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Deseducando o olhar: Onde está o Brasil?

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Academic year: 2021

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XIV Colóquio Ibérico de Geografia/ XIV Coloquio Ibérico de Geografía 11-14 novembro de 2014/ 11-14 Noviembre de 2014 Departamento de Geografia, Universidade do Minho

Deseducando o olhar: Onde está o Brasil?

Carina Merheb de Azevedo Souza(a)

(a) Departamento OLHO/Faculdade De Educação, Universidade Estadual de Campinas/ camerheb@gmail.com

Resumo/ Resumen

Os nossos olhos foram educados a reconhecer o Brasil no formato como é dado nos mapas e atlas escolares;

e se encantam ao reconhecer a nossa pátria em uma rocha, no formato de uma nuvem, na copa de alguma árvore, ou em qualquer outra forma que inicialmente não tinha a pretensão de ser o Brasil dos mapas habituais, mas que de repente, tornam a vir a ser. Ao observar na ilha de Fernando de Noronha, localizada no nordeste brasileiro; o formato do mapa do Brasil surge em uma das rochas, conforme o ângulo em que é observada. O objetivo deste trabalho é apresentar um vídeo produzido que teve a intenção de trazer outras possibilidades de mapas e formas de observá-los como resistência e potência visual.

Palavras chave/ Palabras clave: mapa, deseducar, olhar, potência visual

1. Dos contornos dos mapas

Mapas estão entre as mais antigas formas de representação gráfica espacial. No desenvolvimento histórico da humanidade, os desenhos dos lugares conhecidos ou não; foram simbolicamente escritos em argila, madeira, peles de animais, e outros meios. Com a ampliação das ciências como a geometria e a astronomia; houve o desenvolvimento de tecnologias de medição e os mapas foram pouco a pouco aperfeiçoados.

Os contornos, cores, legendas, desenhos e gravuras que compõem os mapas fazem parte não só das nossas vidas desde os primeiros anos escolares como são referências para simples localização e identificação de lugares e fenômenos.

Atualmente, recursos dotados de alta tecnologia como sinais de satélites e computação gráfica ampliaram ainda mais a possibilidade de mapear espaços e lugares.

O mapa como objeto de referência da Geografia se utilizou tanto como transmissão de informações, ilustração de pensamento, defesa de território, entre outras aplicações. “Nenhuma destas ideias é errada, porém é urgente ampliá-las e transformá-las, caso contrário, educaremos para a passividade diante do mapa.” (Oliveira Jr, 2007).

A partir da educação visual imposta por mapas me disponho a pensar na imagem como potência visual no sentido de reafirmação territorial e de reconhecimento do espaço como fragmento político. Fazer

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do mapa um pensamento espacial ordena e disciplina o reconhecimento do país. Massey aponta nesse sentido:

Mapas dizem respeito a espaço, são formas de representação, certamente icônicas; representação é compreendida como espacialização. Mas um mapa de geografia não é aquela geografia – ou aquele espaço – mais do que uma pintura de cachimbo é um cachimbo. (MASSEY, 2008 pág. 159)

A autora nos leva a refletir no espaço como uma dimensão social, e a sua preocupação é justamente a de que o mapa, como tecnologia do poder acaba dando a impressão de que é uma superfície, a esfera de uma completa horizontalidade; e o que ela propõe é que pensemos no espaço não como um mapa; e um mapa não como espaço. (p.163).

Buscar no mapa as referências das representações acaba sendo uma das práticas mais usuais e conhecidas por todos para se localizar no mundo e também para saber onde os outros estão. Porém, na forma estática.

Para a cartografia, um desafio. Para os artistas, uma possibilidade.

Então, como descrever a mobilidade espacial, os sentidos, ações e situações que permeiam um lugar, para além da imobilidade cartográfica?

Foram essas perguntas e reflexões que me fizeram cogitar em como compor o vídeo. No entanto, sem a menor suspeita de que pudesse dar certo – fato esse assumido por eu não ser artista, além de pouca ou até inexistente habilidade em produções audiovisuais.

Diante dessa dificuldade, Gustavo Tomazi embarca para me amparar dessa deficiência. E o faz com primor, oferecendo com generosidade os seus conhecimentos, dispondo da técnica e do rigor nos detalhes sonoros e visuais da produção de um vídeo.

O objetivo foi o de fazer deslizar os mapas em outras imagens que não necessariamente poderiam vir a ser o mapa. A ideia do deslize vem na forma como a câmera atravessa os corpos e as figuras que compõem o vídeo.

3. Dos combates

Uma das conversas iniciais da disciplina foi a de provocar fugas no ambiente escolar, de fazer a educação ir para além do que ela já é, e isso se torna desafiador, pois existe uma dificuldade imensa de compor com um ambiente que já está estabelecido. E nesse caso; não se trata de tirar, mas sim de colocar outras coisas no lugar, além daquele que já se tornou fixo.

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Essa experimentação de combates de daria em três situações: no pensamento espacial, na mídia e na fotografia.

O vídeo “Onde está o Brasil?” não está envolvido com nenhuma experimentação escolar e tão pouco chegou à sala de aula, mas de certa forma combate a questão do pensamento espacial, do significado usual que demos ao Brasil desde a nossa escolarização cartográfica.

As imagens que foram colocadas no vídeo foram escolhidas aleatoriamente no site de pesquisas Google (imagens) com as palavras digitadas: “formatos do mapa do Brasil”, “mapas diferentes do Brasil”.

A partir das imagens que foram surgindo, algumas me atraíram mais do que outras pela questão estética, e pela ideia de fuga do figurativo. Não foram muitas as imagens que surgiram que poderiam ir de encontro com a proposta do filme, e pressuponho que isso venha do esgotamento da possibilidade poética, de uma ordem social que foi repetida à exaustão como consumo sobre o formato do Brasil.

4. Das resistências

Outra ideia que surgiu durante as aulas dessa disciplina foi a de resistência. Conforme leituras dos artigos de Oliveira Jr (2010) – “Vídeos, resistências e geografias menores” e de Paulo Oneto(2009) – “A que e como resistimos: Deleuze e as artes” , além dos apontamentos do professor, entendi resistência como o movimento de ampliação das margens: “resisto à medida que eu invento algo”, “agir com vontade de arte”, “entrar em contato e se metamorfosear”. A partir disso, é que pretendi colocar os mapas do Brasil encontrados em devir, ou seja, fazer das imagens pesquisadas e colocadas no vídeo como outra forma de pensamento através das formas que foram sendo dadas: o bife estalado, o galo, os corpos femininos, as pinturas, e todas essas obras foram variando do espaço, criando pequenas rupturas na linguagem estabelecida.

Como Oliveira Jr aponta:

Resistência assim pensada é toda ação que faz proliferar outras formas de viver, outras formas de pensar, para além e aquém daquelas formas que já temos vivido e pensado. Por isto, resistência aqui estará fortemente ligada à ideia de versão ou mesmo de sub-versão, estando estas duas palavras associadas diretamente à política como ficção e à poética como verso versado antes submerso na língua (OLIVEIRA JR, 2010, pág. 162)

Então, usando a ideia de resistência, houve a tentativa no vídeo de fazer com que aquilo que já estava dado – o mapa do Brasil e o seu formato; pudesse proliferar, encontrando movimento nas suas

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formas e em outras imagens, outras formas de se olhar o Brasil, deseducando o olhar para outras miradas e movimentos.

Buscar esse contorno habitual do formato do Brasil foi umas das propostas do vídeo e, em nenhum momento esse contorno foi abandonado, por duas razões: a primeira é de como já foi mencionado anteriormente, não possuo habilidade artística para criar outro formato do Brasil que não seja esse que já foi dado; e segundo porque entendo que a ideia de resistência é justamente a de que fazer re-existir, e não negar a anterior, como Oneto (2009) propõe: “A noção de “resistência”, por exemplo, deixa de remeter à negação de alguma coisa que vem primeiro e que deve ser eliminada, ou a uma situação de mera oposição”. (pág.200)

Dessa forma, mantive os formatos físicos do mapa, mas quem fez o movimento de deslizar e criar ruptura foi a câmera.

5.Das cores e dos sons

A sonoridade escolhida para compor o vídeo divide-se em três partes: a primeira, que traz a voz de uma das passageiras da embarcação de Noronha, com a seguinte frase: “A natureza é encantadora e a gente não entende o porquê”. Essa frase foi escolhida para estar ali porque o que encanta nessa moça são os olhos a que tudo vê, como por exemplo, o contorno físico do Brasil em uma das rochas, encanto esse que só pode ser percebido por quem não tem deficiência visual nenhuma, pois essa imagem seria impossível de ser apalpada por um cego. A segunda parte é a música de uma roda de jongo, sugerida por Gustavo, e que surge no momento em que o vídeo sai da esfera representacional da natureza e vem a se estabelecer nos cenários dos mapas realizados como obras artísticas.

Buscamos fazer das cores um elemento que pudesse dar existência ao vídeo. Recorro ao poeta Manoel de Barros, e seu livro “Menino do mato”, onde ele poeticamente trata as cores como elementos significativos do som:

O primeiro poema

O menino foi andando na beira do rio e achou uma voz sem boca.

A voz era azul.

Difícil foi achar a boca que falasse azul.

Tinha um índio terna que que diz-que falava azul.

Mas ele morava longe.

Era na beira do rio que era longe.

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Mas o índio só aparecia de tarde.

O menino achou o índio e a boca era bem normal.

Só que o índio usava um apito de chamar perdiz

que dava um canto azul.

Era que a perdiz atendia ao chamado pela cor e não pelo canto.

A perdiz atendia pelo azul. (BARROS, 2010, pág 36)

A terceira parte da sonorização volta com a primeira frase da passageira do barco, finalizando o vídeo com o recorte da ilha de Noronha e uma frase de Doreen Massey (2008), que me chamou atenção na última aula: “E, se tudo está em movimento, onde está o aqui?”

Referências bibliográficas:

BARROS, Manoel de.(2010) O menino do mato.São Paulo: Leya,

BITTENCOURT, Agueda. OLIVEIRA Jr. Wenceslao M.O. Estudo , pensamento e ciração. (2007) 2ª edição.

Campinas: Faculdade de Educação.

MASSEY, Doreen (2008). Pelo espaço – uma nova política da espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

OLIVEIRA JR, Wenceslao Machado de(2010). Vídeos, resistências e geografias menores – linguagens e maneiras contemporâneas de resistir. Revista Terra Livre. São Paulo. Volume 1 , número 34. p. 161-176. Disponível em http://www.agb.org.br/files/TL_N34.pdf [Acedido em 13/11/2013]

ONETO, Paulo Domenech (2009). A que e como resistimos: Deleuze e as artes. In: LINS, Daniel (org). Nietzche e Deleuze – arte e resistência. Fortaleza: Forense Universitária.

Referências

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