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REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO – RDD RETROCESSO E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS GARANTIDORES DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL

FACULDADE DE DIREITO

JARBAS NEVES GUEDES

REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

RDD

RETROCESSO E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS

GARANTIDORES DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

FORTALEZA

(2)

JARBAS NEVES GUEDES

REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

RDD

RETROCESSO E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS

GARANTIDORES DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Marcos de Holanda.

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JARBAS NEVES GUEDES

REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

RDD

RETROCESSO E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS PROCESSUAIS

GARANTIDORES DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Marcos de Holanda.

Aprovada em_____/_____/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Marcos de Holanda (Orientador) Universidade Federal do Ceará – UFC

_________________________________________ Prof. Luiz Eduardo dos Santos

Universidade Federal do Ceará – UFC

_________________________________________ Prof. Danilo Santos Ferraz

(4)

AGRADECIMENTOS

(5)

RESUMO

Esta monografia visa desenvolver uma análise dos vários aspectos negativos que englobam a aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado – RDD. Para ser mais específico, encontram-se várias irregularidades na aplicação da Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, criadora do referido instituto. Expõe-se tais falhas pelo claro desvio efetuado por esse regime prisional frente ao caminho preceituado pela Constituição brasileira, classificada pela doutrina como garantista, albergando direitos declarados universais pela Declaração Universal dos Direitos do Homem. A pesquisa teve início pelas origens dos preceitos fundamentais e sua constitucionalização, a exibição dos direitos que cada princípio resguarda, passando para a origem do regime ora discutido, sua aplicação e finalmente a demonstração de que o mesmo, nos moldes em que está, não só não se qualifica a dar segurança a sociedade, como consubstancia-se em meio desprovido de razoabilidade, tornando-se, deste modo, em um instrumento cruel e violador dos princípios garantidores da dignidade da pessoa humana, desta feita de inconstitucionalidade flagrante.

(6)

ABSTRACT

This monograph aims to develop an analysis of several negative aspects that include the application of the Disciplinal Differentiated Regime – RDD, to be more specific, there are several irregularities in the implementation of Law 10.792 of December 1, 2003, creator of the scheme. It is clear such failures by the Brazilian Constitution, classified by the doctrine as “garantista”, hosting rights declared by the Universal Declaration of Human Rights. The search began from the origins of the fundamental precepts and its constitution, the exhibition of the rights that each principle protects, to the origin of the system now discussed, its implementation and finally a demonstration that the same, in the molds where it is, not only does not qualify to give security to society, as embodied itself in the midst unprovided of reasonableness, becoming , thus, in a cruel instrument that violates the principles guarantors of the human dignity, using other words, of flagrant unconstitutionality.

(7)

ÍNDICE

INTRODUÇÃO... 09

1. Direitos fundamentais... 10

1.1. Idade Média... 10

1.2. O Iluminismo... 11

1.3. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão... 12

2. A Constituição garantista... 14

3. Princípios Fundamentais... 18

3.1. Princípio da Legalidade... 19

3.2. O devido processo legal... 20

3.3. O princípio da razoabilidade e o devido processo legal... 21

3.4. O princípio non bis in idem... 23

3.5. O princípio da presunção de inocência... 24

3.6. O duplo grau de jurisdição... 25

3.7. O princípio do Juiz natural e o poder geral de cautela... 26

3.8. O princípio da individualização da pena... 28

4. Execução Penal... 29

4.1. Conceito... 29

4.2. Natureza jurídica da execução penal... 30

4.3. A autonomia da execução penal... 32

4.4. O caráter ressocializador da execução penal... 33

(8)

6. Das penas... 36

6.1. Evolução das penas... 37

6.2. Teorias absolutas e relativas... 39

6.3. Sistemas prisionais... 40

6.4. Impossibilidade de regime mais gravoso... 41

6.5. Direitos dos presos... 42

7. O direito penal do inimigo... 44

7.1. Crítica à teoria de Jakobs... 45

8. O Regime Disciplinar Diferenciado... 47

9. Jurisprudência... 56

Conclusão... 62

(9)

INTRODUÇÃO

Com o surgimento do Estado, o qual implicou na proibição da autotutela e a exclusividade na aplicação do jus puniendi, deveria ter havido a eliminação das aberrações, da

barbárie, entretanto, no princípio das instituições nacionais, prevalecia o entendimento de que o súdito deveria servir incondicionalmente ao monarca, o qual detinha poder ilimitado, até mesmo sobre a vida e a morte dos membros da sociedade, o que representou durante um longo período, na execução de penas desumanas, cujo único objetivo era castigar o indivíduo acusado de ter cometido algum crime, sem que lhe fosse garantido qualquer tipo de defesa.

Felizmente, com o surgimento do Estado moderno, sustentado pela junção do Estado de direito e pelo Estado democrático, tendo como norte os princípios garantidores da dignidade da pessoa humana, as sanções desprovidas de racionalidade deixaram de existir, entretanto, com a ascensão da criminalidade, tem havido uma crescente sensação de insegurança, levando o Poder Público a expedir leis casuísticas, atentatórias contra os próprios princípios fundamentais, implícitos e explícitos da Constituição Federal de 1988.

(10)

Retrocede-se aos tempos de Beccaria, o qual denunciou toda sorte de atrocidades cometidas pelo Estado, em nome da Lei.

1. Direitos fundamentais

1.1. Idade Média

Na busca das origens dos direitos fundamentais, já na Idade Média foram encontrados traços das declarações nos forais e nas cartas de franquia, as quais continham enumerações de direitos. Assim, ao contrário do que se pensava, a idéia de direitos fundamentais iniciou antes do chamado Constitucionalismo. Entretanto, verifica-se que, desde a Revolução de 1789, as declarações de direitos são um dos traços do Constitucionalismo, como resposta ao Absolutismo.

Não há como dissociar a influência do Cristianismo na edição das declarações de direitos, visto que a idéia de que cada pessoa é criada a imagem e semelhança de Deus, impulsionou os ideais de liberdade, pois abstraindo-se a ideologia da igualdade, cai por terra as idéias absolutistas, nascendo ou renascendo o pensamento sobre a existência de direitos naturais e intangíveis em favor do indivíduo. São Tomás de Aquino, com suas lições, influenciou sobremaneira a concepção de que o homem possui direitos naturais intangíveis. Assim, embora já possam ser encontrados na Grécia antiga os ideais jusnaturalistas, por exemplo, em “Antígona”, e na concepção Aristotélica, é, no Tomismo, que se encontra a inspiração do direito natural, ao se fazer a distinção entre a “ lex divina, lex natura e lex positiva”. Ocorreu então a necessidade de

(11)

Por conta da supracitada ideologia, várias Cartas foram editadas, as quais precederam às declarações. Dentre mencionadas Cartas, uma das primeiras foi a “Magna Charta Libertatum”, a qual foi editada, por imposição da nobreza inglesa, forçando o Rei João Sem Terra, em 1215, a assinar um Tratado, no qual se comprometia a respeitar direitos e a seguir um

procedimento previamente estabelecido. Convém registrar que, mencionado acordo é tido, pela doutrina, como o marco inicial de um dos mais importantes, se não o mais importante princípio norteador do processo, o “due process of law”. É importante registrar a ocorrência da

mitigação do Poder do Rei, em várias monarquias, ensejando conquistas, que, em princípio, só surtiram efeito para a nova classe emergente, a burguesia, mas que posteriormente, com a elevação do Estado Constitucional, toda sociedade sairia vencedora desse processo. Nessa linha de pensamento, a Constitucionalização de princípios daria maior segurança jurídica aos direitos do homem. Segundo Paulo Bonavides, citando Carl Schimidt, com relação aos direitos fundamentais, “estabeleceu dois critérios formais de caracterização: pelo primeiro, podem ser designados direitos fundamentais todos os direitos ou garantias nomeados e especificados no texto magno. Pelo segundo, os direitos fundamentais são aqueles direitos que receberam da Constituição, um grau mais elevado de garantia ou segurança.1

1.2. O Iluminismo

Inequivocamente, o pensamento iluminista da França do século XVIII e a Independência Americana foram as principais influências para o surgimento das declarações de direitos. Sendo o primeiro a fonte de inspiração do segundo. O Iluminismo foi a corrente de pensamento que estabeleceu o primado da razão como critério da verdade e do progresso da vida

1 BONAVIDES, Paulo.

(12)

humana, representando, em virtude do crescimento comercial, a visão de mundo sob os interesses da burguesia intelectual da época. Há três nomes foram atribuídos a idealização do pensamento Iluminista: René Descartes (1596-1650), na filosofia; Isaac Newton (1642-1727); merecendo estaque, o inglês John Locke (1632-1704), cuja ideologia representou o individualismo liberal contra o absolutismo monárquico, no seu Ensaio sobre o Entendimento Humano (1690). Também influenciaram o pensamento Iluminista: Voltaire (1694-1778) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), aos quais combatiam às injustiças, à intolerância religiosa e aos privilégios do absolutismo. Servindo referida ideologia para preparar o caminho para a Revolução Francesa (1789), fornecendo-lhe, inclusive, o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, o qual, segundo Paulo Bonavides, tais lemas consubstanciaram-se nos direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira geração respectivamente. Sendo o direito de liberdade aquele voltado para garantir direitos civis e políticos inerentes ao ser humano e oponíveis ao Estado, os direitos de segunda geração são os chamados direitos econômicos, sociais e culturais prestados pelo Estado, através de políticas distributivas; os direitos de terceira geração ou de fraternidade garantem o desenvolvimento, a paz, ao meio ambiente, enfim, são direitos voltados para o interesse coletivo. 2

1.3. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 27 de agosto de 1789, surgiu como um instrumento confirmador da Revolução Francesa, sintetizando o pensamento político, moral e social de todo o século XVIII, especialmente dos já citados, Rousseau, Locke e

2 BONAVIDES, Paulo.

(13)

Montesquieu. Convém mencionar que, referida declaração possuía um caráter mais abstrato, mais universal, e tendo o individualismo, iniciado no pensamento Iluminista, o seu ápice.

Nasceu, com a edição dessa declaração, a noção efetiva de defesa do cidadão contra os abusos do Estado. Dessa forma, vários princípios que até hoje norteiam os direitos do cidadão e estão devidamente fundamentados na Constituição de 1988, tiveram início nessa declaração de direitos. Dentre eles, encontram-se os princípios da: isonomia, liberdade, propriedade, reserva legal, anterioridade da lei penal, presunção de inocência, liberdade religiosa, livre manifestação do pensamento, etc. Dá análise dos princípios gravados, verifica-se a presença marcante do pensamento burguês, entretanto, não por esse motivo, deve ser desconsiderado o caráter protecionista dos direitos do cidadão e da defesa do Estado Democrático de Direito, o qual, segundo José Afonso da Silva, traduz-se na junção do Estado de Direito com o Estado Democrático, o qual este “visa a realizar o princípio democrático como garantia geral dos direitos fundamentais da pessoa humana”.3 Assim, tais normas adicionadas ao princípio do devido

processo legal e seus institutos auxiliares (presunção de inocência, contraditório, ampla defesa, proibição de juízo de exceção etc), formam o calhamaço de princípios, garantidores dos direitos do cidadão, e, em especial, devido à instituição do Regime Disciplinar Diferenciado, ao preso, pois, apesar do mesmo estar nesta condição, com exceção ao direito de liberdade, pois o mesmo lhe é cerceado, por motivo justo e atendendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, todos os demais princípios lhe é inerente.

Verifica-se que, de longa data, os direitos atacados, pela edição do Regime Disciplinar Diferenciado, foram positivados, em razão de um período sombrio da história, no qual ao preso ou àquele que fosse submetido a um processo judicial, não lhe era cedido quaisquer

3 SILVA, José Afonso.

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dos direitos supracitados, começa daí a certeza de que o referido regime traduz-se num retrocesso injustificado.

2. A Constituição garantista

A Constituição Federal de 1988, tida pela doutrina, como rígida, passando sua modificação por um processo legislativo bem mais tormentoso, fato este que corrobora o entendimento, segundo o qual, quis o legislador originário que a Constituição brasileira representasse a norma maior desta nação e que todas as demais leis não pudessem contradizê-la, seguindo a escola kelseniana, a qual, nas palavras de Glauco Barreira, defendia que: “as normas superiores fundamentavam as inferiores sob o aspecto dinâmico-formal”.4 Dessa forma, dita

escola propõe uma estrutura piramidal das normas jurídicas, tendo no topo dessa estrutura, a constituição, como máxima lei de um país, e tendo nos princípios fundamentais (direitos do homem positivados) e naqueles que pairam sobre a carta maior, suas diretrizes extremas.

Devido à rigidez das normas constitucionais, as leis infraconstitucionais, já em vigor, na época da edição da Carta Magna, deveriam ser recepcionadas pela Constituição Federal, estando necessariamente de acordo com seus fundamentos, o que efetivamente ocorreu com a Lei nº. 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), pelo seu caráter humanitário e o completo atendimento aos princípios garantidores da dignidade da pessoa humana, o qual constitui o maior objetivo da Constituição brasileira.

O mesmo deve ocorrer quanto às normas que vierem a fazer parte do ordenamento jurídico pátrio, devem as mesmas enquadrar-se dentro do chamado Estado Democrático de

4 MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira.

Hermenêutica e unidade axiológica da Constituição. 3. ed. Belo

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Direito, e, para que isso aconteça, não basta que a norma jurídica infraconstitucional atenda simplesmente ao quorum necessário para sua aprovação, como exige o Procedimento legislativo, é imprescindível que referida lei não fira os princípios escolhidos pelo Estado Democrático, sob pena de inconstitucionalidade. O Regime Disciplinar Diferenciado - RDD, como ao final será provado, é inconstitucional. Entretanto, referida falha legislativa, só é percebida por aqueles que não confundem direito com norma, pois sob o ponto de vista estritamente normativo, nenhuma irregularidade há neste regime fechadíssimo.

Foram, sob regime ditatorial, quinze anos de era Vargas e outros vinte e um anos de regime militar, nos quais inúmeras ofensas aos direitos humanos foram cometidas, tais como, prisões ilegais, torturas e até homicídios, por parte do Estado, algo inaceitável, sob a óptica de um Estado Garantista, o que foi expressamente escolhido pelo povo brasileiro, com a edição da Constituição de 1988. Assim, o legítimo detentor da soberania, por meio de seus representantes, repudiou veementemente as prisões ilegais, o desatendimento ao devido processo legal, o encarceramento desumano, cruel, o que se afigura com a execução deste “tupiniquim” direito penal do inimigo.

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lembrar a fragilidade deste princípio quanto ao seu atendimento, qualquer ação, por menor que seja, já desvirtua o devido processo legal, basilar do processo penal. É importante registrar que, mencionado princípio possui dois corolários, o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Ainda dentro do necessário atendimento ao princípio da dignidade da pessoa humana, encontramos a proibição expressa a existência de penas cruéis, o que ficará devidamente comprovada a irregularidade cometida diante do RDD, tendo em vista o desatendimento a dois princípios que, embora não estejam positivados na Constituição Federal, norteiam todos os atos jurídico, sejam, estatais ou não, mas, em especial, quanto à aplicação de restrições à liberdade e aflições à incolumidade física e mental do condenado, expressamente vedadas pela Carta Magna, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

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Federal, o qual deverá enfrentar o mesmo problema em relação ao Direito Penal do Inimigo Nacional.

Convém registrar que, há entendimento, diga de passagem correto, que os direitos fundamentais não são absolutos, entretanto eles não podem ser desatendidos ao bel prazer de uma determinada classe social, que utiliza de seu poder econômico, para inserir leis punitivas, sem que as mesmas tenham efetividade e se coadunem aos princípios constitucionais. Além disso, o interesse público, sempre utilizado como manto protetor a albergar a edição de leis que renascem o instituto da vingança punitiva, não podem prevalecer ao interesse individual, quando se verifica que a norma em questão não atende aos interesses da sociedade.

Em princípio, acredita-se que o regime disciplinar diferenciado seja inconstitucional, por não atender aos princípios da legalidade, do devido processo legal, do juiz natural e da constituição de pena cruel. Esse último, pelo desatendimento aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Em suma, nos moldes em que está positivado, referido regime, há flagrante atentado ao Estado Democrático de Direito e ao princípio da dignidade da pessoa humana, principal objetivo da Carta política de 1988, e ligado em uma relação meio-fim com os princípios constitucionais. Nesse caminho, Glauco Barreira, assim se posiciona:

A dignidade da pessoa humana é a fonte ética dos direitos fundamentais, não sendo estes senão emanações do valor básico mencionado. Por esse motivo, fala-se hoje em dimensões e não mais em gerações de direitos fundamentais, sendo a relação deles com a dignidade da pessoa humana equiparada àquela que há entre existência e o Ser.5

Em suma, os direitos fundamentais têm no atendimento ao princípio da dignidade da pessoa humana a sua razão de existência, por constituírem os primeiros em base de uma Constituição, para o atendimento do bem comum, traduzindo-se a dignidade humana em ações estatais garantidoras da mesma, através de serviços básicos e essenciais ao ser humano.

5 MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira.

Hermenêutica e unidade axiológica da Constituição. 3. ed. Belo

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3. Princípios Fundamentais

Os princípios fundamentais são, na verdade, as garantias dadas aos direitos do homem e que estão explícita ou implicitamente inseridas no corpo de uma Constituição, ou a norteiam, como é o caso dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Paulo Bonavides, citando Trabucchi, classifica os princípios como:

Critérios inderrogáveis ou diretrizes para a interpretação e a aplicação das normas, eles assumem, com toda legitimidade, a tríplice dimensão fundamentadora, interpretativa e supletória em relação às demais fontes, conforme Juristas contemporâneos de último assinalaram, avaliando, assim, o grau crescente de importância que a cada dia eles assumem em todos os domínios do Direito Público, com presença freqüente e culminante nas esferas da Justiça administrativa e da Justiça Constitucional.6

Proclama ainda o ilustre mestre que, diante do crescente constitucionalismo, há uma “valoração e eficácia dos princípios, como normas-chaves, de todo o sistema jurídico.”7Também

o renomado jurista afirmou que, “em verdade, os princípios são o oxigênio das Constituições na época do pós-positivismo. É graças aos princípios que os sistemas constitucionais granjeiam a unidade de sentido e auferem a valoração de sua ordem normativa”8.

Nesse diapasão, entende-se que os princípios fundamentais se consubstanciam no fim de qualquer norma ou ato jurídico, ou seja, nada deve ir de encontro aos princípios, sob pena de inconstitucionalidade e de representar um desarranjo, uma falta de coerência em todo ordenamento jurídico.

6 BONAVIDES, Paulo.

Curso de direito Constitucional. 19º edição. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 284

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3.1. Princípio da Legalidade

O princípio da legalidade é o principal instrumento Constitucional de proteção individual do cidadão contra abusos cometidos pelo Estado, pois proíbe a retroatividade para incriminar ou agravar a pena, baseada em fato anterior, o uso da analogia, do costume e da indeterminação dos tipos legais e das sanções legais, merece especial destaque a existência nas disposições do regime disciplinar diferenciado da existência de norma penal em branco, a qual a doutrina diverge sobre sua aplicabilidade, entretanto, como o bem jurídico, tutelado por este regime se trata de pena extrema, deve-se entender pela inaplicabilidade da disposição legal, até a adequada regulamentação.

A maior expressão deste princípio se dá na norma penal incriminadora a qual deve inicialmente definir a conduta como ilícita e, em segundo momento, descrever uma sanção a qual será imposta àquele que pratica o ato proibido. Registrando-se os caracteres de exclusividade, por ser a única a descrever um tipo penal e impor uma pena; da abstração e da impessoalidade, por não se destinar a um indivíduo ou grupo determinado; da imperatividade, pois a todos é devido o acatamento da lei; e da generalidade da norma penal, por destinar-se a toda coletividade

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3.2. O devido processo legal

A Magna Carta do Rei João Sem-Terra, em 1215 teria sido o primeiro ordenamento a tratar desse princípio, sendo, muitos séculos depois, consagrado, de forma implícita, na Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948. A Constituição cidadã de 1988, consagra expressamente esse princípio, no art. 5º, inciso LIV: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, constitui assim esse princípio como a maior garantia de cunho processual, garantidor dos demais institutos protecionistas do cidadão, tais como os princípios da isonomia, do juiz natural, da inafastabilidade da jurisdição, da proibição da prova ilícita, da publicidade dos atos processuais, do duplo grau de jurisdição e da motivação das decisões judiciais e principalmente do contraditório e da ampla defesa. Entende-se que o devido processo legal somente se completa como garantia constitucional, mediante a existência de normas processuais justas. Sobre a necessidade da edição de normas justas para que as mesmas não firam o mencionado princípio processual, merecem destaque as palavras do ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Velloso, o qual assim se manifestou:

due process of law, com conteúdo substantivo - substantive due process - constitui

limite ao Legislativo, no sentido de que as leis devem ser elaboradas com justiça, devem ser dotadas de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (racinality),

devem guardar, segundo W. Holmes, um real substancial nexo com o objetivo que se quer atingir.9

Verifica-se diante, da manifestação em acórdão que, para o atendimento deste princípio, faz-se necessário que as normas jurídicas atendam ao princípio da razoabilidade, criando assim uma pétrea ligação, dessa forma, se a lei processual, embora atenda a todos os requisitos de legalidade e legitimidade, se não houver razoabilidade na sua aplicação estará

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devidamente configurada a afronta ao princípio do devido processo legal, e, em conseqüência, a inconstitucionalidade da norma infraconstitucional.

Assim, conclui-se que, o devido processo legal é o instrumento máximo garantidor da cidadania e da democracia, posto que reúne grande número de garantias de ordem constitucional e processual. Além disso, para que a construção que lhe foi dada, pela jurisprudência e doutrina internacional, é necessário que conste do texto constitucional, hierarquicamente superior às normas injustas as quais ele pode e deve coibir, tais como o referido regime ora questionado.

3.3. O princípio da razoabilidade e o devido processo legal

O princípio da razoabilidade advém do direito norte-americano, recebendo outra denominação pelos alemães, princípio da proporcionalidade, entretanto a melhor definição, aquela que por si só já lhe dita os objetivos é a de “princípio da proibição de excesso". Convém mencionar que, os tribunais brasileiros utilizam indistintamente os termos razoabilidade e proporcionalidade, já a doutrina faz distinção sobre os aspectos históricos e estruturais, os quais não são claros. Diante da divergência doutrinária e da falta de discussão jurisprudencial, além de que referida divergência afigura-se inócua, para o tema proposto, apreciaremos apenas seus efeitos na esfera jurídica brasileira.

O Princípio da razoabilidade é o meio através do qual o operador do Direito busca a perfeita adequação, a idoneidade, a lógica e a prudência e a moderação no ato de interpretar as normas, buscando extirpar distorções, anomalias e absurdos decorrentes do arbítrio e do abuso de poder.

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mesmo como o “princípio dos princípios, já que através dele os outros encontram a sua condição de aplicabilidade e eficiência”.10 Nessa linha de pensamento deve haver razoabilidade ou

proporcionalidade quando um princípio afasta outro, o que não ocorre em relação ao regime disciplinar diferenciado.

Na verdade, trata-se de um mecanismo de controle da discricionariedade que a administração possui na edição de seus atos e principalmente, para o caso em questão, o controle das normas emanadas do legislativo, as quais possuem aparência de legalidade, mas estão eivadas de vício, o que permite ao Judiciário invalidar as ações abusivas ou destemperadas dos administradores e dos legisladores. Além dos pressupostos do processo legislativo, uma lei, tem que se adequar aos limites do devido processo, por meio da razoabilidade. Assim, a lei deve empregar razoáveis meios para atingir seus fins, os meios devem mostrar uma razoável e substancial relação aos propósitos do ato, não impondo qualquer limitação desproporcional aos direitos individuais.

Convém registrar que, as leis normalmente ferem direitos. Fazendo uso da lei de porte de arma, podemos exemplificar que uma norma que proíbe "disparo de arma de fogo em área habitada" restringe essa liberdade do indivíduo, entretanto, isso é feito em nome do bem comum, para evitar o risco de balas-perdidas e conseqüente a exposição da idoneidade física e talvez até a vida de terceiros a perigo. Tal lei é razoável, porquanto compreensível que aquela liberdade ou o prazer insólito que daquele ato resulta não são superiores ao bem protegido pela norma.

Pelo exposto, conclui-se que o princípio da razoabilidade atrela-se ao princípio do devido processo legal na busca pelo ideal de justiça e, para se aproximar deste, o instrumento

10 MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira.

Hermenêutica e unidade axiológica da Constituição. 3. ed. Belo

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principal é o senso de proporção. Utilizando-se deste, o intérprete pondera os valores que informam o ordenamento jurídico, buscando o equilíbrio entre o jus societas e o direito

individual, a moderação na aplicação da sanção, de modo que não exclua em definitivo aquele que sofre a penalidade, e a harmonia normativa.

3.4.O princípio do non bis in idem

O princípio do non bis in idem, embora não esteja expressamente previsto

constitucionalmente, tem sua presença garantida no sistema jurídico-penal de um Estado Democrático de Direito. Certamente se avolumou com o incremento do respeito à dignidade da pessoa humana e com a consolidação de um Direito Penal que se ocupa precipuamente do fato

delituoso, ao invés da irracional segregação do indivíduo, por qualquer meio, como instituto de vingança. É a prevalência do "Direito Penal do fato" sobre o "Direito Penal do autor".

Referido princípio em comento consubstancia-se, na diretriz que ninguém poderá ser punido mais de uma vez por uma mesma infração penal. Sobre o RDD, verifica-se que o mencionado princípio é violado, pois se o agente comete o ato reprovável pela sociedade, será então julgado necessariamente em processo próprio, configurando, assim, a aplicação da teoria de Jakobs (RDD) em verdadeiro bis in idem pois o condenado sofrerá duas condenações pelo

mesmo fato, ou pior, caso, posteriormente em processo autônomo se comprove a inocência do mesmo, ele já terá sofrido os efeitos do reprovável regime. Garantindo tal pensamento, filia-se ao mesmo Guilherme de Souza Nucci, o qual assim se manifestou:

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novamente sancionar o agente pelo mesmo fato. Afinal, o tipo penal é um só, não existindo possibilidade de se duplicar a sanção.Por outro lado, seria nitidamente lesivo à dignidade da pessoa humana ser ela punida duas vezes pela mesma conduta, o que evidenciaria não ter fim o poder estatal, firmando autêntico abuso de direito.11

3.5. O princípio da presunção de inocência

O princípio da presunção de inocência, surge como um desdobramento do princípio máximo do processo penal, o devido processo legal, está positivado no art. 5º, Inciso LVII, da Constituição Federal, a qual assim dispõe: “ninguém será considerado culpado até trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Tutela, assim, mencionado princípio a liberdade pessoal daquele submetido a processo judicial na esfera penal.

Referido princípio busca equilibrar o conflito entre o jus puniendi do Estado e o jus libertatis do cidadão. Em verdade, cabe ao Estado promover a punição para os indivíduos que

desenvolvem comportamento em desconformidade com as normas de conduta social, previamente determinadas, segundo o necessário respeito ao princípio da legalidade, entretanto, em regra não cabe a restrição a qualquer direito do indivíduo enquanto ele não for julgado por seus pares.

Guilherme de Souza Nucci, em comentário, exemplifica tal princípio e a única forma possível de mitigação do mesmo: “As pessoas nascem inocentes, sendo esse o seu estado natural, razão pela qual, para quebrar tal regra, torna-se indispensável que o Estado-acusação evidencie, com provas suficientes, ao Estado-Juiz a culpa do réu”.12

11 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 94

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Da análise do preceito constitucional, abstrai-se que as medidas cautelares devem sempre ser executadas com restrições, aliás, mais recomendado seria até que elas fossem evitadas, especialmente no âmbito do processo penal, tendo em vista o relevante objeto jurídico, albergado por essa norma infraconstitucional, a liberdade, a qual, segundo boa parte da doutrina, é o maior bem jurídico do ser humano. Por esse motivo, tendo em vista a falibilidade da decisão judicial, temerárias são as medidas cautelares, pela possibilidade de configurarem-se em verdadeira medida abrupta, não razoável e despótica.

Convém mencionar que, no processo penal, medidas preventivas, em razão do princípio da presunção de inocência, são exceções, o mesmo se aplicando na Lei de Execução Penal (LEP), ocorre que o RDD, aberração jurídica, prevê medida cautelar contra aqueles que estão detidos de maneira apenas preventiva, ou seja, sem condenação definitiva. O que se afigura inaceitável, a aplicação de um regime tão severo a alguém que sequer foi julgado.

3.6. O duplo grau de jurisdição

O princípio do duplo grau de jurisdição decorre do devido processo legal, como uma garantia na busca de uma prestação jurisdicional justada. Essa norma fundamental tem o objetivo de possibilitar a provocação do reexame da matéria apreciada e decidida em primeiro grau, quando a parte vencida, não se conformar com a referida decisão, garante-se ao mesmo esta pretensão diante da sempre presente falibilidade humana.

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recursais, compostas de magistrados de mesma hierarquia; e nos casos de competência originária dos tribunais superiores.

A execução penal deve ser compreendida como um processo judicial autônomo, distinto do processo de conhecimento que lhe deu origem, em cujo bojo devem ser obedecidos os princípios e garantias constitucionais, assim especialmente quanto ao cerceamento de direito pelo RDD, as decisões judiciais deveriam ser albergadas por esse princípio, o que a lei que ensejou a inclusão desse regime na Lei de Execução Penal não o fez, constituindo-se em mais uma falha, entretanto a utilização dos institutos recursais das demais legislações pátrias afiguram-se como solução da questão controversa. Embora devido a rigidez do RDD, por piorar a situação do condenado, deveria haver um processo autônomo para este instituto e não um mero incidente processual, cujo recurso apropriado é o agravo.

3.7. O princípio do Juiz natural e o poder geral de cautela

Não resta dúvidas quanto ao poder geral de cautela do juiz, podendo decretar medidas urgentes, em casos de extrema e comprovada necessidade, quando presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, figurando como exemplos, no processo civil, as liminares, as tutelas

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do sentenciado, entretanto, as medidas cautelares, em âmbito penal, só devem ser proferidas mediante a inequívoca necessidade da medida restritiva de direitos.

Tem o magistrado poderes par coibir excessos ou desvios na execução da pena. Entretanto tais poderes estão limitados pela sentença condenatória transitada em julgado. Conclui-se que, o juiz poderá proferir resoluções que adaptem o comando inicial condenatório às exigências do cumprimento da pena imposta. Ressalve-se que, excepcionalmente, quando a lei permitir, poderá tomar decisões que possam afetar a própria pena, sem agravar a situação do condenado, assim ocorre nos casos de indulto, graça, adaptação da lei mais benigna, etc.

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regime disciplinar diferenciado, pela autoridade administrativa e a efetiva decisão de incluí-lo dada pela legítima autoridade, o Juiz da Execução.13

3.8. O princípio da individualização da pena

O princípio da individualização da pena, na verdade traduz-se na vertente penal do princípio da isonomia, o qual preceitua que se deve tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente, como forma de se garantir a maior medida de justiça possível. Verifica-se que referido princípio está contido no RDD, entretanto, devido ao rigor excessivo desse regime, a pena acaba afetando o mundo jurídico de quem não é destinatário da norma, no caso os familiares do encarcerado, pois as famílias de outros condenados, seguirão um rito normal, enquanto aqueles, com iguais direitos a esse, sofrerão restrições. Convém registrar a opinião do professor Mirabete, o qual assim se expressou: “individualizar a pena significa dar a cada preso as oportunidades e elementos necessários para alcançar a sua reinserção, posto que é pessoa, ser distinto.”14

O art. 52, III, limita as visitas a apenas a duas pessoas, excetuando-se as crianças, convém indagar, sob qual argumento se baseia tal determinação? Certamente não é a prevalência do Jus societas, mas da intenção pura e simples de punir o preso, o qual se transitada em julgado

sua condenação, com certeza, puni-lo é o caminho correto, mas não dessa forma, desprovida de racionalidade, sem um fim social justo, extrapolando inclusive a esfera jurídica do apenado e atingindo outras pessoas, as quais nada devem a justiça.

13 NUCCI, Guilherme de Souza.

Manual de processo penal e execução penal. 2 ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2006. p. 961 14 MIRABETE, Júlio Fabrini

. Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2006.

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4. Execução Penal

4.1. Conceito

A execução penal é uma fase do processo penal, no qual busca-se a efetividade da ordem contida na sentença penal condenatória, sendo a referida sentença o título executivo legítimo para essa fase processual, trata-se na verdade de pressuposto lógico da execução penal, qual possui três finalidades: retributiva, preventiva e ressocializadora. È retributiva por que compreende a privação de uma pena, restringindo um bem jurídico; é preventiva, pois visa evitar a prática de crimes; e é ressocializadora por que objetiva a readaptação social.

Sobre essa última finalidade, Mirabete demonstra descrença na mesma, como se vê: “A ressocialização não pode ser conseguida numa instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciárias, tendem a converter-se num microcosmo no qual de reproduzem e se agravam as graves condições que existem no sistema social exterior [...] A pena privativa de liberdade não ressocializa, ao contrário, estigmatiza o recluso, impedindo sua plena reincorporação ao meio social. A prisão não cumpre uma função ressocializadora. Serve como instrumento para a manutenção de estrutura social de dominação”.15

Embora o referido mestre não acredite na ressocialização no sistema carcerário, é nele que o Estado deve investir, para que a reinserção do condenado na sociedade efetivamente ocorra e não em apenas procurar o caráter aflitivo da pena, pois assim, nenhum benefício receberá a sociedade, pelo contrário, a criminalidade só aumentará por falta de políticas integralizadoras do preso e dos excluídos dos direitos mais básicos.

Convém registrar que, em atendimento aos objetivos constitucionais, o preso faz jus a direitos os quais não podem ser derrogados injustificadamente. Sobre esse entendimento o professor Mirabete assim se posiciona:

15 MIRABETE, Júlio Fabrini.

Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2006.

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“Por estar privado de liberdade, o preso encontra-se em uma situação especial que condiciona uma limitação dos direitos previstos na Constituição Federal e nas leis, mas isso não quer dizer que perde, além da liberdade, sua condição de pessoa humana e a titularidade dos direitos não atingidos pela condenação.”16

Abstrai-se daí que estão proibidos os maus-tratos e castigos que, sejam, cruéis ou desumanos, degradante, vexatório e humilhante, atentando assim a dignidade da pessoa humana, entretanto o regime disciplinar diferenciado apesar de seu caráter meramente aflitivo e eivado de desproporcionalidade, foi posto erroneamente na Lei de Execução Penal, instituto garantidor do princípio humanitário. O supracitado mestre do processo penal, nessa linha de pensamento, expressa-se a respeito da limitação de direitos que a execução penal possa elencar: “a prisão não deve impor restrições que não sejam inerentes à própria natureza da pena privativa de liberdade”.17

4.2.Natureza jurídica da execução penal

Muito se discute a respeito da natureza da execução penal, durante a evolução histórica, apareceram três correntes as quais tentam conceituar a natureza jurídica efetuada pelo órgão jurisdicional nessa fase processual. Segundo a primeira corrente, os atos que envolvem a execução penal seriam meramente administrativos, o que não se sustenta tendo em vista a necessidade dentro do processo penal executório da manifestação meritória da autoridade jurisdicional, pois mesmo já encarcerado, o preso faz jus a direitos os quais só poderão ser afastados, ou mitigados mediante decisão judicial.

16 MIRABETE, Júlio Fabrini.

Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2006.

p. 114

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O segundo posicionamento leva em conta dois os aspectos essenciais da execução criminal, a expiação da pena feita nos estabelecimentos prisionais, e o processualismo dos atos que demandam a apreciação do magistrado, conclui-se que a execução penal tem natureza mista, exercendo o juiz um papel administrativo ao fiscalizar e acompanhar os trabalhos desenvolvidos nas penitenciárias e um papel jurisdicional ao proferir decisões que exerçam modificação do mundo jurídico do condenado.

Ada Pellegrini Grinover, principal representante desta corrente, defende que o processo de execução tenha caráter misto, entretanto, a mesma autora, deixa claro a prevalência da natureza jurisdicional da execução penal, vejamos:

“deixando de lado a atividade meramente administrativa que resulta na expiação da pena, através da vida penitenciária do condenado, ou de sua vigilância, observação cautelar e proteção, e que é objeto do direito penitenciário e matéria estranha ao processo, o processo de execução penal tem, assim, natureza indiscutivelmente jurisdicional 18“

Ainda, no mesmo caminho, a autora demonstra, com clareza as dimensões da execução penal que, a seu juízo, são atividades administrativas: a expiação da pena, o cumprimento material da sentença. Por outro lado, a apreciação dos incidentes da execução concessão de livramento condicional, progressão de regime, indulto, comutação de pena, remição de pena, entre outros – é função jurisdicional que cabe ao juiz da execução, nesse diapasão, quanto a inclusão do condenado no RDD, só a autoridade judiciária cabe a inclusão no mencionado regime, restando à autoridade administrativa o mero requerimento, entretanto não é o que ocorre, pois a mesma já preventivamente põe o condenado no referido regime, por 10 (dez) dias.

O terceiro posicionamento define a figura do juiz, como o principal sujeito da relação jurídica processual executiva, dessa feita essa corrente define o caráter jurídico como principal

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natureza da execução penal, em verdade a natureza jurídica da execução penal pode ser definida como um processo jurisdicional, com finalidade punitiva, cuja execução só se dá com a participação da administração.

Nesse diapasão, verifica-se o caráter jurisdicional da Execução Penal, entretanto há uma necessária participação administrativa, a qual exerce o poder disciplinar, podendo até determinar o isolamento na própria cela, entretanto no caso do RDD pelo imprescindível comando da autoridade judiciária, só ela poderia determinar uma das medidas nesse regime em caráter preventivo, e não a autoridade administrativa.

4.3.A autonomia da execução penal

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4.4. O caráter ressocializador da execução penal

A lei de execução penal, até a inclusão do RDD, atendia perfeitamente aos princípios garantidores da dignidade da pessoa, motivo pelo qual referida legislação foi recepcionada pela Constituição de 1988, adotou a mencionada lei a teoria da prevenção, a qual não busca apenas a punição do indivíduo, mas também a inibição estrita e geral de novos atos condenados pela sociedade, e a ressocialização do mesmo encaixa-se dentro dos objetivos da LEP, por meio de ações que incentivem o trabalho, a educação e a futura inclusão social, o que está expresso na mesma, vejamos:

“Art. 1º - A execução penal tem por objetivo efetuar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”19

Verifica-se o alcance das medidas tomadas na aplicação do processo penal executório na redação do art. 3º da LEP, o qual garante que direitos só serão mitigados por meio de sentença e da lei, vejamos o mencionado artigo:

“Art. 3º - Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.”20

O art. 41 da Lei de Execução Penal dispõe sobre os direitos do condenado, como o direito à alimentação suficiente e vestuário; atribuição de trabalho e sua remuneração; previdência social; constituição de pecúlio; proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; proteção contra qualquer forma de

19 Lei nº 7210/84

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sensacionalismo; entrevista pessoal e reservada com o advogado; visita do cônjuge, companheira, de parentes e amigos em dias determinados; chamamento nominal; igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; audiência especial com o diretor do estabelecimento; representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito: contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. Diante das garantias enumeradas no art.41, é inegável o caráter ressocializador da LEP, até pela participação da comunidade na execução das penas, como, se verifica na exposição de motivos da lei de execução penal, a qual preconiza a integração da comunidade, por meio de organismos representativos, objetivando, garantir uma maior probabilidade de recuperação do condenado e conseqüente reinserção social, especialmente quanto ao mercado de trabalho, como preconiza o art. 4º da LEP, nesse caminho, a Lei de Execução Penal estabelece o Patronato e o Conselho da Comunidade.

Não se questiona o direito do Estado restringir direitos, pois, em verdade, o jus puniendi só a este ente cabe este poder, entretanto, mencionada punição deve atender a um fim

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5. As Organizações Criminosas

Devido à péssima atuação estatal, com o surgimento de inúmeras mazelas sociais, o que ocasionou o crescimento da criminalidade e a conseqüente explosão populacional carcerária, surgiram então as Organizações Criminosas, as quais inicialmente tinham o objetivo de proteção contra assassinatos e estupros pelos demais presos, além de estabelecer um caminho mais fácil ao diálogo com as autoridades, buscando melhores condições de vida na prisão. Entretanto com o passar do tempo ditas organizações expandiram-se inclusive para além dos muros das prisões, especializaram-se nas atividades criminosos.

Convém registrar um dos maléficos fatores causados pelo Crime Organizado, o impedimento à ressocialização do condenado membro dessas organizações, assim surge um problema, pois tanto o RDD quanto as “Organizações Criminosas” são impeditivos da ressocialização do condenado. Deve o Estado buscar o equilíbrio entre a defesa da sociedade e a salvaguarda do mínimo vital dos condenados, deve o Poder Público ser enérgico com mencionadas organizações, tomando medidas severas contra os integrantes desses grupos, entretanto tais atos não devem pautar-se pelo espírito de vingança, já extirpado da conduta social, pela proibição da autotutela e o jus puniendi concedido ao Estado.

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alterações, para se garantir a ressocialização do preso, consistente na humanização da própria execução penal, a qual permitirá ao condenado retornar a condição de cidadania ativa, com reflexos benéficos na própria segurança pública. Assim o combate as “Organizações Criminosas” é um dever Estatal e uma conquista social, entretanto mencionada peleja deve obediência a um postulado básico, o da justiça, a de que os atos públicos devem obedecer ao bom senso e a razoabilidade.

6. Das penas

Quando o agente comete um fato típico, ilícito e culpável, surge o dever para o Estado de fazer valer o seu ius puniendi. Sendo a pena o instrumento natural imposto pelo Estado

quando alguém pratica uma infração penal. Contudo, em um Estado Democrártico de Direito, embora o Estado tenha o dever-poder de aplicar a sanção àquele que viola o ordenamento Jurídico, a pena a ser aplicada e sua execução deverão observar os princípios expressos, e aqueles implícitos, previstos em nossa Constituição Federal.

O inciso XLVII do art. 5º da Constituição Federal, diz: “XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo no caso de guerra declarada, nos termos do seu art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis.” 21

Depreende-se dos artigos supracitados que o Brasil, após passar por momentos de avanço e retrocesso democrático, editou uma Constituição Federal, visando proteger os direitos de todos aqueles que, aqui fixam residência, mesmo que temporária em território nacional,

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proibiu a Carta Magna a cominação de uma série penas, por entender que todas elas, em sentido amplo, ofendiam a dignidade da pessoa humana, além de fugir, em algumas hipóteses, à sua função preventiva.

Os Estados modernos têm se pautado pelo garantismo jurídico, assegurando os direitos daqueles que habitam em seus territórios, limitando-se o direito de punir, na esfera Constitucional e infraconstitucional, procurando preservar a dignidade da pessoa humana. Contudo, nem sempre foi assim, o sistema de penas já foi extremamente cruel, sendo que as pessoas sentiam prazer em assistir às execuções que ocorriam , muitas vezes, em praças públicas.

Rogério Greco cita o texto de Michel Foucault o qual narra uma execução ocorrida em 1757:

“Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757, a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris aonde deveria ser levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; em seguida, na dita carroça, na praça de Greve, e sobre um patíbulo que aí será erguido,atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, na sua mão direita segurando a faca com que cometeu o parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos pelo fogo, reduzidos a cinzas lançadas ao vento”22

6.1. Evolução das penas

O homem, no momento em que passou a viver em comunidade, adotou o sistema de aplicação de penas toda vez que regras da sociedade na qual estava inserido eram violadas.

Desta forma, surgiram várias legislações, ao longo da existência da raça humana, com a finalidade de esclarecer as penalidades cominadas a cada infração por elas previstas, a exemplo

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das leis dos hebreus, concedidas por Deus a Moisés, bem como os Códigos de Hamurábi e de Manu.

As penas eram aplicadas de forma diferenciada, levava-se em conta a origem, a raça do apenado e sua origem social, isso se explica pelo fato de que em várias civilizações dividia-se a populações em cidadãos, escravos, servos e estrangeiros livres.

Verifica-se que desde os primórdios da civilização até aproximadamente o século XVIII as penas tinham uma característica extremamente aflitiva, uma vez que o corpo do agente é que pagava pelo mal por ele praticado. Durante o período Iluminista iniciou-se uma mudança de mentalidade no que dizia respeito à cominação das penas.

Beccaria, em sua obra intitulada Dos Delitos e das Penas, publicada em 1764,

tornou-se precursor da indignação com relação a como os tornou-seres humanos estavam tornou-sendo tratados pelos seus próprios semelhantes, sob a falsa bandeira da legalidade, a qual hoje os defensores do Regime Disciplinar Diferenciado, também a utilizam.

Atualmente, em algumas nações ocidentais, há uma preocupação maior com a integridade física, mental e com a vida dos seres humanos, buscam-se afastar os tratamentos degradantes e cruéis. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas, representa um marco nas garantias dadas ao homem contra toda sorte de atentados aos direitos individuais impostos pelos Estados.

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6.2. Teorias absolutas e relativas

As teorias tidas como absolutas advogam a tese da retribuição a qual não encontra o sentido da pena na perspectiva de algum fim socialmente útil, senão em que mediante a imposição de um mal, merecidamente se retribui, procura-se equilibrar e expiar a culpabilidade do autor pelo fato cometido. Denomina-se absoluta esta teoria porque para ela não há qualquer fim social na imposição de pena que não a de compensação, deverá o autor do delito ser acometido de algum sofrimento, o qual pagará sua dívida perante a sociedade. É importante registrar que a sociedade, acometida pelo sentimento de vingança, costuma contenta-se com esse “pagamento” feito pelo condenado. Daí extrai-se a inércia social diante da edição de um instituto tão desconforme com os preceitos constitucionais, o RDD.

A teoria relativa encontra fundamento no critério da prevenção, a qual se divide em prevenção geral - negativa e positiva e; prevenção especial – negativa e positiva. A prevenção geral negativa ou por intimidação tem a intenção de refletir na sociedade, causando temor aos demais indivíduos sociais de que os mesmos venham a sofrer a mesma pena acometida aos condenados; a prevenção geral positiva visa infundir na consciência geral a necessidade de respeito a determinados valores, exercitando a fidelidade ao direito, promovendo a integração social. Já a prevenção especial negativa busca a neutralização daquele que cometeu o delito, através de sua segregação no cárcere; A prevenção especial positiva visa fazer com que o autor do crime desista de cometer futuros delitos.

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6.3. Sistemas prisionais

Para demonstrar o retrocesso que representa a execução do Regime Disciplinar Diferenciado, verifica-se que até mesmo no sistema prisional ocorreu este fato. Em análise histórica, encontram-se três sistemas prisionais. O primeiro, iniciado em 1790, em “Walnut street jail”, uma prisão na Pensilvânia, EUA, o qual empresta o nome a este sistema, também chamado de celular por restringir o espaço ocupado do prisioneiro à sua cela, não havia estímulo ao trabalho, tampouco visitas. Este sistema, o qual o RDD tanto se assemelha, recebeu inúmeras críticas, por causa de sua severidade extrema e da evidente impossibilidade de readaptação social do condenado, por causa do seu completo isolamento.

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6.4. Impossibilidade de regime mais gravoso

Não pode, cautelarmente, estipular-se regime mais gravoso do que o regime inicialmente sentenciado. Tal afirmativa dá-se pelo fato de que o preso tem direito subjetivo em cumprir sua pena sob o regime que lhe foi concedido, de acordo com a sua opinião pessoal, na sentença condenatória. Uma coisa é a imposição de sanção administrativa, algo perfeitamente aceitável, já que após a sentença condenatória, passa a esfera administrativa a ter certo grau de gerência sobre os atos do encarcerado, entretanto, até mesmo com a imprescindível participação do órgão jurisdicional na inclusão do preso no Regime Disciplinar Diferenciado, não deixa tal instituto de ter o caráter de sanção administrativa, a qual não pode dispor de forma tão severa dos direitos fundamentais do sentenciado, pois viola claramente o conceito de justiça penal.

Convém registrar que, para se chegar à conclusão do regime inicial cabível, teve o órgão julgador de analisar não somente a quantidade da pena aplicada, mas também todas as circunstâncias judiciais elencadas pelo art. 59 do Código Penal, razão pela qual as suas características pessoais influenciam na escolha do regime que não pode ser suplantado pelo Estado, pois o RDD, em verdade, a pesar de dever ter natureza administrativa, constitui-se em verdadeiro super regime, ou melhor dizendo, regime fechadíssimo, pelo longo período pelo qual o condenado pode ficar nesta medida, a qual para manter-se dentro do aceitável, como sanção administrativa deveria respeitar o prazo de 30 dias estipulado na redação original da Lei de Execuções Penais. Medida essa mais do que suficiente para reprimir insubordinações nas unidades prisionais.

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cumprimento da pena, a exame criminológico para obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vista à individualização da execução.

A regressão de regime foi disciplinada no art. 118 da Lei de Execução Penal, o qual estabeleceu que, “a execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com transferência para qual quer dos regimes mais gravosos, quando o condenado: I – praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; II – sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime” (em conformidade com o art. 111 da LEP, o qual dispõe que, quando ocorrer condenação por mais de um crime, no mesmo processo, a determinação do regime de cumprimento de pena será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas)23.

É importante registrar que, há entendimento no sentido de que a primeira parte do inciso I do art. 118, não fora recepcionada pela Constituição Federal, pois o legislador constituinte de forma expressa, consagrou no Texto Maior o Princípio da Presunção de inocência, asseverando, em seu art. 5º, LVII, que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o mesmo acontece no RDD quando por “suspeitas” de ter o encarcerado cometido crime doloso, o mesmo é posto preventivamente em tal regime.

6.5. Direitos dos presos

O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral (art.38 do CP). Talvez esse seja um dos artigos mais desrespeitados de nossa legislação penal. A toda hora testemunhamos, pelos meios de comunicação, a humilhação e o sofrimento daqueles que por algum motivo, muitos

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deles até bárbaros, se encontram em nosso sistema carcerário, lembrando que aí incluem-se os presos provisórios, que ainda aguardam julgamento nas instituições penitenciárias. Por todo o País eclodem inúmeros problemas como motins, mortes, tráfico de entorpecentes e de armas.

A pena é um mal necessário, entretanto o Estado quando faz valer o seu jus puniendi,

deve preservar as condições mínimas de dignidade da pessoa humana, o erro cometido por um cidadão ao praticar um delito não permite que o Estado cometa outro, nem mesmo já estando o indivíduo sob a tutela do estado, pois não pode o Poder Público, tratá-lo como um animal irracional. Se uma das funções da pena é a ressocialização do condenado, certamente em um regime cruel e desumano isso não acontecerá, o que fica devidamente caracterizado diante do RDD. Inúmeras leis casuísticas foram editadas, ao logo da história, o que parece repetir-se com o mencionado regime fechadíssimo, e com a tão comentada lei de crimes hediondos, a qual não modificou em nada o quadro de violência desse país, o mesmo ocorrendo com o primeiro, mais recente, mensalmente vemos rebeliões e a ação de grupos armados, em afronta ao frágil império da lei, desmoralizado pela edição de normas casuísticas.

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7. O Direito Penal do Inimigo

O Direito Penal do Inimigo surgiu por meio das idéias de Günter Jakobs, o qual foi discípulo do criador do funcionalismo sistêmico, Welzel, que defendia a primazia na proteção da norma, deixando os bens jurídicos em segundo plano. Daí explica-se o posicionamento radical do primeiro. Jakobs já se manifestava a favor desse tipo de direito desde 1985, entretanto, somente em 2003, ele assumiu claramente a postura de considerar que determinados infratores deveriam ser tratados, como se não fossem pessoa, não sendo assim detentor de direitos como os demais. Para o autor dessa teoria, os inimigos (não-pessoas) são criminosos econômicos, terroristas, delinqüentes organizados, autores de delitos sexuais e outras infrações penais perigosas.24

Resumidamente, aqueles que não irão continuar fiel à norma jurídica, convém mencionar que as recentes manifestações terroristas serviram como fermento para que essa teoria se difundisse em várias nações, o próprio autor cita o atentado de 11 de setembro de 2001, assim, referida teoria defende que os inimigos sofram um procedimento desatrelado de direitos processuais, sendo tratados de forma até pior do que os criminosos de guerra, tudo em nome da segurança pública, pois, segundo o autor, do contrário, haveria vulnerabilidade do direito à segurança das demais pessoas.

Convém registrar que, esta teoria não é tão nova, em obras de autores iluministas encontram-se trechos os quais fazem referência a esse tipo de pensamento. Rousseau assim se manifestou sobre o assunto: “O inimigo, ao infringir o contrato social, deixa de ser membro do Estado, está em guerra contra ele; logo, deve morrer como tal”. Hobbes também falou sobre o

24 JAKOBS, Günther e MELIÁ, Manuel Cancio.

Direito Penal do Inimigo. Tradução de André Luís Callegari e

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tratamento dado ao contraventor: “Em casos de alta traição contra o Estado, o criminoso não deve ser castigado como súdito, senão como inimigo”.

Essa teoria acredita que o inimigo deve ser punido com medida de segurança, com prazo indeterminado; de acordo com sua periculosidade, ignorando os atos pregressos e levando em conta apenas o risco futuro à sociedade; a pena deve ser intensa (desproporcional) e com antecipação da proteção penal. Defende ainda mencionada teoria a existência de dois direitos punitivos, cada um com seu rito processual específico, sendo um para o cidadão comum e outro, mais severo, para o inimigo, o que não é aceitável, pois não podem co-existir dois sistemas, sem que um fira o outro. Assim, há flagrante oposição ao direito penal do cidadão, albergado pelo devido processo legal, pelo princípio da igualdade e da legalidade. Verifica-se então a filiação do Regime Disciplinar Diferenciado a esta teoria.

7.1.Crítica à teoria de Jakobs

Na verdade, a melhor denominação para esta teoria é Direito Penal do Autor, o qual

busca a punição do infrator pelo que ele é, e não pelo fato contra legem cometido pelo mesmo. È

importante mencionar que o direito penal do autor surgiu durante os períodos mais deprimentes da humanidade: nos Estados despóticos, da idade Média, e, mais recentemente, durante o Estado Nazista, trágico período, no qual, em nome da segurança e dentro da legalidade, inúmeras atrocidades foram cometidas.

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necessariamente vinculadas a Constituição Democrática, nascendo um Direito penal, albergado por normas processuais, garantidoras da dignidade da pessoa humana, o que não se realiza com a questionada teoria de Jakobs.

Uma acertada crítica que se faz ao Direito Penal do inimigo é a de que o mesmo não atende ao princípio da razoabilidade, ou proporcionalidade na aplicação das penas, até por que, para esta teoria, o que interessa é a periculosidade do agente e não o ato cometido pelo mesmo. Também não existe o processo democrático, ou seja, o devido processo legal, o que há na verdade é um procedimento parecido com o utilizado em guerra, cujos direitos são mitigados, de forma razoável, visto que este estado demanda procedimento diferenciado, o que não ocorre na constância do Estado Democrático. Nesse sentido, conclui-se que tais medidas só poderiam ser aplicadas mediante a ocorrência de estado de exceção (guerra, estado de sítio e estado de defesa).

O argumento de que a criminalidade organizada atenta contra o Estado não se sustenta, pois mencionadas organizações não chegam a colocar em risco o poder público, é verdade que a atuação das mesmas afetam bens jurídicos relevantes, os quais causam grande clamor na sociedade, mas a existência do Estado não se abala, somente revoluções tem esse condão.

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8. O Regime Disciplinar Diferenciado

Em maio de 2001, em São Paulo, através da Resolução nº 26, foi criado o Regime Disciplinar Diferenciado, com o objetivo de agravar o tratamento dado ao preso que participasse de organizações criminosas, as quais cresciam desenfreadamente naquele Estado, mencionada instrução normativa estipulava um limite de aplicação da pena em até 360 (trezentos e sessenta) dias, ocorre que a criação de regime tão severo ultrapassa a competência disciplinar do poder executivo, o que gerou inúmeros protestos diante da flagrante inconstitucionalidade deste ato emanado pelo Poder Executivo, convém mencionar que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, utilizando-se do art. 24, I, CF, o qual preceitua que os Estados-Membros tem autonomia para legislarem sobre Direito Penitenciário, fato estranho esse aparente reconhecimento de constitucionalidade pela corte paulista, tendo em vista que o texto Constitucional é bem claro ao conferir autonomia para “legislar”, não podendo o executivo estadual, livremente dispor de garantias constitucionais, representando um verdadeiro estado de exceção, com suas infames arbitrariedades, assim diante de triste decisão jurisprudencial paulista, outra não pode ser a conclusão de que referido órgão está maculado em uma das garantias dadas ao cidadão, a imparcialidade do magistrado, sem a qual dificilmente o princípio da justiça será alcançado.

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