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Processo 07B3026

Data do documento 25 de outubro de 2007

Relator

Santos Bernardino SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Acidente de viação > Indemnização > Danos futuros > Danos não patrimoniais > Juros de mora

SUMÁRIO

1. Na fixação da indemnização por danos futuros, no caso de incapacidade permanente, vem sendo entendido que a indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir e que se extinga no final do período provável de vida.

2. Os resultados a que este critério conduz não podem, porém, ser aceites de forma abstracta e mecânica, devendo ser temperados por juízos de equidade sempre que se mostrarem desajustados relativamente ao caso concreto.

3. A sentença, proferida em finais do ano de 2005, que elegeu, como elemento de referência para calcular a perda de ganho da lesada a partir do ano seguinte, o vencimento de 60.000$00 que ela auferia, como operária fabril, à data do acidente, ocorrido em 1997, descurou um elemento ponderativo adicional, que deveria ter tido em conta, não valorando o facto notório de que, em 2006, o vencimento daquela seria necessariamente superior. Deveria ter sido considerado, para o cálculo efectuado, na falta de outro elemento, o valor do salário mínimo nacional vigente em 2005, de € 374,70.

4. O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais, porque não visa propriamente ressarcir ou tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica.

5. Mas indemnização significativa não quer dizer indemnização arbitrária, já que ela deve ser fixada de acordo com critérios de equidade, tendo em conta as circunstâncias enunciadas no art. 494º do CC e as demais circunstâncias do caso concreto, o que significa que o juiz deve, na sua fixação, procurar um justo grau de “compensação”.

(2)

6. Se, no momento da prolação da decisão, o juiz actualiza o montante do dano liquidado para reparar o prejuízo que o lesado efectivamente sofreu, os juros de mora serão devidos, não desde a citação, mas da data do trânsito em julgado da decisão, não sendo aplicável o n.º 3 do art. 805º do CC; nos casos em que a actualização não for possível ou não tenha sido operada na decisão final, os juros são devidos desde a citação.

TEXTO INTEGRAL Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1.

Em acção com processo ordinário intentada por AA, em 06.09.1999, no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial da comarca de Loures, contra a COMPANHIA DE SEGUROS ..., S.A. (actualmente COMPANHIA DE SEGUROS Empresa-A, S.A.), reclamando desta o pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu em consequência de acidente de viação, ocorrido em 30.04.1997, e provocado pelo condutor de um veículo automóvel segurado na ré – acção em que o Centro Nacional de Pensões (a que sucedeu o Instituto de Solidariedade e Segurança Social) veio deduzir pedido de reembolso de prestações da Segurança Social – foi proferida sentença condenando a ré

- a pagar à autora as quantias de € 522,56, de despesas médicas e com deslocações, de € 14.004,41, de perdas salariais, de € 442,89, também de perdas salariais, e de € 42.010,52, por danos patrimoniais futuros, a que haverá que deduzir o valor das pensões que o ISSS venha a pagar-lhe até ao trânsito em julgado da sentença, e ainda € 50.000,00, por danos não patrimoniais – tudo acrescido de juros às taxas legais desde a citação até integral pagamento;

- a pagar ao ISSS a quantia de € 16.677,82, bem como as prestações que o Instituto vier a pagar à autora até ao trânsito em julgado da sentença.

A ré, em recurso de apelação, reagiu contra esta decisão, no que concerne aos montantes atribuídos à autora a título de danos patrimoniais futuros e de danos não patrimoniais, bem como no que tange à fixação da data da citação como dies a quo da contagem dos juros moratórios.

Não logrou, porém, qualquer êxito, pois a Relação de Lisboa, em acórdão oportunamente proferido, julgou improcedente a apelação, mantendo intocada a sentença recorrida.

Ainda inconformada, a ré traz agora a este Supremo Tribunal o presente recurso de revista, rematando as respectivas alegações com a enunciação de um leque conclusivo recondutível às seguintes proposições:

1ª - As indemnizações – de € 42.010, 52 a título de incapacidade permanente parcial, e de € 50.000,00 por danos não patrimoniais – são manifestamente excessivas, não se ajustando aos critérios jurisprudenciais

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seguidos, nem sendo conformes com a equidade, que deve presidir à sua fixação;

2ª - Ao fixá-las naqueles montantes o Tribunal a quo violou os arts. 483º, 464º, 496º, 562º, 564º e 566º, todos do Código Civil, arbitrando quantias superiores às que resultam dos pressupostos das referidas normas jurídicas, devendo o respectivo acórdão, quanto a estas questões, ser revogado, elaborando-se nova decisão na qual a recorrente seja condenada no pagamento à autora das quantias de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) a título de danos patrimoniais, e de € 20.000,00 (vinte mil euros), como compensação por danos não patrimoniais;

3ª - Ao fixar os montantes ora em discussão, a sentença da 1ª instância operou a sua actualização à data da sua prolação, aplicando os critérios do art. 562º do CC, pelo que não poderia condenar em juros moratórios desde a citação, mas sim desde aquela aludida data;

4ª - A Relação, mantendo o assim decidido, fez errada aplicação e interpretação dos arts. 494º, 496º, 562º, 564º, 566º e 805º do CC, e do acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ n.º 4/2002, de 9 de Maio, devendo o acórdão recorrido ser, nessa parte, revogado, determinando-se que os juros de mora são devidos apenas desde a data em que foi proferida a sentença da 1ª instância.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre agora conhecer e decidir.

2.

São os seguintes os factos que vêm provados das instâncias:

1) No dia 30 de Abril de 1997, cerca das 20 horas, na Estrada de Casal de Cambra-Caneças (no cruzamento com o Casal Novo), do concelho de Loures, ocorreu um acidente de viação;

2) Na altura estava bom tempo e o piso estava seco;

3) Foram intervenientes neste acidente o veículo ligeiro de mercadorias de marca Toyota Dina, de matrícula RQ, conduzido pela autora, e o veículo ligeiro de passageiros de marca Renault LT, de matrícula LQ, conduzido pelo segurado da ré, BB;

4) O veículo conduzido pela autora circulava dentro do cruzamento, virando à esquerda atento o seu sentido de marcha,

5) Enquanto que o Renault LT, conduzido por BB, circulava no sentido Caneças-Casal de Cambra, tendo entrado no referido cruzamento não respeitando o veículo da autora, que se lhe apresentava pela direita;

6) Assim foi que o segundo veículo, que seguia a velocidade excessiva e apesar de ter feito uma travagem de vários metros, não conseguiu evitar a colisão, tendo embatido com a frente do lado esquerdo na parte lateral esquerda da cabine e carroçaria do veículo da autora;

7) A ré aceitou que este embate é imputável ao condutor do LQ e pagou algumas despesas médicas no valor de 66.900$00, bem como 57.499$00 da reparação do veículo da autora;

8) A responsabilidade pelos danos causados pelo veículo LQ havia sido transferida para a ré através de contrato de seguro titulado pela apólice n.º 43-021512/02;

9) Por causa do embate, a autora sofreu traumatismo craniano com contusão cerebral e perda de conhecimento e traumatismo do membro inferior direito, tendo de imediato sido transportada para o

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Hospital de Santa Maria, onde recebeu os primeiros tratamentos;

10) A autora, à data do acidente, tinha 34 anos de idade e gozava de boa saúde, não sofrendo de qualquer doença física ou psíquica, com uma grande alegria de viver e constante boa disposição;

11) Como consequência das lesões sofridas, a autora ficou permanentemente portadora de tremor fino, disartria e ataxia moderadas com alterações marcadas do equilíbrio e na marcha que se encontram afectados por alterações constantes e irregulares do tónos dos membros inferiores, alguns tiques e intenso desequilíbrio, bem como síndrome comocional pós-traumático caracterizado por cefaleias, tonturas, alterações mnésticas, ansiedade, depressão, irritabilidade, insónia, alterações do comportamento e impulsividade aumentada, tudo causador de uma incapacidade permanente de 28% para as tarefas comuns e indiferenciadas da vida, nomeadamente tarefas domésticas, e de uma incompatibilidade total com o exercício da sua actividade profissional, bem como com todas as profissões no âmbito da sua preparação técnico-profissional;

12) A autora sofre com as dores que sente e com o facto de não se sentir bem sozinha, devido às suas perdas de equilíbrio, dificuldade em coordenar os movimentos e dificuldade em se expressar;

13) A autora sofre muito com a sua dificuldade em tomar conta da sua filha menor;

14) A autora é operária fabril e encontrava-se a trabalhar à data do acidente, tendo ficado de baixa desde a data deste, deixando de receber o seu vencimento de cerca de 60.000$00 mensais e passando a receber apenas a pensão mensal prestada pelo CNP;

15) Para além do valor pago pela ré a título de despesas médicas, a autora tem tido outras despesas médicas em valor não inferior a 54.763$00;

16) Das deslocações às consultas bem como à fisioterapia a autora despendeu quantias não inferiores a 50.000$00;

17) A autora é a beneficiária n.º ... do Centro Nacional de Pensões;

18) Em 28.04.00 a referida beneficiária requereu ao Centro Nacional de Pensões a pensão de invalidez;

19) Realizada a (reunião da) CVIP (Comissão de Verificação da Incapacidade Permanente) em 07.07.00, foi a beneficiária considerada incapaz definitivamente para o exercício da sua profissão, por acidente de viação;

20) Em consequência dessa verificação e porque a beneficiária reunia os requisitos legalmente exigidos, em 21.10.00 foi-lhe deferida pelo Centro Nacional de Pensões a pensão de invalidez a partir de 29.04.00;

21) Desde Abril de 2000 a Janeiro de 2001 foram pagas à beneficiária ora autora pensões no valor total de 466.780$00, sendo o valor mensal da pensão, em Janeiro de 2001, de 39.960$00, ascendendo o valor total das pensões pagas até 31.05.05 a 15.025,75 euros e sendo o valor actual da pensão de 236,01 euros.

3.

São três as questões a decidir no âmbito da revista – duas delas relacionadas com a fixação do montante indemnizatório devido à autora pelo dano patrimonial futuro (a primeira) e pelo dano não patrimonial (a segunda), e a terceira respeitante ao momento temporal a partir do qual são devidos os juros de mora fixados nas decisões das instâncias.

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Nada, pois, de diferente daquilo que constituiu o thema decidendum do recurso de apelação.

Vejamos, pois, cada uma delas.

3.1. Na decisão da 1ª instância, as quantias de € 14.004,41 e € 442,89, atribuídas à autora, foram-no a título de perdas salariais até ao final do ano de 2005.

O montante de € 42.010,52 foi fixado a título de danos patrimoniais futuros que a autora suportará a partir do ano de 2006.

É esta a questão que está em aberto.

Para chegar àquele montante, a Ex.ma Juíza que proferiu a sentença – depois de considerar que a perda de ganho anual da autora se cifra em € 4.189,92, correspondente ao vencimento mensal de € 299,28 (60.000$00) vezes 14 meses – apresentou a seguinte fundamentação:

Passando a calcular-se a perda de ganho da autora a partir do ano de 2006, verifica-se que, nesse ano de 2006, a autora há-de perfazer 43 anos, pelo que, considerando-se que a esperança de vida activa pode ir até aos 70 anos, são 27 os anos em que terá uma perda anual de 4.189,92 euros, a que corresponde o índice de 10,026570 para o cálculo do capital correspondente à perda de ganho durante a sua vida activa.

Deverá, portanto, fixar-se a indemnização pelos danos patrimoniais futuros em 42.010,52 euros (4.189,92x10,026570).

A esta quantia deverá ser sempre deduzido o valor de prestações que eventualmente lhe sejam pagas pela Segurança Social até ao trânsito em julgado desta decisão.

A Relação considerou adequada a aludida indemnização, realçando embora que o fazia essencialmente, no quadro factual apurado, por apelo a juízos de equidade, “ante a dificuldade de averiguar com exactidão a extensão dos danos, já que as fórmulas financeiras utilizadas na determinação do quantum indemnizatório por danos patrimoniais futuros apenas relevam como meros elementos instrumentais”.

Que dizer?

Constitui entendimento pacífico o de que o lesado que vê diminuída, em termos definitivos, a sua capacidade laboral por força do facto lesivo de outrem, tem direito a ser ressarcido pelo prejuízo que daí lhe advém. Tal diminuição acarreta, em termos de normalidade, a diminuição do resultado do seu trabalho e a consequente redução da retribuição desse trabalho; e mesmo que não haja diminuição salarial, vem este Supremo Tribunal entendendo que a IPP (incapacidade permanente parcial) dá lugar a indemnização por danos patrimoniais, ponderando que o dano físico determinante da incapacidade exige do lesado um esforço suplementar, físico e psíquico, para obter o mesmo resultado do trabalho.

O entendimento primeiramente enunciado tem, aliás, expressa consagração legal.

Na verdade, estabelece o art. 564º/2 do CC (1) que “na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.

Não é, porém, tarefa fácil a fixação da indemnização relativa aos danos futuros.

Vários são os critérios que têm sido propostos para determinar essa indemnização, sendo que, ultimamente, a nossa jurisprudência vem acolhendo a solução de que a indemnização do dano futuro decorrente de incapacidade permanente deve corresponder a um capital produtor do rendimento que o

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lesado não irá auferir e que se extinga no final do período provável de vida, ou seja, um capital que se extinga no fim da vida provável da vítima e que seja susceptível de garantir, durante essa vida, as prestações periódicas correspondentes ao rendimento perdido (2).

Tal critério cumpre, mas só tendencialmente, o princípio geral válido em matéria de obrigação de indemnização: reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art. 562º). Por isso, os seus resultados não podem ser aceites de forma abstracta e mecânica, devendo ser temperados por juízos de equidade (cf. art. 566º/3) – que assentem na idade e tempo provável de vida da vítima, na actividade profissional por esta desenvolvida e no tempo provável da sua duração, nas suas condições de saúde ao tempo do evento, na flutuação futura do valor do dinheiro, etc. – sempre que se mostrarem desajustados relativamente ao caso concreto.

A equidade funciona, pois, como elemento de correcção do resultado que se atinja a partir do aludido critério ou de outro (como o utilizado na sentença da 1ª instância) que recorra a tabelas financeiras para o cálculo do dano futuro.

À data do acidente a autora tinha 34 anos de idade, e era operária fabril, com um vencimento mensal de cerca de 60.000$00.

Como consequência das lesões sofridas no acidente, ficou a padecer de uma incapacidade permanente de 28% para “as tarefas comuns e indiferenciadas da vida” – isto é, para as actividades correntes do dia-a-dia – e de uma incapacidade definitiva para o exercício da sua actividade profissional ou de qualquer outra profissão compatível com a sua preparação técnico-profissional.

Ficou de baixa desde a data do acidente, deixando de receber o seu vencimento e passando a receber apenas a pensão mensal da Segurança Social.

Atingido o tempo-limite da baixa, requereu ao Centro Nacional de Pensões a pensão de invalidez.

Passou, por isso, após exame por junta médica da CVIP da Segurança Social, à situação de pensionista por invalidez, com efeitos a partir de 29.04.00, recebendo a correspondente pensão, que era, em 2005, de € 236,01.

A sentença da 1ª instância, proferida em 09.12.2005 elegeu, para calcular a perda de ganho da autora a partir do ano de 2006, o vencimento que esta auferia à data do acidente, i.e., há mais de oito anos, (os já aludidos 60.000$00 mensais, equivalentes a € 299,28) – considerando uma perda anual de € 4189,92 (€

299,28x14 meses).

Descurou, assim, um elemento ponderativo adicional, e que deveria ter tido em conta, face ao acima mencionado princípio geral válido em matéria de obrigação de indemnização, por forma a conseguir a reconstituição da situação que existiria se não tivesse ocorrido o facto danoso.

Na verdade não valorou o facto notório de que, em 2006, o vencimento da autora não se quedaria nos escassos 299,28 euros – seria superior ao montante da remuneração mínima mensal (3), que em 2005 se situou nos € 374,70 (art. 1º do Dec-lei 242/2004, de 31 de Dezembro), e atingiu € 385,90 em 2006 (art. 1º do Dec-lei 238/2005, de 30 de Dezembro) – pelo que o ponto de partida para o cálculo da perda de rendimento futuro, a partir daquele ano de 2006, teria de ser necessariamente superior ao considerado, devendo ser tido em conta, à míngua de outro elemento, o valor do salário mínimo nacional vigente na data da prolação da sentença, o que teria como efeito situar a perda salarial anual da autora, ainda assim

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por defeito, em € 5.245,80 (€ 374,70x14 meses).

Considerando uma taxa de juro de 5% (4) , o capital necessário para produzir anualmente este rendimento seria de € 104.916,00.

É óbvio que esta importância teria de sofrer vários e significativos ajustamentos.

Desde logo, porque a autora recorrida receberá de uma só vez aquilo que, em princípio, deveria obter em fracções anuais, o que lhe permitirá rentabilizar em termos financeiros o montante recebido. Para obstar a uma situação de injustificado enriquecimento à custa alheia, sempre haveria que proceder a um desconto, e, diga-se, muito substancial. Só assim se evitará que a recorrente fique colocada numa situação em que receba os juros, mantendo-se o capital intacto (5) .

Sendo, aliás, conhecido o quantum da diminuição anual do rendimento, decorrente da incapacidade definitiva para o exercício da sua actividade profissional, outro caminho mais fácil poderia trilhar-se, tendo como ponto de partida a idade da autora em 2006 (43 anos). Admitindo que o seu período de vida activa findaria aos 65 anos de idade – a partir dos quais deixaria de poder falar-se em perda salarial, com a passagem à situação de reforma e o percebimento da respectiva pensão – a perda de rendimento atingiria

€ 115.307,60 (€ 52450,80x22 anos). E, como se refere no estudo do Conselheiro Sousa Dinis, citado na nota (4), quanto mais baixa for a idade da vítima, maior deverá ser a tendência para nos aproximarmos da quantia encontrada (a partir das fórmulas matemáticas usadas) ou mesmo ultrapassá-la; quanto mais alta for essa idade, maior será a tendência para nos desviarmos dela, para baixo.

Considerando todos os factores acima referidos, temos por seguro que a indemnização fixada na sentença da 1ª instância, e mantida no acórdão recorrido, se quedou muito aquém do montante que, por efeito da intervenção temperadora da equidade, era adequado atribuir à autora, pelos danos patrimoniais futuros resultantes da incapacidade permanente de que ficou a padecer, que a incapacitou totalmente de trabalhar no seu ofício, sem possibilidade de reconversão – conclusão que tem como efeito desconsiderar, no âmbito da revista, a pretensão da recorrente de lhe ver ainda cortada uma fatia significativa.

O quantum encontrado pelas instâncias manter-se-á inalterado, já que a autora com ele se conformou, nem sequer reagindo contra esta última tentativa da recorrente no sentido de o fazer minguar.

3.2. No que concerne aos danos não patrimoniais, a sentença da 1ª instância fixou-os, como vimos, em

€ 50.000,00, montante que a Relação reputou equilibrado, adequado e equitativo.

A recorrente, já o dissemos, pugna pela sua fixação em € 20.000,00.

Avançando, desde já, o nosso entendimento, diremos que, se ali pecaram por defeito, na avaliação feita aos danos não patrimoniais as instâncias usaram de critério que conduziu a um resultado manifestamente excessivo.

“Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”. Assim textua o art. 496º/1.

De acordo com o n.º 3 do mesmo normativo, “o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º”.

Como se refere em acórdão deste Tribunal (6) , a gravidade do dano é um conceito relativamente indeterminado, carecido de preenchimento valorativo a fazer caso a caso, de acordo com a realidade

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fáctica apurada. Todavia, e como refere Antunes Varela (7, não obstante dever essa apreciação ter em conta as circunstâncias de cada caso, a gravidade deverá medir-se por um padrão objectivo, e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria e embotada do lesado; e, por outro lado, deverá ser apreciada em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.

O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado, em qualquer caso, segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado, e às demais circunstâncias do caso (entre as quais se contam, seguramente, as lesões sofridas e os respectivos sofrimentos, físicos e psíquicos), devendo ter-se em conta, na sua fixação, todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (8).

Sendo certo que nestes casos a indemnização não visa propriamente ressarcir, tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido, é mister que tal compensação seja significativa, e não meramente simbólica. A prática deste Supremo Tribunal acentua cada vez mais a ideia de que está ultrapassada a época das indemnizações simbólicas ou miserabilistas para compensar danos não patrimoniais. Importa, todavia, sublinhar que indemnização significativa não quer dizer indemnização arbitrária. O legislador manda, como vimos, fixar a indemnização de acordo com a equidade, sem perder de vista as circunstâncias, já enunciadas, referidas no art. 494º – o que significa que o juiz deve procurar um justo grau de “compensação”.

No caso em apreço, não se suscitam dúvidas quanto a ter a autora sofrido danos de natureza não patrimonial, sendo igualmente inquestionável que eles assumem gravidade suficiente para justificar a intervenção reparadora do direito.

As dores físicas de que padeceu em consequência das lesões sofridas e o sofrimento moral e psíquico e o mal estar emocional resultantes das sequelas das mesmas lesões (cfr. n.º 11 da matéria de facto supra) e da dificuldade em tomar conta da filha, não consentem dúvidas a tal respeito.

Intervindo também aqui, na fixação do montante indemnizatório, a equidade, como já ficou assinalado, importa à realização da justiça do caso concreto, que vai implicada no juízo de equidade, que se tenha em conta, na valoração do dano em apreço, o juízo técnico que flui do relatório médico-legal do IML junto aos autos, que situa o “quantum doloris” no grau médio (numa escala de 1 a 7), e qualifica como médio, na mesma escala, o “prejuízo de afirmação pessoal” – que, no caso em apreço, é justificado “pelos sentimentos de menor valia resultantes do seu (da autora) handicap, que impedem a sua satisfação pessoal, familiar e social” – e como moderado o “dano estético”, traduzido no tremor constante dos membros e da cabeça.

Estamos, pois – repete-se – perante danos não patrimoniais cuja gravidade, objectivamente considerada, justifica e impõe a tutela do direito.

Assim, considerados os demais factores relevantes na formulação do juízo de equidade para a fixação do quantum indemnizatório – designadamente o modo de produção do acidente, unicamente devido a culpa do segurado da ré, e a situação económica desta e da autora lesada – e não perdendo de vista o sentido das decisões jurisprudenciais mais recentes sobre a matéria, i.e., os padrões de indemnização que vêm

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sendo adoptados pela jurisprudência, que constituem também circunstância a ter em conta no quadro das decisões que façam apelo à equidade, temos por ajustado fixar em € 25.000,00 a indemnização a que tem jus a autora, pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do acidente.

3.3. Falta abordar a questão dos juros moratórios fixados na decisão recorrida, que os considerou devidos desde a citação, por a sentença da 1ª instância não ter expressamente procedido à actualização da indemnização.

Solução que a recorrente questiona, sustentando que ao arbitrar a indemnização, o Juiz da 1ª instância teve em conta a data em que proferiu a sentença, o que significa que procedeu à actualização daquela. E, por isso, os juros de mora só são devidos desde a data da sentença.

Quid inde?

De acordo com o n.º 3 do art. 805º, nos casos de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco a regra é a de que o devedor se constitui em mora desde a citação.

Certo é, porém, que não pode perder-se de vista o disposto no n.º 2 do art. 566º, que, apontando para uma indemnização integral e actual, reportada à data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, cria algumas dificuldades de compatibilização com aqueloutro preceito.

Na verdade, se no momento da prolação da decisão, o juiz actualiza o montante do dano liquidado para reparar o prejuízo que o lesado efectivamente sofreu, os juros moratórios, a serem concedidos desde a citação para a acção, representarão uma duplicação de parte do ressarcimento, e este excederá o prejuízo efectivamente verificado.

E é assim porque, de acordo com o critério da diferença assumido no n.º 2 do art. 566º, a obrigação pecuniária em que se converte a dívida de valor do dano determinado, cobre todo o dano efectivamente sofrido – dano emergente e lucro cessante – pelo que a aplicação do n.º 3 do art. 805º, neste caso, resultaria num cúmulo injustificado.

Tudo isto para concluir que, em casos em que, pela via da actualização, seja concedida a reparação integral dos danos até à decisão actualizadora, a aplicação literal do n.º 3 do art. 805º terá de ser afastada, devendo corrigir-se o termo a quo nele contemplado, relegando-o para a data da decisão actualizadora – recte, do trânsito em julgado desta.

Já nos casos em que a actualização não for possível ou não tiver sido operada na decisão final, nada obsta à aplicação irrestrita deste preceito, impondo-se essa aplicação como forma de permitir a reparação integral do dano e respeitar o crédito de valor.

Este entendimento obteve plena consagração em acórdão uniformizador, deste Supremo Tribunal (Jurisprudência n.º 4/2000, de 09.05.2002, in DR I Série-A, de 27.06.2002), que fixou a seguinte norma interpretativa:

Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos arts. 805º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.

Pois bem!

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Lida e relida a sentença da 1ª instância, em lugar algum se surpreende a mínima alusão a eventual actualização dos montantes indemnizatórios aí arbitrados à autora. E a Relação também nada encontrou, por isso que concluiu que “dado que a sentença recorrida não refere expressamente que os montantes indemnizatórios foram actualizados à data da prolação da mesma, deve entender-se que aqueles não o foram (...)”.

E, efectivamente, não é cabível outro entendimento.

Basta atentar em que, para o apuramento do montante do dano patrimonial futuro, computado a partir de 2006, o Ex.mo Juiz usou como elemento de referência, como já se deixou evidenciado, o salário – de todo desactualizado na data da sentença – que a autora auferia na data do acidente, claramente inferior ao salário mínimo nacional então vigente.

E se assim fez – se, para a liquidação do dano patrimonial apurado raciocinou com os valores reportados à data do acidente – nada autoriza a concluir que tenha divergido no que concerne ao dano não patrimonial.

Ou seja: a liquidação dos danos, tal como efectuada na sentença, não se mostra reportada “à data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal”, não foi objecto de cálculo actualizado, pelo que logra plena aplicação ao caso o disposto no n.º 3 do art. 805º, improcedendo o que, ex adversu, vem defendido pela recorrente.

4.

Nos termos expostos, concede-se a revista apenas no que concerne ao montante que vem firmado para os danos não patrimoniais, que se fixam em € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), confirmando-se, no mais, o acórdão recorrido.

Custas, aqui e nas instâncias, por autora e ré, na proporção do vencido.

Lisboa, 25 de Outubro de 2007 Santos Bernardino

Bettencourt de Faria Pereira da Silva

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(1) São deste Código os preceitos citados na exposição subsequente sem indicação de origem.

(2) Neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos deste Tribunal, de 25.06.02, Col. Jur.- Acs. do STJ, X, 2, 132, de 19.10.2004 (revista n.º 2897/04, da 6ª Sec.), e de 16.12.2004 (revista n.º 3839/04, da 2ª Sec.).

(3) Tal como sucedia na data do acidente, em que o salário mínimo nacional então em vigor era de 56.700$00.

(4) Conforme informa o jornal Público, na página 38 da edição de 17 de Setembro, neste momento já se encontram taxas de depósitos a prazo de 4% e 5% e a taxa dos certificados de aforro da Direcção-Geral do Tesouro foi, em Setembro, fixada em 3,546%. Sobre este ponto, cfr. também o estudo do Juiz Conselheiro Sousa Dinis, Dano Corporal em Acidentes de Viação, Separata da Col. Jur. - Acs. do STJ, X, 1, pág. 9.

(5) Estudo citado, pág. 9.

(6) Ac. de 30.09.2003, na rev. 1949/03, da 6ª Secção.

(11)

(7) Das Obrigações em Geral, 7ª ed., vol. I, pág. 600.

(8) Cf. autor citado, Das Obrigações em Geral, 2ª ed., vol. I, pág. 486.

Fonte: http://www.dgsi.pt

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