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JOINT VENTURE EMBRAER E BOEING:

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Academic year: 2022

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JOINT VENTURE EMBRAER E BOEING:

uma visão sistêmica

Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia.

Orientador: Cel Engº R/1 Osvaldo Alburquerque Fonseca.

Rio de Janeiro 2020

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C2020ESG

Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitida a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa.

Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG.

_________________________________

ROGÉRIO FABIANO SCHIFFLER

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Elaborada pela bibliotecária Patricia Imbroizi Ajus – CRB-7/3716 S333j Schiffler, Rogério Fabiano

Joint Venture Embraer e Boeing: uma visão sistêmica unificada / Coronel Aviador Rogério Fabiano Schiffler.- Rio de Janeiro: ESG, 2020.

74 f.

Orientador: Cel Engº R1 Osvaldo Albuquerque Fonseca.

Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos Política e Estratégia (CAEPE), 2020.

1. Indústria aeronáutica - Brasil. 2. Base industrial de Defesa. 3.

Embraer. 4. Acordos comerciais. I. Título.

CDD – 382.9

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A minha gratidão, em especial à minha esposa Carla e aos meus filhos Rodolpho e Rômulo, pela compreensão e incentivos, como resposta aos períodos de minhas ausências em dedicação às atividades da Escola Superior de Guerra, em um momento tão particular da história da humanidade.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus professores de todas as épocas por terem sido responsáveis por parte considerável da minha formação e do meu aprendizado.

Aos estagiários da Turma CAEPE 2020 – Antártica: novos horizontes - pelo convívio harmonioso e pela intensa conectividade em todos os momentos.

Ao Corpo Permanente da ESG, em especial ao meu orientador Cel Eng R/1 Osvaldo Alburquerque Fonseca, pelos ensinamentos e orientações que nos inspiram a refletir sobre a importância de se perceber as potencialidades do Brasil no sentido de transformar, através da sabedoria do livre arbítrio e da responsabilidade, o processo de evolução do nosso povo.

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“Quanto mais estudamos os principais problemas de nosso tempo, mais percebemos que eles não podem ser entendidos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e interdependentes.”

Fritjof Capra

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RESUMO

Esta monografia aborda o ato de concentração entre as fabricantes Embraer e Boeing como resultado de uma estratégia para galvanizar as carteiras de produtos e serviços complementares no mercado de produção de aeronaves civis e militares. O objetivo deste estudo é compreender os fatores que motivaram a empresa brasileira Embraer a negociar o acordo de joint venture com a Boeing para a criação de duas novas empresas, onde haveria participação majoritária da companhia americana. A metodologia adotada fundamentou uma pesquisa bibliográfica e documental, tendo como fontes primárias as obras sobre a teoria da conectividade e a teoria dos sistemas complexos, com a complementação das informações através de relatórios, audiências, apresentações e laudos técnicos. O campo de estudo da pesquisa foi focado na empresa Embraer e, em razão das drásticas mudanças ocorridas no contexto econômico global durante o primeiro semestre do ano de 2020, delimitou-se aos resultados das negociações entre as empresas Embraer e Boeing até a assinatura do Acordo Global de Operações, firmado no dia 24 de janeiro de 2019. Também não foram alvos deste trabalho os impactos desses entendimentos no mercado de aeronaves comerciais de grande porte, acima de 150 assentos. O trabalho de pesquisa discorre, inicialmente, sobre o histórico da empresa Embraer, destacando o protagonismo da Força Aérea Brasileira na sua criação e a importância do seu processo de privatização. Em seguida, explora as características do mercado aeronáutico, especificamente o de aeronaves comerciais de corredor único, de até 150 assentos, e o da aeronave KC-390 Millennium. Por último, analisa as especificidades do acordo comercial em questão, que teve como objetivo a realização de duas operações interdependentes - a primeira, para a criação de uma nova empresa (JV Aviação Comercial), a ser fundada em solo brasileiro, em que a subsidiária da empresa americana Boeing com sede no Brasil comporia 80% do capital social e a Embraer os demais 20%; e a segunda, para a criação de uma outra nova empresa (JV KC-390), a ser fundada em solo brasileiro, em que a Embraer teria 51% do capital social e a Boeing 49%. Por fim, a conclusão sinaliza a importância do processo de privatização da Embraer para a emergência de uma nova estrutura que será crítica para fundamentar a empresa como um dos maiores players no mercado global de produção de aeronaves e identifica as razões que os fatores que motivaram as diligências para o ato de joint venture.

Palavras-chave: Indústria Aeronáutica – Brasil. Base Industrial de Defesa. Embraer.

Acordos comerciais.

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ABSTRACT

This monography addresses the merger between the manufacturers Embraer and Boeing, as a result of a strategy aimed to galvanize their portfolios of products and complementary services in the market of the production of civil and military aircrafts.

This study has the objective of comprehending the factors that motivated the Brazilian company Embraer to negotiate a joint venture deal with Boeing for the creation of two new companies, where the american company would have a majority participation.

The methodology adopted was based on bibliographic and documental research, with texts about connectivity and complex systems theory as primary sources, complemented by data found in reports, hearings, presentations, and technical opinions. The research study field was focused on the Company Embraer; and due to the drastic changes that occurred in the global economic context during the first two quarters of 2020, the results were limited to the negotiations between Embraer and Boeing until the Master Transaction Agreement signature on January 24, 2019. This work has also not included the impacts of these understandings in the large size commercial aircrafts market, above 150 seats. The research starts with the history of the company Embraer, highlighting the prominence of the Brazilian Air Force in its creation, and the importance of its privatization process. Henceforth, it explores the characteristics of the aeronautical market, specifically the single-aisle commercial aircrafts, up to 150 seats, and the KC-390 Millennium aircraft. Last, it analyses the specificities of the joint venture in question, which had the aim of creating two interdependent operations – the first for the creation of a new company (JV Aviação Comercial), to be founded in Brazilian territory, in which the American Boeing subsidiary with headquarters in Brazil would compose 80% of its social capital, and Embraer the other 20%; and the second operation for the creation of a new company (JV KC-390) to be started in Brazilian territory, in which Embraer would have 51% of the social capital, and Boeing the other 49%. The conclusion highlights the importance of the process of privatization of Embraer for the origin of a new structure that will be critical to underlie the company as one of the big players in the aircraft manufacturing market, and identifies the reasons for the factors that motivated the diligences leading to the act of joint venture.

Keywords: Aeronautical Industry - Brazil. Defense Industrial Base. Embraer.

Commercial agreements.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Conceitos para a compreensão do relacionamento entre empresas...16

Figura 2 - Diagrama de possibilidades......20

Figura 3 - Diagrama de bifurcação de um sistema não linear...22

Figura 4 - Maquete e construção do CTA e o professor Smith...25

Figura 5 - Entrada da Embraer...26

Figura 6 - EMB-110 Bandeirante...28

Gráfico 1 - Evolução do faturamento: 1970-1994...34

Gráfico 2 - Faturamento por empregado (US$ mil)...37

Figura 7 - Número de passageiros transportados...39

Figura 8 - Número de pares de cidades interligadas e preço da tonelada transpor- tada por quilômetro...40

Figura 9 - Previsão de novas aeronaves no mercado global...44

Figura 10 - Previsão de distribuição de aeronaves por categorias...45

Figura 11 - Disponibilidade de assentos Ejets da Embraer...45

Figura 12 - Cenário competitivo entre aeronaves e fabricantes...46

Figura 13 - Comparativo de aeronaves e fabricantes...46

Figura 14 - Custo operacional comparativo entre a família Ejets e a família A220...47

Figura 15 - Previsão de mercado global para aeronaves até 150 assentos por con- tinente...47

Figura 16 - Distribuição do mercado de aeronaves de até 150 assentos no final de 2018...48

Gráfico 3 - Pedidos e entregas de aeronaves comerciais da AIRBUS e Boeing entre 1989-2019...49

Figura 17 - Aeronave KC-390 Millenium...50

Figura 18 - Receita Líquida da Embraer por semento e região...51

Figura 19 - Distribuição da receita de Segurança e Defesa por projeto 2017 – 2018...52

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Figura 20 - Distribuição de clientes no segmento segurança e defesa...52

Figura 21 - Payload versus preços dos concorrentes do KC-390...53

Figura 22 - Visão geral do mercado para o KC-390...53

Figura 23 - Composição da estrutura acionária da Embraer...55

Figura 24 - Modelo da parceria Embraer e Boeing...56

Figura 25 - Projeção de mercado para as aeronaves E-Jets...57

Figura 26 - Acervo estimado JV Aviação Comercial...59

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Projetos de aeronaves da Embraer nos anos 70 e 80...31 Tabela 2 - Evolução tecnológica dos equipamentos de voo – 1950, 1985 e 2004...40 Tabela 3 – Pedidos (P) e entregas (E) das aeronaves concorrentes...48

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LISTA DE SIGLAS

BID Base Industrial de Defesa

CAEPE Curso de Altos Estudos Política e Estratégia CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica CNPJ Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica

CTA Centro Tecnológico da Aeronáutica EFL Embraer Finance Limited

EMBRAER Empresa Brasileira de Aeronáutica ESG Escola Superior de Guerra

EU European Union

EUA Estados Unidos da América FAA Federal Aviation Administration FAB Força Aérea Brasileira

FMS Foreign Military Sales

GSI Gabinete de Segurança Institucional IATA International Air Transport Association ITA Instituto Tecnológico da Aeronáutica JV Joint Venture

LCC Low Cost Carrier

LLC Limited Liability Company MTA Master Transaction Agreement NM Nautical Mile

OACI Organização Internacional da Aviação Civil OMC Organização Mundial do Comércio

RTK Revenue Tonne Kilometers

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...12

2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS...16

3 A EMBRAER...24

4 O MERCADO AERONÁUTICO...39

4.1 A fabricação de aeronaves...40

4.2 O processo de aquisição de aeronaves...42

4.3 O mercado de aeronaves comerciais de corredor único...44

4.4 O mercado da aeronave KC-390 Millennium...49

5 JOINT VENTURE EMBRAER E BOEING...55

5.1 Joint venture Aviação Comercial...57

5.2 Joint venture KC-390 Millennium...59

6 CONCLUSÃO...61

REFERÊNCIAS...65

GLOSSÁRIO...69

ANEXO A - DECRETO-LEI DE CRIAÇÃO DA EMBRAER......71

ANEXO B - ESTATUTO SOCIAL DA EMBRAER (P. 4)...73

ANEXO C - NOTA À IMPRENSA – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA...74

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1 INTRODUÇÃO

Um dos maiores desafios para uma empresa que atua em um mercado extremamente competitivo e especializado, como é o caso da indústria aeronáutica, é justamente ter a visão estratégica de como estruturar o desenvolvimento e a produção de produtos e serviços que possuam vantagens mercadológicas no âmbito global.

Nesse sentido, a empresa Embraer, criada por iniciativa do Governo Federal no dia 19 de agosto de 1969 e fundada em 2 de janeiro de 1970, foi o resultado de um projeto idealizado pela Força Aérea Brasileira (FAB) para desenvolver a indústria aeronáutica no território brasileiro. Ao longo da sua história, a empresa vivenciou alguns marcos decisivos, que a tornaram uma referência mundial na fabricação de aeronaves.

Na sua origem, vinculada ao então Ministério da Aeronáutica, a Embraer foi criada sob o regramento da capitalização mista; ou seja, além do aporte de recursos públicos, foi permitida e incentivada a participação de capital privado na sua fundação.

Entretanto, em razão dos riscos que envolviam o projeto naquela época, houve pouca participação do empresariado brasileiro. Consequentemente, o governo federal permaneceu como sócio majoritário da companhia desde a criação até o momento da sua privatização.

A abertura de capital da Embraer, que ocorreu no ano de 1994, foi um dos maiores marcos de mudança estrutural da sua história. A partir dessa reestruturação acionária, uma nova visão empresarial emergiu; a companhia passou a ser gerenciada por um Conselho de Administração que, desde o início, teve a missão de estabelecer a orientação geral dos negócios e decidir sobre as questões estratégicas. No ato da privatização, o governo federal vendeu praticamente todas as ações, permanecendo apenas na qualidade de titular da ação de classe especial, conhecida como golden share. Com essa nova configuração, o Estado brasileiro deixou de ser o principal acionista, porém permaneceu com o poder de veto nas principais decisões. A União reduziu a sua influência na gestão, mas ficou com o direito de eleger um membro efetivo do Conselho de Administração, que é composto de, no mínimo, 9 e, no máximo, 11 membros eleitos pela Assembleia Geral; sendo que dois desses membros efetivos são eleitos pelos empregados, em votação em separado.

Atualmente, a Embraer é formada por um grupo de empresas com atuação global, dentre as quais, a unidade da aviação comercial disputa a liderança no

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mercado de jatos comerciais de até 150 lugares. Segundo os dados do Ministério da Economia, é a maior empresa brasileira exportadora de bens agregados de alto valor.

Atuando principalmente nos segmentos da aviação comercial, executiva e militar, opera com uma força de trabalho que totaliza mais de 18.000 colaboradores, distribuídos por 28 diferentes localidades no Brasil e no exterior.

Entretanto, no embate pela conquista de uma fatia maior do mercado, no ano de 2017 a empresa multinacional europeia AIRBUS, atualmente a maior fabricante de aeronaves comerciais do mundo, adquiriu os direitos de produção das aeronaves CS100 e CS300, ambas projetos da empresa canadense Bombardier. A fusão teve como objetivo principal permitir à AIRBUS uma entrada agressiva no mercado de aeronaves comerciais de até 150 lugares. O consórcio europeu inclusive construiu uma fábrica nos Estados Unidos da América (EUA) específica para produzir e ofertar essas aeronaves com “origem” americana.

De acordo com o relatório anual da Embraer do ano de 2018, o mercado de aeronaves comerciais correspondeu a 47% das receitas da Embraer, sendo que o mercado estadunidense contribuiu com 59% dessas aquisições.

O resultado da união entre a AIRBUS e a Bombardier desequilibrou diretamente o mercado de aeronaves comerciais de corredor único de até 150 lugares, em que a Embraer atualmente disputa a liderança. Indiretamente, também houve reflexos no mercado de aeronaves de grande porte, em que a Boeing opera diretamente rivalizando com a AIRBUS.

No sentido de se contrapor a esse novo cenário, no ano de 2019, as fabricantes Embraer e Boeing firmaram um memorando de entendimento com a intenção de criar duas novas empresas, através da modalidade de joint venture. Uma empresa, fundada em solo brasileiro, que seria responsável por produzir e comercializar o segmento de aeronaves comerciais, ora produzidas pela Embraer – a Família Ejets; e a outra empresa seria habilitada a finalizar a fabricação, em solo americano, da aeronave KC-390 Millennium e comercializá-la no mercado global.

Procurando justamente entender a dinâmica dessas fusões no mercado aeronáutico, o objetivo geral desta pesquisa é compreender que fatores motivaram a empresa Embraer a negociar em favor da criação dessas duas novas empresas, em que haveria participação majoritária da fabricante americana Boeing. Para tanto, como forma de orientar o caminho a ser seguido pelos estudos, foram contemplados os seguintes objetivos intermediários.

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a) Com base nos fundamentos teóricos, identificar as características e as vantagens da concentração econômica do tipo joint venture para as empresas.

b) Identificar a importância da participação estatal, através da FAB, na criação da empresa Embraer.

c) Analisar os impactos da privatização na gestão da Embraer.

d) Compreender as particularidades no processo de fabricação e aquisição de aviões.

e) Dimensionar as projeções para o mercado de aeronaves regionais e para o mercado da aeronave KC-390 Millennium.

f) Analisar as especificidades da joint venture entre as empresas Embraer e Boeing.

A presente pesquisa foi conduzida de modo exploratório e com vistas a descrever os eventos mencionados acima, pois a intenção foi reconhecer os fatores que motivaram o processo de negociação a partir da ótica da empresa Embraer, analisando-os sob uma perspectiva sistêmica global, de acordo com as percepções adquiridas no âmbito das relações comerciais. Trata-se de um estudo de caso com pesquisa bibliográfica e documental

Na verificação dos elementos conceituais foram ressaltadas como fontes primárias as obras sobre a teoria da conectividade, abordada por Khrana (2016), a teoria dos sistemas complexos, estudada por Capra e Luisi (2019), gestão empresarial, livros de história, matérias de jornais e revistas especializados, bem como teses relacionadas ao tema. A pesquisa também foi documental porque, a partir da análise bibliográfica, as informações foram complementadas e validadas por relatórios, audiências, apresentações e laudos técnicos elaborados pelas empresas Embraer e Boeing e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).

As informações e dados obtidos foram organizados e filtrados de forma a permitir um encadeamento lógico dos fatos, que resultou na percepção sistêmica dos fatores que motivaram a empresa brasileira Embraer a negociar e assinar no dia 24 de janeiro de 2019 um acordo de joint venture com a fabricante Boeing.

Entre as possibilidades de análise do problema, o trabalho em questão está focado no ponto de vista da empresa Embraer, especificamente, no sentido de apresentar o seu processo histórico de criação e desenvolvimento, as influências da

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dinâmica sistêmica do mercado na produção de suas aeronaves comerciais regionais, a expansão da produção e da comercialização da aeronave de transporte militar KC- 390 Millennium e as motivações para as negociações com a empresa Boeing.

Por fim, em razão das drásticas mudanças ocorridas durante o primeiro semestre do ano de 2020 no contexto econômico global, não foram escopo desta pesquisa os resultados das negociações após a assinatura do acordo entre as empresas Embraer e Boeing, firmado no dia 24 de janeiro de 2019. Também, não foram alvos deste trabalho os impactos desses entendimentos no mercado de aeronaves comerciais de grande porte, acima de 150 assentos, pois não fazem parte do portfolio de produtos da Embraer.

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2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS

Manter-se no mercado, apesar do sucesso histórico da Embraer, não foi um caminho simples. De acordo com Bernardes (2000a, p. 371), as alianças estratégicas foram fundamentais para a empresa enfrentar a concorrência internacional, dominada por grupos aportados por grandes economias, com amplas capacidades de investimentos e poder de mercado.

De acordo com os conceitos estabelecidos por Dasgupta (2020, l. 107), resumidos na Figura 1, uma organização tem as seguintes opções: atingir seus objetivos de forma independente, também conhecida como crescimento orgânico;

adquirir outra organização; ou, entrar em colaboração com uma nova empresa - as duas últimas opções são conhecidas como crescimento inorgânico. No primeiro caso, a organização deve ter os recursos e as capacidades que a levariam a alcançar os seus objetivos de forma independente. Caso a organização não tenha os recursos necessários para se desenvolver independentemente, poderá adquirir outra empresa que os possua. Porém, a organização deve estar preparada para agregar todos os riscos e passivos da empresa adquirida. Caso isso não seja algo que a organização esteja disposta absorver, pode ser considerada a possibilidade de uma cooperação através de uma aliança estratégica.O que torna as alianças estratégicas interessantes é o fato de que as empresas de origem permanecem independentes; coordenam suas ações e recursos, da mesma forma que também compartilham riscos e recompensas.

Figura 1 - Conceitos para a compreensão do relacionamento entre empresas.

Fonte: DASGUPTA, 2020, l. 107, tradução nossa.

Na perspectiva sistêmica, de acordo com a visão de Capra; Luisi (2019, l.

174), o conceito de evolução, que foi amplamente aceito como uma luta competitiva pela existência, passou a ser reconhecido como um processo cooperativo, no qual a criatividade e a constante emergência da inovação são as forças propulsoras. A propriedade resultante do todo não é encontrada em nenhuma das suas partes, mas

Ambiente Colaborativo

Ambiente Competitivo

Independente Aliança Estratégica Aquisição

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emergem no nível sistêmico como um todo, resultante de padrões de organização e relações específicas entre as partes.

A fabricação de aeronaves é uma atividade industrial que requer elevados investimentos iniciais e grandes demandas de tempo relacionados à concepção, à inovação e ao desenvolvimento dos projetos. A produção é realizada em pequenas escalas relativas, utilizando-se tecnologias cada vez mais complexas. As unidades produzidas podem variar em pequenas unidades por mês, dependendo do modelo e do fabricante. O avião é portanto considerado um bem móvel de alto valor agregado.

Capra e Luisi (2019, l. 2518) apontam que, na matemática que acompanha a teoria dos sistemas complexos, quando se resolve uma equação, o resultado não é uma fórmula, mas sim uma forma visual - um padrão. A dinâmica não linear representa uma abordagem qualitativa, e não quantitativa, da complexidade. Há uma mudança de perspectiva que é característica do pensamento sistêmico – de objetos para relações, de medição para mapeamento, de quantidade para qualidade.

Os maiores fabricantes mundiais de aeronaves anteciparam o cenário em que as fusões entre as empresas seriam a melhor forma de impulsionar a confiança dos clientes e de ampliar as vendas. De acordo com o CADE, (BRASIL, 2020b, p.115), após o anúncio da parceria das fabricantes de aeronaves AIRBUS e Bombardier, em 16 de outubro de 2017, houve um aumento significativo das encomendas dos modelos A220-100 e A220-300 - que, até então, eram fabricados pela empresa canadense Bombardier, com as denominações CS100 e CS300.

Quando se mapeiam relações, segundo as reflexões de Capra e Luisi (2019, l. 2095), há a descoberta de que certas configurações ocorrem repetidamente. Esse efeito é denominado de padrão. Redes, ciclos e fronteiras são exemplos de padrões de organização característicos de sistemas complexos.

A economia global é como um jogo de montar palavras com milhões de peças (letras), distribuídas por países (jogadores) que trabalham em equipes para combinar as peças e produzir produtos (palavras). Não se trocam apenas mercadorias; as tarefas são negociadas ao longo da cadeia de suprimentos. (HAUSMANN, 2014 apud Khanna, 2016, p. 149).

Nos últimos anos, de acordo com Dasgupta (2020, l. 58), as parcerias entre empresas cresceram exponencialmente no ambiente global competitivo. Muitas organizações multinacionais que haviam evitado alianças estão percebendo a importância das parcerias como meio de complementar as suas estratégias

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competitivas. Um fator muito importante para o impulso nas fusões entre as corporações foi o surgimento da integração global. A integração global pode ser vista através das lentes da globalização da demanda, da oferta, da concorrência e da estratégia.

Na visão de Khanna (2016, p. 6), a grande guerra comercial não é um evento, um episódio, nem tampouco uma fase. É uma condição semipermanente em um mundo em que as grandes potências conscientemente evitam confrontos militares dispendiosos, considerados autodestrutivos, pois afetam as cadeias de suprimentos essenciais. Na grande guerra comercial, infraestrutura, cadeias de suprimentos e mercados são tão cruciais quanto territórios, exércitos e dissuasão. Nesse novo cenário do século XXI, o maior nem sempre vence; o mais provável é que o mais conectado leve a vantagem.

Entretanto, para Cardoso (2018, p. 74), nesse cenário, a ordem transnacional é um jogo desigual e hierarquizado, movido por uma luta de forças e de tempo entre grandes capitais amparados pelos Estados mais preparados. Nessa nova configuração, o destino dos países da periferia, como sociedades capazes de controlar seu destino, estaria em grande desvantagem.

A história da civilização atual, emergente da rede global, de acordo com Khanna (2016, p. 30), é o resultado de fluxos e atritos em uma escala sempre em expansão, que se completam e se mantêm em equilíbrio. Fluxos maiores podem ampliar riscos: os migrantes podem ser terroristas, as redes que enviam recursos para os pobres também podem financiar o crime organizado, os viajantes e o gado podem levar pandemias, atritos podem ser autodestrutivos; entretanto, os países fracassarão se não estiverem abertos aos fluxos. Os atritos são necessários na medida em que regulam a obtenção de vantagens e redução de desvantagens: o mundo continuará repleto de atritos, mas o atrito do futuro é controlar o fluxo. Lutaremos menos pelas linhas que nos dividem do que pelas linhas que nos conectam. Os conflitos do futuro não serão mais sobre estabelecer mais fronteiras, mas sobre o controle de conexões.

De acordo com Gereffi (2001, p. 31-32), as corporações transnacionais estão convertendo a produção de alto volume para a produção de alto valor. Em vez de uma estrutura piramidal, onde o poder está concentrado na sede, as empresas transnacionais estão imersas em redes globais de produção. As principais empresas atuam como agentes estratégicos no centro da rede, controlando informações, habilidades e recursos críticos necessários para que a rede global geral funcione com

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eficiência. Na visão do autor, para que países e empresas tenham sucesso no mercado internacional de hoje, eles precisam se posicionar favoravelmente dentro das redes globais e desenvolver estratégias para obterem um melhor posicionamento junto às empresas líderes. Nesse contexto, é decisivo garantir o controle das extremidades da cadeia produtiva; ou seja, o início com a pesquisa e o desenvolvimento, e o final com os canais de distribuição e ativos intangíveis.

Portanto, em se tratando de um mercado historicamente bilionário, com grande demanda prevista para os próximos anos, em sincronia com Gomes, Barcellos e Tucci (2018, p. 81), o elemento central que compõe o pano de fundo da atual disputa e das possíveis configurações de alianças entre as empresas Boeing e Embraer e entre AIRBUS e Bombardier será a capacidade que cada um desses elementos reconfigurados terá de capturar o mercado da aviação comercial e militar.

Com base nos apontamentos de Dasgupta (2020, l. 192), de acordo com a proximidade entre as empresas e a força dos seus relacionamentos, as alianças estratégicas podem ser representadas ao longo de uma escala, conforme ilustrado na Figura 2. As empresas podem formar um consórcio, na medida em que os parceiros se unem para um propósito, sem compartilhamento de ativos e receitas.No caso de grandes projetos complexos, nos quais são necessárias diversas habilidades especializadas, que raramente são possuídas por uma única empresa, as organizações formam um consórcio. No outro extremo da escala, existem as parcerias de cadeia de valor, em que as empresas aliadas precisam de uma elevada sincronia na produção para geração de valor. As parcerias de cadeia de valor são geralmente empresas que funcionam dentro de empresas; onde são firmados acordos de longo prazo pelas organizações, com os seus fornecedores ou com os seus distribuidores, para obterem vantagens mútuas. A joint venture é justamente o ponto médio da escala, onde é formada uma nova entidade legal independente, com a alocação de recursos, responsabilidades operacionais, riscos financeiros e recompensas de cada membro. Logo, é mantida a identidade e a autonomia das empresas originadoras.

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Figura 2 - Diagrama de possibilidades.

Fonte: DASGUPTA, 2020, l. 192, tradução nossa.

Na visão sistêmica complexa, de acordo com Capra e Luisi (2019, l. 1682), existe uma tendência dual, em sentidos opostos, na existência em rede; uma, integrativa, que os inclina a funcionar como partes de um todo maior; e outra, autoafirmativa, que os leva a funcionar para a preservação da sua autonomia individual. Os sistemas se integram, operando em níveis de complexidade diferenciados, com tipos de leis distintas operando no seu respectivo nível.

Conforme estabelecido por Dasgupta (2020, l. 243), existem várias finalidades pelas quais as alianças estratégicas beneficiam as organizações. Os motivos mais comuns seriam os seguintes.

Entrar em novos mercados. Uma organização que investe em outro país geralmente sofre com a responsabilidade de uma moeda estrangeira. É uma desvantagem competitiva que surge da incapacidade da organização de entender o mercado externo e operar nele.

Buscar proteção contra incertezas. Em condições dinâmicas de mercado, uma aliança ajuda as organizações a se protegerem contra várias incertezas. Com efeito, as alianças oferecem opções para explorar o crescimento e o desenvolvimento futuros. As organizações têm a opção de sair da aliança ou se envolver mais profundamente, dependendo do atendimento das expectativas. Quanto maior a incerteza de eventos futuros, maior o valor da flexibilidade.

Obter acesso a ativos complementares críticos. Para a comercialização bem- sucedida de um produto ou serviço, as organizações precisam de ativos complementares, variando de atividades posteriores, como marketing, distribuição e serviço pós-venda, a atividades anteriores, como compras de matérias-primas e manufaturas.

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Adquirir novos conjuntos de habilidades. Alianças estratégicas permitem que as organizações aprendam novos conjuntos de habilidades, que de outra forma não seriam possíveis se operassem de forma independente. Do contrário, a aquisição desses recursos seria um processo demorado e caro.

Reduzir o risco político. A decisão de entrar em novos mercados é carregada de riscos políticos, principalmente por causa do alto grau de assimetria de informação. O risco também é alto devido às incertezas geradas pelas especificidades das várias regras e regulamentos governamentais em relação às operações de empresas multinacionais.

Obter economias de escala. Duas organizações que operam no mesmo setor, ao entrar em uma aliança, podem desfrutar de benefícios de economias de escala e reduzir o custo médio por unidade. Isso pode produzir uma barreira potencial para a entrada de possíveis concorrentes no setor. Também pode ajudar as organizações a competir de forma mais eficaz e eficiente com o conjunto de concorrentes existente.

Fortalecer a posição competitiva. As organizações podem usar alianças estratégicas para mudar a dinâmica da indústria, estabelecer novos padrões e, assim, fortalecer sua posição competitiva.

Na visão do CADE, (BRASIL, 2020b, p. 138), o ato de concentração entre Embraer e Boeing poderia proporcionar ganhos de eficiência maiores do que a joint venture dos concorrentes. Para o Conselho, na operação AIRBUS e Bombardier, tratou-se apenas da anexação da família de aeronaves C-Series da Bombardier às linhas de produção da AIRBUS. Essa aquisição não permitiu à AIRBUS o controle sobre a capacidade de engenharia da aviação comercial da Bombardier, nem estabeleceu incentivos para o desenvolvimento de novas plataformas de aeronaves de forma conjunta. Ao contrário, a joint venture Embraer e Boeing pretendia reunir as respectivas capacidades em design, engenharia e fabricação de aeronaves comerciais. Através do processo cooperativo de desenvolvimento, seria ampliada a comunalidade entre as respectivas famílias de aeronaves, melhorando a tecnologia em toda a gama de produtos; por exemplo, combinando a tecnologia de compósitos da Boeing com a experiência em fly-by-wire da Embraer.

Observando pela perspectiva da teoria sistêmica complexa, abordada por Capra e Luisi (2019, l. 2172), a tensão entre crise e transformação tem importância central para a formação de novas configurações. A crise organizacional se manifesta

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como uma ruptura do equilíbrio sistêmico existente e, ao mesmo tempo, representa uma transição para um novo estado de equilíbrio. Diferentemente dos sistemas fechados, que se estabelecem em um estado de equilíbrio térmico, os sistemas abertos se mantêm afastados do equilíbrio, de um “estado estacionário”, sendo caracterizados por fluxos e mudanças contínuos.

Para Capra e Luisi (2019, l. 2888), sistemas dinâmicos são estruturalmente instáveis. Na medida em que há o afastamento do ponto de equilíbrio, surgem os pontos críticos de instabilidade, que são chamados de “pontos de bifurcação”. Esses marcos são pontos na evolução do sistema nos quais uma ramificação aparece subitamente, e o sistema se ramifica em uma nova direção (Figura 3). Essa emergência espontânea da ordem em pontos críticos de instabilidade – com frequência chamada, simplesmente, de “emergência” – está sendo reconhecida como um dos “selos de qualidade” da existência.

Figura 3 - Diagrama de bifurcação de um sistema não linear.

Fonte: CAPRA e LUISI, 2019, l. 3772.

A Embraer enfrenta concorrência acirrada de outros fabricantes, particularmente da recém-formada joint venture entre as empresas AIRBUS e Bombardier. A junção com a Boeing proporcionaria a ambas as empresas um fortalecimento sistêmico; através da emergência de uma nova configuração, que permitiria a oferta de produtos complementares. A joint venture Boeing e Embraer provavelmente teria melhor performance perante esse mercado competitivo, de comportamento não linear, dominado pelo portfolio de produtos oferecido atualmente pela AIRBUS, em parceria com a Bombardier, que atualmente lidera, com larga margem, o segmento de mercado de aeronaves acima de 150 assentos.

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Segundo o CADE, (BRASIL, 2020b, p. 138), os requisitos para a compra de aeronaves, tanto civis quanto militares, são incertos e podem mudar nos anos seguintes a uma encomenda. Nos casos de alterações de cenários, oferecer a um cliente a opção de converter aeronaves menores da Embraer em aeronaves maiores da Boeing, ou vice-e-versa, permitiria uma flexibilidade contratual que reduziria os riscos da negociação. A oferta de acordos com a combinação de aeronaves permitiria à Boeing competir de forma mais equivalente com a AIRBUS. Atualmente, após a joint venture com a Bombardier, o consórcio europeu já possui a capacidade de ofertar toda uma gama de aeronaves comerciais que vai do grande porte, iniciando com o A380, até aeronaves comerciais de pequeno porte, como o A220.

Desde o momento em que as empresas Boeing e Embraer iniciaram as discussões sobre o ato de concentração proposto no ano de 2017 e formalizado no ano de 2019, nas considerações do CADE, (BRASIL, 2020b, p. 7), a lógica por trás da negociação é transparente, convincente e pró-competitiva. No curto prazo, o ato de concentração proposto pelas empresas permitiria a redução dos custos de produção, principalmente para a Embraer, por meio de sinergias criadas na cadeia de fornecimento, engenharia, dentre outras áreas. Considerando um longo prazo, os recursos combinados reduziriam os custos de desenvolvimento de novos projetos.

Com uma gama maior de produtos e serviços, os clientes teriam flexibilidade para otimizar a aquisição de aeronaves, adequando melhor a frota, de acordo com as demandas específicas de cada mercado.

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3 A EMBRAER

No dia 20 de janeiro de 1941, foi criado o Ministério da Aeronáutica com o objetivo de desenvolver, fomentar e gerenciar as atividades técnicas e orçamentárias relacionadas à aviação nacional. Desde a sua gênese, o novo ministério já possuía, no seu escopo, o objetivo dual de ampliar a segurança nacional no ambiente aeroespacial e catalisar o desenvolvimento da indústria e da infraestrutura aeronáuticas brasileiras.

Segundo os registros do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, com o objetivo de integração das atividades aeronáuticas no Brasil, o Ministério da Aeronáutica criado pelo Presidente Getúlio Vargas, através da assinatura do Decreto n⁰ 2961, de 20 de janeiro de 1941, teve os seguintes parâmetros delineados.

a) Comando único, político e estratégico, sobrepondo-se a todas as atividades aeronáuticas do país, civis e militares;

b) Integração de órgãos dispersos em três Ministérios com atividades absolutamente correlatas;

c) Integração de infraestrutura aeronáutica para uso comum, civil e militar, com grande economia de meios;

d) Lançamento das bases para implantação definitiva da indústria aeronáutica brasileira; e

e) Institucionalização da pesquisa, com vistas ao desenvolvimento tecnológico(BRASIL,1990, p. 74, grifo nosso).

O Brasil da década de 1940 possuía uma matriz produtiva essencialmente agrícola. A capacitação técnica da mão de obra industrial era muito limitada. Nesse período, as relações do Brasil com os Estados Unidos foram pautadas pela negociação do alinhamento brasileiro aos interesses regionais americanos; pois, em agosto de 1942, o Brasil declarou guerra aos países do Eixo e se uniu definitivamente às forças aliadas.

Segundo Forjaz (2005, p. 267 - 287):

Em junho de 1941, Brasil e Estados Unidos assinaram um acordo de cooperação baseado no Lend and Lease Act, que regulava os programas de empréstimos e arrendamentos subsidiados, por meio dos quais os Estados Unidos forneciam ajuda militar aos países aliados. Foram trazidos mais de quatrocentos aviões de treinamento e quase todos os oficiais da Aeronáutica na época fizeram um curso de Estado-Maior nos Estados Unidos. A contrapartida brasileira foi a permissão para a instalação de várias bases militares norte-americanas em território nacional: Amapá, Belém, São Luís do Maranhão, Fortaleza, Recife e Natal, a maior e mais importante delas, que chegou a contar com 60 mil homens.

Em 1943, galvanizado pelo apoio norte-americano, o então subdiretor técnico do Ministério da Aeronáutica, Coronel Aviador Casimiro Montenegro Filho, realizou uma viagem aos Estados Unidos com a missão de transladar um lote de aviões e

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realizar uma visita prospectiva ao Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

Após essa visita de cortesia, o Coronel Montenegro retornou convicto da ideia de criar uma escola de engenharia de alto nível, com o objetivo principal de formar e capacitar engenheiros de excelência e desenvolver uma tecnologia genuinamente brasileira, que permitisse fomentar diretamente a indústria aeronáutica. Em agosto de 1945, com a supervisão do professor e chefe do Departamento de Engenharia Aeronáutica do MIT, Richard Harbert Smith, foi delineado o plano de criação do Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA), mais conhecido como Plano Smith (Figura 4). Em setembro de 1945, numa conferência realizada no Ministério da Educação, a convite do governo brasileiro, o Prof. Smith esclareceu a importância da criação do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e do CTA para que o Brasil se tornasse um país independente, com um transporte aéreo adequado à sua realidade. (ITA, 2020).

Em 1950, foi inaugurado o ITA, cujo projeto da sede foi concebido pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Foi a primeira organização a formar-se no CTA, que na atualidade é um complexo de pesquisa e desenvolvimento na área aeroespacial.

Figura 4 - Maquete e construção do CTA e o Professor Smith.

Fonte: EMBRAER, 2020a.

No final dos anos 1960, conforme observado por Forjaz (2005, p. 296), o parque industrial brasileiro havia amadurecido. A indústria automobilística propiciava ampla e complexa rede de apoio que removia parcialmente os obstáculos da produção doméstica de materiais e de componentes requeridos para a manufatura de aeronaves. Nesse momento, um novo salto no projeto da indústria aeronáutica brasileira passou a ser apoiado pelo governo, possibilitando, assim, as condições para a criação da Embraer. Mais uma vez, e tal como nos anos 1940, houve forte participação dos militares na decisão estratégica de criar uma indústria aeronáutica no Brasil.

Fruto do desafio da necessidade da produção seriada e da comercialização do projeto Bandeirante, o então diretor do CTA, Brigadeiro do Ar Paulo Victor da Silva,

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obteve sucesso na formalização do projeto para a criação da empresa brasileira que tinha por missão atender especificamente a esse propósito e teria a sua sede localizada nas vizinhanças do CTA, em São José dos Campos, SP.

Cabe ressaltar que, no período antecedente à concepção da Embraer, de acordo com Forjaz (2005, p. 294), ocorreram poucas iniciativas no âmbito privado no setor aeronáutico da indústria brasileira, pois as condições estruturais do desenvolvimento tecnológico do país não tinham o nível requerido para o empreendimento. O cenário era desfavorável, pois havia: limitações do mercado consumidor brasileiro, dependência exclusiva da demanda governamental, restrições no desenvolvimento científico e tecnológico até a década de 1950, intensa competição da indústria aeronáutica dos países desenvolvidos, inexistência de infraestrutura aeroportuária no país, precariedade do parque metalmecânico nacional e limitações financeiras dos empresários brasileiros.

Foi quando, no dia 19 de agosto de 1969, o Presidente Artur da Costa e Silva, através do Decreto-Lei n⁰ 770/69 (Anexo A), formalizou a criação da Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A (EMBRAER). Sob a gerência do Sr. Ozires Silva, oficial aviador da reserva da FAB, formado em engenharia aeronáutica pelo ITA, a empresa inicia as suas atividades na cidade de São José dos Campos, SP (Figura 5).

Figura 5: Entrada da Embraer.

Fonte: EMBRAER, 2020a.

A Embraer foi criada com o capital inicial totalmente subscrito pela União Federal. Segundo Bernardes (2000a, p. 161), cerca de US$ 1,1 milhão, em valores da época, foram investidos. O governo brasileiro, através do Ministério da Aeronáutica, ficou com o controle da empresa, onde permaneceu com pelo menos 51% do capital votante. Através de dispositivos legais, foi colocado em prática um arranjo de incentivo fiscal. Apesar de pouca aderência, pessoas jurídicas puderam investir a quantia de até 1% do seu imposto de renda devido ao governo federal na compra de ações da Embraer, sem direito a voto. O objetivo foi tentar capitalizar a empresa mediante investimentos privados.

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No início, muitos técnicos e especialistas, tanto do setor privado como do governo, foram céticos quanto ao desenvolvimento de aeronaves no Brasil. Na percepção de Silva (2005, p.133), a grande questão era se não seria mais fácil e prático comprar uma licença de fabricação ou, então, trazer uma empresa do exterior para operar em solo brasileiro. Entretanto, nenhum fabricante externo estava disposto a empreender no Brasil, devido ao risco de uma produção brasileira competir com os seus próprios produtos no mercado internacional.

Apesar de ofertar um mercado interno com grande potencial de expansão, as demandas não eram adequadas economicamente para a operação de apenas um tipo de aeronave. A Embraer, visando à viabilidade econômica do seu primeiro projeto, logo nos primórdios capturou o conceito de que, qualquer que fosse o tipo de aeronave a ser produzida, para obter volume de produção, era mandatório projetá-la para competir no mercado internacional.

Segundo Bernardes (2005a, p. 165), a influência do governo brasileiro sob a ótica estratégico-militar foi fundamental para os fatores críticos de competitividade da Embraer. Logo no início da operação, a empresa entendeu a necessidade de ir além da posição confortável proporcionada pelas políticas de apoio governamentais.

Revelou-se imperativo para a sua existência enfrentar um mercado externo altamente competitivo.

Para Silva (2000, p. 145-147), o cenário no Brasil e no exterior na década de 1970 apresentava tendência por aviões de grande porte, em face de serem capazes de oferecer custos operacionais mais reduzidos. Entretanto, a utilização de aeronaves pesadas atendia a um número cada vez menor de cidades, pois requeriam estruturas aeroportuárias mais complexas. Logo, a análise de mercado sinalizava a certeza de que havia um espaço crescente para o emprego de aviões de menor porte, como o EMB-110 Bandeirante (Figura 6), pois a necessidade de maior eficiência no uso do tempo das pessoas demandava o uso intensivo do transporte aéreo.

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Figura 6 - EMB-110 Bandeirante.

Fonte: PRIMEIRO [...], 2017.

Para compreender a estratégia desenvolvida pela Embraer, é importante entender que os engenheiros militares formados pelo ITA, que tiveram forte influência na criação da empresa, já tinham certa experiência com as empresas automotivas estrangeiras que atuavam no Brasil no final dos anos cinquenta.

De acordo com Dagnino (1993, p. 224), os ensinamentos da indústria automotiva influenciaram diretamente na concepção da Embraer. Para otimizar a produção, optou-se pela arquitetura da não verticalização dos componentes. Esse conceito requer cuidados com a gestão financeira, pois amplia a complexidade da estrutura de custos. Um ciclo de produção de aeronaves é caracterizado por pequenas escalas de produção, com elevados requisitos de confiabilidade e qualidade, que sempre determina grandes custos envolvidos no desenvolvimento e na fabricação.

Com isso, os esforços da Embraer foram estrategicamente direcionados para o domínio e a capacitação tecnológica nas áreas de aerodinâmica, fuselagem, desenvolvimento e integração de sistemas. Essa estratégia de dominar o design do projeto foi fundamental para o futuro competitivo da empresa. A capacidade na concepção da fuselagem, na visão de Bernardes (2000a, p. 175), foi a tecnologia chave para o estabelecimento da Embraer como uma empresa autóctone brasileira no desenvolvimento de projetos aeronáuticos.

A fim de exemplificar os desafios iniciais da Embraer, conforme aponta Silva (2005, p. 292), na produção da aeronave EMB-110 Bandeirante, em razão dos investimentos realizados, era necessário fabricar pelo menos três aviões por mês – o

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ideal seriam quatro unidades. Abaixo dessa produtividade, o resultado era a não lucratividade da linha. Vender os aviões de forma ajustada e a um ritmo correspondente ao da linha de montagem também era uma condição mandatória.

Uma das causas do colapso de uma fábrica de aeronaves são os estoques não vendidos. A Embraer, logo no seu início, teve que desenvolver todo um sistema de comercialização, financiamento e assistência pós-venda no nível do que os competidores mundiais já ofereciam ao mercado.

No início da década de 1960, segundo estudos da empresa Boeing, com o aumento exponencial do volume de tráfego aéreo, os países mais desenvolvidos começaram a se preocupar com a questão da segurança aérea. Grande parte dos acidentes aeronáuticos da época se dava por falhas do produto, na operação ou na manutenção. Para mitigar os acidentes e regulamentar a atividade aérea, principalmente em relação à padronização dos critérios de projeto e fabricação das aeronaves, foram criadas organizações governamentais locais de certificação.

(BOEING, 2016a apud CAMARGO, 2017, p. 32).

Para Silva (2005, p. 295), os gestores da Embraer perceberam, logo no início, que a decisão de exportar um avião não significava apenas encontrar um bom produto e um comprador interessado. A entrada de um novo tipo de avião em um país – sobretudo nos mais desenvolvidos – é um processo complexo que envolve muito tempo e grandes somas de recursos, pois os países mantêm órgãos governamentais que aprovam previamente qualquer tipo de aeronave que venha a voar sobre o seu território. Nenhum fabricante pode legalmente vender uma aeronave se o certificado de homologação não estiver aprovado pelo órgão competente.

A certificação do EMB-110 Bandeirante para voar em território americano foi fundamental para criar a percepção nos clientes internacionais de que as aeronaves produzidas no Brasil poderiam voar com segurança em todo o mundo, sob as mais variadas condições.

Outro aspecto muito importante para a prospecção inicial do mercado internacional foi, segundo Silva (2005, p. 301), a gerência da Embraer perceber que, embora a fábrica pudesse ter uma presença no “jogo”, a necessidade de representantes locais era fundamental para estabelecer uma rede de vendas e pós- vendas; pois, cada país tem peculiaridades próprias, sobretudo os Estados Unidos - maior e mais importante mercado do mundo.

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Os americanos, em virtude das restrições legais, para aceitar a homologação do EMB-110 Bandeirante exigiram um operador inicial local. Porém, a aeronave não poderia ser comprada por não ser homologada. Então, conforme comentado por Silva (2005, p. 309), a solução encontrada na época foi a permissão da Embraer para que um americano, Robert Terry, criasse uma empresa para montar a aeronave em solo americano, a Aero Industries. A partir desse momento, a Aero Industries representou as vendas da Embraer com exclusividade em todo território americano. Ao mesmo tempo, para iniciar a fabricação inicial, Robert Terry criou uma subsidiária da Aero Industries, denominada Mountain West Airlines, e encomendou as unidades. Com a criação dessas empresas foi possível a homologação do EMB-110 Bandeirante pela Federal Aviation Administration (FAA).

O resultado dessa necessidade de mercado galvanizou a assinatura de um acordo diplomático bilateral entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos, no qual foram estabelecidas regras e normas para a homologação recíproca de produtos aeronáuticos.

De acordo com Silva (2005, p.348), presidente da empresa na época:

[...] seria essencial demonstrar que a compra de um avião brasileiro (vindo de um país exótico, como ouvimos várias vezes) não seria uma aventura impensada, e sim um ato racional, que permitiria certeza no retorno do investimento realizado.

A entrada em serviço do EMB-110 Bandeirante sincronizou justamente com o período em que, principalmente nos Estados Unidos, houve a concentração das grandes empresas de transporte aéreo nos grandes centros urbanos (hubs). Foram criadas empresas subsidiárias das grandes operadoras, que passaram a voar em conexão com as frequências e horários dos grandes jatos, as chamadas linhas commuters, interligando os grandes centros às pequenas cidades. Portanto, as premissas de mercado estabelecidas para o Bandeirante se concretizaram e proporcionaram o êxito da entrada da aeronave no mercado estadunidense.

Segundo Silva (2005, p. 313), as vendas para os Estados Unidos alteraram os parâmetros de produção, levando a programação da linha do EMB-110 Bandeirante a números bem mais altos, do que os originalmente previstos. Novos empregados tiveram que ser contratados e treinados em tempo recorde. Foi necessária a organização de um sistema logístico amplo e sofisticado, capaz de garantir estoques crescentes em atendimento às necessidades operacionais.

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Nas conclusões de Bernardes (2000a, p. 171), o aporte inicial do governo brasileiro, no uso do seu poder de compra, revelou-se uma das grandes contribuições para a sobrevivência da empresa. Além disso, o acordo de cooperação com a empresa italiana Aermacchi na produção do EMB-326 Xavante foi fundamental para o aprimoramento da linha de produção, pois os conhecimentos advindos dessa parceria estratégica tornaram-se uma importante experiência de aprendizagem. No seu início, a empresa percebeu a necessidade de criação de parcerias para diminuir a defasagem tecnológica. Ao mesmo tempo, o Ministério da Aeronáutica já possuía a visão concreta de que, para aumentar a capacidade da indústria aeronáutica brasileira, era mandatório atrelar nos processos de aquisições de novas aeronaves a participação da Embraer, seja com projetos próprios, seja sob licença através de projetos de offset.

Nos anos 1980, a Embraer passou por um processo de expansão na produção de novos modelos, sempre sendo impulsionada pelas demandas dos projetos militares encomendados pela FAB. Logo no seu primeiro ano de vida, o Ministério da Aeronáutica encomendou oitenta aeronaves EMB-110 Bandeirante e ordenou a produção sob licença de 112 EMB-326 Xavantes.

Em 1989, após 20 anos produzindo aeronaves turboélices, com uma crescente participação no mercado global de aeronaves (Tabela 1), a empresa, após pesquisa de mercado, lança os estudos para o desenvolvimento do primeiro jato fabricado no Brasil, o ERJ-145.

Tabela 1 - Projetos de aeronaves da Embraer nos anos 70 e 80.

Modelo Início e término Projeto

EMB-110 Bandeirante 1973 - 92 Embraer

EMB-326 Xavante 1971 - 81 Cooperação

EMB- Ipanema 1971 - Embraer

EMB-121 Xingu 1978 - 87 Embraer

EMB-312 Tucano 1983 - Embraer

EMB-120 Brasília 1985 - Embraer

AMX 1989 - Cooperação

CBA-123 1989 - Protótipo Cooperação

ERJ-145 1989 - Parceria de risco

Fonte: EMBRAER apud BERNARDES, 2000a, p. 196.

Através da evolução dos produtos, do avanço no aprendizado tecnológico e da estratégia de mercado, na visão de Bernardes (2000a, p. 197), é possível inferir o elevado grau de maturidade empresarial adotado pela alta administração da Embraer, que direcionou a estruturação em dois eixos principais; o primeiro, no sentido de atentar para uma minuciosa estratégia baseada na avaliação e na exploração de

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demandas de nichos de mercado no âmbito global; e o segundo, uma visão de longo prazo voltada para altos investimentos nos processos de aprendizado tecnológico, de capacitação industrial e de formação de mão de obra altamente especializada.

Contudo, o modelo empresarial desenvolvido pela Embraer demonstra uma estrutura basicamente linear, com certo grau de interatividade entre as diversas áreas.

Entretanto, tal concepção era considerada pelos funcionários lenta em relação à solução das não conformidades geradas na linha de produção; com pouca agilidade na divulgação das informações entre os setores. Para qualquer demanda era necessária a consulta por diversas áreas, que poderiam levar alguns meses para se apresentar uma solução. Ou seja, uma estrutura muito verticalizada e hierarquizada, com departamentos basicamente funcionais, não havendo o conceito de unidades de negócio. A visão e os valores da empresa continham fortes raízes na matriz militar.

(CABRAL 1998 apud BERNARDES, 2000a, p. 200),

Os princípios da teoria clássica da administração, na visão de Capra e Luisi (2019, l. 1620), fundamentam-se na forma como os administradores pensam sobre as organizações como sendo o planejamento de estruturas formais, ligadas por linhas claras de comunicação, coordenação e controle. Essa abordagem mecanicista da administração tornou-se, hoje, um dos principais obstáculos à mudança organizacional.

Apesar da atuação expressiva no mercado global, a cultura organizacional, para Bernardes (2000a, p. 202), era, de certa forma, nacionalista e corporativista. Os seus fundadores e boa parte dos seus engenheiros eram oriundos do ITA, portanto, forjados em um processo de socialização que é ancorado no comportamento disciplinar rigoroso, que fortalece o espírito de grupo. De certa forma, essa cultura organizacional era predominantemente técnica, pouco fluida, que dificultava o enfrentamento das mudanças radicais causadas pelo cenário econômico, que exigem uma gestão mais competitiva dos fatores de produção e dos recursos financeiros.

No início dos anos 1990, a tendência da indústria aeronáutica mundial apontava para novas estratégias de fabricação, que exigiam formas mais flexíveis de gestão. Segundo Bernardes (2000a, p. 204), na Embraer desse período as estratégias de produção eram mais fundadas nos critérios de capacitação científica e tecnológica do que na adoção dos novos conceitos da indústria aeronáutica de integração e flexibilidade. O monitoramento do sistema produtivo, através de indicadores de desempenho e eficiência, visando à obtenção de níveis de produtividade e redução

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de custos, não eram considerados fatores prioritários na estratégia da empresa. Esse tipo de abordagem mais detalhada de desempenho só passou a ser adotada na Embraer a partir da privatização em 1994. Foi uma fase na qual foram identificadas não conformidades, tais como: falta de capacidade de reduzir o tempo de entrega de uma aeronave, ou até mesmo o cumprimento do prazo estabelecido, e a redução da qualidade da assistência técnica e do atendimento aos clientes.

Na ocasião, os fabricantes concorrentes, em especial a empresa canadense Bombardier, vinham aperfeiçoando os seus modelos e gerando novas pressões no mercado civil.

De acordo com Bernardes (2000a, p. 205), no ano 1994 as vendas do mercado militar capturaram 41% do faturamento total da Embraer. Desse total, os pedidos da FAB correspondiam a 68%. Somente o programa AMX injetava 93% do faturamento do mercado militar interno, cujo término estava previsto para o ano de 1998. Esse projeto dependia das encomendas governamentais do Brasil e da Itália, que passavam por contínuos cortes no orçamento. O programa, que teve o seu início em 1979, no ano de 1987 já havia consumido US$ 1,8 bilhão e sofreu uma redução de 40% nas suas entregas.

Bernardes (2000a, p. 215) observa que, nesse período, ocorreram eventos importantes no âmbito externo que conduziram ao arrefecimento do mercado aeronáutico global, especialmente no campo militar, em que o mundo assistia ao fim da Guerra Fria. No âmbito interno, a Embraer passava por um grave desequilíbrio financeiro gerado basicamente por duas razões: o elevado custo do componente importado que era utilizado na manufatura das aeronaves, e a falta de lucratividade na venda dos aviões. Para o autor, a causa raiz dessa deficiência na gestão administrativo-financeiro estaria no fato de a empresa ter sido concebida sob a ótica da estratégia tecnológica estatal.

A crise financeira da empresa se tornou pública com o fracasso de mercado da aeronave CBA-123. Esse projeto, concebido durante o governo do Presidente José Sarney, foi idealizado com o objetivo de estreitar os laços e dinamizar o Mercosul; ou seja, foi um projeto político que careceu de estudo de mercado.

Na visão de Bernardes (2000a, p. 216), a Embraer passou por quatro fases:

a inicial, que inicia-se em 1975 com as exportações do Bandeirante e vai até 1979, com crescimento moderado; a segunda , que vai de 1979 e avança até 1984, considerado um período de estabilidade; a terceira fase marcada por grande

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crescimento entre 1985 e 1990; e, por fim, a quarta fase de queda acentuada no faturamento, entre 1990 e 1994, ano em que foi privatizada (Gráfico 1).

Gráfico 1 - Evolução do faturamento: 1970-1994.

Fonte: EMBRAER apud BERNARDES 2000a, p. 216.

O quadro de crise fiscal e institucional no Brasil no início dos anos 1990 inviabilizou qualquer tentativa governamental para a resolução do impasse financeiro da empresa. No campo político, após a eleição presidencial no Brasil de 1990, foi criado o Plano Collor. Esse foi um período marcado pela adoção de um conjunto de diretrizes políticas e econômicas que promoveram a abertura e a desregulamentação ampla das políticas industrial e do comércio exterior, atreladas a um forte programa de privatização das empresas públicas. De acordo com Bernardes (2000b, p.13), as dívidas da Embraer, até então estatal, alcançaram cerca de US$ 1 bilhão em 1994. O governo ainda assumiu cerca de US$ 700 milhões da dívida da empresa, reduzindo o endividamento para algo da ordem de US$ 300 milhões.

Segundo relatos de Silva (2005, p.348):

Estamos perante problemas muito sérios. Vamos precisar de estratégias novas e criativas. Assim, proponho defender a privatização da Embraer. Não será possível enfrentar a difícil conjuntura internacional, que temos vigorando hoje no mundo, numa empresa amarrada pelo enorme conjunto de restrições gerenciais imposto pelo nosso acionista controlador maior, o Governo Federal.

Após três anos de um processo de corte e saneamento, de acordo com Bernardes (2000a, p. 256), no dia 7 de dezembro de 1994, a Embraer foi arrematada pela iniciativa privada pelo valor de R$ 154,1 milhões. A venda foi executada por meio de leilão na Bolsa de Valores de São Paulo, com ágio de 0,3% acima do preço mínimo fixado, e foi paga integralmente em títulos da dívida de estatais. Nessa operação, o principal investidor individual foi o banco de investimentos americano Wasserstein

0 100 200 300 400 500 600 700 800

70 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94

US$ Milhões

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Perella, que detinha 19,09% das ações ordinárias. O consórcio liderado pelo grupo brasileiro Bozano Simonsen, por ter adquirido 40% das ações, assumiu o controle da empresa. Esse grupo era reconhecido no mercado brasileiro por atuar na aquisição de empresas estatais deficitárias. Usava a estratégia de acertar as contas das empresas, tornando-as rentáveis através da valorização dos ativos, para posteriormente revendê-las.

Condicionado ao processo de privatização, por questão de estratégia nacional, o governo brasileiro exigiu a criação de uma classe especial de ações, a Golden Share, que assegurou ao Estado o direito de veto em matérias de programas militares, mudança do objeto social e transferência do controle acionário.

Segundo Bernardes (2000a, p. 261), o primeiro passo do novo Conselho de Administração da Embraer foi o delineamento em um plano de recuperação que se pautava no lançamento, na certificação e nas vendas do projeto ERJ-145. Para o implemento desse novo projeto, foram aportados pelos acionistas US$ 500 milhões no período de 1995 a 1996. Esse novo plano centrou a estratégia de execução em quatro linhas de ação:

a) compromisso da administração por resultados, mediante processos de reengenharia financeira e reestruturação patrimonial, organizacional e produtiva;

b) melhoria das relações com os clientes e fornecedores, através de uma política focada na satisfação do cliente;

c) identificação da missão da empresa e uma nova estratégia de mercado; e

d) priorização na viabilidade do programa ERJ-145.

Cabe ressaltar que, na percepção dos novos controladores, a gestão da empresa deveria ser radicalmente transformada de uma cultura marcada pela excelência tecnológica do produto, e consequentemente dirigida pela engenharia, para uma abordagem orientada pela satisfação das demandas do mercado, comandada pela inteligência de mercado.

Com o advento da participação do grupo Bozano Simonsen no novo Conselho de Administração da Embraer, segundo Bernardes (2000a, p. 262), logo após a privatização, medidas foram tomadas para agilizar as operações de aquisição de insumos, comercialização e financiamento dos produtos e serviços, como, por

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