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Uma investigação sobre a memória de trabalho e desenvolvimento da leitura e escrita em crianças participantes do Projeto Acerta

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM. LÍGIA DE SOUZA LEITE MORAES. UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE A MEMÓRIA DE TRABALHO E O DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS PARTICIPANTES DO PROJETO ACERTA. NATAL 2017.

(2) LÍGIA DE SOUZA LEITE MORAES. UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE A MEMÓRIA DE TRABALHO E O DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS PARTICIPANTES DO PROJETO ACERTA. Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, para a obtenção do grau de Doutora em Letras.. Área de Aplicada.. concentração:. Orientadora: Weissheimer.. Prof.. Dra.. Linguística. Janaína. NATAL 2017. 2.

(3) Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA. Moraes, Ligia de Souza Leite. Uma investigação sobre a memória de trabalho e desenvolvimento da leitura e escrita em crianças participantes do Projeto Acerta / Ligia de Souza Leite Moraes. - 2018. 146f.: il. Tese (doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem. Natal, RN, 2017. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Janaína Weissheimer. 1. Memória de trabalho. 2. Aprendizagem de leitura. 3. Desenvolvimento da leitura. 4. Provinha Brasil. I. Weissheimer, Janaína. II. Título. RN/UF/BS-CCHLA. CDU 81'33:373.3. 3.

(4) LÍGIA DE SOUZA LEITE MORAES. UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE A MEMÓRIA DE TRABALHO E O DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E ESCRITA EM CRIANÇAS PARTICIPANTES DO PROJETO ACERTA. Tese submetida à comissão examinadora designada pelo colegiado do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito para obtenção do grau de Doutora em Letras na área de concentração de Linguística Aplicada.. Natal, 13 de dezembro de 2017.. BANCA EXAMINADORA. ________________________________________________ Professora Doutora Janaína Weissheimer Orientadora/Presidente. _________________________________________________ Professor Doutor Augusto Buchweitz (PUC-RS) Membro Externo. _________________________________________________ Professora Doutora Ângela Maria Chuvas Naschold Membro Externo. ________________________________________________ Professor Doutor Sidarta Ribeiro Membro Interno. ________________________________________________ Professora Doutora Mahayana Godoy Membro Interno 4.

(5) AGRADECIMENTOS. Muito obrigada, Bernardo. Meu agradecimento a você é especial. Obrigada por entender minhas ausências e as renúncias que precisei fazer. A vida não poderia ter me dado um esposo mais especial nem mais completo.. Agradeço de todo o coração aos meus pais. Desde criança eles foram e são os maiores incentivadores dos meus estudos. Sem eles eu não teria conseguido sonhar tão alto.. Jana, tenho certeza que nunca vou ser capaz de retribuir tudo o que você fez por mim. Conheço poucos pós-graduandos que tiveram uma orientadora tão comprometida e com a rara capacidade de deixar esta caminhada leve. Você é uma pessoa de muita luz e algumas vezes acreditou mais em mim que eu mesma. Entenda o meu MUITO OBRIGADA como o que eu tenho de mais completo pra dizer a você agora. Minha orientadora e amiga, o que eu aprendi com você vai bem além do doutorado.. Agradeço à UFERSA pelos dois anos de afastamento. Foi um privilégio poder me dedicar a esta pesquisa com exclusividade.. Prof. Augusto, muito obrigada por ter aceitado ser meu co-orientador ainda na época da seleção para o doutorado, quando esta pesquisa tinha outro formato. Obrigada por participar da banca de qualificação, por todos os apontamentos e contribuições, pela presteza ao longo desses anos de pesquisa e pela bolsa concedida através do ACERTA. Foi muito bom poder contar com sua ajuda.. Prof. Sidarta, muito obrigada por aceitar participar da banca de defesa. Desde as reuniões no ICe, no início do ACERTA, que suas contribuições têm sido importantes e eu só tenho a agradecer. Muito obrigada por ter viabilizado o Projeto ACERTA em Natal, atitudes como a sua fazem muita diferença!. 5.

(6) Muito obrigada à profa. Mahayana por ter aceitado participar da banca de qualificação. Suas contribuições são muito importantes. Obrigada também por me ensinar um pouco de estatística, por toda a ajuda nos encontros mensais do grupo e espaço para o ensaio, foi uma contribuição ímpar.. Profa. Ângela, obrigada por ter aceitado participar da banca de defesa. Obrigada também por ter aceitado que eu participasse de sua disciplina como aluna ouvinte no início desta caminhada. Aprender com você foi muito importante.. Agradeço à Raysa, que pacientemente me ajudou a entender o SPSS e atendeu aos meus chamados sempre com prontidão. Obrigada por me inserir neste universo estatístico.. Renata, muito obrigada pela torcida. A gente sabe como este processo é difícil e ter uma torcida como a sua ajuda bastante. Agradeço de coração por tudo que você fez por mim. O doutorado acaba, mas o que a gente leva dele é bem maior que a tese. Sua calma, sua presteza e amizade foram muito importantes. Muito obrigada à Natália! Na hora certa você me fez entender que “estar na nuvem” após a coleta de dados faz parte do processo e passa (risos)! Obrigada por me ajudar com sua leveza a compreender o que parecia tão caótico.. Por último, mas não menos importante, agradeço à Maria Helena, minha filha ainda tão pequena, que foi minha fonte diária de força e inspiração.. 6.

(7) RESUMO. Este estudo longitudinal visa a investigar a relação entre a memória de trabalho (BADDELEY e HITCH, 1974; DANEMAN e CARPENTER, 1980; ENGLE, 2004; BADDELEY, 2012; entre outros) e o desenvolvimento da leitura e da escrita (CABRAL, 1986; FRITH, 1985; EHRI, 2005; DEHAENE, 2009, 2010, 2015; entre outros) em participantes do projeto ACERTA (Avaliação de Crianças em Risco de Transtorno de Aprendizagem), alunos do Ensino Fundamental I, matriculados em 6 escolas municipais de Natal-RN ao longo de 2014 a 2016. Para tanto, três perguntas de pesquisa nortearam este trabalho (1) Como a memória de trabalho está relacionada ao desenvolvimento da leitura e escrita das crianças participantes do estudo?; (2) De que forma a memória de trabalho (MT) pode predizer o desenvolvimento de leitura e escrita das crianças avaliadas? e, (3) De que forma a Provinha Brasil (PB) pode predizer o desenvolvimento de leitura e escrita das crianças avaliadas? Os 57 participantes foram submetidos à Provinha Brasil no ano de 2014 e realizaram atividades de avaliação de leitura e escrita e avaliações de MT (AWMA – Automated Working Memory Assessment) de 2014 a 2016. Os resultados quantitativos obtidos através das correlações de Spearman para responder à primeira pergunta de pesquisa e corrigidos através do FDR (False Discovery Rate) revelam que: (1) a MT verbal não teve correlação significativa com nenhuma das atividades de leitura e escrita propostas nos anos de 2015 e 2016; e (2) a atividade de MT para não-palavras realizada tanto em 2015 quanto em 2016 obteve correlação significativa com a atividade acurácia nos dois anos em que foi realizada, revelando semelhanças e diferenças entre tarefas designadas a medir o mesmo construto, porém com modos de apresentação de estímulos distintos. Em resposta à segunda pergunta, os resultados quantitativos obtidos por regressão linear revelam que a MT não foi capaz de predizer o desenvolvimento da leitura das crianças em nenhuma das quatro medidas propostas no ano de 2016, aspecto que não se alinha à hipótese de que a MT sozinha é capaz de prever o desenvolvimento da leitura. Ao contrário do previsto, os resultados apontam a memória de curto prazo com uma possível tendência de prever o desenvolvimento dos nossos participantes nas atividades de acurácia e cópia. Por fim, para responder à terceira pergunta de pesquisa, também através de regressão linear, a Provinha Brasil 2014 revelou-se um preditor ineficaz do desenvolvimento de leitura e escrita em 2015 e 2016, já que somente duas das oito atividades propostas foram preditas pela PB 2014. A discussão proposta pretende lançar luz sobre as variáveis que impactam o processo de aprendizagem da leitura, sob um ponto de vista neurocognitivo.. Palavras-chave: Memória de trabalho, aprendizagem de leitura, desenvolvimento da leitura, Provinha Brasil.. 7.

(8) ABSTRACT. The aim of this longitudinal study is to investigate working memory (WM) (BADDELEY e HITCH, 1974; DANEMAN e CARPENTER, 1980; ENGLE, 2004; BADDELEY, 2012; among others) and the development of reading and writing (CABRAL, 1986; FRITH, 1985; EHRI, 2005; DEHAENE, 2009, 2010, 2015, among others) in participants of Project ACERTA (Avaliação de Crianças em Risco de Transtorno de Aprendizagem) of Ensino Fundamental 1 from six public schools in Natal-RN from 2014 to 2016. For this purpose three research questions guided this study: (1) How is working memory related to the writing and reading development of the participants of this research?; (2) How can working memory predict the development of reading and writing of the learners of this research? and, (3) How can Provinha Brasil (PB) predict the development of reading and writing of the participants of this research? The 57 participants took Provinha Brasil in 2014 and they also did reading and writing tasks and WM evaluations (AWMA – Automated Working Memory Assessment) from 2014 to 2016. The quantitative results from Spearman correlations to answer the first research question and corrected by FDR (False Discovery Rate) pointed towards that: (1) verbal WM did not correlate significantly with any of the reading and writing activities proposed in 2015 and 2016; and (2) the non-words WM activity correlated significantly with accuracy activity, reinforcing the similarity and differences in tasks designed to measure the same things, but with different types of input. In response to the second research question, the quantitative results obtained by linear regression pointed towards WM not predicting the reading development of children in any of the four activities proposed in 2016, which does not corroborate the hypothesis that WM by itself is able to predict reading development. Contrary to expectations, the results point to short-term memory as a possible tendency to predict the development of our participants in accuracy and copy activities. Lastly, to answer the third research question, also by linear regression, Provinha Brasil 2014 was considered an ineffective predictor of reading and writing development in 2015 and 2016, once only two from eight activities could be predicted by Provinha Brasil 2014. The proposed discussion aims to shed light on the variables that impact the learning process of reading, from a neurocognitive point of view.. Keywords:Working memory, learning to read, reading development, Provinha Brasil.. 8.

(9) There are many hypotheses in science which are wrong. That's perfectly all right; they’re the aperture to finding out what's right. Science is a self-correcting process. To be accepted, new ideas must survive the most rigorous standards of evidence and scrutiny. Carl Sagan (Cosmos - fourth episode). 9.

(10) À Maria Helena. Sempre.. 10.

(11) LISTA DE FIGURAS. FIGURA 01: Visão moderna das redes corticais da leitura ....................................... p 29 FIGURA 02: Arquitetura do sistema de leitura......................................................... p 30 FIGURA 03: A abordagem da memória baseada no processamento da informação ..................................................................................................................................... p 45 FIGURA 04: Modelo modal proposto por Atkinson e Shiffrin (1968)..................... p 46 FIGURA 05: Representação simplificada do modelo de memória de trabalho proposto por Baddeley e Hitch (1974) ...................................................................................... p 48 FIGURA 06: Modelo proposto por Baddeley (2012)................................................ p 51 FIGURA 07: Exemplo de questão de interpretação da PB 2014.1............................ p 72 FIGURA 08: Exemplo de questão de decodificação da PB 2014.1........................... p 73 FIGURA 09: Avaliação da leitura de palavras e pseudopalavras ............................. p 74 FIGURA 10: Atividade de cópia – o camaleão ......................................................... p 75 FIGURA 11: Representação da atividade de Listening Recall do AWMA .............. p 76 FIGURA 12: Representação da atividade de Non-words do AWMA ...................... p 77 FIGURA 13: Ditado .................................................................................................. p 78 FIGURA 14: Cópia realizada por aluno com baixa capacidade de MT ................... p 84 FIGURA 15: Cópia realizada por aluno com alta capacidade de MT ...................... p 85 FIGURA 16: Gráficos de dispersão sobre as correlações entre MT verbal e o desenvolvimento da leitura e da escrita em 2015 ....................................................... p 86 FIGURA 17: Gráficos de dispersão sobre as correlações entre MT verbal e o desenvolvimento da leitura e da escrita em 2016 ....................................................... p 90. 11.

(12) LISTA DE QUADROS QUADRO 01: Dados demográficos das escolas participantes .................................. p 67 QUADRO 02: Testes de aferência da habilidade leitora e capacidade de memória de trabalho aplicados aos alunos participantes da pesquisa ............................................ p 69 QUADRO 03: Cronologia da aplicação das atividades para as crianças participantes ..................................................................................................................................... p 70. 12.

(13) LISTA DE TABELAS. TABELA 01: Perguntas de pesquisa e suas respectivas hipóteses ............................ p 80 TABELA 02: Correlações entre memória de trabalho verbal e o desenvolvimento da leitura e escrita nos anos de 2015 e 2016 ................................................................... p 83 TABELA 03: Correlações entre memória de curto prazo verbal e o desenvolvimento da leitura e da escrita nos anos de 2015 e 2016 ............................................................... p 94 TABELA 04: Correlações entre não-palavras e o desenvolvimento da leitura e da escrita nos anos de 2015 e 2016 ................................................................................. p 96 TABELA 05: A capacidade da MT predizer o desenvolvimento da leitura e da escrita ................................................................................................................................... p 100 TABELA 06: A Provinha Brasil como preditora do desenvolvimento de leitura e da escrita ........................................................................................................................ p 105 TABELA 07: As questões de decodificação da PB como preditoras do desenvolvimento da leitura e da escrita .................................................................... p 106 TABELA 08: As questões de interpretação da PB como preditoras do desenvolvimento da leitura e da escrita ................................................................................................ p 107 TABELA 09: Resumo do capítulo de discussão dos dados .................................... p 110. 13.

(14) LISTA DE GRÁFICOS. GRÁFICO 01: Representação do efeito chão obtido pelos alunos nos anos de 2015 e 2016 .......................................................................................................................... p 103. 14.

(15) SUMÁRIO INTRODUÇÃO 1.1 Motivação e propósito da pesquisa .......................................................................... 16 1.2 Educação, psicologia cognitiva e neurociência: três ciências que podem caminhar juntas .............................................................................................................................. 18 1.3 Perguntas de pesquisa .............................................................................................. 23 CAPÍTULO 2: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................... 25 2.1 A LEITURA NO CÉREBRO ................................................................................26 2.1.1 Conceitos, mecanismos e processamento da leitura ............................................. 26 2.1.2 A aprendizagem da leitura na infância ................................................................. 33 2.1.3 Testes de aferência da habilidade de leitura e escrita ........................................... 38 2.1.4 Quando a leitura não acontece .............................................................................. 42 2.2 MEMÓRIA DE TRABALHO E LEITURA ....................................................... 44 2.2.1 Conceito e modelos de memória de trabalho ...................................................... 44 2.2.2 O desenvolvimento da memória de trabalho ........................................................ 54 2.2.3 A relação entre memória de trabalho e leitura ...................................................... 59 CAPÍTULO 3: METODOLOGIA MÉTODO....................................................................................................................... 65 3.1 Natureza da pesquisa ............................................................................................... 65 3.2 Contexto e participantes da pesquisa ....................................................................... 66 3.3 O projeto ACERTA ................................................................................................. 68 3.4 Instrumentos e procedimentos de coleta de dados .................................................. 68 3.4.1 Os testes ................................................................................................... 70 3.4.2 Raven ........................................................................................................ 71 3.4.3 Provinha Brasil ....................................................................................... 71 3.4.4 Leitura de palavras e pseudopalavras - Acurácia e Tempo de Leitura... .........................................................................................................................................73 3.4.5 Atividade de cópia – O Camaleão ......................................................... 75 3.4.6 AWMA – Automated Working Memory Assessment ............................. 75 3.4.6.1 Atividade de memória de trabalho verbal (Listening Recall) ............................ 76 3.4.6.2 Atividade de memória de trabalho de não-palavras (Non-words) ......................77 3.4.7 Ditado ....................................................................................................... 78 3.5 Instrumentos e procedimentos de análise de dados ................................................ 79 CAPÍTULO 4: RESULTADOS E DISCUSSÃO ...................................................... 80 4.1 Como a memória de trabalho está relacionada ao desempenho da leitura e escrita das crianças participantes do estudo?............................................................................................................................ 82 4.4.1 Memória de Trabalho Verbal ................................................................ 82 4.1.2 Memória de Curto Prazo Verbal ........................................................... 93 4.1.3 Memória de Trabalho para Não-palavras ............................................ 95. 15.

(16) 4.2 De que forma a memória de trabalho (MT) pode predizer o desempenho de leitura e escrita das crianças avaliadas? ...................................................................................................................................... 100 4.3 De que forma a Provinha Brasil (PB) pode predizer o desempenho da leitura e escrita das crianças avaliadas? ...................................................................................................................................... 105. CONCLUSÃO .............................................................................................................111 REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 116 ANEXOS ..................................................................................................................... 122. 16.

(17) INTRODUÇÃO Os motivos para unir educação e neurociência são muitos. As salas de aula são espaços heterogêneos com muitos aspectos a serem investigados e, justamente por serem ambientes complexos, a parceria com outra(s) área (s) do conhecimento tende a contribuir para o crescimento tanto da educação quanto das neurociências1. Visto que ambos os campos de pesquisa podem ser complementares, partimos do princípio de que os mais variados aspectos que compõem uma sala de aula podem ser investigados pelas neurociências. Assim, com o intuito de mostrar que uma área pode ser complementar à outra, apresento, a seguir, o início da caminhada: educação e neurociência juntas, na tentativa de estabelecer uma ponte (BRUER, 1997; VARMA et al., 2008; SIGMAN et al., 2014) e extrair o melhor dos dois mundos. Essa proposta de complementaridade se alinha à ideia do ensino baseado em evidências (SIGMAN et al., 2014; OLIVEIRA, 2014), já que o ideal é que as perguntas de pesquisa que norteiam as investigações das neurociências emerjam das salas de aula e que estas, por sua vez, apliquem as evidências provenientes de pesquisas neurocientíficas.. 1.1 Motivação e propósito da pesquisa Com a conclusão do mestrado, passei a frequentar as reuniões do ACERTA (Avaliação em Crianças Em Risco de Transtorno de Aprendizagem) na UFRN na tentativa de entender o que seriam transtornos de aprendizagem e até mesmo de encontrar um objeto de pesquisa para minha então futura tese de doutorado, que não estivesse tão distante do que eu havia feito no mestrado. Foi a partir de então que me deparei com um enorme quebra-cabeça a ser montado. Desde a primeira reunião, o aspecto multiprofissional do grupo ficou muito claro, porque os vários profissionais que compunham o ACERTA-Natal estavam presentes. Havia fonoaudiólogos, psicoterapeutas, professores, pedagogos, médicos e 1. Os termos neurociência e neurociências têm significados diferentes. Quando escrito no singular referese à biologia, ciência básica; e quando escrito no plural refere-se às ciências aplicadas, incluindo a educação. (Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Neuroci%C3%AAncia – Wikipedia. Acesso em 29/03/2017). 17.

(18) estudantes pesquisadores. Cada um tinha sua forma de contribuir com as pesquisas que estavam sendo iniciadas, o principal intuito era unir força e conhecimento para conduzir 4 anos de trabalho em 6 escolas diferentes de Natal-RN. Para mim, o quebra-cabeça começava a ter suas primeiras peças encaixadas. Isso porque em cada encontro havia a discussão de uma leitura esclarecedora para que as pesquisas ganhassem mais forma. E para cada leitura, um profissional se dispunha a conduzir a discussão e esclarecer as dúvidas que surgiam com o grupo que só aumentava. Assim, confiando no grupo, aceitei o desafio de compreender os transtornos de aprendizagem e começar a pesquisar em uma nova área. Saí bastante da minha zona de conforto mas, em contrapartida, passei a fazer parte de um universo cheio de desafios prazerosos. A partir daí, a pesquisa conduzida por mim permitia encaixar algumas peças do quebra-cabeça que é a neurociência da leitura. Ao longo das reuniões fui entendendo a realidade de quem tem dificuldades para realizar tarefas simples para muitos, como ler e escrever, por exemplo; mas, por outro lado, era preciso pesquisar o cerne desta dificuldade. Uma das alternativas que se apresentou foi a memória de trabalho (MT), um construto que pode tanto limitar como potencializar o aprendizado da leitura. Acreditando que a neurociência possa vir a somar esforços ao contribuir com uma investigação baseada em construtos cognitivos, procuramos contribuir com a educação na tentativa de esclarecer alguns poucos pontos que esta pesquisa pode solucionar, ao investigar a capacidade de ler e escrever atreladas à memória de trabalho.. 18.

(19) 1.2 Educação, psicologia cognitiva e neurociência: três ciências que podem caminhar juntas. O funcionamento do cérebro, e tudo o que envolve suas funções, fascina educadores desde sempre. No final do século passado, Bruer (1997) acreditava que a neurociência tinha pouco a oferecer à prática em sala de aula e apontava a ciência cognitiva como um bom começo para compreender o desenvolvimento do aprendizado. Segundo Bruer (1997), é a psicologia cognitiva – não a neurociência – que está ligada às práticas educacionais. Para ele, há uma tendência a subestimar o que a psicologia já explica e buscar apoio na neurociência que, segundo ele, não sustenta as práticas em sala de aula. Bruer (1997) não se posiciona contra à construção da ponte entre neurociência e educação, mas procura mostrar que a ligação que já existe precisa ser valorizada. O autor, na verdade, propõe duas pontes: (1) uma que una biologia e psicologia cognitiva e que, para ele, já soluciona problemas educacionais relevantes e, (2) outra que use a psicologia cognitiva unida à educação, com o intuito de desenvolver intervenções que possam solucionar problemas específicos das salas de aula, na tentativa, por exemplo, de compreender como a matemática e a leitura podem ser aprendidas por grupos com mais dificuldades. Desta forma, a ciência cognitiva seria o ponto de encontro entre as duas, um ponto intermediário onde poderia haver cooperação e ajuda mútua. Bruer (1997) ressalta que o desenvolvimento da visão, do movimento e da memória de trabalho é de grande importância para a criança. Contudo, essas não são habilidades que possam ser adquiridas na escola ou aprendidas no jardim de infância, mas que – sem dúvida – sustentarão aprendizados futuros. Para Bruer (1997), não é possível explicar com base em pesquisas neurocientíficas a relação que existe entre as capacidades mencionadas e os aprendizados vindouros. Para ele, o que se sabe atualmente sobre sinaptogênese2 pode dizer muito pouco a respeito de como as experiências no jardim de infância ou as experiências vividas cedo na infância podem 2. Processo de proliferação sináptica (BRUER, 1997). Um processo de desenvolvimento neural que ocorre numa grande variedade de espécies mamíferas.. 19.

(20) realçar ou potencializar as capacidades cognitivas das crianças ou seus resultados escolares. Ademais, Bruer (1997) acha prematuro chegar a alguma conclusão considerando a complexidade deste tipo de desenvolvimento, mesmo porque não se sabe se há período crítico para sistemas de conhecimento transmitido. Ao concluir, Bruer (1997) sustenta que a psicologia cognitiva é a melhor aposta para resolver problemas educacionais e desenvolver ferramentas para instruir educadores. Para ele, aliás, é importante olhar com mais atenção e cuidado o que a ciência do comportamento pode nos dizer sobre ensinar, aprender e sobre desenvolvimento cognitivo. De fato, para Bruer (1997), ainda é tempo de trabalhar com o que temos em mãos, ao invés de esperar respostas e soluções que podem demorar a chegar. Até porque, segundo ele, a psicologia cognitiva pode contribuir bastante para as problemáticas do desenvolvimento da sala de aula, o que não justificaria esperar pela neurociência. Ao contrário de Bruer (1997), Varma et al. (2008) veem com mais facilidade a possível ponte entre educação e neurociência. Para Varma et al. (2008), a neurociência atuando na área da educação é uma iniciativa que pode trazer importantes contribuições para a aprendizagem considerando tanto preocupações científicas (como método, teoria e dados, por exemplo), quanto o aspecto pragmático das pesquisas (como duração e custos). Varma et al. (2008) veem as preocupações como oportunidades de unir as duas áreas, e aí está a chance de ir construindo a ponte pouco a pouco. Apesar de ter-se ciência dos desafios que cada área já possui separadamente, aproximá-las pode resultar em ganhos para as duas comunidades, já que o foco estaria na colaboração. Varma et al. (2008) não fecham os olhos para as diferenças que existem entre educação e neurociência. Eles só não acreditam que tais diferenças sejam suficientes para manter as duas áreas distantes e sem apoio mútuo. Os autores, inclusive, apresentam saídas viáveis para as diferenças mais relevantes. Para citar um exemplo, eles afirmam que os custos das pesquisas em neurociência são geralmente muito altos e, portanto, inviáveis para as pesquisas em educação; e que buscar soluções em parceria com a neurociência poderia ajudar a educação a atrair fundos para suas pesquisas. Além disso, os autores também. 20.

(21) afirmam que não há risco da área da educação ser sempre dependente da neurociência, porque assim como a neurociência tem bastante a oferecer à educação, a recíproca é igualmente verdadeira. Quando o assunto é colaborar para construir esta tão controversa ponte entre neurociência e educação, é primordial considerar a necessidade de produzir e oferecer educação baseada em evidências. Sigman et al. (2014) encerram – ou quem sabe instigam ainda mais– a discussão sobre essa ponte e a atualizam. Os autores chamam atenção para a necessidade de produzir experimentos pedagógicos mais ousados, éticos e situados na prática escolar, que possam resultar em avanços sociais efetivos. Ao contrário de Bruer (1997), Sigman et al. (2014) alegam ser insuficiente considerar somente a ciência cognitiva na construção da ponte entre a neurociência e a educação. Eles defendem a parceria entre as neurociências no intuito de promover ferramentas que se complementem e ajudem a entender tanto a mente quanto as ações para tornar a educação mais efetiva. Para tanto, voltam seu olhar para a base fisiológica da pedagogia: o sono, a alimentação e o exercício físico como importantes catalisadores da aprendizagem. Além dos fatores mencionados, existem também, segundo Sigman et al. (2014), outros pontos importantes que contribuem para o aprendizado da criança, mas que acontecem fora do ambiente escolar. Os autores citam, por exemplo, (1) o fato de que as crianças passam cerca de 85% do tempo que estão acordadas fora da escola; bem como (2) as relações entre pais e filhos – que desempenham um papel muito importante no desenvolvimento das crianças e, (3) a qualidade das brincadeiras que acontecem fora da escola (SIGMAN et al., 2014). Para Sigman et al. (2014), a neurociência tem permitido diagnósticos mais precoces em relação às dificuldades cognitivas do que permitiria uma observação comportamental ou psicológica. Os autores exemplificam esta questão mostrando que é possível detectar a surdez congênita em recém-nascidos, mas tradicionalmente, os testes psicológicos somente conseguem detectá-la meses após o nascimento, o que acaba, por vezes, impossibilitando as devidas intervenções. Enquanto Bruer (1997) argumenta que a ponte entre neurociência e educação está longe de ser construída e Varma et al. (2008) e Sigman et al. (2014), por outro. 21.

(22) lado, enumeram algumas possibilidades para esta construção ser real e eminente, surge Bowers (2016) com uma visão crítica e cética colocando em cheque tudo o que foi exposto. Bowers (2016) alinha-se a Bruer (1997) e questiona se a neurociência realmente tem o poder de melhorar a instrução em sala de aula. Ele não acredita na contribuição da neurociência com a educação, sobretudo, porque, sob sua perspectiva, o sucesso obtido por professores em sala de aula não são advindos da neurociência e, sim, da psicologia. Desta forma, Bowers (2016) discute, inclusive, as considerações feitas por Sigman et al. (2014). Bowers não acha justo que os aspectos sociais, biológicos, como a prática de atividade física, alimentação adequada e/ou começar o turno da escola em horário mais tarde que o habitual para adolescentes, por exemplo, sejam considerados resultados de pesquisas neurocientíficas porque, para ele, estes fatores já são problemas conhecidos à espera de solução. As críticas feitas à posição adotada por Sigman et al. giram em torno do fato de que as necessidades de mudança e os problemas identificados não precisaram da neurociência para serem listados, e as soluções apresentadas tampouco tiveram interferência da neurociência. Além disso, o ceticismo de Bowers (2016) em relação à construção da ponte ganha espaço pela falta de novidades vindas da neurociência para a sala de aula. Neste ponto, ele novamente apoia Bruer (1997) por entender que as evidências e resultados que a sala de aula procura estão nos dados comportamentais aos quais os professores já têm acesso. Mais que isso, para ele, os professores produzem esses dados. Para Bowers (2016), alterar a forma de ensinar ou alterar uma abordagem em sala de aula podem trazer resultados importantes e que precedem a neurociência. Em consonância com Bruer, ele acredita que a ciência cognitiva já responde a muitos dos questionamentos feitos à neurociência desnecessariamente, porque é no comportamento que o foco deve estar. Desta forma, os neurocientistas pouco têm a contribuir com os professores em sala de aula, mas os professores podem ajudar os neurocientistas ao modificar os cérebros de seus alunos com suas formas de ensinar. Daí, em se tratando da construção da ponte para unir neurociência e educação, Bowers (2016) não acredita que ela esteja distante, mas para ele a neurociência está andando na direção errada,. 22.

(23) contribuindo, no máximo, para a "construção de uma rua de mão única que ligaria as duas áreas" (BOWERS, 2016, p. 10)3. Sigman et al. (2014) também temem a ponte como uma via de mão única, caso os esforços para que a neurociência contribua para com a educação se percam se não forem acompanhados por uma reflexão eficaz sobre como organizar todo este processo de parceria. E, é claro, essa parceria não pode ser desenvolvida somente enquanto a neurociência estiver sob os holofotes da mídia e da moda (SIGMAN et al., 2014). É preciso que haja bem mais que um apelo comercial, porque há uma grande responsabilidade em disseminar uma visão crítica e rigorosa dos resultados obtidos a fim de estabelecer um diálogo, inclusive, com quem não é expert em neurociência. Todavia, acreditamos que mesmo com alguns argumentos desfavoráveis, a ponte que pode unir educação, psicologia cognitiva e neurociência não é algo tão distante ou irreal, talvez a ansiedade em resolver muitos problemas que se arrastam há bastante tempo possa causar alguns equívocos, mas com a devida perseverança e as pesquisas trabalhando direcionadamente, a ponte para unir esses dois mundos seja cada vez mais possível. O que não se pode negar até então é que esta ponte – construída agora ou mais tardiamente – inevitavelmente passe pela psicologia cognitiva. Quanto tempo levará para que neurociência e educação dêem as mãos nós não podemos afirmar, mas o fato de que a ciência cognitiva é a interseção entre elas nós já podemos sustentar, uma vez que as conexões entre linguagem e mente são investigadas nesta interseção, considerando, inclusive, os processos cognitivos envolvidos na produção da linguagem. Além disso, como Bruer (1997) propõe, não podemos subestimar o que a ciência cognitiva já investiga, porque muitas respostas ligadas à prática em sala de aula já estão nesta interseção. Assim, valorizando este elo importante, desenvolvemos esta pesquisa apoiandonos na ciência cognitiva, no intuito de investigar a relação entre a memória de trabalho e o desenvolvimento da leitura e da escrita, habilidades fundamentais para desempenho das funções escolares e que envolve aspectos que, por vezes, precisam ser investigados além da sala de aula. A seguir estão as perguntas que nortearam este estudo. 3. Critics of educational neuroscience might reconsider the analogy of a bridge too far. Perhaps a more appropriate analogy is that there is a one-way street linking education to neuroscience. Educational neuroscience is trying to travel in the wrong direction.. 23.

(24) 1.3 Perguntas de pesquisa. Considerando os processos mentais e as funções executivas que subjazem a leitura e a escrita, investigamos sua relação com a memória de trabalho. Para tanto, elaboramos três perguntas no intuito de conduzir esta pesquisa:. (1) Como a memória de trabalho está relacionada ao desempenho da leitura e escrita das crianças participantes do estudo? Esta primeira pergunta surge da hipótese de que a memória de trabalho estabelece relação direta com o desempenho da leitura e da escrita, portanto, espera-se uma correlação significativa entre os escores dos testes do AWMA (memória de trabalho, memória de curto prazo e não-palavras) e as medidas de leitura e escrita (Provinha Brasil, ditado, acurácia e tempo de leitura de palavras e pseudopalavras e cópia). O intuito deste estudo é investigar se esta relação, consistentemente reportada na literatura científica, pode ser confirmada no contexto em que as crianças participantes deste estudo estão inseridas.. (2) De que forma a memória de trabalho (MT) pode predizer o desempenho da leitura e escrita das crianças avaliadas? Esta segunda pergunta visa a investigar a capacidade da memória de trabalho de predizer o desempenho da leitura e escrita das crianças participantes deste estudo, já que a literatura científica sustenta que o desenvolvimento da leitura está diretamente associado à memória de trabalho. Utilizamos medidas de memória de trabalho (memória de trabalho verbal, memória de curto prazo verbal e não-palavras) para verificar se elas serão capazes de predizer o desempenho da leitura e escrita das crianças um ano depois. Em outras palavras, espera-se que o desenvolvimento da leitura medida no ano de 2016 seja mais expressivo para as crianças que possuíam maior capacidade de MT em 2015.. (3) De que forma a Provinha Brasil (PB) pode predizer o desempenho de leitura e escrita das crianças avaliadas?. 24.

(25) Por fim, esta terceira pergunta visa à investigação da capacidade de predição da Provinha Brasil, realizada em 2014, sobre o desenvolvimento da leitura (acurácia e tempo de leitura de palavras e pseudopalavras) e da escrita (ditado e cópia) das crianças em 2015 e 2016. Partimos do princípio de que este instrumento de leitura elaborado pelo governo federal e aplicado nacionalmente seja capaz de predizer o desenvolvimento da leitura e da escrita.. A presente tese está organizada em 5 capítulos. Na Introdução propomos uma reflexão sobre a possibilidade da neurociência, a psicologia cognitiva e a educação caminharem juntas e estabelecerem parcerias que podem ser importantes para a ciência. O Capítulo 2 apresenta os conceitos sobre a leitura no cérebro e memória de trabalho adotados para este trabalho, bem como o desenvolvimento de cada uma destas habilidades e a relação que há entre elas. No Capítulo 3 apresentamos a metodologia utilizada para conduzir esta pesquisa e todas as atividades de leitura, escrita e memória de trabalho propostas aos nossos participantes. Já no Capítulo 4 conduzimos a discussão dos resultados de cada uma das três perguntas de pesquisa separadamente e, por fim, na Conclusão, discorremos brevemente sobre os principais achados deste estudo, apontamos nossas limitações e apresentamos algumas ideias para futuras pesquisas. Em suma, a discussão aqui proposta pretende lançar luz sobre o papel que a memória de trabalho tem no processo de aprendizagem da leitura e da escrita, sob um ponto de vista neurocognitivo, e sobre o uso da Provinha Brasil para a aferição da leitura e escrita e as implicações decorrentes disso para a instrução dessas habilidades.. 25.

(26) CAPÍTULO 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Neste capítulo abordamos a relação existente entre leitura e MT. Começamos mostrando tanto os mecanismos cerebrais envolvidos no ato de ler (DEHAENE, 2009; DEHAENE, 2015; SNOWLING E HULME, 2013; RAYNER, SCHOTTER, MASSON, POTTER E TREIMAN, 2016; MORAIS, 2016; NAZIR E BRYSBAERT, 2005; FRITH, 1985; ESKEY E GRABE, 1988; CABRAL, 1986; COLTHEART, 2013; GABRIEL, MORAIS E KOLINSKY, 2016; EHRI, 2005; MORAIS, 1996; KINTSCH E RAWSON, 2013, ZORZI, 2003; ZORZI, 2004) quanto os mecanismos que são hipoativados em cérebros de aprendizes que apresentam alguma dificuldade neste processo (DEHAENE E COHEN2007; SHAYVITZ, 2003; TEMPLE et al., 2003; MEYLER et al., 2008). Em seguida, revisamos os testes capazes de identificar leitores típicos e atípicos em relação a seus desempenhos no aprendizado da leitura (MASCARELLO, 2016; FUJII, 2015; VILHENA, SUCENA, CASTRO E PINHEIRO, 2016; SALLES, 2005; ANDRADE E ARAÚJO, 2013; GATHERCOLE; BADDELEY, 1993; ZORZI, 2003; ALLOWAY e ALLOWAY, 2012; GABRIEL et al., 2016; MOOJEN, PROVINHA BRASIL, MORAIS,1996; VILHENA et al., 2016). Além da leitura, tratamos também dos conceitos e modelos de memória de trabalho (MT) (ATKINSON e SHIFFRIN, 1968; BADDELEY e HITCH, 1974; GATHERCOLE e BADDELEY, 1993; ERICSSON e KINTSCH, 1995; ENGLE, 1999; WEISSHEIMER, 2007; COWAN, 2008; BADDELEY, 2012; FOY E MANN, 2014) e da relação deste construto cognitivo com o processamento da leitura e da escrita.. 26.

(27) 2.1 A LEITURA NO CÉREBRO. Nesta seção tratamos de fundamentos importantes para esta pesquisa, como os conceitos e mecanismos da leitura, a aprendizagem da leitura, bem como os problemas decorrentes da não-aprendizagem desta habilidade, ressaltando que nosso foco principal é a atividade de decodificação, um dos processos inerentes à atividade de ler. Também abordamos testes de aferência da habilidade leitora no intuito de apresentar a importância deles para as atividades propostas nesta pesquisa.. 2.1.1 Conceitos, mecanismos e processamento da leitura. O cérebro capaz de ler possui um grupo sofisticado de mecanismos unicamente voltados para esta atividade. Contudo, estes mecanismos nem sempre foram de nosso conhecimento, como Dehaene (2009) aponta, a leitura foi um mistério para os cientistas por séculos. Para ele, a invenção da escrita foi responsável por grandes mudanças no mundo e, como consequência, diferentes áreas da nossa sociedade foram transformadas. Aspectos culturais, economia e ciência, por exemplo, são parte desta transformação, e mais recentemente é possível mencionar a psicologia e a neurociência cognitiva como parte destas transformações. Para compreender melhor o processo de aprendizagem da leitura é importante saber que os mecanismos e os processos visuais envolvidos no ato de ler englobam o sistema cognitivo desde o momento em que os olhos veem a informação a ser lida. O reconhecimento das palavras é a base da leitura, porque todos os outros processos dependem desse reconhecimento (SNOWLING & HULME, 2013). De forma geral, a leitura é definida como um processamento de informação textual cujo objetivo é recuperar o significado do texto e também aprender algo novo (RAYNER, SCHOTTER, MASSON, POTTER E TREIMAN, 2016). É um processo complexo que não somente requer o reconhecimento de uma sequência de palavras, mas a compreensão das relações que existem entre elas.. 27.

(28) Para Snowling e Hulme (2013) o reconhecimento das palavras significa acessar as informações que estão na memória. Se o reconhecimento for visual, envolve recuperar informações sobre a forma falada e o significado da palavra a partir de sua forma escrita. De acordo com Dehaene (2009), aprender a ler é conectar as duas regiões do cérebro: o circuito da linguagem e o sistema de reconhecimento de objetos. Em consonância, Rayner et al. (2016) entendem que a leitura é baseada na linguagem falada, mas envolve também a aprendizagem de um sistema arbitrário de símbolos, fazendo com que a leitura e a escrita precisem ser explicitamente ensinadas. Também contribuindo para a definição de leitura, Morais et al. (2016) concordam que ler é um processo complexo, mas alegam que alongar a definição deste processo não contribuiria para sua importância. Segundo Morais et al. (2016), a leitura deveria ser compreendida como uma ferramenta que leva a novas formas de aprender; além de também ser uma maneira de usar a linguagem e ser capaz de estabelecer conhecimento e comunicação. Outros ganhos que a leitura pode permitir são as mudanças positivas que acontecem no cérebro comparado ao cérebro de alguém que não lê. O impacto está relacionado às novas conexões que podem ser feitas por conta do novo aprendizado e envolve mudanças inclusive no comportamento. Devido aos ganhos que o aprendizado da leitura proporciona, Dehaene (2015) afirma que aprender a ler pode influenciar habilidades cognitivas de alto nível como a memória de trabalho, a organização semântica, o raciocínio e as funções executivas, por exemplo. Segundo Dehaene (2015), a aprendizagem da leitura pode até mesmo ampliar conceitos motores, culturais, fonológicos e visuais. E no tocante ao processamento visual primário, Dehaene (2015) afirma que há consequências positivas inclusive para quem aprendeu a ler na fase adulta, isso porque ler aumenta a ativação bilateral do lobo occipital devido a estímulos visuais como as letras, imagens e rostos. Além disso, o córtex visual passa a ficar mais específico e refinado para localizar palavras na retina e há um ganho também na capacidade de discriminar dois itens semelhantes, o que significa que o nível de acuidade visual passa a ser maior.. 28.

(29) Apesar de corroborarem com os ganhos que o aprendizado da leitura proporciona, Nazir e Brysbaert (2005) enfatizam que a palavra escrita ou impressa é um estímulo visual, de forma que quaisquer limitações no sistema de atenção visual podem resultar em limitações na velocidade e na acurácia do reconhecimento da palavra. Além disso, eles também reforçam a importância dos códigos fonológicos e que a leitura não é apenas baseada em informações ortográficas. Para Dehaene (2009), os princípios que subjazem o cérebro capaz de ler são heranças da evolução humana e, de acordo com esta abordagem, nossas redes de neurônios são “recicladas” pela leitura. De acordo com esta hipótese da reciclagem neural proposta por Dehaene (2009), a arquitetura do cérebro humano obedece algumas limitações genéticas, mas alguns circuitos evoluíram o suficiente para tolerar as variações que surgiram com o passar dos anos. O termo ‘reciclagem’ também é uma forma de reorientação ou retreinamento, que transforma uma função antiga, em uma nova, mais útil no contexto cultural presente. Este termo também deixa claro que o tecido que apoia o aprendizado não está em branco, mas possui propriedades que limitam sua gama de aplicações (DEHAENE, 2009, p.147)4 De acordo com Dehaene (2009), se sua teoria da reciclagem neuronal estiver correta, o aprendizado cultural como o da escrita, por exemplo, não desfaz estruturas pré-existentes, ela atua em torno delas. Para ele, parte do sistema visual do homem está aberto às mudanças do ambiente, de tal forma que a plasticidade visual permitiu ao homem a aprendizagem da escrita, guiando o reconhecimento dos traços que diferenciam as letras em si, por exemplo, principalmente ao considerarmos que os mecanismos utilizados pela visão são refinados à medida que o leitor é exposto à alfabetização. Observar a forma através da qual a leitura modifica o cérebro pode transformar em muitas maneiras a forma como observamos a educação e as dificuldades de 4. Tradução livre da pesquisadora. “Neuronal recycling is also a form of reorientation or retraining: it transforms an ancient function, one that evolved for a specific domain in our evolutionary past, into a novel function that is more useful in the present cultural context.”. 29.

(30) aprendizagem. É preciso levar em conta que as palavras não são sempre escritas com a mesma fonte, mesmo tamanho e nem ocupam sempre as mesmas posições. Partindo deste ponto, é preciso lidar com uma dificuldade perceptual: a invariância. Uma capacidade para reconhecer quais aspectos de uma palavra não variam dentro de uma sequência de letras que poderiam assumir outros formatos, ou até mesmo reconhecer um mesmo rosto ou objeto a distância. No tocante à análise visual das letras e o formato das palavras, Dehaene (2009) aponta a “caixa das letras” como a área do cérebro responsável por este reconhecimento. Esta área, também conhecida como área da forma visual da palavra– do inglês, VWFA visual word form área – é responsável pelas palavras captadas e tem papel fundamental na identificação rápida da sequência de letras e em sua transmissão para as demais áreas responsáveis pela pronúncia e significado. Ela funciona como um funil através do qual as informações visuais fluem antes de serem distribuídas para outras áreas, conforme ilustrado na Figura 1.. Na Figura 1, proposta por Dehaene (2009), diversas regiões do cérebro são ativadas e trabalham em conjunto, recebendo mensagens que constantemente se cruzam.. 30.

(31) Dehaene (2009) entende a leitura como um dos maiores passos no desenvolvimento da criança. Para compreender a leitura, processo que tem início na retina, quando a palavra é quebrada em pequenos fragmentos e reorganizada por uma série de neurônios, nosso sistema visual entra em ação progressivamente para extrair grafemas, sílabas, raízes de palavras, etc, em dois processos subsequentes denominados: (1) rota fonológica, que converte letras em sons e, (2) rota lexical, que permite o acesso ao significado das palavras (DEHAENE, 2009). As duas rotas funcionam como caminhos que se suplementam no momento da leitura, e as palavras percorrem estes caminhos em busca de sentido. A abordagem da dupla rota é trazida por Coltheart (2013), como apresentada na Figura 2, baseada no modelo de Baron (1977), para ilustrar o porquê um sistema de duas rotas representa uma proposta mais plausível que de uma só rota.. Coltheart (2013) explica a teoria da dupla rota com a mesma analogia utilizada por Baron (1977). Na comparação, as duas rotas se equivalem a duas mangueiras para encher um balde com água, mas uma delas é mais lenta que a outra. Todavia, as duas. 31.

(32) têm sua importância porque sem uma delas o balde levaria mais tempo para ficar cheio. Esta comparação é pertinente para explicar que, embora uma rota seja mais longa e lenta, ambas são igualmente importantes. Na Figura 2 é possível ver os percursos possíveis para a rota fonológica e a rota lexical. Segundo Coltheart (2013), a leitura pela rota lexical começa pela procura da palavra no léxico mental, que deve conter conhecimento sobre a escrita e pronúncia da palavra procurada, ela é mais curta por não ser uma via de duas mãos, visto que o percurso é somente do aspecto ortográfico para o semântico. Já a leitura pela rota fonológica não envolve o grupo lexical, mas envolve as regras que conectam a ortografia com a fonologia. Esta rota sim é uma via de duas mãos, já que a leitura pode ser do aspecto semântico para o fonológico e vice-versa. O modelo da dupla rota representado na Figura 2 pode explicar não somente a leitura regular, mas também os transtornos de leitura. Segundo Coltheart (2013), a leitura em voz alta levará mais tempo para ser concluída se a palavra lida for irregular, isso porque as duas rotas produzem informações conflitantes no nível do fonema para palavras irregulares e resolver este conflito demanda tempo. Ainda, as palavras de baixa frequência terão um processamento lexical relativamente mais lento que seus pares de alta frequência e, consequentemente, levará mais tempo para a rota fonológica atingir a leitura. Dehaene (2009) corrobora o modelo da dupla rota. Para ele, os dois caminhos coexistem e se suplementam. A rota fonológica é utilizada preferencialmente, segundo ele, para a leitura de palavras novas, raras ou regulares, já que primeiramente a sequência de letras é decifrada, convertida em pronúncia e, só então, há o acesso ao significado, se houver algum. Ao contrário desta, a rota lexical– geralmente utilizada por leitores proficientes – entra em ação para a leitura de palavras frequentes ou de palavras cujas pronúncias são excepcionais, pois nesses casos a leitura opta por uma rota direta que tenta primeiro recuperar a identidade ou o significado da palavra lida e, a partir daí, utiliza a informação lexical para a pronúncia. Segundo Dehaene (2009), um dos fatores que melhor sustenta o modelo da dupla rota são os estudos realizados com pacientes que sofreram lesões cerebrais e tiveram consequências psicológicas. Em alguns casos os pacientes perdem a capacidade de. 32.

(33) pronunciar as palavras que leem, o que demonstra ser uma lesão na rota de conversão grafema-fonema e, embora eles fossem capazes de ler antes da lesão, essas são características de uma dislexia fonológica. Pacientes assim não conseguem mais ler palavras infrequentes mesmo que a escrita seja regular, nem neologismos ou palavras inventadas. Por outro lado, eles podem conseguir ler palavras de uso frequente mesmo que sejam irregulares e, algumas vezes, eles podem confundir algumas, como por exemplo, “presunto” ser lida como “carne", ou “pintor” ser lida como “artista”. Isso acontece porque a natureza de erros como esses demonstra que o acesso ao significado da palavra está preservado. Afinal, se o paciente não tivesse compreendido minimamente o que leu, ele não teria sido capaz de apresentar o significado (DEHAENE, 2009). Considerando ainda o processamento da leitura, há duas abordagens que descrevem este processo como mais interativo ou menos interativo, a depender de quão proficiente o leitor é. Eskey e Grabe (1988) denominam tais abordagens de leitura de top-down e bottom-up. Segundo eles, a (1) top-down é geralmente utilizada por leitores menos presos às pistas linguísticas no texto. Esses leitores, em sua maioria, possuem conceitos mentais mais organizados e, portanto, conseguem realizar uma leitura mais fluente, mais baseada em conhecimentos prévios e na ideia geral que depreendem do texto. Já a abordagem (2) bottom-up, por outro lado é, na maioria dos casos, atribuída a leitores que recorrem mais às pistas contidas no texto por possuírem mais dificuldades em lidar com o contexto. É uma leitura que apoia-se mais no texto em si, nas palavras, frases e parágrafos, e com menos estratégias que possam facilitar a compreensão. Além das abordagens de leitura mencionadas por Eskey e Grabe (1988), os autores também enfatizam que as crianças devem ser encorajadas a lerem para interpretar o texto, atingindo o sentido global do texto, ao invés de simplesmente decodificarem o que está escrito. Isso porque a decodificação pode não ultrapassar o nível de identificação visual, quando a criança sabe pronunciar o que está escrito, mas não é capaz de atribuir significado àquilo. Ao contrário da decodificação, a interpretação, segundo Cabral (1986), envolve a capacidade crítica do leitor, é o momento em que se demonstra a capacidade de julgar o que está sendo lido. A. 33.

(34) interpretação, para Cabral (1986) é uma capacidade idiossincrática, o que permite dar ao texto várias possibilidades de leitura. Por fim, tendo visto que a leitura pode ser considerada um processo eminentemente visual (NAZIR E BRYSBAERT, 2005) e baseada nos mecanismos da linguagem (RAYNER et al., 2016), é fato que ela interfere diretamente na organização cerebral ao criar uma interface eficiente entre a visão e a linguagem. Desta forma, destinamos a próxima seção à aprendizagem da leitura, para compreendermos melhor as alterações na arquitetura cerebral e cognitiva que a leitura é capaz de promover.. 2.1.2 A aprendizagem da leitura na infância. Gabriel, Morais e Kolinsky (2016) trazem a aprendizagem da leitura como ferramenta importante, já que é uma tarefa complexa e que requer o acesso e manipulação de grandes quantidades de informações. Para Gabriel et al. (2016), ler é um aprendizado cultural que altera a memória, considerando que para executar a leitura será preciso que a MT e a memória de curto prazo interajam e busquem representações na memória de longo prazo. A leitura, segundo Gabriel et al. (2016), traz ganhos importantes. A habilidade de manipular unidades fonológicas como em gato, pato, mato, por exemplo, não é adquirida espontaneamente, mas pode ser aprendida mesmo por quem somente conseguiu ler na idade adulta. O desenvolvimento do princípio alfabético – recurso disponível somente para quem aprende a ler – segundo os pesquisadores, refina o sistema de representações mentais do aprendiz. Frith (1985), por sua vez, apresenta quatro estágios de desenvolvimento da leitura que são sucessivos na vida escolar da criança. Para os estágios mencionados, Frith (1985) destaca uma importante estratégia de aprendizagem peculiar a cada um deles. No primeiro, conhecido como “rota da aprendizagem”, a criança tenta adivinhar a palavra a ser lida com base no contexto; no segundo estágio, pela primeira vez, a. 34.

(35) criança se baseia no contexto linguístico para deduzir a palavra; no terceiro, há uma decodificação sequencial de cada letra e de cada fonema e; no quarto estágio, acontece uma decodificação hierárquica, a interpretação de cada letra depende do contexto em que está inserida, como a letra “c”, por exemplo, que pode assumir mais de um som. Em sequência ao desenvolvimento da leitura, Frith (1985) apresenta três fases com suas respectivas estratégias, elas são: logográfica, alfabética e ortográfica. A habilidade logográfica inclui o reconhecimento instantâneo de reconhecer palavras familiares, e alguns formatos gráficos podem funcionar como pistas importantes neste processo. A ordem das letras ainda não é levada em conta pela criança e, se ela não reconhece a palavra, provavelmente se recusará a dizer o que está escrito. Já a habilidade alfabética refere-se à correspondência grafema-fonema e suas associações, há uma percepção mais analítica e a ordem das letras já faz diferença nesta fase. Com base na percepção visual, é na fase alfabética que a criança pode ser capaz de pronunciar novos sons ainda que não seja da forma correta. Concluindo a sequência, Frith (1985) apresenta a habilidade ortográfica, que envolve o reconhecimento instantâneo da palavra em unidades ortográficas sem conversão fonológica. Esta habilidade se distingue da logográfica por ser analítica de uma maneira sistemática e por ser não-visual, e se diferencia da alfabética por ser não-fonológica e por envolver unidades maiores. Frith (1985) apresenta as estratégias que ela acredita ser importantes para o desenvolvimento da leitura, mas que podem ficar disponíveis para o leitor em todo o período da aprendizagem, sem impedi-lo de recorrer a uma anterior. Contudo, ao contrário de Frith (1985), Ehri (2005) prefere apresentar estágios ao invés de fases. Isso porque, para ela, os estágios quase sempre apresentam relação de dependência em relação ao próximo, ou seja, um estágio geralmente é requisito para o outro, o que faz mais sentido em tratando-se da aprendizagem da leitura. Ehri (2005) aborda a aprendizagem da leitura na infância como um campo ainda muito cheio de desafios para os pesquisadores. Para ela, compreender o processo de aprendizado da leitura desde o início é importante para melhorar as instruções dadas em sala de aula, por exemplo. Este processo de aprendizagem, segundo Ehri (2005) tem. 35.

(36) início com a leitura de textos que preenchem as mentes com muitas ideias e, para estas ideias, há uma rota feita com palavras que farão a correspondência a cada uma delas. Ainda que não haja muita prática com a leitura, sabe-se que as palavras são pronunciadas sempre da mesma maneira, o que as torna unidades mais confiáveis para o processo de ler que tem início com o movimento dos olhos. Contudo, a relação grafemafonema pode variar bastante. (EHRI, 2005). Segundo Ehri (2005), compreender como o desenvolvimento da leitura acontece ajuda a entender como os leitores proficientes reconhecem as palavras escritas de maneira automática e com precisão. Esta automaticidade, segundo Ehri (2005) pode acontecer de quatro formas diferentes: (1) através da decodificação, quando grafemas são transformados em fonemas, ou quando blocos de letras – chunks – passam a ser palavras; (2) através da analogia, quando uma palavra conhecida ajuda na leitura de uma palavra nova, como “fazer” pode ajudar a reconhecer a palavra “desfazer”, por exemplo; (3) a predição, que leva em conta o contexto para deduzir palavras não-familiares e; (4) a memória ou a visão, que pode ser aplicada às palavras que já foram lidas anteriormente, e o cérebro as reconhece logo que os olhos as fitam novamente. Após o processo de reconhecimento de palavras, Ehri (2005) destaca as quatro fases mais relevantes no aprendizado da leitura. Para ela, estas fases refletem o tipo de conhecimento alfabético que predomina nas conexões que a criança é capaz de fazer: (1) pré-alfabética: nesta fase as crianças ainda conhecem pouco do sistema alfabético e não são capazes de fazer conexões. As que demonstram alguma capacidade, provavelmente utilizam a memória ou associações, mas mesmo assim são consideradas não-leitoras, isso porque elas são capazes de fingirem que leem um livro cuja história já foi lida para elas inúmeras vezes, deduzindo o enredo com base nas ilustrações; (2) parcialmente alfabética: neste ponto as crianças já são capazes de associar os sons às letras e dependem menos de ilustrações. Devido a esta habilidade, Ehri (2005) explica que as crianças conseguem ler a palavra mesmo que ela esteja representada somente por seus principais grafemas, como em PLHÇ, por exemplo, para a palavra “palhaço”; (3) alfabética: fase em que a criança é capaz de estabelecer conexões completas entre letras e pronúncias. Isso passa a ser possível porque elas já conhecem a correspondência grafema-fonema e conseguem segmentar as pronúncias em fonemas, que se combinam. 36.

(37) com os grafemas que elas veem; (4) alfabética consolidada: as conexões grafemafonema nesta fase são para unidades maiores, até palavras completas em alguns casos. As crianças já conseguem ler rimas, sílabas, morfemas e palavras completas que já se tornaram uma unidade. Nesta fase, os chunks são importantes e podem fazer a diferença para a leitura de algumas palavras completas. Traçando um mesmo caminho, observando que as crianças já são capazes de ler de alguma maneira, Morais (1996) ressalta a importância da decodificação e da compreensão. Para ele, aprender a ler está obrigatoriamente ligado a descobrir e utilizar o princípio alfabético de correspondência entre letras e fonemas. Segundo Morais (1996), a criança reconhece, em média, mil palavras novas escritas por ano. O aumento na quantidade de palavras ano após ano é possível, segundo ele, porque a criança passa a ser capaz de identificar padrões ortográficos de maneira mais complexa e eficiente, tornando possível associar a forma fonológica e ortográfica das palavras ao seu sistema semântico, salvo casos especiais. Em se tratando de leitores proficientes, Kintsch e Rawson (2013), discutem três processos básicos envolvidos na compreensão textual. Segundo eles, compreender um texto abrange processamento em diferentes níveis, de maneira que, (1) inicialmente o leitor atinge o nível linguístico, sendo capaz de processar palavras e frases específicas contidas no texto. É preciso decodificar os símbolos gráficos presentes na leitura, já que neste nível estão presentes processos perceptivos, de reconhecimento de palavras e análise. Em seguida, (2) o significado das palavras deve ser combinado formando unidades de ideias ou proposições, sempre da forma determinada pelo texto, já que é a análise semântica que determina o significado do que está escrito. Por fim, (3) a compreensão não pode estar limitada somente ao que é explicitamente expresso no texto porque não será suficiente para um entendimento mais profundo. Para isso, o conteúdo deve ser utilizado para a construção de um modelo situacional, que seria um modelo mental criado pelo leitor com base no que leu; esse modelo é geralmente rico porque possui a interpretação do texto, conhecimento prévio e os objetivos do leitor. Passando do nível cognitivo para o social, Zorzi (2003) condiciona o aprendizado da leitura à condições sociais propícias. Este aprendizado pode ser decorrente de um contato informal com pessoas letradas, ou de maneira formal, através. 37.

(38) de encontros planejados oferecidos pela escola, por exemplo. Zorzi (2003) também relaciona o aprendizado da leitura à inteligência, à dinâmica familiar, a conhecimentos que podem ser adquiridos no dia-a-dia através de condições afetivas que possam motivar o interesse pelo aprendizado e, claro, à qualidade da instrução escolar. Quaisquer alterações em um desses fatores, ou até mesmo a ausência de um deles pode, segundo o autor, alterar negativamente o aprendizado da leitura. Para Zorzi (2003), ler é compreender, é buscar significado alcançando a relação entre os símbolos e o que eles simbolizam. Isto significa que, se uma criança é capaz de decodificar ao pronunciar o que está escrito, mas não é capaz de entender e alcançar a ideia proposta, ela não pode ser considerada leitora. Isso porque a leitura propriamente dita precisa incluir capacidades como diferenciar os sinais gráficos entre si; reconhecer o papel da escrita como um sistema que representa a linguagem oral e seus usos sociais; compreender a organização espacial da escrita sendo da esquerda para a direita; entender as regras do sistema ortográfico, incluindo a transformação de letras em sons e vice-versa, dentre outras (ZORZI, 2003). No processo de formação de um bom leitor é importante incluir a participação da família e a interação com um ambiente extra-escolar que permita o contato com a leitura. Pois, de acordo com Zorzi (2003), a relação da família com a leitura terá peso fundamental no envolvimento do aprendiz. Por outro lado, as crianças que não dispõem de um ambiente extra-escolar envolvido com a leitura e dependem somente da escola para aprenderem a ler, estarão mais propícias a serem maus leitores. Nesta última condição, a escola passa a assumir o papel mais importante de transformação no desenvolvimento destas crianças, que poderiam usufruir de um benefício maior se as escolas pudessem recebê-las um pouco mais jovens. Segundo Zorzi (2004), 60% dos alunos do ensino fundamental I apresentam baixo rendimento escolar mesmo não tendo sido diagnosticados com dificuldade de aprendizagem alguma. Somado a isto, Zorzi (2003) constatou que mais da metade destas crianças não possuem hábitos favoráveis à leitura. Para ele, este enorme conjunto de crianças que apresentam dificuldade de aprendizagem é composto, em grande parte, pelo que o autor considera pseudodistúrbios de aprendizagem.. 38.

Referências

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