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Atrás das cenas : o processo criativo da narrativa de ficção televisiva

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Academic year: 2020

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Universidade do Minho

Instituto de Ciências Sociais

Nuno Henrique Azevedo Pereira

Outubro de 2012

Atrás das cenas:

O Processo Criativo da Narrativa de

Ficção Televisiva

UMinho|20 12 N uno Henriq ue Aze vedo P er eir a

Atrás das cenas: O Processo Criativo da Narrativ

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Trabalho realizado sob a orientação da

Professora Doutora Rosa Cabecinhas

Universidade do Minho

Instituto de Ciências Sociais

Nuno Henrique Azevedo Pereira

Outubro de 2012

Relatório de Estágio

Mestrado em Ciências da Comunicação

Área de Especialização em Audiovisual e Multimédia

Atrás das cenas:

O Processo Criativo da Narrativa de

Ficção Televisiva

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É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTE RELATÓRIO APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE;

Universidade do Minho, ___/___/______

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AGRADECIMENTOS

Deixo os meus sinceros e fraternos agradecimentos a todos aqueles cuja colaboração foi fundamental para levar a cabo este trabalho, nomeadamente:

- À minha família – em particular ao meu pai, à minha mãe, e ao meu irmão, pelo apoio incondicional e pelo ambiente benigno que me criam no quotidiano;

- À professora Dr.ª Rosa Cabecinhas, orientadora deste trabalho, pelo profissionalismo e prontidão com que resolveu os assuntos mais prementes;

- Ao professor António Branco da Cunha, coorientador deste estudo, um sincero agradecimento pelo empenho e pela forma encorajadora com me motivou e aconselhou no desenvolvimento deste projeto.

- À Dr.ª Vera Roquette e a Natacha Ribeiro pelo obséquio e celeridade com que me providenciaram os dados estatísticos das audiências para análise.

- A Nuno Vaz, Marco Oliveira e a todos os orientadores e colegas de trabalho da Academia RTP pelo conhecimento que me transmitiram e por contribuírem para uma experiência laboral inolvidável e marcante.

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página | v RESUMO

TÍTULO: Atrás das Cenas: O Processo Criativo da Narrativa de Ficção Televisiva

O documento que se segue pretende ser uma investigação exploratória sobre dinâmicas de produção de novos conteúdos criativos para televisão – papel ao qual está intimamente ligada a figura do guionista. Um guionista enfrenta o vazio com ideias, convicções, saber e método, características que costumam ser simplesmente entendidas como “criatividade”.

Todos os que lerem este estudo deverão estar cientes de que este foi um trabalho de investigação que começou com a prática, através do meu estágio em produção de conteúdos media na Academia RTP – no qual exerci as funções de guionista e que serviu de mote para a presente dissertação.

Tendo em vista os fins propostos para este trabalho que está sob a égide do Mestrado de Ciências da Comunicação (Instituto de Ciências Sociais) da Universidade do Minho, é então apresentada uma sumarização da história da Rádio e Televisão de Portugal, local onde decorreu o estágio, assim como uma descrição da experiência do estágio, à qual se segue um estudo de caso concernente ao papel que cabe ao guionista numa produção televisiva, avaliando de que forma é que este deve ou não realizar a sua ideia.

A mensurabilidade dessa premissa far-se-á através de uma proposta de investigação baseada na análise das audiências televisivas auxiliada pela criação de um sistema semiótico de sintagmas que possa desconstruir os predicados da linguagem audiovisual e quais os impactos que repercutem na audiência quando um guionista realiza a sua obra, ou quando deixa a realização a cargo de outrem.

Assim esta dissertação é um testemunho e uma reflexão sobre a atividade televisiva no seio da sociedade e como as relações interpessoais dentro e fora da produção podem contribuir para a qualidade do produto final.

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página | vii ABSTRACT

TITLE: Behind the Scenes: The Creative Process of Television’s Fiction Narrative

The following document is intended to be an exploratory investigation on the dynamics of production of new creative content for television - role which is closely linked to the figure of the screenwriter. A screenwriter faces the blank with ideas, beliefs, knowledge and method, features which are often understood simply as "creativity".

All the readers of this study should be aware that this research work was started with practice, through my internship in media content production at the RTP Academy - in which I exercised functions as a screenwriter who served as the motto for this dissertation.

In trying to correspond to the proposed uses of this type of work that is under the auspices of the Master of Communication Sciences (Institute of Social Sciences), University of Minho, is then presented a summarization of the history of Radio and Television of Portugal, venue of the stage, as well as a description of the experience of that stage, which is followed by a case study concerning the role of the scriptwriter in television productions, evaluating how it is that this should or should not be the director of its screenplays.

The measurability of this premise will be done throughout a proposed investigation based on analysis of television ratings aided by the creation of a semiotic system of syntagmas that can deconstruct the predicates of audiovisual language and the impacts that reverberate in the audience when a screenwriter performs his work, or when it leaves the directing in charge of another person.

Thus this dissertation is a testimony and a reflection on the television activity in society and how interpersonal relationships inside and outside of production can contribute to the quality of the final product.

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página | ix ÍNDICE GERAL

NOTA INTRODUTÓRIA ...3

CAPÍTULO I – Das notas sobre o estágio ...7

1. RTP a velha senhora Televisão ...9

1.1 A mais longa tradição nos media nacionais ... 13

1.2 O compromisso com a ficção (uma história de ficção) ... 23

1.2.1 Anos do preto-e-branco... 24

1.2.2 Cores vivas da expansão ficcional ... 25

1.2.2.1 As telenovelas ... 26

1.2.2.2 Os seriados ... 28

1.2.2.3 Os filmes ... 33

1.3 Academia RTP: um laboratório de ideias ... 36

1.3.1 O processo criativo da Academia ... 39

1.3.2 A Academia como incubadora de projetos ... 44

2. Escrevendo imagens ... 45

2.1 O desafio do processo narrativo ... 49

2.1.1 Manter viva a acendalha criativa ... 50

3. A moeda de duas caras ... 55

3.1 A esferográfica de filmar (ou a câmara de escrever) ... 57

CAPÍTULO II – Enquadramento Teórico ... 61

1. A narrativa de ficção ... 63

1.1 Funções narrativas ... 68

1.1.1 Aproximação e ilusão do real ... 71

1.1.2 Expressão dos códigos narrativos ... 72

1.1.3 O estilo semântico... 73

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2. O produto narrativo ... 77

2.1 O guião ... 78

2.1.1 O ponto de vista ... 81

2.1.2 A impossibilidade do narrador visível ... 83

2.2 Escrita televisiva ... 84

2.3 A lógica televisiva mediante o público-alvo ... 86

3. Interpretação literária e transição para o visual ... 88

3.1 Estrutura semântico-semiótica ... 92

3.2 O papel do guionista em contexto de produção ... 94

3.2.1 O nível performativo ... 95

3.3 O papel do guionista em contexto de pós-produção ... 98

CAPÍTULO III – Caso de Estudo ... 99

1. O resultado final ...101

1.1 A qualidade do produto ...102

1.1.1 O conteúdo e o estilo ...103

1.1.2 Audiências como indicador de qualidade ...106

1.1.3 A qualidade intrínseca ...107

2. Apresentação de dados ...110

2.1 Amostra de programas com trabalhos separados ...112

2.2 Amostra de programas com autor único ...115

CAPÍTULO IV – Análise de Resultados ...119

1. Reflexão Teórica dos Resultados ...121

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...137

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...142

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ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Share “O Último Verão” ... 112

Gráfico 2 – Share “Bocage” ... 112

Gráfico 3 – Share “Paixões Proibidas” ... 113

Gráfico 4 – Share “Nós os Ricos” ... 114

Gráfico 5 – Share “A Rapariga da Máquina de Filmar” ... 115

Gráfico 6 – Share “O Dez” ... 115

Gráfico 7 – Share “Filme do Desassossego” ... 116

Gráfico 8 – Share “Ai… Life” ... 117

Gráfico 9 – Comparação de Share – Telefilmes ... 123

Gráfico 10 – Comparação de Share – Séries ... 124

Gráfico 11 – Comparação de Share – Telenovela/Filme ... 126

Gráfico A1 – Evolução do share de audiência mensal ... 128

Gráfico 12 – Comparação de Share – Sitcoms ... 129

Gráfico 13 – Classificações IMDb relativos aos dados em análise ... 131

Gráfico 14 – Rating Total ... 133

Gráfico 15 – Média de Rating Total ... 133

Gráfico 16 – Rating % Total ... 134

Gráfico 17 – Média Rating % Total ... 134

Gráfico 18 – Média Share Total ... 135

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página | xii ÍNDICE DE TABELAS

Grelha 1 – Dados de emissão “O Último Verão”...112

Grelha 2 – Dados de emissão “Bocage” ...113

Grelha 3 – Dados de emissão “Paixões Proibidas” ...113

Grelha 4 – Dados de emissão “Nós os Ricos” ...114

Grelha 5 – Dados de emissão “A Rapariga da Máquina de Filmar” ...115

Grelha 6 – Dados de emissão “O Dez” ...116

Grelha 7 – Dados de emissão “Filme do Desassossego” ...116

Grelha 8 – Dados de emissão “Ai… Life” ...117

Tabela 9 – Tabela de Termos ...160

ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Esquema de Estrutura de Narrativa Clássica ... 66

Figura 2 – Diagrama de Estrutura de Narrativa Clássica ...157

Figura 3 – Diagrama de Estrutura de Narrativa Ondulante ...157

Figura 4 – Diagrama de Estrutura de Narrativa Clássica em Patamar ...158

Figura 5 – Diagrama de Estrutura de Narrativa em Declive ...158

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Deverá este documento traduzir uma apreciação ao trabalho do guionista, ou do criativo, no seio de uma estação televisiva, como foi o caso da experiência profissional de que dispus durante nove meses na Rádio e Televisão de Portugal, S.A. Pretende-se, com esta dissertação, analisar a relação entre o guionista, o produto e a relação interpessoal com a restante equipa durante a fase de produção, nomeadamente com o realizador.

A incorporação neste estágio suscitou-me algumas questões concernentes à prática do guionismo e às suas particularidades práticas e teóricas de aplicação ao conteúdo televisivo. Em contexto empresarial sem exemplos precedentes, deparei-me com implicações que este labor pressupõe no processo criativo de exequibilidade estrutural. Afinal, até onde vai o trabalho do guionista? Que competências e saberes cabem a um guionista? Para que tipo de programas escreve? Como estimular o processo criativo de uma forma constante de modo a responder com competência ao trabalho contínuo?

Partindo do projeto em que estive envolvido, designado de "Academia RTP", que funcionou como um laboratório de desenvolvimento de conteúdos media nas plataformas de televisão, web e rádio, irei formular a minha dissertação sobre a minha experiência como guionista.

A Academia RTP é um projeto pioneiro na europa, que vai, de momento, na sua segunda edição. Este certame proporcionou uma oportunidade a candidatos autopropostos, numa faixa etária compreendida entre os dezoito e os trinta anos, de produzir um programa ou outro tipo de conteúdos para a RTP somente através de uma ideia exposta em forma de sinopse, que seria depois trabalhada pelos "formandos" e pelos gestores de projeto no contexto da Academia.

O projeto iniciou-se com a execução de "programas-piloto" após os quais fez-se uma triagem daqueles que seguiram em frente para emissão. A implicação direta deste processo de seleção para os “formandos” traduziu-se na implementação de novas equipas de trabalho com base nas competências apresentadas por cada um na elaboração desses “programas-pilotos”. Dos sessenta e sete projetos apenas vinte e quatro foram trabalhados no sentido de serem emitidos.

No meu caso, a experiência foi marcante e colocou-me perante várias questões às quais tive muitas das vezes de responder sozinho. No momento em que me atribuíram as funções de guionista do “À Boleia” e posteriormente também do “Tintim por Tintim” (isto já depois do piloto que trabalhei não ter seguido em frente), via-me a contas com a responsabilidade sobre tudo o que aconteceria em três episódios de trinta minutos, no caso do primeiro programa e cinco episódios de cinco minutos no caso do segundo. Isto implicava ainda a ordem de trabalhos de muitas outras pessoas, quer a nível produção, quer a nível de pós-produção, durante os seis meses seguintes. Para além disso,

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página | 4 determinadas circunstâncias colocaram-me na realização do programa “À Boleia” que assumi em contexto de rodagem.

Desde a formatação em master scenes, enredo, estrutura da narrativa, definição dos pressupostos da abertura e do desenlace dos programas, tive muito de me adaptar, aprender e apreender e o resultado só poderia melhorar à medida que fosse fazendo mais. Escrever um guião é um processo moroso que se rege por várias regras, estruturas, formas, códigos e socorre-se, fundamentalmente, de muito engenho criativo. A coluna vertebral de qualquer guião pressupõe uma narrativa, que por sua vez origina uma história. Ter uma história significa ter uma base para a maioria dos produtos audiovisuais no que toca à Televisão.

Não obstante, alguns programas baseiam-se simplesmente na forma, numa estrutura de sucessão de eventos que, todos juntos, formam uma metanarrativa, ou seja, uma narrativa dissimulada, que não é imediata, que se estrutura mecanicamente através de sinais e tópicos, flui por fases independentes (como cenas) até confluir num todo.

Escrever para o ‘pequeno ecrã’ pressupõe um determinado estilo de escrita e um registo de língua que esteja apropriado ao meio. Como os timings e os orçamentos são sempre muito apertados, por vezes não há oportunidade para brilharetes pois há sempre constrangimentos vários de que se está à mercê.

Em televisão, uma vez que se trabalha sobre um processo repetitivo, é preciso encontrar um formato, isto é, uma linha constante de acontecimentos que vai definir uma rotina na ordem de trabalhos. Depois de se definir este padrão de eventos encontram-se as pequenas divergências que vão dotar o programa de alguma surpresa e imprevisibilidade. Seja para que conteúdo for, pelo menos no plano teórico, será sempre preciso, no mínimo, um alinhamento, uma gestão de conteúdos ou de ideias. É preciso um guião, seja ele mais ou menos detalhado, mais ou menos abrangente.

Independentemente do programa e do meio que vai difundir um determinado conteúdo audiovisual, a linguagem está sempre lá, a narrativa e os seus momentos primordiais estão e estarão sempre por detrás da base de qualquer tipo de produção porque nada se faz sem comunicar e tudo aquilo que é pensado para ser comunicado está a delinear a definição de narrativa: pensar como comunicar.

Mediante isto, os pressupostos para a elaboração desta dissertação passam por abarcar a dimensão do processo criativo no âmbito da pré-produção televisiva, avaliando de que modo é que a etapa de criação original pode contribuir para uma melhor explanação da transposição da narrativa literária para a narrativa visual, no caso de programas em que o realizador é também o guionista.

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Pretende-se inferir a eventualidade de uma divergência nos resultados qualitativos em relação a um trabalho separado, quer ao nível do produto final em si, quer ao nível das audiências geradas pelo mesmo produto.

É também objetivo desta dissertação aferir formas sintáticas e semânticas na produção literária que confluam numa maior eficiência entre o realizador e o guionista que possam justificar, ou não, a assimilação de cargos.

Este documento traduz, portanto, um testemunho e uma reflexão de uma experiência e de uma atividade, é sobre o guionismo, o seu processo criativo e como este deve ser valorizado e respeitado no âmbito das produções televisivas. Sobre esta temática, cheguei, portanto, à seguinte questão de partida:

Quais as implicações na narrativa e nas audiências televisivas quando um guionista acumula o cargo de realizador?

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CAPÍTULO I

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O primeiro capítulo desta dissertação reserva-se às notas sobre o meu estágio, nas quais incluo uma breve exposição relativa à história da empresa na qual realizei o meu estágio – a Rádio e Televisão de Portugal, S.A.. Para além de um apanhado generalizado da história da RTP, incidirei também na perspetiva do compêndio da produção de programas de ficção, cuja estação televisiva tem um verdadeiro espólio perdido. Não obstante, apresentarei a sua relação para com os guionistas ao longo do tempo.

Haverá também espaço para uma alusão ao “departamento” que me acolheu na empresa, a Academia RTP, e como a sua criação poderá influenciar o modo de criação de programas em Portugal pelo seu cariz de investigação e experimentação de conteúdos media.

Este capítulo terminará com a transposição para a minha experiência pessoal, e como ela se intersecta com a rica tradição da RTP na área da ficção.

1. RTP a velha senhora Televisão

‘[…] A oportunidade que oferece a atual situação económica e política do País; avivada a necessidade pelas circunstâncias atuais do Mundo e estudada uma situação viável do problema, urge montar um serviço de Televisão – já começa a tardar em Portugal este marco de progresso’.

Lopes da Silva apud Vasco Hogan Teves, 2007

Falar do surgimento da RTP é falar de um marco que revolucionou toda a indústria da comunicação social portuguesa. É enfatizar o início de uma nova era em Portugal, uma vez que este evento transfigurou a forma de se estar em sociedade, tal foi a forma como mexeu com as dinâmicas sociais deste país.

Apesar de sobejamente conhecida, a longa história da RTP esconde muitas peculiaridades que a definem tal como hoje é. Esta pioneira história da televisão em Portugal ter-se-á iniciado a 15 de Dezembro de 1955 no gabinete da direção da Emissora Nacional de Radiodifusão, onde foi assinada a escritura que cumpria com o “disposto no artigo 1º do Decreto-Lei nº 40 341” (Teves, 2007).

O acordo foi celebrado entre membros do estado, emissora nacional e bancos envolvidos no negócio.

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“ […] ficou definitivamente constituída, por iniciativa do Governo, uma sociedade anónima de responsabilidade limitada, com sede e domicílio na cidade de Lisboa, sob a designação de RTP - Radiotelevisão Portuguesa, SARL, que se iniciou com o capital mínimo previsto na lei, no montante de 60 milhões de escudos, divididos em terços que couberam ao Estado, às emissoras particulares de radiodifusão e ao público - esta parte a subscrever em ações de 1.000 escudos, pelas quais se tornaram desde logo responsáveis várias instituições bancárias” (Teves, 2007).

Esta é a história oficial. A partir daí começaram, na Feira Popular, as primeiras transmissões experimentais, que duraram até Março de 1957, data em que se encetaram as primeiras emissões permanentes. Enquanto isso, a RTP instalava a sua sede na Rua de Quelhas, ao abrigo da Emissora Nacional, tendo-se mudado depois para a cave de um Palacete na Lapa que foi adquirindo por completo ao longo dos anos.

Ao mesmo tempo que organizava a sua sede, também os seus estúdios ganhavam forma no Lumiar. “ […] Em Outubro [1956], a RTP iniciara a adaptação às suas conveniências de serviço de um antigo estúdio cinematográfico, desativado e implantado em terrenos marginais à Alameda das Linhas de Torres, ao Lumiar” (Teves, 2007). As instalações que agora pertenciam à RTP seriam, à partida, de ocupação temporária para efeitos de mais algumas emissões experimentais, mas, na realidade, mantiveram-se em funcionamento durante quase cinco décadas.

“No termo dos anos 50 a única história que fazia algum sentido era a que decorria da necessidade de pôr de pé, e naquele local, uma estação de TV” (Teves, 2007). Para isso contribuíram também os Serviços Radielétricos da Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones através da supervisão e instalação de equipamentos.

Apesar das instalações imprevistas ficarem muito aquém daquilo que se exigia, já na época, a uma estação de televisão, a verdade é que foi-se aproveitando o espaço o melhor que foi possível e este foi sendo remendado e requalificado conforme as necessidades o previam, mas sem grandes opulências. Todavia, estas modificações foram possibilitando “uma fase de recomeço mais consciencializada dos trabalhos públicos da RTP” (Teves, 2007).

Este novo estúdio representava “uma tentativa de se encontrar, pelo aproveitamento máximo dos espaços – na verdade muito reduzidos e precários – melhores possibilidades de resposta às exigências da produção” (Teves, 2007). Começava assim a ganhar forma um espaço televisivo português. Criou-se então uma entidade para estudo de programas para a futura grelha, prevista no Estatuto da Radiodifusão Nacional. O rebuliço ganhava mais veemência à medida que se acertavam metodologias

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de trabalho relacionadas com o entrosamento de tecnologias e a conceptualização da produção de conteúdos e outras burocracias.

“As emissões de ensaio possibilitaram […] uma nova fase de adestramento do pessoal da empresa. Aos que já haviam trabalhado na Feira, outros se juntaram, começando a definir-se quadros cuja repartição pelos diversos sectores de atividade pareceram capazes de satisfazer as necessidades imediatas. Na sede, em S. Domingos, à Lapa, novos técnicos eram admitidos, através dos primeiros concursos que se realizaram. Dias depois já estavam às voltas com a teoria, orientados pelos mais experientes” (Teves, 2007).

Estavam criadas todas as condições para o início. “A primeira emissão regular, também batizada, por muitos, de oficial, foi a 7 de Março de 1957. A idade da RTP começava a ser contada” (Teves, 2007). Dava-se, então, o primeiro pequeno passo na história televisiva do nosso país, mas muito havia ainda a realizar. O país carecia de sinal de antena para que o sucesso da implementação da televisão e da RTP fosse firmado. Assim seguiram-se tempos dedicados ao estudo de propostas por parte dos engenheiros da RTP, nas quais também se pronunciaram “os especialistas em finanças sobre a matéria que lhes competia e que também importava considerar para a tomada da decisão final” (ibidem). A escolha final determinou que se adotariam “emissores, torres e antenas Siemens & Halske, equipamento de imagem (vídeo) Fernseh, equipamento (áudio) Philips, ligações hertzianas da Compagnie Générale de Télégraphie sans Fil e carros de reportagem Fernseh-Philips-Daimler Benz” (ibidem).

Com as diretrizes alinhavadas no sentido do crescimento, iniciava-se a última fase do processo de implementação de uma nova janela para o mundo em Portugal. Dentro de portas, a RTP montava “um pequeno estúdio, com disponibilidade para ensaiar canais de imagem e de som” que permitia aos seus inexperientes funcionários o acumular de rotinas que compreensivelmente faltavam a quem fazia algo nunca antes feito no nosso país e cuja ditadura vigente, aliada à mocidade da televisão no mundo, não permitia a existência de cidadãos portugueses com competências nesta área. Os elementos da equipa expedicionária da RTP “provinham de empresas e serviços com atividades afins, designadamente Emissora Nacional, CTT, Rádio Marconi e RARET (uma empresa radiofónica ligada à Rádio Europa Livre)” (Teves, 2007).

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página | 12 No terreno, por sua vez, começavam-se a erguer os emissores bem alto nos céus. O primeiro a dar sinal foi o de Lisboa, em Monsanto, que “entrou em funcionamento a 23 de Novembro de 1957”. Nesse mesmo dia, também o emissor da Lousã cortava as suas fitas e difundia as suas ondas. Para mais tarde ficou “o de Vila Nova de Gaia - Porto (com potência idêntica ao de Lisboa, 100 kw)” (Teves, 2007). Este terceiro emissor irradiou pela primeira vez na última noite de 1957 e não mais parou. É agora um gigante e um símbolo absolutamente impressionante do Centro de Produção da RTP do Monte da Virgem, em Vila Nova de Gaia, de que falarei mais à frente neste trabalho.

Não obstante, agora que o norte e o centro do país tinham já um suporte de cobertura televisiva assinalável, o último emissor foi então colocado a sul, em Montejunto, cuja primeira emissão data de 10 de Março de 1958. Para além disso, foi ainda instalado um retransmissor em Fóia (serra de Monchique), que iniciou funções a 25 de Abril desse ano. “A partir de então, 44% da superfície continental e 58% da população estavam cobertos pelas primeiras 4 grandes antenas da RTP” (Teves, 2007).

Abria-se aqui um novo capítulo na história da RTP e dava-se um passo de gigante na história da televisão portuguesa. Quase 60% da população portuguesa podia usufruir de um serviço permanente de televisão, quer graças à instalação dos emissores, quer graças à produção regular de transmissões televisivas e a verdade é que os sinais de antena não caíam no espaço vazio devido à recetividade que o povo português mostrava já face às novas tecnologias

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A corrida à aquisição de recetores foi uma loucura desmedida e desenfreada que não estava nas previsões dos mais otimistas. Enquanto noutros países europeus o público demorou a aderir, o público português tinha os braços demasiado compridos e abertos para tão pequena oferta. “Assim, o número de recetores previstos inicialmente para o fim de 8 anos […] foi alcançado em 2 anos! Quer dizer, um ritmo quatro vezes mais rápido do que o esperado – 32 000 aparelhos importados até Dezembro de 1958, ano em que o ritmo foi de cerca de 2 000 por mês” (Teves, 2007).

Concluída a primeira fase de cobertura nacional, a RTP crescia a olhos vistos. “Lentamente, o televisor coletivo foi cedendo lugar ao televisor doméstico e familiar” (Teves, 2007). Apesar da adesão espontânea o processo que levou até isso foi bastante árduo, daí o prémio justo concedido pelo consumidor português, que demonstrou o reconhecimento por uma causa que recolocava Portugal mais perto do panorama tecnológico dos países ditos desenvolvidos.

Na realidade, a história que levou à implementação da RTP no panorama social português começa bem antes das emissões experimentais no Lumiar. Precedente a esta história havia já uma outra, quando em 1937 vários engenheiros portugueses tinham encetado experiências no sentido de

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desenvolver uma emissão televisiva, embora falhando redondamente. “A Televisão é, por enquanto (1937), impraticável para um posto amador. Os conhecimentos técnicos que exige são de tal forma complicados e demandam uma tal soma de capitais para serem postos em prática que pus de parte, absolutamente, essa ideia” (Teves, 2007).

Daqui talvez se depreenda e importância que teve todo este processo. Em meados dos anos 50 contavam-se “pelos dedos os países europeus que ainda não dispunham de emissões regulares de TV […]” (Teves, 2007). Em apenas três anos, fruto do investimento do governo, porque a entidade quis que acontecesse e porque as pessoas também o quiseram, passou-se do papel à ação e criou-se algo que não existia em Portugal: uma estação televisiva, que é hoje uma senhora televisão.

1.1 A mais longa tradição nos media nacionais

Depois do primeiro impulso, não mais a RTP parou de convulsionar. Os anos 60 ficam intimamente ligados à relação entre a RTP e a Eurovisão, assim como à implementação de novos emissores e à criação de um novo espectro de ondas televisivas. O crescimento sustentado foi notável e os primeiros dez anos de vida da RTP são, essencialmente, anos de consolidação. “Durante o ano de 1960 (1 285 horas de emissão; 47 372 televisores registados e a pagarem taxa; faturação publicitária a ultrapassar, pela primeira vez, as 100 horas e os 10 mil contos); tinha então a RTP 614 empregados (apenas mais 27 do que em 1959)” (Teves, 2007).

Foi com a casa arrumada que se deu luz verde para o início da segunda fase de cobertura nacional e dessa medida procedeu-se à instalação dos retransmissores da Marofa (Guarda) e Bornes (Bragança). “No conjunto, as duas novas instalações técnicas da RTP passaram a servir cerca de 450 000 habitantes” (Teves, 2007). Porém, o programa não ficou por aqui uma vez que se montaram ainda outros retransmissores para propagar o sinal no centro do país. Foram eles localizados em Mértola, Alcoutim, Santiago do Cacém e Elvas.

Para além dos retransmissores levantou-se ainda o primeiro emissor de UHF em Monsanto com uma capacidade de transmissão de 10 quilowatts e 405 quilowatts de PAR (potência aparente radiada). Por ser capaz de emitir em UHF, a construção deste emissor permitiu a “possibilidade de se promoverem investigações ligadas à emissão em UHF, com vista à sua extensão ao resto do País”, pertinente no sentido em que o espectro de ondas de VHF estava já saturado (Teves, 2007).

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página | 14 Num tempo dominado pela ditadura do Estado Novo, era a RTP o único veículo de comunicação que os portugueses tinham com o resto do mundo. A rede de emissores, agora implementada em solo nacional, unia não só a pátria lusitana ao velho continente, como também aproximava os continentes separados pelo atlântico. A prova maior disso deu-se a 23 de Julho de 1962, data em que chegavam dos Estados Unidos da América as primeiras emissões transatlânticas captadas pelas antenas da RTP e difundidas para o resto da Europa. Era um passo histórico.

As imagens “do porto de Nova Iorque, da estátua da Liberdade, do presidente Kennedy e de um jogo de beisebol” que chegaram a 16 países da Europa enformavam “o primeiro programa da Mundovisão”, que foi depois replicado em sentido inverso através de “um programa conjunto, complexo, esforçado (tão brilhante como o “made in USA”) [que] partiu das torres europeias”. (Teves, 2007).

Sempre a abrir novos canais de emissão, a RTP não deixou que as novidades ficassem por aqui. A parafernália de equipamento de emissão tinha ainda um outro lugar reservado em Mendro, no Alentejo, que foi inaugurado a 1 de Dezembro de 1965. Este serviu não somente as populações interiores do sul e centro do país, mas também como elo de ligação à rede da Eurovisão. No ano seguinte ao da inauguração do emissor de Mendro, Portugal estava assim capacitado para “aderir às transmissões diretas originárias dos países membros da União Europeia de Radiodifusão, com a certeza de oferecer ao público-espectador uma qualidade de imagem [que] não existia anteriormente” (Teves, 2007).

A Eurovisão contava, à data, com 28 membros ativos e 40 associados europeus. Nesse ano em que Portugal aderia à “comunidade europeia de TV” verificava-se um acréscimo bastante assinalável de produção e difusão de programas que passou de 14 para 58 (Teves, 2007).

Por cá acompanhavam-se as tendências. O nosso país parecia cada vez mais capaz de não perder de vista os desenvolvimentos tecnológicos deste ramo, sem que no entanto fosse capaz de se manter na linha da frente da inovação. Talvez tenha sido por isso que os primeiros dez anos de vida da RTP também tenham sido marcados pelo programa ‘Zip-Zip’, relevante por ter sido o primeiro programa de entretenimento feito em Portugal perante um público participante. “Num ano rico em acontecimentos (1969), mesmo no interior da RTP, o “Zip-Zip” é, certamente, o facto mais importante. Há quem vá mais longe e o considere mesmo (e com justiça) um acontecimento na vida inteira da RTP” (Teves, 2007).

Partindo da insistência de Raul Solnado, Fialho Gouveia e Carlos Cruz, este programa viria a fruir de um sucesso sem precedentes sem que nada o fizesse prever. Era um projeto de risco, mas vingou. Uma autêntica pedrada no charco na melancolia e na aversão a fazer. Afinal, terá sido das poucas

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vezes que Portugal criou um formato televisivo, o que por si só assinala um vitória estrondosa sobre a inércia e o marasmo.

“O programa durou de Maio a Dezembro de 1969. São seis meses em plena primavera marcelista em que se verificam algumas mudanças no regime. […] Um ano antes não teria sido possível. É o primeiro programa onde as entrevistas são feitas com o público presente e diziam-se então coisas que tempos antes eram consideradas tabu” (Fialho Gouveia apud Teves, 2007).

Ao surgir, o “Zip-Zip” revolucionou as segundas-feiras de grande parte da população portuguesa. O programa era saboreado à hora do almoço, em diferido, depois de ter sido rodado no sábado anterior, com público presente. A verdade é que ninguém ficava indiferente a essa “experiência humana e profissional inesquecível”. O ‘talk-show’ que marcou uma época era vivido em ambiente de festa e o seu cartão-de-visita era preenchido por entrevistas, humor e música. “Foram coisas importantes que se disseram a falar, a cantar e a rir” (Fialho Gouveia apud Teves, 2007).

Fortemente marcado por uma apertada vigência da censura, os conteúdos do Zip-Zip chegavam mesmo a ser negociados, mas nunca foram silenciados, mesmo que parte deles não tenha sobrevivido à impetuosidade da história.

Seguiu entretanto a RTP na sua história – que se alargava agora à Madeira e gritava ao mundo que estava bem viva.

“A partir de 6 de Agosto de 1972 a RTP já não emite exclusivamente para o território do Continente. A sua primeira Delegação (mais tarde, 1980, Centro Regional) é oficialmente inaugurada na Madeira, após a realização de algumas emissões experimentais (a partir de 30 de Junho), que permitiram os indispensáveis ensaios e ajustes técnicos na rede de distribuição; e após, sobretudo, um ano de 1971 que foi passado em trabalho intenso de implementação das infraestruturas necessárias” (Teves, 2007).

Não tão viva estaria a ditadura. Dois anos depois de se ter instalado na pérola do atlântico, a RTP seguia bem de perto a transição de regime para a democracia e aproximava também os portugueses do evento que marcou o fim de um ciclo e o início de outro. No ato revolucionário, foram os estúdios da RTP que melhor conduziram a informação que chegava ao país. “Às 3 horas, conforme o previsto, contingentes militares afetos ao Movimento ocupam e assumem o controlo de centros vitais na área da comunicação. Antes de qualquer outro, chegam aos estúdios da RTP” (Teves, 2007).

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página | 16 Após uma autêntica batalha interna de contrainformação bicéfala, na qual o polo do Porto no Monte da Virgem desafiava a revolução do Lumiar, tudo se conjugou para que às 18.45h se conseguisse finalmente colocar no ar a emissão do MFA. Já no ar os telespectadores foram avisados que, a partir desse momento, “o Movimento das Forças Armadas controla totalmente a rede emissora da Radiotelevisão Portuguesa” (Teves, 2007) . Seguiu-se um especial de informação no qual Fialho Gouveia leu “os comunicados até então divulgados pelo MFA, dando ênfase aos apelos à serenidade da população, à disponibilidade dos médicos e à assunção de responsabilidades pelas forças da ordem que ainda não tinham aderido ao Movimento” (Fernando Balsinha apud Teves, 2007).

Foi então pela RTP que se conseguiu um elo importantíssimo de unificação e adesão a uma revolução que mudaria por completo os destinos do país. Após o comunicado, a emissão manteve alguma normalidade intercalada com momentos que se viviam nas ruas, como por exemplo o abrir fogo de elementos da PIDE sobre os cidadãos que se manifestavam no largo Camões. Ao fim da noite, todavia, foi apresentado o conselho da Junta de Salvação Nacional com o qual se fechou esta histórica transmissão televisiva.

“Órgão de comunicação social privilegiado por milhares de espectadores, detentor da verdade da imagem real, a RTP foi um elemento indispensável na cadeia da divulgação e do entendimento de quanto se passava e, a partir de certa altura, na hora a que se passava. Foi através dos televisores que o País viu os acontecimentos maiores de Lisboa, por aí os dimensionou e por aí os julgou”(Teves, 2007).

Na ressaca do 25 de Abril vieram momentos conturbados de ingerência e confusão no seio da administração da RTP. “As movimentações nas áreas de chefia continuavam a ser, no cenário RTP, um sinal de instabilidade, sendo que a preponderância da componente militar (nunca desligada da cláusula “comissão de serviço”) ia subsistindo” (Teves, 2007). Após umas quantas mudanças, o sistema tardou em reformular-se. Urgia, portanto, uma tomada de posição. “A nacionalização das posições sociais no capital da sociedade RTP-Radiotelevisão Portuguesa, SARL, não pertencentes direta ou indiretamente ao Estado, era inevitável” (ibidem).

Ao fim de um ano caótico concretizou-se então o dossier da nacionalização da RTP “pelo Decreto-Lei nº 674-D/75, de 2 de Dezembro” de 1975 (Teves, 2007). Aí se determinava a rescisão do contrato de concessão “que datava de 16 de Janeiro de 1956 e criou uma empresa pública denominada RTP-Radiotelevisão Portuguesa, EP […]. A nova empresa pública passava a ser dirigida por uma Comissão

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Administrativa de 5 Membros, de nomeação governamental, sob proposta do Ministro da Comunicação Social (a tutela)” (ibidem).

Começou com esta medida uma nova era na Televisão portuguesa. Para trás ficavam 14 anos de exercício em que as emissoras particulares de radiodifusão, acionista da RTP nesse intervalo temporal, “tinham obtido, além do seu dividendo e sem que para isso despendessem mais do que o capital, um lucro líquido equivalente a mais de 6 vezes a totalidade do investimento”, isto em receitas publicitárias (Teves, 2007). Foi mediante pressupostos de saneamento de uma situação escandalosa que se apregoou uma nova Televisão que estivesse “ao serviço, não de interesses comerciais inconfessáveis, mas dos superiores interesses do povo português. E só destes” (ibidem).

A servir o povo português, mais precisamente o povo insular, já a RTP estava uns meses antes, por altura em que se fez chegar a televisão aos Açores. Aí a caixa mágica terá chegado “mais cedo do que se previra (embora com 3 anos de atraso sobre a da Madeira)” (Teves, 2007). A tal se deveu o afinco colocado nas ações de um senhor chamado Ramalho Eanes. A apetência do general, que viria a tornar-se o 16º Presidente da República um ano depois, deu asas ao “entusiasmo posto nas tarefas e ainda no ano de 75, a 10 de Agosto, um domingo, via-se Televisão nos Açores, pela primeira vez” (ibidem).

Para além de se multiplicar em novas ‘filiais’, também a casa-mãe da estação televisiva era mudada de S. Domingos da Lapa para a Avenida 5 de Outubro. A nova sede localizava-se num edifício que antes pertencera ao Banco Pinto & Sotto Mayor e terá custado à volta de 200 mil contos [1 milhão de euros] segundo noticiava o Jornal Expresso. Nas novas instalações, para além de se ter instalado o núcleo burocrático foram também construídos dois estúdios de pequena dimensão. Não obstante, os meios de produção da RTP continuariam a funcionar no Lumiar “até à construção do novo Centro de Produção de Lisboa” (in Jornal Expresso apud Teves, 2007).

Em efervescente atividade, o raio de ação parecia não parar de aumentar à medida que se avançava no tempo. Em outubro de 1978, esse raio recrudesceu. A 16 desse ano, a RTP tem “dois rostos novos, diferentes, e quem a encontra, no rodar do botão dos canais, surpreende-se com o que vê e começa a ter dificuldade em saber onde ficar” (Teves, 2007). O novo canal simplesmente denominado de RTP2, era o segundo na ‘grelha’ portuguesa e apresentava uma pluralidade de oferta cultural que antes não era possível. O surgimento da RTP2 é sinónimo de “escolha”. “A escolha tornava-se possível porque, então sim, havia uma alternativa real, uma concorrência dir-se-ia que sadia, benéfica para o auditório (ibidem).

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página | 18 ‘Novidade’ é uma palavra que no seio da RTP foi sendo vulgarizada. Isto porque, da novidade que constituiu a 2º canal foram precisos somente dois anos para apresentar novos desenvolvimentos. As nuances foram ao nível da coloração. A televisão a cores já existia nos Estado Unidos, nos anos 50, quando aqui ainda se estava a implementar a televisão. Em 1966 a televisão a cores chegava à europa e o Campeonato do Mundo desse ano foi já transmitido a cores em Inglaterra. No entanto, por cá, continuava-se a ver televisão a preto-e-branco. Isso não quer dizer, todavia, que a situação estivesse hipotecada. Na realidade nunca esteve isto porque haviam já emissores instalados de raiz que, apesar de transmitirem a preto-e-branco, estavam já preparados para emitir a cores tal como notou Vasco Hogan Teles:

“o emissor que acabava de ser instalado em Monsanto [1957] como os outros que, nos anos próximos, viriam a ser montados noutros pontos do País, estavam preparados para a emissão de programas a cores, em qualquer sistema. Os progressos no domínio da cor continuavam, aliás, a ser analisados pelos engenheiros da RTP com o maior interesse, mas sem que as decisões se perspetivassem” (Teves, 2007).

Daí até que realmente se iniciassem as transmissões regulares de televisão a cores foram precisos mais 23 anos. Quem teve o privilégio de assistir ao Festival RTP da canção de 1980 presenciava uma completa novidade em Portugal. Aquilo que os espetadores viam era uma revolução visual que dotava os ecrãs de imagens mais realistas e punha cobro a uma era de negrume, marcada pelo defeito limitativo do B&W.

A década de 80 abria assim a cores pela data do 23º aniversário da RTP, a 7 de Março. Os dois meses que ficavam para trás seriam os únicos desse decénio (e dos que estavam por vir) que não seriam vistas com tonalidade matizada. Para tal começou-se a trabalhar em 1976 num “arrojado plano de investimentos que atingiu um milhão e quinhentos mil contos [7,5 milhões de euros], que se fez reverter na compra de equipamentos, reciclagem de pessoal e montagens de instalações completamente novas” (Teves, 2007).

A máquina do tempo anda mais 12 anos para encontrar um novo marco de história. Depois de muito ter lutado para chegar a todo o país e às regiões insulares, a Radiotelevisão Portuguesa alargava-se ao estrangeiro por via da RTP Internacional, cujas emissões regulares deram início a 10 de Junho de 1992. O canal de ligação da língua portuguesa com o mundo fazia-se através de “2 satélites de difusão do sistema de operações da companhia Marconi, com aluguer orçado em 2 milhões de contos/

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ano [10 milhões de euros]. Assim, para a Europa, o serviço ficou entregue ao Eutelsat II-F3, bastando para a receção (individual ou comunitária) antenas parabólicas a partir dos 80 cm de diâmetro” (Teves, 2007).

Este novo sinal de vitalidade surge, todavia, numa conjuntura pouco favorável, o que enaltece ainda mais o sucesso desta operação. É que, por esta data, o Estado cortava com a “taxa [de Televisão], a cedência da rede difusora do sinal televisivo e as muitas dúvidas geradas pela ausência de uma definição clara da política das participações financeiras” que lhe competiam. (Teves, 2007).

E, não obstante, surgiram num curto intervalo temporal dois novos canais privados através da alteração da lei que previa a possibilidade de abrir o espaço televisivo aos privados. Mediante isto, foram para a frente os projetos da Sociedade Independente de Comunicação (SIC) em Outubro de 1992 e da Televisão Independente (TVI) em Fevereiro de 1993. Para além da concorrência pelas audiências televisivas, a RTP via-se privada de 30% das suas receitas que significava a taxa de Televisão, e via o seu espaço publicitário reduzido a 12 minutos por hora.

Todavia, o papel da RTP foi associado não à luta pelas audiências mas antes à prestação de um serviço público, e, como tal, ambos os canais da RTP seriam compensados com verbas do Estado para ajuda de custos à produção. Na sequência destes desenvolvimentos, a RTP reservou surpresas para perto da sua data de aniversário.

“ […] corria o ano de 1993, há um acontecimento na vida da empresa, um novo sinal de vitalidade, que lhe marcará o futuro: entre o Estado Português e a Radiotelevisão Portuguesa, SA, é celebrado o Contrato de Concessão do Serviço Público de Televisão pelo prazo de 15 anos abrangendo a difusão pelas redes de cobertura geral que integram as frequências correspondentes aos 1º e 2º canais e, ainda, a emissão internacional” (Teves, 2007).

Entre outras especificações de um vasto documento ficou determinado que o 1º Canal seria ampliado à população generalizada com uma programação diversa e plural. Quanto ao 2º Canal foi-lhe conferido o caracter de “complementar” constando na sua grelha programas de índole educativa e atingindo públicos mais especializados, ou, como ficou expresso “públicos potencialmente minoritários” (Teves, 2007).

Para além disso, constava no documento a especificação das obrigações de Serviço Público da emissora televisiva mediante a sociedade política, civil e religiosa e declarava-se “de interesse público os Arquivos Audiovisuais da RTP” (Teves, 2007). Ficou ainda o alerta para a “necessidade de

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página | 20 permanente inovação tecnológica” e resoluções de ordem financeira com que se fechou o despacho (ibidem).

Colocado o ponto final no dossier do Contrato de Concessão de Serviço Público, a televisão mais antiga de Portugal continuou fértil em projetos.

“Por todos os seus canais, incluindo o da RTPi, que, em direto, transmitiu para todo o Mundo, em emissão especial, ficou a saber-se que chegava a fase de concretização um novo projeto da RTP e que esse era o que visava objetivamente os Países Africanos de Língua Portuguesa” (Teves, 2007).

Nascia então a RTP África que abria portas no dia 7 de Março de 1997.O objetivo era criar uma programação específica, com uma duração de quatro horas diárias, apresentando uma grelha diversificada e que desse “um novo impulso às relações entre Portugal e os PALOP (ibidem).

“Entretanto, começaram a ser montadas e postas a funcionar Delegações da RTP África nas capitais dos 5 países africanos da CPLP. […] As Delegações, que recrutaram localmente algum pessoal, dispunham de instalações dotadas de equipamento técnico próprio e operavam uma estação terrena de satélite ligada à NET-RTP” (Teves, 2007).

Dado mais este passo rumo ao progresso, chega a data de 11 de maio de 2000, e com ela chegam novos desenvolvimentos na indústria do Audiovisual que contribuíram para um serviço público de televisão como hoje o conhecemos. Nesta data que foi enunciada tinha sido criada a “holding” Portugal Global SGPS SA, empresa que agregava o capital social da RTP, RDP e a Agência Lusa. Contudo apenas três anos depois esta empresa seria extinta “nascendo, em sua substituição, a RTP - Rádio e Televisão de Portugal, SGPS SA, na qual se integravam todas as participações do Estado na Televisão (aberta, satélite, cabo e digital) e na Rádio” (Teves, 2007).

Isto é o mesmo que dizer que foi redefinida toda a organização do setor público do audiovisual português. RTP e RDP estreitavam laços e daí se partia para uma nova linha de orientações. O acordo alcançado, não só aproximava os órgãos de comunicação do estado, como também “consolidava-se sob influência de um Conselho de Administração que respondia pelas duas estações de serviço público e que estava a pôr em prática as primeiras medidas que concretizavam o aproveitamento de sinergias” (Teves, 2007).

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O processo de reorganização do audiovisual português dava uma nova cara ao setor e deixava os pratos limpos em relação aos mecanismos de funcionamento de ambas as empresas. Relativamente à Televisão, em termos práticos, canalizou a sua atividade para o “desempenho de Serviço Público de Televisão, e concentrando, além da RTP 1, canal generalista, a RTP Internacional e a RTP África (que podiam passar a incluir conteúdos produzidos pela SIC e pela TVI, uma contrapartida à redução do tempo de publicidade na RTP 1)” (Teves, 2007).

Para além disso, definiu-se a criação da RTP Meios de Produção, que vinha para substituir a FOCO e da EDIPIM, e alinhavou-se ainda o modelo de gestão do Canal 2. Nas ilhas, as delegações da RTP também não escaparam à mudança. Tendo-lhes sido projetado um destino autónomo em relação à base.

Para a resolução deste processo importa ainda referir que os Arquivos da RTP, então considerados de Interesse Público, como já tinha sido dito, assim foram transferidos para o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento.

Mas não foi somente para os arquivos museológicos que seguiram as imagens que fizeram a história da RTP. Estas foram também aproveitadas e canalizadas para a emissão do presente através da RTP Memória que se estreava no cabo em 2004. “Acolhida com compreensível expectativa, a grelha de programação revelou, desde logo, que estava ali um canal de presença, de reencontros e de lembranças – muito mais do que um canal aberto à saudade” (Teves, 2007).

Quem também se estreou no cabo nesse ano (2004) foi a RTP N, emitida através dos estúdios do Monte da Virgem, o que traria algum vigor ao Centro de Produção do Porto. A RTP-N vinha em substituição da RTP Regiões que, por sua vez, tinha substituído a NTV – implementada no Monte da Virgem desde 2001. Pretendia-se com a ‘N’ a exploração noticiosa da atualidade de forma rigorosa e exemplar como é apanágio do sector informativo da RTP. Porém, “o que se tornou curioso de fixar na RTP-N é que, além da credibilidade da sua Informação, a estação estava a funcionar como uma espécie de “laboratório”, onde se iam buscar não só ideias, mas também intérpretes para os vários canais da RTP” (Teves, 2007).

Chegou assim a ‘velha senhora Televisão’ aos seus 50 anos e para trás ficava uma longa tradição nos media nacionais, tradição essa que continua a cumprir-se todos os dias. Nesse ano, aliás, dar-se-ia mais um passo rumo ao futuro aquando a inauguração do novo Centro de Produção da RTP, desta vez com Chelas como palco principal. As novas instalações, construídas de raiz, eram das mais modernas de toda a Europa, o que coloca a RTP, do ponto de vista tecnológico, uma das mais sofisticadas cadeias de emissão do velho continente.

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página | 22 Como não podia deixar de ser, os novos estúdios vinham preparados para a Televisão Digital Terrestre (TDT) que seria implementada em Portugal cinco anos mais tarde. No entanto isso não impediu que, logo no ano seguinte, se lançasse mais um canal para o cabo: a RTP HD. De imagem bem nítida e definida, a RTP alargou os seus horizontes para o 16:9, por ocasião dos Jogos Olímpicos de Pequim e aderia à nova era tecnológica da televisão digital. Mas este capítulo estava ainda a começar. O ano de 2011 trouxe também ele novidades. O primeiro é na plataforma web, onde se criou o serviço RTP Play. As particularidades deste serviço passam por “oferecer uma possibilidade de que

permite o acesso aos programas em direto através de um serviço on-demand na internet. A RTP Play

põe ao dispor dos utilizadores os canais de televisão e rádio estatais, possibilitando a visualização e audição de programas em direto, mas também emissões em diferido” (Teves, 2007).

Além disso, o Gabinete de Multimédia da RTP, em polvorosa desde 2003, tem lançado vários projetos pioneiros que deixam antever mudanças drásticas para breve nas inter-relações com o público. Assim, em dezembro desse ano concretizou-se “a primeira emissão de áudio-descrição, um processo que consiste na adaptação de conteúdos televisivos para cidadãos cegos e amblíopes” (Teves, 2007).

No ano seguinte, por sua vez, foi lançado o sítio ‘www.rtp.pt’ “que atendeu à nova imagem empresarial, quer dizer: reuniram-se, pela primeira vez, as áreas de TV e Rádio” (Teves, 2007). Ainda nesse ano, surgiu a RTP-WAP “que permitia acesso a conteúdos da TV pública através do telemóvel (notícias, guia-TV, meteorologia, totolotarias, farmácias, etc.) (ibidem). Esta introdução de formatos interativos, possibilitava “que os espectadores ganhassem prémios”, sabendo-o mesmo “enquanto assistiam ao programa” (ibidem).

Já lançada no mundo móvel, foi um pequeno passo até que a RTP aderisse ao serviço portátil. Assim, em 2006, foi criada a Mobile TV “numa ação conjunta com os operadores nacionais das redes de telemóveis” (Teves, 2007). Este projeto denotava a capacidade de trazer emissões televisivas para os telemóveis de terceira geração. “Estava-se, pois, perante um novo canal da RTP (mais um) mas este específico para o telemóvel e com possível captação em qualquer parte do Mundo” (ibidem).

No que toca à multimédia, há ainda a referir a criação de uma plataforma capaz de disponibilizar conteúdos gratuitos via YouTube, isto antes mesmo de se criar o RTP Play que retirou parte do sentido deste serviço – o que diz bem da velocidade com que os conteúdos se transfiguram na plataforma web. Assim, em 2007 “os conteúdos da estação pública portuguesa passaram a estar acessíveis através do link ‘www.youtube.com/rtp’” (Teves, 2007).

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Num ano pleno em movimentações foi a vez de a RTPN migrar do Porto para Lisboa, mudando com essa transição o seu nome para RTP Informação. No entanto, preenchendo o vazio que a ‘N’ deixou no Monte da Virgem, veio a Academia RTP colmatá-lo.

Esta história fecha com a limitação imposta pelo presente. Falemos então daquilo que, em 2012, marca a atualidade da RTP. Este ano ficará para sempre marcado na história da RTP e da Televisão por ser o ano do apagão analógico. A Televisão e a sua tecnologia evoluíram e com isso evoluíram também os aparelhos de receção do sinal televisivo. Apesar de o processo ter suscitado muita polémica pela escassez de aproveitamento e de estar ainda a ser reformulado, é um passo em frente nas possibilidades que, nos anos vindouros, a Televisão trará ao consumidor no que concerne à interatividade.

Toda a gente sabe que no futuro não há lugares cativos. Mas o espectro que paira sobre a RTP é suficiente para antever uma época de dificuldades. A atravessar uma crise económica, o Estado Português denota uma incapacidade evidente em suportar as despesas de dois canais televisivos que, por imposição própria do Estado, não possuem argumentos financeiros de autossuficiência. Prevê-se assim a privatização de um dos dois canais da RTP, algo que, pela complexidade que se prevê para a operação, fará ainda correr muita tinta. Assim estava a RTP quando a deixei, em Janeiro de 2012. 1.2 Um compromisso com a ficção

“A Televisão é um instrumento de ação, benéfico ou maléfico, consoante o critério que presidir à sua utilização. O Governo espera que os dirigentes do novo serviço público saibam fazer desse instrumento um meio de elevação moral e cultural do povo português.”

Marcello Caetano, Ministro da Presidência e interino das Comunicações

Quando a 2 de Maio de 2011 entrei pela primeira vez nas instalações do Monte da Virgem, estava longe de ter o conhecimento quer da história geral da RTP que acima apresentei, quer do que se tinha feito a nível de programas televisivos que não fosse do ponto de vista do espectador.

Se pouco sabia da programação histórica, pouco sabia também da obra ficcional da RTP. Poderia citar de memória algumas produções que tivesse visto, mas a verdade é que não houve a preocupação por parte da RTP em contextualizar a sua história aos seus formandos no contexto da Academia, sendo que a forma como nos passou os seus valores nunca foi pela mostra ou exposição pública de um

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página | 24 compacto de ideologias. De facto, em momento nenhum do meu estágio denotei a existência de uma ‘escola RTP’ com bases padronizadas e estruturas definidas.

Tal postura poderá até ter sido intencional, uma vez que se pretendia a criação de programas com características inovadoras em relação àqueles que têm vindo a ser produzidos. Não obstante, para efeitos desta dissertação, considero relevante como enquadramento e conhecimento de causa avaliar como tem evoluído esta história de ficção nacional nos vários canais da RTP.

Partindo deste entendimento, resolvi reunir toda a informação possível relativa a todas as obras de ficção da RTP que conseguisse encontrar. Obedecendo a Comparato (1993) entendem-se como trabalhos ficcionais, todos aqueles que repercutam o “ato ou o resultado de criar uma imagem, de compor, modelar ou inventar alguma coisa” (Comparato, 1993: 61).

A realidade é que, após recorrer ao Arquivo da RTP, que não conseguiu responder com sucesso aos meus almejos, a minha busca cingiu-se forçosamente ao livro da história dos 50 anos da RTP, ao site ‘The Internet Movie Database’ e outras informações postas a circular na web, tendo com isso conseguido um compêndio assinalável mas sem que haja uma ligação, uma visão de continuidade entre as peças soltas que acabo de reunir. Consegui ainda, graças ao YouTube, visualizar algumas amostras das obras em questão. Como um pergaminho desfragmentado pelo tempo, ficam aqui os registos possíveis das histórias que marcaram a ficção nacional, todas com o cunho da Rádio e Televisão de Portugal.

1.2.1 Anos do preto-e-branco

Tendo principiado em 1955, a RTP somente emitiu para o país durante a segunda metade da década de 50. Apesar do período experimental e de todos os condicionalismos de algo que estava ainda a começar, a estação televisiva foi capaz de produzir o seu “primeiro programa com movimentação de estúdio” ainda nessa década. Chamava-se “Canções a Granel” “uma série que faria carreira. Uma produção de Francisco Mata, realizada por Ruy Ferrão, apresentou-nos Maria de Lurdes Resende, Rui de Mascarenhas, o conjunto Domingos Vilaça e Raúl Solnado (Teves, 2007). Trata-se de um programa perdido e com pouca informação a circular, pelo que pouco posso adiantar a nível de conteúdo. Para a história fica apenas que marcou o início das transmissões regulares da RTP.

Doravante, nas décadas de 60 e 70, a ficção não foi propriamente uma aposta. Nesta época a grelha procurava “manter “no ar” uma programação genérica, […] com algum recurso a materiais de arquivo, dar-lhe certo peso cultural […] e de entretenimento, pelo teleteatro ou por uma ou outra série

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filmada de características inócuas, quanto possível” (Teves, 2007). Em posição demarcada na programação da RTP dessas décadas estava a informação, telescola, programas de entretenimento em estúdio, como o Zip-Zip e alguns trabalhos a área do documentário.

Em ficção, um dos trabalhos mais relevantes que encontrei foi “A Lena e o Carlos” de 1960, que saiu dos estúdios do Porto. O trabalho teve a realização de Nuno Fradique e era “uma série de episódios de comédia” (Teves, 2007). No ano seguinte, de Lisboa, veio algo semelhante. “Fernando Frazão responde com o mesmo género, realizando “Aventuras de Eva”, com a atriz brasileira Eva Todor”, escrito por Luís Iglésias (ibidem).

Sem deixar de ressalvar que houve muitas outras séries de ficção, que, embora sem grande mediatismo, contribuíram para o entretenimento da população portuguesa e formaram peças essenciais para a continuidade da indústria de produção de conteúdos media, foram, todavia, os anos 80 que vinham para mudar o paradigma de produção nacional de ficções.

1.2.2 Cores vivas da expansão ficcional

O ano de 1979 marca a época “em que se começa a notar uma maior presença de produção nacional contratada pela RTP ao mercado externo” (Teves, 2007). Vendo surgir um mercado com potencial, empresas como Cinequanon, Forum, Virver, Grupo 4, Telecine, Cinequipa, Diafilmes, na sua maioria organizadas em base cooperativa, “tornaram-se fornecedores habituais da programação da RTP, fazendo-o geralmente sob encomenda e após aprovado o projeto encomendado (ou apresentado espontaneamente), tanto melhor se acompanhado de episódio-piloto” (ibidem).

Os efeitos práticos disto podiam-se verificar no final da década de 80. Em 1989 a TV Guia/Norma lançou os dados das preferências quanto a géneros televisivos através de uma sondagem realizada que saiu a cinco de maio desse ano. Segundo o estudo, aberto a mais do que uma hipótese, “os programas de Informação eram […] os mais apreciados (57,8%), à frente dos filmes de longa-metragem (45,6%), das telenovelas (43,8%) e das séries filmadas (15,5%)” (Teves, 2007). No entanto, aquilo que mais surpreendeu na época foi a classificação obtida pelos concursos televisivos, “normalmente considerados como de muito agrado dos espectadores, mas que se verificou não reunirem mais de 9,9% das preferências” (ibidem).

Isto não quer dizer que a RTP tenha deixado de produzir concursos televisivos, antes pelo contrário, os concursos continuaram a ocupar uma boa parte da programação da RTP com grande sucesso como se verificou nos “Jogos Sem Fronteiras” mesmo durante a década de 90, “Quem Quer

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página | 26 Ser Milionário” (2000) e “O Preço Certo em Euros” (2002) – um Case Study nacional que ainda hoje é transmitido, dez anos depois. Todavia é possível notar um incremento na importância que a ficção ganhou na produção e na programação da RTP.

Como reforço do trabalho que se fez sentir durante a década de 80, a estação televisiva pública criou ainda o núcleo de Pré-Produção de Teledramáticos, em 1989 “criado na área do Gabinete de Textos, que, fazia tempo, agitava planos e se dava a projetos sem resultados à vista” (Teves, 2007). Infelizmente, este gabinete já não existe, tal como já não existe o Gabinete de Guionismo, ambos desaparecidos do mapa de investigação e potenciação de conteúdos audiovisual, que hoje poderiam incrementar a qualidade dos produtos portugueses nesta área e dar-lhes dimensão internacional (ibidem).

De entre coisas que ficam enterradas no passado, ficaram também os produtos que saírem destes departamentos. Ficam, de seguida as obras que marcaram a produção nacional, seguindo em anexo1 a

lista de outras que, neste período, mantiveram o sector em atividade. 1.2.2.1 As telenovelas

As telenovelas portuguesas só apareceram pela primeira vez na década de 80. Antes já havia as radionovelas, muito populares especialmente antes do tempo da Televisão.

Nesta época de boom de ficções nacionais, muitas foram as que marcaram uma geração. Como tal, não é de estranhar que o ano de 1982 seja um marco para a televisão portuguesa, por ser o ano em que surge a primeira telenovela portuguesa. “Vila Faia” era o título que abriu um precedente na produção nacional de conteúdos televisivos que dura até hoje. Não será fácil explicar o porquê dos produtores terem optado por este tipo de ficção, mas, quer tenha sido intencional, quer tem sido de forma inocente, a verdade é que a moda pegou.

A partir daqui a produção de telenovelas surgiu em catadupa. Após “Vila Faia” rodaram-se “Origens” (1983), “Chuva na Areia” (1985) e “Palavras Cruzadas” (1987), sendo que “Vila Faia” foi também a primeira a ser exportada, em Setembro de 1988, para passar na Televisão Popular de Angola (TPA) “registando grande sucesso” (Teves, 2007). Nuno Teixeira foi o denominador comum das três primeiras novelas enunciadas, das quais fez a realização. A outra, “Palavras Cruzadas”, foi realizada por Nicolau Breyner.

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A quinta telenovela não tardou a aparecer. Estreou em 1988 “na programação de Outubro” (Teves, 2007). Tal como nas novelas anteriores, os estúdios da EDIPIM da Abrunheira foram a casa de nova produção, mais uma vez comandada por Nuno Teixeira. “’Passerelle’ contava, em 120 episódios, uma história escrita por duas mulheres ligadas à Televisão – Ana Zanatti e Rosa Lobato de Faria. Um enredo que tomava a moda como pretexto para situações marginais, intensas; para as vidas e os dramas consequentes” (ibidem). O elenco era composto por trinta caras, algumas conhecidas do público e outras que apareciam pela primeira vez diante das câmaras. A dirigi-los estava Armando Cortez. A produção batia todos os recordes de cenografia das produções portuguesas: “50 décores que se montavam e desmontavam, consoante as pautas de trabalho, em apenas 600m² de estúdio. Com audiência próxima dos 80%, “Passerelle” situou-se ao melhor nível da telenovela” (Teves, 2007).

Em 1992, António Torrado “concedeu alguns favores telenovelísticos” escrevendo “Pós de Bem-Querer”, uma “bem urdida narrativa que dá às ações e aos personagens o toque, ainda que crítico, do real” (Teves, 2007). A nível performativo destacou-se o ator André Gago que terá tido no realizador Fernando Ávila “um técnico que, por seu lado, foi mostrando como era possível argumentar com movimentos e enquadramentos, usando a câmara” (ibidem).

Dois anos volveram-se para que o grande público assistisse a mais uma produção novelística assinada pela RTP que saída dos “armazéns” da NBP (Nicolau Breyner Produções), em Vialonga. “Na Paz dos Anjos” teve 130 episódios e sua história caracteriza-se pela propriedade “irónica e satírica” (Teves, 2007). O elenco contou com 30 intérpretes e o argumento deve-se ao trabalho conjunto de José Fanha e Jorge Paixão da Costa “que Régis Cardoso (em estúdio) e Nicolau Breyner (nos exteriores) realizaram, procurando ir ao encontro de situações que lembrassem a melhor comédia portuguesa dos anos 30” (ibidem).

Nos anos que se seguiram, a relação entre NBP e RTP estreitou-se e produziu mais dois frutos: “Vidas de Sal” em 1996 e “Ajuste de Contas” em 2000. A primeira passou em horário noturno, teve 150 episódios e abordava uma temática relacionada com a vida de uma comunidade piscatória. A segunda foi escrita por Francisco Nicholson e contou com a realização de Gonçalo Mourão e Jorge Cardoso.

Pelo meio tempo ainda para “A Lenda da Garça”, que em 1999 foi mesmo inserida em horário nobre, prerrogativa a que as telenovelas veriam vedadas nos seis anos seguintes de grelha.

Tal aconteceu porque depois da reformulação da FOCO, que passou a designar-se RTP Meios de Produção, foi traçada uma nova linha editorial de Televisão Pública, no qual se estipulava que, segundo o Administrador da RTP na época, Luís Marques, “a missão primeira da RTP não é ganhar audiências,

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Figura 1 – Esquema de Estrutura de Narrativa Clássica  Fonte: Field, S. (1983). Manual do Roteiro, Paris: Nathan, pp 13
Gráfico 1 – Share “O Último Verão” (adh%)  Fonte: RTP Gabinete de Audiências e Estudos de Mercado
Gráfico 3 – Share “Paixões Proibidas” (adh%)  Fonte: RTP Gabinete de Audiências e Estudos de Mercado
Gráfico 5 – Share “A Rapariga da Máquina de Filmar” (adh%)  Fonte: RTP Gabinete de Audiências e Estudos de Mercado
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