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Avaliação fisioterapêutica para apnéia obstrutiva do sono na população curitibana

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Academic year: 2021

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1 INTRODUÇÃO

1.1 O Problema

A história da avaliação fisiológica do sono encontra-se em fase de infância quando comparada às outras especialidades médicas, visto que há pouco mais de 60 anos o sono era considerado um estado simples, homogêneo e de pequeno significado de interesse clínico.

Os primeiros estudos relativos aos distúrbios do sono datam de aproximadamente 1860 (Slutzky, 1997) e continuaram, a passos lentos, até o desenvolvimento do eletroencefalograma, em 1935. No período pós- eletroencefalograma pôde-se colher, com maior clareza e riqueza, informações clínicas que têm ajudado no entendimento mais amplo do sono. Dentre as doenças relacionadas ao sono cita–se a Apnéia Obstrutiva do Sono - SASO (Gastault et al.,1965), como uma das maiores causadoras de déficits de memória, transtornos de concentração e alterações da personalidade, devido a noites mal dormidas.

As complicações orgânicas, já bastante conhecidas no portador da doença, adquirem maior amplitude quando esses transtornos afetam diretamente as atividades laborais, pois a má qualidade de sono aliada a complicações de saúde das mais distintas, leva o indivíduo a um baixo rendimento em todas as suas atividades de vida diária. A estreita relação entre o sono e saúde pode ser observada no dia a dia. Quem não conhece um estudante que passou noites sem dormir estudando para o vestibular e , após 3 ou 4 dias, inicia um processo gripal? E um executivo que não dorme direito devido ao fechamento de um grande negócio e, no dia da reunião decisiva, desperta com uma dor de garganta? O que acontece, nesses casos, é uma baixa da imunidade, deixando o corpo à mercê de doenças oportunistas. As conseqüências mais evidentes serão: baixa produtividade, diminuição nos lucros e a propensão a acidentes de trabalho, cujos custos poderão ser incalculáveis.

Isso pode ser comprovado no relatório sobre acidentes que o pesquisador francês Dr. Damien Léger (apud Coren, 1998, p.140) preparou para a comissão de distúrbios do sono, publicado em 1994, utilizando dados coletados nos Estados Unidos. Segundo Léger, os acidentes automobilísticos causados pela privação do

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sono custaram U$ 37,9 bilhões em 1998. Se a cifra impressiona, tem-se mais a lamentar as perdas de vidas nesse processo: 24.318 mortos e quase 2,5 milhões de feridos, com seqüelas físicas ou mentais permanentes. Dos acidentes de trabalho, resultam 29,2 milhões de dias perdidos.

Tais números são um pesadelo para a economia de qualquer país. E estão subestimados, porque os cálculos só envolveram custos com médicos, hospitais, medicamentos, reabilitação e perdas por dias parados ou por morte prematura dos trabalhadores. A SASO está diretamente ligada ao estresse, à obesidade, ao sedentarismo, ao uso de álcool, dentre outros fatores que atingem um número cada vez maior de trabalhadores das mais diversas áreas do conhecimento. Profissionais atingidos pela SASO põem em risco as empresas, quer pela baixa produção, quer pela exposição da vida em atividades periculosas que exigem concentração e raciocínio rápido.

Todos esses fatores podem ser detectados de forma preventiva, evitando-se tratamentos de alto custo. Em sua fase inicial, uma simples mudança nos hábitos de vida bastaria para propiciar ao ser humano melhor qualidade de vida em suas relações familiares e profissionais.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo geral

Analisar a correlação da Apnéia Obstrutiva do Sono e o tipo de atividade laboral exercida pelo indivíduo residente na cidade de Curitiiba, estado do Paraná.

1.2.2. Objetivos específicos

- Eleger fatores indicativos de Apnéia e avaliá-los na amostra populacional recolhida.

- Cotejar esses fatores com atividades laborais que exijam maior e menor empenho.

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- Concluir qual modalidade laboral pode levar o indivíduo a desenvolver a Apnéia Obstrutiva do Sono.

1.3 Questões investigadas

A avaliação da amostra populacional através de uma primeira fase de questionamentos objetivos, está centralizada em um fator característico de portadores de SASO, que é o ronco. A partir desse fator considerado clássico, buscaram-se outros sintomas que, quando associados ao ronco, fornecem o perfil da doença descrita neste trabalho, tais como: hipersonolência diurna, cefaléia matinal, irritabilidade, agressividade e baixo poder de concentração. Esses fatores são característicos de noites mal dormidas e quando associados à obstrução de vias aéreas superiores e sedentarismo, praticamente nos fazem delimitar o diagnóstico da patologia.

Uma segunda fase de avaliação realizada com análise direta do biótipo do indivíduo, em dados colhidos como peso, sexo, idade e altura, permite-nos analisar exames mais específicos como o de Saturação de Oxigênio, Freqüência Cardíaca, Pressão Arterial, Perimetria Cervical e Relação C/Q – cintura/quadril. Todos esses dados fornecerão indícios, ou seja, um caminho mais seguro para realizar uma pesquisa que mostra a relação da atividade laboral com possíveis portadores de Apnéia Obstrutiva do Sono.

1.4 Justificativa e relevância do assunto

Estresse, sedentarismo, obesidade e abuso alcoólico são palavras que freqüentam usualmente o vocabulário do homem moderno, esse indivíduo, sujeito às pressões e aos hábitos do mundo globalizado. Esses fatores, associados à obstrução das vias aéreas superiores ocasionadas pela poluição ambiental, podem desencadear a Apnéia Obstrutiva do Sono – SASO, uma moléstia que vem ganhando notoriedade à medida em que se conhecem suas causas e efeitos.

A SASO afeta cerca de 9% da população masculina e 4% da feminina acima de 40 anos, levando ao desenvolvimento silencioso de hipertensão arterial (Fletcher

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et al, 1985), aumento do trabalho cardíaco, deficiente mecânica ventilatória, alterações contínuas da personalidade, deterioração intelectual, depressão e diminuição da libido e dessaturação de oxigênio.

Todos esses episódios levam o trabalhador a desenvolver baixo rendimento psico-social, visto que a qualidade de vida nos aspectos familiar, social e profissional encontra-se prejudicada.

Embora seja uma doença considerada nos EUA extremamente alarmante, no Brasil não há estudos suficientes, levando a patologia a ser encarada como sintomas isolados, e não como conjunto de fatores que levam a uma baixa qualidade de vida e também baixa produtividade no trabalho. As grandes empresas têm dificuldade em identificar o futuro trabalhador, como um possível portador , principalmente no âmbito da contratação. Por outro lado, se diagnosticada precocemente e com a devida mudança dos hábitos de vida, poder-se-á, não somente a salvação do empregado, mas principalmente de um ser humano exposto aos males da vida moderna.

1.5 Delimitação do estudo

O universo selecionado para este estudo diz respeito a características de apnéia obstrutiva do sono e a relação da patologia com as suas atividades laborais, na população curitibana.

1.6 Limitações do Estudo

A maior dificuldade foi na veracidade das respostas e no tempo dispendido pelos transeuntes para responderem ao questionário e realizarem os testes, o que lhes tomou um tempo em torno de cinco minutos. Outro problema foi o da divisão das atividades laborais, nas quais pudemos observar a existência de uma gama muito grande de profissões com os mais distintos nomes.

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1.7 Organização do trabalho

O presente trabalho é constituído de cinco capítulos.

O capítulo um conta com a Introdução, objetivos gerais e específicos, justificativa e relevância do assunto, organização do estudo, delimitação e limitação do estudo e descrição dos capítulos.

O capítulo dois traz a revisão bibliográfica, constituída por amplo acervo científico e publicações concernentes ao tema proposto.

O capítulo três contempla a metodologia de pesquisa e análise, composta pelo tipo de estudo, aspectos éticos da pesquisa, os sujeitos e local da pesquisa, além de estratégias para levantamento, registro e análise de dados.

O capítulo quatro traz a representação e análise dos dados, com a discussão e interpretação dos resultados encontrados e a confirmação da proposta de pesquisa.

O capítulo cinco, relativo a conclusões e sugestões, apresenta os resultados deste estudo, uma possível contribuição para o alargamento das pesquisas e trabalhos futuros na área da apnéia obstrutiva do sono.

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2. REVISÃO BIBLIOGRAFICA

Em 1837, Charles Dickens descreveu o primeiro possível paciente de apnéia do sono em "Os Escritos Póstumos do Clube de Pickwick". Um de seus personagens (Joe) era descrito como segue: "... e no caixote sentou-se um garoto gordo e de rosto vermelho em estado de sonolência" (p.35) Há diversas outras referências no livro de Dickens a este personagem sugerindo que ele sofria de apnéia do sono:

"Joe – que droga aquele garoto, ele foi dormir novamente".

... "todas as pessoas estavam excitadas exceto o garoto gordo, e ele dormia profundamente como se o barulho do canhão fosse a sua usual canção de ninar... senhor, será que é possível beliscá-lo na sua perna, nada mais o acorda".

Em 1918, Sir William Osler utilizou o termo "Pickwickian" para referir-se a paciente obeso e sonolento. O Dr. Browman e col. (1956), descrevendo paciente severamente obeso, hipersonolento e com insuficiência cardiorespiratória, utilizaram o termo "Síndrome de Pickwickian".

Segundo Reimão (1996, p.295):

“Apnéia Obstrutiva do Sono foi tratada durante muito tempo como uma doença exclusivamente dos obesos. Após o desenvolvimento dos estudos na área, pôde-se observar que essa doença não afeta somente aos obesos como as crianças, adolescentes e adultos, entre eles homens e mulheres.” Na década de 50, um grupo de Chicago, nos Estados Unidos, deu inicio nas pesquisas sobre o sono. Na época, não existia a polissonografia e os pesquisadores tinham como única aliada sua capacidade de observação. Tudo começou em 1953, quando Aserinsky e colaboradores perceberam que os olhos das crianças se movimentavam várias vezes durante o sono. Mas, Dement e colaboradores, notaram que o fenômeno era cíclico (Dement et al, 1957). Os três, então, resolveram investigar se a causa residia no fato de as pessoas estarem sonhando.

Observaram pessoas dormindo em laboratório (Dement et al, 1957). Na hora que um indivíduo começava a movimentar os olhos, o grupo o acordava e perguntava se ele estava sonhando. Cerca de 85% responderam afirmativamente. Pela primeira vez ficou evidente que o sonho não é aleatório, tem uma ligação com o

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cérebro e acontece em um determinado estágio do sono - o REM, que denominaram

Rapid Eye Movement. A partir daí, desenvolveram-se outras pesquisas sobre o sono

no mundo inteiro.

Na França o Dr. Gastault e colaboradores fizeram a importante observação de que pacientes tidos como "Pickwickian" apresentavam repetidos episódios de apnéia durante o sono. Em 1978, Dr. John Remmers descreveu a interação entre sono, músculo da caixa torácica e da via aérea superior, a qual elucidou grandemente a razão do colapso da via aérea superior durante o sono, ocasionando o que atualmente denomina-se Apnéia Obstrutiva do Sono (AOS).

Em 1981, os Drs. Sullivan, Berthon-Jones e Issa , da Universidade de Sidney, Austrália, publicaram os resultados de pacientes portadores de Apnéia Obstrutiva do Sono tratados com uma prótese ventilatória denominada CPAP (Pressão Positiva Contínua da Via Aérea), iniciando assim o método mais comum e eficiente para o tratamento desta doença.

2.1. Os estados do sono

Durante o sonho, a atividade do cérebro é semelhante àquela que existe em vigília, durante o dia (Corner, 1984). Há apenas uma diferença básica: perdem-se os parâmetros diurnos. Ou seja, não há noção de tempo (as coisas acontecem muito rápido ou muito devagar durante o sonho), o espaço se modifica (fica grande ou pequeno demais) e não existe uma lógica (a história não tem começo, meio e fim, e os objetos podem flutuar). Mesmo sem se recordar, todos os seres humanos sonham várias vezes por noite.

Segundo McCarley et al (1977) sonhar é uma forma de reavaliar as informações da memória e fazer uma faxina geral, livrando-se daquilo que não interessa. Daí, a repetição de alguns sonhos e imagens antigas. É como se estivéssemos sempre arrumando e limpando um arquivo de escritório. Nesse momento do sono REM, observamos o que podemos ou não esquecer. Tal teoria não elimina, é claro, todos os estudos realizados pelo pai da psicanálise sobre sonhos. Em linhas gerais, Sigmund Freud acreditava que os sonhos eram realização dos desejos inconscientes.

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geralmente numeradas de 1 a 4 e que correspondem a atividades elétricas progressivamente mais lentas. Os diferentes estágios do sono lento não são acompanhados por movimentos oculares e, em relação à vigília, subsiste um certo tônus postural (Dement et al, 1957). Além disso, quando somos acordados durante o sono lento, é raro lembrarmo-nos de termos sonhado (Jouvet, 1979).

O ser humano passa aproximadamente 1/3 de sua existência dormindo. Mas o sono não é um processo passivo, ao contrário, durante este sucedem, de modo cíclico, uma série de diferentes estágios caracterizados por padrões cardiorespiratórios e neurofisiológicos definidos (Orem et Barnes, 1980).

Para uma melhor compreensão do processo do sono, pode-se compará-lo a uma descida em degraus de uma escada. Ao se fechar os olhos seria o primeiro passo para a fase 1 do sono. Nesta fase, o corpo inicia a distensão muscular, a respiração torna-se uniforme e no eletroencefalograma observa-se uma atividade cerebral mais lenta do que no estado de vigília, aparecendo algumas ondas típicas denominadas "ondas agudas do vértex". Após esta fase, seguindo a descida em direção à fase 2, na qual as ondas cerebrais são mais lentas, aparecem figuras típicas tais como "fusos do sono" e "complexo K" (Halasz et al, 1986).

Posteriormente, continuando a descida para o sono mais profundo, aparece o sono delta ou fase 3 e 4, pois as ondas cerebrais são bastante lentas, necessitando assim de fortes estímulos acústicos ou táteis para o despertar. Este processo dura aproximadamente 60-70 minutos voltando-se novamente à fase 2 para entrar numa nova situação fisiológica denominada fase REM por se caracterizar pelos movimentos rápidos dos olhos (Miyauchi et al, 1987). Em conjunto, estas quatro fases (1,2,3,4 e REM) denominam-se ciclo e possuem uma duração total de 90-100 minutos. Estes ciclos se repetem em 4 a 5 ocasiões durante a noite. Durante o sono, ocorrem modificações fisiológicas no eletroencefalograma, eletromiograma, eletrooculograma, ritmo cardíaco, temperatura do corpo e outras que caracterizam distintamente cada etapa do sono (Carskadon et Rechstschafen, 1989).

A fase REM é aquela em que habitualmente se sonha e pode ser definida como uma fase de grande atividade cerebral e paralisia do corpo, diferente da fase Não – REM, caracterizada por um período de relativa tranqüilidade cerebral e corporal. Na fase REM ocorre uma atonia de todos os músculos do organismo, exceto do diafragma e dos músculos oculares. Nesta fase ocorrem também complexas modificações, tais como o inadequado controle da temperatura corporal e

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a diminuição das respostas ventilatórias a hipóxia e hipercapnia (Parmeggiani, 1982).

Para que o sono seja reparador, as distintas fases anteriormente descritas devem repetir-se ciclicamente durante a noite. O sono profundo (fase 3 / 4) ocupa geralmente a primeira metade da noite enquanto o sono superficial (fase 1 e 2) e o sono REM predominam na segunda metade.

A representação das distintas fases do sono são assim ilustradas: a fase 1 ocupa entre 2 a 5% do total do sono. A fase 2, entre 45 e 50% e a fase 3/4, 18 a 25% do total do sono. Portanto, as fases 1, 2 e 3/4, também denominadas sono Não-REM, ocupam entre 75-80% do total do sono. O sono REM ocorre em aproximadamente 20 a 25% do total do período de sono (Slutzky, 1997).

2.2. O sono paradoxal

O sono lento distingue-se do sono paradoxal e da vigília graças aos registros das atividades cerebral e muscular. No conjunto dos sinais, que traduzem o estado de sono paradoxal, distinguem-se os sinais tônicos (persistentes) e os sinais físicos (episódicos).

Os sinais tônicos caracterizam-se por uma ativação cortical semelhante à da vigília atenta e por uma atonia postural generalizada (Jouvet, 1965). Os sinais físicos distinguem-se por uma atividade elétrica particular do cérebro, inicialmente recolhida ao nível da ponte, do núcleo geniculado externo (ou lateral) e do córtex occipital, daí derivando o nome de atividade "ponto-geniculo-occipital" (Sakai, 1980). Essa atividade é responsável por fenômenos físicos periféricos, como os movimentos rápidos dos olhos, da língua, e por vezes, dos dedos.

Quando se individualizou o sono paradoxal no fim dos anos 50, a situação era a seguinte: tudo indicava que, no homem, o sonho ocorre durante o sono paradoxal.

2.2.1 Mecanismos que preparam o sonho

Em condições habituais, o sono paradoxal nunca ocorre durante a vigília, devendo, pois, ser preparado ou iniciado por uma fase prévia de sono de ondas

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lentas. Os mecanismos desta "etapa preparatória" são complexos, mas são conhecidas as suas grandes linhas. Em primeiro lugar, é preciso que a vigília cesse, ou seja, que o cérebro, o sistema de vigília, deixe de estar excitado. Isso supõe, em primeiro lugar, que não exista perigo imediato e, por conseguinte, que os tele-receptores auditivos, olfativos e visuais não sejam alertados por sinais provenientes de predadores eventuais e que os próprio-receptores da dor não estejam excitados (Nielsen et al, 1993).

Por fim, supõe que o período de adormecimento se situe na fase de inatividade do ritmo circadiano: sabe-se que, no rato, o sono ocorre espontaneamente com mais facilidade durante o dia. Quando estas condições estiverem satisfeitas, o sistema de vigília deixa de estar excitado e os mecanismos ativos do adormecimento podem entrar em ação.

Anatomicamente, o sistema de vigília é constituído por uma rede de neurônios situada na formação reticulada mesencefálica: durante a vigília, esses neurônios excitam o córtex por intermédio de neurotransmissores, em particular a acetilcolina; eles próprios recebem uma inervação noradrenérgica proveniente, sobretudo, do locus coeruleus (Aghajanin et al, 1982). Mas a lista de neurotransmissores ativados durante a vigília está longe de se limitar ao par acetilcolina-noradrenalina. A serotonina e certos péptidos também são libertados durante a vigília (Inoue, 1989).

O adormecimento e as fases preparatórias do sono paradoxal que ocorrem durante o sono lento ativam outras estruturas do tronco cerebral, sobretudo aquelas que se situam na parte caudal do sistema do rafe; o papel desempenhado no adormecimento pelos neurônios que contém serotonina (5-hidroxitriptamina ou 5HT) foi demonstrado por uma série convergente de experiências cuja interpretação é ainda delicada (Inoue, 1989).

Tudo se passa como se numerosos mecanismos de controle impedissem o sono paradoxal de se produzir durante a vigília e no início do sono. Os dois mecanismos de controle mais importantes situam-se ou na parte do sistema de vigília (locus coeruleus), ou ao nível do sistema do rafe dorsalis (que está ativo durante a vigília, o adormecimento e o sono leve). O sono paradoxal só pode surgir quando cessa toda a atividade dessas duas estruturas.

Assim, o sonho só é possível depois da verificação de numerosos sistemas de segurança: essa proteção parece muito adaptada, porque o sonho é

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acompanhado por um aumento importante do limiar de vigília e por uma paralisia quase total. Surdo, cego e paralisado, o animal torna-se muito vulnerável e só pode sonhar se estiver em segurança; só então é que mergulha num sono profundo.

Essa noção de segurança é vital e explica em parte as variações na duração do sonho entre as diferentes espécies: os animais perseguidos, que raramente estão em segurança, dormem pouco, com um sono muito leve, e a duração total dos períodos de sono paradoxal não excede 15 a 20 minutos em 24 horas; em contrapartida, os caçadores (carnívoros) e o gato doméstico, perfeitamente em segurança e que não tem de caçar para encontrar alimentação, dormem muito, podendo a duração do sono paradoxal exceder 200 minutos em 24 horas.

A transição direta da vigília para o sono paradoxal só se observa no decurso de uma doença: a narcolepsia. Esta afecção, traduz-se por um desaparecimento brutal do tônus muscular que pode levar à queda do indivíduo (acessos catalépticos). É muito freqüente que esses acessos catalépticos sejam acompanhados por sonho e o sujeito perder o contato com o mundo exterior; em casos mais raros, o sujeito mantém a consciência, pois só o sistema de atonia postural é envolvido (Hublin et al, 1994). Percebe-se que a maior parte das drogas que suprimem os acessos de narcolepsia impedem a chegada do sono paradoxal, ao agirem sobre os mecanismos de segurança que protegem o sonho. É o caso dos inibidores das monoamina-oxidases ou dos antidepressivos tricíclicos (imipramina-clorimipramina) que, ao aumentarem a concentração de 5HT ou de catecolamina, excitam os receptores que bloqueiam o aparecimento do sono paradoxal (Inoue, 1989).

2.2.2 A organização do sono paradoxal

Sabe-se, hoje, que essas atividades dependem da integridade de estruturas situadas no tronco cerebral inferior (Jouvet, 1965). A delimitação exata das estruturas implicadas no controlo da atonia postural e da atividade PGO foi longa e difícil, porque a organização anatômica das formações reticulares pônticas e bulbares é complexa; ela progride todos os anos graças às novas técnicas histoquímicas e anatômicas.

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2.2.3 Necessidades de sono

Quantas horas devemos dormir por noite? Reza a lenda que bastam oito. Mas nem todo mundo acorda feliz e saltitante depois de dormir esse tempo. Ao contrário: muita gente se levanta cansada e passa o dia sonolenta. Por quê? É simples. A quantidade de sono varia de pessoa para pessoa, de acordo com o sexo, a idade e a constituição biológica. As mulheres, por exemplo, dormem 40 a 50 minutos a mais do que os homens e têm maior quantidade de sono profundo. Em relação à idade, o sono diminui ao longo da vida. Enquanto um recém-nascido chega a dormir 18 horas (Da Costa et al, 1991), um adulto jovem atinge a marca das sete ou oito horas e um idoso se satisfaz com apenas cinco horas (Albert, 1981).

Os short sleepers (dormidores curtos) necessitam de apenas cinco a seis horas para se sentirem livres, leves e soltos no dia seguinte. No mundo moderno, em que as pessoas valorizam mais a produção do que o descanso, os dormidores curtos são invejados, e os longos têm mais dificuldade para se adaptar socialmente. Geralmente, os primeiros apresentam uma grande disposição e um desempenho melhor no trabalho.

Já os "dorminhocos" não conseguem trabalhar ou estudar tantas horas. Se eles são obrigados a dormir pouco e não conseguem repor o sono, ficam muito cansados e com uma vontade incontrolável de cochilar em qualquer canto. Resultado: produzem menos, são malvistos e chamados de preguiçosos. Uma injustiça, já que na turma dos "sonecas" encontram-se personalidades geniais, como Albert Einstein, descobridor da Lei da Relatividade, apesar de passar 10 horas ou mais do seu dia dormindo. Winston Chuchill também valorizava demais as horas de sono. Até mesmo durante a II Guerra Mundial, quando a defesa da Inglaterra estava em suas mãos, ele detestava ser acordado cedo.

2.2.4 Sonolência e agressividade

Dormir é tão importante quanto comer e beber. O sono repõe energias, ajuda o metabolismo e o nosso desenvolvimento físico e mental, mas, como o mundo não funciona de acordo com as necessidades reais do ser humano, existe muita gente que passa dias sem dormir. São as vítimas da privação do sono. É o

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caso dos médicos, jornalistas e outros profissionais que fazem plantões de madrugada ou trabalham em horários irregulares (Reimão, 1996).

Desde da década de 50, vários cientistas, no mundo todo, vêm realizando experiências sobre essa privação aguda, deixando jovens voluntários e saudáveis sem dormir durante 24 horas. No dia seguinte, os voluntários se apresentam desatentos e desconcentrados.

Figura 1 - Necessidades de Sono de Acordo com a Idade.

Fonte: http:/www.nib.unicamp.br/sbpt/apsonIIIhtml. Acesso em 19/03/99

Quando eles repetem a experiência na noite seguinte, os sintomas iniciais aumentam e a pessoa apresenta sinais de falta de memória e irritabilidade. Numa terceira noite, a sonolência torna-se insuportável e a pessoa fica agressiva (Isaacson, 1974). Portanto, é mais do que comprovado: o sono é necessário e ninguém pode passar sem ele.

Para aprofundar as pesquisas, os cientistas resolveram fazer outros tipos de privação em laboratório: com o sono REM e o sono 3 e 4. No momento em que a pessoa analisada começava a mexer os olhos e entrar no sono REM, os cientistas o acordavam. Verificava-se que os voluntários apresentavam todos os sintomas psicológicos da falta de sono (irritabilidade, falta de memória e de concentração), ainda que menos sonolentos e cansados do que se passassem a noite em claro. Daí

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concluírem que o sono REM está relacionado com a recuperação de funções como memória e raciocínio.

Por outro lado, a privação de sono 3 e 4 faz a pessoa ficar exausta (Horne et al, 1984). No dia-a-dia, essas privações agudas não são tão comuns. A maioria das pessoas sofre uma privação parcial e crônica do sono. Ou seja, trabalham muito, chegam tarde em casa, acordam cedo e acabam dormindo pouco. Nestes casos, os sintomas são os mesmos da privação total. A diferença é que elas ficam cansadas, irritadas e sonolentas todo dia, de forma menos intensa. Mas quem consegue mudar o ritmo de vida, melhora o padrão do sono depois de alguns dias. A sonolência pode ainda provocar acidentes de trabalho ou de trânsito, já que os reflexos ficam mais lentos.

Algumas pessoas, como os guardas - noturnos, trabalham à noite e não conseguem sequer repor o sono durante o dia. É difícil para alguns deles conseguir dormir sete ou oito horas seguidas durante o dia, pois ruídos urbanos, temperatura e ambientes não propícios, quando não tarefas executáveis somente durante o dia, podem impedi-los de ter as horas ideais de sono. Além disso, a produção de melatonina (hormônio que provoca o sono) só acontece à noite (Arendt et al, 1985). E mais: seu relógio biológico não está adaptado para dormir de dia e ficar acordado de noite (Aschoff, 1965). A explicação é simples: quando chega o final de semana, ele tenta mudar esses horários para conseguir conviver com os amigos e parentes e não consegue estabilizar seu relógio biológico. Daí muitos deles cochilarem durante o trabalho, prejudicando o desempenho.

O ideal seria ninguém trabalhar à noite. Na sociedade moderna, entretanto, é impossível dispensar o serviço de algumas categorias à noite. A solução para os trabalhadores noturnos é fixar um horário para dormir e melhorar as condições do ambiente. E o mais importante: fazer a família compreender que ele precisa descansar durante o dia da mesma forma que ela repousa à noite. O apoio familiar é fundamental para a pessoa conseguir dormir sem culpas durante o dia, com direito a estágio 1, 2, 3, 4 e REM.

Outra categoria que tem problemas para dormir é a dos trabalhadores em turnos. De maneira geral, a situação é parecida com a dos trabalhadores noturnos. Só que para eles é mais difícil ainda estabelecer regras para dormir, já que cada dia ou semana fazem isso em horários diferentes. No Brasil, algumas empresas dividem os turnos de forma arbitrária e aleatória, sem levar em conta a saúde do trabalhador

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e sua capacidade de adaptação. Na Europa e nos Estados Unidos, algumas firmas fazem um planejamento racional do trabalho em turno, tornando-o menos penoso e prejudicial à saúde. E há uma boa razão para isso. Antigamente, só profissionais da área de saúde e de segurança trabalhavam dessa forma. Hoje digitadores, metalúrgicos e operários de indústrias químicas fazem parte dos 8% da população das grandes cidades que trabalha em turnos.

De maneira geral, esse tipo de trabalhador falta mais porque está mais sujeito sujeitos a mal-estares físicos e psíquicos. Ele corre o risco de sofrer doenças ou problemas provocados pelo estresse: úlcera, infarto e acidentes (Dinges et al, 1989). Só para ilustrar, dois acidentes nucleares (Chernobyl, na Rússia, e Three Mile Island, nos Estados Unidos) aconteceram por volta das quatro horas, no final da jornada de trabalho, com equipes que estavam completamente exaustas. Em ambos, a causa apontada foi erro humano, provocado pela privação de sono. Uma pesquisa realizada por Akersted, em 1988, com trabalhadores de turnos, mostrou que 20% cochilavam durante o turno da noite, justificando os maiores índices de acidentes registrados com esses profissionais.

Para efeito de prevenção, é necessário melhorar as condições ambientais e diminuir as mudanças (Sanvito, 1991). Para que essas mudanças ocorram, é preciso que os trabalhadores questionem seus horários de turno, reivindicando uma divisão de trabalho mais humana.

Algumas categorias mais esclarecidas, como a dos médicos, são as que mais cometem erros nesse sentido (Sanvito, 1991). Ao contrário dos metalúrgicos, que buscam melhores condições de trabalho, alguns profissionais da área de saúde acreditam que são super-homens, capazes de passar dias sem dormir ou trocando os horários sem o menor problema. O que acontece é que, como todo mortal, eles acabam ficando exaustos e adoecem. O ideal para todas as categorias, portanto, é evitar esse tipo de trabalho. Dormir durante o dia não é pecado para quem trabalha à noite ou em horários irregulares. Ao contrário: é, acima de tudo, uma necessidade do corpo e da mente.

Por parte da empresa, um planejamento "inteligente" inclui ainda a seleção de jovens que normalmente têm mais facilidade de adaptação. Ao longo dos anos, esse mesmo trabalhador deve passar para os turnos fixos. É importante também evitar pessoas com insônia, com antecedentes de úlcera, gastrite ou infarto, ou muito estressadas, que não suportarão um trabalho tão desgastante. Muitos

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empresários ainda não levam em consideração que a saúde do trabalhador é muito importante para o bom desenvolvimento de sua empresa. Prevenir doenças e acidentes é uma investimento tão importante quanto qualquer aplicação financeira. Infelizmente, na prática, não é isso o que acontece. Na Europa, o operário de turno que se acidenta por fadiga, processa a empresa; no Brasil, esse operário é julgado displicente e acaba demitido pela "falha".

2.2.5 Sono, fenômeno biológico essencial

Durante o sono, o organismo é sede de uma atividade metabólica energética particular, própria a todos os mamíferos, que se aplica a todos os níveis do organismo; é ela a responsável por sua ação regeneradora.

Os conhecimentos adquiridos mostraram particularmente que o balanceamento da composição do meio interior, do qual depende nosso equilíbrio vital, exigia a alternância entre o sono e a vigília, para que fosse possível renovar a harmonia osmótica. É também o caso do equilíbrio energético e óxido-redutor de nossas células.

Uma simples verificação tátil, embasada na observação, mostrará um relaxamento das estruturas musculares e segmentares, próximo às vezes da lassidão e da atonia, que pode ser percorrida por movimentos espontâneos, descontínuos e desordenados, que traduzem uma solicitação episódica do sistema nervoso central (Orem et al, 1980).

Além do estado de torpor e da dissociação da consciência, é preciso considerar a posição daquele que dorme, seu relaxamento neuromuscular, suas atitudes de introjeção e de alheamento. Plínio já dizia que durante o sono "nos voltamos sobre nós mesmos".

Assim, temos de considerar um evento sua totalidade e para melhor entendê-lo não poderemos dissociar essa investigação do seu contexto histórico e biológico.

Em 1937, foram descritos os primeiros estágios do sono em função de sua intensidade ou profundidade (Reimão, 1996). Foi necessário esperar cerca de vinte anos para que o segundo aspecto do sono, aquele que permite a emissão do sonho, fosse enfim identificado. Estávamos apenas em 1953. Entre Galeno, que na

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Antigüidade assinalou as anomalias respiratórias e cardíacas durante o sono, e os fisiologistas do século XVIII, nada houve de essencial, a não ser a manifestação de sinais oculares em diversos momentos do sono. As características de ligação do sono com a psicologia foram evidenciadas, a propósito do adormecimento e do sonho, por Maury no século XIX.

Mas a verdadeira ofensiva fisiológica só data realmente do começo deste século, onde foi descrita a influência do sono sobre o organismo e as adaptações do sistema neurovegetativo e de seus reflexos durante esse estado. Foi, de fato, após a II Guerra Mundial que o estudo do sono seria empreendido e que o estudo de sua dualidade diferenciaria dois estados fundamentalmente desiguais ao longo de seu desenvolvimento: o sono regular, profundo e lento, que nós chamaríamos "metabólico e vegetativo", e o sono rápido, de atividade cerebral intensa, tão desconcertante que seria chamado sono paradoxal

Foram muitas as definições dadas ao sono. Para Piéron, tratava-se "de um estado periodicamente necessário, relativamente independente das circunstâncias exteriores e caracterizado pela suspensão das relações que unem o ser a seu meios". Essa definição geral, ainda que exata, emitida no começo do século, não podia apoiar-se sobre os dados experimentais atuais, Em 1936, demonstraram a partir de uma experiência com o cérebro isolado, a existência de uma atividade cortical permanente e lenta (Reimão,1996) análoga aquela observada durante o sono. Esse fato pôs fim a séculos de interrogação, a despeito dos ensinamentos hipocráticos e das tentativas de Aristóteles e Galeno para relacionar a qualidade do sono a certas modificações funcionais respiratórias e circulatórias.

A eletrofisiologia foi o fator indutor de todo o progresso no estudo do tema. A determinação dos traços do sono pelo eletroencefalograma e o registro simultâneo por poligrafia dos potenciais elétricos cerebrais, musculares e oculares permitiram rapidamente descrever e codificar as etapas e as fases do sono e da vigília, suas características normais, rítmicas, episódicas ou anormais, as ligações que se poderia estabelecer entre eles e o estado funcional dos outros aparelhos, sistemas ou grupos de órgãos (Flloh et al, 1986).

Mas apenas a eletrofisiologia não podia explicar a natureza do sono, nem muito menos suas reposições ou a famosa "ressaca", cujos efeitos se estendem por vários dias após experiências ou provas de supressão.

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uma relação de correspondência entre o desencadeamento do sono e as estruturas caudais do tronco cerebral (territórios da rafe anterior), ao mesmo tempo em que elegeram o sistema ascendente reticular ativador como o lugar de origem do despertar comportamental .

Este sistema, verdadeiro cruzamento sensitivo-sensorial e cortical, integra todas as informações do corpo, sejam elas orgânicas, funcionais ou metabólicas (Cambier et al, 1988). Tudo se passa como se um verdadeiro sistema de embreagem permitisse, em função da presença de substâncias-limiares, o início ou a interrupção do sono, assim como da atividade dinamogênica cortical ou motora. Esse território particular constitui o conjunto diencefálico que se prolonga pela epífise e pela hipófise. Por essa razão, a zona ependimária do terceiro ventrículo participa ativamente dos fenômenos endócrinos do diencéfalo.

As fibras brancas vindas do tronco cerebral insinuam-se entre as formações celulares densas da parede do terceiro ventrículo, os núcleos cinzentos centrais, para desenvolver uma estrutura brilhante chamada cápsula interna (Ranson et al, 1955).

Encontraremos essas estruturas na origem da vigília e do sono e da regulação homeostática do organismo, condicionado pela alternância vigília-sono.

O córtex cerebral aparece tardiamente na filogênese e na ontogênse, enquanto que todos os outros componentes do cérebro estão completamente desenvolvidos. O arquecéfalo deve, portanto, ser interpretado como o verdadeiro cérebro que conserva as funções essenciais da vida genética e vegetativa. É somente durante um desenvolvimento recente é que ele será enriquecido pelo neoencéfalo, a fim de criar o neocórtex (Patten, 1953).

Voltando ao córtex, o território mesencéfalo inclui as estruturas da motricidade espontânea, chamado de sistema piramidal. Essas estruturas comportam os núcleos cinzentos centrais (núcleo caudado, pallidum, putamen) ou "stratum". Herdeiros do cérebro arcaico e extremamente importantes nos pássaros e nas aves de rapina, em razão da coordenação motora de que precisam para o vôo, essas estruturas são responsáveis pelos movimentos involuntários e pelo tônus muscular.

Os reflexos vitais e automáticos mesencefálicos, os movimentos espontâneos mesencefálicos devem ser condicionados e regulados segundo as adaptações exigidas pelos comportamentos induzidos.

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Tal será o papel do diencéfalo juntamente com as estruturas bastante caracterizadas e diferenciadas que são o tálamo e o sistema hipotálamo-hipofisário, não é errado afirmar que o tálamo constitui o verdadeiro diencéfalo. É para esse ponto que convergem os influxos sensoriais, auditivos, visuais, táteis, antes de serem projetados, de um lado, para o neocórtex e, na volta, para o "striatum". É a esse nível que a FR, formação reticular, difunde suas redes terminais em direção aos núcleos intralaminares (Gorney, 1973).

O tálamo controla o hipotálamo, mas diferentemente daquele, o hipotálamo participa do sistema límbico. Trata-se do cérebro endocraniano. Ele está ligado aos núcleos talâmicos anteriores e à formação reticular. Integra, ao mesmo tempo, as expressões emocionais e os comportamentos víscero-somáticos. Todos os comportamentos elementares, tais como a fome, o desejo, a sede, o medo, o prazer e a raiva, que resultam, a um só tempo, dos metabolismos, das pulsões e dos instintos primários ou secundários, têm aqui sua indução.

2.2.6 O córtex límbico

O córtex límbico representa o conjunto das estruturas que reúnem o sistema límbico.

Os estudos do sistema límbico revelaram os mecanismos de interdependência e de harmonização funcional que impõem, ao mesmo tempo, a distribuição neocortical em dois hemisférios e os processos de lateralização somática. Essas estruturas apresentam-se com dois arcos anelados, um superior, outro inferior, separados pelos bulbos olfativos. A primeira via inferior ou segmento inferior do anel, está sob o comando do núcleo amigdalóide (Bloom, 1988); trata-se da via dos "afetos" e do comportamento da autoconservação por meio dos circuitos de necessidades egoístas (alimentares, agressão, proteção).

A segunda via ou parte superior do anel, que a via septada liga ao septo, governa os estados de expressão e de sentimento. Trata-se da zona que comanda os comportamentos de conservação da espécie, de procriação, de sociabilidade e de orientação.

O anel límbico, articulado ao núcleo dorsal mediano do tálamo, desenvolve projeções em direção ao neocórtex frontal, participando, assim, da função de

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previsão. Em suma, todos os sistemas sensoriais convergem para os circuitos reverberantes do córtex límbico, que gera vias de influxo para as outra estruturas, tais como o hipocampo, o hipotálamo, o tálamo e para formação reticular, sem esquecer o neocórtex.

Essas estruturas vão intervir principalmente no sonho, através do sono, em razão de seu papel determinante no comportamento do sujeito (Sanvito, 1991).

O córtex límbico é, portanto, responsável pelo aparecimento de um estado de motivação que provoca, ao mesmo tempo, uma situação de vigilância e atenção, uma estratégia de sobrevivência e um conjunto de condutas sociais que modulam as induções hipotálamo-mesencefálicas, em função de um determinado relacionamento à adaptação e ao desenvolvimento da personalidade (Cambier et al, 1988).

Essa adaptação será resultante das informações analisadas, selecionadas, classificadas e memorizadas pelas estruturas específicas do sistema.

Assim, a amígdala intervém na percepção de informação de um estímulo e no processo de habituação progressiva a essa informação, participando também do sistema de inibição comportamental.

O hipocampo controla os processos ligados à memória e desenvolve a experiência afetiva. Ele está apto a avaliar as mensagens do hipotálamo, as mensagens neocorticais das informações sensoriais com traços de fracasso e de sucesso, permite indexar as informações, a supressão das interferências e autoriza as adaptações comportamentais e emocionais. Ativa, igualmente, os circuitos de reforço, permitindo a seleção posterior e a indexação consecutiva da informação.

A região septada, sob o impulso do hipocampo, torna-se, em particular, uma zona de inibição e de ativação essencial, a fim de engendrar os estados de atenção, de consciência, de sono e participar dos conteúdos do sonho (Kelly et al, 1991).

A FR intervém no controle das principais funções vegetativas, tais como a micção, a saudação, as variações da pressão arterial e do ritmo cardíaco, e na regulação dos mecanismos ventilatórios, graças ao centro "pneumotáxico".

2.2.6.1 A relação com o sono

O neocórtex, estruturado em dois hemisférios cerebrais, é a sede da discriminação fina, do pensamento, da consciência. Contudo, ao contrário daquilo

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que se acreditou durante muito tempo, ele não desempenha um papel essencial no sono. O sono existia antes dele.

Os principais mecanismos do sono recorrem a estruturas antigas, que bloqueiam as estruturas mais recentes a fim de assegurar a estabilidade e a diferenciação do sono, em particular durante o sonho.

O arquencéfalo reveste-se, portanto, de uma grande importância na organização do sono. Ele desempenha o papel de centro coordenador e regulador das fibras aferentes e eferentes, exceto no sistema cortical dos mamíferos (Patten, 1953).

As paredes do terceiro ventrículo são, evidentemente, um lugar privilegiado de reunião de centros neurovegetativos para os comandos nervosos e secretores. Elas são essenciais à vida dos tecidos e ao equilíbrio bionergético. A peça principal desse território inventariado sob o termo diencéfalo é o hipotálamo, tendo acima a epífise (pineal) e abaixo a hipófise (Ranson, 1955).

Atrás do diencéfalo, a zona insular mesencefálica, irá, juntamente com a região da ponte e do bulbo, desempenhar um papel importante, até mesmo capital, no funcionamento do sono. Essa região, bastante complexa, merece atenção.

Portanto, o mesencéfalo é uma zona de passagem e, como tal, veicula as vias ascendentes, mas assegura também o trânsito das expansões da formação reticular (FR).

2.2.6.2 Hipóteses sobre os mecanismos do sono

As estruturas anatômicas dessas áreas apresentam um interesse tanto maior quanto é a sua interferência direta na produção do sono, ou mais exatamente na determinação do equilíbrio sono-vigília.

Van Economo (1930) chamou a atenção dos pesquisadores sobre essas estruturas. Nos anos 30, a exploração das informações do surto de encefalite epidêmica conduziu-o a relacionar o fenômeno da hipersonolência a lesões no hipotálamo. Conhece-se, já há bastante tempo, o fenômeno da sonolência persistente após a exérese de tumor da região meso-diencefálica. Ora, Van Economo propôs que o dano na substância cinzenta na junção mesodiencefálica seria o responsável pela doença letárgica. Quer se trate dos "sonolentos

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patológicos" ou dos "letárgicos" de Van Economo, o mecanismo de hipersonolência resulta de lesões mesodiencefálicas.

Van Economo formulou, portanto, a hipótese sobre um controle do estado de vigília e de sono, garantido por um "centro de vigília" mesodiencefálico, compensado por um "centro hipnótico", situado diante dele.

Assim, o arquencéfalo, além de suas funções de regulação vegetativa secretora, tornava-se também responsável por duas atitudes essenciais, a regulação da vigília e do sono, associada às atividades corticais.

Desde então, o mecanismo do sono pode ser interpretado como um processo de inibição, evoluindo por analogia da região interpeduncular mesencefálica para os centros nervosos sobre e subjacentes.

Existe, portanto, uma ligação estreita entre a existência de tais centros e o funcionamento dos centros neurovegetativos, entendendo-se que, durante o sono, os sistemas simpático e cérebro-espinhal encontram-se em repouso, enquanto o sistema parassimpático ocupa-se plenamente em contribuir para a reparação tissular e para a restauração energética.

Michael (1996) anulou a vigília e o ritmo circadiano através da supressão de todas as vias de estimulação sensorial e vegetativa até as primeiras cervicais.

2.3 Síndrome de apnéia obstrutiva do sono: quadro clínico e

diagnóstico

A palavra Apnéia provém do latim e significa “ausência de entrada de ar”. A Apnéia Obstrutiva do Sono é a condição definida por paradas repetidas e temporárias da respiração durante o sono. Esse distúrbio freqüentemente se associa a roncos. O ronco é causado pelo relaxamento excessivo dos músculos da garganta durante o sono, de modo que o fluxo de ar se torna parcialmente bloqueado. A vibração de estruturas da garganta (palato mole) na passagem estreitada resulta em ronco sonoro (Megirian et al, 1980).

As pessoas são mais propensas a roncar quando dormem de costas e respiram pela boca. Pessoas obesas são mais propensas ao ronco porque têm mais tecido adiposo no pescoço. Perda de tônus muscular também pode contribuir para o transtorno. O tônus muscular diminui com doenças, uso de álcool ou outras drogas

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(tais como tranqüilizantes e anti-histamínicos), ou simplesmente com a idade. Pessoas com nariz obstruído ou congestionado precisam fazer mais esforço para inalar, o que ocasiona maior pressão para empurrar os músculos da garganta e os fazem vibrar mais. É por isto que muitas pessoas roncam quando têm um resfriado ou alergia nasal, mas não em outras situações.

Transcorreu mais de um século desde que o novelista Charles Dickens descreveu, (em 1837), em The Posthumous Papers of the Pickwick Club, Joe, um criado de Mister Pickwick, como um jovem obeso, roncador e portador de uma incrível sonolência diurna. Sem sequer imaginar, estava realizando a primeira contribuição para a descrição de uma síndrome até este momento ainda não relatada na literatura médica.

O caminho transcorrido desde então nem sempre foi tranqüilo e fluido no esclarecimento da síndrome que hoje conhecemos como síndrome de apnéia do sono tipo obstrutivo (SASO).

Em 1918, Sir William Osler utilizou o termo “síndrome de Pickwick” para descrever um quadro clínico de obesidade e sonolência excessiva diurna. Burwel e col. completaram, em 1956, a descrição de tal síndrome, consistindo de obesidade, sonolência diurna excessiva, respiração periódica com hipoventilação alveolar, cianose, poliglobulina e cor pulmonale.

A associação entre síndrome de Pickwick e apnéia do sono só foi reconhecida quando Gastaut e col. (1965) observaram o aparecimento de episódios repetitivos de apnéias obstrutivas durante o sono nestes pacientes. Pouco tempo depois, Schwarts e col. (1967), utilizando a cinerradiologia, demonstraram o colapso da orofaringe durante as apnéias. Até aqui todas as investigações estavam focalizadas no estudo de pacientes com obesidade mórbida. Em 1972, Saloul e Lugaresi descreveram pela primeira vez episódios de apnéia do sono na ausência da síndrome típica de Pickwick.

Fujta e col. (1981) introduziram a uvulopalatofaringoplastia (UPFP), uma nova técnica cirúrgica para correção de anormalidades anatômicas da orofaringe nesses pacientes; e Sullivan (1981) abriu uma nova luz com a utilização de máscaras nasais de pressão positiva contínua de ar durante o sono, deixando de lado a traqueostomia, único tratamento efetivo até aquele momento.

A SASO é caracterizada por episódios repetitivos de obstrução da via aérea superior que ocorrem durante o sono, geralmente acompanhados da redução da

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saturação de oxiemoglobina. O ponto de colapso pode encontrar-se em níveis distintos que vão desde as fossas nasais até a porção inferior da hipofaringe.

Os critérios propostos para o diagnóstico da SASO requerem o mínimo de cinco apnéicos por hora de sono (10 nos idosos) e uma queda de saturação de oxiemoglobina que deverá ser superior a 4% (Gould, 1990).

De acordo com diversas estatísticas populacionais, a SASO tem uma prevalência situada entre 1% e 10%. Esta diferença se deve ao fato de a SASO aumentar consideravelmente com a idade. O pico de maior incidência se situa entre 40 e 60 anos, apesar de também ser encontrada em crianças e idosos (Bearpark, 1991; Lavie, 1983b).

A obstrução das vias aéreas superiores pode ser total (apnéia) ou parcial (hipopnéia). Convencionalmente, define-se apnéia do sono como uma parada na ventilação, maior ou igual a 10s de duração, e a hipopnéia como uma diminuição da ventilação até 50%, de igual duração que a anterior (Langevin et al, 1992). Ambas se acompanham de dessaturação de oxigênio e culminam com um microdespertar eletroencefalográfico, que definimos como "despertar breve” (Rechtschaffen et al, 1968).

O número de apnéias adicionado às hipopnéias por hora de sono, denominado índice de distúrbio respiratório (IDR), nos dá o total de eventos respiratórios, e é um bom preditor da severidade do quadro.

2.3.1 Classificação de apnéias do sono

Quadro 1 - Divisão dos Tipos de Apnéia

Obstrutivas

Parada do fluxo aéreo buconasal com persistência do esforço ventilatório (diafragmático). Manifesta a existência de componente obstrutivo das vias aéreas superiores.

Centrais

Ausência total de fluxo aéreo buconasal e de esforço ventilatório por inibição do centro respiratório.

Mistas

Apnéia que começa com o padrão central, que logo muda para o padrão obstrutivo.

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2.3.1.1 Apnéia do Sono Obstrutiva

A Apnéia do Sono Obstrutiva é caracterizada por repetidas pausas na respiração durante o sono, devido à obstrução e/ou colapso da via respiratória superior (garganta), normalmente acompanhada da redução da saturação de oxigênio no sangue e seguido por um despertar para respirar (Adair et al, 1991). Isto é chamado de um evento de Apnéia. O esforço respiratório continua durante o episódio de Apnéia. Uma analogia pode ajudar a entendê-la: ASO é semelhante a pôr sua mão sobre o tubo do aspirador de pó. Sua mão bloqueia todo o ar que entra (colapso da via aérea superior), muito embora o aspirador continue aplicando sucção (esforço respiratório continua). O aspirador normalmente é exigido um pouco mais neste momento, e assim faz o corpo humano.

2.3.1.2 Apnéia do Sono Central

A Apnéia do Sono Central é definida como uma condição neurológica que causa a parada de todo o esforço respiratório durante o sono, normalmente com o decréscimo da saturação de oxigênio no sangue (Greenberg et al, 1987). Voltando à analogia do aspirador de pó: Apnéia do Sono Central pode se comparar ao puxar o plug do aspirador da tomada. Sem energia, sem sucção. Se o centro de comando que controla a respiração "desliga" não há esforço respiratório nem respiração. A pessoa é despertada por um reflexo automático de respiração e no final acaba dormindo muito mal. Note que a ASC, que é uma desordem neurológica, é muito diferente na causa da ASO, que é um bloqueio físico, ainda que os efeitos sejam muito similares.

2.3.1.3 Apnéia do Sono Mista

Apnéia do Sono Mista, como o nome sugere, é uma combinação dos outros dois tipos de Apnéia. Um episódio de Apnéia Mista normalmente inicia-se com um componente central, para depois tornar-se obstrutiva. Geralmente o componente central da Apnéia torna-se menos problemático, uma vez tratada a Apnéia

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obstrutiva. .

O ronco é um dos principais sintomas dos pacientes com síndrome de apnéia do sono tipo obstrutiva, ocorrendo em 95% dos casos. É mais freqüente no sexo masculino e sua intensidade aumenta com a idade e com o peso excessivo (Partiner et al, 1988).

A sintomatologia clínica que se observa nos pacientes com síndrome de apnéia do sono tipo obstrutiva tem a particularidade de mostrar alguns sintomas que se manifestarão exclusivamente durante o sono (por exemplo, apnéia, ronco), além da sonolência diurna com o paciente em vigília.

A sonolência excessiva diurna é outro importante sintoma dos pacientes com síndrome de apnéia do sono tipo obstrutiva. A sonolência excessiva diurna ou hipersenia manifesta-se no início como uma tendência fácil a adormecer em situações monótonas, como ler ou ver televisão; os pacientes costumam referi-la como um "esgotamento" ou "cansaço" raramente como sonolência. Em casos mais graves, o indivíduo pode dormir enquanto dirige ou trabalha, podendo provocar graves acidentes.

A Polissonografia - PSG, método ideal para o diagnóstico dos distúrbios do sono, utiliza-se da análise do registro gráfico dos sinais captados pelos diversos sensores usados para este exame (Nunes, 1994):

EEG - Eletrencefalograma, ECG - Eletrocardiograma, EOG - Eletrooculograma, EMG - Eletromiograma, FAN - Fluxo Aéreo Nasal,

SO2 - Saturação de Oxigênio, Movimentos Respiratórios (cinta torácica) e movimentos Periódicos dos Membros.

A Polissonografia - PSG, além de permitir o diagnóstico preciso dos distúrbios do sono, auxilia ainda a instituir uma terapêutica adequada (Carskadon et al.1989).

Além de uma certa predisposição hereditária, a SASO atinge com maior intensidade a população masculina na relação de 10:1. Relação que se iguala quando comparada com mulheres pós-menopausa.

A SASO ocorre em aproximadamente 30% das patologias estudadas em laboratórios do sono (Coleman et al, 1982).

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Estudos com fluoroscopia, fibra óptica e tomografia axial computadorizada (TAC) mostram orofaringe e a hipofaringe como lugares mais freqüentes de obstrução a. (Hudgel, 1988. Surrat, 1983). Esses métodos permitiram comparar indivíduos normais com pacientes com SASO, encontrando-se nos últimos uma clara diminuição do calibre orofaríngeo em comparação aos controles normais.

A oclusão das vias aéreas superiores se agrava, na maioria dos casos, por alterações anatômicas locais. Elas somam-se nesses pacientes, a fatores dinâmicos, como o colapso das paredes laterais da orofaringe, a descida da língua sobre o véu palatino e a faringe e o fechamento concêntrico da hipofaringe, durante o sono, diminuindo ainda mais a luz do espaço aéreo (Rajewski et al, 1982).

Figura 2 - Entrada Normal de Ar

Fonte: http:/www.nib.unicamp.br/sbp7/apneiasompq.html Acesso em 19/03/99

Figura 3 - Obstrução na Entrada do Ar

Fonte: http:/www.nib.unicamp.br/sbp7/apneiasompq.html Acesso em 19/03/99

O bom funcionamento da via aérea superior depende, normalmente, do equilíbrio dinâmico entre as forças de dilatação, a atividade tônica e fásica dos dilatadores faríngeos e as forças de colapso (Remmers, 1978).

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superiores, ou seja, a pressão intraluminal negativa produzida pela cintração diafragmática, supera a dos músculos dilatadores orofaríngeos. O esforço respiratório realizado para vencer a obstrução somente consegue agravar a oclusão, ao aumentar a pressão de sucção. A pressão de sucção é diretamente proporcional à velocidade do fluxo aéreo (determinado perlo calibre das vias aéreas superiores e o esforço inspiratório) e inversamente proporcional ao calibre das vias aéreas superiores (Block et al, 1984).

A cada parada de entrada do ar (apnéia), se produz hipoxemia, hipercapnia e acidose, a qual provoca por estimulação central um despertar breve. Esse breve despertar traz junto, a abertura da orofaringe e a volta da respiração, voltando aos valores basais a gasometria no sangue e a pressão arterial.

Quando volta o sono, os músculos da orofaringe mais uma vez relaxam, e todo o processo inicia novamente, podendo repetir-se centenas de vezes por noite. Deduz-se do exposto uma baixa eficiência do sono, que terá como conseqüência direta a sonolência diurna.

O aumento da resistência das vias aéreas superiores durante o sono é mais importante quando existe uma obstrução anatômica. Todas as causas que reduzem a atividade das vias aéreas superiores poderão produzir apnéias (Lavie, 1983a).

A sintomatologia clínica que se observa nos pacientes com SASO tem a particularidade de mostrar alguns sintomas que se manifestarão exclusivamente durante o sono (por exemplo, apnéia, ronco) e outros, em troca, como a sonolência, aparecerão alterando o comportamento diurno.

2.3.2 Sintomas noturnos

O ronco é um ruído predominantemente inspiratório causado pela vibração dos tecidos moles da orofaringe; traduz a existência de uma obstrução da via aérea superior (VAS) (Lugaresi et al, 1989). O importante é diferenciar o ronco suave e contínuo do ronco pesado e cíclico. O primeiro corresponde a um ruído inspiratório de igual amplitude para cada ciclo (40-60 ciclos/s) e, em geral, não representa demasiado risco. Em pacientes com SASO, por outro lado, o ronco é cíclico e intermitente, podendo alcançar 85 dB (1.000 a 3.000 ciclos/s) (Millman, 1987). A elevada intensidade do nível de ruído é o principal responsável pela utilização de

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dormitórios separados entre os cônjuges.

Uma série de roncos seguidos por um silêncio respiratório (apnéia ou hipopnéia) terminando com uma expiração explosiva e, por vezes, com vocalização e um despertar breve com movimento do corpo é a clara descrição do ronco de um paciente com SASO.

Estudos epidemiológicos demonstram que os roncadores habituais sofrem mais freqüentemente de hipertensão arterial sistêmica, (Koskenvuo,1985. Mondini, 1983) apresentando maior predisposição para a isquemia cardíaca e cerebral. Em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica, a SASO pode alterar dramaticamente o equilíbrio ventilatório noturno (Perez-Padilla et al, 1985).

2.3.2.1 Sono noturno

O sono noturno do paciente com SASO se acompanha, em geral, de uma atividade motora normal, a qual dá a característica de um sono inquieto. Esta atividade pode incluir movimentos periódicos das pernas, movimentos bruscos, abalos das mãos ou dos pés.

É freqüente que os pacientes com SASO refiram vários despertares noturnos, em alguns casos com sensação de asfixia ou afogamento, criando angústia. Outros sintomas descritos com freqüência nítida incluem comportamento automático, enurese (mais comum em crianças), noctúria,, transpiração excessiva, saliva sanguinolenta, refluxo gastroesofágico. Este último é associado ao esforço e ao aumento da pressão intra-abdominal necessários para restabelecer a respiração (Guilleminault et al, 1976).

2.3.3 Sintomas diurnos

2.3.3.1 Sonolência excessiva diurna

A sonolência excessiva diurna, junto com o ronco, é o sintoma principal dos pacientes com SASO. A sonolência excessiva diurna ou hipersônia se manifesta no início como uma tendência fácil a adormecer em situações monótonas, como ler ou

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ver televisão; os pacientes costumam referi-la como um "esgotamento" ou "cansaço", raramente como sonolência. Em casos mais graves, podem dormir sobre o volante enquanto dirigem ou no trabalho, provocando acidentes de importância (Findley, 1988. Lavie,1983b).

A sonolência excessiva diurna, presente em 80% dos pacientes com SASO, é a conseqüência de um sono noturno fragmentado e interrompido constantemente pelas apnéias ou microdespertares. Tais eventos impedem que se consolide o sono, sendo freqüente encontrar ausência de sono lento profundo (estágios 3 e 4) e alterações de REM. É por isso que os pacientes sentem, ao despertar pela manhã, que não descansaram adequadamente, pois o sono não foi reparador (Bradley et al, 1992).

A sonolência excessiva diurna pode ser acompanhada de comportamentos automáticos, principalmente pela manhã, tais como: amnésia retrógrada, dificuldade na concentração, deterioração da memória e, por vezes, do raciocínio (Greenberg et al,1987; Scheltens et al, 1991). Também foram descritas mudanças de personalidade, como agressividade, ataques de ira, irritabilidade, ansiedade e depressão. As cefaléias matinais de predomínio frontal estão presentes na metade dos pacientes. Há uma diminuição da libido e até a impotência apresenta-se em 20% a 40% dos pacientes com SASO (Guilleminault, 1989b). Recentemente tem-se descrito a presença da sonolência excessiva diurna em roncadores sem apnéias, na síndrome de resistência das vias aéreas superiores (Guilleminault et al, 1977).

2.3.4 Conseqüências hemodinâmicas da SASO

A resposta hemodinâmica à asfixia (apnéia) é muito complexa e a sobrevida dependerá da capacidade da reação cardíaca e cerebral à hipóxia, hipercapnia e acidose.

2.3.4.1 Hipoxemia associada à apnéia

Cada episódio apnéico está associado a uma queda transitória da saturação arterial de oxiemoglobina (SatO2).

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a ventilação, desencadeando uma asfixia progressiva. Observa-se, então, uma queda rápida da SatO2 com aumento da tensão de dióxido de carbono, que voltará

aos níveis basais ao finalizar a apnéia. O grau de hipoxemia dependerá da pressão de oxigênio basal e da capacidade funcional residual (CFR) de cada indivíduo (Shepard et al, 1985). Em pacientes obesos, a CFR diminui ao se adotar o decúbito dorsal e isso faz com que a hipoxemia ocorra com maior rapidez. As maiores hipoxemias estão associadas ao sono REM, coincidindo com as apnéias mais prolongadas. Pacientes com índice de peso normal raramente apresentam dessaturações abaixo de 85%.

2.3.4.2 Arritmias cardíacas

A associação das arritmias cardíacas às apnéias do sono são freqüentes (Tilkian et al, 1977). Durante a apnéia, se produz um incremento da atividade eferente parassimpática vagal, a qual se traduz em uma bradicardia que pode descer até 50% do nível pré-apnéia. Ao finalizar a apnéia e restaurar a ventilação se produz uma taquicardia compensatória (Guilleminault et al, 1986).

Dois tipos diferentes de arritmias cardíacas costumam acompanhar as apnéias (Bradley et al, 1990). As mais freqüentes são a braditaquicardia, bloqueio atrioventricular de segundo grau, parada sinusal de 2, 3 a 13s de duração, fibrilação auricular e taquicardia ventricular (Guilleminaul et al, 1983).

As extra-sístoles ventriculares (PVC) se manifestam quando a dessaturação de oxiemoglobina desce abaixo de 70%. Pode haver prolongamento do intervalo Q-T, especialmente durante a bradicardia (Guilis et al,1991; Shepard, 1985).

Pelo fato de as apnéias se associarem com as arritmias de graus variados de severidade, os pacientes com SASO têm risco maior de mortalidade cardiovascular (Shepard, 1990).

2.3.4.3 Hipertensão arterial sistêmica e pulmonar

Durante o sono normal, a pressão arterial sistêmica desce entre 10% e 15%; a maior redução ocorre durante o sono não-Rem (NREM, estágios 3 e 4) (Khatri et al, 1967). As flutuações do estado ácido-básico durante as apnéias provocam

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importantes mudanças hemodinâmicas.

As pressões arterial sistêmica e pulmonar sobem simultaneamente a cada apnéia, dependendo do nível de incremento do grau de dessaturação da oxiemoglobina (Tilkian et al, 1976). Quando se restaura a ventilação, as pressões voltam, em geral, aos níveis basais. Sem dúvida, se os episódios apnéicos se sucedem um após o outro, ambas as pressões aumentam rapidamente, sem poder retornar à linha de base, já que os intervalos entre as apnéias não são suficientes.

A repetição cíclica de tais episódios de hipertensão arterial sistêmica e pulmonar contribui para a hipertrofia ventricular e levam à insuficiência cardíaca. Dos pacientes com SASO, 50% desenvolvem hipertensão arterial sistêmica em vigília; em 30% dos pacientes diagnosticados como hipertensos essenciais tem sido encontrada apnéia do sono (Fletcher et al, 1985).

Não se sabe ao certo a patogênese da hipertensão arterial sistêmica nos pacientes com SASO, mas provavelmente é secundária à interação de múltiplos fatores. A obesidade, o sexo masculino e o aumento da atividade simpática são fatores contribuintes. Recentemente, foi descrito o aumento de catecolaminas plasmáticas e urinárias em pacientes com SASO e hipertensão arterial sistêmica, cujos valores se normalizam logo após a traqueostomia (Guilleminault et al, 1981).

2.3.7 Avaliação do paciente com SASO

Por ser esta síndrome polissintomática e comprometer diferentes órgãos da economia, o paciente com SASO deve ser submetido a um exame clínico geral que inclua a avaliação da via aérea superior, provas pneumológicas, exames cardiológico, neurológico e hematológico. O paciente com SASO será avaliado tanto desperto como dormindo.

A obesidade é um dos principais fatores agravantes da enfermidade e por isso deverá ser avaliada a distribuição do tecido adiposo, prestando especial atenção a infiltração no pescoço, abdome e tórax (Horner et al, 1989). Também é útil a avaliação do índice de massa corporal (IMC). Em 75% dos pacientes com SASO encontra-se peso acima de 20% do ideal (Walsh et al, 1972). A mulher com SASO tende a apresentar um excesso de peso maior do que o homem. Observa-se, com freqüência, que pequenas reduções do peso corporal trazem grandes

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mudanças na sintomatologia, principalmente a reversão da sonolência diurna.

2.3.7.1 Avaliação da Região Oronasomaxilofacial

Realiza-se, em primeiro lugar, um exame do maciço craniofacial em busca de micrognatia ou retrognatia. São utilizadas as mediações cefalométricas. Deve-se fazer, também, a exploração exaustiva das cavidades orofaríngea e nasal, com o objetivo de avaliar consistência e tamanho da língua (macroglossia), comprimento e coloração da úvula, hipertrofia de adenóide ou de amígdala, aspecto e consistência do palato mole, obstrução de cavidade nasal, podendo haver desvio de septo (Guilleminault, 1989a).

Pode-se complementar a exploração das vias aéreas superiores com a visualização endoscópica com fibroscopia óptica, reflexão acústica, TAC ou ressonância nuclear magnética (RNM), que dão dados sobre o local de obstrução.

2.3.7.2 Álcool e Sedativos

A ingestão de álcool, horas antes do adormecer, pode desencadear apnéia em roncadores benignos e provocar um aumento na duração e freqüência das apnéias com pacientes com SASO. As benzodiazepinas apresentam um efeito semelhante. Ambos os fatores atuam produzindo uma depressão da atividade dos músculos de vias aéreas superiores (Scrima et al, 1982).

Devemos sempre buscar as etiologias específicas que predispõem ou contribuem para o aparecimento de SASO.

Obstrução das vias aéreas superiores:

a) Nasal: desvio de septo, hipertrofia de cornetos, rinite, hipertrofia adenóide; b) Orofaringe: úvula larga e pendular, hipertrofia amigdaliana, hipertrofia celopalatina, macroglossia, tumores ou cistos faríngeos;

c) Anomalias craniofaciais e esqueléticas: Micrognatia, retrognatia, Síndrome de Pierre Robin Arnod-Chiari, Cifoescoliose.

Alterações neurológicas e musculares: Siringomielia-seringobulbia, Enfermidade de motoneurônios, Miastenia grave, Distrofia muscular, Miopatias.

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Willy, amiloidose, obesidade.

Figura 4 - Remodelamento do Palato Mole

Figura mostrando o remodelamento do palato mole através dos raios laser de CO2.

2.3.8 Avaliação do paciente dormindo

2.3.8.1 Polissonografia Noturna

Quando se suspeita de SASO, a única confirmação diagnóstica se dará através do registro polissonográfico noturno. Além dos parâmetros poligráficos habituais (eletroencefalograma, eletrooculograma, eletromiografia), (Guilleminault et al, 1976) se deve incluir no registro: eletrocardiograma (ECG), termistores que determinarão o fluxo aéreo buco-nasal, cinturão toracoabdominal, que marcará a presença ou ausência do esforço ventilatório, monitorização oximétrica e atividade eletromiográfica (RMG) dos músculos tibiais anteriores, que colocarão em evidência os movimentos periódicos das pernas (Rechtschaffen et al, 1968).

É importante verificar o decúbito em que se produzem as apnéias, já que a posição supina aumenta o índice de apnéias e esse dado pode ser de valor para o tratamento.

O registro polissonográfico noturno permitirá avaliar: tipo, freqüência e duração das apnéias e/ou hipopnéias; características do ronco; grau de

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dessaturação de oxigênio; avaliação das arritmias cardíacas; fragmentação do sono; severidade do quadro.

As apnéias são encontradas com maior freqüência nos estágios 1 e 2 do sono NREM e durante o sono REM. Em alguns casos, serão manifestas somente durante o sono REM, e é neste estágio que as apnéias obstrutivas são mais severas e a SatO2 chega aos níveis mais baixos (Greenberg et al, 1987). Não se aconselha

avaliar o estágio da sesta, pois o REM predomina ao final da noite, entre as 3 e 6 horas, correndo o risco de perder seu registro, e consequentemente, um dado de valor.

Os pacientes apnéicos dificilmente alcançam os estágios profundos de sono (estágios 3 e 4, devido aos despertares breves ou longos que freqüentemente acompanham as apnéias).

A determinação do grau de severidade da SASO se dará pelos índices obtidos na polissonografia junto à avaliação clínica do paciente.

2.3.9 Curso da enfermidade

O término espontâneo da SASO pode ocorrer algumas vezes com a diminuição do peso, mas geralmente segue um curso progressivo e pode ser causa de morte prematura (Browman et al, 1984). O estudo de seguimento de pacientes com SASO durante cinco anos mostra uma taxa de mortalidade de 11% e 13% para os não tratados.

2.3.9.1 Perfil do portador

Esta doença tem uma certa predisposição familiar, sendo mais freqüente no sexo masculino e em indivíduos com excesso de peso. O ronco geralmente se associa com elevada prevalência; contudo, em algumas ocasiões, pode estar ausente. Acredita-se que a apnéia do sono afeta mais de 5% das mulheres e 15% dos homens na faixa etária entre 30 e 60 anos e que 19% das mulheres e 34 % dos homens que habitualmente roncam padecem deste distúrbio. A apnéia obstrutiva do sono é tão prevalente quanto a asma no adulto, contudo, aproximadamente 95% dos pacientes não são adequadamente diagnosticados e tratados.

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