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Proposta de modelo para o estudo das condições de trabalho baseada na técnica dos incidentes críticos

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Academic year: 2021

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1. INTRODUÇÃO

1.1 Contextualização do problema

As afecções músculo-esqueléticas relacionadas ao trabalho, que no Brasil tornaram-se conhecidas como Lesões por Esforços Repetitivos (LER), representam o principal grupo de agravos à saúde entre as doenças ocupacionais em nosso país. Tratam-se de afecções de importância crescente em vários países do mundo, com dimensões epidêmicas em diversas categorias profissionais, apresentando-se sob diferentes formas clínicas, de difícil manejo por parte de equipes de saúde e de instituições previdenciárias. Por essas características geram inquietações e, por vezes, questionamentos sobre os limites do papel do médico e de outros profissionais dentro da equipe de assistência (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2000).

Muitas das questões apontadas são realmente polêmicas e se referem a aspectos de quadros clínicos subjetivos, de formas de avaliação de fatores de risco do trabalho, à interferência de fatores extra-laborais, à existência de pressões de organismos empresariais ou de burocracia previdenciária e a outras influências dentro do contexto social, político e cultural.

Diferentemente das doenças profissionais, as DORT (Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho) são enquadradas em afecções nas quais não se identifica apenas um agente causal, mas vários, entre os quais os laborais, que irão repercutir em danos para a saúde física e mental do trabalhador (SATO, 2001).

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Muitas situações de trabalho e da vida cotidiana são prejudiciais à saúde, e as doenças do sistema músculo-esquelético, juntamente com as psicológicas constituem as

mais importantes causas do absenteísmo e de incapacitação para o trabalho (RIBEIRO,1997; CHEREM, 1997). Essas causas podem ser atribuídas ao trabalho repetitivo ou com sobrecarga, fatores organizacionais e ambientais e uso inadequado de equipamentos, sistemas e tarefas, associada a uma solicitação e pressão psíquica nos locais de trabalho.

Segundo Vasconcelos et al (2001), as DORT/LER atingem mais a faixa etária de 20 a 39 anos, em indivíduos que encontram-se em plena produtividade. Porém, ocorre um aumento na incidência na faixa etária de 30-39 anos. Tal situação é considerada grave pelos efeitos sociais que acarreta, como afastamentos e aposentadorias precoces. Indivíduos em meio a sua fase produtiva estão sendo afastados do trabalho, e em muitos casos, permanecem incapacitados para o trabalho ou mesmo para o desempenho de atividades da vida diária.

O aumento no número de casos de DORT/LER torna-se preocupante, evidenciando a necessidade de priorização de ações que auxiliem na compreensão da gênese da doença e, a partir daí, trabalhar no sentido da prevenção.

Segundo Dejours (1980), “ a relação do homem com a organização do trabalho é a origem da carga psíquica no trabalho.” Os fatores organizacionais vêm sendo evidenciados em diversos estudos, estabelecendo uma relação direta entre a tarefa prescrita e a atividade real do trabalhador, influenciando o trabalho e a saúde física e psíquica do indivíduo.

Segundo Smith (1996), ao nível organizacional, as políticas e os procedimentos da empresa podem influenciar a suscetibilidade para o desenvolvimento de

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DORT/LER. O contexto organizacional no qual o trabalho encontra-se inserido pode interferir na motivação, na atitude, no comportamento, na tensão do trabalho e na saúde do trabalhador.

Dejours (1994), refere-se a atividade laboral como “um espaço possível de investimento dos nossos impulsos”, se o trabalhador encontra na organização do seu trabalho um espaço que permite-lhe investir, estabelecer metas, construir uma auto imagem e uma história de vida positiva, o trabalho torna-se fonte de prazer, realização e equilíbrio psíquico e somático. Caso contrário, o trabalho torna-se sofrimento repercutindo negativamente na saúde do trabalhador.

Ainda, segundo Dejours (1980), “ quando o rearranjo da organização do trabalho não é mais possível, quando a relação do trabalhador com a organização do trabalho é bloqueada, o sofrimento começa”. A questão dos desequilíbrios e sobrecargas nas cargas de trabalho levará a alterações sobre o bem-estar físico e psicológico do trabalhador, resultando em cansaço, absenteísmo, doença, acidentes, estresse e comprometimento da qualidade de trabalho.

Faz-se necessário a preocupação com o trabalhador em contexto amplo do termo, buscando através da análise ergonômica do trabalho, caracterizar as ações que possam repercutir em danos para a saúde física e psíquica do indivíduo, para a posteriori criar subsídios que previnam e minimizem essas reações indesejadas.

A sobrecarga de trabalho no setor de orientação do tráfego e a falta de treinamento específico sobre a prevenção de acidentes e incidentes, podem causar sérios danos, não apenas ao trabalhador imediatamente envolvido na atividade, como também a trabalhadores de outros setores da empresa e ao usuário. Faz-se necessário que se tomem providências, no sentido de reverter o processo de adoecimento, desgaste e “sofrimento” destes trabalhadores.

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1.2 Pergunta de pesquisa

Em face ao exposto, pode-se formular a seguinte pergunta de pesquisa:

Como viabilizar a identificação de incidentes críticos que possam estar interferindo na saúde dos funcionários de uma Companhia de Transporte e Tráfego?

1.3 Justificativas

A origem da demanda da presente pesquisa parte, portanto, da resolução de problemas ergonômicos de um sistema de produção já implantado e em funcionamento a muitos anos. É importante ressaltar que o interesse para realização desta pesquisa, parte, também, da vivência da pesquisadora, onde , no período em que trabalhava em clínica de Fisioterapia, teve a oportunidade de atender diversos trabalhadores do “EstaR” (Estacionamento Regulamentado), com história de DORT/LER. O relato da rotina de trabalho, de como esta rotina estava influenciando na saúde e na qualidade de vida de um número cada vez maior de indivíduos, chamaram a atenção desta pesquisadora.

A aplicação da TIC, juntamente com a AET, na análise da atividade da situação de trabalho, permitirá a identificação de áreas-problemas em um determinado sistema que estão repercutindo em incidentes e acidentes de trabalho. O estudo dos incidentes críticos possibilitará a análise do comportamento do trabalhador e o sentido de sofrimento e fracasso ou de prazer e sucesso que demanda de sua atividade.

Os riscos estão presentes em todas as atividades humanas, portanto a participação do trabalho no processo de saúde e doença é evidente, a ponto de ser

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referenciado como fonte de prazer ou de sofrimento, dependendo do contexto em que se insere.

A presente pesquisa pretende conhecer os problemas e as condições do trabalho por meio da análise dos incidentes críticos e relacioná-los ao grande número de casos de DORT/LER confirmados e as “quase” DORT/LER encontrados entre os trabalhadores pesquisados.

Segundo Ribeiro (1997), a DORT/LER é a mais freqüente das doenças do trabalho nos países precoces ou tardiamente industrializados. Trata-se de uma doença emblemática, envolvendo vários fatores relativos a dimensão do trabalho e a dimensão do indivíduo.

Apesar de sua evidência em diversas categorias profissionais e do número de casos crescente, há uma carência de medidas efetivas para a prevenção da DORT/LER.

É necessária a análise complexa e dinâmica do trabalhador para que se possa determinar a causalidade real da doença. A análise ergonômica do trabalho, associada a TIC, possibilitará uma pesquisa criteriosa das condições de trabalho envolvido na ocorrência de incidentes e acidentes de trabalho, bem como a gênese da DORT/LER .

A análise será pertinente ao comportamento do trabalhador e da organização, podendo traduzir problemas ergonômicos como sofrimento físico e mental, doenças ocupacionais, acidentes, absenteísmo, rotatividade, baixa produtividade e diminuição da qualidade do trabalho.

A partir da pergunta de pesquisa que norteia o trabalho, estabeleceu-se os seguintes objetivos do trabalho:

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1.4 Objetivo Geral

Identificar as situações críticas que podem estar interferindo na saúde do trabalhador, baseada na análise ergonômica do trabalho associada à Técnica de Incidentes Críticos.

1.5 Objetivos específicos

Para atingir o objetivo geral do trabalho, propõe-se os seguintes objetivos específicos:

- Identificar a incidência de DORT/LER entre os funcionários da Companhia de Transporte e Tráfego (CTT);

- Identificar os aspectos das condições de trabalho que estão repercutindo no surgimento das DORT/LER e no comprometimento da saúde dos trabalhadores; - Identificar e categorizar os incidentes críticos, associados ao aparecimento das

DORT/LER, utilizando a Técnica de Incidentes críticos;

- Elaborar um caderno de encargos de recomendações ergonômicas para subsidiar a concepção de um Programa de Prevenção.

1.6 Limitação do trabalho

O presente trabalho abrange uma análise da situação de trabalho, objetivando identificar as situações críticas que podem estar interferindo na saúde do trabalhador e no surgimento das DORT/LER, baseada na AET associada a aplicação da TIC.

A situação de trabalho será analisada de forma geral, não apresentando-se pesquisa específica em assuntos abordados no trabalho, como questões cognitivas e

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ambientais, que norteiam a pesquisa como importantes fatores agravantes para o desenvolvimento de DORT/LER e ocorrência de incidentes e acidentes de trabalho.

Os resultados deste trabalho não serão generalizados, mas o método aqui empregado poderá ser reaplicado.

1.7 Estrutura do Trabalho

O trabalho está estruturado em 7 capítulos, descritos a seguir:

O capítulo 2 apresenta uma revisão bibliográfica, dispondo a respeito dos aspectos teóricos de DORT/LER, trabalho e Carga de trabalho, acidente de trabalho, ergonomia, análise ergonômica do trabalho, incidentes críticos e Técnica de Incidentes Críticos.

No capítulo 3 apresentar-se-á a caracterização da pesquisa, a situação de trabalho, a amostra a ser pesquisada e as técnicas para coletar os dados necessários para a realização da AET. A TIC será empregada, a partir de observações e entrevistas, para o levantamento dos possíveis incidentes críticos. Neste capítulo será mostrada as variáveis a serem analisadas.

O capítulo 4 relata a aplicação da análise ergonômica do trabalho na CTT. No capítulo 5, baseando-se nos dados colhidos na aplicação da AET associado à TIC e na pesquisa referenciada apresenta-se as conclusões e sugestões para trabalhos futuros.

Finalizando a pesquisa, o capítulo 6 apresenta as Referências Bibliográficas, seguidas dos Anexos, no capítulo 7.

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1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Neste Capítulo, será realizada uma revisão literária aprofundada, objetivando referendar o estudo e promover a compreensão do tema, auxiliando na análise dos resultados e considerações finais.

Serão abordados os seguintes tópicos: Doença Osteomuscular Relacionada ao Trabalho (DORT), trabalho e carga de trabalho, acidente de trabalho, ergonomia, análise ergonômica do trabalho, incidente crítico e Técnica de Incidente Crítico.

Neste estudo será adotado o termo DORT/LER, para o referencial teórico citado tanto como LER ou como DORT.

2.1 Doença Osteomuscular Relacionada ao Trabalho (DORT)

2.1.1 Contexto histórico

O papel das atividades ou dos movimentos repetitivos no desenvolvimento de DORT/LER vem sendo relatados desde o antigo Egito, onde foram encontrados sinais de osteófitos marginais em ossos de punhos e joelhos de múmias de populações pré-Hispânicas, que permaneciam de joelhos por tempo prolongado, executando movimentos de flexão e extensão dos membros superiores na atividade de moer grãos (Consejo Nacional para la Cultura y las Artes (1996). Bernardino Ramazzini, considerado o pai da medicina do trabalho, já descrevia em 1700, que há cerca de 2000 anos existia a doença dos escribas, que por vezes cursava com um quadro dramaticamente doloroso, bastante compatível como quadro de DORT/LER, atribuindo-a a três fatores básicos: vida sedentária, movimento contínuo e repetitivo da

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mão e atenção mental para que não manchasse os livros, refletindo situações de constante tensão (BRAVERMAN apud RIBEIRO, 1997). Verifica-se, que desde 1700, além da repetitividade da atividade, a questão da sobrecarga mental tornava-se um fator importante envolvido na gênese da doença ocupacional.

Desta forma, constata-se que as DORT/LER, não podem ser encaradas como doenças da industrialização e da modernidade, mas como distúrbios relacionados diretamente com as condições de trabalho inadequadas, no que tange, principalmente as características da organização do trabalho, que de forma geral privilegiam o paradigma da alta produtividade e qualidade do produto em detrimento da preservação do trabalho e da qualidade de vida do trabalhador (MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2001).

O Japão foi o país que mais precocemente evoluiu em termos de industrialização e automação, sendo o primeiro também a detectar a gravidade das doenças ocupacionais, relacionadas, principalmente, a fatores físicos do posto de trabalho e a fatores organizacionais, como à sobrecarga do trabalho, jornadas longas de trabalho contínuo, aumento das tarefas associadas a movimentos repetitivos, empobrecimento do conteúdo do trabalho, controle rígido das chefias e redução do repouso e do lazer (NAKASEKO, 1982 apud RIBEIRO, 1997; BARREIRA, 1994).

Na Austrália, a década de 70 foi marcada por um acentuado aumento no número de doenças do trabalho , principalmente em digitadores, operadores de linhas de montagem e embaladores. No início, estes quadros eram denominados como “lesão ocupacional por sobreesforço” (Ocupational Overuse Injury), mudando a partir de 1980, para “lesões por esforços repetitivos” (MENDES, 1995).

Nos Estados Unidos, segundo dados do seguro de acidentes do trabalho, as lesões por esforços repetitivos (Cumulative Trauma Disorders), vêm sendo

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acompanhadas de altos índices de incapacidade laborativa, e que essa proporção vêm aumentando (FEUERTEIN et al, 1993 apud MENDES, 1995).

A ocorrência das DORT/LER em um grande número de pessoas, em vários países e em tipos diferentes de trabalho, provocou uma mudança no conceito tradicional de que o trabalho pesado, envolvendo esforço físico, é mais desgastante que o trabalho leve, envolvendo esforço mental, com sobrecarga dos membros superiores e relativo gasto de energia.

No Brasil, as DORT eram conhecidas, inicialmente, como Lesões Por Esforços Repetitivos (LER) e foram descritas como tenossinovite ocupacional no XII Congresso Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho em 1973 abrangendo um número insignificante de atividades laborais (MINISTÊRIO DA PREVIDÊNCIA E DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2001). Posteriormente, observou-se o surgimento de casos em diferentes ocupações, exercendo atividade de risco, principalmente em digitadores.

A partir de 1986, as DORT/LER assumem importância crescente nas estatísticas relativas à ocorrência de doenças profissionais, devido, principalmente, as inovações tecnológicas associado a intensa fragmentação do trabalho, divisão de tarefas e sobretrabalho, expondo os trabalhadores aos esforços repetitivos. O surgimento abrupto dos casos, defrontou-se, também, com um sistema de saúde e de profissionais despreparados, levando ao tratamento e ao desenvolvimento de condutas inadequadas (MENDES,1995).

Em 1990, o Ministério do Trabalho, através da NR-17 da Portaria número 3214/78 regulamentou alguns aspectos da ergonomia, introduzindo a obrigatoriedade da realização da análise ergonômica dos postos de trabalho, objetivando estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às condições

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psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente (MIRANDA et al, 2001).

Ainda, segundo Miranda et al (2001), somente em 1998 na revisão da Norma Técnica (NT), ocorreu a alteração do nome LER para DORT, com o objetivo de torná-la mais abrangente e para evitar que na própria denominação já caracterize causas e efeitos definidos, como no caso da denominação LER

Atualmente, as DORT/LER representam um dos grupos de doenças ocupacionais mais polêmicos no Brasil e em outros países. Segundo estatísticas do Instituto Nacional do Seguro Social, referente à população trabalhadora segurada, nos últimos anos, as mesmas têm sido as mais prevalentes dentre as doenças ocupacionais registradas, acarretando em gastos previdenciários, comprometimento da produção e da saúde do trabalhador (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2000).

2.1.2 Aspectos conceituais

A denominação utilizada para caracterizar a doença ocupacional tem relação com a história de reconhecimento da doença em diferentes países. LER/DORT são termos utilizados como sinônimos de Lesões por Traumas Repetitivos, Distúrbios Cervicobraquiais Ocupacionais, Síndrome Ocupacional do Overuse, entre outros. Segundo o Ministério da Saúde (2000), a tendência mundial é utilizar cada vez mais à denominação Work Related Musculoskeletal Disorders (WRMD), traduzida como Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT).

Segundo a Norma Técnica do Instituto Nacional do Seguro Social, sob o rótulo de “LER” abrigam-se formas clínicas como: as tenossinovites (CID 727.0/2), que incluem a tenossinovite de De Quervain; as epicondilites (CID 726.3/0); as bursites

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(CID 727.2/9); a tendinite do supra-espinhoso (CID 726.1/3) e bicipital (CID 726.2/1); os cistos sinoviais (CID 727.4/5); o dedo em gatilho (CID 727.0/2); a contratura ou moléstia de Dupuytren (CID 729.4/0); a compressão de nervos periféricos: síndrome do túnel do carpo (CID 354.0/8), síndrome do canal de Guyon (CID 354.2/4), síndrome do pronador redondo (CID 354.1/6), síndrome cervicobraquial (CID 723.3/8), síndrome do desfiladeiro torácico (CID 723.4/6), e a síndrome da tensão do pescoço ou mialgia tensional (CID 723.8/9) (MPS-INSS,1993).

Couto et al (1998), descreve a DORT/LER da seguinte forma:

As DORT/LER são transtornos mecânicos e lesões de músculos e/ou de tendões e/ou de fáscias e/ou de nervos e/ou de bolsas articulares e pontas ósseas nos membros superiores ocasionadas pela utilização biomecanicamente incorreta dos membros superiores. Resulta em fadiga, queda da performance no trabalho, incapacidade temporária e, conforme o caso, podem evoluir para uma síndrome dolorosa crônica, nesta fase agravada por diversos fatores psíquicos (inerentes ao trabalho ou não) capazes de reduzir o limiar de sensibilidade do indivíduo.

No Diário Oficial da União (DOU de 19/08/1998, p. 27) encontra-se o seguinte conceito para LER:

[...] Patologias, manifestações ou síndromes patológicas que se instalam insidiosamente em determinados segmentos do corpo, em conseqüência de trabalho realizado de forma inadequada, o nexo é parte indissociável do diagnóstico que se fundamenta numa boa anamnese ocupacional e em relatórios de profissionais que conhecem a situação de trabalho,

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permitindo a correlação do quadro clínico com a atividade ocupacional efetivamente desempenhada pelo trabalhador.

Infelizmente este conceito dificilmente é aplicado na prática, onde as causas reais e portanto o nexo não é estabelecido, devido à profissionais despreparados e, principalmente, alheios a realidade do trabalhador.

As DORT/LER são doenças do trabalho provocadas pelo uso inadequado e excessivo do sistema que agrupa ossos, nervos, músculos e tendões atingindo, principalmente, os membros superiores. Afecções típicas de trabalho intenso e repetitivo, são causadas por diversos tipos de pressões existentes no trabalho tanto física quanto psíquicas. Resultando, portanto da superutilização do sistema músculo-esquelético, geralmente associado à sobrecarga psíquica e a condições de trabalho inadequadas. (GAIGHER & MELO, 2001).

As DORT/LER, caracterizam-se como uma síndrome clínica caracterizada por dor crônica acompanhada ou não por alterações objetivas, apresentando geralmente os seguintes sintomas: dores, sensação de formigamento, dormência, fadiga muscular, perda de força muscular em conseqüência de alterações nos tendões, musculatura e nervos periféricos (LECH et al,1998). Esses sintomas acabam repercutindo na vida pessoal e profissional, comprometendo o desempenho no trabalho e a saúde do trabalhador.

A partir da conceitualização de diversos autores, constata-se que as DORT/LER podem ser definidas como um conjunto de lesões crônicas que afetam o indivíduo como um todo, comprometendo sua saúde física e mental. São causadas por diversos fatores laborais e extra-laborais, que interligados potencializam a ocorrência da doença.

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2.1.3 Fatores causais da DORT

As teorias atuais sobre os distúrbios ósteo-musculares relacionados ao trabalho indicam que a sua causa é devida a diversos fatores, que agem conjuntamente no desenvolvimento da doença.

Vários fatores de risco associados as DORT/LER podem não causar a doença diretamente, mas favorecer seu aparecimento, através de sobrecargas impostas ao trabalhador, como: repetitividade de movimentos, manutenção de posturas inadequadas por tempo prolongado, esforço físico, invariabilidade de tarefas, pressão mecânica sobre determinados segmentos do corpo, em particular membros superiores, trabalho muscular estático, choques e impactos, vibração, frio, fatores organizacionais e psicossociais. Esses fatores geralmente apresentam-se interligados, intensificando o risco de desenvolver DORT/LER.

O processo de psicossomatização das DORT/LER, parte de um marco conceitual do processo de percepção do trabalho determinado pela influência de diferentes variáveis, como ambiente físico do trabalho, ritmo de trabalho, problemas organizacionais e fatores psicossociais. Essas variáveis irão influenciar a percepção, o processo de adoecimento e o nível de estresse, repercutindo na qualidade de vida e de trabalho do indivíduo (MERLO, 2001).

As diversas formas de sobrecargas do trabalho (psíquicas e físicas), as condições de trabalho e a forma de organização do trabalho têm sido fontes geradoras de doenças ocupacionais, de incidentes e de acidentes de trabalho. Várias pesquisas sobre as DORT/LER, vêm reforçando o dado subjetivo da doença, indicando que os fatores psicológicos geradores de estresse ou fadiga crônica efetivam a dor e a incapacidade.

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Segundo Smith (1996), “os fatores psicossociais aumentam o risco de DORT/LER por meio da tensão no trabalho e da fadiga psicológica e fisiológica correlata, afetando as reações hormonais e circulatórias e influenciando as atitudes e o comportamento pessoal.”

Inúmeras atividades já foram analisadas objetivando-se o estabelecimento do nexo causal da DORT/LER evidenciando que a doença prevalece em ambientes de trabalho que combinam entre vários fatores atividades repetitivas, movimentos biomecanicamente inadequados, fatores psicossociais (pressão da supervisão, pressão do tempo, falta de controle sobre a produção, falta de autonomia), fatores pessoais (patologias associadas, condições psicológicas, atividades domésticas) e os organizacionais (pausas programadas, treinamentos, pagamento por produção, horas-extras) (MAZZONI ; MARÇAL, 2001).

Os fatores de risco para o desenvolvimento de DORT/LER indicam que a doença pode atingir qualquer pessoa, desde que as condições psicossociais e físicas em que o trabalhador atue, sejam desfavoráveis. As causas da DORT/LER, representam uma associação de fatores biomecânicos, psicossociais e organizacionais que irão repercutir de maneira única sobre cada trabalhador.

2.1.4 Fatores individuais

Geralmente, os fatores de risco se apresentam associados a fatores individuais, comprometendo ainda mais o trabalhador, agravando ainda mais a situação de trabalho e dificultando o diagnóstico e tratamento da doença.

Quanto à idade e sexo, dados do Ambulatório de LER/DORT do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da faculdade de Medicina da

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Universidade de São Paulo, entre o período de março de 1993 à dezembro de 1998, mostraram que 91,8% dos pacientes com diagnóstico de LER/DORT eram do sexo feminino com uma média de idade de 38,5 anos. Esta evidência também é confirmada no Centro de Referência em Saúde do Trabalhador da Secretária de Saúde do Estado de São Paulo (CEREST/SP), onde em uma amostra de 620 pacientes atendidos, entre 1990 e 1995, 87% eram mulheres, com faixa etária predominante entre 26 a 35 anos (SETTIMI et al, 1995 apud MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2000).

No Núcleo de Referência em Doenças Ocupacionais da Previdência Social de Belo Horizonte (NUSAT), mais de 70% dos casos atendidos são de mulheres entre 30 e 39 anos de idade (CUNHA et al, 1992). Estes dados remetem a um questionamento à respeito da alta incidência de DORT/LER no sexo feminino, o que segundo a literatura existente se atribui principalmente à fatores hormonais, de composição corporal, a fatores psicossociais e a dupla jornada de trabalho.

De acordo com Sommerich et al (1993), além dos fatores já citados, os autores relacionam fatores não-ocupacionais, como o pouco tempo de lazer e outras características demográficas (estado civil e filhos), e hábitos pessoais como prática de esportes.

Alguns indivíduos apresentam uma propensão maior para desenvolver DORT/LER por serem portadores de condições predisponentes tais como diabetes, artrite reumatóide, gota, hipotirioidismo, colagenoses vasculares, tuberculose e infecções por fungos (MIRANDA E DIAS, 2001). Sabe-se que os aspectos referentes a características pessoais e da qualidade de vida do trabalhador também repercutem na saúde/doença do mesmo, sendo um fator de relevância e que deve ser levado em conta durante o tratamento do paciente.

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2.1.5 Fatores biomecânicos

As principais causas da DORT/LER mencionadas, são as relacionadas aos fatores biomecânicos, que levariam aos “micro” traumas nos tecidos, que seriam acumulados ao longo do tempo e produziriam problemas mais sérios. Estes fatores associados às questões psicossociais desempenham papel importante na problemática da doença ocupacional (SMITH E CARAYIN, 1996 apud SMITH, 1996).

A repetitividade é sem dúvida o fator de risco mais freqüentemente referido, mas não é o único fator biomecânico determinante, pois às DORT/LER podem ocorrer devido sobrecargas e manutenção de posturas estáticas por tempo prolongado (KUORINKA, 1995).

Segundo Santos Filho & Barreto (1998), fatores biomecânicos como contrações musculares prolongadas e posturas inadequadas, freqüência e força empregada no movimento repetitivo, inadequações do posto de trabalho, desenho e manutenção dos equipamentos e tensão muscular associada ao estresse são fatores associados ao surgimento e agravamento dos quadros de DORT/LER.

Segundo Smith (1996), quanto maior o esforço físico, maior o risco de desenvolver DORT/LER. A duração da exposição pode ser classificada em ações diárias, longos períodos de ações semelhantes e exposições devido à profissão, desencadeando um ciclo evolutivo de fadiga muscular localizada, fadiga geral sistêmica e micro lesões nos músculos, tendões e ligamentos.

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2.1.6 Fatores Psicossociais

Os fatores psicossociais do trabalho compreendem as percepções subjetivas que o trabalhador tem do trabalho. A percepção psicológica que o indivíduo tem das exigências do trabalho seria resultado das características físicas da carga de trabalho, da personalidade do indivíduo, das experiências anteriores e da situação social do trabalho (SANTOS FILHO E BARRETO, 1998).

Há várias maneiras pelas quais os fatores psicossociais podem aumentar o risco de DORT/LER. Ao nível pessoal, através de tensão no trabalho, a natureza das atividades, do treinamento, da disponibilidade de relações de assistência e supervisão podem afetar a exposição, a satisfação, a atitude e o comportamento do indivíduo. Ao nível organizacional, as políticas e os procedimentos da companhia podem afetar a exposição, por meio da definição de projetos de cargos, através de especificação da duração do tempo gasto em atividades específicas, estabelecendo-se os ciclos de pausas, definindo-se o grau de pressão no trabalho e estabelecendo-se o clima psicológico em relação à socialização, à carreira e à segurança no emprego. Esses fatores poderão influenciar à disposição psicológica afetando a motivação, a atitude, o comportamento e, principalmente, a saúde do trabalhador, aumentando a suscetibilidade para desenvolver as DORT/LER, ou a sensibilidade à dor e ao desconforto (SMITH, 1996).

Ainda, segundo Smith (1996), os fatores pessoais aumentam a suscetibilidade à DORT/LER. Isso inclui os danos musculoesqueléticos anteriores, os túneis do carpo mais estreitos, o sexo e o uso de certos tratamentos com hormônios, tais como estrogênio. Além disso, algumas pessoas são mais propensas a esse tipo de problema devido à sua personalidade e ao seu comportamento na execução do seu trabalho.

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Fatores de natureza psicossocial como pressão excessiva no trabalho, ambiente tenso, problemas de relacionamento e questões relativas à carreira, carga, ritmo, segurança e ambiente social, irão influenciar o aparecimento das DORT/LER (MERLO et al, 2001).

O estresse constitui-se num conjunto de respostas inerentes a cada indivíduo, frente aos estímulos externos e internos, exigindo que o organismo humano se adapte a estes estímulos, através de reações de alarme e de tensão. O estresse constitui-se em um componente importante no processo de adoecimento por doença ocupacional, bem como na ocorrência de acidente e incidentes de trabalho.

Segundo Antonalia (2001), o estresse pode ser definido como “ qualquer situação de tensão aguda ou crônica que produz uma mudança no comportamento físico e no estado emocional do indivíduo, sendo uma resposta psicofisiológica que pode ser positiva ou negativa no organismo”.

O mesmo autor discorre à respeito de estresse ocupacional como:

Um estado em que ocorre um desgaste anormal da máquina humana e/ou diminuição da capacidade de trabalho, ocasionados por incapacidade prolongada do indivíduo tolerar, superar ou se adaptar às exigências de natureza psíquica existentes no seu ambiente de trabalho.

Desta forma, evidencia-se que o estresse juntamente com os demais fatores de risco, exerce influência direta no processo de adoecimento por DORT/LER, sendo que o mesmo vêm se tornando um problema de saúde pública, acometendo grande parte da população e sobrecarregando o sistema de saúde, principalmente pelas complicações que provoca.

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2.1.7 Fatores organizacionais

Os fatores organizacionais representam importantes fatores de risco para o desenvolvimento de doenças ocupacionais. Entre eles, pode-se citar: ritmo de trabalho, pausas, hierarquia, horas-extras, estímulo à produção, rotatividade de mão-de-obra, relacionamento interpessoal, falta de treinamento, supervisão inadequada, pressões de tempo e produtividade.

Dejours (1980), refere-se a forma com que o trabalho é organizado, da seguinte maneira:

Para transformar um trabalho fatigante em um trabalho equilibrante precisa se flexibilizar a organização do trabalho, de modo a deixar maior liberdade ao trabalhador para rearranjar seu modo operatório e para encontrar os gestos que são capazes de lhe fornecer prazer, isto é, uma expansão ou uma diminuição de sua carga psíquica.

Faz-se necessário, uma organização do trabalho que respeite as aptidões e as necessidades individuais, possibilitando ao trabalhador o julgamento e a percepção de seu trabalho de maneira prazerosa.

As evidências epidemiológicas apontam para uma associação de fatores causais que interagem nos processos agudos e na cronificação da DORT/LER. É difícil quantificar a parcela de cada fator na determinação da doença, visto que ocorre a interação de vários fatores associados à história de vida de cada trabalhador (MERLO et al, 2001). Contudo, verifica-se que os fatores relacionados à organização do trabalho juntamente com às características psicossociais tornam-se fatores de importância no agravamento da doença.

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2.1.8 Fatores ambientais

As condições ambientais presentes no local de trabalho interferem diretamente sobre o conforto do trabalhador ao executar sua tarefa, contribuindo no aparecimento da doença ou em agravos à saúde, podendo influenciar na qualidade da tarefa a ser realizada (COUTO, 1995).

Sorock & Courteney (1996) apud Silva (2001), relatam que temperaturas elevadas no ambiente de trabalho podem provocar sudação excessiva, cardiopatias, prostração térmica, cãibras, fadigas, entre outros. Da mesma forma que, temperaturas muito baixas, além de desconfortáveis, exigem uma maior atividade cardiovascular, provocando a diminuição da sensibilidade tátil, podendo levar a resfriados; redução da capacidade motora, tornando os movimentos mais lentos. Esses fatores irão favorecer a ocorrência de incidentes ou acidentes de trabalho.

Segundo Smith (1996), os ambientes de trabalho frios podem aumentar o risco de fadiga muscular e de distorções nos processos neuro-sensoriais. Ambientes quentes, também podem levar à um aumento da fadiga muscular e outros fatores ambientais como vibrações podem aumentar os riscos de DORT/LER.

A temperatura e a umidade ambiental influem diretamente no desempenho do trabalho humano. A sensação térmica depende não só da temperatura externa, mas também do grau de umidade do ar e da velocidade do vento. A partir destas variáveis, determina-se a “zona de conforto térmico”, situada entre as temperaturas efetivas de 20 a 24° C, com umidade relativa de 40 a 60%, com uma velocidade do ar moderada, da ordem de 0,2 m/s, para o organismo adaptado ao calor. Em organismo adaptado ao frio, essa zona de conforto situa-se entre 18 e 22° C para a mesma taxa de umidade e velocidade do vento. A variação não deve ser superior a 4° C (IIDA, 1998).

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A presença de ruídos elevados (acima de 85db), no ambiente de trabalho industrial podem perturbar e com o tempo comprometer a audição do trabalhador (NR-15). O primeiro sintoma é a dificuldade cada vez maior para entender a fala em ambientes barulhentos, provocando interferência nas comunicações e redução da concentração, aumentando a tensão psicológica e diminuindo o nível de atenção (DUL & WEERDMEESTER, 2000). Este fator poderá influenciar no aparecimento de incidentes ou acidentes de trabalho, bem como de DORT/LER, pois reflete um agente provocador do estresse, tensão no trabalho, além de outras doenças psicossomáticas.

Outro fator ambiental importante diz respeito a iluminação do local de trabalho, fator este que interfere no mecanismo fisiológico da visão e também na musculatura que comanda os olhos. A iluminação inadequada no local de trabalho poderá levar a fadiga visual, ocasionando tensão, desconforto, lacrimejamento excessivo, dores de cabaça, náuseas, depressão e irritabilidade emocional (IIDA, 1998).

Nos trabalhos realizados a céu aberto, é obrigatória a existência de abrigos, ainda que rústicos, capazes de proteger os trabalhadores contra intempéries (NR-21). Da mesma forma que se faz necessário medidas especiais de proteção aos trabalhadores contra a insolação excessiva, o calor, o frio, a umidade, os ventos e a contaminação proveniente do ar e do local em que a atividade está sendo desenvolvida.

2.2 Trabalho e Carga de trabalho

Segundo Schuler (1995) apud More (1997), o trabalho humano é visto como uma ação que leva à transformações físicas e mentais do trabalhador, podendo ser visto de forma benéfica quando realizado de maneira saudável e com prazer e

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maléfico, quando o trabalhador fica exposto à condições insalubres e a sobrecarga física e/ou psíquica em seu local de trabalho.

O trabalho é uma atividade inerente ao indivíduo enquanto ser social, visto que o homem passa grande parte de sua vida dentro do ambiente de trabalho, estando sujeito a diversos tipos de intercorrências, que poderão repercutir negativamente ou positivamente, sobre sua saúde física e mental.

Segundo Dejours (1993), “o trabalho pode ser um fator de deterioração, de envelhecimento e de doenças graves, mas pode, também, constituir-se em um fator de equilíbrio e de desenvolvimento”. O resultado prazer ou sofrimento no trabalho estará na dependência do trabalhador encontrar um trabalho equilibrado, fonte de realização profissional ou um trabalho fatigante, fonte de insatisfação, desmotivação, estresse e de doenças ocupacionais.

O comportamento do homem no trabalho está em constante evolução e diretamente ligado à natureza e seus meios de produção. Este comportamento pode ser manifestado por insatisfação, quando relacionado com sofrimento físico e/ou psíquico, e à satisfação e sucesso, quando desenvolvido em condições saudáveis.

Vários fatores estão ligados ao trabalho e são importantes no estabelecimento de condições de trabalho favoráveis como: posto de trabalho, ambiente de trabalho, questões organizacionais, tarefa prescrita, jornada, relações interpessoais, valorização do trabalho, interação com chefia, entre outros (MORE,1997). Estes fatores influenciarão o comportamento do homem frente ao trabalho, que poderá ser manifestado por insatisfações induzindo ao fracasso, quando relacionado com penalizações e sofrimento, ou prazeroso, induzindo ao sucesso, se desenvolvido em condições satisfatórias, que não agridam a integridade física e psíquica do trabalhador.

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A situação de trabalho compreende um sistema interrelacionado, entre a atividade prescrita (às exigências econômicas, sócio-técnicas e organizacionais, caracterizadas na tarefa) que determinam os comportamentos do homem no desenvolvimento de suas atividades laborais e, atividade realizada efetivamente (onde serão vistos os resultados da produção e da saúde do trabalhador).

Segundo Ferreira et al (2001), no campo da ergonomia, o trabalho é visto como uma interação entre o sujeito e sua atividade de trabalho, resultando em um processo de interpretação, transformação e releitura do que foi prescrito pela organização do trabalho. A forma como o trabalho é realizado permite a percepção da carga de trabalho envolvida.

Segundo Fachinni, (1994) apud Greco et al, (1995), as cargas de trabalho são definidas como:

Exigências ou demandas psicobiológicas do processo de trabalho, gerando ao longo do tempo as particularidades do desgaste do trabalhador. Em outras palavras, as cargas são mediadoras entre o processo de trabalho e o desgaste psicobiológico.

As cargas de trabalho podem ser agrupadas segundo sua característica, em cargas que têm materialidade externa e que se modificam na interação com o corpo, como as físicas, químicas, biológicas e mecânicas e aquelas que adquirem materialidade no corpo humano e se expressam internamente por meio dele, como as fisiológicas e psíquicas.

Segundo Dejours (1980), costuma-se separar a carga de trabalho em carga física e carga psíquica. A noção de carga psíquica é subjetiva e qualitativa, pois reflete o

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prazer, a satisfação, a frustração, a agressividade e o comportamento do trabalhador, frente ao trabalho.

Facchini (1994) apud Greco (1995), refere-se a carga psíquica como aquelas que derivam principalmente dos elementos do processo de trabalho que são fonte de estresse, como nível da organização e divisão do trabalho. As cargas psíquicas se relacionam com todos os elementos do processo de trabalho, sendo influenciada pelas demais cargas de trabalho envolvidas.

Segundo Rio & Pires (2001), a carga de trabalho representa a quantidade de exigências que são impostas sobre o trabalhador. Essa carga é constituída por um conjunto de exigências que atuam conjuntamente, mas que didaticamente, podem ser sub-divididas em carga sensorial, carga cognitiva, carga afetiva, carga visual e carga musculoesquelética. Adequar a carga de trabalho às características individuais do trabalhador é fundamental, e daí derivam as principais contribuições da ergonomia no sentido de promover melhorias nas condições de saúde e produtividade das pessoas e organizações.

As cargas de trabalho estão presente no processo de trabalho e interagem com o indivíduo, podendo gerar no trabalhador algum tipo de dano. Por exemplo: trabalho realizado em condições ambientais inadequadas, sobrecarga mecânica e fisiológica, condições de trabalho insalubres, problemas organizacionais, estresse, entre outras.

2.3 Acidente de trabalho

O problema dos acidentes e das doenças profissionais acompanha o desenvolvimento das atividades do homem através dos séculos, sempre cercado de novos e diferentes riscos que podem afetar a vida e a saúde do trabalhador.

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Apesar disto, foi com o advento da revolução industrial que os riscos com acidentes de trabalho e as doenças profissionais se alastraram, chamando atenção para uma questão importante e até então ignorada: a prevenção.

O acidente do trabalho está intimamente relacionado ao trabalho, ao ambiente em que o mesmo é desenvolvido e as exigências psíquicas envolvidas. O acidente acontece em decorrência da execução de uma determinada tarefa em um ambiente determinado, envolvendo fatores emocionais individuais e as condições de trabalho encontradas. Também está relacionado com os aspectos sociais, onde estatísticas evidenciam que no Brasil os trabalhadores mais atingidos são os da mão-de-obra não qualificada (MORE, 1997).

Segundo Leplat (1985), “ a análise dos acidentes depende da relevância da análise do trabalho sobre o qual se baseia”. Para que isto ocorra faz-se necessário um estudo detalhado e crítico do local de trabalho, das condições de trabalho envolvidas com a atividade e dos incidentes verificados.

O artigo 19 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 do Plano de Benefícios da Previdência Social conceitua legalmente acidente de trabalho da seguinte forma:

Acidente de Trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII (produtor, parceiro, meeiro e arrendatário rural, pescador artesanal e assemelhados) do artigo 11 desta Lei, provocando a morte ou perda ou redução, permanente ou temporária da capacidade para o trabalho, sendo a empresa responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador (GONÇALVES, 2000).

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More (1997), evidencia que este conceito de acidente de trabalho, favorece apenas os mecanismos de compensação e indenização, não havendo preocupação com a prevenção. As doenças adquiridas na execução do trabalho, chamadas de doenças profissionais e doenças de trabalho, também deveriam ser categorizadas como acidente de trabalho, uma vez que podem levar às mesmas conseqüências do acidente, como incapacitação laborativa e afastamento do trabalho. A diferença reside no fato do acidente ser um fato súbito e quase sempre violento de conseqüências externas e imediatas, impossibilitando o trabalhador temporariamente ou definitivamente, de sua atividade. Já as doenças do trabalho e profissional ocorrem de forma lenta e progressiva, atingindo internamente o trabalhador.

Verifica-se que o conceito legal não contempla todas as situações que caracterizariam um acidente de trabalho, se restringindo apenas às hipóteses de ocorrência de lesões e/ou perturbações de ordem funcional ou mental. O conceito prevencionista de acidente de trabalho contempla de forma mais abrangente as situações de acidente de trabalho.

A doença profissional pode ser entendida como aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade, sendo que todos os empregados que desenvolvem uma mesma atividade comumente estão sujeitos a contraí-la, pois os riscos ambientais são inerentes à atividade em si. Já a doença de trabalho pode ser definida como aquela adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado (GONÇALVES, 2000).

Portanto, na categoria das doenças relacionada ao trabalho, são enquadradas as afecções nas quais não se identifica apenas um agente causal, mas vários, entre os quais os laborais, que irão interagir, favorecendo o adoecimento do trabalhador.

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Segundo Gonçalves (2000), acidente de trabalho sob a visão prevencionista pode ser definido como a ocorrência não programada, inesperada ou não, que interrompe ou interfere no processo normal de uma atividade, ocasionando perda de tempo útil e/ou lesões nos trabalhadores, e/ou danos materiais.

Segundo Chapanis (1962) apud More (1997), acidente de trabalho pode ser conceituado como:

Um evento inesperado e indesejável que surge diretamente da situação de trabalho, isto é, de um equipamento defeituoso ou de um desempenho inadequado de uma pessoa. Isto pode ou não causar danos pessoais e danificar o equipamento ou propriedade. Acidentes, entretanto, sempre interrompem a rotina normal do trabalho e estão associados com um aumento no atraso de tempo ou erro.

De acordo com as definições anteriores, constata-se que o acidente de trabalho é causado por uma ação nociva, que poderá influir na integridade física e/ou psíquica do trabalhador, podendo provocar uma incapacidade laboral temporária, permanente ou em casos mais graves a morte do trabalhador, representando, dessa forma, um problema importante na medida em que resulta em perdas significaticas, tanto de vidas humanas como econômicas.

Os acidentes geralmente resultam de interações inadequadas entre o homem, a tarefa e o seu ambiente. Heinrich (1959) apud Iida (1998), elaborou o chamado “dominó” do acidente, relacionado com cinco eventos que culminariam em acidente: a personalidade, falhas humanas, condições inseguras, acidente e lesão. Segundo esta teoria a prevenção deveria ser feita pela remoção das causas do acidente, para assim,

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evitar-se a propagação seqüencial dos eventos. A teoria do “dominó” evidência a influência dos fatores individuais na ocorrência dos acidentes de trabalho.

Segundo Iida (1998), os modelos fatoriais são mais indicados para explicar a ocorrência de acidentes, pois não existiria uma seqüência lógica ou temporal de eventos, mas um conjunto de fatores que interagindo continuamente, podem ocasionar um acidente ou incidente. Vários fatores influenciam a ocorrência dos acidentes ou incidentes como o tipo de tarefa, as máquinas e ferramentas utilizadas, o trabalhador, aspectos psicológicos, estrutura organizacional e o ambiente físico.

As causas dos acidentes de trabalho podem ser resumidas em duas categorias: condições inseguras e atos inseguros. As condições inseguras seriam as deficiências, defeitos ou irregularidades técnicas nas instalações físicas, máquinas ou equipamentos, os quais presentes no ambiente de trabalho podem ocasionar acidentes. Os atos inseguros por sua vez, compreendem as atitudes, ações ou comportamento do trabalhador que podem colocar em risco a sua saúde e/ou integridade física, ou de outros trabalhadores. Nos atos inseguros a causa do acidente reside no fator humano, mesmo que o trabalho apresente condições seguras para o trabalhador desempenhar sua tarefa (GONÇALVES, 2000).

O acidente de trabalho ou incidente surge geralmente de uma situação de deficiência funcional suscetível de aparecer durante a execução da tarefa pertinente ao trabalho (MORE, 1997). Tornam-se necessários estudos aprofundados, não apenas sobre acidentes de trabalho, mas também é fundamental a pesquisa dos incidentes que poderão levar a um acidente, e desta forma atuar de forma preventiva, pois eliminando-se os incidentes, os acidentes terão menor probabilidade de ocorrer.

Segundo Dwyer (1989), os métodos atuais de análise dos acidentes de trabalho e as tentativas de reduzi-los não têm sido muito eficazes, isso se deve a falta de uma

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conceitualização teórica adequada das causas dos acidentes do trabalho, a falta de análises detalhadas do local de trabalho e a ineficácia das técnicas preventivas predominantes. A redução de acidentes ou incidentes em níveis significativos, só será alcançada adotando-se um programa preventivo, com atuação em longo prazo.

A ergonomia oferece, através da análise ergonômica do trabalho, um instrumento importante de estudo dos erros humanos, relacionando-os à ocorrência dos acidentes de trabalho. Para tanto se faz necessário o estudo minucioso do trabalho real, da atividade do trabalhador e dos comportamentos utilizados para realização da tarefa prescrita.

Segundo Wisner (1994), o trabalho real é o verdadeiro trabalho, caracterizado por produções psíquicas que a atividade determina e portanto o que deve receber atenção e estudo. Uma vez que o trabalho real, é característico de cada trabalhador e moldado conforme o perfil de cada funcionário. A tarefa pode ser a mesma mas a realização da atividade é individualizada.

Segundo Iida (1998), a prevenção inclui um programa de segurança do trabalho com fixação clara de objetivos e metas a serem alcançadas, definição de uma estrutura e uma organização administrativa para o programa, envolvimento de todos os níveis da empresa e investigação continua dos acidentes com elaboração de registros, relatórios e análises estatísticas. Segundo o autor, as organizações que estimulam a participação dos trabalhadores nas decisões, melhoram a motivação, favorecem a redução de acidentes e reforçam a execução de atitudes seguras. Este fato é visto ao reverso em organizações autoritárias, que usam punição para com os trabalhadores que cometem falhas, apresentando um índice de acidentes bem mais acentuado.

Verifica-se a necessidade de um estudo profundo das condições de trabalho, sob a ótica da ergonomia da atividade do trabalhador e dos incidentes ocorridos, no sentido

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de se apurar os fatores envolvidos na gênese dos acidentes, buscando a prevenção do mesmo e proporcionando ao trabalhador condições adequadas de trabalho, visando a manutenção de sua saúde física e mental.

2.4 Ergonomia

2.4.1 Contexto histórico

A ergonomia desenvolveu-se durante a Segunda Guerra Mundial quando pela primeira vez houve uma conjugação de esforços entre a tecnologia e as ciências humanas. Fisiologistas, psicólogos, antropólogos, médicos e engenheiros trabalharam juntos para resolver os problemas causados pela operação de equipamentos militares complexos. A solução encontrada foi simplificar os equipamentos, para que um número maior de soldados pudesse utilizá-los. Como conseqüência, vários deles foram adaptados às características psicofisiológicas, antropométricas e biomecânicas do homem, surgindo os primeiros estudos relacionados à Ergonomia (SAAD,1981).

Conceitos ergonômicos foram aplicados na indústria automobilística a partir de 1970, na tentativa de tornar mais confortáveis e funcionais o interior de seus veículos como forma de transmitir a sensação de bem estar ao seu condutor (WEERDMEESTER & DUL, 2000). Esta primeira geração da ergonomia enfocou o projeto das interfaces homem-máquina, sendo que a grande maioria das pesquisas enfocava as características físicas do homem e a aplicação destes conhecimentos no projeto de máquinas e equipamentos.

Inicialmente, as aplicações da ergonomia se restringiram a indústria e ao setor militar e espacial. Atualmente, o uso da ergonomia se expandiu e se faz necessária, em

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todos os ambientes de trabalho e na vida diária do trabalhador. Isso exigiu novos conhecimentos sobre aspectos até então pouco desenvolvidos, como o estudo das características de trabalho de mulheres, de pessoas idosas e de deficientes físicos (IIDA, 1998).

Num segundo momento evolutivo da ergonomia verifica-se uma mudança na preocupação central do aspecto do homem com o trabalho. Deixa-se de ter como ponto principal apenas os aspectos físicos e perceptuais do trabalho e inicia-se a preocupação com a natureza cognitiva envolvida na tarefa, aliada aos aspectos físicos e a inteligência artificial. Este segundo estágio é considerado, o estágio da “tecnologia de interface usuário-sistema” (BEZERRA,1998).

A terceira geração da ergonomia, à macroergonomia surge em resposta a importantes mudanças decorrentes da organização do trabalho, ocasionadas pelo desenvolvimento tecnológico, devido mudanças demográficas (aumento da idade média da população e a extensão da vida produtiva dos trabalhadores levando a um contexto de trabalhadores mais experientes, exigindo organizações menos formalizadas e processos de tomada de decisão mais descentralizados), mudanças de valores e aumento da competitividade, decorrente da organização do trabalho e pelo desenvolvimento tecnológico, sendo chamada de interface organização-homem-máquina (HENDRIK, 1987 apud DUTRA, 2001).

Num quarto momento evolutivo, pode-se caracterizar a ergonomia participativa como uma nova tecnologia que requer que os usuários finais estejam vitalmente envolvidos no seu desenvolvimento e implementação. Assim, evidencia-se que a ergonomia não se preocupa apenas em adaptar o trabalho ao homem, mas de estudar toda a organização do trabalho e, principalmente, a participação do trabalhador inserido no contexto participativo para a resolução de problemas existentes. Tornando

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o homem o foco central dos estudos visando garantir a qualidade de vida do trabalhador.

A ergonomia aplica conceitos de fisiologia, anatomia e psicologia na adaptação do ambiente e das condições de trabalho ao ser humano, proporcionando a integração e harmonia entre o indivíduo e seu local de trabalho, gerando conforto total para o empregado e aumento de produtividade para a empresa (GAIGHER & MELO, 2001).

Os preceitos ergonômicos são praticados desde o surgimento do homem, quando ele buscava adaptar ferramentas e utensílios para sua sobrevivência. A ergonomia, assim como o homem, evoluiu muito, e atualmente ela pode ser entendida como a ciência que estuda a interação homem-trabalho, visando propiciar uma solicitação adequada dos trabalhadores, de modo a se alcançar uma otimização do sistema de trabalho, respeitando-se, porém, as características psicofisiológicas individuais daqueles, e prevenindo o desgaste prematuro de suas potencialidades profissionais. A adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, deve ser realizada através da AET, respeitando as condições estabelecidas na NR-17, que trata da ergonomia, sendo responsabilidade do empregador (GONÇALVES, 2000).

A NR- 17, visa estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores de modo a proporcionar o máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente (MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2001).

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2.4.2 Conceitualização da Ergonomia

Segundo Iida (1998), a ergonomia é o estudo da adaptação do trabalho ao homem, abrangendo não apenas máquinas e equipamentos utilizados para transformar os materiais, mas também toda a situação em que ocorre o relacionamento entre o homem e seu trabalho. Os objetivos práticos da ergonomia são a segurança, satisfação e o bem-estar dos trabalhadores no seu relacionamento com sistemas produtivos. A melhora da produtividade e a eficiência será conseqüência deste processo.

A ergonomia está diretamente relacionada com a organização do trabalho, pois seu maior objetivo é o de proteger a vida e a dignidade do homem em decorrência da necessidade do mesmo de auto-adaptação aos sistemas de produção em constante evolução (MORE, 1997).

Segundo Baixo (1994) apud More (1997), o objetivo de pesquisa da ergonomia é a caracterização do homem em atividade profissional, estudando o funcionamento do indivíduo exposto à condições de trabalho constrangedoras e a atividade profissional em relação ao comportamento do trabalhador. Para o autor, as pesquisas em ergonomia devem avaliar o fator físico, os meios de produção, o ambiente de trabalho associado as questões cognitivas, proporcionando, desta forma, um aprendizado global e completo do homem em sua situação de trabalho.

Segundo Wisner (1995), ergonomia é um conjunto de conhecimentos científicos relativos ao homem e necessários para conceber ferramentas, máquinas e dispositivos que possam ser utilizados com o máximo de conforto, de segurança e de eficiência. A Ergonomia não deve ser vista como um simples recurso, mas como uma maneira de

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entender o trabalhador dentro do contexto do trabalho, respeitando todos os aspectos envolvidos para a realização da tarefa.

Segundo Rio & Pires (2001), os conceitos de ergonomia predominantes em determinadas organizações e sociedades, mais ainda as práticas ergonômicas, estão intimamente relacionados com as representações que são feitas do trabalho, com as formas com que ele é percebido e efetivamente valorizado.

Do ponto de vista da ergonomia, as atividades do homem no trabalho podem ser analisadas segundo um modelo antropocêntrico (considerando o homem como centro), dentro de um sistema homem-tarefa, com a compreensão de duas componentes principais, de um lado o homem e, do outro lado, as tarefas que ele deve efetuar (SANTOS E FIALHO, 1995).

Os autores citados anteriormente evidenciam os principais condicionantes que afetam o desenvolvimento das atividades do homem no trabalho, como: má concepção dos materiais do trabalho, exigências em termos de trabalho muscular, características ambientais, condicionantes temporais, organização do trabalho, ambiente psicossociológico e condições de vida extra profissional.

Fazer ergonomia não é simplesmente ajustar mobiliário, ou preocupar-se apenas com a parte física do trabalhador. É muito mais abrangente, sendo necessário o entendimento da relação do homem com o seu trabalho em um contexto amplo, e para tanto, faz-se necessário pensar como quem faz a atividade, assumindo sua postura física e cognitiva e dessa forma captar e compreender as decisões do trabalhador.

Segundo Dul e Weerdmeester (2000), a ergonomia pode contribuir para solucionar um grande número de problemas sociais relacionados com a saúde, segurança, conforto e eficiência. Muitos acidentes podem ser causados por erros humanos, e analisando esses acidentes pode-se verificar que a maioria é devido ao

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relacionamento inadequado entre os operadores e suas tarefas. A probabilidade de ocorrência dos acidentes pode ser reduzida quando se consideram adequadamente as capacidades e limitações humanas durante o trabalho e de seu ambiente. E, também, com a pesquisa e tratamento adequado dos incidentes, no sentido de buscar a prevenção de erros, evitando, desta forma os acidentes.

A ergonomia atravessa hoje grandes questionamentos e ajustes metodológicos para acompanhar o nível da evolução do trabalho humano, principalmente nas últimas duas décadas. Primeiramente, se coloca a necessidade em se fazer um trabalho preventivo considerando-se o contexto das situações de trabalho, abordando-se o trabalho dentro de uma escala macroergonômica e sobretudo, atuando-se eficientemente em sistemas sócio-técnicos em toda a sua complexidade, abandonando os paradigmas mecanicistas e simplificadores que regeram a ciência nas últimas décadas, advinda do Taylorismo e do Fordismo. Buscando, dessa forma, acompanhar a evolução da organização do trabalho e das inovações tecnológicas, procurando adotar uma abordagem mais próxima e ampla dos problemas relacionados ao trabalho (ENGESTRÖN & RASMUSSEN, 2001).

Atualmente, tem-se ouvido muito a respeito de macroergonomia e antropotecnologia. Segundo Brown (1995), a macroergonomia é o campo que enfatiza a interação entre os contextos organizacional e psicossocial de um sistema e o projeto, implementação e uso de novas tecnologias. Dessa forma evidencia-se a preocupação da macroergonomia com a questão da organização do trabalho. Neste sentido, a abordagem macroergonômica reconhece que os fatores organizacionais, sociais e psicológicos do trabalho têm importância, juntamente com os fatores físicos da atividade.

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Uma concepção mais abrangente nós remete a antropotecnologia, superando a visão macroergonomica, pois além da questão organizacional, preocupa-se com previsões futuras, partindo de um diagnóstico, para o prognóstico de uma situação futura. Em sua evolução conceitual, verifica-se que a ergonomia, hoje, se constitui numa ferramenta de gestão empresarial, pois de nada adianta a certificação de processos e produtos, se não for possível certificar sentimentos, crenças, hábitos, costumes, isto é, certificar o homem. Uma das formas de compatibilizar os sistemas técnico e social, é evidentemente, o que preconiza a visão antropocêntrica. A antropocentricidade da ergonomia, favorece não só mudanças organizacionais, como também alavanca mudanças no conceito de vida no trabalho, devido preocupações com a participação do trabalhador, com a liberdade e a valorização do saber fazer (BEZERRA, 1998).

Segundo More (1997), a ergonomia está diretamente relacionada com a organização do trabalho, passando a ser objeto de estudo a partir da necessidade de proteger a vida e a dignidade do homem em seu ambiente de trabalho, devido as crescentes mudanças dos processos de produção. Atualmente a ergonomia não preocupa-se apenas em “adaptar o trabalho ao homem”, através do estudo da máquina, do ambiente, da tarefa e do local de trabalho, mas há à preocupação em estudar à organização do trabalho, através da ergonomia participativa, com a participação do trabalhador no reconhecimento e resolução dos problemas existentes no local de trabalho.

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2.4 Análise Ergonômica do Trabalho

Segundo Wisner (1996), “a Análise ergonômica do Trabalho (AET), é a descrição exaustiva das atividades de trabalho de um determinado indivíduo que interage com um determinado dispositivo técnico, de complexidade mais ou menos elevada.” Para tanto, o ergonomista deve observar todos os comportamentos deste indivíduo, quer sejam eles sensório-motores, perceptivos, cognitivos ou de comunicação, que, por sua vez, serão reagrupados e formarão a história deste indivíduo. Somente, vivenciando a rotina do trabalhador e o modo como ele reage ao meio, será possível, realizar uma AET que realmente responda a realidade do trabalhador. Para tanto, todas as atividades desenvolvidas pelo trabalhador devem ser observadas.

Por meio da análise ergonômica do trabalho é possível evidenciar os pontos críticos do trabalho, através do estudo da atividade real dos trabalhadores. A partir daí, se poderá identificar os riscos e suas características moduladoras, que são definidas pela intensidade, freqüência e duração da atividade (SIMONEAU, 1996).

Segundo Montmollin (1990) a ergonomia, por meio da AET, permite analisar com o máximo de objetividade o trabalho humano, a fim que se possa tirar conclusões que permitam melhorar a produção e, simultaneamente, diminuir a fadiga e os acidentes. Através da atuação sobre os dispositivos técnicos, sobre a atividade do trabalhador e sobre as condições de trabalho.

A AET compreende cinco etapas distintas: análise da demanda e proposta de contrato, análise da tarefa, análise das atividades e da situação de trabalho e restituição dos resultados, recomendações ergonômicas e validação da intervenção e eficiência

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das recomendações (WISNER, 1995). A finalidade principal da AET é a de melhorar as condições de trabalho, dentro de limites considerados aceitáveis para a produção.

A seguir serão mais detalhadas as etapas da AET.

2.5.1 Análise da demanda

Segundo Guérin et al (2001), a ação ergonômica decorre de uma demanda e essa demanda poderá advir de origens diferentes como as demandas formuladas na origem de um projeto de concepção, visando a transformação profunda da atividade dos trabalhadores e as demandas formuladas num quadro de evolução permanente, objetivando resolver os problemas de forma progressiva acompanhando o decorrer do processo de trabalho.

Ainda segundo, Guérin et al (2001), é importante ressaltar que o problemas expressos na demanda refletem geralmente apenas uma parte do problema de trabalho e que cabe ao ergonomista detectar a natureza de outros problemas potenciais envolvidos na situação analisada e que não apresentam-se explícitos na demanda inicial.

Segundo Santos e Fialho (1997), a demanda é o ponto de partida de qualquer pesquisa em ergonomia. A sua análise permite compreender a natureza e a dimensão dos problemas apresentados, assim como elaborar um plano de intervenção de como resolvê-los. Compreende a definição do problema e das hipóteses preliminares referentes a situação de trabalho a ser analisada, objetivando delimitar as condicionantes e as determinantes da situação de trabalho.

Os mesmos autores, comentam, ainda, que a demanda pode ter origem nos diversos atores sociais da empresa, direta ou indiretamente envolvidos pelos

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problemas ergonômicos existentes na situação de trabalho a ser analisado. Desta forma, a análise da demanda gerará as hipóteses preliminares do posto de trabalho a ser analisado.

2.5.2 Análise da tarefa

Montmollin (1990), define tarefa como um objetivo que o trabalhador tem que atingir. Trata-se dos procedimentos e dos meios de trabalho colocados à disposição do indivíduo, das características do ambiente físico e, também, das condições soció-organizacionais de trabalho.

Santos e Fialho (1997), definem tarefa como o que é prescrito para o trabalhador realizar e as condições ambientais, técnicas e organizacionais envolvidas, enfatizando que a tarefa consiste, basicamente, na análise das condições de trabalho da empresa. A tarefa é um objetivo imposto ou prescrito ao trabalhador, que deve ser atingido durante a realização de sua atividade de trabalho.

A análise da tarefa consiste em observar as condições dentro das quais o trabalhador desenvolve suas atividades de trabalho. Para analisar a tarefa, ou as condições de trabalho, deve-se primeiramente delimitar o sistema homem-tarefa a ser analisado, em seguida, deve-se proceder a uma descrição de todos os elementos que compõe este sistema que condicionam as exigências de trabalho, e, a posteriori, deve-se proceder a uma avaliação destas exigências (SANTOS, 1995).

A análise das condições de trabalho pressupõe um conhecimento global do processo de produção, sendo fundamental para a obtenção de uma melhor compreensão das relações existentes entre o trabalho de um setor e o realizado pelo conjunto da empresa (GUÉRIN et al, 2001). Do mesmo modo, que é importante para

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diferenciar o trabalho prescrito (realizado na análise da tarefa) do trabalho real (verificado durante a análise da atividade).

2.5.3 Análise da atividade

Segundo Santos e Fialho (1997), a atividade de trabalho ou atividade real é a mobilização total do indivíduo para realizar a tarefa que é prescrita. Constituindo o objeto principal da AET, pois reflete o trabalho real, realizado a partir do trabalho prescrito, caracterizando-se a maneira como o trabalhador organiza sua tarefa e os comportamentos assumidos em função de sua realidade de trabalho.

A atividade nada mais é que a resposta do indivíduo frente aos diversos aspectos existentes em seu local de trabalho, evidenciando seu comportamento físico, como gestos e posturas, e mental, caracterizada pelos processos cognitivos como, sensação, percepção, memorização, processamento de informações, tomada de decisão, raciocínio e ação.

Guérin et al (2001), descreve a atividade como:

À maneira pela qual o homem dispõe de seu corpo (seu sistema nervoso, órgãos sensoriais), sua personalidade e suas competências (formação, aprendizagem, experiência) para realizar uma tarefa. Também apresenta os aspectos físicos (atividade muscular estática e dinâmica, forças exercidas); componentes sensoriais (utilização dos órgãos visuais, auditivos, tácteis, olfativos, que recolhem as diversas informações e as transmitem ao sistema nervoso central); componentes mentais (correspondem às atividades ou processos de tomada e processamento de informações e que

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envolvem a identificação, análise e interpretação dos dados ambientais, das tarefas, de problemas na situação de trabalho e dos resultados da própria ação) e componentes relacionais (essenciais para a realização do trabalho, embora a organização formal do trabalho tenda a prescrever as tarefas como independentes entre si, minimizando ou desconhecendo a utilidade das relações sociais de trabalho).

A análise das atividades representa a ergonomia prática, pois é onde se pode observar a efetivação da tarefa e, desta forma, compreender o trabalho real em todas as suas instâncias (RIO e PIRES, 2001). É nesta fase que pode-se detectar as dificuldades do trabalhador e suas características físicas, sensoriais e cognitivas frente a atividade laboral.

Para a ergonomia, a discrepância existente entre a tarefa prescrita e a atividade dos sujeitos constitui uma dimensão crucial a ser explorada, buscando-se identificar, principalmente, o custo humano do trabalho. Tal custo é abordado em termos de carga de trabalho, cujos componentes físico, cognitivo e psíquico que lhe são inerentes, exigem do indivíduo um esforço permanente de adaptação e evidenciando a função mediadora da inter-relação trabalho-desgaste vivenciada por ele (LAURELL e NORIEGA, 1989; LEPLAT, 1996 apud FERREIRA E MENDES, 2001).

Segundo Ferreira e Mendes (2001), a atividade expressa os comportamentos do trabalhador, que tende a ser estruturada sob a forma de estratégias e modos operatórios, para responder às exigências físicas, cognitivas e psíquicas inerentes às tarefas e às condições de trabalho disponibilizadas pela organização. As influências deste contexto podem ser positivas ou negativas, dependendo da percepção da atividade pelo indivíduo, sendo responsáveis pela qualidade do trabalho e da

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realização e bem-estar psíquico do trabalhador. Os mesmos autores citam a atividade como um processo contínuo de regulação visando responder adequadamente aos objetivos da tarefa, às múltiplas determinações do contexto de trabalho, e à avaliação que o sujeito realiza de seu estado interno. A atividade seria vista como o resultado ao confronto do sujeito frente a carga de trabalho, determinando a percepção da atividade como significativa ou não.

2.5.4 Diagnóstico Ergonômico

A partir da análise ergonômica da situação de trabalho, uma síntese de resultados pode ser estabelecida, através de um diagnóstico em ergonomia (análise e tratamento de dados) e das conclusões da pesquisa (elaboração de um caderno de encargos de recomendações ergonômicas). Nesta etapa, confronta-se os aspectos evidenciados na análise da tarefa com os aspectos encontrados na análise das atividades, evidenciando-se as diversas alterações que irão caracterizar as patologias ergonômicas da situação de trabalho.

Segundo Santos e Fialho (1997), é fundamental a aplicação do princípio da globalidade, procurando-se analisar a atividade humana no trabalho do ponto de vista fisiológico e psicológico, dentro de uma visão holística da participação e do comportamento do homem no trabalho, para a posteriori definir um modelo operativo da situação de trabalho analisada. O diagnóstico ergonômico é, portanto, formulado a partir da correlação entre as diversas condicionantes ambientais e técnico-organizacionais do ambiente de trabalho e que irão definir o planejamento da intervenção ergonômica.

Referências

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