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Resumos Livro Jorge Miranda(1)

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Universidade de Lisboa Faculdade de Direito

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

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2004/2005

Luís Manuel Nascimento/Vera Maria Correia Capítulo I – O DIREITO INTERNACIONAL

1 – Formação e evolução Direito internacional e história

O Direito Internacional tem de ser compreendido a partir da história

Em sentido lato, a história interpenetra-se com a história do Estado. Onde quer que haja Estado e que mantenha qualquer tipo de relações mais ou menos duradouras com outros Estados tornam-se necessárias normas jurídicas para as estabelecer e fazer subsistir, sejam quais forem essas normas.

Considerando apenas o moderno direito internacional, cabe distinguir dois períodos na história:

1) Desenrola-se até à 1.ª guerra mundial (clássico) – dominam as relações entre os Estados, sendo estes os únicos sujeitos do direito internacional.

2) Desde então até hoje (contemporâneo) – nele os Estados têm de concorrer com novos sujeitos na esfera internacional: organizações internacionais, o próprio indivíduo (que adquire também subjectividade internacional). Abundam os tratados multilaterais sobre as mais variadas matérias.

Direito Internacional clássico

Sendo nos séculos. XV, XVI e XVII que se encontram as origens directas do Dto. Internacional moderno e é nos séculos. XVIII e XIX que ele se desenvolve e ganha importância crescente. Sucedem-se três fases:

- A primeira, de primórdios, abrange os tempos anteriores à paz de Vestefália (1648). Entre o séc. XV a 1648 sucedem-se grandes eventos históricos: a quebra do poder do imperador do Sacro-Império, os descobrimentos, o Renascimento, A reforma a Contra-reforma.

Serão os descobrimentos a trazer problemas que se reportam, à delimitação da acção e das esferas das potências europeias em expansão (aqui entra a famosa contraposição entre Hugo Grócio e Frei Serafim de Freitas – Mare Clausum Vs. Mare Liberum).

- A segunda decorre até à Rev. Francesa e Século XVIII – os tratados de Vestefália reconhecem o princípio da soberania dos Estados como princípio de independência dos Estados europeus entre si e de exclusão de qualquer poder que lhes seja superior. Multiplicam-se as relações comerciais, celebram-se tratados e vão surgindo normas consuetudinárias em áreas vitais (limites do poder do Estado, Territórios, representações diplomáticas).

Afirma-se o Dto. Das gentes com crescente alcance e vai-se projectando na vida dos Estados.

- A terceira começa nessa altura e termina na 1.ª guerra mundial – as Rev. Francesa e americana marcam uma nova fase, coincidente com o liberalismo burguês, com o nacionalismo romântico e com o apogeu do poderio europeu. Introduzem-se noções de soberania popular (o Dto. Internacional passa a ser concebido como o Dto. Das relações entre os povos, livres e iguais). A Santa aliança é a expressa da nova ordem de consenso que emerge através de conferências diplomáticas. Emergem os EUA e Japão, aparecem uniões administrativas internacionais, e cria-se um Dto. Humanitário de guerra.

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Direito internacional contemporâneo Divide-se em duas fases:

- Uma primeira até 1939, até a 2.ª guerra Mundial – o desmembramento dos chamados impérios centrais levam à reafirmação dos princípios da autodeterminação dos povos e das nacionalidade, separadamente ou conjugados. Novos estados emergem. Desenham-se movimentos anticoloniais fora da Europa.

Em anexo ao Tratado de Versalhes é criada a Sociedade das nações (embora não confinada a objectivos de segurança, são eles que avultam, sendo ainda os países europeus que dominam a Sociedade das Nações).

Aparecimento da Organização Internacional de Trabalho a qual irá desempenhar uma função decisiva no progresso social, através das convenções e das recomendações que elaborará a partir da sua assembleia, a Conferência Internacional do Trabalho.

Aparecimento de um Tribunal Permanente de Justiça Internacional – instância jurisdicional de solução de litígios internacionais de harmonia com critérios estritamente jurídicos.

- A segunda, após 1945, sob a égide das Nações Unidas. Esta foi criada a pensar num sistema mundial mais dinâmico. Tem os seguintes aspectos:

- A elevação da cooperação económica e social – art. 1.º, 33.º e 55.º da Carta.

- O empenho no progresso político, no sentido da autodeterminação e da independência – art. 73.º e 75.º. - A proibição da guerra – arts. 2.º, n.º 3, 4 e 5, e 51.º.

- Conjunto complexos de órgãos.

A par das N.U e da organização internacional do trabalho constituíram-se outras organizações (organização das N.U. para a educação, a ciência, e a cultura).

Criação numerosas organizações de âmbito continental ou subcontinental, com objectivos políticos, militares, económicos e culturais.

O aparecimento dos novos Estados dir-se-ia pôr em causa algumas das bases do Dto. Internacional. Para certas correntes de doutrina teria mesmo de se dar uma ruptura com os princípios e regras anteriores, produto do domínio de países imperialistas e exploradores, à semelhança do que ocorreria como Dto. Interno, também haveria um Dto. Internacional e o desenvolvimento. Porém, ultrapassado apriorismos ideológicos, verificar-se-ia que o Dto. Internacional conseguiria adaptar-se às transformações, revelando-se dotado mesmo de maior capacidade de adaptação do que o Dto. Interno, em vez de ser mera super-estrutura dependente de quaisquer interesses.

Entre os aspectos mais cadentes da actualidade internacional podem ser destacadas: - A globalização económica

- A globalização da comunicação social e cultura. - O agravamento das desigualdades

- Os extensos movimentos de pessoas

- O exacerbamento dos contrastes nacionais, rácicos, religiosos e mundiais. - Os problemas do clima e da preservação do ambiente e dos recursos naturais.

Características distintivas e institucionalizadas do Dt. Internacional Ainda hoje o Dt. Internacional apresenta características que bem o distinguem do direito estatal:

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- Sistema complexo e diferenciado de fontes. - Diversificação o âmbito das normas. - Sistema complexos de sujeitos:

- No dt. Estatal os sujeitos com capacidade plena são as pessoas singulares, no Dt. Internacional são os Estados (os indivíduos também mas quando verificados certos pressupostos).

- Multiplicidade de sujeitos e de categorias de sujeitos a nível interno.

- Igualdade jurídica e biológica a nível interno, a nível internacional são iguais a nível jurídico mas condicionados pelas diferenças de poder e dimensão.

- Dependência do dt. Interno para a execução das suas normas.

- Domínio quase completo nos actos jurídicos-internacionais das manifestações. O fenómeno da criação de organizações de diversos tipos:

- Fenómeno da criação de organizações de diversos tipos.

- Imposição pelas N.U. dos seus princípios e injunções a Estados não membros.

- A assunção das N.U., mediante a Assembleia Geral de uma tarefa de codificação das normas preexistentes de origem consuetudinária.

- O reconhecimento num dos grandes textos de codificação – a Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados de 1969 – de um JUS COGENS, de normas imperativas de Dt. Internacional que prevalecem sobre os tratados e cujo não-acatamento determina a nulidade destes.

- Na linha do pacto da Sociedade das nações também a prescrição de que as obrigações advenientes da Carta das nações Unidas prevalecem sobre quaisquer outras obrigações internacionais.

- A prática crescente de tratados multilaterais e abertos a Estados não participantes na sua formação.

2 – Sentido do Direito Internacional Âmbito do Direito Internacional

- O primeiro critério atende às relações reguladas pelo direito internacional como relações entre estados: Dt. Internacional é então o Dt. das relações entre Estados – entre Estados nacionais, ou tendencialmente nacionais.

Esta noção não pode ter-se por correcta. Existem outras entidades para além dos estados, que também são objecto de regulamentação e que participam activamente no que se tem vindo a chamar vida jurídica internacional. Em contrapartida, existem Estados que não participam na vida internacional (federações).

- Segundo critério contempla, não já os Estados, mas sim os sujeitos de Direito Internacional em geral. O Direito Internacional é encarado como Dt. Regulador das relações entre sujeitos de Direito Internacional, independentemente de serem ou não Estados.

Mas tal definição tem um gravíssimo defeito: o de implicar uma petição de princípio – define o dt. Internacional a partir dos sujeitos de direito internacional: ora, o que sejam esses sujeitos depende do próprio dt. Internacional. - Terceira definição parte do objecto das normas. Tudo o que seja matéria internacional é objecto de normas de direito Internacional; este aparece como o Direito relativo a matérias internacionais, e não como o direito das relações entre Estados e outros sujeitos.

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Surgem logo as dúvidas: afigura-se tarefa difícil afirmar com segurança e firmeza que uma dada matéria cabe ou não no direito internacional, é internacional ou não; e cada vez se observa mais uma intrincada teia de circulação, comunicações, relações e trocas entre os povos.

- Critério dos processos de formações das normas: o direito internacional abrangeria as normas resultantes de processos de formação específica de normas contrapostos aos de direito interno.

E as diferenças ressaltam quase à vista desarmada. Não encontramos leis como modos de formação centralizada do direito por obra de autoridades com competência para tal. Como modo mais aproximado apenas encontramos os tratados multilaterais gerais.

O Direito internacional constitui ainda uma ordem jurídica descentralizada, enquanto a ordem jurídica correspondente à concepção de estado moderno é centralizada. Por isso, a par do costume, com muito maior importância do que na ordem interna, o que mais avulta é a convenção internacional ou no tratado internacional.

Este critério é demasiado formal para nos dar uma verdadeira noção de Dt. Internacional

- Ideia de comunidade internacional: o Dt. Internacional como expressão jurídica da existência de uma comunidade internacional.

Contudo, o Dt. Internacional surge como expressão das soberanias dos Estados, a partir dos seus interesses e vontades; ainda hoje não se pode negar o peso decisivo que os Estados têm dentro da comunidade internacional. Para além disso existem, não uma, mas várias comunidades internacionais.

O Prof. Jorge junta os dois últimos critérios. O Dt. Internacional compreende processos de formação específicos; e singulariza-se pelo papel mais extenso do costume, pela ausência de lei como acto normativo, autoritário e centralizado e pelo significado peculiar de factores convencionais. Mas esses procedimentos não valem nem se explicam por si mesmos; derivam, naturalmente, das condições próprias e mutáveis da vida internacional, dos modos e das circunstâncias, como nela se inscrevem os Estados e os demais sujeitos, bem como das conexões entre eles e as pessoas físicas.

Tendo começado como Dt. Das relações recíprocas dos estados ele foi-as estruturando em termos permanentes através de meios organizativos a se e de formas avançadas de institucionalização.

Ele liga-se a uma dinâmica feita tanto de entidades colectivas como de pessoas singulares que não acaba nas fronteiras políticas, antes pressupondo a inserção num plano mais vasto e mais complexo; patenteia a existência de círculos alargados de comunidades jurídicas para além da comunidade estatal.

Áreas do Direito Internacional

O Dt. Internacional é um ordenamento jurídico, não um ramo de Direito. Ao lado das ordens jurídicas estatais depara-se o Dt. Internacional.

Em conexão com a mundialização do Dt. Internacional, observa-se o fenómeno do regionalismo.

O Direito Internacional tende à universalidade em diferenças zonas geográficos, continentes ou subcontinentais. A própria Carta das Nações Unidas prevê «acordos regionais» (arts. 52.º, 53.º e 54.º.)

O Dt. Internacional regional mais antigo vem a ser o Direito interamericano, de base mais consuetudinária do que convencional. Mas não é o único. Outros Direitos internacionais particulares emergem, em correspondência com grandes organizações políticas e económicas regionais, desde a Europa à Ásia.

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Podemos separar o Direito Internacional geral e o Direito Internacional convencional. Até há pouco mais de cinquenta anos só através do costume e dos princípios gerais de direito Internacional poderia haver um conjunto de normas obrigatórias para todos os Estados. Ao invés, por meio de tratado não poderia ser criado direito obrigatório senão para certos sujeitos.

Hoje temos de olhar a outros dados. O Costume tem sido, predominantemente, geral, também têm existido em todas as épocas importantíssimos costumes regionais.

O crescente peso das normas provenientes de organizações internacionais justificaria, aliás, uma divisão tricotómica:

- Direito geral ou comum.

- Direito Internacional convencional.

- Direito interno das organizações internacionais.

Do mesmo modo esse relevo das organizações internacionais levaria a contrapor um Dt. Internacional relacional e um Dt. Interno institucional.

Poder-se-á então falar em Dt. Internacional fundamental ou constitucional, em direito estruturante das relações internacionais e da própria comunidade internacional; num conjunto de normas definidoras da posição jurídica dos sujeitos de tais relações e do quadro em que elas se desenvolvem; num conjunto de normas de vária origem, mas de função nuclear, e algumas das quais possuem um valor superior ao de todas as demais.

Direito Internacional geral – cobre o Dt. Internacional fundamental, e todas as normas de carácter geral.

Direito internacional especial – subdivide-se em diversos sectores. Por exemplo sectores afins do direito estatal: Dt. Internacional Penal.

Fundamento do Dt. Internacional Hobbes – negava-lhe carácter jurídico.

O positivismo tende a definir o Direito através da estadualidade e da coercibilidade; e dele não se fasta. Não havendo na ordem internacional «nem legislador, nem juiz, nem policia o direito internacional ou não seria verdadeiro direito ou , a sê-lo, não passaria de um direito estatal externo.

No séc. XX prevalecem na doutrina as posições não voluntaristas, as teses que explicam a obrigatoriedade jurídica ou a necessidade de cumprimento das normas de Direito Internacional à margem ou para além da vontade estatal.

Entre estas teses:

- Teses normativistas – reconduzem o sistema de Direito internacional não à vontade, mas a uma norma. - Teses solidarista – fundamentam o Direito internacional na solidariedade entre os indivíduos.

- Teses institucionalistas –

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O Direito Internacional faz parte do universo jurídico o mesmo fundamento e a mesma razão de ser do restante Direito. Apresentando, por certo, características específicas, nem por isso deixa de conter aquilo que de essencial assinala o Direito: a estrutura normativa necessária duma sociedade ou de certo tipo de convivência entre as pessoas humanas.

Existe uma pluralidade de ordenamentos em cada um, o Direito assume expressões peculiares, dependentes de factores culturais, políticos e económicos.

Por que motivo se obedece a qualquer norma jurídica? Para além da reciprocidade de interesses, para além do temor ou não de sanções, o que determina a obediência é o sentido racional e ético, mais ou menos conscientemente assumido, da pertença a um grupo, a uma comunidade, a um sistema de relações. O destinatário da norma é livre de cumprir ou não, mas a norma que se lhe dirige não tem por base a sua vontade; funda-se em princípios objectivos de ordem que o transcendem ou num sentido de bem comum.

Quanto à lei, ela não pode ser decretada em Direito Internacional, seguro é que há sucedâneos ou aproximações: o tratado multilateral geral e, em certos casos, a decisão de organização internacional ou de entidade afim.

Quanto a tribunais, afora os arbitrais, refiram-se o TIJ, o Tribunal Europeu e Interamericano de Direitos do Homem, os tribunais de administrativos da ONU, o Tribunal Internacional do direito do Mar.

Apenas de polícia e exército permanente não dispõe a comunidade internacional. Mas a carta das Nações Unidas prevê (no capítulo VII) medidas coercivas, e até sanções de carácter militar (arts. 42.º e 43.º)

Direito Internacional público e Direito Internacional privado

DIPúblico – está patente uma vida internacional que vale por si mesma, que se manifesta em determinados processos de formação de normas e que se liga a formas relacionais e institucionais específicas.

DIPrivado – em princípio não se afasta o Direito interno de cada estado: há situações jurídicas que estão em conexão com mais do um ordenamento jurídico, mas é o ordenamento jurídico correspondente a este ou àquele Estado que vai decidir qual o Direito aplicável para resolver o conflito de leis, decretando ele mesmo normas para esse fim. Este só é internacional pelas implicações na circulação internacional das pessoas, dos negócios jurídicos e dos bens.

Capitulo II – FONTES DE DIREITO INTERNACIONAL 1 – Aspectos gerais

O art. 38.º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça

O conceito de fontes é em geral plurívoco, com vários sentidos. O próprio art. 38.º do estatuto do Tribunal Internacional de Justiça, ponto de referência habitual no tratamento da matéria, joga com várias acepções do termo.

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Esta disposição não prejudicará a faculdade de o tribunal, se as partes estiverem de acordo, decidir «ex aequo de bono».

Facilmente se observa que, na fórmula adoptada, dir-se-ia feita a distinção entre fontes primárias ou principais e fontes secundárias ou auxiliares (as primeiras seriam convenções, o costume e os princípios gerais do Direito, as segundas a jurisprudência e a doutrina); e que se confundem modos de produção ou de revelação do Direito (convenções e costume) e normas jurídicas (princípios).

É corrente sustentar que haveria aí, de uma banda, fontes formais e, de outro, fontes materiais. O que importaria distinguir seria, sim, entre fontes de Direito e normas de Direito criado ou revelado através de determinados modos, processos e instrumentos.

- O art. 38.º não contém uma enumeração exaustiva das fontes, apenas uma enumeração exemplificativa e que, feita em certa época, tem de ser submetida a uma interpretação actualista. Este art. não esgota os modos de produção ou de revelação existentes, nem pode impedir futuras mutações de Direito internacional. Basta lembrar as decisões das organizações internacionais; para a orientação dominante entre autores, os actos jurídicos unilaterais dos estados, vindos já do DI clássico, e actos dos quais decorrem consequências nas relações entre sujeitos de DI.

- Não pode inferir-se dele uma hierarquia das fontes ou das normas de Direito internacional. A ordem de enumeração não traduz qualquer supremacia da convenção sobre o costume e deste sobre os princípios gerais de Direito. Se tivesse de haver hierarquia (que na realidade não há) teria de ser inversa.

Desde já vejamos estas fórmulas:

- Na alínea a) do n.º1 refere-se a «convenções internacionais, gerais ou especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados». Algumas notas críticas se oferecem: 1.º não se apercebem a razão e o critério de distinção entre convenções gerais e convenções especiais; 2.º as regras convencionais não são reconhecidas, mas sim estabelecidas pelas partes; 3.º a referência a regras expressas poderia limitar o alcance da interpretação.

- Quanto ao costume internacional, ele é definido como «prova de uma prática geral aceite como de direito». Nessa noção muito menos parece de acolher, porque: 1.º o costume não é prova de uma prática, mas sim o sentido ou a orientação de uma prática; 2.º não se descortina o que seja «uma prática geral»

- Os princípios gerais de Direito dizem-se reconhecidos pelas «nações civilizadas» - o que pressupõe nações não civilizadas. Trata-se, desde já, de Estados e não de Nações. Por outro lado os princípios constam de normas consuetudinárias e convencionais.

- Na alínea d) lê-se: «o Tribunal aplicará sob reserva do art. 59.º, as decisões judiciais». E parece algo contraditório: por um lado, este art. 59.º diz que as decisões do tribunal não obrigam senão as partes entre si e relativamente ao litígio em concreto; por outro lado, inculca-se que o tribunal aplica as decisões na resolução de futuros casos. Não pode ser só isso; só podem estar em causa orientações jurisprudenciais.

- Ainda nesta alínea d), na 2.º parte, colocam-se em pé de igualdade a jurisprudência e a doutrina.

- Finalmente, acrescenta-se no n.º 2 que o disposto no n.º1 «não prejudicará a faculdade do Tribunal, se as partes estiverem de acordo, de decidir ex aequo et bono». Trata-se de uma referência à equidade, que, contudo, não é em si uma fonte de Direito; é, antes, um modo de aplicar o sentimento ideal de justiça aos casos concretos, um critério de decisão.

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O sistema das fontes

O costume, o tratado e a decisão de organização internacional são fontes formais que se recortam hoje com nitidez. A elas acresce a jurisprudência, com um papel mais reduzido, conquanto de modo algum insignificante quer pela sua intervenção insubstituível na interpretação e na integração das normas preexistentes, quer pelo seu eventual contributo para a formação de um tipo de costume – o costume jurisprudencial.

Estas quatro categorias de fontes surgem em abstracto com suficiente autonomia, em concreto, são interdependentes e as normas através delas criadas entrelaçam-se sistematicamente, sem prejuízo da consideração de zonas diferenciadas.

A interdependência das fontes aponta para a precedência do costume: - A jurisprudência, por natureza, pressupõe norma jurídica anterior.

- A decisão de qualquer organização internacional repousa na competência de um ou vários órgãos e reveste a eficácia que se encontre prevista no respectivo tratado constitutivo.

- Mas o processo de conclusão dos tratados, bem como os demais aspectos do seu regime, assentavam até à convenção de Viena de 1969 em normas consuetudinárias; e ainda hoje assentam em tais normas, no tocante aos Estados, como Portugal, que até agora não a ratificaram.

Não se inculca com isto que a razão da obrigatoriedade de todas as normas internacionais deva ser procurada no costume: ela tem de se firmar, como atrás se disse, em princípios objectivos.

O costume internacional

O costume tem em Direito Internacional um papel bem maior do que aquele que tem no domínio do Direito interno.

A ausência de uma autoridade central, a nível mundial, explica-o, em parte. Ainda hoje há matérias importantíssimas que continuam reguladas principalmente ou quase só por costume, como responsabilidade internacional e as imunidades dos Estados. O caminho para a institucionalização não impede a formação de normas consuetudinárias.

O costume internacional não resulta só da prática dos estados nas suas relações bilaterais ou multilaterais. Resulta também da prática que se desenvolva no interior das organizações internacionais.

Um caso paradigmático de costume nestas circunstâncias a que vale a pena aludir, desde já, é o respeitante ao direito de veto dos membros permanentes do Conselho de Segurança.

De harmonia com o art. 27.º, n.º3 da Carta das nações Unidas, as deliberações do Conselho de Segurança em questões não processuais são tomadas com votos afirmativos de nove membros. À letra, isto significaria que tanto o voto contrário como a abstenção equivaleriam a veto. No entanto, desde há muito que se verifica não ser a tomada de abstenção neste sentido.

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- Olhando ao seu âmbito ou aos destinatários, contrapõe costume geral (obriga todos os Estados) ou universal e costume particular (aplicável apenas a certo continente).

- Costume local, quase sempre bilateral, relativo a uma área geográfica circunscrita, como foi o costume consagrador do direito de passagem de autoridades civis portuguesas entre Damão e os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli.

Quanto ao fundamento do costume:

- Posição antiga, ligada à doutrina da soberania, tendia a reconduzir o costume ainda à vontade. O costume seria um pacto tácito: não manifestada a sua vontade em contrário, os Estados ou os sujeitos de Direito Internacional em geral estariam adstritos a cumprir os deveres decorrentes de normas consuetudinárias (Grócio).

- Jorge Miranda – o costume internacional decompõe-se num elemento material – o uso – e num elemento psicológico – a convicção de obrigatoriedade.

O uso exige tempo e repetição de comportamentos de diversa natureza (actos diplomáticos, actos de execução de tratados).

A convicção de obrigatoriedade reporta-se não a qualquer psicologia colectiva, mas à interpretação funcional e normativa da vontade manifestada por sujeitos de Direito Internacional ou pelos seus órgãos; e depreende-se, antes de mais, da consideração objectiva dos actos praticados ou deixados de praticar por esses sujeitos.

As normas jurídicas de origem consuetudinária e as de origem convencional possuem o mesmo valor jurídico e deve admitir-se, à partida, a possibilidade de recíproca modificação ou revogação.

Em contrapartida, as normas consuetudinárias encontram-se, também elas, subordinadas ao jus cogens e com este não se confundem, mesmo as de costume universal, visto que: 1.º o jus cogens não pode ser modificado ou afectado por normas consuetudinárias; 2.º o costume postula sempre a prática, o jus cogens impõe-se ainda quando não haja nenhuma prática, seja no sentido do seu cumprimento, seja noutro sentido.

Os actos das organizações internacionais

Há muitos tipos de actos ou decisões de organizações internacionais: - Actos de eficácia externa e actos de mera eficácia interna.

- Actos políticos, actos jurisdicionais e actos administrativos. - Actos normativos e não normativos.

Das decisões, enquanto actos vinculativos ou imperativos, distinguem-se as recomendações e os pareceres. Só os actos normativos, sejam de eficácia interna, sejam de eficácia externa, são fontes de Direito Internacional. Os estatutos, cartas ou constituições de organizações internacionais são-no naturalmente, também, mas reconduzem-se a tratados; não têm autonomia.

No âmbito das nações unidas, são decisões gerais e abstractas as de afirmação ou reafirmação de princípios ou regras de Direito Internacional, e decisões gerais e concretas, as da Assembleia Geral sobre matérias financeiras (art.

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17.º da carta) e sobretudo, as do Conselho de Segurança sobre a manutenção da paz e da segurança internacional (arts. 39.º e segs.)

No âmbito de organizações especializadas da «família» das N.U. são decisões normativas os padrões internacionais de aviação civil estabelecidos pelo Conselho da Organização de Aviação Civil Internacional.

As mais importantes de todas as decisões normativas são as que emanam dos órgãos das Comunidades europeias (Dt. comunitário derivado). O art. 249.º do Tratado da Comunidade Europeia dá nos o panorama.

a.

O regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-membros.

b.

A directiva vincula o estado-membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios.

c.

A decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que ela designar.

d.

As recomendações e os pareceres não são vinculativos.

A jurisprudência

Importa considerar tanto as decisões de tribunais internacionais, arbitrais e judiciais, como as decisões de tribunais existentes na esfera interna dos Estados, na medida em que estes tribunais aplicam directamente o Direito Internacional.

Os arts. 38.º e 59.º do estatuto do Tribunal Internacional de Justiça não atribuem às decisões deste órgão efeitos erga omnes nem é adoptada, na prática, a regra do precedente.

O papel dos tribunais internos varia de acordo com os sistemas jurídicos respectivos e com as formas de Estado. Tem-se revelado significativo em problemas como os concernentes ao reconhecimento de Estado ou de Governo, à sucessão de Estados, às imunidades diplomáticas, à extradição e à cidadania.

Os actos jurídicos unilaterais

Os únicos actos jurídicos unilaterais que cabem no âmbito das fontes de Dt. Internacional são os actos normativos de organizações internacionais, as decisões de conteúdo geral e abstracto ou de conteúdo geral e concreto dos seus órgãos.

As decisões não normativas dessas organizações e os clássicos actos jurídicos unilaterais dos estados porque não assumem tal conteúdo, não devem ser integrados nessa categoria.

A grande contraposição dá-se entre actos unilaterais autónomos e actos unilaterais não autónomos, ou seja, entra actos que aparecem à margem de quaisquer outros actos, válidos e eficazes por si e actos que se inserem em processos ou procedimentos de formação de outros ou que decorrem directa imediatamente de outros actos.

Os primeiros são o reconhecimento, o protesto, a notificação, a promessa e a renúncia. Entre os segundos, contam-se a assinatura, a ratificação, a adesão, as reservas, a aceitação, a objecção e a revogação de reservas, a denúncia, etc.

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Os primeiros tanto produzem efeitos directos e imediatos nas relações com outros sujeitos como efeitos enquanto se inserem na prática dos Estados e contribuem para a formação ou para a revelação de costume internacional.

- Reconhecimento – declaração unilateral de um estado pela qual considera que certo facto ou certa situação está em conformidade com as regras jurídicas ou satisfaz os requisitos por elas prescritos.

- Protesto – declaração de sentido contrário, a declaração segundo a qual certo facto ou certa situação não respeita o Dt. Internacional.

- Notificação – declaração relativa a certo facto ou certa situação, presente ou futura, levada ao conhecimento de outro sujeito de Dt. Internacional.

- Promessa – declaração unilateral de vontade pela qual certo sujeito compromete a agir ou não de certo modo. - Renúncia – acto jurídico unilateral pelo qual certo sujeito declara não exercer ou, eventualmente mesmo, quer deixar na sua esfera jurídica certo direito.

Os actos jurídicos unilaterais autónomos ou principais apresentam as seguintes característica comuns:

a.

Provêm de um só sujeito de Direito internacional.

b. Expressão da própria capacidade internacional dos sujeitos, são também expressão de autovinculação de acordo com o princípio da boa fé e, por conseguinte, irrevogáveis logo que se tornam definitivos. c. Não estão dependentes de nenhum requisito formal – designadamente, não têm de revestir forma escrita e não estão sujeitos ao ónus de registo junto do Secretário-Geral das Nações Unidas.

A codificação do direito internacional

Nas últimas décadas tem-se assistido a um movimento dito de codificação, tendente a substituir, gradualmente, o conhecimento das normas de Dt. Internacional consuetudinário através da observação da prática pela sua incorporação em grandes textos sob a forma de convenção.

Obedece a uma finalidade de certeza e segurança jurídicas. Tem também uma finalidade política: propiciar uma intervenção dos estados que não participaram na formação de muitas das suas normas consuetudinárias.

A passagem das normas a escrito não afecta o seu carácter consuetudinário. E tanto é assim que os novos Estados ficam automaticamente vinculados a essas normas; e Estados que não sejam partes em convenções de codificação continuam vinculados às normas preexistentes doravante nelas inscritas.

2 – Os Tratados Noção de tratado

Por tratado (artigo. 2º, n.º 1, al. A) da Convenção de Viena) ou convenção internacional entende-se um acordo de vontades entre sujeitos de Dt. Internacional constitutivo de direitos e deveres ou de outros efeitos nas relações entre eles. Contudo, só quando estes efeitos consistirem na criação ou modificação de normas, estaremos perante um tratado fonte de direito internacional. Este conceito envolve:

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- Um acordo de vontades.

- A necessidade das partes serem todas sujeitos de direito internacional e de agirem nessa qualidade. - A regulamentação pelo Dt. Internacional.

- A produção de efeitos com relevância nas relações internacionais. O conceito não implica:

- Que as partes sejam Estados como os previstos no art. 43.º da Carta das nações Unidas. - Que o acordo seja reduzido a escrito.

- Que sendo escrito o acordo se reduza a um único instrumento.

Distinção de realidades afins

Dos tratados internacionais distinguem-se:

- Os feixes de actos unilaterais – emitidos simultaneamente por diferentes Estados com conteúdo idêntico, sob forma de declaração.

- Os acordos estritamente políticos (em si sem produzir efeitos jurídicos, mas a que se sucedem verdadeiros tratados).

- Os acordos informais ou gentlemen’s agreements (não imediatamente vinculativos a nível jurídico). - Os comunicados de reuniões e conferências diplomáticas.

Terminologia

O termo geral que tanto a prática internacional como a doutrina adoptaram é tratado, mas também se fala em convenção. No direito interno português os dois termos reportam-se a amplitudes diferentes.

Numerosos tratados, considerados especificamente recebem designações diferentes:

- Carta, Constituição ou Tratado Constitutivo de um Organização; pacto ou tratado militar; concordata ou tratado entre a Santa Sé e o Estado; acto final ou tratado conclusivo de uma conferência, convenção técnica ou tratado sobre matérias especializadas de carácter técnico.

Classificações

1)

Tratados normativos ou tratados-leis e tratados não normativos ou tratados-contratos. No primeiro estabelece-se comandos de carácter geral e abstracto ou geral e concreto. No segundo estipula-se prestações recíprocas e os tratados esgotam-se com a sua realização.

2)

Tratados bilaterais e tratados multilaterais. Os primeiros só com duas partes em que se entremostra a reciprocidade dos interesses, os segundos com uma pluralidade de partes em que avultam interesses comuns. Estes podem ser restritos ou gerais (aqui há uma tendencial coincidência com a totalidade dos Estados com acesso à comunidade internacional).

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3)

Tratados solenes e tratados não solenes. Os primeiros exigem o acto de ratificação. Os segundo o processo termina quando à aprovação ou em alguns casos assinatura. Dentro dos segundos, as convenções simplificadas pode-se distinguir acordos em forma simplificada e acordos em forma ultra-simplificada. Os últimos caracterizam-se por a vinculação ocorrer não aquando da ratificação ou aprovação, mas aquando da assinatura e dispensam quer a ratificação que a própria assinatura.

4)

Tratados abertos e tratados fechados. Os primeiros admitem e os segundos não, a assinatura, a ratificação ou a adesão de sujeitos que não participaram originariamente da celebração ou da entrada em vigor. Por definição os tratados multilaterais gerais são tratados abertos.

5)

Tratados institucionais e tratados não institucionais. Conforme crie ou não uma organização internacional e entidades afins.

6)

Tratados exequíveis por si mesmo e tratados não exequíveis por si mesmo. Consoante obtêm plena efectividade só por si ou carecem de outro tratado ou lei de complementação.

7)

Tratados perpétuos e tratados temporários. Consoante sejam de duração indefinida ou de duração sujeita a termo final.

8)

Tratados principais e tratados acessórios. Sendo estes tratados subsequentes aos primeiros, destes dependentes e destinados a conferir-lhe concretização.

9)

Tratados públicos e tratados secretos. Conforme o conhecimento do seu conteúdo seja revelado ou fique reservado a quem interveio na sua conclusão.

Limites à liberdade convencional

Os tratados pressupõem liberdade não só de celebração mas também de estipulação das partes contratantes. Todavia essa liberdade não é completa e tem vindo a reduzir-se. Acha-se sujeita a limites, uns de Dt. interno e outros de direitos internacional. Limites de direito internos que procedem de cada Estado. Limites de direito internacional são:

- Princípios de jus cogens. - Derivados de tratados principais.

- Derivados de tratados constitutivos de organizações internacionais. - Decorrentes de normas emanadas de organizações internacionais. De salientar art. 103.º da Carta das Nações Unidas.

A regulamentação das formas de vinculação interna dos Estados

A regulamentação das formas de vinculação internacional tem carácter misto; consta tanto de normas de direito internacional como de normas de direito interno. Em princípio deveriam ser normas internacionais a disciplinar o processo de conclusão de tratados. Todavia afora algumas regras da Convenção de Viena sobre o dt dos tratados é principalmente o direito interno que regula, por razões de deficiente estrutura ou institucionalização e por haver uma grande variedade de regimes e sistemas de governo.

(15)

O processo e as formas de vinculação

As fases clássicas do processo ou procedimento de vinculação internacional dos estados eram três: - Negociação.

- Assinatura. - Ratificação.

No actual direito internacional contemporâneo a tripartição é diferente: - Negociação (com a assinatura).

- Aprovação. - Ratificação.

Enquanto no Dt. Internacional Clássico a conclusão dos tratados solenes abrangia sempre o mesmo iter processual, hoje nos tratados não se verifica isso: tem de haver necessariamente negociação mas nem sempre ocorre ratificação ou aprovação (artigo. 11º CV).

Nas monarquias absolutas a concentração de poder político também se traduzia na concentração de fases de processo. No constitucionalismo assente no princípio da separação de poderes, cada fase possui um significado especial e procura-se a interdependência dos vários órgãos na formação da vontade do Estado.

A negociação e a assinatura

A negociação de qualquer tratado cabe a cada Estado, às pessoas investidas de plenos poderes como seus representantes, mas a representação do Estado pode resultar da prática dos Estados interessados ou de outras circunstâncias (artigo. 7º, n.º 1 CV). São considerados representantes do Estado – artigo. 7º, n.º 2 CV. Um acto relativo à conclusão de um tratado praticado por pessoas que não possam ser consideradas autorizadas a representar o Estado não produz efeitos jurídicos a não ser que seja ulteriormente confirmado pelo Estado (artigo. 8º CV). A adopção do texto do tratado efectiva-se através do consentimento de todos os Estados que participam na sua elaboração (art. 9.º, n.º1 CV). Realizando-se uma conferência internacional com essa finalidade, efectua-se pela maioria de dois terços dos Estados presentes e votantes a não ser que os Estados decidam, pela mesma maioria, aplicar regra diversa (artigo. 9º, n.º 2 CV). Á adopção segue-se a autenticação do texto – assinatura ad referendum (art. 10.º). A assinatura não é formalidade requerida pela convenção para todos os casos. Há tratados abertos que prevêem assinatura diferida.

Fixado o Texto, os Estados-partes ficam adstritos por imperativos de boa-fé a abster-se de actos que privem o tratado do seu objecto ou do seu fim (art. 18º CV).

Aprovação e ratificação

Tirando os tratados sob forma ultra-simplificada, todos os tratados requerem aprovação pelo órgão interno competente. Pelo contrário, nem todos requerem ratificação. A ratificação nunca é um acto obrigatório para quem tenha de a emitir. É sempre um acto livre.

Nos sistemas representativos os efeitos da ratificação apenas podem produzir-se pelo futuro. Na monarquia absoluta os efeitos retroagiam ao momento da assinatura.

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Os órgãos internos competentes

Para além do que disponha qualquer tratado em concreto (art. 14.º) é o direito interno de cada Estado que estabelece qual a forma - solene ou simplificada - que os tratados podem ou não assumir; e é todo ele que determina quais os órgãos competentes para a vinculação internacional. São os órgãos do poder executivo e P.R. Quanto à ratificação, ela compete ao chefe de Estado.

Em sistema de governo com concentração de poder, predomina na aprovação o próprio órgão que negoceia e assina, e em sistema de governo com desconcentração de poder, dá-se uma separação ou divisão entre o órgão de negociação e assinatura e o órgão de aprovação.

Violação das regras constitucionais sobre conclusão dos Tratados

Quais as consequências de violação de regras de Dt. Interno à composição e à forma de conclusão de tratados? Equivale essa violação a um vício de que determina invalidade?

Art. 46.º Convenção de Viena – contemplou o problema estabelecendo uma solução intermédia e equilibrada; o chamado protocolo das ratificações imperfeitas. São dois os requisitos de invocabilidade:

1.º - Que se tenha infringido uma regra interna de importância de fundo. 2.º - Que a violação seja manifesta.

Subjacente as regras estão o princípio da boa fé e as exigências de segurança jurídica.

Reservas (art. 2º, al. d) CV)

Em princípio, as partes num tratado obrigam-se à totalidade das suas cláusulas. A vinculação apenas a algumas delas só se torna possível se o tratado o permite ou se as outras partes o consentem (artigo 18 CV). Todavia nos tratados multilaterais – não nos bilaterais – podem ser admitidas reservas.

Por reserva entende-se uma declaração unilateral seja qual for o seu conteúdo ou designação feita por um estado quando assina ratifica aceita ou aprova um tratado ou a ele adere, pela qual visa excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado na sua aplicação a este Estado (artigo 2º/1, al. d) CV). Desta figura distinguem-se:

- As rectificações do texto. - As declarações interpretativas.

- As disposições transitórias e as cláusulas de exclusão.

A emissão de reserva está sujeita a limites materiais, temporais e formais.

a) Os limites materiais podem ser expressos – proibição de reservas pelo Tratado – e tácitas (artigo 19º, al. a), b) e c) CV)– incompatibilidade da reserva com o objecto ou o fim do Tratado. Há tratados que não consentem reservas: Carta das nações Unidas, Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça.

b)

Os limites temporais traduzem-se na exigência de a reserva coincidir com qualquer fase do processo de vinculação ao Tratado, não depois: a reserva tem de ser formulada no momento da assinatura, da ratificação, da aceitação (artigo 19º CV).

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c) Os limites formais consistem na necessidade de reserva ser formulada por escrito e comunicada aos Estados (artigo. 23º CV).

Para que a reserva produza efeito é necessário que pelo menos outro estado a tenha aceita – art. 20.º, n.º4. Contudo, nem sempre é assim:

- Quando resulte do número restrito de estados que a sua aplicação na íntegra entre todos as partes é condição essencial para o consentimento de cada um a vincular-se (art. 20.º, n.º2).

- Quando o tratado é um acto constitutivo de uma organização internacional, essa reserva exige a aceitação do órgão competente dessa organização (art. 20.º, n.º3).

A aceitação da reserva pode ser tácita (artigo. 20º, n.º 5 CV). As reservas podem ser revogadas – mas não modificadas – a todo o tempo (art. 22.º, n.º1). E também a objecção a uma reserva pode em qualquer momento ser revogada (art. 22.º, n.º2). Já não a aceitação. A nível interno dos Estados a competência para emitir e para revogar reservas ou para aceitar ou objectar a reservas depende das normas constitucionais relativas à aprovação de tratados.

O depósito dos tratados

Nos tratados multilaterais existe o instituto do depósito, também previsto na CV (artigo. 76º e 77º).

O Registo e a Publicação

A CV vem impor o registo relativamente a todos e quaisquer tratados, sejam ou não parte das Nações Unidas (artigo 80º). Contudo, a mesma não determina a consequência jurídica da falta de registo.

Efeitos do Tratado perante terceiros

O postulado básico é o da relatividade: um tratado não constitui nem direitos, nem deveres para os estados que não seja parte, a não ser com o seu consentimento (art. 34.º). No caso de deveres é necessário que o terceiro os aceite expressamente por escrito (art. 35.º). No caso de direitos presume-se o consentimento enquanto não haja indicações em contrário, ao menos que o Tratado disponha diversamente (artigo. 36º). Os tratamentos abertos são, por definição tratados que conferem direitos a terceiros. Constituído o dever ou o direito a sua modificação ou revogação depende do consentimento das partes e do terceiro Estado, salvo se se puder concluir ou se tiver estabelecido diversamente (artigo. 37º).

Todos os estados devem respeitar os Tratados concluídos por outros estados e não interferir na sua execução.

Entrada em vigor

Qualquer Tratado entra em vigor segundo as modalidades e nas datas fixados pelas suas disposições ou convencionados por acordo dos Estados que tenham participado na negociações (art. 24.º, n.º1). Na falta de disposição

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no tratado ou de acordo, o Tratado entra em vigor logo que o consentimento a ficar por ele vinculado seja manifestado por todos os estados que tenham participado na negociação (art. 24.º, n.º2). As cláusulas dos tratados não têm aplicação retroactiva (artigo. 28º CV).

Modificação dos Tratados

Antes de 1945 qualquer Tratado só poderia ser modificado de acordo com a vontade de todos os estados que o tivessem estipulado. Porém quando as relações internacionais se tornam cada vez mais multilaterais e quando tendem a institucionalizar-se, exigir o acordo de todos as partes seria criar uma excessiva rigidez. Daí vir-se a admitir a possibilidade de modificação de Tratados multilaterais, não por unanimidade, mas por maiorias agravadas. Por outro lado, há Tratados que se declaram insusceptíveis de revisão durante o tempo. Na Convenção de Viena consagram-se duas regras procedimentais básicas:

- Acordo entre as partes (art. 39.º).

- Possibilidade de cada Tratado regular as suas próprias modificações (art. 39.º, segunda parte, e 40.º) donde o carácter supletivo das normas da convenção.

O procedimento de revisão dos Tratados multilaterais é mais complexo do que os bilaterais (art. 40.º).

Limites materiais de revisão dos tratados

Há limites de carácter geral à estipulação originária – relevo para o jus cogens e para os tratados constitutivos de organizações ou outras entidades internacionais. Não é apenas a propósito do tratado da União Europeia ou Convenção do Direito do Mar que pode falar-se em limites materiais de revisão. Pode igualmente falar-se a propósito de outros. Em terceiro lugar, nem sequer se afigura tão ousado quanto pareceria prima face divisar limites materiais de revisão.

Cessação de vigência - Cessação por vontade das partes:

- Ab-rogação – art. 54.º, alínea b) da Convenção de Viena. - Celebração de Tratado ulterior sobre a mesma matéria – 59.º. - Cessação por caducidade:

- Decurso do prazo de vigência do Tratado. - Execução do próprio Tratado.

- Alteração fundamental de circunstâncias ou cláusula rebus sic stantibus (art. 62.º). - Impossibilidade superveniente de execução (art. 61.º)

A estas causas acrescem quando estejam em causa, tratados bilaterais: - Denúncia – art. 56.º - tem de estar previsto no próprio Tratado. - Inexecução do Tratado por uma das partes.

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Em Tratados multilaterais a denúncia assume forma de recesso. A denúncia funda-se na vontade expressa, tácita ou conjectural das partes; e tanto pode ter por causa a alteração de circunstâncias como a não ter; pelo contrário a cláusula rebus sic stantibus decorre de um princípio geral de Direito, conjugada com o facto jurídico strictu Sensu.

Validade e invalidade dos Tratados

A principal linha de força do actual Direito dos tratados é a salvaguarda da subsistência dos tratados. Daí resultam quatro regras básicas:

- A validade de um Tratado só pode ser contestada por aplicação da convenção de Viena (art. 42.º, n.º1).

- A nulidade de um Tratado não afecta o dever do estado de cumprir todas as obrigações constantes do Tratado (artigo 43º).

- Uma causa de nulidade de um Tratado somente pode ser invocada em relação ao conjunto do Tratado (art. 44.º, n.º2).

- Um Estado não pode alegar uma causa de nulidade de um Tratado quando depois de haver tomado conhecimento dos factos esse Estado tiver aceitado considerar que ele era válido (art. 45.º).

O regime de invalidade dos tratados assenta na distinção entre violação de regras internas de composição, vícios de consentimento ou na formação da vontade interna e desconformidade material.

Vícios de conssentimento (erro, dolo, coacção)

As disposições de um tratado nulo não têm força jurídica (artigo 69º, n.º 1 da CV).

A CV regula o processo de arguição das causas de invalidade (artigo 65º) e contempla a solução de eventuais diferendos então emergentes, através do Tribunal. Internacional de Justiça, de arbitragem e da conciliação (artigo 66º).

3 – A conclusão dos tratados em Portugal As formas dos Tratados ou convenções perante o direito português

Perante o Dt. Constitucional português encontram-se 2 formas de tratados: tratados solenes e tratados de forma simplificada. A terminologia constitucional portuguesa:

- Convenções são quaisquer tratados.

- Tratados que são os tratados solenes submetidos a ratificação.

- Acordos internacionais são acordos em forma simplificada, apenas carecidos de aprovação e não ratificação. A relevância constitucional entre tratados e acordos é a seguinte:

A vinculação dos estados dá-se com a ratificação nos tratados e com a aprovação nos acordos 8art 8º, n.º 2). Os tratados são todos sujeitos a aprovação do Parlamento (artigo 161º, al. i) 1ª parte); os acordos tanto podem ser aprovados pela AR. (artigo 161º al. i) 1ª parte) como pelo Governo (artigo 197º, n.º 1). Por outro lado, há fiscalização

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preventiva da constitucionalidade de uns e outros embora com efeitos diferentes: em caso de pronúncia de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional ainda poderá haver ratificação do tratado se a AR. o aprovar por maioria de dois terços (279.º, n.º4). Porém. O PR não poderá assinar o decreto ou a resolução de aprovação do acordo (artigo 279º, n.º 1 e 2). Só questões objectos de tratado, não de acordo, podem ser submetidas a referendo (artigo 115º, n.º 3). O PR intervém nos tratados através de ratificação (artigo 135º, al. b)) e nos acordos através da assinatura dos decretos ou das soluções de aprovação (artigo 134º, al. b)).

O Direito Português exclui Tratados em forma ultra-simplificada (as únicas formas de vinculação são as previstas no art. 8.º, n.º2; o P.R. representa o estado – art. 123.º - logo não faz sentido que ele fique afastado da vinculação externa).

Isto não obsta a que existam acordos de troca de notas, desde que submetidos a aprovação e, mesmo a ratificação (Portugal e Chipre relativo à supressão de vistos).

Distinção material entre tratados (solenes) e acordos (em forma simplificada)

O ponto de partida, dentro da nossa constituição é o art. 161.º, alínea i). Com este preceito – a conjugar com o art. 197.º, n.º1, alínea c), relativo ao Governo – visa-se assegurar a intervenção da AR nas convenções que assumam maior relevância na vida do país. Se ela é a Assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses (artigo 147º), lógico e necessário se torna que as Convenções internacionais que mais as possam afectar lhe sejam submetidas para apreciação e aprovação. Com a revisão constitucional de 1997 procura-se reforçar e alargar a competência internacional da AR. Não se poderia perfilhar um entendimento redutor da competência da AR para aprovar convenções internacionais. Quais as matérias de tratado segundo a CRP?

- Matérias referidas nominativamente no art. 161.º.

- Matérias especificamente contempladas em preceitos avulsos de reserva de convenção

- Matérias que envolvam decisão política relevante ou primária (a transferência da Macau para a China regulada pela declaração conjunta de 1987).

Dir-se-à que a Constituição permite a existência de referendos também no concernente a acordos internacionais e a referendos que incidem sobre questões de relevante interesse nacional a serem decididas no plano interno, por acto legislativo (art. 15.º, n.º3 e 5). Não cremos que seja assim. A referência a relevante interesse nacional significa que apenas questões que devam ser objecto de tratado e não de acordo em forma simplificado.

Mas preconizar uma divisão de tratados e acordos em razão da primariedade ou não primariedade das matérias, sabendo-se que a cargo da AR ficam certas categorias de acordos não redunda em fazer que esta se arrogue competências de natureza administrativa ou executiva. Em primeiro lugar a atribuição à AR do poder de aprovar acordos em forma simplificada representa medida cautelar de defesa da sua competência. Em segundo não têm de coincidir as competências na ordem interna e na ordem internacional. Em terceiro lugar a aprovação de tratados e acordos é uma faculdade política strictu sensu e de fiscalização.

Pode mesmo reconhecer-se um valor reforçado aos tratados em face dos acordos em forma simplificada, no âmbito do direito português. Um tratado não poderá ser afectado com efeitos na ordem interna, por um acordo em forma simplificada.

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A negociação e a assinatura

Nas CRP anteriores a negociação e a assinatura eram competências do Rei. Na CRP actual elas competem ao Governo (197.º, n.º1, alínea b)). O PM informa (artigo 201º, n.º 2, al. c) CRP) o PR acerca dos assuntos da política externa do país (artigo. 182º CRP). AR não participa na negociação. Dever de informação tem o Governo em relação aos partidos políticos (artigo 114º, n.º 3 CRP) e aos grupos parlamentares (artigo 180º, n.º 2, al. j) CRP).

Participação das regiões autónomas

Temos um novo elemento trazido pela actual CRP, em virtude da transformação do Estado português em Estado unitário regional, é a participação das RA nas negociações dos tratados e acordos internacionais – art. 227.º, n.º1, alínea t).

Tem de se tratar de tratados que respeitem a interesses predominantemente regionais ou cuja matéria tenha uma específica ligação ou implicação nestas.

O órgão regional que intervêm na negociação não pode deixar de ser o Governo Regional (ver o Estatuto dos Açores e da Madeira).

Aprovação

Regime actual de aprovação por força dos arts. 161.º, alínea i) e 197.º, alínea c) apresenta-se: - Aprovação de tratados – só pela AR.

- Aprovação dos acordos em forma simplificada sobre matérias da competência reservada à A.R. – também só à AR.

- Aprovação dos restantes acordos em forma simplificada – pelo Governo.

O procedimento e as formas de aprovação

O processo parlamentar de aprovação de tratados e acordos (art. 210.º e seg. do Regimento da A.R.) tem as seguintes fases:

- Iniciativa – reservada ao Governo (art. 210.º, n.º1).

- Apreciação pela comissão competente em razão da matéria (art. 210.º, n.º2), ou pelo Conselho Superior de Defesa Nacional.

- Discussão e votação – discussão no plenário na generalidade e na especialidade e só votação global final (art. 210.º). a maioria de aprovação é a maioria relativa (art. 116.º, n.º3).

Quanto aos acordos aprovados pelo Governo a CRP exige uma deliberação em Conselho de Ministros (art. 200.º, n.º1 alínea d), o que traduz uma ideia de fiscalização intra-orgânica e de responsabilização colectiva do governo.

Os actos de aprovação de convenções internacionais tomam a forma ou de resolução ou de decreto:

- Nos tratados aprovados pela AR – resolução (art. 166.º, n.º5) a qual é publicada independentemente de promulgação pelo PR (166.º, n.º6).

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- Nos acordos aprovados pela AR – resolução (art. 166.º, n.º5) submetida a assinatura (não a promulgação) do PR (art 134.º, alínea b)).

- Nos acordos aprovados pelo Governo – o decreto, o decreto simples (art. 197.º, n.º2), assinando, também não promulgando, pelo PR (art. 134.º, alínea b).

Referendo nacional e aprovação de Tratados

Num procedimento de conclusão de tratado pode inserir-se um referendo. E até por haver referendo mesmo que não esteja em curso nenhum procedimento de aprovação. Importa examinar de que maneira e com que efeitos. Traços substantivos do regime do referendo:

- As questões a decidir são questões objecto de tratado já negociado pelo Estado português. - Mas podem ser também questões relativas a tratado futuro.

- Cada referendo recai sobre uma só matéria, num número máximo de 3 perguntas (artigo 115º, n.º 6 CRP). - Através do referendo o povo não aprova o Tratado; decide, sim se o Parlamento deve ou não aprová-lo - Os seus resultados são vinculativos para o órgão competente.

- O carácter positivo do referendo impõe ao PR a ratificação.

- Afora isto a CRP não prevê qualquer forma de garantia dos resultados do referendo.

É a AR que pode propor referendos (artigo 161º, al. j) CRP) e é o PR que submete a fiscalização preventiva obrigatória (artigo 134º, al g) e 278º, n.º 1 CRP).

Fiscalização preventiva da constitucionalidade

Todos os Tratados e acordos internacionais são passíveis de fiscalização preventiva da constitucionalizasse pelo TC a requerimento do PR (artigo 278º, n.º 1 CRP): antes da ratificação no caso dos tratados e antes da assinatura no caso dos acordos em forma simplificada. A constituição não prevê, nem poderia prever o expurgo da norma considerada inconstitucional constante de tratado ou acordo internacional.

A ratificação dos Tratados

Ao PR compete ratificar os tratados depois de devidamente aprovados (art. 135.º, alínea b)). Compete-lhe também o acto homólogo da ratificação relativa à aceitação superveniente de um tratado solene – a adesão.

A ratificação (artigo 2º, n.º 1, al. b) da CV) consiste na declaração solene de vinculação do Estado. Pondo fim ao processo de conclusão do tratado, ela não interfere no seu conteúdo: o PR não pode formular reservas.

A ratificação é entendida como um acto livre é somente não o é quando tenha havido referendo.

Estará a ratificação sujeita a algum prazo? Parece difícil supor que o PR goze de liberdade total, neste âmbito, com implicações na condução da política externa do Estado. Isto vale também para a assinatura das resoluções e dos decretos de aprovação de acordos em forma simplificada. Podemos fazer analogia com o prazo de 20 dias (art. 136.º, n.º1). Talvez se justifique um prazo mais alargado (artigo 136º, n.º 4 CRP?).

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A referenda ministerial é obrigatória (artigo 140º CRP).

A assinatura dos actos de aprovação dos acordos

Questão controversa vem a ser a de saber se o PR pode recusar a assinatura do acto de aprovação de um acordo em forma simplificada. Durante muito tempo pronunciamo-nos pela resposta negativa porque apenas os actos sujeitos a promulgação estariam sujeitos a veto.

Mudamos de opinião por o PR poder suscitar a fiscalização preventiva de acordos e por mal se compreender que o PR não possa opor-se a acordos em forma simplificada quando pode opor-se a tratados solenes.

Competência e forma em caso de desvinculação

A desvinculação obedece a requisitos idênticos aos da vinculação (colaboração de diversos órgãos). Ainda que o acto de denúncia dirigida aos outros Estados-partes caiba ao Governo, deve entender-se que:

- Não pode o Governo denunciar nenhuma convenção sem o consentimento do PR.

- Estando em causa um tratado ou um acordo que verse sobre matérias reservadas à AR, a decisão de desvinculação tem de ser por ele aprovada (sob forma de resolução).

A publicação

Todas as convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas, para vigorarem na ordem interna, têm de ser publicadas (art. 8.º, n.º2 da CRP) no jornal oficial – 119.º, n.º1, alínea b).

Carecem igualmente de publicação os avisos de ratificação e os restantes avisos respeitantes a convenções internacionais (art. 119.º, n.º1, alínea b)

Mas a publicação se é elemento necessário não é condição suficiente para a vigência, é necessário que vigore na ordem internacional (artigo 8º, n.º 2 CRP).

Capítulo III – AS NORMAS DE DIREITO INTERNACIONAL 1 – Regras e princípios

Os princípios gerais de direito internacional

O Direito Internacional não se reduz a um conglomerado de normas avulsas, compreende regras e princípios e apenas os princípios que permitem integrar as regras num todo sistemático.

Os princípios fazem parte do complexo ordenamental, são também eles direito, e exercem uma acção imediata, enquanto directamente conformadores de soluções concretas (basta pensarmos no art. 38.º do Estatuto do Tribunal Internacional).

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O

Jus cogens

Dentre os princípios de Dt. Internacional geral ou comum avultam aqueles a que a doutrina tem chamado princípios de jus cogens (à letra de direito cogente, imperativo). A expressão não se afigura inteiramente correcta, afinal todas as regras jurídicas são, em geral, imperativas o que se pretende dizer é que são os princípios que estão para além da vontade ou do acordo de vontades dos sujeitos de Dt. Internacional.

Desde sempre foram reconhecidos certos princípios como prevalecentes nas relações entre Estados (Grócio), mas só após 1945 estes princípios são proclamados em textos solenes e tomados como critérios de decisão

Os grandes passos conducentes ao reconhecimento e à afirmação da relevância do jus cogens viria a ser: - A Carta das Nações Unidas (art. 2.º, n.º6 e 103.º, n.º1).

- O acórdão do Tribunal de Nuremberga.

- Convenções de Genebra (art. 62.º, 63.º, 142.º, 158.º).

- Tratados de Direitos do Homem (art. 15.º da Convenção Europeia).

Como são estabelecidas essas regras? Nenhuma organização internacional goza de poder para tal: o costume internacional não poderia aplicar-se a um Estado que se opusesse à sua formação; quanto aos mecanismos convencionais, eles seriam os menos indicados dado que um Tratado não produz efeitos perante terceiros. Desenha-se uma representação mental que vê a comunidade internacional como vagamente personificada, como instrumento de consenso.

O jus cogens pressupõe hierarquia das normas, no entanto, numa sociedade privada de aparelho legislativo torna-se difícil determinar que normas entram na categoria de normas cogentes

O

jus cogens nas convenções sobre Direito dos Tratados

As duas convenções de Viena sobre Direito dos Tratados são os dois textos paralelos de formal consagração de um regime próprio de jus cogens. Ocupam-se de tal nos art. 53.º, 64.º, 71.º, 66.º, alínea a), 44.º, n.º5, 60.º, n.º5. os preceitos básicos são os art. 53.º, 64.º e 71.º:

- É nulo todo o Tratado que é incompatível com uma norma imperativa de Direito Internacional geral (53.º, 1.ª parte).

- Uma norma imperativa de Dt. Internacional é a que seja aceite no seu conjunto como norma à qual nenhuma derrogação é permitida (art. 53.º, 2.ª parte).

- Se sobreviver uma norma imperativa de Direito internacional geral todo o tratado existente que for incompatível com esta norma tornar-se-á nulo (art. 64.º).

- Quando um Tratado for nulo, as partes serão obrigadas a proceder segundo o art. 71.º, n.º1. - Se um tratado se tornar nulo deve proceder segundo o art. 71.º, n.º2.

Traços específicos do jus cogens: - Faz parte do Dt. Internacional geral. - Pressupõe aceitação e reconhecimento.

- Tem de ser aceite e reconhecido pela comunidade internacional no seu conjunto. - Possui força jurídica superior a qualquer outro princípio

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- A sua violação envolve invalidade de norma contrária. - O jus cogens é evolutivo e susceptível de transformação.

Determinação das normas de jus cogens

Nenhum preceito da Convenção de Viena de 1969 aponta o modo como se reveste ou determina o jus cogens. Hoje parece possível aventar-se linhas de orientação: no tocante à revelação do jus cogens o exigir que sejam normas aceites e reconhecidas pela comunidade internacional no seu conjunto implica que se deva ter em conta as fontes mais próximas dessa dimensão universal:

- O costume internacional geral. - Os tratados multilaterais gerais.

- As resoluções da Ass. Geral das Nações Unidas.

Temos então princípios atinentes à comunidade internacional como um todo, princípios atinentes às obrigações dos sujeitos de Direito Internacional, princípios atinentes às relações entre os estados e ainda princípios atinentes à pessoa humana.

2 – Interpretação, integração e aplicação A interpretação em geral

Os cânones gerais da hermenêutica jurídica aplicam-se também ao direito internacional público. Não cabe contrapor interpretação em direito interno à interpretação em direito internacional. O que pode haver mais é a necessidade de adequação ou adaptação.

Galvão Telles - Aceitar a incorporação da norma internacional na ordem interna e negar, ao mesmo tempo, a interpretação e a integração da fonte de que deriva naqueles termos significa conceder com uma mão o que se retira com outra.

A interpretação em direito internacional pode ser autêntica ou doutrinal (o art. 38.º, n.º1 alínea d) do Estatuto do Tribunal Internacional). A judicial tanto pode ser levada a cabo por tribunais internacionais – judiciais e arbitrais – como por tribunais estatais.

A interpretação dos tratados em especial

A Convenção de Viena ocupa-se ex professo da interpretação dos Tratados acolhendo de forma clara, o princípio da boa fé e, com alguma prudência, um duplo princípio objectivista e actualista.

Um tratado deve ser interpretado de boa fé (art. 31.º, n.º1, 1ª parte):

- A interpretação não pode conduzir a um resultado manifestamente absurdo (art. 32.º, alínea b). - A interpretação não pode ser feita à margem de acordo das partes (art. 31.º, n.º2 e 3, alínea b)).

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Um tratado deve ser interpretado segundo o sentido comum atribuível aos seus termos no seu contexto e à luz dos respectivos objecto e fim – princípio objectivista (art. 31.º, n.º1). O Tratado deve ser sistematicamente interpretado na perspectiva geral do Dt. Internacional e desde logo do jus cogens. O princípio objectivista acarreta uma interpretação evolutiva e não fixa do tratado.

Poderá haver interpretação conforme com a Constituição de tratados internacionais? A resposta não poderá ser negativa, dado que existe uma supremacia de normas constitucionais sobre normas convencionais. Todavia com uma diferença importantíssima em confronto com as leis: a interpretação conforme a CRP de qualquer preceito legal pode ir até onde for razoável para o salvar. Já não a interpretação de normas constantes de tratados, a qual tem de se deter perante o imperativo de harmonização e de boa fé nas relações internacionais.

A integração de lacunas

Talvez seja desaconselhável falar em lacunas no Dt. Internacional, em virtude das áreas muito diferenciadas por que se reparte, e das diversas finalidades que cada uma visa atingir.

As lacunas são mais visíveis em relação a este ou àquele conjunto de normas – desde tratados bilaterais à Carta da ONU.

A determinação de lacunas envolve uma prévia interpretação: só existe lacuna quando se conclua que certa matéria está sujeita a regulamentação jurídico-internacional. Uma vez apurada a lacuna, o seu preenchimento far-se-á através dos meios usuais: a analogia e os princípios gerais de Direito.

Aplicação do Direito Internacional

A Convenção de Viena formula grandes princípios acerca da aplicação dos Tratados: - Boa fé – art. 26.º.

- Não invocabilidade de disposições de Direito Interno para justificar a não execução – art. 27.º. - Não-retroactividade – art. 28.º.

- Aplicação das normas internacionais à totalidade do território dos estados seus destinatários – art. 29.º. - Prevalência da norma nova sobre a anterior a respeito da mesma matéria – art. 59.º e 30.º.

A forma de estado – unitário centralizado, unitário regional, federal – é indiferente quanto à aplicação indivisível de qualquer tratado a todo o território estatal (quando os EUA celebram um tratado vinculam todos os estados federados).

Ocorre sucessão de Tratados quando um novo tratado, concluído entre as mesmas partes, visa substituir o que até então se encontrava em vigor (art. 59.º, n.º1 e 30.º, n.º3 da Convenção de Viena).

Princípio da não-vinculação significa que um Tratado não produz efeitos perante terceiros sem o seu consentimento, e o mesmo se aplica as decisões de organizações internacionais (art. 2.º, n.º6 da Carta das Nações Unidas).

Referências

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