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Responsabilidade civil do estado: omissão na conservação das rodovias sob sua responsabilidade

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TIAGO HARTMANN MIRON

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: OMISSÃO NA CONSERVAÇÃO DAS RODOVIAS SOB SUA RESPONSABILIDADE

Ijuí (RS) 2016

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TIAGO HARTMANN MIRON

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: OMISSÃO NA CONSERVAÇÃO DAS RODOVIAS SOB SUA RESPONSABILIDADE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Graduação em Direito, objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão (TC).

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Me. Eloísa Nair de Andrade Argerich

Ijuí (RS) 2016

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Dedico este trabalho a todos que de uma forma ou de outra me auxiliaram e me ampararam durante esta jornada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem.

À minha orientadora, mestre Eloísa Argerich, pela dedicação e disponibilidade.

A todos que colaboraram de uma maneira ou de outra durante a elaboração deste estudo, os meus agradecimentos!

(5)

“Interpretar a lei é revelar o pensamento, que anima as suas palavras.”

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise da responsabilidade civil do Estado por omissão na conservação das rodovias sob sua responsabilidade, mostrando a evolução do tema ao longo das Constituições. Conceitua a responsabilidade civil objetiva e subjetiva e analisa os casos em que existem pressupostos excludentes e atenuantes na aplicação da responsabilidade objetiva. Apresenta, também, o tipo de responsabilidade nas concessões de serviço público na conservação das rodovias, bem como a atuação da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) na manutenção e fiscalização das rodovias. Por fim, examina alguns casos julgados, demonstrando o dever de indenizar do Estado.

Palavras-chave: Responsabilidade civil. Rodovias. Concessão. ANTT. Omissão. Conservação.

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ABSTRACT

This working monographic research is an analysis of liability for failure to state the maintenance of highways under sub responsibility, showing the evolution of the theme throughout the Constitutions. Conceptualizes the objective and subjective liability. It analyzes the cases where there are exclusionary and mitigating assumptions in the application of strict liability. It is also considering the type of responsibility in public service concessions in the maintenance of highways, as well as the performance of the National Land Transport Agency (ANTT) in the maintenance and inspection of roads. Finally, it examines some trial cases, demonstrating the duty to indemnify the state.

Key words: Civil responsability. Highways. Concession. ANTT. Omission. Conservation.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO ... 10

1.1 Teoria da Irresponsabilidade ... 10

1.2 Teoria Civilista e suas derivações ... 12

1.3 Concepção publicística da responsabilidade do Estado ... 13

1.4 Evolução da responsabilidade civil do Estado nas Constituições brasileiras ... 16

1.4.1 Teoria da responsabilidade objetiva e subjetiva do Estado, conforme art. 37, § 6º da CF/88... 18

1.4.2 Aplicação da responsabilidade objetiva: pressupostos excludentes e atenuantes ... 21

1.4.2.1 Alguns precedentes jurisprudenciais ... 23

2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: OMISSÃO NA CONSERVAÇÃO DAS RODOVIAS SOB SUA RESPONSABILIDADE ... 27

2.1 A responsabilidade do Estado por omissão ... 27

2.2 Responsabilidade civil do Estado em face do Código de Trânsito brasileiro ... 29

2.2.1 Análise do art. 1º da Lei nº 9.503, de 23/09/1997 ... 29

2.3 Concessão da prestação do Serviço Público de conservação das rodovias ... 31

2.3.1 Atuação e fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na manutenção das rodovias ... 34

2.4 Análise de casos julgados em decorrência da omissão do Estado na conservação das rodovias sob sua responsabilidade ou do concessionário ... 38

2.4.1 Caso 1: Ato omissivo do Poder Público nem sempre gera indenização ... 38

2.4.2 Caso 2: Omissão do Estado na conservação de estradas gera indenização ... 41

CONCLUSÃO ... 45

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INTRODUÇÃO

O Estado, em sua estrutura estatal, de acordo com o art. 175 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), cerca-se de pessoas jurídicas de direito privado para a realização do serviço público, seja por meio de concessão, permissão ou autorização. Em decorrência disso, essas pessoas jurídicas podem ser responsabilizadas pelos danos que causarem a terceiros quando da omissão na prestação do referido serviço, conforme previsão constitucional contida no art. 37, § 6º.

Observa-se, em face do disposto no texto constitucional, que as pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviços públicos, estão sujeitas à responsabilidade civil objetiva, fundada na teoria do risco, pois estão agindo em nome do Estado. Isso, contudo, só pode ocorrer em virtude de estar o concessionário no exercício de atividade e poderes incumbentes ao cedente, o que será desenvolvido no decorrer desta pesquisa.

Por outro lado, é inegável o dever de conservação das rodovias por parte do Estado. Sua omissão pode acarretar uma responsabilização desses entes quando houver a comprovação de um dano e nexo causal, pois é seu dever propiciar aos administrados o direito a um trânsito seguro.

Esta pesquisa, portanto, visa a realizar um estudo acerca da responsabilidade civil do Estado por omissão na conservação das rodovias sob sua responsabilidade, especialmente no desenvolvimento das funções que lhe são próprias para a realização dos fins almejados. O estudo busca, também, compreender a responsabilidade do Estado em face do Código de Trânsito brasileiro e a atuação e fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Finalmente, faz uma análise de jurisprudências pertinentes ao fato.

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Desta forma, no primeiro capítulo abordam-se aspectos referentes à evolução da Teoria da Responsabilidade do Estado, iniciando pela Teoria da Irresponsabilidade, passando pela Teoria Civilista e suas derivações e, por fim, a Teoria Publicística da Responsabilidade. Ainda, no primeiro capítulo, o estudo traz a evolução da Responsabilidade nas Constituições brasileiras, desde 1824 até 1988, bem como um estudo acerca da responsabilidade objetiva e subjetiva do Estado.

Para melhor compreensão da responsabilidade do Estado, o segundo capítulo analisa a sua responsabilidade por atos omissivos quando da falta de prestação de serviço público relacionado à conservação das rodovias, esclarecendo a atuação e fiscalização da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) na manutenção das rodovias sob sua responsabilidade ou concessionário. Explana, ainda, sobre a responsabilidade civil do Estado em face do Código de Trânsito brasileiro, que rege as relações decorrentes da utilização das vias terrestres no Estado brasileiro.

Quanto aos procedimentos metodológicos, a pesquisa é do tipo exploratória. Utiliza no seu delineamento a coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores. Na sua realização utilizou-se o método de abordagem hipotético-dedutivo, observando os seguintes procedimentos: seleção de bibliografia e documentos afins à temática e em meios físicos e na Internet, interdisciplinares, capazes e suficientes para que o pesquisador construa um referencial teórico coerente sobre o tema em estudo, responda o problema proposto, corrobore ou refute as hipóteses levantadas e atinja os objetivos propostos na pesquisa; leitura e fichamento do material selecionado; reflexão crítica sobre o material selecionado; exposição dos resultados obtidos através de um texto escrito monográfico.

Ao final, seguem as conclusões a que se chegou com a realização do estudo e as referências utilizadas na sua fundamentação.

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1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Ao examinar a questão da responsabilização da Administração Pública pela omissão na conservação de rodovias sob sua responsabilidade faz-se necessário buscar compreender o conceito de responsabilidade do Estado e, assim, melhor compreender as inúmeras teorias que foram elaboradas no decorrer dos tempos referentes à responsabilização do Estado.

Este capítulo discorre sobre a evolução das teorias acerca da responsabilidade civil do Estado. Para tanto, traça-se uma linha de desenvolvimento desde a Teoria da Irresponsabilidade Absoluta, passando pela Teoria da Responsabilidade Civilista até chegar à Teoria da Responsabilidade Objetiva do Estado. Na sequência aborda-se a Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e, posteriormente, a sua evolução no ordenamento jurídico brasileiro.

1.1 Teoria da Irresponsabilidade

Antes de adentrar no tema da evolução das Teorias da Responsabilidade Civil do Estado, há necessidade de se entender a sua posição frente aos seus administrados, ou seja, verificar porque ele responde pelos danos causados a terceiros.

O Estado, na condição de pessoa jurídica de direito público e de sujeito de direitos, indubitavelmente pode vir a causar danos a terceiros e isso se reflete na possibilidade de indenização e reparação do dano. Nem sempre, contudo, ele foi assim considerado, pois mesmo sendo pessoa jurídica de direito público interno, a sua consagração nos Textos Constitucionais do mundo e no Brasil percorreram um longo caminho.

No entendimento de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2015, p. 787), “a teoria da irresponsabilidade foi adotada na época dos Estados absolutos e repousava fundamentalmente na ideia de soberania: o Estado dispõe de autoridade incontestável perante o súdito; ele exerce a tutela do direito, não podendo, por isso, agir contra ele [...].”

Pode-se afirmar, então, que na metade do século XIX, a ideia que prevalecia no mundo ocidental era a de que o Estado não tinha qualquer responsabilidade pelos atos praticados por seus agentes. A solução era rigorosa para com os particulares em geral, mas

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obedecia às reais condições políticas da época. O denominado Estado Liberal tinha limitada atuação, raramente intervia nas relações entre particulares, de modo que a doutrina de sua irresponsabilidade constituía mero corolário da figuração política de afastamento e da equivocada isenção que o Poder Público assumia (CARVALHO FILHO, 2012).

Na mesma linha de entendimento, Yussef Said Cahali (2009) mostra que a Teoria da Irresponsabilidade se firma em três pilares: 1) na soberania do Estado que, por natureza irredutível, proíbe ou nega sua igualdade ao súdito, e em qualquer nível de relação a responsabilidade do soberano perante o súdito é impossível de ser reconhecida, pois envolveria uma contradição nos termos da equação; 2) segue-se que, representando o Estado soberano o direito organizado, não pode aquele aparecer como violador desse mesmo direito; 3) daí os atos contrários à lei praticados pelos funcionários jamais podem ser considerados atos do Estado, devendo ser atribuídos pessoalmente àqueles.

Dentro da concepção política do Estado Absoluto, portanto, não podia caber a ideia de reparação dos danos causados pelo Poder Público, dado que não se admitia à constituição de direitos contra o Estado Soberano, que gozava de imunidade total. Essa concepção ainda continuou sendo sustentada em nome do Princípio da Separação dos Poderes, em virtude do qual a sustentação da responsabilidade do Poder Público importaria a censura ou o julgamento dos seus atos, atividade de defesa do Poder Judiciário (CAHALI, 2009).

A respeito do Princípio ou Teoria da Irresponsabilidade francesa, Celso Antonio Bandeira de Melo (2008) leciona que o Princípio da Irresponsabilidade do Estado era temperado em suas consequências gravosas para os particulares pela admissão da responsabilidade do funcionário, quando o ato lesivo pudesse ser diretamente relacionado a um comportamento seu, ou seja, pessoal. É bem verdade, todavia, que a operatividade da solução sobre se revelar insuficiente pela pequena expressão do patrimônio que deveria responder, era gravemente comprometida em sua eficácia pela existência de uma “garantia administrativa dos funcionários.” (BANDEIRA DE MELO, 2008, p. 985).

Observa-se, assim, que a teoria logo começou a ser combatida por sua evidente injustiça, pois se o Estado deve tutelar o Direito, não pode deixar de responder quando, por sua ação ou omissão, causar danos a terceiros, uma vez que sendo pessoa jurídica, é titular de direitos e obrigações.

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1.2 Teoria Civilista e suas derivações

Avançando no tempo, sublinha-se que foi no século XIX que se abandonou a Teoria da Irresponsabilidade do Estado e surgiu a doutrina da Responsabilidade Estatal no caso de ação culposa de seu agente. Assinala-se que nessa teoria os princípios do Direito Civil eram adotados, apoiados na ideia de culpa e costumavam distinguir os atos de império dos de gestão (BANDEIRA DE MELO, 2008).

Desta forma esclarece Di Pietro (2009, p. 641):

Os atos praticados pela administração com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorização judicial, sendo regidos por um direito especial, exorbitante do direito comum, porque os particulares não podem praticar atos semelhantes. Os atos de gestão seriam praticados pela administração em situação de igualdade com os particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para a gestão de seus serviços, como não difere a posição da administração e a do particular, aplica-se a ambos o direito comum.

Essa distinção é uma tentativa de diminuir a Teoria da Irresponsabilidade do Imperador por prejuízos causados a terceiros. Começou-se a admitir a responsabilidade civil quando decorrente de atos de gestão e a afastá-la nos prejuízos resultantes de atos de Império. Segundo Di Pietro (2009), distinguia-se a pessoa do Rei, que praticava os atos de Império, da pessoa do Estado, que praticava atos de gestão por intermédio de seus prepostos.

Essa teoria perdurou até 1873 e “foi sintetizada em duas frases que resumiam o espírito do período: ‘o rei não erra’ (the king can do not wrong) ou ‘aquilo que agrada ao príncipe tem força de lei’ (quod princip placuit habet lehis vigorem).” (MAZZA, 2011, p. 277, grifo do autor).

Pela impossibilidade de dividir a personalidade do Estado surgiu grande oposição em

relação a essa teoria. Mesmo assim, oDireito brasileiro conheceu a denominada fase civilista

em razão da sua previsão no art. 15 do Código Civil, de 1916, que tornava extremamente difícil, senão impossível, a reparação do dano. Havia, pois, uma vulnerabilidade gritante do cidadão se comparado com os direitos e prerrogativas exclusivas do Estado em sua abrangente e intensa intervenção na sociedade (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 255).

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É inegável que a teoria civilista serviu como inspiração ao art. 15 do Código Civil, de 1916, o qual consagrou a Teoria da Responsabilidade Subjetiva do Estado. O predomínio das normas de Direito Público sobre as regras do Direito Privado na regência das relações entre Poder Público e administrados passou a ser exigência constitucional, uma vez que segundo Hely Lopes Meirelles (2003, p. 618), “[...] não se pode equiparar o Estado, com seu poder e privilégios administrativos, ao particular, despido de autoridade e de prerrogativas públicas.” Uma nova fase, portanto, passou a nortear a responsabilização da Administração pelos danos causados aos administrados.

1.3 Concepção publicística da responsabilidade do Estado

Em contraposição à Teoria da Irresponsabilidade e Civilista surgiram as teorias publicistas, baseadas no famoso caso Blanco, ocorrido em 1873, na cidade de Bordeaux, na França, quando a menina Agnes Blanco, ao atravessar uma rua, foi colhida por uma vagonete da Companhia de Manufatura de Fumo. O julgamento do referido caso foi realizado pelo Tribunal Administrativo que deliberou que o Estado “[...] se sujeita a regras especiais que variam conforme as necessidades do serviço e a imposição de conciliar os direitos do Estado com os direitos privados.” (DI PIETRO, 2015, p. 788).

Na verdade, é inconteste que a Teoria da Irresponsabilidade estatal foi superada após o Tribunal de Conflitos, na França, em 1873, na decisão do Aresto Blanco (FIGUEIREDO, 2016), ou seja, quando:

Em 3 de novembro de 1871, Agnas Blanco, 5 anos, ao passar em frente a uma fábrica de processamento de tabaco, foi atropelada e ferida gravemente por uma vagonete que saiu subitamente de dentro do estabelecimento, tendo uma perna amputada. A vagonete pertencia a uma empresa estatal de manufatura de tabaco de Bourdeax e era conduzida por quatro empregados. Inconformado, o pai da menina, Jean Blanco, ingressou, em 24 de janeiro de 1872, no Tribunal de Justiça (civil) com uma ação de indenização (reparação de danos) contra o Estado, alegando a responsabilidade civil (patrimonial) pela falta cometida por seus quatro empregados. A chamada aut du service. Surgiu, então, um conflito entre a jurisdição judicial (causas entre particulares – civil) e a jurisdição administrativa (causas em que o Estado é parte), sendo o Tribunal de Conflitos responsável por decidir de quem era a competência para julgar a causa. A corte, composta por quatro membros de cada jurisdição, enfrentou um impasse, posto que houve um empate (4 x 4). O Ministro da Justiça, Jules Dufaure, presidente do Tribunal de Conflitos, denominado Guardião dos Selos, desempatou, usando sua prerrogativa do Voto de Minerva, em favor do Conselho do Estado, a jurisdição administrativa.

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Essa decisão proferida em 8 de fevereiro de 1873 modificou radicalmente a tese da irresponsabilidade estatal e passou-se a admitir a responsabilização do Estado em decorrência de atos de gestão estatal.

A responsabilidade do Estado, portanto, é decorrente do funcionamento do serviço e, assim surgiram as teorias publicistas da responsabilidade do Estado que se dividem em: Teoria da Culpa do Serviço ou da Culpa Administrativa e Teoria do Risco. De fato, a Culpa Administrativa ou Teoria da Culpa do Serviço procura desvincular a responsabilidade do Estado da ideia de culpa do funcionário (DI PIETRO, 2015).

Segundo Carvalho Filho (2012, p. 545), essa teoria foi consagrada pela clássica doutrina de Paul Duez, segundo a qual o lesado não precisaria identificar o agente estatal causador do dano. Bastava-lhe comprovar o mau funcionamento do Serviço Público, mesmo que fosse impossível apontar o agente que o provocou. A doutrina, então, cognominou o fato como Culpa Anônima.

Anota, ainda, Carvalho Filho (2012), que essa culpa do Serviço Público podia consumar-se de três maneiras: pela inexistência do serviço, mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço. Em qualquer dessas hipóteses, a falta de serviço implicaria a existência de culpa, ainda que atribuída ao serviço da Administração. Para que o prejudicado pudesse exercer seu direito necessitava que comprovasse que o fato danoso se originava do mau funcionamento do serviço e, consequentemente, o Estado teria atuado culposamente.

Neste compasso, Di Pietro (2015, p. 789) sustenta essa tese ao pontuar que:

Essa culpa do serviço ocorre quando: o serviço público não funcionou (omissão), funcionou atrasado ou funcionou mal. Em qualquer dessas três hipóteses, ocorre a culpa (faute) do serviço ou acidente administrativo, incidindo a responsabilidade do Estado, independentemente de qualquer apreciação da culpa do funcionário.

Di Pietro (2015) afirma que a Teoria do Risco serve de fundamento para a responsabilidade objetiva do Estado pois, segundo entendimento de José Cretella Júnior (1970, p. 69-70), é assim chamada, precisamente,

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por prescindir da apreciação dos elementos subjetivos (dolo ou culpa), é também chamada teoria do risco, porque parte da ideia de que a atuação estatal envolve um risco de dano, que lhe é inerente. Causado o dano, o Estado responde como se fosse uma empresa de seguro em que os segurados seriam os contribuintes que pagando os tributos contribuem para a formação de um patrimônio coletivo.

Está presente nessa tese o Princípio da Igualdade e da Solidariedade, segundo o qual todos os prejuízos causados a terceiros serão repartidos com a coletividade, restabelecendo-se o equilíbrio que foi rompido quando o direito de um cidadão foi violado.

Para corroborar o exposto, pode-se afirmar que essa doutrina baseia-se, conforme Di Pietro (2015, p. 789),

no princípio da igualdade de todos perante os encargos sociais e encontra raízes no artigo 13 da Declaração dos Direitos do Homem de 1789, segundo a qual para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com as suas possibilidades. O princípio significa que, assim como os benefícios decorrentes da atuação estatal repartem-se por todos, também os prejuízos sofridos por alguns membros da sociedade devem ser repartidos. Quando uma pessoa sofre um ônus maior do que o suportado pelas demais, rompe-se o equilíbrio que necessariamente deve haver entre os encargos sociais, para restabelecer esse equilíbrio, o Estado deve indenizar o prejudicado utilizando recursos do erário público.

Ainda segundo Di Pietro (2015, p. 789), “a ideia de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o prejuízo sofrido pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou mal, de forma regular ou irregular.”

O certo é que a responsabilidade objetiva do Estado foi acolhida no texto constitucional vigente, tanto que o art. 37, § 6º preceitua que

As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Interessante apontar que o Brasil não adotou de forma irrestrita a tese da irresponsabilidade do Estado. Mesmo não havendo normas legais expressas, os doutrinadores e Tribunais sempre repudiaram tal orientação.

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Desta forma, mesmo não adotando a Teoria da Irresponsabilidade, as Constituições brasileiras, com exceção das Constituições de 1824 e 1891, conforme estudo a seguir, apresentam uma evolução gradativa quanto à responsabilidade civil do Estado.

1.4 Evolução da responsabilidade civil do Estado nas Constituições brasileiras

Efetuar uma análise das Constituições brasileiras é fundamental para esclarecer sobre o dever de conservação das rodovias por parte do Estado e a sua responsabilização quando o dano decorrer de sua omissão no dever de assegurar um trânsito seguro. Isso inclui, certamente, o dever de fiscalizar e de prestar um serviço eficiente e satisfatório aos administrados.

Segundo Cavalieri Filho (2012), a Constituição de 1824, em seu art. 178, n° 29, estabelecia que: os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos. A Constituição de 1891, por seu turno, em seu art. 79, continha disposição idêntica, responsabilizando os funcionários públicos pelos abusos e omissões em que incorressem no exercício dos seus cargos. Entendia-se haver solidariedade do Estado em relação aos atos de seus agentes.

Com o advento do Código Civil, de 1916, alguns doutrinadores, entre eles Di Pietro (2009) e Cavalieri Filho (2012), entendem que foi adotada a Teoria Civilista da responsabilidade subjetiva (ou teoria da culpa), conforme o art. 15, in verbis:

[...] as pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo do modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo direito regressivo contra causadores do dano.

Não resta dúvida de que a teoria adotada pelo Direito brasileiro naquela época era a Teoria da Responsabilidade Subjetiva, regida por princípios de direito privado.

Com a edição da Constituição de 1934, considerada um documento avançado para a época, acolheu-se o Princípio da Responsabilidade Solidária entre Estado e funcionário. Nos termos de seu art. 171, “os funcionários são responsáveis solidariamente com a Fazenda

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Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício de seus cargos.” A mesma norma se repetiu no art. 158 da Constituição de 1937, não apresentando nenhuma novidade em termos de responsabilidade do Estado (DI PIETRO, 2009).

A Constituição de 1946 adotou a responsabilidade objetiva do Estado. Conforme expressa seu art. 194, “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros. § único: Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano”, quando tiver havido culpa destes. Observa-se, assim, que o Estado reconhece a sua responsabilização quando terceiros sofrerem danos causados por seus funcionários.

Na Constituição de 1967 a norma anterior se repete, porém, com o acréscimo do parágrafo único ao art. 105, que declarava caber ação regressiva em caso de culpa ou dolo.

Decorridos os “Anos de Chumbo” (período mais repressivo da ditadura militar no Brasil), a Constituição de 1988 disciplinou a responsabilidade civil do Estado no parágrafo 6° do seu art. 37, que tem a seguinte redação:

Art. 37. As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado, prestadores de serviços públicos, responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa

Evidencia-se claramente nesse dispositivo que as entidades de direito privado, prestadoras de serviço público, ou seja, “as concessionárias e permissionárias de serviço público somente responderão objetivamente na medida em que os danos por elas causados sejam decorrentes da prestação de serviço público” (DI PIETRO, 2015, p. 793), transferindo-se o debate sobre a culpa ou dolo para a ação regressiva.

Destaca-se que o Código Civil de 2002, andando na contramão dos direitos constitucionais brasileiros, perdeu a oportunidade e não trata da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.

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Sobre a teoria adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, registram Áthila Silva Braga e Cid Capobiango Soares de Moura (2012, p. 62) que:

Em síntese, como regra geral, é adotada no direito brasileiro a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, na modalidade do risco administrativo, admitindo-se o regresso em relação ao agente público que tenha agido com culpa ou dolo, sendo a responsabilidade do agente público subjetiva.

Isto possibilita que todo aquele que sofrer um dano que tiver relação direta com as atividades prestadas ou não pelo Estado, poderá ser ressarcido, sem que tenha que comprovar o dolo ou a culpa do agente público, agindo em nome do Estado.

1.4.1 Teoria da Responsabilidade Objetiva e Subjetiva do Estado, conforme art. 37, § 6º da CF/88

Destaca-se aqui que, como regra, a Teoria Objetiva, na modalidade do Risco Administrativo, admite o pagamento da indenização por atos omissivos ou comissivos sem a necessidade de comprovação de culpa ou dolo, bastando para tal a existência de dano e o nexo causal.

O exame do art. 37, § 6° da CF/88 revela, em primeiro lugar, que o Estado só responde objetivamente pelos danos que os seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. A expressão “seus agentes, nessa qualidade”, evidencia que a Constituição, ao condicionar a responsabilidade objetiva do Poder Público ao dano decorrente da atividade administrativa, adotou expressamente a Teoria do Risco Administrativo como fundamento da responsabilidade da Administração Pública, e não a Teoria do Risco Integral. Em outras palavras, ela condicionou a responsabilidade objetiva do Poder Público aos casos em que houver relação de causa e efeito entre a atuação do agente público e o dano. Sem essa relação de causalidade não há como e nem porque responsabilizar o Estado de forma objetiva (CAVALIERI FILHO, 2012).

Consoante disciplina Di Pietro (2009, p. 645), a regra da responsabilidade objetiva exige, segundo o art. 37, § 6° da CF/88:

1. Que o ato lesivo seja praticado por agente de pessoa jurídica de direito público (que são as mencionadas no art. 41 do CC) ou pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público (o que inclui empresas

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públicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais de direito privado, cartórios extrajudiciais, bem como qualquer entidade com personalidade jurídica de direito privado, inclusive as do terceiro setor, que recebam delegação do Poder Público, a qualquer título, para a prestação do serviço público; 2. Que as entidades de direito privado prestem serviço público, o que exclui as entidades da administração indireta que executem atividade econômica de natureza privada, as que prestam serviço público respondem objetivamente, nos termos do dispositivo constitucional, quando causem dano decorrente da prestação de serviço público, mesmo as concessionárias e permissionárias de serviço público e outras entidades privadas somente responderão objetivamente na medida em que os danos por elas causados decorrentes da prestação de serviço público;

Em primeiro lugar, Di Pietro (2009) considera as atividades desenvolvidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviços concedidos ou permitidos pelo Estado, incluindo-se aí todos os serviços que são delegados a terceiros para que os executem por sua conta e risco. Ela acentua a responsabilização dessas pessoas jurídicas de direito privado quando causarem danos a terceiros em decorrência da prestação dos serviços que lhes foram delegados ou outorgados pelo Estado.

A autora supracitada assevera que, além das pessoas jurídicas, a regra da responsabilidade objetiva prevê

3. Que seja causado dano a terceiros, em decorrência da prestação de serviço público, aqui está o nexo da causa e efeito, como o dispositivo constitucional fala em terceiros, o dispositivo, ao falar em danos causados a terceiros, não distingue entre o usuário e o não usuário, em consequência, não pode o intérprete fazê-lo, sob pena, inclusive, de derrogar o princípio da repartição dos encargos sociais e a ideia de risco que é inerente a grande parte das atribuições do Estado; 4. Que o dano seja causado por agente das aludidas pessoas jurídicas, o que abrange todas as categorias, de agente políticos, administrativos ou particulares em colaboração com a Administração, sem interessar o título sob o qual prestam o serviço; 5. Que o agente, ao causar o dano, aja nessa qualidade, não basta ter a qualidade de agente público, pois, ainda que o seja, não acarretará a responsabilidade estatal se, ao causar o dano, não estiver agindo no exercício de suas funções. (DI PIETRO, 2009, p. 645).

Basicamente são três os pressupostos para se configurar a responsabilidade objetiva: fato administrativo, considerado qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público; dano, não há como falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocada um dano, não importando a natureza do dano, seja patrimonial ou moral, ambos são indenizáveis, se o lesado não provar que a conduta estatal lhe causou prejuízo, nenhuma reparação terá a postular; nexo causal entre o

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fato administrativo e o dano, cabendo ao lesado apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta do Estado, se o dano decorre de fato que, não pode ser imputado à Administração Pública, não poderá imputar responsabilidade civil a esta, inexistindo o fato administrativo, não haverá, por consequência, o nexo causal.

Para que se aplique a Teoria da Responsabilidade Objetiva da Administração é necessário que os seus requisitos estejam presentes. A partir daí tem-se o dever de indenizar o lesado pelos danos que lhe foram causados, sem que se faça necessária a investigação sobre a conduta administrativa ter sido ou não conduzida pelo elemento culpa.

Em relação ao ônus da prova, Carvalho Filho (2012) afirma que diante dos pressupostos da Responsabilidade Objetiva, ao Estado só cabe defender-se, provando a inexistência do fato administrativo, a inexistência de dano ou a ausência do nexo causal entre o fato e o dano. Há, ainda outro fato – a pretensão formulada pelo indivíduo para obter do Estado a reparação de prejuízos, o que atenua em muito o princípio de que o ônus da prova incumbe a quem o alega (onus probandi incumbit ei que dicit, non qui negat). Se o autor da ação alega a existência do fato, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro, cabe ao Estado-réu a contraprova sobre tais alegações.

A responsabilidade subjetiva, por sua vez, não foi banida do ordenamento jurídico. A regra é a Responsabilidade Objetiva, fundada na Teoria do Risco Administrativo, sempre que o dano for causado por agentes estatais ou quando houver relação de causa e efeito entre a atuação administrativa e o dano. Resta, contudo, espaço para a responsabilidade subjetiva por omissão genérica, determinando-se, a responsabilidade da Administração, com base na culpa anônima ou na falta de serviço, seja porque esta não funcionou quando deveria ter funcionado, seja porque funcionou mal ou tarde demais.

Há divergência sobre este tema entre os doutrinadores, sendo que alguns acreditam que a norma é a mesma para a conduta e a omissão do Poder Público, enquanto outros aplicam a Teoria da Responsabilidade Subjetiva em casos de omissão.

Segundo Bandeira de Melo (2008), tem-se a Reponsabilidade Subjetiva da Administração sempre que o dano decorrer de omissão do Estado. O autor pondera que nos casos de omissão o Estado não agiu, não sendo, portanto, o causador do dano, pelo que só

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estaria obrigado a indenizar os prejuízos resultantes de eventos que teria o dever de impedir. Aduz, ainda, Bandeira de Melo (2008), que a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por ato ilícito e, portanto, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que constituía em dada obrigação.

1.4.2 Aplicação da Responsabilidade Objetiva: pressupostos excludentes e atenuantes

A respeito da aplicação da Responsabilidade Objetiva é interessante abordar os pressupostos excludentes e atenuantes pois, muitas vezes, o Estado não concorreu para o dano ou as circunstâncias em que esse ocorreu, o que leva à necessidade de sua análise.

A legislação brasileira prevê as formas que atenuam ou excluem a Responsabilidade Objetiva do Estado. O nexo de causalidade constitui-se no fundamento da Responsabilidade Civil do Estado, e deixará de existir ou incidirá de forma atenuada quando o Serviço Público não for a causa do dano, quando este estiver aliado a outras circunstâncias ou, ainda, quando não for a causa única. São causas excludentes da responsabilidade, segundo Di Pietro (2009), a força maior, a culpa da vítima e a culpa de terceiros. Como causa atenuante, a autora aponta a culpa concorrente da vítima.

Segundo Cavalieri Filho (2012, p. 263),

As causas que excluem o nexo de causalidade (força maior, fato exclusivo da vítima e de terceiro) excluirão também a responsabilidade objetiva do Estado, com o temperamento acima exposto. Não responde o Estado objetivamente por fenômenos da natureza, como chuvas torrenciais, tempestades, inundações, causas de força maior. Tais eventos não são causados por sua atividade. Não responde pelo fato exclusivo da vítima ou de terceiros, doloso ou culposo, pela mesma razão. Assaltos, furtos, acidentes na via pública são fatos estranhos à atividade administrativa, em relação aos quais não é aplicável o princípio constitucional que consagra a responsabilidade objetiva. Quanto ao fortuito interno, este não exclui a responsabilidade do Estado porquanto, embora imprevisível, faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos da atuação estatal. Só o fortuito externo exclui a responsabilidade estatal por se tratar de fato irresistível, estranho à atividade administrativa.

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Manifesta-se Di Pietro (2009, p. 648), ressaltando que existe controvérsia sobre as diferenças entre força maior e caso fortuito. O Código Civil, de 2002, parece identificar os dois conceitos no art. 393, § único, ao estabelecer que “o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não são possíveis evitar ou impedir.”

Força maior é acontecimento imprevisível, inevitável e estranho à vontade das partes, como uma tempestade, não podendo ser imputável à Administração, tampouco incidir a responsabilidade sobre o Estado. Não fica evidente o nexo causal entre o dano e o comportamento da Administração Pública. Já o caso fortuito decorre de atos humanos ou de falha da Administração Pública.

A culpa da vítima atenua e/ou exclui a responsabilidade estatal, contudo, há que se fazer distinção entre culpa exclusiva ou culpa concorrente com a do Poder Público. No caso de culpa exclusiva da vítima, o Estado não responde. Já em caso de culpa concorrente ocorre a atenuação da responsabilidade do Estado. Está previsto no art. 945 do Código Civil, de 2002, que “se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada, tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”

A respeito, ainda, das causas excludentes da responsabilidade do Estado, Diógenes Gasparini (2011, p. 1115) aduz que em duas hipóteses o Estado não tem de indenizar:

A primeira diz respeito a acontecimento, imprevisível e irresistível, causado por forca externa ao Estado, do tipo do tufão e da nevasca (caso fortuito) ou da greve e da grave perturbação da ordem (força maior). Destarte, demonstrado que o dano é uma decorrência de acontecimentos dessa ordem, não há o Estado que indenizar, dado não ter sido ele o causador do dano, conforme decisões de nossos Tribunais, a exemplo do STF (RDA, 128:554), e do Tribunal de Justiça de São Paulo (RT, 509:141). Assim, demonstrado o estado de imprevisibilidade e de irresistibilidade do evento danoso, nada mais é necessário para liberar a Administração Pública da obrigação de indenizar o dano sofrido pela vítima.

Observa-se que acontecimentos imprevisíveis que na maioria das vezes ocorrem por fatos da natureza e, também, pelos administrados – como por exemplo, a perturbação do silêncio em área residencial, que é proibida em lei – eximem o Estado da indenização por não ter dado causa ao dano.

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Continua Gasparini (2011, p. 1115) ressaltando que:

A segunda diz respeito à situação em que a vítima deu causa ao evento danoso. É o que ocorre quando a vítima se atira sob as rodas de um caminhão de lixo pertencente ao Estado. Por evidente, nada fez o agente estatal para a ocorrência desse evento gravoso para a vítima. Nesse caso e em outros semelhantes, não cabe qualquer responsabilidade ao Estado, pois não está presente o nexo indispensável entre a ação do Estado e o dano sofrido pela vítima. Pode ocorrer, no entanto, que a vítima apenas concorreu para o evento danoso. Provado, pois, que a vítima participou, de algum modo, para o resultado gravoso, exime-se o Estado da obrigação de indenizar, na exata proporção dessa participação. Destarte, sua responsabilidade, nesses casos, será sempre parcial, na medida em que se leva em conta a colaboração da vítima na produção do acontecimento danoso. (RDA, 137:233; RJTJSP, 85:140; RT 550:106).

Evidencia-se, assim, que não é em todas as situações que o Estado tem o dever de indenizar totalmente o dano produzido pois, às vezes, a vítima pode ter contribuído para que o dano ocorresse e, nesse caso, divide-se a responsabilidade entre os dois – vítima e Estado.

1.4.2.1 Alguns precedentes jurisprudenciais

Deve-se assinalar que em muitas situações do cotidiano a conduta comissiva ou omissiva do Estado ocasiona danos aos particulares e, se comprovado o nexo causal e o dano, o Estado fica na obrigação de reparar o dano pelo prejuízo causado. De fato, “[...] como qualquer outro sujeito de direitos, o Poder Público pode vir a se encontrar na situação de quem causou prejuízo a alguém, do que lhe resulta obrigação de recompor os agravos patrimoniais oriundos da ação ou abstenção lesiva.” (BANDEIRA DEMELLO, 2008, p. 853).

O Poder Judiciário frequentemente tem sido acionado para decidir sobre situações provocadas pelo Estado e seus agentes estatais, que exigem a reparação do dano provocado. Essas decisões dão ensejo a precedentes de conteúdo valioso, na medida em que trazem novos e inusitados vieses interpretativos da legislação pátria.

Assim, passa-se a analisar a Responsabilidade Extracontratual do Estado, sob a ótica da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, pontuando os principais aspectos dessa importante temática.

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O primeiro caso que chama a atenção é o da Responsabilidade Civil do Estado por dano decorrente de crime praticado por preso foragido. A esse respeito destaca-se o entendimento de Alexandre Mazza (2011, p. 290), que assim se expressa:

a responsabilidade do Estado é mais acentuada do que nas relações de sujeição geral, à medida que o ente público tem o dever de garantir a integridade das pessoas custodiadas. Por isso, a responsabilidade estatal é objetiva, inclusive, quanto a atos de terceiros.

Observa-se, então, que no caso colacionado a seguir, houve omissão do dever de vigilância, ou seja, o Estado deixou de agir e, devido a tal, não conseguiu impedir o resultado lesivo, pois:

Data de publicação: 18/09/2013

Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DANO

DECORRENTE DE CRIME PRATICADO POR PRESO FORAGIDO. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da responsabilidade civil do

Estado em face de dano decorrente de crime praticado por preso foragido,

haja vista a omissão no dever de vigilância por parte do ente federativo.

Encontrado em: Responsabilidade civil do Estado por ato praticado por

preso foragido. Acórdão(s) citado(s): (RECURSO... FEDERAL LEG-FED SUMSTF-000279 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF RECTE(S): ESTADO DE MATO GROSSO.

Como regra geral, a Responsabilidade Civil do Estado é objetiva, bastando para a sua configuração a comprovação do dano, do fato administrativo e do nexo de causalidade entre eles, não afastando a objetividade e a responsabilidade decorrente de omissão in vigilando. O ente estatal é responsável, inclusive, nos casos decorrentes de sua omissão, pois, se assim não fosse, a sociedade de forma geral sofreria pela falta de vigilância e por todas as outras precariedades do sistema prisional brasileiro.

Outra situação que tem a ver mais pontualmente com o escopo desta pesquisa é o caso de acidentes ocorridos pela falta de conservação em rodovias federais, no qual a Jurisprudência já reconhece a responsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, ou seja:

ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO DNIT. MÁ CONSERVAÇÃO DA ESTRADA. DANO MORAL CONFIGURADO. 1. Os documentos e a prova testemunhal deixam claro que o motivo causador do acidente foram as péssimas condições de conservação da rodovia. 2. Mantida a condenação à reparação dos danos morais causados pelo acidente.

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É evidente que a Administração Pública tem o dever jurídico de fiscalização e conservação das rodovias. Sua omissão pode gerar resultados lesivos à sociedade, que poderá exigir a reparação do dano ocorrido. Yussef Said Cahali (2007) afirma que nem sempre o simples fato da má conservação da via é o suficiente para a responsabilização estatal, sendo necessário constatar a falha gritante da ausência do cumprimento do dever legal pela Administração Pública. Aduz o autor:

A pretensão contra o Estado só nasce se efetivamente, na grande relatividade do espaço social, em concreto, se puder interpretar o direito objetivo como falha tão gritante que, nas circunstâncias, se possa interpretar como obrigação estatal descumprida; o só fato de não estar, em geral, perfeitamente cuidada a rua não é suficiente causa de acidente atribuível ao Estado, num País apenas em desenvolvimento, com as finanças públicas também em estado de grande debilitação; a configuração da hipótese ter-se-ia dado se fosse o caso de uma ‘cratera’ especter-se-ial, contra o qual o Município nenhuma providência tomou, sequer a de aviso de perigo; o simples mau estado das ruas, numa Capital com poucos recursos financeiros, somente exige aos cidadãos ainda maior cuidado com o tráfego. (CAHALI, 2007, p. 207).

Há, portanto, necessidade de se verificar quando o Estado deverá ressarcir prejuízos atribuídos à sua omissão. Não se pode esquecer que o ônus do pagamento da indenização para reparar o dano é repartido pela sociedade, uma vez que os recursos que o Estado vai utilizar são oriundos do pagamento dos seus tributos.

Para melhor elucidar a responsabilização do Estado por danos causados a terceiros pela falta de conservação das estradas, seja por ação ou omissão, no próximo capítulo será abordado o tema referente à Responsabilidade Objetiva do Estado pelos danos causados aos cidadãos, sejam estes resultantes de ação ou omissão. Se um transeunte sofre um acidente em uma rodovia, causado por falta de sinalização, acostamento ou buracos, ou seja, pela sua má conservação, a responsabilidade do Estado é objetiva, podendo a vítima entrar com um pedido de indenização contra o órgão rodoviário responsável pela via, provando o nexo causal entre a omissão do Estado na manutenção da via e o dano.

A respeito disso, Cahali (2007, p. 220) assim se posiciona:

[...] as obrigações em direito comportam causas, podendo elas ser a lei, o contrato ou o ato ilícito; assim, causa nas obrigações jurídicas é todo fenômeno de transcendência jurídica capaz de produzir um efeito jurídico pelo qual alguém tem o direito de exigir de outrem uma prestação; daí

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concluir que a omissão pode ser causa e não condição, ou, em outros termos, o comportamento omissivo do agente público, desde que deflagrador primário do dano praticado por terceiro, é causa e não simples condição do evento danoso; portanto, há que se examinar, em cada caso concreto, se o evento danoso teve como causa a omissão grave do representante do Estado; se teve a responsabilidade subjetiva do Estado; se não teve, isto é, se o dano ocorreu por omissão do funcionário, incapaz de ser caracterizado como causa daquele, tal omissão não gerará a responsabilidade do Estado.

O Estado, portanto, possui Responsabilidade Civil com relação à conservação das rodovias sob sua responsabilidade. Sua omissão pode gerar o dever de indenizar as vítimas em caso de acidentes, tema do capítulo que segue.

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2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: OMISSÃO NA CONSERVAÇÃO DAS RODOVIAS SOB SUA RESPONSABILIDADE

É imprescindível retomar os aspectos referentes à aplicação do art. 37, § 6° da Constituição Federal de 1988 para compreender o alcance e os elementos configuradores da Responsabilidade Civil do Estado.

Por outro lado, objetiva-se, também, analisar a responsabilização do Estado por atos omissivos quando da falta de prestação de Serviço Público relacionado à conservação das rodovias, e esclarecer a atuação e fiscalização da Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) na manutenção das rodovias sob sua responsabilidade ou do concessionário.

Por derradeiro, analisa-se alguns casos julgados pelos Tribunais Superiores que demonstram o dever do Estado em indenizar as vítimas que sofrem danos pela sua omissão na conservação das rodovias sob sua guarda ou das concessionárias prestadoras de serviços públicos.

2.1 A responsabilidade do Estado por omissão

Conforme exposto anteriormente, a Responsabilidade Objetiva constitui-se no dever de indenizar atos lícitos ou ilícitos que produziram lesões a bens particulares juridicamente protegidos. Quando, porém, se trata de atos omissivos na conservação das rodovias, a responsabilidade é subjetiva, uma vez que não basta a simples relação entre ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido, mas sim, a obrigação legal de impedir o evento danoso. Isso significa que o Estado é responsável pela conservação das estradas que estão sob sua tutela, direta ou indiretamente, sob a forma de concessão (BANDEIRA DE MELLO, 2008).

Em outras palavras, para se configurar a Responsabilidade Subjetiva, relativa ao tema ora em pauta, é necessário que o Estado tenha cometido a ilicitude ou não tenha impedido o dano em razão de um ato omissivo. A responsabilização do Estado por danos causados em decorrência da má conservação das estradas só faz sentido se este estiver obrigado legalmente a impedir o acontecimento danoso (BANDEIRA DE MELLO, 2008).

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Interessante registrar que a CF/88 não apresenta qualquer regra expressa sobre a Responsabilidade Civil por eventuais danos ocasionados por omissão do Poder Público. Constata-se, portanto, que tal responsabilidade encontra respaldo na doutrina e jurisprudência, pois o Estado responde com base na teoria da culpa administrativa.

Esta teoria, segundo Marcelo Alexandrino e Vicente de Paulo (2012, p. 783),

trata-se, portanto, de modalidade de responsabilidade civil subjetiva, mas a pessoa que sofreu o dano basta provar (o ônus da prova é dela) que houve falta de prestação do serviço que deveria ser prestado pelo Estado, provando, também que existe nexo causal entre o dano e omissão estatal [...]. Em suma, para ensejar a responsabilização a pessoa que sofreu o dano deve provar que houve falta no serviço que o Estado deveria ter prestado (nas modalidades omissivas, inexistência do serviço, deficiência do serviço ou atraso na prestação do serviço).

É pacífico na jurisprudência brasileira que a responsabilização estatal seja de caráter subjetivo no caso de conduta omissiva, inclusive quando a prestação do serviço se faz por meio da concessão, ou seja, delegação de Serviço Público. A conduta omissiva ocorre quando estiverem presentes os elementos caracterizadores da culpa, do descumprimento do dever legal de realizar a conservação das rodovias, impedindo a consumação do evento danoso.

Com efeito, a frequência de danos ocorridos devido à má conservação das estradas ou até mesmo por defeitos apresentados nas pistas, possibilitam que se faça uma interpretação declarativa do art. 90, § 1°, da Lei 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro – quanto ao dever do Poder Público em sinalizar as rodovias que apresentam defeitos, quando graves, não perceptíveis facilmente e determinante dos danos: “O órgão ou entidade de trânsito com circunscrição sobre a via é responsável pela implantação da sinalização, respondendo pela sua falta, insuficiência ou incorreta colocação”1.

O voto da Apelação 350.912, da 7ª Câmara do 1° Tribunal de São Paulo, de 27/12/1986, em RT 606/1332, sustenta essa afirmação e dispõe que: “ocorrido o acidente por

1 Uma interpretação declarativa especificadora parte do “pressuposto de que o sentido da norma cabe na letra de

seu enunciado”, ou seja, segundo a teoria dogmática “na interpretação especificadora, a letra da lei está em harmonia com a mens legis ou o espírito da lei, cabendo ao interprete apenas constatar a coincidência” (FERRAZ JÚNIOR, 2001, p. 290, grifo do autor).

2 É importante que se esclareça sobre o julgado acima tratado, uma vez que a intenção é a de mostrar que mesmo

antes da edição da atual Constituição, os Tribunais Superiores já manifestavam sobre a tese da Responsabilidade Subjetiva do Estado quando houvesse a falta exclusiva do serviço que estava sob sua guarda ou de pessoas jurídicas de direito público, como no caso das autarquias e pessoas jurídicas criadas pelo Decreto n. 200/67.

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falta exclusiva do serviço público que mantinha pista defeituosa e sem sinalização adequada, responde a autarquia encarregada desse mister administrativo pelos prejuízos causados.” (grifo nosso).

Vale anotar que o Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, também apresenta aspectos referentes à responsabilidade civil do Estado quando este não oferece condições seguras no trânsito.

2.2 Responsabilidade Civil do Estado em face do Código de Trânsito brasileiro

Não se pode deixar de enfocar a Responsabilidade Civil do Estado em face do Código de Trânsito Brasileiro, cuja legislação rege as relações decorrentes da utilização das vias terrestres no Estado brasileiro.

A responsabilidade estatal em situações em que o dano ocorre por omissão vem sendo sustentada há vários anos por doutrinadores e pelo Supremo Tribunal Federal. Em linhas gerais, “o Estado só pode ser condenado a ressarcir prejuízos à sua omissão quando a legislação considera obrigatória a prática da conduta omitida.” (MAZZA, 2011, p. 288).

Desta forma, faz-se necessário analisar o art. 1° da Lei 9.503/97 para compreender a amplitude e seu significado.

2.2.1 Análise do art. 1º da Lei nº 9.503, de 23/09/1997

Sem embargos, reitera-se que nos casos de Responsabilidade por Omissão a responsabilidade é subjetiva, o que fica claro ao analisar o disposto no supramencionado artigo que presume a obrigação legal do poder estatal em proporcionar condições de trafegabilidade nas vias terrestres sob sua responsabilidade ou oriundas de delegação por contrato nas concessões.

O dispositivo que ora se transcreve possibilita uma interpretação correspondente ao entendimento da amplitude da expressão “vias terrestres”. Dispõe in verbis:

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Art. 1º. O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código.

§ 1º. Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.

§ 2º. O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.

§ 3º. Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.

§ 4º. (VETADO)

§ 5º. Os órgãos e entidades de trânsito pertencentes ao Sistema Nacional de Trânsito darão prioridade em suas ações à defesa da vida, nela incluída a preservação da saúde e do meio-ambiente.

É indispensável que se compreenda o significado de “vias terrestres” para não pairar dúvidas sobre a responsabilidade civil subjetiva do Estado na ocorrência de danos, sejam eles patrimoniais, morais, estéticos ou decorrentes de acidentes relacionados à má conservação das rodovias.

É nesse ponto que se utiliza os comentários de Julyver Modesto de Araújo (2016), referente ao significado e amplitude de “vias terrestres”, o qual argumenta que:

Embora não tenha sido utilizada a expressão “vias públicas” na redação do artigo 1º, preferindo o legislador o termo “vias terrestres abertas à circulação”, é lícito entender que eles se equivalem, de forma que somente se aplicam às regras de trânsito, instituídas pela lei, às “superfícies por onde transitam veículos, pessoas e animais, compreendendo a pista, a calçada, o acostamento, ilha e canteiro central” (conceito de via, segundo o Anexo I), quando elas estiverem inseridas no contexto de bem público de uso comum do povo, nos termos do artigo 99, inciso I, da Lei n. 10.406/02 (Código Civil).

Desse modo, é inegável que a conservação das vias terrestres ou vias públicas abrangem as estradas conservadas pelo Poder Público ou Concessionárias.

Cumpre esclarecer, ainda, que a legislação evoluiu no sentido de incluir nas vias públicas não apenas as estradas mas também as vias existentes em condomínios e em estacionamentos para pessoas com necessidades especiais.

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Consoante entendimento de Araújo (2016), as modificações legislativas a seguir expostas mostram a evolução de um quadro que abrange não só os bens públicos, como os bens privados de uso coletivo:

[...] Mais recentemente, a Lei n. 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) promoveu alteração justamente no parágrafo único do artigo 2º, para também considerar vias terrestres as vias e áreas de estacionamento de estabelecimentos privados de uso coletivo, como estacionamentos de supermercados, shoppings e congêneres.

Nesse contexto percebe-se que não só em propriedades públicas se aplica o disposto no art. 1°, mas também nas propriedades privadas de uso coletivo. Não se pode deixar de mencionar que essa ampliação interpretativa relaciona-se com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana que impõe limites à atuação estatal, “[...] objetivando impedir que o Poder Público venha a violar a dignidade pessoal, mas também implica que o Estado deverá ter como meta permanente, proteção, promoção e realização concreta de uma vida com dignidade para todos.” (SARLET, 2008, p. 115).

Nessa linha, não restam dúvidas que:

[...] todos os órgãos, funções e atividades estatais encontram-se vinculados ao princípio da dignidade humana, impondo-se-lhes um dever de respeito e proteção, que se exprime tanto na obrigação por parte do Estado de abster-se de ingerências na esfera individual que sejam contrárias à dignidade pessoal, quanto no dever de protegê-la [...]. (SARLET, 2008, p. 115).

Neste entendimento reflete-se a importância que assume a atuação do Estado na conservação das estradas, considerando que compete ao Poder Público oferecer aos seus cidadãos rodovias em condições mínimas de trafegabilidade. Isto corresponde a uma garantia constitucional, uma vez que a ideia da dignidade está relacionada com qualidade de vida e é um dever prestacional dos poderes públicos em agir de acordo com padrões mínimos existenciais.

2.3 Concessão da prestação do Serviço Público de conservação das rodovias

A concessão de Serviço Público, bem como a delegação de sua prestação está definida no art. 2°, III, da Lei 8.987/95, e efetuadas pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência.

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A respeito do tema enuncia Bandeira de Melo (2008, p. 686):

Concessão de serviço público é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob a garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.

As concessionárias que recebem do Estado o dever de colocar em funcionamento os Serviços Públicos também têm o dever constitucional de reparar os danos. Destarte, assumem a responsabilidade de forma objetiva de acordo com o art. 37, § 6° da CF/88.

Existe relação de consumo entre o usuário do serviço e a empresa concessionária, assegurada pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 22, conforme destaca Igor Pereira Matos Figueredo (2014):

[...] no que toca às concessões de rodovias, não se pode negar a nítida relação de consumo que se estabelece entre o usuário do serviço e a empresa concessionária (CDC, art. 22). Mesmo quando o pedágio não é pago diretamente (como no caso dos passageiros de ônibus), a tarifa está embutida no preço da passagem, o que não altera o caráter do elo jurídico.

Na hipótese de acidente com veículo de transporte de passageiros, cabe ao ofendido demonstrar o nexo de causalidade entre a conduta comissiva ou omissiva da empresa concessionária e o resultado danoso. Provada a ligação fática entre os danos da vítima e a falta de manutenção ou de sinalização do trecho da rodovia em que ocorreu o sinistro, ou mesmo a negativa, demora ou má qualidade na assistência médica pré-hospitalar, o dever de indenizar afigura-se irrefutável (IGOR FIGUEREDO, 2014).

O entendimento do Tribunal da Cidadania não diverge da tese dos doutrinadores administrativos e vem corroborar o exposto por intermédio do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL E PROCESSUAL. ACIDENTE. RODOVIA. ANIMAIS NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. SEGURANÇA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES.

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I – De acordo com os precedentes do STJ, as concessionárias de serviços rodoviários estão subordinadas à legislação consumerista.

II – A presença de animais na pista coloca em risco a segurança dos usuários da rodovia, respondendo às concessionárias pelo defeito na prestação do serviço que lhes é outorgado pelo Poder Público concedente.

III – Recurso especial conhecido e provido. (REsp. 687.799/RS, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, julgado em 15/10/2009, DJe 30/11/2009).

O Estado é obrigado a oferecer rodovias e estradas seguras e em condições mínimas de trafegabilidade e segurança aos seus cidadãos. E, quando não consegue dar conta das demandas exigíveis pela sociedade, repassa às concessionárias a execução das atividades que lhe seriam próprias. Ressalta-se que o Estado, por sua imobilidade, criou as concessionárias para que exercessem as suas próprias funções, as quais caracterizam a Administração Pública. Para tanto, permitiu que explorassem a movimentação de veículos por meio de cobrança de pedágio.

Com isto, segundo entendimento de Eurivaldo Neves Bezerra (2004),

[...] as concessionárias se sub-rogam nos deveres e obrigações do Estado na exploração das rodovias, devendo oferecer ao cidadão e consumidor o direito de trafegar por rodovias seguras, com piso em boas condições e sinalização adequada, oferecendo ainda no caso de acidentes, um atendimento médico gratuito e ágil.

Evidencia-se que o Estado está se desvinculando da prestação direta de serviços públicos, passando à iniciativa privada a responsabilidade da sua adequada execução. Neste sentido, esclarece Patrícia Bispo Zanusso (2006, p. 18):

Cabe aos órgãos executivos rodoviários federais, estaduais e municipais conservar as vias públicas, proporcionando a devida manutenção para garantir um trânsito em condições seguras aos usuários das mesmas.

Se houver concessão, caberá às concessionárias a prestação do serviço público de manutenção e conservação das vias públicas federais, fiscalizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres.

Haverá, também, a possibilidade de delegação da responsabilidade da conservação ou manutenção das vias públicas mediante convênios firmados entre a União e os Estados, Distrito Federal e Municípios, buscando, tal qual no caso das concessionárias, a descentralização da prestação dos serviços públicos. Se ocorrerem danos aos particulares, apesar da via ser federal, o ente responsável pela conservação ou manutenção da rodovia será responsabilizado.

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Com o intuito de garantir uma melhor prestação dos serviços, o Estado vem transferindo para a esfera privada tais incumbências. Com isso, fica o ente estatal encarregado de fiscalizar as concessões, permissões e autorizações, segundo o art. 12 da Lei 10.233/01. No objetivo de cumprir esse dever é que foram criadas as agências reguladoras, estando seus objetivos estipulados no art. 20 da Lei nº 10.233/01.

Segundo dados extraídos do site oficial do Programa Brasileiro de Concessões Rodoviárias (2016),

A atuação das Concessionárias Federais de Rodovias é regulamentada e fiscalizada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), do Ministério dos Transportes. Este sistema foi adotado no País como alternativa para recuperar e aprimorar parte significativa da malha rodoviária brasileira, uma vez que as rodovias encontravam-se num nível alto de degradação, devido à falta de investimentos públicos. Com o fim do Fundo Rodoviário Nacional, em 1988, cujos recursos eram obrigatoriamente aplicados nas rodovias, não havia outra fonte de recurso disponível, a não ser a capacidade de investimento da iniciativa privada.

Constata-se, assim, que a existência de um órgão com atribuições específicas para recuperar, aprimorar e fiscalizar as rodovias é de suma importância para a Administração Pública brasileira. Nesse rumo, contar com investimentos privados para atender às demandas da malha rodoviária do Brasil é uma das alternativas encontradas para superar os problemas enfrentados nessa área.

A atuação e fiscalização das concessionárias na área dos transportes passou, então, para a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que surgiu em decorrência do “processo de liberalização econômica ocorrido na década de 1990, que ensejou sensíveis mudanças no papel desempenhado pelo Estado na economia brasileira [...].” A ANTT destacou-se como uma entidade com novo perfil, ou seja, com conhecimento técnico capaz de examinar e medir a qualidade dos serviços prestados.

2.3.1 Atuação e fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na manutenção das rodovias

Para cumprir com suas atividades e realizar a prestação de serviços públicos, o Estado pode atuar de forma direta, desempenhando as atividades por sua conta em risco, ou por meio de outras pessoas jurídicas e, assim, auxiliar no desempenho das atividades com mais eficiência e adequação aos fins desejados.

Referências

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