto que seguravam. Ou seja, conseguiram, através do sentido tátil, formar uma imagem mental da caneta.

A última parte da experiência empírica consistiu em uma segunda pergunta: “Se eu apenas falar: ´há uma caneta na mesa´, você consegue evocar mentalmente a imagem que possui de uma caneta, sem fazer o uso do sentido tátil”?

(36)

CAPÍTULO III.

01. REFLETINDO SOBRE A QUESTÃO DA CEGUEIRA

1.1. O DEFICIENTE VISUAL: CEGUEIRA E BAIXA VISÃO

O tema que se discute requer, primeiramente, que se elenquem alguns termos específicos relacionados à deficiência visual.

Para AMIRALIAN (2000, p. 98), deficiência difere de descapacidade e desvantagem e pode ser definida como a:

(...) perda ou anormalidade de estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, temporária ou permanente. Incluem-se nessas a ocorrência de uma anomalia, defeito ou perda de um membro, órgão, tecido ou qualquer outra estrutura do corpo, inclusive das funções mentais. Representa a exteriorização de um estado patológico, refletindo um distúrbio orgânico, uma perturbação no órgão.

A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, aprovada pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 9 de dezembro de 1975 , em seu artigo I, considera como deficiente aquela pessoa:

Incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais. (ONU, 1975, p.1)

O termo “deficiência visual” diz respeito às pessoas com deficiência no órgão da visão, abrangendo tanto aquelas que possuem perda total (cegas) quanto as que possuem baixa visão.

Do ponto de vista médico e educacional, os cegos constituem um grupo dentro de um conjunto maior de indivíduos possuidores de problemas no órgão da visão, que são denominados deficientes visuais. Dentre estes há também aqueles que, embora apresentem limitação da percepção visual, a utilizam para muitos afazeres, e são classificados como sujeitos com visão residual. (AMIRALIAN, 1997, p. 30)

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por meio de apresentação de linhas, símbolos ou letras em tamanhos diversificados. Ou seja, a pessoa com baixa acuidade visual apresenta dificuldades na percepção de formas, seja de perto ou de longe.

A acuidade visual é definida pela relação entre o tamanho dos caracteres que permite a uma pessoa identifica-los, e a distância na qual consegue fazer essa identificação. A distância padrão é de 20 pés (seis metros) entre a pessoa e a tabela, porque a essa distância as lentes dos olhos estão em sua posição natural, não precisam acomodar-se para encontrar o foco. Uma pessoa com acuidade visual normal é capaz de identificar os caracteres à distância de 20 pés e, segundo esse método de avaliação, qualifica-se sua visão como 20/20, o que significa que a 20 pés de distância ela pode ver o que uma pessoa com visão normal vê também a 20 pés, portanto sua visão está dentro do padrão de normalidade. (LEME, 2003, p.10)

Com o objetivo de criar uma linguagem comum para a pesquisa e para prática clínica, a Organização Mundial da Saúde publicou, em 1980, um sistema de classificação de deficiências, o qual propunha que cegos são:

Aqueles que apresentam acuidade visual de 0 a 20/200 (enxergam de 20 pés de distância aquilo que o objeto de visão normal enxerga a 200 pés), no melhor olho, após correção máxima, ou que tenham um ângulo visual restrito a 20º de amplitude. A restrição do campo visual, a chamada visão de túnel, também é considerada cegueira, independentemente da acuidade visual possuída pelo sujeito, porque qualquer visão nesta amplitude impede a apreensão do ambiente como um todo, uma das características fundamentais da percepção visual. São considerados indivíduos com visão residual aqueles que apresentam acuidade visual de 20/200 pés a 20/70 pés no melhor olho, após correção máxima (AMIRALIAN, 1997, p. 30).

Visto isto, a deficiência visual pode ser entendida como a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da visão, sendo a cegueira a perda total da visão ou pouquíssima capacidade de enxergar. Já a baixa visão (ou visão subnormal) se caracteriza pelo comprometimento do funcionamento visual dos olhos, mesmo após tratamento ou correção.

(38)

1.2. CEGUEIRA E SEUS EFEITOS NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

“Vocês não são videntes clássicos, vocês são cegos. Porque atualmente vivemos num mundo que perdeu a visão. A televisão nos propõe imagens, imagens prontas, e não sabemos mais vê-las, perdemos a visão, perdemos o olhar interior. Perdemos o distanciamento. Vivemos numa espécie de cegueira generalizada. Tenho uma pequena televisão, assinto sem enxergar...”(Eugen Bavcar - fotógrafo cego)

1.2.1. Teorias Sistêmicas e a questão da Umwelt dos deficientes visuais

Tendo em vista a importância dada ao sentido da visão na atualidade, por ser o sentido que mais facilmente nos coloca em contato com o mundo exterior, é no mínimo curioso imaginar como o deficiente visual elabora seu mundo mental e como ele consegue se apropriar do conhecimento das coisas que não pode vivenciar através do tato, olfato e audição. A exemplo disto, como um cego conceituaria uma nuvem, a lua, ou um abismo?

Para compreender as características mais gerais da realidade e dos objetos, é necessário se passar por um estudo acerca da Ontologia, que pode ser definida como o estudo do ser enquanto ser, ou como melhor define Bunge (1977, apud VIEIRA, 2008, p. 22) “a ciência concernente à totalidade da realidade – o que não é o mesmo que a realidade como um todo”.

Para Jorge Vieira, a Ontologia “estuda os traços genéricos de todo modo de ser e vir-a-ser, assim como as características peculiares da maior parte dos existentes” (VIEIRA, 2008, p. 23).

Para o estudo de qualquer objeto o domínio da Ontologia se faz fundamental. E é neste contexto que a Teoria Geral dos Sistemas levanta as noções de coisas e objetos como relativas à sistemas, desempenhando seu papel de Ontologia Científica.

Remetendo-se ainda à Teoria do Conhecimento, há sempre uma relação entre o sujeito – aquele que deseja conhecer – e o objeto – aquilo que o sujeito deseja conhecer. Não se pode conhecer algo sem que se tenha contato com o objeto, da mesma maneira que o conhecimento não repousa unicamente no objeto, pois há interferência do sujeito.

(39)

relação (sujeito-objeto) ocorre através de uma ação. Toda natureza se comunica porque em tudo há um certo tipo de ação.

A realidade exerce um tipo de ação sobre o homem, o qual é livre para realizar qualquer coisa até o limite que a realidade o impõe. É prudente respeitar as imposições que a realidade aplica sobre as pessoas.

Pode-se dizer, portanto, que a realidade existe e é formada por sistemas. Tudo o que compõe a realidade é um sistema, ou seja, um conjunto de elementos relacionados e partilhando propriedades.

Estes sistemas podem ser abertos ou fechados. Segundo Uexkull (2004, p. 21) “sistema aberto” seria aquele que, “(...) ao contrário de um sistema fechado5, interage com seu ambiente. Visto que cada processo de observação implica interações entre o observador e o sistema observado, sistemas fechados geralmente não podem ser observados”.

Para Vieira (2008, p. 33-34):

É necessário que todos os sistemas sejam abertos, ou seja, troquem matéria, energia e informação com os outros (...). Sistemas fechados trocam energia e informação, mas não a matéria. Sistemas isolados nada trocam, sendo praticamente uma impossibilidade ontológica.

Portanto, todos os sistemas serão sempre abertos em algum nível, o que significa que são envolvidos por algum outro sistema.

(...) a realidade é formada por sistemas abertos, tal que a conectividade entre seus subsistemas, com o consequente transporte de informação, gera a condição em que cada subsistema é mediado ou vem a mediar outro, comportando-se como signo, de acordo com a proposta de Peirce. (VIEIRA, 2008, p. 29)

Ademais, todos os sistemas, seja qual for sua natureza, são determinados por parâmetros. “Chamamos de parâmetros sistêmicos àquelas características que ocorrem em todos os sistemas, independente da natureza particular de cada um, ou seja, os traços que encontraríamos tanto em uma galáxia quanto em uma sinfonia, por exemplo”. (VIEIRA, 2008, p. 31)

5 A autora obedeceu a citação da obra de Uexkull (2004, p. 21), contudo, importa

(40)

Tais parâmetros são divididos em duas classes: parâmetros básicos ou fundamentais e parâmetros evolutivos. Os parâmetros básicos, ou seja, aqueles existentes em todos os sistemas, dividem-se em permanência, ambiente e autonomia.

Permanência diz respeito à sobrevivência no sistema. “Todas as coisas tendem a permanecer. No sentido acima, as coisas ou objetos, a partir do momento em que se tornam existentes, ‘tentam’ durar, tentam permanecer no tempo” (VIEIRA, 2008, p. 32).

Para que certo sistema surja, e não outro, o universo propicia certas condições prévias, chamadas “Condições de Permanência”, as quais propiciam a “sobrevivência” das coisas no tempo. Assim, logicamente, “há um meio prévio ao sistema, onde essas coisas atuem, localmente” (VIEIRA, 2008, p. 33).

Portanto, para existir, esse sistema deve estar inserido em um ambiente. O ambiente diz respeito a um sistema que envolve outro sistema. Disto, parte-se do pressuposto de que, como anteriormente dito, todos os sistemas são abertos e como tais trocam matéria, energia e informação uns com os outros, pois “sistemas que tendem ao isolamento e perdem contato com o ambiente tendem à morte” (VIEIRA, 2008, p. 34).

Como resultado da interação entre o sistema e o seu ambiente, trocas energéticas e entrópicas levam o sistema a internalizar informações, desde diversidade material e energética (os níveis de energia de um átomo; reservas de vitaminas ou gorduras em sistemas vivos, etc.) até diversidade signica (conhecimento, competência, talento, etc.) de vários tipos. À medida em que a internalização ocorre, uma espécie de ‘estoque’ é gerado no sistema. É a chamada Autonomia. (VIEIRA, 2008, p. 34)

Foi estudando as diversas formas de interação do indivíduo com o ambiente que o biólogo Jakob von Uexkull elaborou o conceito da “Umwelt”: o modo como uma espécie constrói o mundo relacionando-se com o ambiente em que vive. Seria também compreendido tal conceito como o mundo em torno do indivíduo, isto é: “cada espécie viva sobrevive como que envolvida por uma ‘bolha’ particular, que a acompanha aonde for, que é a sua maneira particular de perceber a realidade e adaptar-se à permanência” (VIEIRA, 2007, p. 24).

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coerente com a mesma tal que, apesar da finitude quanto aos subsistemas processadores de informação, as representações assim criadas permitem uma eficiência na sobrevivência do sistema. Não estamos falando, portanto, de representações que “espelham” a realidade e sim de “mapas” isomórficos entre a organização da realidade e a organização cerebral, mental do sistema cognitivo. (VIEIRA, 2007, p. 101)

Em outras palavras, cada espécie viva é como que envolvida por uma esfera, por uma interface que faz o contato entre ela, enquanto sistema cognitivo, e o resto da humanidade. Tal interface se configura como uma ponte entre objetividade e subjetividade, o que faz com que cada espécie viva num mundo particular dimensionado através de sua história e, portanto, elabora a realidade de certa maneira que pode ser diferente da maneira como outras espécies elaboram.

Funciona como se cada espécie tivesse um mundo particular, o que Uexküll denominou de “Umwelt”, uma palavra alemã que significa “o mundo em volta”, “o mundo em torno”.

O homem vidente, por exemplo, tem a sua Umwelt bastante visual, enquanto que os deficientes visuais constroem imagens por meio da discriminação advinda dos demais sentidos – tato, olfato e audição. Eles, por exemplo, “veem” o som. Assim, cada ser vivo vê o mundo de maneira diferente. É certo que um vidente não vê o mundo da mesma maneira que um deficiente o vê, fazendo com que cada um dos seres humanos tenha um Umwelt.

A autonomia se refere ao desenvolvimento de um modo de exploração do ambiente e para isto o indivíduo precisa desenvolver recursos que são entendidos como um “estoque”. Ela seria, em outras palavras, reserva de estoque (memória). O estoque é um processo dinâmico que evolui, se modifica. A memória conecta o sistema ao tempo, e por isto não são estáticas, mas dinâmicas, e estão sempre se reorganizando.

(42)

A segunda classe dos parâmetros sistêmicos diz respeito aos parâmetros evolutivos, isto é, os que surgem ao longo da evolução, e são classificados em composição, conectividade, estrutura, integralidade, funcionalidade, organização, e complexidade.

A composição consiste em determinar os componentes formadores do sistema. Tudo é feito de algo e este algo de que tudo é feito denomina-se composição. Isto é, a composição “consiste naquilo de que é formado o sistema” (VIEIRA, 2008, p. 36).

Ela possui cinco características, quais sejam: Quantidade, que é o número de elementos que compõem o agregado; Qualidade, que é a natureza dos elementos6; Diversidade, que consiste no quanto os elementos se diversificam em classes de tipos; Informação, que significa diferença. “Os sistemas mais complexos terminam por selecionar informação, ou seja, tornam-se mais tornam-sensíveis às diferenças que percebem no meio ambiente e que mais ajudam às suas permanências” (VIEIRA, 2008, p. 36).

A ausência de diferença (informação), compromete a percepção. Perdendo diferença, se perde informação. A percepção da coisa viva acontece com a sensibilidade de conhecer o diferente. Com isto conclui-se que informação reduz a incerteza, e isso se dá pela leitura das diferenças.

A última característica da Composição é a Entropia, ou seja, “se existe informação, existe informação média e, em sistemas naturais, isso costuma implicar uma medida de entropia” (VIEIRA, 2008, p. 36-37).

Retomando a classificação dos parâmetros evolutivos, tem-se a conectividade, que consiste na capacidade que os componentes do sistema têm em se ligar um ao outro, em estabelecer relações e conexões.

A estrutura pode ser entendida como a relação entre as partes, entre os componentes. É a rede de relações e conexões entre as partes. Nas palavras de Vieira (2008, p. 38), é “o número de relações estabelecidas no sistema até um determinado instante de tempo”.

Integralidade se refere ao grau de organização de um sistema. A integralidade gera o ponto de alta conexão, possibilitando o surgimento de subáreas, cujo grau de organização faz emergir a formação de subsistemas.

(43)

Integralidade é exatamente o parâmetro que exprime essa configuração por meio de subsistemas. Para Denbigh (1975:87), a integralidade já é grau de organização. Temos assim que, se uma forma da organização, logo uma forma elevada de complexidade, se manifestar, isso se dará a partir da formação de sistemas dentro do sistema, subsistemas, portanto. (VIEIRA, 2008, p. 39)

Funcionalidade é um parâmetro que leva à organização, mas não se identifica com ela. É a emergência de propriedades partilhadas que caracterizam os sistemas. Ou seja, a organização pode ser vista quando uma determinada composição desenvolve sua conectividade, tornando-se progressivamente estruturada, com integralidade e funcionalidade.

Organização “é uma forma elaborada de complexidade, sendo que no momento é a mais elevada que conhecemos” (VIEIRA, 2008, p. 40). Assim,

(...) um sistema será dito organizado quando for composto por subsistemas conectados por relações efetivas (no sentido de Denbigh. 1975:87) com graus variados de importância tanto nos subsistemas quanto nas conexões, gerando uma totalidade dotada de propriedades irredutíveis aos subsistemas ou elementos. (VIEIRA, 2008, p. 43)

O autor Jorge Vieira (2008, p. 41) cita a visão de Bunge (1963) para a definição da Complexidade: “teríamos duas formas de complexidade, a dita ontológica, que se refere à complexidade que existe realmente nas coisas; e a semiótica, que consiste na complexidade de nossas representações das coisas”.

Como se observa, os sistemas buscam sobrevivência e para tanto interagem com o meio ambiente utilizando os estoques adequados.

Sob a visão da Teoria Geral dos Sistemas, o Deficiente Visual pode ser caracterizado como um sistema aberto diante das relações que o mesmo mantém com o ambiente. Para garantir a permanência, precisa desenvolver recursos que o ajude a explorar o ambiente em que vivem.

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a luta pela Autonomia e a conquista e demarcação do adequado Ambiente. (VIEIRA, 2007, p. 131)

Contudo, para conseguir identificar os signos que compõem o sistema, o corpo humano foi adaptado para a percepção de mudanças, diferenças, que constituem a informação.

É a partir dessa filtragem, dessa seleção, imposta pela Umwelt que o indivíduo tenta entender e explicar o mundo. Mas para VIEIRA (2007, p. 25): “Somos capazes, os humanos, de refinar nossa Umwelt”.

Como já discutido, é registrando as diferenças que o indivíduo consegue observar o mundo, pois as utilizam como índices que expressam o comportamento das pessoas e permitem oferecer um parâmetro que garanta a permanência humana.

A evolução dotou os sistemas cognitivos de formas elaboradas de sensibilidade: quando o ambiente se perturba, essa perturbação chega ao sistema cognitivo e é por ele percebida, por meio de dispositivos sensíveis às mudanças ou perturbações mais importantes para aquele sistema específico. (VIEIRA, 2007, p. 23)

Como resultado da interação do sujeito deficiente com o seu ambiente, surge a informação. Isto ocorre porque, à medida que a internalização das diferenças ocorre, os DVs criam seus estoques – função memória. Tal função memória, como se verá adiante, é possibilitada através da elaboração de mapas mentais, os quais são decorrentes da percepção sonora, tátil e olfativa.

Em outras palavras, para o deficiente visual, a função memória se atende com a percepção multissensorial do ambiente, tendo em vista que não pode contar com a imagem.

Assim, após internalizar tais diferenças, ou seja, criar uma memória, um arquivo renovável das diferenças percebidas, o deficiente visual elabora a informação, isto é, obtém uma reação sob a informação captada. Quando consegue cumprir estes três aspectos, passa a conhecer.

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ser signo. De modo a designar uma significação, o sinal é codificado como um “signo perceptivo” que – como um ser capaz de perceber – indica um “objeto” (comida, presa, parceiro sexual etc.) ainda não percebido ou uma de suas qualidades que servem como um ponto de referência apto à pista operacional de um comportamento adequado. (UEXKULL, 2004, p. 28)

Portanto, o objeto tal como o DV percebe, com todas as suas qualidades variadas e objetivamente determinadas, surge no processo sígnico.

A evolução e a consequente permanência também exigem que, além desse refinamento, que a Umwelt seja dilatada.

De uma maneira ainda desconhecida, nosso cérebro tornou-se tão complexo que é capaz de criar representações da realidade oculta, tão brilhantes e estranhas que são verdadeiras ficções. (...) Segundo filósofos como Hans Vahinger, foi a evolução e nossa eterna necessidade de permanência que nos obrigou ao desenvolvimento dos tradutores adequados aos ambientes específicos, às codificações intersemióticas, à geração em nossos cérebros de determinadas representações que são fictícias, sim, mas são tão eficientes que permitem que nossa interação com a realidade seja executada com sucesso. (VIEIRA, 2007, p. 26)

Tudo o que é adquirido pelo homem é resultado da filtragem de informações que ele adquire do mundo real. Quando o indivíduo processa as informações em sua Umwelt, tem-se o que se chama de “fenômeno”.

Segundo VIEIRA (2006, p. 14, apud Bunge):

(46)

realismo a experiência é uma classe de fatos: cada experiência singular é um acontecimento que ocorre no sujeito conhecedor, o qual se considera por sua vez um sistema concreto que tem expectativas e um acervo de conhecimento com duas consequências: a deformação e o enriquecimento da experiência.

1.2.2. Construção Sígnica

Cumpre, a partir daqui, traçar um enlace entre a Semiótica Peirceana e a questão do som na construção de imagens mentais pelos DVs.

Peirce dividiu as ciências em três classes, quais sejam: Matemática, Filosofia e Idioscopia. A primeira teria como objetivo construir seus objetos na forma de hipóteses e a partir de tais hipóteses extrair as consequências, sem precisar adentrar-se nas questões de fato. Já a Idioscopia tem como base observações especiais, a exemplo do que ocorre na Química ou Física. E finalmente a Filosofia teria como finalidade o estudo da experiência cotidiana, buscando dizer o que sobre ela é verdadeiro.

O ramo da Filosofia subdivide-se em outros três grupos de ciências: a Fenomenologia, as Ciências Normativas e a Metafísica.

A Fenomenologia, também conhecida como Faneroscopia ou Doutrina das Categorias constitui-se em uma ciência que propõe “um inventário das características do faneron ou fenômeno, dividindo-as em três grandes classes ou categorias” (IBRI, 1992, p. 4).

A fenomenologia, como base fundamental para qualquer ciência, meramente observa os fenômenos e, através da análise, postula as formas ou propriedades universais desses fenômenos. Devem nascer daí as categorias universais de toda e qualquer experiência do pensamento. (SANTAELLA, 2005b, p. 29).

Fenômeno, no sentido Peirceano, é qualquer coisa que esteja, de algum modo, presente à mente. O objetivo do filósofo, portanto, era criar uma doutrina de categorias, com a função de realizar uma análise das experiências.

(47)

Portanto, a Fenomenologia procura discriminar as classes que perfazem toda a experiência comum. Em outras palavras:

Esse exame tinha por função revelar os diferentes tipos de elementos detectáveis nos fenômenos para, a seguir, agrupar esses elementos em classes as mais vastas e universais (categorias) presentes em todos os fenômenos e, por fim, traçar seus modos de combinação. (SANTAELLA, 2000, p. 7)

Essa análise de todas as experiências, de acordo com Peirce, é o primeiro objetivo a que a Filosofia se destina.

Assim, Peirce foi capaz de analisar que tudo o que uma mente é capaz de apreender, ou seja, tudo o que aparece à consciência, assim o faz através de uma graduação de três elementos formais, quais sejam: a qualidade de sentimento, ação e reação e mediação. Mas para o autor, essas maneiras de apreensão não estão presentes apenas no ato de apreender os fenômenos, mas constituem-se em elementos formais de todo e qualquer fenômeno, seja ele físico, psíquico, real, recordado, sonhado, experimentado, etc, todo e qualquer fenômeno.

Defende, portanto, a existência de três categorias universais do pensamento e da natureza, que se encontram inter-relacionadas e onipresentes em todo e qualquer fenômeno: primeiridade, secundidade e terceiridade.

O primeiro está ligado às idéias de acaso, indeterminação, frescor, originalidade, espontaneidade, potencialidade, qualidade, presentidade, imediaticidade, mônada... O segundo às idéias de força bruta, ação-reação, conflito, aqui e agora, esforço e resistência, díada... O terceiro está ligado às idéias de generalidade, continuidade, crescimento, representação, mediação, tríada... (SANTAELLA, 2004, p. 8)

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Em síntese, esses elementos formais, que Peirce chamou de categorias, são os filamentos mais gerais, abstratos e universais de todo o universo. Por serem tão universais a ponto de se presentificarem em tudo e qualquer coisa, Peirce resolveu esvaziar os termos de qualquer conteúdo material, reduzindo-os à sua natureza puramente lógica. Daí as categorias passarem a ser designadas por (1) primeiridade = mônada, (2) secundidade = relação diádica e (3) terceiridade = relação triádica. Em cada fenômeno particular, a roupagem aparente dessas categorias se modifica, mas o substrato lógico sempre permanece.

Seriam estes os três modos que os fenômenos apareceriam à consciência, segundo a teoria de Charles S. Peirce, modos os quais devem ser interpretados como operação do pensamento-signo que se processam na mente e não como entidades mentais. Neste sentido, a consciência é o lugar de interação das formas de pensamento, sendo as categorias “as modalidades peculiares com que os pensamentos são enformados e entrecidos” (SANTAELLA, 2005b, p. 42).

A Filosofia Peirciana engloba também as Ciências Normativas, as quais tem como base a Fenomenologia e “estão voltadas para compreensão dos fins, das normas e ideais que guiam o sentimento, a conduta e o pensamento humanos”. (SANTAELLA, 2005a, p. 36)

Em tais Ciências Normativas, por sua vez, incluem-se a Estética, a Ética, e a Lógica. A Lógica, mais conhecida como Semiótica, também se subdivide em Gramática Especulativa (ou Teoria Geral dos Signos), Crítica (dividida em Abdução, Indução e Dedução) e Metodêutica (ou Retórica Especulativa).

Semiótica é “a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significado e de sentido” (SANTAELLA, 2005b, p.13)

Imagem

Ilustração 1 – Principal mídia utilizada pelo DV no intuito de manterem-se informados
Ilustração 2 – Deficientes Visuais que assistem TV.
Ilustração 4 – Período em que os DVs assistem TV
Ilustração  7  –  Deficientes  Visuais  que  se  sentem  influenciados  pelo  conteúdo  televisivo
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