• Nenhum resultado encontrado

Maira Baldan Fechio Rodrigues Pereira

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Maira Baldan Fechio Rodrigues Pereira"

Copied!
173
0
0

Texto

(1)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

MAÍRA BALDAN FECHIO RODRIGUES PEREIRA

A relação profissional-paciente em um programa de reabilitação de pessoas com deficiência física

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

MAÍRA BALDAN FECHIO RODRIGUES PEREIRA

A relação profissional-paciente em um programa de reabilitação de pessoas com deficiência física

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

Dissertação apresentada à Banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Psicologia Clínica - Núcleo de Psicossomática e Psicologia Hospitalar, sob a orientação da Prof.ª Dra. Mathilde Neder.

(3)

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________

_______________________________________________

(4)

Dedico este trabalho aos meus amores. Ao meu marido Guti, por todo o seu companheirismo simples e

(5)

AGRADECIMENTOS

À Professora Dra. Mathilde Neder, uma grande pioneira da Psicologia no Brasil. Agradeço pela valiosa orientação e pela oportunidade de conhecer mais de perto sua brilhante história de luta pela Psicologia no Brasil.

Aos excepcionais professores Doutores Maria Helena Franco e Avelino Luiz Rodrigues por aceitarem tão prontamente fazerem parte da banca examinadora e por suas valorosas contribuições na avaliação de minha dissertação .

À Dra Vera Rodrigues Alves pelo incentivo e por sempre se mostrar disponível e aberta a colaborar com este projeto.

À Harumi K. Nemoto, que muito mais que minha chefe, posso hoje chamar de amiga. Cotidianamente presente, me apoiando, pensando junto e discutindo comigo caminhos para a concretização deste trabalho.

À minha amada amiga Camila Vasco, pelo prazer e sorte de poder viver com você todos os momentos desta louca jornada. Entramos juntas e saímos juntas e unidas. Nunca vou me esquecer de você. A melhor companheira. Fiel, confidente, paciente, inteligente, guerreira. Não lhe faltam qualidades. Por suas palavras, opiniões e sugestões tão valiosas só posso agradecer imensamente. Desejo lindos frutos a partir desta nova fase que se inicia e que a gente ainda possa viver muitas outras aventuras juntas!!!

Às amigas da pós-graduação Patrícia e Ana Paula Bonilha pelo carinho e sensibilidade ao longo deste tempo que passamos juntas.

(6)

A todos os colegas de profissão, que se dedicam ao cuidado com a saúde e, em especial, aos colaboradores desta pesquisa, que tão gentilmente cederam seu tempo e mostraram uma enorme disponibilidade e confiança no encontro comigo.

(7)

“[…] O espírito humano é mais forte que qualquer remédio. E é isso que precisa ser alimentado por meio do trabalho, lazer, da amizade e da família. Isso é o que importa. Foi disso que nos esquecemos. Das coisas mais simples”.

(8)

RESUMO

Por meio deste estudo buscou-se investigar a relação profissional de saúde e paciente com deficiência física a partir da percepção de profissionais que atuam na assistência em um programa de reabilitação física. Inicialmente foi realizada uma revisão de conceitos relacionados à saúde; conceitos de humanização; Reabilitação Física; e de conceitos teóricos oriundos de teorias voltadas para a questão do cuidado e vínculo terapêutico. Os teóricos destacados no estudo são Michael Balint e Jonh Bowlby. Os dois autores foram eminentes Psicanalistas que se dedicaram ao estudo das relações humanas e mais especificamente, cada um a seu modo, aos aspectos do vínculo nas relações de cuidado. Posteriormente foi apresentada a pesquisa realizada junto a 11 profissionais da área da saúde (Assistentes sociais, Psicólogos, Enfermeiros, Fisioterapeutas, Fonoaudiólogos, Nutricionistas). Os profissionais participaram de uma entrevista semi estruturada, com enfoque em questões pertinentes a temática. A partir destas informações contidas no discurso deste grupo foi possível discutir alguns aspectos relevantes presentes nesta prática. A maior parte dos indivíduos valoriza a escuta, o acolhimento e a empatia como importantes qualidades e recursos para o encontro terapêutico. A experiência de estágio acadêmico é apontada como uma importante ferramenta para a preparação e formação do profissional, no que se refere ao seu contato com o paciente, mas a maior parte se queixa da falta de maior espaço nos meios acadêmicos para discussão referente a temática da relação profissional-paciente, que todos valorizam como importante para a qualidade da atuação e efetividade do serviço. A relação estabelecida com os pacientes, representa para estes profissionais uma oportunidade de oferecimento de auxilio ao próximo e também de crescimento e valorização da própria vida. Entretanto, estes também descrevem que muitas vezes identificam o surgimento de medos, angustias e sofrimento diante do compartilhamento da experiência do paciente. O grupo refere receios em relação a própria saúde e integridade física e mental. Parte destes destacaram dificuldades em lidar com aspectos institucionais, relações entre profissionais , a falta de tempo e sobrecarga de trabalho . Todo o grupo evidencia consciência sobre a necessidade do profissional de saúde adotar medidas e ações que garantam a sua própria saúde de maneira integral, entretanto através de suas colocações é possível perceber que parte destes cuidados são negligenciados ou excluídos de suas práticas cotidianas de atenção à saúde. Diante do impacto emocional muitos procuram apoio e suporte junto à espiritualidade, ao contato com seus familiares, amigos e colegas de trabalho, mas reforçam que a participação em uma atividade estruturada e focada nesta temática poderia oferecer uma melhor oportunidade de desenvolvimento de recursos pessoais para o enfrentamento mais adequado destes aspectos subjetivos que muitas vezes não encontram espaço para discussão e elaboração na realidade cotidiana. O discurso expresso por este grupo de profissionais não permite generalizações, entretanto justifica a realização de estudos futuros e chama a atenção para a necessidade de estruturação de recursos e ferramentas para que os diversos profissionais de saúde possam se desenvolver e oferecerem um atendimento de qualidade através do qual possam contribuir de maneira ainda mais efetiva com a saúde de pacientes, sem deixar de considerar a sua própria saúde e integridade.

(9)

ABSTRACT

Through this study we sought to investigate the relationship health professional and patient with physical disabilities from the perception of professionals working in care in a physical rehabilitation program. Initially a review of concepts related to health was conducted; humanization concepts; Physical Rehabilitation; and theoretical concepts from theories focused on the issue of care and therapeutic bond. Seconded theorists in the study are Michael Balint and John Bowlby. The two authors were eminent psychoanalysts who have dedicated themselves to the study of human relations and more specifically, each in his own way, aspects of the bond in care relations. Later was presented the survey of 11 health professionals (social workers, psychologists, nurses, physiotherapists, speech therapists, nutritionists). The professionals participated in a semi-structured interview, focusing on issues relevant to theme. From this information contained in the speech of this group was able to discuss some important issues involved in this practice. Most individuals values listening, acceptance and empathy as important qualities and resources for the therapeutic encounter.. The academic internship experience is seen as an important tool for the preparation and training of professional, with regard to its contact with the patient, but most complained about the lack of larger space in the academic discussion related to the theme of professional-patient relationship, that all value as important to the quality of the performance and effectiveness of the service. The relationship established with patients, is for these professionals a help of offering opportunity to the next and also of growth and appreciation of life itself. However, they also report that often identify the emergence of fears, anguish and suffering before the sharing of patient experience. The group refers fears about their health and physical and mental integrity. Of these highlighted difficulties in dealing with the institutional aspects, the relationships between professionals and hierarchies, lack of time and workload. Shines the spotlight awareness of the need for health professionals to adopt measures and actions to ensure their own health in a comprehensive way, but through its investments you can see that part of these precautions are overlooked or excluded from their daily health care practices . Given the emotional impact many seek help and support with the spirituality, the contact with their families, friends and co-workers, but reinforce that participation in a structured and focused activity on this theme would offer a better personal resources development opportunity for more adequately cope with these subjective aspects that often find no room for discussion and elaboration in everyday reality. The speech expressed by this group of professionals does not allow generalizations, however justify the need for future studies and draws attention to the need for structuring resources and tools for many health professionals can develop and offer quality care through which can contribute even more effectively with the health of patients, while considering their own health and integrity.

(10)

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Características Gerais dos participantes 89

Quadro 2: Subcategorias 91

Quadro 3: Concepções relacionadas às suas atribuições e papel na relação com o

paciente com deficiência física 93

Quadro 4: Interferência do meio familiar do paciente, a equipe de profissionais e o

ambiente institucional 99

Quadro 5: Contribuição acadêmica para a formação profissional 106

Quadro 6: Dificuldades e frustrações no trabalho de assistência junto aos pacientes

e quais as estratégias de enfrentamento adotadas. 112

Quadro 7: Recursos e habilidades pessoais que reconhecem e valorizam em si

mesmos para o estabelecimento de uma relação de qualidade com o paciente. 118

Quadro 8: Saúde do trabalhador: As práticas de saúde identificadas como importantes e os receios em relação à própria saúde e integridade no exercício de

suas atividades laborativas 120

(11)

LISTA DE APÊNDICES

Apêndice 1 - Roteiro temático

164 Apêndice 2 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

166 Apêndice 3 - Carta de apresentação aos Diretores

170 Apêndice 4 -Carta de apresentação aos Colaboradores

(12)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 13

2 OBJETIVO 18

3 QUESTÕES DE SAÚDE 19

3.1 Panorama histórico da saúde 19

3.2 Conceitos de humanização: uma construção na atualidade 31

3.3 O ato de cuidar e a rede de cuidados 36

3.4 As relações humanas no hospital 41

3.5 Desafios do ensino e assistência em saúde 55

3.6 A saúde do trabalhador hospitalar 64

4 REABILITAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA FÍSICA 71

4.1A pessoa com deficiência física 75

4.2 O profissional de reabilitação e a equipe que presta assistência à pessoa com deficiência

física na instituição de reabilitação 78

5 MÉTODO 82

5.1 Local 82

5.2 Participantes 83

5.3 Instrumento 83

5.4 Cuidados éticos 84

5.5 Coleta das informações 85

5.6 Análise das informações 86

6 ANÁLISE E DISCUSSÃO 88

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS 153

REFERÊNCIAS 159

(13)

1 INTRODUÇÃO

Desde os primeiros contatos, encantei-me com o universo hospitalar. Tão rico em quantidade e qualidade de pessoas, com as mais variadas realidades, origens e histórias de vida. Desde as primeiras experiências foi possível perceber a riqueza, a intensidade e a importância dos encontros e das relações que ali dentro eram estabelecidas, às vezes tão rapidamente, entre pacientes e profissionais de saúde diante do enfrentamento da dor, da urgência, da angústia e da luta pela sobrevivência.

Inquietava-me e causava-me certo desconforto perceber que com a mesma urgência e rapidez com que algumas relações eram estabelecidas estas também eram encerradas ou finalizadas com a chegada da alta hospitalar. Intrigava-me pensar quem estaria junto destes pacientes, como seriam realizados os cuidados e de que forma se daria o enfrentamento de situações tão intensas e adversas que se estabeleceriam após a alta hospitalar, após a estabilização do paciente e quando os riscos eminentes de morte já não se fariam tão urgentes. Eu percebia essa inquietação, e até mesmo frustração, também em muitos outros profissionais.

Depois de concluir a graduação universitária, iniciei um curso de pós-graduação lato senso em Psicologia Hospitalar na área de reabilitação física para pessoas com deficiência em uma instituição pública voltada para a pesquisa, o ensino e a assistência na Cidade de São Paulo. Nesta Instituição, já como profissional, tenho tido a oportunidade de acompanhar a jornada de muitos pacientes e observar mais de perto a intensidade e a riqueza da troca que acontece entre pacientes e terapeutas, profissionais da saúde, envolvidos em um trabalho intensivo de assistência à pessoa com deficiência em reabilitação.

Por meio deste atendimento especializado em saúde, pacientes com várias formas de deficiência, passam a participar de programas integrados de reabilitação, com duração de algumas semanas ou meses, através dos quais eles se submetem a uma internação ou passam a frequentar a Instituição com uma frequência de aproximadamente dois a três dias da semana e a receber o atendimento ambulatorial de uma equipe, visando o desenvolvimento do seu potencial físico, psicológico, social e profissional.

(14)

Psicólogo, Fisioterapeutas, Terapeutas Ocupacionais, Enfermeiros, Fonoaudiólogos e Nutricionistas. Em alguns casos, além destes profissionais, o paciente também pode ser acompanhado por professores de educação física, odontologistas e técnicos em diversas áreas.

Em uma forma de assistência com características tão peculiares de intervenção pude perceber o valor dos recursos relacionais e comunicacionais na ação junto ao paciente. Sendo assim, o estudo e a busca por uma maior compreensão dos fenômenos presentes na relação entre o profissional de saúde e o paciente com deficiência é de fundamental importância para o aperfeiçoamento e desenvolvimento de uma prática de assistência que possa contribuir de forma mais efetiva com o processo de reabilitação do paciente, favorecendo o enfrentamento dos limites e desenvolvimento de recursos e potencialidades por parte do indivíduo para que este possa desfrutar de uma vida saudável e de qualidade.

O encontro entre o profissional de saúde e o paciente inevitavelmente envolve custos. Existem custos financeiros significativos envolvidos na assistência em saúde, mas além destes, existe também um custo emocional para todos os seres envolvidos nesta relação. Tanto o paciente quanto o próprio profissional de saúde podem lidar com repercussões e se sentir lesados ou prejudicados em níveis muito mais profundos e subjetivos. Em contrapartida, este envolvimento também pode significar aprendizado, desenvolvimento e amadurecimento para ambos.

Cabe aos próprios profissionais da área de atuação uma maior reflexão a respeito de sua prática. Estes necessitam reconhecer os recursos relacionais e comunicacionais, além de valorizar as reações e repercussões que esta assistência pode despertar em si mesmos e em seus pacientes.

É importante que o profissional de saúde tenha a consciência de um princípio já há tempos formulado pelo Psicanalista Balint (1989, p. 2) de que “a primeira droga que se oferece ao paciente é a personalidade do terapeuta”. Segundo este brilhante autor, cada profissional possui características individuais que podem oferecer benefícios, mas também “efeitos colaterais e toxicidade” ao paciente. Ao longo de sua atuação profissional Balint dedicou-se à tarefa de destacar a importância do cuidado em relação ao vínculo desenvolvido entre os profissionais de saúde e seus pacientes. Segundo Balint (1989, p. 2) a capacidade do profissional para “prescrever sua própria pessoa” é decisiva para o desenvolvimento da relação terapêutica e do tratamento proposto.

(15)

área da saúde (Assistentes Sociais, Psicólogos, Enfermeiros, Fisioterapeutas, Terapeutas Ocupacionais, Fonoaudiólogos, Nutricionistas), por meio de uma entrevista, através da qual se buscou investigar a percepção destes indivíduos a respeito dos fenômenos emocionais presentes na relação assistencial, enfatizando a relevância de uma maior discussão a respeito dos recursos e das limitações atualmente vivenciadas na prática clínica por profissionais de saúde na relação junto a seus pacientes, ao longo de um processo de reabilitação física.

Rodrigues (2011) afirma que para compreender o trabalho em um hospital é fundamental questionar a forma com que cada profissional concebe a questão do corpo, as formas de operar sobre ele, e de que maneira a Instituição de saúde recebe e atende à demanda de seus pacientes. Tais questões estão implicadas diretamente na qualidade do atendimento prestado ao paciente e na rotina da equipe que o atende.

O modelo de prática prevalente durante muitas décadas na instituição hospitalar foi o biomédico. Nesta concepção a lesão assume o lugar de protagonista, fonte de toda a dificuldade do sujeito, necessitando assim ser tratada e superada. Muitas vezes, foi exigido da equipe de saúde a exclusão de uma concepção de aspectos relacionados à subjetividade para que se pudesse agir sobre o corpo, visto como um organismo pela ciência positivista. Para compreender esta postura e posicionamento é importante nos debruçarmos sobre a origem e o desenvolvimento das profissões voltadas ao cuidado em saúde ao longo da história.

Há atualmente uma mudança de paradigmas na área da saúde. Em resposta a este modelo biomédico passa a haver um movimento de revalorização mais acentuada de uma gama de medidas e recursos pautados não somente nos avanços técnicos específicos, mas também nas dimensões humanas, culturais, espirituais e estéticas.

As mudanças percebidas no contexto atual estão relacionadas a uma transformação nos conceitos de doença e saúde, na reestruturação de modelos assistenciais, agora pautados em uma assistência baseada em princípios de humanização do indivíduo, que valorizam a adoção de ações integradas para a promoção de saúde do sujeito, nas diversas esferas de demandas que este apresenta.

(16)

encarado simplesmente enquanto alguém que deva ser exclusivamente curado fisicamente, mas sim enquanto um paciente que possa vir a se beneficiar da adoção de uma série de ações integradas de atenção e cuidado, adotadas por diversas áreas da saúde, visando à promoção de saúde global e qualidade de vida do sujeito com alguma forma de deficiência.

A escolha por um trabalho voltado a uma prática de assistência multidisciplinar e a proposta de pesquisa junto a uma série diversificada de profissionais de diversas áreas da saúde representa um particular interesse em tratar da importância desta pluralidade e em reforçar a necessidade e a demanda por mais estudos voltados à formação em diversas áreas de profissionais da saúde que hoje se fazem tão presentes e atuantes na realidade da prática e assistência hospitalar.

Como veremos adiante, grande parte dos estudos encontrados na bibliografia deste trabalho estão relacionados principalmente à relação entre médicos e pacientes ou enfermeiros e pacientes. Muitas vezes, me refiro ao profissional ou estudante de medicina, simplesmente porque a maior parte dos referenciais se destina ao estudo desta profissão específica. Entretanto, acredito que possa existir um ponto de encontro entre os diversos profissionais que se dedicam ao cuidado e à saúde das pessoas. Acredito que possa haver uma maior reflexão sobre estes indivíduos que exercem as mais variadas funções dentro do trabalho de assistência em saúde e não somente sobre uma determinada área da saúde ou da ciência.

A intenção não é a de reforçar preconceitos ou críticas sobre uma determinada área da saúde, mas sim enfatizar a importância de se pensar de que maneira os diversos profissionais, independentemente de suas áreas de atuação em saúde, percebem e são afetados por esta relação de assistência.

Primeiramente foi realizada uma revisão de alguns conceitos relacionados à saúde, à reabilitação propriamente dita (enquanto uma especialidade e forma de assistência), a conceitos de atendimento humanizado, e a conceitos teóricos oriundos de teorias voltadas para a questão do cuidado e vínculo terapêutico. Em seguida, apresenta-se a pesquisa realizada junto a profissionais de saúde (membros da equipe interdisciplinar) que atuam em reabilitação, discutindo os relatos destes profissionais e relacionando-os com os conceitos apresentados ao longo do estudo.

(17)

Freud, Carl Jung, Donald Winnicott, Wilfred Bion, Anne Alvarez, Fonagy.

Os dois autores foram eminentes psicanalistas que se dedicaram ao estudo das relações humanas e mais especificamente, cada um a seu modo, aos aspectos de vínculo nas relações de cuidado. Os conceitos e aspectos das teorias destes autores serão abordados de acordo com a proposta e enfoque deste trabalho.

Entretanto, espero que a construção deste texto e as conexões e relações apontadas entre os diversos autores e seus respectivos pensamentos possam representar a minha própria maneira de perceber e contribuir para uma reflexão a respeito do tema abordado.

Busco, por meio deste trabalho, oferecer informações referentes à percepção de profissionais da saúde, que atuam em reabilitação de pessoas com deficiência física, sobre a sua relação com o paciente. Assim, a partir destas informações, poderemos refletir a respeito das particularidades deste encontro e dos aspectos subjetivos presentes nesta prática cotidiana de contato tão próximo e intenso, que favorecem ou dificultam o processo de reabilitação do indivíduo.

Ofereço destaque à maneira como esses profissionais percebem o impacto que as relações estabelecidas com pacientes e a prática assistencial podem representar para a saúde física e mental do trabalhador. Pretendo oferecer uma pequena contribuição para que a atividade laborativa possa representar uma fonte de desenvolvimento, crescimento e satisfação para o profissional de saúde e que o possível sofrimento seja elaborado e minimizado quando presente na realidade do profissional de saúde.

(18)

2 OBJETIVO

Estudar a percepção de profissionais da saúde, que atuam em reabilitação de pessoas com deficiência física, sobre a sua relação com o paciente, por meio da investigação:

- da percepção que estes profissionais de saúde possuem sobre o seu papel e sua atuação nesta relação com o paciente;

- da percepção que estes profissionais possuem a respeito da influência da família, da equipe multiprofissional e do ambiente hospitalar na relação que eles estabelecem com seu paciente;

- da importância que os profissionais atribuem à formação básica em saúde no que se refere à capacitação para o desenvolvimento de recursos relacionais e comunicacionais voltados para a atuação junto ao paciente;

- das características e habilidades pessoais consideradas relevantes por estes profissionais para o estabelecimento de uma relação eficiente e saudável com o paciente;

- das definições e significados atribuídos por estes profissionais à palavra humanização;

(19)

3 QUESTÕES DE SAÚDE

3.1 Panorama histórico da saúde

De acordo com os estudos de Martins e Araújo (2008), existem algumas ambiguidades e características arbitrárias que marcam o discurso e a prática de alguns profissionais em saúde na atualidade. Muitos expressam preocupação com aspectos relacionais, com a comunicação, a abertura para o diálogo e livre expressão de seus pacientes, mas através de suas ações e atuações na prática de assistência apresentam dificuldade em se comunicar de forma efetiva com seus pacientes, muitas vezes dando ênfase excessiva a aspectos físicos, a sintomas e sinais. Para compreender esta situação descrita pelo autor é importante que nos debrucemos sobre aspectos históricos relacionados à origem desenvolvimento do conhecimento e das práticas de assistência e cuidado em saúde até os dias atuais.

Um olhar para o desenvolvimento histórico de conceitos e modelos de pensamento gera a possibilidade de pensarmos criticamente sobre as posições a serem adotadas futuramente.

Para Castro, Andrade e Muller (2006), no surgimento das primeiras civilizações, as práticas de atenção e cuidado à saúde eram adotadas de acordo com uma visão orgânica do ser humano. Havia uma integração entre aspectos físicos, psíquicos, espirituais e também ambientais que faziam parte da realidade do indivíduo. Através de uma forma de pensamento primitivo e intuitivo, os indivíduos eram vistos como receptores de cuidados e atenção integral e o enfoque não era direcionado somente a sua doença, como um aspecto externo, separado do sujeito. Neste momento, a escuta era adotada como uma ferramenta básica fundamental para o atendimento ao sofrimento do outro.

(20)

No início das civilizações (e ainda em muitas culturas atuais ao redor do mundo) os cuidados e a atenção à saúde dos seres humanos eram responsabilidade de curandeiros, xamãs, chefes de tribos, feiticeiros, sacerdotes e líderes espirituais. Estas figuras de destaque nas diversas sociedades foram frequentemente vistas como dotadas de conhecimentos e poderes de ordens mística e espiritual e suas ações de cuidado com o outro estavam alicerçadas no conhecimento do ser humano que era adquirido oralmente e através de experiências com a natureza.

A relação de cuidado sempre pode ser vista como uma relação assimétrica, de poder, através da qual o encontro e a comunicação (não somente verbal) assumiam um papel central no processo de saúde-doença. Neste período, a visão do indivíduo e de suas doenças e males estava baseada unicamente em uma concepção orgânica do homem enquanto um ser vivo em relação com o meio ambiente e dotado de corpo físico, afetos e espírito.

Os males humanos eram vistos nos tempos primitivos como situações de desequilíbrio do organismo como um todo e suas origens frequentemente voltadas a ordens espirituais, às divindades, deuses e demônios e também a forças e fenômenos da natureza ou afetos e paixões. As curas e processos de tratamento foram se desenvolvendo de diversas maneiras nas mais variadas culturas. Cada qual com uma maneira de conceber o indivíduo e seus males

Ainda de acordo com Capra (1982), o surgimento da medicina científica e de uma série de outras áreas de conhecimento em saúde tem suas origens nestas bases primitivas de conhecimento.

Scliar (2007) descreve que na Antiguidade encontram-se os primeiros registros de intervenções físicas e ações de saúde mais sistematizadas e técnicas. Através dos registros do povo Egípcio é possível identificar a realização de cirurgias e processos de mumificação, por exemplo.

Os gregos foram os pioneiros neste processo de desenvolvimento de uma medicina científica e tiveram Hipócrates como seu maior representante. No século V a.C. a medicina foi colocada de maneira distinta da religião, da magia ou de qualquer outra forma divina no que se refere à compreensão do indivíduo.

(21)

presentes ainda nos tempos atuais.

A Hipócrates é atribuída a autoria do texto utilizado na atualidade como forma de juramento solene por médicos, no momento de sua formatura, no início da vida profissional. Existem duas versões do Juramento de Hipócrates. Neste texto é possível observar as preocupações com a formação de um profissional que se comprometa com o desenvolvimento de sua sociedade e coloque o ser humano como valor acima de todas as outras coisas.

Hipócrates realizou grandes descobertas e feitos na medicina. Postulou a existência de quatro fluidos corporais (humores) que estariam envolvidos na saúde do ser humano e na origem de seus males quando em desequilíbrio (bile amarela, bile negra, sangue e fleuma). Não considerava as doenças de forma isolada. Acreditava que o médico deveria guiar sua conduta de acordo com o homem que desta doença era vítima, considerando toda a sua natureza, suas qualidades, características individuais e o contexto no qual ele estaria inserido.

Depois de Hipócrates, Galeno passa a ser o médico mais conhecido da história da Antiguidade, contribuindo com descobertas importantes relacionadas ao funcionamento dos rins, artérias e aparelho neurológico, além de mostrar-se um clínico hábil, com êxito no desenvolvimento de atividades cirúrgicas e no tratamento de fraturas e ferimentos graves, experimentadas ao longo de sua experiência no atendimento junto aos gladiadores.

Na Idade Média o cristianismo apresenta uma importante ascensão com a queda com Império Romano; neste momento, a forma de se pensar sobre a doença e o sofrimento passa a estar diretamente relacionada às ideias de punição divina e pecados mortais. Neste período, além da Instituição Igreja, temos a importante contribuição do pensamento de Aristóteles.

De acordo com Capra (1982), no século XIII, Tomas de Aquino dá mais poder à forma de Aristóteles perceber a natureza destacando os valores e a ética cristã. Durante todo esse período medieval, o pensamento científico desenvolvido baseava-se em uma forma de investigação que privilegiava a compreensão dos aspectos relacionados à alma humana, à ética e a Deus. O pensamento científico desta época buscava apenas compreender os fenômenos e não dominá-los ou transformá-los.

(22)

O pensamento privilegiado passa a ser o racional, linear, focado e analítico e os estudos buscam apreender e dominar os fenômenos por meio de processos de discriminação, classificação e quantificação. Neste momento, a física passa a assumir papel de destaque em relação ao desenvolvimento do pensamento científico, e todas as áreas do conhecimento passam então a sofrer a influência dos importantes pensadores e cientistas deste período da história.

Destacam-se, neste período, a geometria de Copérnico, a astronomia de Galileu, a filosofia de Descartes, a metodologia científica de Bacon e a teoria matemática de Newton, que vão influenciar fortemente todos os pensadores dos séculos XVII, XVIII e XIX.

Acreditava-se que os fenômenos complexos podiam ser sempre entendidos desde que se os reduzisse a seus componentes básicos e se investigasse os mecanismos através dos quais esses componentes interagem. Essa atitude, conhecida como reducionismo, ficou tão profundamente arraigada em nossa cultura, que tem sido frequentemente identificada com o método científico. (CAPRA, 1982, p. 44)

Neste período, denominado Era Científica, foram desenvolvidos os métodos para medição e quantificação na investigação científica. Para René Descartes, o método fundamental da pesquisa científica era a dúvida e a chave para a compreensão da natureza estaria na matemática e na decomposição do fenômeno em partes, em uma ordenação lógica. Através desta maneira de pensar a ciência, foi atribuída a Descartes a ideia de “decomposição” do indivíduo entre mente e matéria. Vale destacar, porém, que este dualismo tão difundido ao longo dos séculos e que tanto influenciou o mundo ocidental foi distorcido a partir dos postulados de Descartes. Na realidade, Descartes defendia de fato uma metodologia analítica que separava as “partes” corpo e matéria, entretanto, ele próprio reconhecia e pensava estas partes em relação, como um todo. Por isso, Capra (1982) afirma que Descartes talvez fosse menos cartesiano do que seus seguidores.

(23)

qual o cuidado com a saúde e os recursos técnicos de medicina não eram empregados visando à cura propriamente.

No século XIX a invenção do microscópio acromático gera grandes avanços. Pasteur se destaca pela descoberta das bactérias e suas relações com o desenvolvimento de grande parte das doenças.

Para Capra (1982), desde a revolução científica, da qual fizeram parte grandes pensadores tais como Descartes e Newton, estabeleceu-se um pensamento mecanicista, hegemônico na cultura ocidental, através do qual o organismo vivo assemelha-se ao funcionamento de uma máquina composta por partes, estruturas e “peças” que funcionam separadamente, compostas em conjunto, numa grande engrenagem. Quando doente, o organismo representa um aparelho com defeito, que deve ser fragmentado e consertado.

Esta maneira de pensar sobre o ser humano sofreu influências e transformações, com a ascensão de outros pensadores, tais como Albert Einstein, com a teoria da Relatividade, e Charles Darwin, com a teoria da Evolução. Depois deste período, houve movimentos importantes, tais como o Iluminismo e a Revolução Industrial. Entretanto, ainda nos dias atuais é possível notar a forte influência dos modelos mecanicistas e reducionistas herdados desta Era Científica.

A concepção moderna de ciência voltada à saúde está alicerçada nestes pressupostos científicos e pode ser denominada de modelo biomédico. Este modelo possui uma visão mecanicista da vida e prioriza a investigação e o desenvolvimento de medidas voltadas à intervenção física ou química para a resolução de problemas de mau funcionamento do organismo físico.

Esta maneira de conceber a ciência e o ser humano gerou avanços imensuráveis para a civilização moderna. Graças à grande clareza, objetividade, a sistematização, ordenação e quantificação dos fenômenos introduzida por estes pensadores é que se tornou possível sobreviver às grandes pestes e epidemias do passado e alcançar avanços fundamentais na área da saúde, tais como as descobertas de uma série de vitaminas, vacinas e de medicamentos tais como a penicilina, cortisona, insulina e da pílula anticoncepcional.

(24)

aumento da expectativa de vida.

Podemos perceber as influências da característica “fragmentação” ou divisões do organismo humano ao longo do desenvolvimento, por exemplo, das diversas especialidades médicas e das diversas profissões e áreas de conhecimento em saúde. Não se pode negar a relevância deste movimento e os avanços gerados para a saúde.

Entretanto, Capra (1982) aponta que o grande ônus deste desenvolvimento está na dificuldade de se alcançar nos dias atuais um modelo de saúde que consiga reintegrar estas “partes” em uma compreensão mais totalizadora do ser humano. Uma maneira de pensar o ser humano que não valorize unicamente o cuidado e a atenção estritamente por meio de recursos técnicos que desconsiderem aspectos do indivíduo, tais como sua espiritualidade, sua afetividade e a realidade que o cerca.

Os avanços tecnológicos e científicos desenvolvidos ao longo dos tempos são colossais. A tecnologia em saúde, os exames laboratoriais e a robótica fazem parte da realidade dos diagnósticos e das intervenções em saúde e o grande desafio da atualidade é integrar estes recursos a uma compreensão e ação mais integrada, capaz de atender o indivíduo em suas diversas demandas e sofrimento.

De acordo com Capra (1982), a sociedade como um todo sofreu a influência e também influenciou as mudanças decorrentes desta evolução histórica. Com os significativos avanços tecnológicos e a grande repercussão das descobertas que contribuíram para um maior conhecimento de aspectos biológicos do homem, passou a ser evidenciada no meio social a adoção de uma concepção do homem e de seus processos de saúde e adoecimento, através da qual se supervalorizava o positivismo e as teorias mecanicistas que tratam o paciente enquanto um organismo composto por um dispositivo funcional bioquímico. Aspectos de ordem afetiva, espiritual, social e ambiental, por não serem, muitas vezes, passíveis de medição, quantificação ou dedução, deixaram de fazer parte do rol dos conhecimentos estritamente científicos e assumiram, com grande frequência, um papel de menor importância nas ações de cuidado e atenção ao indivíduo.

(25)

trabalho terapêutico.

As escolas de formação em saúde, fundamentalmente as escolas médicas, tiveram sua formação baseada em conceitos de assistência biocêntrica e tecnocêntrica, como os defendidos pelo relatório Flexner, de 1912, no qual o foco do conhecimento se voltava ao estudo de partes do corpo e à compreensão de fenômenos e mecanismos biológicos de funcionamento de um organismo vivo. Pessini e Bertacini (2004) afirmam que o trabalho em saúde valorizado neste enfoque é o de intervir física e quimicamente para restabelecer o equilíbrio orgânico do corpo.

Apesar dos reflexos deste processo histórico da sociedade ocidental se fazerem presentes de forma intensa ainda hoje e de suas marcas ainda serem muito presentes e vivas no cotidiano hospitalar, é possível perceber concomitantemente e de maneira, muitas vezes, ambígua, as marcas, posturas e tendências de um movimento contrário de retomada dos conceitos humanísticos nos dias atuais, que procura se estabelecer de maneira gradual e sistemática. Rios (2010, p. 2) afirma que “a sociedade contemporânea apresenta-se à história como um tempo de grande desenvolvimento científico e tecnológico que pede a contrapartida ética necessária”.

Trentini, Paim e Vasquez (2011) atribuem a iniciação deste movimento contrário, de retomada de características mais humanizadas de relação, às mudanças referentes ao âmbito das ciências em geral, da cultura, economia e de políticas. As mudanças presentes nesta sociedade atual impactam e influenciam diretamente a área da saúde e cobram desta um posicionamento diferenciado para o atendimento às necessidades de uma população que não se satisfaz e não se percebe bem atendida através de um modelo pautado predominantemente no modelo biomédico de atenção, vigente até então e que favorece uma “crescente superficialização das relações intersubjetivas reduzidas ao estrito caráter instrumental e utilitário” (RIOS, 2010, p. 2).

(26)

industrializadas e capitalistas. Isso difere dos conflitos e demandas do passado, mais diretamente relacionados ao enfrentamento das grandes pestes, epidemias, do enfrentamento da fome e da questão da insalubridade.

Em resposta a estes posicionamentos positivistas, foram surgindo então os movimentos críticos e começaram a ser criados espaços de discussão a respeito desta mentalidade amplamente difundida e vigente. Ao longo dos anos, especialmente nos meios acadêmicos, passou a ser possível identificar o surgimento de publicações que denunciavam a necessidade de se recuperar a esfera humana da relação médico-paciente, tão desvalorizada ao longo deste processo histórico descrito.

De Marco (2006) destaca que na virada do século XIX para o século XX as mudanças e os movimentos de quebra do paradigma estabelecido contribuíram na área médica, por exemplo, para o surgimento de áreas de ensino, investigação e prática, tais como a Psicologia médica, a Psicossomática, a Psicanálise e a Medicina comportamental.

Em um primeiro momento, aproximadamente por volta de 1940, nos EUA, em resposta ao modelo de ensino da medicina integral, surgiram os primeiros movimentos pela reforma desse modelo vigente com propostas educacionais e disciplinas que enfocavam a pessoa “como um todo” e não só mais a doença. Eram chamadas estas disciplinas de “humanidades médicas”. Entretanto, mesmo assim, o profissional de saúde ainda ocupava o papel de um técnico especializado no corpo e não mais de um cuidador que acolhe o indivíduo doente.

Alguns teóricos dedicaram especial atenção à questão do relacionamento entre médicos e seus pacientes. Dentre estes autores destacam-se Jasper, Parsons, Donabedian e Balint, este último escolhido nesta pesquisa para ser estudado mais detalhadamente.

De acordo com Caprara e Franco (1999), em 1950, Karl Jasper, médico e teórico alemão, apresentou uma importante reflexão a respeito dos aspectos relacionais e comunicacionais presentes na relação terapêutica e uma crítica importante ao fato de se reforçar até este período a ideia de que caberia à pratica psicanalítica se ocupar ou se responsabilizar pela questão da relação com o paciente, enquanto que à clínica caberia o cuidado e a dedicação à técnica e à produção de dados mais objetivos, muitas vezes, em detrimento da subjetividade presente na relação.

(27)

médico-paciente, propondo grupos de trabalho entre profissionais de saúde para discussão destes aspectos de ordem subjetiva presentes na pratica clínica.

Em 1970, Talcott Parson desenvolveu os primeiros trabalhos na área da sociologia da saúde, enfocando a relação médico paciente e o que denominava de consenso intencional ou consentimento informado (com enfoque nos direitos dos indivíduos consumidores dos serviços de saúde), além de ter apresentando uma crítica à intensa supervalorização da instrumentalização médica em geral.

Em 1980, Donabedian publicou diversos estudos voltados para a questão da qualidade dos serviços de saúde e as diretrizes de reorganização dos modelos de assistência, reforçando o ponto de vista de usuários destes serviços.

De acordo com Scliar (2007), em 1948, a ONU divulga uma carta de princípios, através da qual declara que o direito à saúde é universal e sua promoção e proteção uma obrigação do Estado.

Nesta declaração a ONU define a saúde como um estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas como a ausência de uma enfermidade. Este conceito é tomado com base nestas mudanças e reflete o contexto social da época (os movimentos sociais do pós-guerra e a ascensão do socialismo).

Em 1960, há um adensamento das críticas ao modelo biomédico, e este passa a ser visto como um modelo que de fato não compreende a questão da intersubjetividade – a arte de estar junto. Ezequiel et al (2008) afirmam que após a Segunda Guerra e até os primeiros anos da década de 1960, os EUA registraram estudos voltados ao estudo das relações saúde, doença, medicina, sociedade e sua introdução em práticas pedagógicas.

Em 1974, Marc Lalonde, titular do Ministério da Saúde e do Bem-estar do Canadá, define a saúde como um campo que abrangeria a biologia humana, o meio ambiente, o estilo de vida e a organização da assistência à saúde (SCLIAR, 2007).

(28)

De Marco et al (2009) relatam as mudanças das instituições de ensino e formação médica no Brasil, ao relatar um pouco da trajetória histórica do desenvolvimento do curso de formação médica da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, oferecendo uma exemplificação clara destas mudanças no cenário nacional.

Descreve que em 1956 é implementado no terceiro ano do curso de medicina da Universidade, a disciplina de Psicologia Médica, estruturada, a princípio, apenas para uma apresentação teórica de conceitos (atualmente a Psicologia Médica está presente desde o primeiro até o quinto ano do curso de medicina na UNIFESP). Já em 1993, durante o estágio do internato em Psiquiatria, os alunos passaram a participar de uma atividade grupal, realizada semanalmente, na qual os estudantes passaram a ter a possibilidade de refletir “sobre aspectos psicológicos da prática médica, com ênfase nas discussões sobre os fatores gratificantes e estressantes do exercício da medicina, salientando-se os aspectos ligados aos dilemas éticos e à saúde mental do estudante, do residente e do médico” (DE MARCO et al, 2009, p. 283).

Em 1963, a Universidade Federal de Campinas UNICAMP é criada e a ela incorporada a Faculdade de Medicina (criada em 1953). Em 1966, ocorre a implementação da Disciplina de Psicologia Médica e Psiquiatria, chefiada por Dr. Roberto Silveira Pinto de Moura.

Em 1965, é criado o centro de Medicina Psicossomatica e Psicologia Médica do Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, por Dr. Danillo Perestrello. Neste mesmo ano Dr. Danilo Perestrello, Julio de Mello Filho e Abram Eksterman são precursores na criação da Associação Brasileira de Psicossomática (MELLO, 2008).

Em 1967, a Associação organiza a primeira Reunião Nacional de Medicina Psicossomática, na Academia Nacional de Medicina, presidida pelo renomado Dr. Michael Balint.

(29)

informação” (CAPRARA e FRANCO, 1999, p. 649).

De acordo com Trentini, Paim e Vasquez (2011), esse movimento de construção de novos paradigmas de ciências que buscam retomar a percepção humana do indivíduo em sua totalidade estruturara-se através de alguns marcos históricos importantes. Segundo os autores, a Declaração de Alma Ata-1977, evocada nas conferências Internacionais sobre promoção de saúde (Ottawa – 1986; Adelaide – 1988; Sundsvall – 1991; e Santa Fé de Bogotá – 1992), representa um marco no surgimento do atual conceito de promoção de saúde.

A Carta de intenções de Ottawa já tratava da importância da elaboração de estratégias voltadas à promoção da saúde, tais como a construção de políticas públicas saudáveis, a criação de ambientes favoráveis, a reorientação dos serviços de saúde e o desenvolvimento de competências pessoais e o reforço de ações comunitárias. Enfatizando a capacitação e empoderamento da própria comunidade enquanto fundamentais para a participação e controle de ações voltadas à promoção da saúde e qualidade de vida da população.

A Declaração de Santa Fé de Bogotá já tratava das questões de pobreza e saúde na América Latina. Segundo Trentini, Paim e Vasquez (2011, p. 96),

o desafio da promoção em saúde consiste em trabalhar pela solidariedade e equidade social, fundamentais a todos os processos de saúde e desenvolvimento. Enfatiza a adoção de ações de políticas públicas orientadas diretamente ao combate da pobreza e das enfermidades. Destaca a importância do conceito de cuidado integral, onde o cuidado adotado parte sempre da adoção de ações condizentes com o contexto sociocultural do qual o paciente encontra-se inserido e onde este sujeito é sempre considerado como parte integrante de uma rede de cuidados maior através da qual o profissional de saúde poderia contribuir para a promoção da saúde.

(30)

Em 1973, Julio de Mello Filho passa a ministrar a disciplina de Psicologia médica no curso de medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (MELLO, 2008).

Nota-se neste período também uma maior preocupação com a saúde e com a assistência a este profissional que se dedica ao cuidado com o paciente. Um exemplo disso é a criação, em 1987, do Serviço de Atendimento Psicológico e Psiquiátrico ao estudante de graduação e pós-graduação, o SAPPE, criado na UNICAMP, pelo Dr. Maurício Knobel (VELLA, 2015).

Não é possível tecer uma investigação sobre o desenvolvimento da saúde e dos aspectos subjetivos da assistência em saúde no Brasil, sem destacar o desenvolvimento e o fortalecimento da Psicologia no Brasil iniciada na Universidade de São Paulo – USP através da Professora Noemi da Silveira Rudolfer, Catedrática da Disciplina de Psicologia Educacional seguida de Professora Anita de Castilho e Cabral, chefe da cadeira de Psicologia Social.

Iniciando seus estudos na USP com a Professora Noemi da Silveira Rudolfer, partindo da Psicologia Educacional e Social, a eminente Professora Doutora Mathilde Neder aprofundou-se na Psicologia clínica (seguindo Noemi, Virgínia Leone Bicudo, Lygia Alcântra do Amaral e Judith Andreucci) e pode ser reconhecida como pioneira no desenvolvimento da Psicologia Hospitalar no Brasil. Dra. Mathilde Neder iniciou um trabalho em 1953 no Instituto de Ortopedia do HCFMUSP junto a crianças submetidas a cirurgias e seus familiares, e este fato marcou o início dos trabalhos em Psicologia Hospitalar no Brasil. Em 1974, Dra. Mathilde Neder integrou a recém-criada Divisão de Reabilitação Profissional de Vergueiro do Hospital das Clínicas, à frente do Serviço de Psicologia. Sendo assim, podemos pensar que o Serviço de Reabilitação sempre, desde sua origem, procurou abarcar uma compreensão e uma forma de atuação em que o indivíduo pudesse ser assistido de maneira mais integral, considerando-se não somente os aspectos físicos da deficiência, mas também com uma atenção especial para as repercussões emocionais e sociais (ANGERAMI, CHIATTONE e NICOLETTI, 1996).

(31)

humanizada. Entretanto, este processo de revalorização do humano se estabelece, com algumas resistências.

Para Capra (1982), não existe um único saber ou uma maneira de se pensar a realidade que assuma uma verdade soberana. A saúde e a assistência sofrem a influência dos muitos pensadores e conceitos ao longo da história e estes representam importantes contribuições para o desenvolvimento da sociedade, mas também carregam em suas essências limites e fragilidades que se evidenciam e favorecem o fortalecimento de outras ideias e conceitos que possam oferecer um contraponto e outra possibilidade de compreensão e ação. A verdade está não na adoção cega de um modelo, mas sim no diálogo e na interlocução das diversas ideias e conceitos, que necessitam ser confrontados e questionados sempre em um movimento de transformação e amadurecimento.

Para que se possa pensar nas práticas atuais de saúde é fundamental analisar com atenção os conceitos e ideias presentes na palavra “humanização”. Esta palavra, que hoje é tão frequentemente aplicada às mais diversas ações, merece uma atenção especial. O que é humanização? E quais são os conceitos reconhecidos e valorizados na atualidade?

3.2 Conceitos de humanização: uma construção na atualidade

“Humanizar o cuidar é dar qualidade à relação profissional-paciente. É acolher as angústias do ser humano diante da fragilidade de corpo, mente e espírito” (PESSINI e BERTACINI, 2004, p. 1).

Gonzales e Almeida (2010) afirmam que o sistema hegemônico começa a ceder espaço e ser gradativamente substituído por um sistema universal que busca modelos de atenção pautados por conceitos de integralidade, promoção de saúde e cuidado humanizado, através dos quais possa se contribuir para que o haja um maior protagonismo dos indivíduos implicados na assistência. Mas o que é o cuidado humanizado propriamente?

A palavra humanização faz parte do repertório comum de toda a população, mas sua definição ainda encontra alguma dificuldade. O que é a humanização? Seria ela inerente à prática de assistência em saúde já que seria esta uma forma de atendimento a seres humanos?

(32)

humanizar é garantir à palavra a dignidade ética. Ou seja, para que o sofrimento humano e as percepções de dor ou de prazer sejam humanizados, é preciso que as palavras que o sujeito expressa sejam reconhecidas pelo outro. É preciso, ainda, que esse sujeito ouça do outro, palavras de seu reconhecimento.

Os significados e ideias presentes na palavra humanização decorrem de toda essa trajetória histórica, mas ainda hoje podemos considerar que os conceitos relativos à humanização em saúde fazem parte de um processo vivo, ainda em construção. Uma construção, que requer muitas discussões e debates para o alcance de uma satisfatória implementação na saúde Brasileira.

A definição da palavra humanismo em saúde está atrelada a diversas iniciativas e ações voltadas à assistência. Podemos afirmar, em linhas gerais, em acordo com as diretrizes do Ministério da Saúde (2014), que a humanização diz respeito a uma cultura de atenção e cuidados aos usuários, que favorece o estabelecimento de uma relação através da qual se busca alcançar um diálogo mais efetivo entre pacientes e profissionais e a adoção de processos de trabalho que contribuam para com a corresponsabilização e o protagonismo em saúde.

As dificuldades encontradas por toda a população para garantir acesso a atendimentos, agendamento de exames e vagas em leitos, os problemas com convênios, o alto custo de procedimentos e as queixas em relação às administrações de entidades públicas, constatadas através de inúmeros relatos e denúncias estampadas em jornais já nos dizem que a humanização não parece ser algo inerente e garantido necessariamente a toda forma de atendimento em saúde e que o alcance dos ideais humanísticos ainda devem percorrer uma longa jornada.

Para Trentini, Paim e Vasquez (2011), a humanização da assistência em saúde implica na utilização de tecnologias leves no processo de cuidado. O termo tecnologias duras, neste caso, representa os equipamentos tecnológicos, o termo leve-duras representa os saberes estruturados e o termo leve, propriamente dito, é então utilizado pelo autor para representar um conjunto de recursos e saberes relacionados ao estabelecimento de uma relação baseada nos princípios de humanização, tais como acolhimento, vínculo e autonomia para o desenvolvimento pessoal da capacidade de se autogovernar.

(33)

concebido com base nestas concepções de um atendimento humanizado e buscava a universalidade e a qualidade no atendimento. Entretanto, apesar de representar um marco importante no desenvolvimento da saúde brasileira e ser considerado por muitos como um dos melhores sistemas de saúde pública do mundo, esse modelo ainda apresenta dificuldades em garantir de fato o atendimento a toda a demanda populacional e em assegurar um relacionamento ideal de qualidade entre usuários e colaboradores.

Em 2000, o Ministério da Saúde identificou os seguintes problemas relacionados à implantação do sistema:

A)Dificuldade de acesso aos serviços e bens de saúde, caracterizado por desigualdade socioeconômica;

B) Graves lacunas nas necessidades dos usuários; C) Desvalorização dos trabalhadores da saúde; D)Precarização nas relações de trabalho;

E)Baixo investimento nos processos de educação permanente;

F)Pouca participação de profissionais e usuários na gestão dos serviços de saúde; G)Vínculo fragilizado entre as organizações de saúde e seus usuários;

H)Modelos de gestão centralizados e verticais;

I) Pouco compromisso e corresponsabilização na produção da saúde; J) Desrespeito aos direitos dos usuários;

K)Grande despreparo dos profissionais para lidar com as questões subjetivas que toda prática de saúde implica;

L)Incorporação de novas tecnologias e especialização;

M)Aumento no processo de descentralização da atenção nas ações visando integralidade, universalidade e equidade.

(34)

Em 2003, o Programa Nacional de Humanização (PNH) surge como uma política que deve ser obrigatoriamente adotada por toda organização de saúde visando servir como uma diretriz para qualquer forma de ação.

Mello (2008, p. 39) apresenta os pressupostos que fundamentam a política de humanização da assistência. São eles:

A) Valorização da dimensão subjetiva e social em todas as práticas de atenção e gestão, fortalecendo e estimulando processos integradores e promotores de compromissos e responsabilização;

B) Estímulo aos processos comprometidos com a produção de saúde e com produção de sujeitos;

C) Fortalecimento do trabalho em equipe multiprofissional, objetivando a transdisciplinaridade e a grupalidade;

D) Atuação em rede, com alta conectividade, de modo cooperativo e solidário, em conformidade com as diretrizes do SUS;

E) Utilização da informação, comunicação, educação permanente e dos espaços de gestão na construção de autonomia e protagonismo de sujeitos coletivos.

Para implantação da Política Nacional de Humanização (PNH) foram estabelecidos seis eixos voltados para as estratégias gerais por meio dos quais deve se buscar a apropriação da política pela sociedade. Os eixos são:

1) Financiamento – Por meio de recursos e subsídios destinados especificamente aos programas de humanização.

2) Instituições do SUS – Operacionalização da política por meio de planos de trabalho Estaduais e Municipais.

3) Educação Permanente – Com operacionalização da política por meio do conteúdo de programas de formação e especialização profissional.

4) Mídia – Através do favorecimento de debates da sociedade relacionados à questão da saúde.

5) Atenção – Através da ampliação das redes de suporte voltadas à atenção integral à saúde.

6) Gestão da política – Através do estabelecimento de avaliações sistemáticas que estimulem pesquisas relacionadas ao tema humanização.

(35)

de maneira geral, almeja o estabelecimento de um conjunto de normativas e medidas voltadas para a criação de espaços propícios para a dinamização da relação entre paciente e profissional de saúde. Através de tias medidas, poderá se estabelecer, então, uma comunicação efetiva, na qual os saberes sejam trocados e compartilhados entre duas pessoas iguais em sua essência humana. Distancia-se, assim, de uma possível relação autocrática, por meio da qual o conhecimento técnico possa servir como uma ferramenta de controle e submissão.

De acordo, ainda, com Trentini, Paim e Vasquez (2011), o modelo atualmente defendido em saúde abarca o conceito da integralidade. A integralidade em saúde deve ser praticada por um conjunto de profissionais com conhecimentos variados relacionados ao humano, mas que inter-relacionados buscam alcançar uma compreensão do indivíduo em sua complexidade, no que diz respeito à esfera física, psíquica, social, cultural, ambiental e espiritual. Para Gonzales e Almeida (2010), a atenção integral em saúde representa as necessidades ampliadas e complexas de pessoas e grupos e não a simples manutenção dos corpos, no que diz respeito à sua funcionalidade.

Para De Marco (2006), a mudança de um modelo biomédico para outro modelo pautado nos princípios biopsicossociais exige do profissional de saúde não somente o domínio de suas capacidades técnico-instrumentais, mas também o desenvolvimento de habilidades e recursos pessoais que favoreçam o seu encontro e a sua relação com o paciente. Tais habilidades comunicacionais e relacionais estão relacionadas à comunicação verbal e não verbal, à linguagem, à capacidade de escuta, de empatia e vínculo com o paciente que se apresenta a sua frente.

Dois importantes teóricos, Balint e Bowlby, dedicaram-se a pensar sobre as relações humanas e os vínculos estabelecidos em situações de assistência e cuidado. Portanto, ao se pensar em um atendimento humanizado e efetivo é de fundamental importância pensar quais elementos estão presentes nesta relação que podem favorecer ou dificultar a assistência e contribuir com uma assistência efetiva e de qualidade.

(36)

3.3 O ato de cuidar e a rede de cuidados

John Bowlby, psicanalista inglês, em meados de 1950, apresentou sua grande contribuição para o desenvolvimento e estruturação de importantes conceitos relacionados à compreensão das relações humanas, através da criação da Teoria do Apego enquanto uma variável da teoria das relações objetais, na clínica Tavistock, Londres.

As ideias apresentadas por Bowlby através da Teoria do Apego estão estreitamente de acordo com um importante fator reconhecido na atualidade como recurso de proteção à saúde do profissional que trabalha junto ao paciente. De acordo com Macedo, Nogueira-Martins e Nogueira-Nogueira-Martins (2008), a capacidade de desenvolver e fortalecer uma rede de suporte, apoio e relações significativas por meio de vínculos pode ser percebida como valioso recurso de proteção para a saúde do profissional que se dedica ao cuidado com o paciente, na medida em que oferece sustentação e contribui com o seu enfrentamento de conflitos. Bowlby apresenta essa necessidade de apego como sendo inata e essencial ao desenvolvimento de qualquer ser humano. Independentemente de serem profissionais ou pacientes todos apresentam essa necessidade de maneira inata.

Durante muito tempo, acreditava-se que tanto a formação quanto a manutenção dos vínculos estariam alicerçadas única e exclusivamente na necessidade humana básica de satisfação de impulsos primários, tais como alimento e sexo.

Segundo Bowlby (1984), o apego seria uma forma de vinculação através da qual o senso de segurança atribuído pela figura do apego seria a motivação do sujeito. Motivação esta que é apontada pelo autor como algo tão importante à sobrevivência quanto às necessidades de procriação e alimentação. A figura de apego, segundo esta concepção, é percebida e identificada enquanto alguém ou algo dotado de qualidades que lhe possibilitam estar apto a lidar com o mundo que circunda a relação.

A segurança e o conforto atribuídos a esta figura permitem que esta seja usada enquanto uma base a partir da qual, sentindo-se seguro e protegido, o sujeito poderá fazer uma exploração do mundo ao seu redor. Bowlby (1989) denomina este conceito de “base segura”.

(37)

básico e inerente ao ser humano e possui raízes biológicas características da espécie. Entretanto não é possível afirmar que estes comportamentos sejam instintivos, mas sim uma construção de modelos funcionais do Self e das figuras de apego, estruturas cognitivas influentes que surgem como produto de um aprendizado que se inicia a partir das primeiras relações que o indivíduo estabelece através de suas primeiras experiências de vida com os cuidadores que o cercam, ou seja, representações que vão sendo assimiladas, integradas e organizadas hierarquicamente por meio da linguagem e comunicação ao longo do desenvolvimento do sujeito.

O vínculo afetivo pode ser concebido enquanto um laço de duração relativamente estável, através do qual o parceiro é percebido como um indivíduo único, com o qual se deseja uma proximidade e que não pode ser trocado por outro qualquer. O apego diz respeito a uma das formas de vínculo afetivo, no qual o senso de segurança representa a base deste relacionamento. Os vínculos afetivos e os apegos são estados ou representações internas e suas existências podem ser observadas através dos “comportamentos de apego” (tais como sorrir, tocar, chorar, agarrar, etc.) que visam manter a proximidade com a figura.

“O modelo funcional interno é uma representação mental de aspectos do mundo, dos outros, do self e dos relacionamentos com os outros que são relevantes para o indivíduo. Incluem componentes afetivos e cognitivos.” (RAMIRES e SCHNEIDER, 2010, p. 27). Os modelos funcionais internos são, portanto, representações ligadas ao apego.

Sua formação inicia-se durante o primeiro ano de vida, através das respostas do cuidador às ações do seu bebê. Os conceitos de vínculo afetivo e de modelo funcional estão intimamente baseados em representações de relacionamentos e/ou de interações com figuras significativas. Assim, vão se construindo as primeiras representações generalizadas de eventos. Por isso, Franco et al (2011, p. 302) afirmam que o vínculo desenvolvido nas relações hospitalares “já vem escrito em nossa história e relações afetivas significativas”.

(38)

mundo interno do sujeito podem ser explorados e desenvolvidos.

Uma vez formados, esses modelos têm uma tendência à estabilidade e uma existência fora da consciência do sujeito. As generalizações e modelos construídos e integrados ao sujeito vão sendo responsáveis pela geração de regras capazes de direcionar os comportamentos, as avaliações de experiências futuras, a organização da atenção, e da memória e a regulação das próprias emoções.

O sistema de apego é considerado o primeiro e o principal regulador da experiência, sempre com o objetivo de buscar a garantia da segurança. A criança aprende a identificar e lidar com suas próprias emoções a partir de um contexto diádico, ou seja, na relação com o outro. A criança aprende sobre suas próprias emoções e as regula, ou modula, a partir da ressonância, ou seja, da maneira como o cuidador compreende e responde às emoções que lhe são endereçadas.

Os modelos funcionais possuem uma função defensiva. Possuem o papel de contribuir para a regulação e fortalecimento do Self. Através deste, o sujeito cria sua realidade e os significados individuais e socialmente compartilhados atribuídos a esta realidade. Segundo Ramires e Schneider (2010), a função regulatória seria responsável, assim, não somente para a reflexão a respeito da realidade, mas também enquanto uma maneira de construir uma realidade e percepção própria da realidade. As regras decorrentes destes modelos podem permitir, mas também limitar o acesso do indivíduo a certas formas de conhecimento a respeito do Self, da figura de apego e do relacionamento entre ambos, e serão refletidas na organização do pensamento e da linguagem, na medida em que se relacionam direta e indiretamente ao apego.

Main, Kaplan e Cassidy (1985) procuram demonstrar, através de estudo, que mesmo possuindo uma história de infância desfavorável em relação as suas figuras de apego, muitos adultos podem ser percebidos como sendo cuidadores seguros e autônomos para suas crianças, na medida em que se mostram capazes de produzir uma narrativa coerente, clara, organizada e suficientemente aberta emocionalmente. Segundo estes autores, o que está em jogo para a definição da qualidade de segurança atribuída a esses adultos em relação ao apego, nestas situações, não é o comportamento concreto dos cuidadores que estes tiveram na infância, mas, sim, o estabelecimento de modelos representacionais internos adequados.

(39)

desempenhem uma função regulatória para a criança na interação. A rede de suporte, ou seja, as figuras importantes na via e nas relações do indivíduo devem possuir a capacidade de imaginar experiências afetivas nas suas crianças mesmo antes do seu nascimento, reconhecê-las e responder a ereconhecê-las por meio do seu comportamento. Cabe ao cuidador, a figura importante na relação, sintetizar e integrar para o outro, na relação, a experiências que ela é capaz de sintetizar e integrar nele mesmo. Entretanto, as fragmentações e distorções nas suas respostas ao afeto também podem acarretar falhas relacionadas à capacidade empática e às regulações inconsistentes no outro.

Fornagy (1999) apresenta o conceito de função reflexiva. Segundo esse autor, cuidadores com capacidade reflexiva promovem com mais probabilidade apego seguro em suas crianças. Ressalta que um ciclo de desvantagens e de persistências transgeracionais de vínculos inseguros e fragilizados pode ser interrompido se o cuidador adquirir a capacidade de refletir produtivamente sobre a experiência mental. A capacidade dos cuidadores de observar, compreender e nomear os estados mentais da criança é o que vai permitir que esta adquira a mesma capacidade.

A função reflexiva envolve tanto um Self reflexivo (a autocorreção) como um componente interpessoal que supre idealmente o indivíduo com uma capacidade bem desenvolvida de distinguir as realidades interna e externa, supostas com base nas vivências reais e nos processos mentais e emocionais intrapessoais, a partir das comunicações interpessoais.

A aquisição da capacidade de mentalizar é, desta forma, parte do processo intersubjetivo entre a criança e o cuidador, que se desenvolve no contexto de relacionamentos de apego seguro, facultando à criança a possibilidade de alcançar a regulação e o controle das próprias emoções, desenvolvendo a segurança interna, a autoestima e a autonomia. O estabelecimento adequado da função reflexiva é um recurso protetor, entretanto, o contrário deve implicar numa maior vulnerabilidade para traumas futuros.

Referências

Documentos relacionados

Através do experimento in vivo, verificou-se que o pó nebulizado de nanocápsulas (Neb-NC) é efetivo na proteção da mucosa gastrintestinal frente à indometacina, enquanto que os

• Capacitação e Transferência da metodologia do Sistema ISOR ® para atividades de Coaching e/ou Mentoring utilizando o método das 8 sessões;.. • Capacitação e Transferência

Se no cadastro da administradora, foi selecionado na aba Configurações Comissões, para que as comissões fossem geradas no momento da venda do contrato, já é

Excluindo as operações de Santos, os demais terminais da Ultracargo apresentaram EBITDA de R$ 15 milhões, redução de 30% e 40% em relação ao 4T14 e ao 3T15,

Na sequência da identificação das medidas de intervenção, que se enquadram nos objetivos deste estudo estratégico, foram identificadas, no âmbito do PGBH-RH4, 58 massas

5.2 Importante, então, salientar que a Egrégia Comissão Disciplinar, por maioria, considerou pela aplicação de penalidade disciplinar em desfavor do supramencionado Chefe

O destaque é dado às palavras que abrem signi- ficados e assim são chaves para conceitos que fluem entre prática poética na obra de arte e sua reflexão em texto científico..

Este desafio nos exige uma nova postura frente às questões ambientais, significa tomar o meio ambiente como problema pedagógico, como práxis unificadora que favoreça