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Eu e tu na aula de Inglês : reconfigurar os papéis pedagógicos rumo à autonomia

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abril de 2014

Maria Manuela Ferreira Ribeiro

UMinho|20 14 Maria Manuela F err eir a Ribeir o

Universidade do Minho

Instituto de Educação

Eu e tu na aula de Inglês: reconfigurar os

papéis pedagógicos rumo à autonomia

Eu e tu na aula de Ing

lês: reconfigurar os

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Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação

Área de Especialização em Supervisão Pedagógica

na Educação em Línguas

Trabalho realizado sob orientação da

Professora Doutora Isabel Flávia Gonçalves

Fernandes Ferreira Vieira

Universidade do Minho

Instituto de Educação

Maria Manuela Ferreira Ribeiro

Eu e tu na aula de Inglês: reconfigurar os

papéis pedagógicos rumo à autonomia

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DECLARAÇÃO

Nome: Maria Manuela Ferreira Ribeiro Endereço eletrónico: manela1962@gmail.com Número do Bilhete de Identidade: 5786527 Título dissertação:

Eu e tu na aula de Inglês: reconfigurar os papéis pedagógicos rumo à autonomia Orientador(es):

Professora Doutora Isabel Flávia Gonçalves Fernandes Ferreira Vieira Ano de conclusão: 2014

Designação do Mestrado:

Mestrado em Ciências da Educação

Área de Especialização em Supervisão Pedagógica na Educação em Línguas

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE;

Universidade do Minho, 28/04/2014

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“O que eu quero principalmente é que vivam felizes.”

Não lhes disse talvez estas palavras, mas foi isto o que quis dizer. No sumário, pus assim: "Conversa amena com os rapazes". E pedi, mais que tudo, uma coisa que eu costumo pedir aos meus alunos: lealdade. Lealdade para comigo, e lealdade de cada um para cada outro. Lealdade que não se limita a não enganar o professor ou o companheiro: lealdade activa, que nos leva, por exemplo, a contar abertamente os nossos pontos fracos ou a rir só quando temos vontade (e então rir mesmo, porque não é lealdade deixar então de rir) ou a não ajudar falsamente o companheiro.

“Não sou, junto de vós, mais do que um camarada um bocadinho mais velho. Sei coisas que vocês não sabem, do mesmo modo que vocês sabem coisas que eu não sei ou já esqueci. Estou aqui para ensinar umas e aprender outras. Ensinar, não: falar delas. Aqui e no pátio e na rua e no vapor e no comboio e no jardim e onde quer que nos encontremos.”

Não acabei sem lhes fazer notar que "a aula é nossa". Que a todos cabe o direito de falar, desde que fale um de cada vez e não corte a palavra ao que está com ela.

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Dedicatória

À memória de meu pai… onde quer que ele esteja, deve estar muito feliz.

Aos meus filhos, Luís e Rui Pedro, que lhes sirva de exemplo de que (quase) tudo é possível e que os faça sonhar e acreditar, tornando a sua vida o espelho dos seus sonhos.

Aos meus sobrinhos-netos, Joana e Mano Rui, símbolos do futuro da Educação em Portugal, desejando que encontrem professores que os inquietem e desafiem.

A todos os meus alunos, por quem eu iniciei este percurso, mais particularmente aos alunos da turma-alvo deste projeto, que sempre viveram a sala de aula de forma especial.

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Agradecimentos

À professora doutora Flávia Vieira, a minha referência incomparável da pedagogia para a autonomia; chamem-lhe supervisora ou orientadora, para mim vai ser sempre mais do que isso.

Às professoras do curso de pós-graduação em Supervisão Pedagógica na Educação em Línguas, que, com a sua sabedoria, contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional.

A todos os meus colegas de curso, em especial ao Hugo e à Joana, que trouxeram alegria e profundidade ao meu percurso de formação.

Às professoras Rosário Carvalho e Júlia Amaro, colaboradoras nesta investigação, que se disponibilizaram a entrar na minha sala de aula.

À minha irmã, Amélia para os amigos e Loquinhas para a família, que faz aflorar o que há de melhor em cada um de nós.

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Eu e tu na aula de Inglês: reconfigurar os papéis pedagógicos rumo à autonomia

Maria Manuela Ferreira Ribeiro Dissertação de Mestrado

Mestrado em Ciências da Educação – Supervisão Pedagógica na Educação em Línguas Universidade do Minho – 2014

RESUMO

Este estudo foi desenvolvido no âmbito da Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação na área de Supervisão Pedagógica na Educação em Línguas, da Universidade do Minho, e diz respeito a uma intervenção pedagógica e investigativa realizada na área curricular de Língua Inglesa, com uma turma do 6º ano de escolaridade de uma Escola E.B. 2,3, durante o ano letivo de 2010/2011.

Pretendendo reconfigurar os papéis pedagógicos da professora e dos alunos, numa visão democrática e transformadora da educação, o estudo tinha como objetivos: (1) analisar representações e perceções da professora e dos alunos sobre os seus papéis pedagógicos na aula de Língua Inglesa; (2) reconfigurar os papéis pedagógicos da professora e dos alunos na aula de Língua Inglesa, através de uma experiência orientada por pressupostos e princípios de uma pedagogia para a autonomia, e (3) avaliar potencialidades e constrangimentos da abordagem implementada.

Os intervenientes foram a professora-investigadora, numa perspetiva de autossupervisão, uma turma do 6º ano de escolaridade, constituída por 25 alunos, e duas professoras colaboradoras, com a função de observar e comentar práticas desenvolvidas. A abordagem didática assentou em práticas de reflexão, regulação, negociação e autodireção, baseadas em pressupostos de uma pedagogia para a autonomia. A informação, de natureza qualitativa e quantitativa, foi recolhida através de questionários, diários, apontamentos reflexivos e um contrato pedagógico.

Os resultados obtidos apontam para a possibilidade de reconfigurar os papéis pedagógicos em sala de aula, através da criação de relações de interdependência democrática que implicam escutar a voz dos alunos, partilhar o poder e negociar decisões pedagógicas. Este é o primeiro passo de uma pedagogia para a autonomia.

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Me and you in the English class: reshaping pedagogical roles towards autonomy

Maria Manuela Ferreira Ribeiro Master’s Dissertation

Master in Sciences of Education – Pedagogical Supervision in LanguageEducation University of Minho – 2014

ABSTRACT

This study was developed within the Dissertation of the Master in Sciences of Education in the area of Supervision in Language Education, at the University of Minho. It involved a pedagogical research intervention in a 6th grade English class at an elementary school, developed during the academic year of 2010/2011.

Aiming at reshaping the teacher and the students’ pedagogical roles within a democratic and transformative vision of education, it had the following objectives: (1) analyzing representations and perceptions of the teacher and the students about their roles in the English language class; (2) reconfiguring the roles of the teacher and the students in the English language class, through an experiment oriented by assumptions and principles of a pedagogy for autonomy, and (3) evaluating the potential value and constraints of the implemented approach.

The participants were the teacher researcher, in a self-supervision perspective, a 6th grade class of 25 students, and two cooperating teachers who observed and commented on teaching practices. The didactic approach involved practices of reflection, assessment, negotiation and self-direction, based on assumptions of a democratic pedagogy for autonomy. Qualitative and quantitative information was collected through questionnaires, diaries, reflective notes and a learning contract.

The results point to the possibility of reshaping pedagogical roles by developing relationships based on democratic interdependence, which entail listening to the students’ voice, sharing power and negotiating pedagogical decisions. This is the first step towards pedagogy for autonomy.

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Índice

Introdução ...………..………...……….……….. 1

Pressupostos teóricos: Começar… ... 5

1. Pedagogia para a autonomia na educação em línguas estrangeiras ... 5

1.1 O que é uma pedagogia para a autonomia? ... 5

1.2 A cidadania e a democracia na educação... 14

2. Reconfiguração dos papéis pedagógicos ... 20

2.1 Autonomia do aluno e do professor ... 20

2.2 A negociação pedagógica ... 27

2.3 O professor reflexivo ... 34

Capítulo II – Entrar na sala de aula… ... 37

Plano de intervenção: Planta da sala de aula. ... 37

1. Objetivos de investigação e tipo de estudo ... 38

2. Contexto de intervenção ... 42

2.1 A escola ... 42

2.2 A turma da experiência ... 44

2.3 A professora ... 46

3. Metodologia de intervenção/ investigação ... 47

Capítulo III – Viver na sala de aula… ... 61

Recolha e análise da informação: Um dia atrás do outro… ... 61

1. Conceções iniciais dos alunos sobre os papéis pedagógicos ... 61

2. Reconfigurando os papéis pedagógicos... 66

3. Avaliação global da experiência ... 81

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Conclusões e perspetivas futuras ... 97

Referências Bibliográficas ... 105

Anexos ... 111

Anexo 1 – Questionário inicial: Eu e Tu na Aula de Inglês ... 113

a) Questionário ... 113

b) Tratamento de dados ... 117

Anexo 2 – Questionário intermédio: Autorregulação – vamos parar para pensar! ... 121

a) Questionário ... 121

b) Tratamento de dados ... 125

Anexo 3 – Questionário final: Eu e Tu na Aula de Inglês ... 129

a) Questionário ... 129

b) Tratamento de dados ... 133

Anexo 4 – Contrato Pedagógico: um pacto de confiança entre professora e alunos ... 137

a) Discussão ... 137

b) Assinatura ... 141

c) Reformulação ... 145

Anexo 5 – Diários ... 149

a) Excertos do diário reflexivo da professora ... 149

b) Diário de aprendizagem dos alunos ... 181

Anexo 6 – Apontamentos reflexivos da observação ... 185

a) Folha de registo ... 185

b) Da professora colaboradora ... 189

c) Da professora investigadora ... 193

Anexo 7 – Testes de avaliação elaborados com os alunos... 197

a) Teste realizado em 25/03/2011 ... 197

b) Teste realizado em 03/06/2011 ... 203

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a) Problemas de comportamento? Autoavaliação ... 209

b) Reflexão: o que penso dos meus professores? ... 213

c) Let’s plan: group work ... 217

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Índice de Figuras

Figura 1 - "Pedagogia" e “Autonomia”... 5

Figura 2 - Papéis pedagógicos do professor e do aluno e relação pedagógica ... 27

Figura 3- Princípios chave da negociação pedagógica (baseado em Breen & Littlejohn, 2000) ... 30

Figura 4 - Perfil do professor reflexivo e condições da sua formação (adaptado de Vieira, 1994) ... 35

Figura 5 - "Planta da sala de aula": elementos do plano de intervenção ... 37

Figura 6- Recursos utilizados e suas funções ... 47

Figura 7- Conclusões da reflexão com os alunos sobre os papéis pedagógicos ... 64

Índice de Quadros Quadro 1 - Condições e princípios facilitadores de uma pedagogia para a autonomia (Vieira, 1998) ... 7

Quadro 2 - Fatores de constrangimento a uma pedagogia para a autonomia (Vieira, 2006) ... 9

Quadro 3 - Pedagogia da dependência e pedagogia para a autonomia (Vieira, 2006) ... 19

Quadro 4 - Análise da definição de autonomia do professor e do aluno (Jiménez Raya et al, 2007) .. 21

Quadro 5 - Papéis do aluno e do professor numa pedagogia para a autonomia (Vieira, 2003) ... 24

Quadro 6 - Imaginar possibilidades entre o real e o ideal (adaptado de Jiménez Raya et al, 2007) .... 25

Quadro 7 - Tipo de decisões abertas à negociação (Breen & Littlejohn, 2000) ... 31

Quadro 8 - Estratégias de intervenção/investigação e papéis do aluno ... 48

Quadro 9 - Papéis pedagógicos: experiência anterior de aprendizagem ... 62

Quadro 10 - Papéis pedagógicos: predisposição para participar nas tarefas pedagógicas ... 62

Quadro 11 - Papéis pedagógicos: participação na experiência anterior e futura ... 63

Quadro 12 - Visões de educação: interpretações dos alunos ... 64

Quadro 13 - Contrato Pedagógico: responsabilidades negociadas e assumidas ... 67

Quadro 14 - Planificação das ações dos grupos de trabalho ... 73

Quadro 15 - Comparação dos registos reflexivos das professoras observadora e investigadora ... 77

Quadro 16 - Papéis pedagógicos: avaliação intermédia ... 80

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Quadro 18 - Papéis do aluno: perceções finais ... 83 Quadro 19 - Papéis da professora: perceções finais ... 83 Quadro 20 - Representação da aula de Inglês ... 85

Índice de Gráficos

Gráfico 1 - Comparação dos resultados dos testes elaborados pela professora e com os alunos ... 94 Gráfico 2 - Comparação dos níveis de sucesso nos testes elaborados pela professora e com os alunos ... 95

Nota: A presente dissertação é redigida de acordo com o novo acordo ortográfico, exceto nos textos ou títulos de obras anteriores à sua generalização, mantendo-se nesses casos a grafia original.

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Introdução

Começa aqui a história da minha aventura pedagógica e investigativa. Aqui faço o convite ao leitor para abrir a porta da minha sala de aula, espreitar o que lá se passa, entrar e viver o seu dia-a-dia. Espero que, ao sair, leve a alma cheia!

Antes de mais, atentemos no título desta experiência pedagógica e investigativa – “Eu e tu na aula de Inglês: reconfigurar os papéis pedagógicos rumo à autonomia” –, servindo de mote para rodar a maçaneta da porta desta sala de aula, espreitar e entrar. O título está dividido em duas partes que se interrelacionam, sendo que na primeira, “Eu e tu na aula de Inglês”, se anuncia ao leitor, de forma sucinta, a temática a explorar, ou seja, a relação entre dois sujeitos pedagógicos que interagem na aula de língua inglesa. Na segunda, “reconfigurar os papéis pedagógicos rumo à autonomia”, especifica-se o propósito da intervenção realizada. Saliento a utilização dos pronomes pessoais “eu” e “tu”, onde se insinua um clima de proximidade e familiaridade, de colaboração e partilha entre professor e aluno, numa relação democrática na sala de aula. Sublinho, ainda, a utilização do verbo “reconfigurar”, que assinala uma intenção de transformação e inovação, numa orientação proativa do processo de ensino e aprendizagem. Finalmente quero chamar a atenção para a utilização da expressão “rumo à autonomia”, que nos dá uma ideia de autonomia como um processo em evolução, inacabado e a decorrer durante a realização da experiência.

As razões que alicerçaram a escolha deste tema prendem-se com um sentimento de insatisfação face à ineficácia do modelo tradicional de transmissão de conhecimentos e o desejo e a necessidade de desenvolver práticas mais democráticas e transformadoras através de estratégias centradas no aluno, promotoras da sua autonomia e da autonomia do professor: “A autonomia do professor e do aluno constituem dois lados da mesma moeda” (Jiménez Raya, Lamb & Vieira, 2007: 45). Pretendeu-se, assim, promover a autossupervisão de todos os intervenientes, com vista a uma libertação de práticas tradicionais.

Numa era de globalização em que as distâncias geográficas ficam esbatidas pela facilidade de comunicação, impõe-se uma nova abordagem na aprendizagem de línguas estrangeiras, neste caso a Língua Inglesa, que desempenhe um papel importante na construção do cidadão do século XXI. Por outro lado, há muito que nas políticas educativas nacionais e internacionais se projeta a dimensão humanista da Educação, numa visão

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construam e desenvolvam competências para a vivência em sociedade. Assim, o presente estudo afigura-se pertinente, uma vez que tem como objetivo global a transformação pessoal dos intervenientes, com vista a serem agentes de mudança, num contexto escolar, pleno de desafios e em permanente transformação.

Numa sociedade do conhecimento e da informação como a nossa, a comunicação e a construção do saber são premissas fundamentais, pois um mundo em constante mudança implica uma aprendizagem para além da escola e ao longo da vida. Há que dotar os jovens de novas competências e requalificar as competências dos adultos; há que dar oportunidades a todos os cidadãos para que se sintam preparados e capazes (e o sejam efetivamente) de atuar no mundo moderno em que vivem e possam apreciá-lo, transformá-lo, melhorá-transformá-lo, torná-lo mais justo e equitativo. Neste sentido, o Conselho e o Parlamento Europeu adotaram, em 2006, um quadro de referência europeu com as competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida, de modo a tornar a Europa mais produtiva e competitiva. No âmbito do programa de trabalho “Educação e Formação 2010”, este quadro de referência identifica e define competências-chave que os estados membros devem desenvolver em todos os seus jovens e adultos, numa garantia de equidade no acesso de todos os cidadãos. Entre essas competências encontram-se as seguintes: comunicação em línguas estrangeiras, aprender a aprender e competências sociais e cívicas. O estudo aqui relatado integra estas competências através da exploração de uma pedagogia para a autonomia na educação em línguas.

Assistimos hoje à necessidade de uma mudança de paradigma na educação, que inevitavelmente vai afetar a visão de educação, o modo de gestão das escolas, o modo de ensinar e aprender, o papel pedagógico do professor e dos alunos. Esta mudança paradigmática tem de apostar na escola, na formação inicial, mas também na requalificação e na formação contínua, e este processo tem de viver para além de ambientes educativos e ao longo da vida. Como nos diz Hargreaves (2003: 37),

“A sociedade do conhecimento é uma sociedade da aprendizagem. O sucesso económico e uma cultura de inovação contínua dependem da capacidade dos trabalhadores para continuarem a aprender por si próprios e uns com os outros. Uma economia baseada no conhecimento não funciona no poder das máquinas, mas sim no dos cérebros – o poder de pensar, de aprender, de inovar.”

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Na sociedade global do séc. XXI, a reconfiguração dos papéis pedagógicos do professor e do aluno torna-se inevitável. O professor deverá assumir-se como facilitador e mediador da aprendizagem, e o aluno como construtor ativo e crítico do conhecimento. Professor e aluno constroem assim significativamente o saber, numa relação dialógica assente em ideais democráticos, tornando-se potenciais agentes de transformação social. No entanto, este processo de emancipação é lento e gradual e varia de acordo com os contextos onde é desenvolvido. Existe ainda uma relação de poder muito assimétrica na sala de aula, resultante de uma pedagogia tradicional onde o professor é o detentor de todo o saber e onde se fomenta a dependência do aluno face ao professor. Para contrariar esta tradição, o professor deve, acima de tudo, ouvir os seus alunos e convidá-los a participarem e a responsabilizarem-se na e pela aprendizagem. Este é o primeiro passo rumo a uma pedagogia para a autonomia: o professor estar atento e ouvir a voz dos seus alunos. Este foi também o princípio-chave da experiência que aqui se relata.

A narrativa da experiência foi dividida em quatro capítulos que pretendem dar a conhecer ao leitor o meu estudo em todas as suas vertentes, explicitando os seus propósitos, os acontecimentos e as potencialidades e constrangimentos encontrados. Assim, e usando uma metáfora que sublinha a centralidade da aula neste projeto, no primeiro capítulo, “Abrir a porta...”, são referidos os pressupostos teóricos subjacentes à temática da pedagogia para a autonomia na educação em línguas estrangeiras e à consequente reconfiguração dos papéis pedagógicos do professor e do aluno. O segundo capítulo, “Entrar na sala de aula…”, debruça-se sobre a natureza do estudo e a metodologia utilizada, explicitando o contexto em que foi operacionalizado e enumerando as atividades, os recursos e os instrumentos utilizados. No terceiro capítulo, “Viver na sala de aula…”, o leitor tem acesso aos resultados obtidos e interpretados à luz do quadro teórico do estudo. Finalmente, no último capítulo, “Fechar a porta…”, apresentam-se as conclusões do estudo face aos objetivos delineados e as expetativas para futuras intervenções em outras salas de aula.

O estudo aqui relatado foi realizado no âmbito da dissertação do Mestrado em Ciências da Educação, na área de Supervisão Pedagógica na Educação em Línguas. Visou reconfigurar os papéis pedagógicos da professora e do aluno, no quadro de uma pedagogia para a autonomia, e pretendeu cumprir os seguintes objetivos: analisar representações e perceções dos alunos sobre os papéis pedagógicos do professor e do aluno na aula de Língua

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Inglesa; analisar representações e perceções da professora sobre os papéis pedagógicos do professor e do aluno na aula de Língua Inglesa; reconfigurar os papéis pedagógicos do professor e do aluno na aula de Língua Inglesa e avaliar potencialidades e constrangimentos das abordagens vivenciadas.

A experiência, realizada pela autora como professora-investigadora, desenvolveu-se na área curricular de Inglês, com uma turma do 6º ano de escolaridade, numa escola E. B. 2, 3 do concelho de Guimarães, no ano letivo de 2010/2011, em três fases diferentes, correspondentes aos três períodos letivos, de forma gradual e com crescente complexidade. Foram utilizados diversos instrumentos de caráter pedagógico e investigativo, nomeadamente questionários, diários e um contrato pedagógico, atividades autodirigidas e práticas de trabalho colaborativo na aprendizagem, com vista a promover e estimular a reflexão, a negociação e a regulação, permitindo assim dar voz ao aluno e contribuir para a sua autonomia, e também para a emancipação da professora. Contou-se, ainda, com a colaboração pontual de duas professoras da escola na observação de práticas.

Serão apresentados e analisados os resultados desta experiência, que, de uma forma global, ilustram o modo como uma pedagogia para a autonomia favorece a reconfiguração dos papéis pedagógicos do professor e do aluno, num espaço de cidadania democrática traduzida em relações de interdependência positiva e na partilha de poder e de decisões. Nesta sala de aula viveu-se, cresceu-se, aprendeu-se, caminhou-se para a autonomia. Primeiro, entreabrindo as janelas para deixar a brisa entrar e depois escancarando-as, convidando o ar fresco a permanecer. A porta desta sala de aula estará sempre encostada e nunca será fechada à chave, permitindo que qualquer pessoa entre e disfrute da sua vida. Espera-se que esta experiência constitua mais um exemplo de que é possível mudar a educação em línguas, de forma a promover uma relação pedagógica mais democrática e potenciar a autonomia na aprendizagem.

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Capítulo I – Abrir a porta…

Pressupostos teóricos: Começar…

Este primeiro capítulo pretende abrir a porta do estudo ao leitor, apresentando os pressupostos teóricos que o orientaram. Assim, vou primeiro refletir sobre a pedagogia para a autonomia nas línguas estrangeiras, baseando-me em conceitos de cidadania e democracia. Seguidamente, irei aflorar a necessidade de reconfiguração dos papéis pedagógicos do professor e do aluno, tornando-se o primeiro um professor reflexivo e o segundo um aluno envolvido, e ambos cooperantes e autónomos na aprendizagem, através da negociação pedagógica.

1. Pedagogia para a autonomia na educação em línguas estrangeiras

1.1 O que é uma pedagogia para a autonomia?

A figura 1 apresenta dois acrósticos que sintetizam um conjunto de noções que podemos associar aos conceitos de “pedagogia” e “autonomia”.

P rofessor

E nsino

D esejo de saber A prendizagem

G estão de problemas

O rganização de tarefas e ambientes G anhar conhecimento I nvestigação A luno A utodeterminação U nião de esforços T rabalho O rganização do estudo N ecessidades e interesses O bjetivos próprios M udança pessoal e social I n(ter)dependência

A rriscar

Figura 1 - "Pedagogia" e “Autonomia”

O conceito de autonomia não é um conceito novo, remontando às reflexões dos pensadores da Grécia e Roma Antigas, nomeadamente Sócrates e Aristóteles, Séneca e Cícero. Contudo, é sobretudo no final do séc. XIX que surge com especial relevo na educação, com o movimento da Escola Nova, cujo principal objetivo era o desenvolvimento

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da autonomia do aprendente. Ainda assim, o movimento da pedagogia para a autonomia não conseguiu enraizar-se na Escola e na Educação.

Henri Holec, pedagogo francês, considerado o principal percursor da introdução do conceito de autonomia na educação em línguas, conceptualizou e operacionalizou esse conceito no C.R.A.P.E.L. (Centre de Recherches et d’Applications Pédagogiques en Langues), na Universidade de Nancy em França, coordenando um sistema de aprendizagem autodirigida, destinado a estudantes universitários. Questionando os modelos tradicionais de transmissão de conhecimentos, diversos investigadores da educação em línguas têm vindo a teorizar uma pedagogia para a autonomia, com algum eco nas comunidades educativas. Vejamos algumas definições de autonomia:

 capacidade de gerir a própria aprendizagem (Holec, 1979)

 capacidade de planear, monitorizar e avaliar as atividades de aprendizagem, tanto quanto ao seu conteúdo como quanto ao seu processo (Little, 1991)

 responsabilidade para tomar e implementar decisões que dizem respeito à sua aprendizagem (Dickinson, 1992)

Estas definições referem três aspetos essenciais à autonomia dos sujeitos: a responsabilidade, a reflexão e a ação. Mas o conceito não se esgota aqui. Outros, como Paulo Freire (1994, 2001, 2002), juntam-lhe a ideia de liberdade e de transformação pessoal, social e política. Por outro lado, é importante articular a autonomia do professor e do aluno, fazendo depender uma da outra, como defendem Jiménez Raya, Lamb & Vieira (2007), para quem a autonomia é, antes de tudo, um interesse coletivo ao serviço da democracia. É ainda importante referir que os sujeitos podem manifestar diferentes graus de autonomia, conforme as suas capacidades, motivações, experiências e contextos onde interagem.

O conceito de autonomia é um conceito complexo, com raízes na Filosofia e na Ciência Política, que foi evoluindo com a contribuição de muitos pedagogos e investigadores em diversas áreas. O conceito abrange uma multiplicidade de dimensões, tendo implicações pessoais, sociais e políticas. Representa uma capacidade ou competência que se pode construir ou desenvolver nos indivíduos, que lhes permite tomar decisões e fazer escolhas sobre a sua aprendizagem ao longo da vida, responsabilizando-se por ela. Assim, a autonomia tem a ver com liberdade e reflexividade, mas também com responsabilidade e

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agência. Podemos referir aqui algumas condições e princípios que favorecem uma pedagogia para a autonomia, apresentados por Vieira (1998: 94) conforme o quadro 1.

Condições facilitadoras Implicações pedagógicas: princípios organizadores 1. INTEGRAÇÃO

integração do desenvolvimento da competência de aprendizagem do aluno no processo de desenvolvimento da sua competência de comunicação

Inclusão da competência de aprendizagem – intrapessoal interpessoal e didáctica – nas intenções e acções pedagógicas Alargamento dos conteúdos instrucionais: linguísticos e processuais

Acesso do aluno ao saber didáctico/ processual Articulação entre aprender e aprender a aprender a LE

2. TRANSPARÊNCIA

explicitação dos pressupostos, objectivos e formas de desenvolvimento das

competências de comunicação e de aprendizagem

Partilha do saber didáctico com o aluno

Envolvimento do aluno na descoberta do funcionamento do processo do ensino/ aprendizagem da LE

Desenvolvimento de uma postura crítica face ao processo de ensino/ aprendizagem da LE

3. METODOLOGIA ESPECIALIZADA

criação de actividades didácticas incidentes no desenvolvimento da autonomia do aluno enquanto aluno e enquanto falante

Actividades didácticas de tipo reflexivo e experimental, sobre as dimensões linguística e processual da aprendizagem da LE (incluindo tarefas de "descondicionamento")

Actividades de conceptualização (compreensão) e de programação (tomada de decisões) que envolvam operações de reflexão, experimentação, monitoração, negociação e auto-direcção

Construção/adaptação de materiais didácticos "autonomizantes"

4. NEGOCIAÇÃO

negociação dos assuntos e dos papéis, conducente à recuperação da autoridade pedagógica e do poder discursivo do aluno

Construção colaborativa de saberes Diversificação dos papéis pedagógicos

Redistribuição de direitos e deveres académicos e discursivos Envolvimento do aluno no processo de gestão da informação (conteúdo e ilocução) e da palavra (forma e distribuição), e na avaliação da aprendizagem

5. COLABORAÇÃO

diversificação das formas de organização do trabalho, com ênfase nas tarefas de tipo colaborativo e no reforço das relações simétricas (entre alunos)

Promoção da independência e da interdependência Encorajamento da colaboração e inter-ajuda

Diversificação de recursos de aprendizagem para auto-gestão colaborativa

... 6. PROGRESSÃO

desenvolvimento progressivo da autonomia do aluno, definida como capacidade de gestão da aprendizagem

Avaliação dos contextos (conhecimento da situação) Abordagens adequadas aos contextos em termos de focalização, operacionalização e gestão pedagógicas Adopção de estratégias de 'descondicionamento' Preparação - psicológica e metodológica- sistemática

Quadro 1 - Condições e princípios facilitadores de uma pedagogia para a autonomia (Vieira, 1998)

Verificamos que estas condições e princípios estão agrupados em seis dimensões: integração, transparência, metodologia especializada, negociação, colaboração e

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progressão. A sua operacionalização depende de vários fatores, por exemplo (Vieira, 1999b: 2-3):

a) As concepções e experiências anteriores dos alunos: o professor que pretende desenvolver uma pedagogia para a autonomia deve ter em conta que o processo de ensino e aprendizagem é tradicionalmente reprodutor e pouco autonomizante; por isso, os alunos trarão consigo essa representação da prática pedagógica. Assim, o professor deve, em primeiro lugar, procurar informação sobre o contexto para conhecer o grau de autonomia dos seus alunos e assim desenvolver intervenções emancipatórias com uma maior garantia de sucesso.

b) As concepções e experiências dos professores: também os professores estão tradicionalmente habituados a práticas e teorias pedagógicas pouco autonomizantes que precisam de questionar, no que diz respeito ao seu papel, ao papel do aluno e ao papel do contexto em que atuam. Esta atitude crítica implica reflexividade, tornando o professor mais consciente dos condicionalismos e das possibilidades da sua ação. Ao operar-se esta transformação, o professor vai desenvolver a autonomia nos seus alunos e tornar-se, ele próprio, mais autónomo, pois a autonomia do professor e do aluno são indissociáveis e estão intrinsecamente relacionadas.

c) As condições sociais e institucionais do ensino e aprendizagem: professores e alunos convivem num contexto social e educativo que os condiciona na sua ação e que pode favorecer ou limitar a liberdade de decisão. Professores e alunos devem estar conscientes de que a ideia de autonomia é controversa e nem sempre é aceite e compreendida, e tem uma natureza utópica que lhe é fundamental para operar mudanças, por muito insignificantes que possam parecer.

Os constrangimentos a uma pedagogia para a autonomia em contexto escolar podem ser muito variados. No quadro 2, apresentam-se constrangimentos relativos ao contexto, ao professor e ao aluno, definidos por Vieira (2006:30).

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Fatores relativos ao contexto

o Valores (políticos, socioculturais, educacionais): competitividade, individualismo, eficácia, normalização, resignação, obediência à autoridade…

o Tendências e tradições da educação escolar: políticas educativas centralizadoras, currículos-mosaico, manuais normalizadores da aprendizagem, exames externos, fragmentação do tempo de

aprendizagem, número de alunos por turma e de turmas por professor, falta de recursos e espaços educativos, isolamento profissional dos professores, falta de tempo para refletir e investigar a prática…

o Cultura institucional: hierarquização de papéis, regulamentação excessiva, burocratização do trabalho do professor, prestação de contas…

o Expectativas da família ou da comunidade sobre o papel da escola: visão do professor como

transmissor de conhecimentos, do aluno como recetor passivo, da avaliação como forma de seleção, do castigo e da recompensa como formas de educação…

Fatores relativos ao professor

o Formação profissional (inicial/contínua): académica, aplicacionista (não reflexiva)

o Experiência anterior como aluno: centrada na autoridade do professor e do conhecimento

o Teorias pessoais (valores, atitudes, convicções…) relativas à educação escolar: visão da educação como reprodução

o Práticas de ensino: centradas na autoridade do professor e do conhecimento

o Atitudes face à profissão: conformismo, impotência, inércia, desmotivação, pessimismo, cinismo, cansaço, isolamento…

o Biografia pessoal: fatores relativos à personalidade, condições e percursos de vida… que podem condicionar negativamente o professor

Fatores relativos ao aluno

o Experiência anterior de aprendizagem: centrada na autoridade do professor e do conhecimento o Teorias pessoais (valores, atitudes, convicções…) relativas à educação escolar: visão da educação como

reprodução

o Práticas de aprendizagem: centradas na autoridade do professor e do conhecimento

o Atitudes face à escola: conformismo, impotência, inércia, desmotivação, pessimismo, cinismo, cansaço, isolamento…

o Biografia pessoal: fatores relativos à personalidade, condições e percursos de vida… que podem condicionar negativamente o aluno

Quadro 2 - Fatores de constrangimento a uma pedagogia para a autonomia (Vieira, 2006)

Para além destes fatores, há a considerar algumas objeções frequentemente levantadas pelos professores a uma pedagogia para a autonomia em contexto escolar. Apontam-se problemas como a perda da autoridade do professor e a ausência de uma efetiva aprendizagem do aluno, pondo-se em causa a eficácia do processo de ensino; por outro lado, há por vezes o entendimento de que só alguns alunos conseguem atingir a autonomia, ou que esta constitui uma metodologia de autoinstrução, tornando o papel do professor redundante e indesejável. Estas questões resultam de “pressupostos falsos” sobre a autonomia (Little, 1991: 3). Pelo contrário, uma pedagogia para a autonomia confere uma dinâmica mais interativa ao processo de ensino e aprendizagem, apostando na reflexão,

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responsabilidade e negociação, redefinindo os papéis pedagógicos do professor e do aluno, tornando-os mais exigentes, participativos e democráticos.

A ideia de autonomia tem vindo a ser consagrada em políticas educativas e curriculares europeias (Miliander & Trebbi, 2011), embora não seja posta em prática na maior parte dos casos. Ora vejamos:

a) Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – o objetivo de preparação para a cidadania democrática implica “promover métodos de ensino das línguas vivas que reforcem a independência de pensamento, de juízos críticos e de acção, associada a capacidades sociais e a responsabilidade.” (Conselho da Europa, 2001: 22);

b) Lei de Bases do Sistema Educativo em Portugal – a finalidade da escola é “o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários” (Lei nº 46/86: artº 2).

c) Programas e Orientações Curriculares – no programa de Inglês do 2º ciclo regista-se que “se fomenta a motivação e empenho do aluno, ao mesmo tempo que ele se torna mais responsável e autónomo ao ser chamado a intervir, a negociar, a tomar decisões e a assumi-las (…) sendo a promoção da autonomia do aluno na utilização da língua inglesa para fins comunicativos o objectivo fundamental da aprendizagem e do ensino desta disciplina (…)” (Ministério da Educação, 1996: 40-41)

As razões para que uma pedagogia para a autonomia continue a não ser concretizada no contexto escolar português e a não ser reconhecida pelos agentes educativos são variadas. Podemos enunciar algumas, que se prendem com alguns dos constrangimentos assinalados no quadro 2 acima. A tradição ainda é o que era! Não existem rotinas de trabalho colaborativo entre os professores, de partilha de experiências, de reflexão sobre as práticas e de inovação. Por outro lado, apesar de se advogar a autonomia, é exigido às escolas que estabeleçam e cumpram percentagens de sucesso nos resultados escolares e aos professores que sejam rigorosos no cumprimento dos conteúdos dos programas. As

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recentes reformas associadas à definição de “metas de aprendizagem” vêm reforçar esta pressão. Os professores que querem transformar esta situação sentem-se sozinhos, sem apoios, com muitas críticas à sua competência e agência, com muitos obstáculos a ultrapassar. Também não existe em Portugal uma cultura de colaboração entre as universidades e as escolas, que permitiria ao professor tornar-se investigador e estar assim mais seguro das suas arriscadas intervenções. Quando o professor decide transformar-se em investigador nunca mais será o mesmo, porque “Teaching becomes a sort of research, and research becomes a way of teaching” (Vieira, 1999a: 155). Através da investigação pedagógica, os professores iniciam eles próprios, conjuntamente com os seus alunos, um processo de emancipação.

As transformações são sempre difíceis e demoradas, pois implicam mudanças de visões e comportamentos enraizados. É necessário o sujeito estar predisposto à mudança e estar preparado para avanços e recuos, sem perder a esperança. O poder estabelecido é muito forte e o professor tem de compreender a sua realidade, explorando as suas potencialidades e constrangimentos, e procurar espaços de ação e iniciando ou reforçando a sua emancipação profissional; ele tem de se servir da sua criatividade para encontrar soluções e procurar alternativas para os muros que se forem criando e levantando à sua volta, pois “os professores que aceitam o status quo estão nadando a favor da corrente, mas os que desafiam a dominação estão nadando contra a corrente” (Freire & Shor, 1986: 107).

É sempre possível fazer alguma coisa. Existem sempre algumas possibilidades de ação. Entre o real (o que é) e o ideal (o que devia ser) há o possível (o que pode ser). Esta perspetiva re(ide)alista da educação (Jiménez Raya, Lamb & Vieira, 2007) requer esperança e perseverança, acreditando-se na possibilidade de fazer transformações, mesmo sendo pequenas e aparentemente insignificantes:

“A noção de autonomia, quer falemos de alunos ou de professores, encerra uma dimensão utópica essencial ao seu sentido emancipatório; essa utopia ganha legitimidade quando se traduz em mudanças, por muito pequenas que sejam, na qualidade das condições em que professores e alunos trabalham.” (Vieira, 1999b: 3-4)

A escola deve preparar o aluno para o mundo atual, em constante mudança, ensinando-o a pensar e facultando-lhe as ferramentas necessárias para a resolução dos

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problemas que a sociedade enfrenta ou poderá vir a enfrentar. É necessário um novo paradigma da Escola que se preocupe em “educar os alunos na autonomia, pela autonomia e para a autonomia (…)” (Cardoso, Peixoto, Serrano & Moreira, 1996: 85).

Felizmente, há já diversos estudos e experiências direcionados a uma pedagogia para a autonomia. Por exemplo, e no âmbito do curso de Mestrado em que esta dissertação se integra, têm sido realizados vários projetos de promoção da autodireção na aprendizagem da língua estrangeira em contexto escolar ou de análise de práticas de autonomia (por exemplo, Menezes, 2009; Silva, 2009; Teixeira, 2012; Brandão, 2013). Por outro lado, têm sido realizadas inúmeras experiências de maior e menor dimensão no âmbito do GT-PA – Grupo de Trabalho-Pedagogia para a Autonomia –, um grupo de académicos e de professores ao qual pertenço, coordenado por Flávia Vieira desde 1997, e que tem vindo a explorar uma pedagogia para a autonomia, promovendo o estudo e a partilha de experiências pedagógicas e de formação de professores.

O GT-PA, iniciado apenas com professores de língua inglesa, foi expandindo o seu âmbito para outras áreas do saber e estreitando a relação dos investigadores académicos da universidade com professores das escolas dos variados níveis de ensino, com o objetivo de produzir colaborativamente diálogos interdisciplinares. Contando já com quinze anos de existência, mantém-se com o seu caráter estruturadamente caótico (Fernandes & Vieira, 2009), querendo-se com isto sublinhar a flexibilidade e diversidade do seu modo de funcionamento e dos seus participantes. De acordo com a sua coordenadora, o GT-PA é:

“Um caso que prova que o contacto entre investigadores e professores não tem de ser marcado por prioridades, linguagens e experiências opostas, por críticas e resistências de ambos os lados, resignados uns e outros a papéis distanciados e irreconciliáveis, eternamente condenados a ‘diálogos de surdos’ onde as vozes ecoam em vales distintos de uma paisagem que é, afinal, comum a todos.” (Vieira, 2003: 214)

Este grupo de trabalho tem realizado atividades sobre, para e nos contextos de ensino e aprendizagem. As primeiras dizem respeito a estudos de natureza descritiva (por exemplo análise de programas e manuais escolares, análise de representações de professores e alunos, etc.), visando a compreensão do modo como os contextos podem potenciar ou impedir a pedagogia para a autonomia; as segundas apostam na construção de instrumentos

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de referência para a construção e avaliação das experiências pedagógicas e de formação profissional; finalmente, as últimas referem-se à experimentação, mais ou menos prolongada, que exploram uma abordagem emancipatória. Estas atividades têm sido objeto de divulgação em encontros, congressos e ações de sensibilização, mas também na publicação de “Cadernos” e livros de Atas onde têm participado muitos elementos do grupo e onde se faz a síntese do trabalho realizado.

Como refere Vieira,

“No GT-PA, acredita-se na possibilidade de transformar as condições de ensino e da aprendizagem através da emancipação dos professores e da autonomização dos alunos; e acredita-se que este trabalho pode ser feito em conjunto com investigadores da universidade, num processo de democratização da investigação e das relações universidade-escola.” (2003: i-ii)

O GT-PA representa uma comunidade de aprendizagem constituída por profissionais que têm as mesmas preocupações e os mesmos anseios relativamente à educação. Criou-se uma união e uma fraternidade entre os seus membros, e nos encontros, verdadeiros espaços e tempos de partilha, reflexão e aprendizagem, respira-se uma atmosfera de mudança, colaboração e esperança. Richard Smith, um investigador britânico que pertence ao grupo, num texto que finaliza um dos Cadernos, fala do espírito do GT-PA:

“(…) in rereading these pages I experienced again that positive ‘feeling of togertherness’ which seems to me very characteristic of the GT-PA. Togertherness among you, togertherness among your students, and perhaps – I don’t know – an enhanced feeling of ‘togertherness inside yourself’ (autonomy) which can come from positive collaboration with colleagues and students.” (2003: 127)

Como conclusão, direi que é ao GT-PA que vou buscar a força para continuar a sentir-me livre e não ficar presa à minha rotina, abrindo a porta da minha sala de aula a uma pedagogia para a autonomia. A experiência aqui relatada é um exemplo disso.

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1.2 A cidadania e a democracia na educação

É impossível falar de autonomia sem falar de democracia e sem nos referirmos ao pensamento de John Dewey (2007). Este foi um pensador complexo e controverso. Como afirma João Paraskeva,

“Somos, na verdade, confrontados com uma figura cuja análise se afigura assaz difícil. (…) Estamos perante um intelectual complexo que adoptou posições controversas. (...) No entanto, esta complexidade em torno da figura de Dewey não dissuadiu o interesse no cerne da investigação. Bem pelo contrário, tal complexidade funciona como um profundo estímulo à investigação do seu trabalho.” (Paraskeva, 2005: 24)

Para Dewey, a democracia é um ideal social de qualquer sociedade moderna, que se deve praticar na escola e através do qual o cidadão constrói o conhecimento. A escola é, antes de tudo, uma instituição social ao serviço da evolução da sociedade, de modo a transformá-la num espaço de vivência mais equitativa, solidária e justa, permitindo aos seus elementos viver uma vida mais agradável e plena. No entanto, embora a sociedade seja uma entidade agregadora, ela é composta de uma pluralidade de indivíduos que têm de estar dispostos a interagir e a cooperar entre si e com outras sociedades, pois o isolamento, quer individual quer social, não traz progressão nem reconstrução e cria uma sociedade estratificada em que os indivíduos se deixam dominar, muitas vezes sem disso terem consciência. Como refere Paraskeva, “Platão definiu o escravo como alguém que aceita de um outro os propósitos que controlam a sua conduta” (op. cit.: 32).

A educação é indispensável à redução das desigualdades sociais, que se concretiza através da democracia e do exercício da cidadania. A educação é um palco privilegiado para estas ideias se desenvolverem e experienciarem. Tendo como valores a democracia e a equidade, a educação escolar universalizou-se: em 1964, torna-se obrigatória a escolaridade de seis anos no nosso país; em 1986, alarga-se para nove anos; e, por fim, em 2009, expande-se a escolaridade obrigatória para doze anos.

Com esta expansão da educação escolar, que se queria equitativa e universal, assiste-se ao fenómeno da explosão da diversidade e quantidade de alunos que agora têm acesso à escola. Apesar de se ter conseguido a universalização no acesso à educação escolar, o

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mesmo não se passou em relação ao sucesso dos alunos, consequência da heterogeneidade com que se vive nas escolas e da pedagogia estandardizada com que se ensina e aprende. Condicionados por diversas circunstâncias, nomeadamente o meio familiar, social, económico e cultural de origem, os alunos têm o acesso à escolaridade garantido, mas o seu sucesso fica aquém do pretendido num sistema de ensino uniformizado. De notar aqui que a diversidade não se cinge aos alunos, pois os professores também aumentaram em grande número e com isso trouxeram a diferença aos estabelecimentos de ensino, que, por sua vez, se multiplicaram para acolher uma massa crescente de estudantes.

Para lidar com esta condição é necessário construir uma escola diferente. Então legisla-se sobre a avaliação, o currículo e a orgânica das escolas. Determina-se que a avaliação passe a ser formativa e não seletiva, que os currículos sejam diferenciados e flexibilizados. Surgem assim os currículos alternativos, as adequações curriculares, a Área-escola e as áreas curriculares não disciplinares. Modifica-se o modelo de gestão das Área-escolas, chamando os encarregados de educação a intervir e as comunidades locais a participarem da liderança dos agrupamentos escolares. Transmite-se a ideia de que na educação “o que é igual deve ser tratado igualmente e o que é desigual deve ser tratado de forma diferenciada” (Formosinho & Machado, 2011: 21). Ao mesmo tempo, são exigidas às escolas avaliações externas e exames nacionais, estatísticas e resultados positivos. As escolas têm assim de lidar com a pluralidade e estar sujeitas à uniformidade.

As aprendizagens escolares deveriam estar relacionadas com as aprendizagens do dia-a-dia. Assim, as aprendizagens querem-se ativas (proporcionando desafios e estímulos),

significativas (de acordo com os interesses e necessidades), integradoras (relacionadas com

as vivências de cada um), diversificadas (permitir o contacto com muitas e variados recursos e estratégias) e socializadoras (garantindo uma formação pessoal e social) (Sarmento & Freire, 2011: 46-47). Estas aprendizagens devem envolver os alunos e proporcionar-lhes as competências para poderem viver em pleno a sua cidadania, agindo criticamente na sociedade. É neste enquadramento que faz sentido desenvolver uma pedagogia para a autonomia.

Numa sociedade democrática, os cidadãos vivem a sua cidadania de forma livre e autónoma e esta vivência tem de começar na escola. Mas como tornar os alunos participativos e envolvidos? Segundo Delors (1996), de acordo com as exigências das

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sociedades modernas, a educação deve assentar em quatro pilares fundamentais organizados em aprendizagens essenciais:

1. Aprender a conhecer (adquirir os meios para aprender e compreender o mundo, mas também tirar prazer nessa compreensão, despertar curiosidade intelectual, estimular o sentido crítico);

2. Aprender a fazer (aprender a agir na realidade envolvente para a transformar); 3. Aprender a viver em comum (participar e cooperar são as ações mais importantes numa base de entendimento, solidariedade e respeito pelo outro);

4. Aprender a ser (a educação deve dar ao homem o seu desenvolvimento pleno, de modo a que ele possa elaborar pensamentos críticos e autónomos, bem como formular juízos de valor).

De acordo com Carbonell Sebarroja (2001), a democracia e a educação são conceitos que não podem existir separadamente, porque um influencia o outro. Assim, apresenta algumas características da escola democrática para que assim seja considerada. Então, a democracia na escola:

a) só se concretiza se existir harmonia entre a liberdade e a igualdade; b) é um direito e um dever, um desejo e uma necessidade;

c) é uma porta aberta ao respeito crítico e ativo, não à intolerância e ao relativismo; d) favorece a autonomia, através do diálogo e da colaboração;

e) tem de mostrar a máxima eficácia no serviço à comunidade.

Segundo Paulo Freire, a educação autêntica “faz-se de A com B, mediatizados pelo mundo” (1994: 84). A educação deve ser problematizadora e libertadora, humanizando o Homem com o seu poder crítico e criador. Assim, o Homem é concebido como ser autêntico, pensante e único, que reflete sobre o mundo para o compreender e o transformar. A esta conceção, Paulo Freire contrapõe a “educação bancária”, prática e instrumento de dominação dos opressores sobre os oprimidos. Esta visão de educação é um mecanismo ao serviço da classe dominante e opressora, que aliena a sociedade e os indivíduos. Caracteriza-se por Caracteriza-ser uma educação em que o educador deposita os conteúdos nos educandos, Caracteriza-sendo

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estes considerados meros recipientes para serem enchidos. Neste sentido e de acordo com Paulo Freire (op. cit.: 34), os papéis do professor e dos alunos numa educação bancária resumem-se ao seguinte:

“a) o educador é o que educa; os educandos, os que são educados; b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem; c) o educador é o que pensa; os educandos, os pensados;

d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente: e) o educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;

f) o educador é o que opta e prescreve a sua opção; os educandos os que seguem a sua prescrição;

g) o educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador;

h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta escolha, se acomodam a ele;

i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele;

j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.”

Como pode o homem agir sobre o mundo com esta educação disciplinadora, limitadora e redutora? Como pode o homem viver a sua cidadania democrática? Onde fica o direito à vivência da sua cidadania e da sua liberdade democráticas? Como afirma Paulo Freire (2001: 18), “Não é a cultura discriminada a que gera a ideologia discriminatória, mas a cultura hegemônica a que o faz”. Assim, e no caso da educação escolar, impõe-se uma mudança profunda de uma tradição reprodutora e domesticadora. Impõe-se a passagem de uma pedagogia da dependência a uma pedagogia para a autonomia.

Como afirma Vieira (1998, 1999), uma pedagogia da dependência e uma pedagogia

para a autonomia são dois modos de ensinar e aprender. Estas duas abordagens

pedagógicas baseiam-se em pressupostos opostos, refletindo-se nos papéis pedagógicos do professor e do aluno. Assim, uma pedagogia da dependência postula o aluno como recetor do conhecimento, inativo e não participativo, o professor como único detentor e transmissor do saber, e o saber como algo inerte e completo. A aprendizagem centra-se em processos de

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memorização e na aquisição/desenvolvimento de capacidades de tipo cognitivo, com vista à aptidão académica. Realiza-se através de atividades definidas pelo professor, focadas nos conteúdos programáticos e avaliadas de acordo com critérios de seleção dos sujeitos, num clima hierarquizado em que o aluno se torna dependente do professor e desinteressado da aprendizagem. Por sua vez, numa pedagogia para a autonomia, o aluno assume-se como criador do conhecimento, opinativo e ativo, o professor como orientador do processo de aprendizagem e o saber é visto como algo em transformação e pleno de movimento. Os objetivos a atingir são tornar o aluno responsável pela sua própria aprendizagem, que ele gere com postura crítica e reflexiva. Este processo é concretizado com atividades de caráter experimental e colaborativo, com a partilha de decisões pedagógicas, numa relação democrática em que o aluno se vai tornando autónomo e pronto para agir.

O quadro 3 (Vieira, 2006: 25) sumaria os pressupostos e finalidades de uma pedagogia da dependência e de uma pedagogia para a autonomia, respetivamente assentes numa visão reprodutora e transformadora da educação. Mas como fazer a transição de uma pedagogia da dependência para uma pedagogia para a autonomia? Avançar de uma para a outra significa uma mudança de visão de educação e não se faz com um passe de mágica. Exige tempo, exige envolvimento, exige reconstrução e, acima de tudo, exige esperança. Parece não haver grandes danos quer para o professor, quer para o aluno; muito pelo contrário. Relativamente à implementação de uma pedagogia para a autonomia, Allwright diz que “Certainly we teachers would seem to have very little to lose, and learners could have a great deal to gain” (1988: 40).

Numa pedagogia para a autonomia o papel pedagógico do professor é, em última análise, tão complexo como o papel pedagógico do aluno. Segundo Heidegger (1968:15), ensinar é mais difícil que aprender, pois ensinar é facilitar a aprendizagem; o professor tem mais a aprender do que os seus alunos, ele tem de aprender a deixá-los aprender. Jiménez Raya (2008: 127) afirma: “La clave de la pedagogia para la autonomia está en dejarles aprender; en permitirles seguir aprendendo. De aquí se deriva un nuevo papel para el professor. Este papel se resume en: conocer al alumno y valorar sus processos de pensamento.”

Na experiência pedagógica e investigativa que desenvolvi e que dá origem a este relatório, tentei que os meus alunos desenvolvessem a sua autonomia e questionassem os modelos tradicionais dos papéis pedagógicos dos agentes educativos mais imediatos, ou

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seja, o professor e os alunos, e considero que obtive algum sucesso. De facto, em muitos momentos desta intervenção viveu-se efetivamente uma pedagogia para a autonomia e houve claramente um afastamento de uma pedagogia de dependência.

REPRODUÇÃO

PEDAGOGIA DA DEPENDÊNCIA

TRANSFORMAÇÃO

PEDAGOGIA PARA A AUTONOMIA PRESSUPOSTOS

PRINCIPAIS

O aluno é sujeito consumidor passivo do saber.

O professor é figura de autoridade social, científica e pedagógica, única fonte do saber, assumindo o papel de

transmissor.

O saber é estático e absoluto.

O aluno é sujeito consumidor crítico e produtor criativo do saber.

O professor é facilitador da

aprendizagem, mediador na relação aluno-saber, parceiro da negociação pedagógica.

O saber é dinâmico, transitório e diferenciado de sujeito para sujeito. FINALIDADES

PRIORITÁRIAS

Desenvolver a competência académica do aluno, principalmente traduzida na aquisição de conhecimentos e no domínio de capacidades de tipo cognitivo.

Aproximar o aluno do saber e do processo de aprendizagem. Ajudá-lo a aprender a aprender, a desenvolver a capacidade de gerir a própria aprendizagem.

Encorajar a responsabilidade e a assunção de uma postura pró-activa no processo de aprender.

Desenvolver uma perspectiva crítica da escola, do saber e da aprendizagem. Promover a relação entre a escola e a vida.

TRAÇOS PROCESSUAIS

Focalização nos processos de transmissão e nos conteúdos de aprendizagem.

Clima potencialmente autoritário e formal.

Processos dominados pelo professor, único decisor e avaliador.

Forte dependência do aluno aos níveis do discurso e das tarefas,

frequentemente associada a um enfraquecimento motivacional ou a motivações externas.

Tarefas determinadas pelo professor, tendencialmente dirigidas

exclusivamente ao desenvolvimento da competência académica.

Ênfase na competição e no individualismo.

Práticas de avaliação normativas, tendencialmente segregadoras.

Focalização nos processos de aprendizagem e no aluno: teorias, estilos, necessidades, estratégias, hábitos, experiências anteriores, sistema apreciativo.

Clima tendencialmente democrático e informal.

Participação do aluno na tomada de decisões e elaboração de projectos e contratos.

Tarefas de tipo reflexivo e experimental; desenvolvimento de capacidades de planificação, regulação e (auto) avaliação da aprendizagem.

Gestão colaborativa da informação e da palavra.

Construção colaborativa de saberes académicos, sociais e de aprendizagem. Valorização da função formativa das práticas de (auto) avaliação, tendencialmente integradoras. Quadro 3 - Pedagogia da dependência e pedagogia para a autonomia (Vieira, 2006)

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2. Reconfiguração dos papéis pedagógicos

2.1 Autonomia do aluno e do professor

Em várias áreas do saber e do nosso quotidiano, apercebemo-nos de alusões às funções do professor, do aluno e da educação em geral. Assim, aparecem-nos frases famosas de autores como Albert Einstein, que afirmou “Não ensino meus alunos. Crio a condição para que aprendam", ou de Galileu Galilei, que terá afirmado que ”Não se pode ensinar nada a um homem; só é possível ajudá-lo a encontrar a coisa dentro de si”; outros exemplos são os provérbios que usamos no nosso dia-a-dia e que ilustram uma sabedoria milenar, passada de geração em geração pela tradição oral, como os seguintes: “Diz-me e eu esquecerei, ensina-me e eu lembrar-me-ei, envolve-me e eu aprenderei” e “Quem quer ensinar precisa primeiro aprender”. Prestemos, por exemplo, atenção ao provérbio chinês “Os professores abrem a porta, mas tu tens de entrar sozinho”. Ele faz referência a algumas ideias sobre a reconfiguração dos papéis pedagógicos do professor e do aluno e a relação entre ambos. Assim, este dito popular encerra várias ideias:

a) interdependência entre professor e aluno, pois se o professor não abrir a porta, o aluno não entra na sala de aula e se este não entrar o esforço de professor terá sido em vão; b) diferenciação de tarefas do professor (abrir a porta) e do aluno (entrar na sala de aula),

embora com um propósito comum;

c) autonomia do aluno (o aluno tem de entrar sozinho na sala de aula);

d) autonomia do professor (o professor detém a competência profissional para abrir a porta e fica por aí, acompanhando e orientando a entrada do aluno na sala de aula);

e) mudança de papéis pedagógicos do professor e do aluno, como consequência da sua autonomia;

f) o processo de ensino e aprendizagem é um risco, uma vez que nem professor nem o aluno sabem o que está para lá da porta que o primeiro abre e o segundo transpõe.

Jiménez Raya, Lamb & Vieira (2007: 2) definem a autonomia do aluno e do professor como uma “competência para se desenvolver como participante autodeterminado, socialmente responsável e criticamente consciente em (e para além de) ambientes educativos, por referência a uma visão de educação como espaço de emancipação (inter)pessoal e transformação social”. Porquê esta definição comum ao professor e ao

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aluno? Porque a autonomia do professor e do aluno são dois processos interdependentes e interrelacionados quando a autonomia é entendida como um interesse coletivo ao serviço de uma educação democrática.

Mas quais são então os papéis pedagógicos do professor? E do aluno? Ao analisarmos pormenorizadamente a definição de autonomia acima registada, verificamos que nos fornece uma primeira resposta às questões colocadas. Os autores apresentam o quadro 4 (op. cit.:2-3), onde podemos começar a compreender os papéis pedagógicos do professor e dos alunos.

Competência Para que uma pessoa se governe deverá estar em posição de agir com competência. A competência envolve disposições atitudinais, conhecimentos e capacidades para desenvolver autodeterminação, responsabilidade social e consciência crítica.

Para se desenvolver A autonomia não é um conceito absoluto, devendo ser concebida como um

continuum em que diferentes níveis de autogestão podem ser exercidos em

diferentes momentos.

Como participante A autonomia implica assumir um papel proactivo e interativo.

Autodeterminado A autonomia tem uma dimensão individual (por ex., autoconhecimento, agência responsável, autorregulação, autodireção).

Socialmente responsável A autonomia tem uma dimensão social (por ex., voz, respeito pelos outros, negociação, cooperação, interdependência).

Criticamente consciente A autonomia comporta implicações morais e políticas e implica cultivar uma mente inquiridora e independente.

Em (e para além de) ambientes educativos

Os espaços educativos formais podem e devem permitir aos indivíduos exercer o direito de desenvolver a sua autonomia e, por conseguinte, promover a aprendizagem ao longo da vida, tanto dentro como fora das instituições educativas.

Por referência a uma visão de educação como espaço de emancipação (inter) pessoal e transformação social

O desenvolvimento do aluno e do professor no sentido da autonomia parte do pressuposto de que a educação é um fenómeno moral e político, cujo propósito é transformar (em lugar de reproduzir) “o status quo”. Neste sentido, a autonomia é um interesse coletivo orientado por ideais democráticos e emancipatórios.

Quadro 4 - Análise da definição de autonomia do professor e do aluno (Jiménez Raya et al., 2007)

Assim, a autonomia é uma competência, que se desenvolve num processo contínuo, assumindo um papel virado para a ação, com uma dimensão individual e social, que comporta implicações morais e políticas e implica uma mente inquiridora e independente, promovendo a aprendizagem ao longo da vida, dentro e fora das instituições educativas, e é também um interesse coletivo, orientado por ideais democráticos e emancipatórios. Assim, os papéis pedagógicos do professor e do aluno serão aqueles que permitirão fazer emergir um indivíduo competente e autónomo, com espírito crítico, para agir na transformação da

Imagem

Figura 1 - "Pedagogia" e “Autonomia”
Figura 2- Papéis pedagógicos do professor e do aluno e relação pedagógica
Figura 3 - Princípios chave da concretização da negociação pedagógica (baseado em Breen & Littlejohn, 2000)
Figura 4 - Perfil do professor reflexivo e condições da sua formação (adaptado de Vieira, 1994)Perfil do Professor Reflexivo
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