• Nenhum resultado encontrado

The British Revolution in Global Perspective, de Robert Allen

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "The British Revolution in Global Perspective, de Robert Allen"

Copied!
39
0
0

Texto

(1)

resenha bibliográfica/book review

André Villela

Professor da Escola de Pós-graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas/RJ

As origens da grande divergência: uma sistematização do debate

acerca da ascensão do ocidente

Introdução

U m d o s t e m a s m a i s p o l ê m i c o s n a l i t e r a t u r a d e h i s t ó r i a e c o n ô m i ¬ ca e s o c i a l g l o b a l é a q u e l e q u e e n v o l v e as o r i g e n s do p r e d o m í n i o e c o n ô m i c o do O c i d e n t e sobre o resto do m u n d o - the Rise of the

West, p a r a t o m a r e m p r e s t a d o o t í t u l o d o c o n h e c i d o l i v r o d e W i l l i a m

M c N e i l l ( 1 9 6 3 ) .

A o l o n g o d e m a i s d e u m século, c o n s t r u i u - s e u m a n a r r a t i v a h i s t ó r i c a d o m i n a n t e , q u e , em l i n h a s gerais, postula q u e , após o a n o 1000 d . C . - seja após a R e v o l u ç ã o C o m e r c i a l m e d i e v a l ; d u r a n t e o R e n a s c i m e n t o , c o m a e x p a n s ã o c o m e r c i a l da L i g a H a n s e á t i c a e o c o m é r c i o m e d i t e r r â n e o ; ou após as Grandes N a v e g a ç õ e s i b é r i c a s - e n ã o m u i t o após 1500, o O c i d e n t e d e s e n v o l v e u u m a nova d i n â m i c a i n s t i t u c i o n a l e c u l t u r a l q u e o l a n ç o u no c a m i n h o da m o d e r n i d a d e . A i n d u s t r i a l i z a ç ã o , a i n d a segun¬ d o esta v i s ã o t r a d i c i o n a l , seria u m d e s d o b r a m e n t o n a t u r a l deste dina¬ m i s m o a n t e r i o r d a Europa. E m c o n t r a p a r t i d a , a s p r i n c i p a i s c i v i l i z a ç õ e s asiáticas - C h i n a , Índia, J a p ã o , I m p é r i o O t o m a n o - s e r i a m caracteriza¬ das por e s t a g n a ç ã o e c o n ô m i c a e i n s t i t u c i o n a l , t o r n a n d o - a s presas fáceis, nos séculos XVIII e XIX, de u m a E u r o p a c r e s c e n t e m e n t e a v a n ç a d a1.

1 GOLDSTONE, Jack "Capitalist Origins, the Advent of Modernity, and Coherent Explana-tion: a Response to Joseph M. Bryant". Canadian Journal of Sociology, Winter 2008:119.

(2)

A p a r t i r dos a n o s 90, d i v e r s o s h i s t o r i a d o r e s e s o c i ó l o g o s , p r a t i c a n -tes d a c h a m a d a H i s t ó r i a G l o b a l , i n s u r g i r a m - s e c o n t r a este c o n s e n s o e p o s t u l a r a m a tese r e v i s i o n i s t a s e g u n d o a q u a l a n t e s d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l - e a d e s p e i t o de d i f e r e n ç a s c u l t u r a i s e i n s t i t u c i o n a i s e n t r e O c i d e n t e e O r i e n t e o p a d r ã o de v i d a das d u a s r e g i õ e s se a s s e m e -l h a r i a2. A G r a n d e D i v e r g ê n c i a e n t r e a E u r o p a e a Á s i a , s e g u n d o esta l i t e r a t u r a r e v i s i o n i s t a , s o m e n t e s e t e r i a i n i c i a d o a p a r t i r d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l e , m e s m o assim, e m d e c o r r ê n c i a d e fatores c o n t i n g e n t e s , d e sorte, e n ã o ( c o m o q u e r a v i s ã o t r a d i c i o n a l ) p o r força de q u a l q u e r s u p e r i o r i d a d e i n s t i t u c i o n a l d o O c i d e n t e .

A presente r e s e n h a p r o c u r a r e s u m i r parte da vasta l i t e r a t u r a s u r g i d a a partir deste r e v i s i o n i s m o , i d e n t i f i c a n d o os p r i n c i p a i s c a m p o s e n v o l v i dos n a controvérsia, b e m c o m o o s a r g u m e n t o s centrais acerca d o " q u a n -d o " , -do " c o m o " e -do " p o r q u e " -da G r a n -d e D i v e r g ê n c i a e ascensão -do O c i d e n t e .

D e f o r m a bastante r e s u m i d a , a d i s c i p l i n a c o n h e c i d a c o m o H i s t ó r i a Global (world history) p o d e ser definida c o m o a " h i s t ó r i a das c o n e x õ e s entre a c o m u n i d a d e h u m a n a g l o b a l "3. S e u p o n t o de p a r t i d a é a i d e i a de q u e , desde os seus ancestrais m a i s r e m o t o s , o H o m e m i n t e r a g e de di¬ versas m a n e i r a s - p o r parentesco, a m i z a d e , c r e n ç a s c o m u n s , r i v a l i d a d e , troca e c o n ô m i c a , troca e c o l ó g i c a , c o o p e r a ç ã o p o l í t i c a , etc. - f o r m a n d o o q u e dois c o n h e c i d o s autores da área d e s i g n a m c o m o " t e i a s " (webs)4.

O e n f o q u e dos p r a t i c a n t e s deste t i p o de a b o r d a g e m h i s t ó r i c a é, p o r c o n s e g u i n t e , g l o b a l , sistêmico, n a t r a d i ç ã o , p o r e x e m p l o , d e W a l l e r s t e i n e B r a u d e l5. Para eles, n ã o faz sentido t o m a r a h i s t ó r i a de povos, países

2 Para um argumento semelhante, Bairoch ( B A I R O C H , Paul, Economics and World

History: myths and paradoxes. Chicago: University of Chicago Press, 1 9 9 3 : 1 0 8 ) .

3 M A N N I N G , Patrick Navigating World History: historians create a global past. Nova York: Palgrave Macmillan, 2003:3.

4 M C N E I L L , John R. & M C N E I L L , W i l l i a m H., The Human Web: a bird's-eye v i e w of human history. Nova York e Londres: W. W. Norton, 2003.

5 Diferentemente destes dois autores, porém, os global historians de hoje não assumem a existência de um "sistema" econômico global centrado na Europa, mas sim de um mundo multipolar. Para esta distinção, ver M A N N I N G , Patrick, "Asia and Europe

(3)

o u , m e s m o , r e g i õ e s i s o l a d a m e n t e , s e m a t e n t a r p a r a a s i n ú m e r a s c o n e x õ e s q u e o s l i g a m a u m " t o d o " g l o b a l6. Em t e r m o s h i s t ó r i c o s , é r a z o á v e l a c e i t a r q u e foi a p a r t i r da v i r a d a do p r i m e i r o p a r a o s e g u n d o m i l ê n i o d a Era C r i s t ã q u e o s l a ç o s q u e u n i a m as diversas r e g i õ e s c o n h e c i d a s do g l o b o (isto é, t o d o s os c o n t i n e n t e s , à e x c e ç ã o das A m é r i c a s e d a A u s t r á l i a ) s e t o r n a r a m m a i s f o r t e s7. T a m b é m p a r e c e c o n s e n s u a l q u e , até o R e n a s c i m e n t o e as G r a n d e s N a v e g a ç õ e s , a E u r o p a e r a " m a r g i n a l " e m t e r m o s e c o n ô m i c o s , c o m p a r a t i v a m e n t e aos g r a n d e s i m p é r i o s d o O r i e n t e ( C h i n a e Índia, s o b r e t u d o ) e , d u r a n t e a l g u m t e m p o , t a m b é m e m r e l a ç ã o a o m u n d o i s l â m i c o8. A c h e g a d a , q u a s e q u e s i m u l t â n e a , dos e u r o p e u s às A m é r i c a s e ao O r i e n t e p e l a v i a m a r í t i m a c o m e ç a r i a a m u d a r este p a n o r a m a . O fato i n e q u í v o c o d e q u e foram o s e u r o p e u s a aportar n o N o v o M u n d o j á pa¬ rece i n d i c a r q u e o a n t e r i o r o r d e n a m e n t o das " c i v i l i z a ç õ e s " d o m u n d o c o m e ç a v a a m u d a r . D e p a r t i c i p a n t e m e n o r n a t e i a d e trocas d o m u n d o m e d i e v a l e, nas suas franjas, objeto de i n c u r s õ e s m i l i t a r e s p a t r o c i n a d a s p o r m u l ç u m a n o s ou m o n g ó i s , o O c i d e n t e passa a d e s e m p e n h a r , crescente¬ m e n t e , u m papel e c o n ô m i c o , m i l i t a r e c u l t u r a l ativo, e n q u a n t o s u b j u g a outras partes d o g l o b o9. A "ascensão d o O c i d e n t e " estava e m curso.

in the W o r l d Economy: Introduction". American Historical Review, vol. 107, n. 2, April 2 0 0 2 .

6 Na opinião de Stokes, tal abordagem seria superior à tradicional, ao privilegiar "interações policêntricas", ao invés de questões do tipo hegemonia ou pioneirismo que, habitualmente, ocupam a atenção dos historiadores (STOKES, Gale, " T h e Fates of H u m a n Societies: a review of recent macrohistories". The American Historical

Review, vol. 106, n. 2, April 2 0 0 1 ) .

7 FINDLAY, R o n a l d & O ' R O U R K E , Kevin H., Power and Plenty: trade, war, and the world economy in the second millennium. Princeton e Oxford: Princeton University Press, 2 0 0 7 . Já Hobson enxerga os primórdios desta "globalização no ano 500 D.C., tendo o mundo islâmico como seu centro ( H O B S O N , John M . , The Eastern Origins

of Western Civilization. Cambridge: Cambridge University Press, 2 0 0 4 ) .

8 Conforme argumenta, por exemplo, Abu-Lughod ( A B U - L U G H O D , Janet, Before

European Hegemony: the world system, A.D. 1250-1350. Nova York e Oxford: Oxford

University Press, 1989).

9 Para um influente tratamento da relação entre inovação militar e a ascensão do Ocidente no início da Era Moderna, ver P A R K E R , Geoffrey. The Military Revolution: military innovation and the rise of the West, 1 5 0 0 - 1 8 0 0 . Cambridge: Cambridge University Press, 2a ed., 1 2a reimp., 2 0 0 8 . Para u m a crítica contundente à ideia de que as grandes civilizações asiáticas foram subjugadas pelos europeus (pela ordem, por¬ tugueses, holandeses e britânicos) antes do século X I X , ver Hobson ( H O B S O N , John

(4)

D i a n t e destes fatos, os h i s t o r i a d o r e s m o d e r n o s se f a z e m d u a s per¬ g u n t a s e s s e n c i a i s , a s a b e r : " q u a n d o , e f e t i v a m e n t e , o O c i d e n t e e o O r i e n ¬ te c o m e ç a r a m a divergir" e " o q u e p r o v o c o u esta d i v e r g ê n c i a "1 0. A m a i o r i a e s m a g a d o r a da h i s t o r i o g r a f i a c e n t r a d a na E u r o p a - e x p l i c i t a ou i m p l i c i t a m e n t e - r e s p o n d e r i a a estas d u a s p e r g u n t a s c o m u m a respos¬ t a ú n i c a : c e r t a m e n t e a p a r t i r d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l b r i t â n i c a e , pos¬ s i v e l m e n t e , antes d e l a1 1 - o u seja, a s t r a n s f o r m a ç õ e s e x p e r i m e n t a d a s , d e f o r m a p i o n e i r a , p e l a G r ã - B r e t a n h a n a v i r a d a d o s é c u l o XVIII p a r a o X I X e , p o s t e r i o r m e n t e , d i s s e m i n a d a s p a r a o u t r a s p a r t e s d o C o n t i n e n t e e p a r a os Estados U n i d o s , c o n f i r m a r i a m o d o m í n i o do O c i d e n t e sobre o res¬ t a n t e d o m u n d o . O p r o b l e m a c o m esta i n t e r p r e t a ç ã o é q u e a p r ó p r i a n a t u r e z a revo¬ l u c i o n á r i a - n o s e n t i d o d e i n a u g u r a r u m a d e s c o n t i n u i d a d e n a trajetó¬ r i a d e c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o n a G r ã - B r e t a n h a - d a R e v o l u ç ã o In¬ d u s t r i a l t e m s i d o p o s t a e m x e q u e p o r v á r i o s a u t o r e s1 2. U m d o s r e s u l t a d o s deste r e v i s i o n i s m o " d e d e n t r o " (isto é , p a r t i n d o d e a u t o r e s

M . , The Eastern Origins of Western Civilization. Cambridge: Cambridge University Press, 2 0 0 4 ) . Para o autor, os ocidentais foram, no máximo, tolerados pelos governos e comerciantes locais e jamais tiveram um papel preponderante nas intricadas redes comerciais da região antes do período do Imperialismo do século X I X .

1 0 Ocioso dizer que os termos " O c i d e n t e " e " O r i e n t e " não devem ser essencializados. Quando empregados no debate, não podem ser entendidos como sugerindo qualquer uniformidade econômica, social ou cultural entre as inúmeras unidades políticas que formavam, respectivamente, a Europa Ocidental e a Ásia. Trata-se, isto sim, apenas de um recurso expositivo conveniente que, quando necessário, será substituído por designações mais precisas.

1 1 Conforme sustentam, entre outros, Epstein (EPSTEIN, Stephan R . , Freedom and

Growth: the rise of markets in Europe, 1 3 0 0 - 1 7 5 0 . Londres e NovaYork: Routledge,

2 0 0 0 ) , Mielants ( M I E L A N T S , Eric H., The Origins of Capitalism and the 'Rise of the

West'. Philadelphia, PA: Temple University Press, 2007) e Van Zanden (VAN ZANDEN,

Jan Luiten, " T h e R o a d to the Industrial Revolution: hypotheses and conjectures about the medieval origins of the 'European M i r a c l e ' " . J o u r n a l of Global History, vol. 3, n. 3, November 2 0 0 8 ) .

1 2 As primeiras críticas modernas à visão dominante acerca do caráter abrupto, des¬ contínuo, da R e v o l u ç ã o Industrial partiram dos chamados cliometristas, ligados à Nova História Econômica ( C R A F T S , Nick F. R . , "English Economic Growth in the Eighteenth Century: a R e - e x a m i n a t i o n of Deane and Cole's Estimates". Economic

History Review, vol. 29, n . 2 , May 1976; Idem, "British Economic Growth, 1 7 0 0 - 1 8 3 1 : a

R e v i e w of the Evidence". Economic History Review, vol. 3 6 , n. 2, M a y 1983, e Idem & H A R L E Y , Knick, "Output Growth and the Industrial Revolution: a Restatement of the Crafts-Harley V i e w " . Economic History Review, vol. 45, n. 4, November 1992.

(5)

q u e e s t u d a m a h i s t ó r i a e c o n ô m i c a e u r o p e i a ) foi reforçar j u n t o aos estudiosos da E u r o p a p r é - i n d u s t r i a l (early modernists) a c o n v i c ç ã o de q u e o d i n a m i s m o da e c o n o m i a e da s o c i e d a d e e u r o p e i a s p r e c e d e u a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l e , p o r t a n t o , suas o r i g e n s d e v e m ser b u s c a d a s , p e l o m e n o s , d o i s séculos a n t e s1 3.

Este r e v i s i o n i s m o , p o r sua v e z , foi d u r a m e n t e c o n t e s t a d o por a q u e les q u e m a n t ê m q u e a R e v o l u ç ã o Industrial i m p l i c o u , sim, e m m u d a n -ça " r e v o l u c i o n á r i a " na h i s t ó r i a e c o n ô m i c a da G r ã - B r e t a n h a . A partir do trabalho de C u e n c a Esteban (1994), as estimativas dos cliometristas de ( b a i x o ) c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o d u r a n t e a R e v o l u ç ã o Industrial perde¬ r a m parte de seu p o d e r de persuasão. B e r g e H u d s o n (1992 e 1994), por sua v e z , c r i t i c a m o e n f o q u e e x c l u s i v a m e n t e m a c r o e c o n ô m i c o dos revi¬ sionistas e m o s t r a m c o m o a R e v o l u ç ã o Industrial teve e n o r m e impac¬ to sobre i n ú m e r o s setores d e s c o n s i d e r a d o s pelos revisionistas, s e m falar das suas c o n s e q u ê n c i a s espaciais, sociais e c u l t u r a i s . De f o r m a m a i s in¬ cisiva, L a n d e s (1998) p r o c u r a restabelecer o papel profundo, t r a n s f o r m a -dor, da R e v o l u ç ã o Industrial, e n f a t i z a n d o os i m p a c t o s das i n v e n ç õ e s b r i t â n i c a s n o p e r í o d o .

C u r i o s a m e n t e , o r e s t a b e l e c i m e n t o da visão o r i g i n a l a c e r c a da natu¬ reza r e v o l u c i o n á r i a d a R e v o l u ç ã o Industrial b r i t â n i c a i r i a c o n t a r c o m o a p o i o de um g r u p o i n s u s p e i t o de autores, cuja área de estudo princi¬ pal é o " R e i n o do M e i o " (a C h i n a ) . M a i s e s p e c i f i c a m e n t e , a partir dos anos 1990 diversos autores, baseados e m u n i v e r s i d a d e s d a C a l i f ó r n i a ,1 4 c o m e ç a r a m a l a n ç a r d ú v i d a s sobre as i n t e r p r e t a ç õ e s " e u r o c ê n t r i c a s " d a q u i l o q u e se c o n v e n c i o n o u c h a m a r de a G r a n d e D i v e r g ê n c i a , a partir d o t í t u l o h o m ô n i m o d o i n f l u e n t e t r a b a l h o d e P o m e r a n z (2000).

1 3 Para os early modernists, antes da Revolução Industrial, a Inglaterra (e algumas outras partes da Europa e Estados Unidos) teria experimentado uma Revolução Industriosa, que envolveu decisões tomadas no nível domiciliar e que levaram a uma elevação tanto da oferta de artigos e mão de obra no mercado como da demanda por bens no mercado. Assim, diante da maior disponibilidade de bens de consumo (inclusive, importados, como açúcar, chá, café, sedas, porcelana, etc.) indivíduos reduziram o seu tempo dedicado ao lazer (tendo em vista uma maior utilidade marginal da renda monetária) e à produção para consumo próprio. C o m isso, aumentaram o tempo e a intensidade do trabalho, visando à produção para o mercado, seja na agricultura, como na protoindústria.

1 4 Daí a alcunha de Escola da Califórnia, proposta por um de seus expoentes, o soció¬ logo Jack Goldstone, professor da University of California - Davis.

(6)

E m l i n h a s g e r a i s , o a r g u m e n t o destes r e v i s i o n i s t a s " d e f o r a "1 5 p o d e ser r e s u m i d o e m três p r o p o s i ç õ e s : a. A d i n â m i c a e c o n ô m i c a e u r o p e i a a n t e r i o r à R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l não s e r e s u m i a a p o u c o ( o u n e n h u m ) c r e s c i m e n t o , i n t e r r o m p i d o p o r c r i s e s M a l t h u s i a n a s1 6; b . T a m b é m h a v i a c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o " m o d e r n o "1 7 n a Á s i a , antes d a c h e g a d a dos e u r o p e u s ;

c. A G r a n d e D i v e r g ê n c i a entre a Á s i a e a E u r o p a foi tardia e d e p e n d e u da sorte (late and l u c k y )1 8. Ela t e r i a tido i n í c i o apenas por v o l t a de 1800, c o m a R e v o l u ç ã o Industrial, e d e c o r r e u , f u n d a m e n t a l m e n t e , da exis¬ t ê n c i a de vastos depósitos de c a r v ã o na G r ã - B r e t a n h a e da facilidade de acesso d a q u e l e país às r i q u e z a s das A m é r i c a s .

O p r i m e i r o p o n t o r e p e t e o c e r n e do q u e se c h a m o u de a " R e v o l t a dos Early Modernists", q u a l seja, o a r g u m e n t o de q u e a E u r o p a p r é i n d u s -t r i a l es-tava l o n g e d e ser e s -t a g n a d a e c o n o m i c a m e n -t e . N a p r á -t i c a , p o r é m , esta a f i r m a ç ã o n ã o t e m i n f l u ê n c i a m a i s d i r e t a sobre a c o n t r o v é r s i a e m t o r n o da G r a n d e D i v e r g ê n c i a e a ascensão do O c i d e n t e .

Já o s e g u n d o , c o m o se v e r á a d i a n t e , é m a i s c o n t e n c i o s o e d i z respei¬ t o à e x i s t ê n c i a d e t r a ç o s d e " p r é - m o d e r n i d a d e "1 9 s o c i o e c o n ô m i c a n ã o

1 5 Posto que não são, em geral, estudiosos da história econômica do Ocidente, mas sim da História Global, com ênfase no Oriente.

1 6 As crises malthusianas decorreriam do fenômeno dos retornos decrescentes, em um contexto de oferta (quase) fixa do fator terra e lento crescimento da produtividade. Ocorreriam em sociedades que experimentam crescimento apenas extensivo (isto é, decorrente de aumento populacional e / o u da maior utilização de terras) ou, no máximo, smithiano (derivado dos ganhos de especialização).

1 7 No sentido kuznetziano, isto é, em que se observa crescimento tanto do produto total como per capita de forma sustentada, e liderado pelo progresso técnico. Trata-se do crescimento do tipo schumpeteriano, na terminologia de Parker ( P A R K E R , W i l l i a m N., Europe, America, and the Wider World: essays on the economic history of Western capitalism. C a m b r i d g e : C a m b r i d g e University Press, vol. 1, 1 9 8 4 ) . 1 8 A expressão é de Bryant, u m feroz crítico do revisionismo, como se verá na próxima

seção ( B R Y A N T , Joseph M . , " T h e West and the R e s t Revisited: debating capitalist origins, European colonialism, and the advent of modernity". Canadian Journal of

Sociology, vol. 3 1 , n. 4, Fall 2 0 0 6 ) .

1 9 Na falta de um termo melhor, optou-se por " p r é - m o d e r n o " para designar algo característico do início da Era M o d e r n a (Early Modern period), ou seja, séculos XVI

(7)

a p e n a s n a E u r o p a , c o m o t a m b é m e m v á r i a s p a r t e s d a Á s i a . E x e m p l o s destas s e r i a m m e l h o r i a s t é c n i c a s na a g r i c u l t u r a e na i n d ú s t r i a , e n v o l v e n d o g a n h o s de p r o d u t i v i d a d e e p r o d u ç ã o ; a e x i s t ê n c i a de vastas r e d e s de co¬ m é r c i o d o m é s t i c o e i n t e r n a c i o n a l , b a s e a d a s e m c e n t r o s u r b a n o s e man¬ tidas p o r c o m e r c i a n t e s prósperos; e r e g i m e s p o l í t i c o s c r e s c e n t e m e n t e b u r o c r a t i z a d o s e c e n t r a l i z a d o s2 0. H a v e r i a , e m s u m a , s e g u n d o o s revisio¬ nistas d a Escola d a C a l i f ó r n i a , m u i t o m a i s s e m e l h a n ç a s d o q u e diferen¬ ças e n t r e as e c o n o m i a s e as s o c i e d a d e s " o c i d e n t a l " e " o r i e n t a l " a n t e s de 1800. A n t e s d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l , v i v i a - s e , s e g u n d o , P o m e r a n z (2000), u m m u n d o d e " s e m e l h a n ç a s s u r p r e e n d e n t e s " e n t r e a Á s i a e a E u r o p a2 1, c o n t r a r i a n d o a m a i o r p a r t e d o mainstream " e u r o c ê n t r i c o " , tão b e m re¬ p r e s e n t a d o p o r L a n d e s (1998).

N o c a p í t u l o 1 4 ("Por q u e a E u r o p a ? P o r q u e e n t ã o ? " ) , d e seu i n -f l u e n t e l i v r o , L a n d e s d e i x a d e l a d o o s n ú m e r o s d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l e sua b r i g a p a r t i c u l a r c o m os cliometristas da N o v a H i s t ó r i a E c o n ô m i c a p a r a d e l i n e a r a sua i n t e r p r e t a ç ã o pessoal a c e r c a das o r i g e n s d a " r i q u e z a e p o b r e z a das n a ç õ e s "2 2. N e s t e c a p í t u l o , i d e n t i f i c a m - s e três e l e m e n t o s

2 0 G O L D S T O N E , Jack, "Efflorescences and Economic Growth in World History: rethinking the ' R i s e of the West' and the Industrial R e v o l u t i o n " . Journal of World

History, vol. 13, Issue 2, Fall 2 0 0 2 .

2 1 As alusões, na literatura, a diferenças entre características do Ocidente e Oriente (ou Europa e Ásia) costumam ser enganadoras. Na realidade, quase sempre se baseiam em exame de dados referentes, respectivamente, a partes da Inglaterra (as Midlands, sobretudo) e ao delta do R i o Yang-Tsé, na China. Este é o caso da maior parte da análise empreendida no influente trabalho de Pomeranz ( P O M E R A N Z , Kenneth,

The Great Divergence: China, Europe, and the making of the modern world economy.

Princeton, NJ: Princeton University Press, 2 0 0 0 ) .

2 2 Para Hobson ( H O B S O N , John M . , The Eastern Origins, op. cit.), a abordagem de Landes — como, de resto, aquela da maior parte dos autores eurocêntricos envolvidos no debate — pecaria por um "vício de origem", representado pela forma em que os termos do debate são colocados. Partindo do fato concreto de que o Ocidente foi pioneiro na Revolução Industrial e viria a dominar o restante do mundo ao longo dos séculos X I X e X X , estes autores se lançariam a encontrar características supostamente intrínsecas à cultura ocidental que "explicariam" este mesmo pionei¬ rismo. Não encontrando, nas sociedades orientais, muitos destes traços, tais autores acreditariam estar demonstrando serem estas as razões para a ascensão do Ocidente (e, simetricamente, a não-ascensão do Oriente) quando, para Hobson, estariam, meramente, incorrendo na armadilha da teleologia, ao escrever a História de frente para trás. Weber seria o principal responsável, segundo o autor, por este vício argu-mentativo, ao contrastar a existência de características do "espírito capitalista" no Ocidente com a sua (suposta) ausência nas sociedades do Oriente.

(8)

p o r trás do sucesso e u r o p e u , tal c o m o " d e m o n s t r a d o " p e l o fato de a R e v o l u ç ã o Industrial ter o c o r r i d o n a q u e l a p a r t e d a Eurásia, e n ã o n o O r i e n t e : a crescente a u t o n o m i a da c i ê n c i a ( e m r e l a ç ã o ao Estado e à I g r e j a ) ; o s u r g i m e n t o do m é t o d o c i e n t í f i c o ; e a r o t i n i z a ç ã o do esforço de p e s q u i s a e sua p o s t e r i o r d i s s e m i n a ç ã o ("a i n v e n ç ã o da i n v e n ç ã o " , em suas palavras).

A cultura, s e g u n d o L a n d e s , e s t a r i a na o r i g e m destes e l e m e n t o s dis¬ t i n t a m e n t e e u r o p e u s e , e m ú l t i m a i n s t â n c i a , e x p l i c a r i a a a s c e n s ã o d o O c i d e n t e2 3. Tal c u l t u r a t e r - s e - i a d e s e n v o l v i d o a p a r t i r d a f r a g m e n t a ç ã o t e r r i t o r i a l q u e p r e v a l e c e u na E u r o p a e n t r e os a n o s 1000 e 1500. Esta, p o r seu t u r n o , t e r i a f o m e n t a d o a c o n c o r r ê n c i a e n t r e as u n i d a d e s po¬ l í t i c a s d e e n t ã o , c o n c o r r ê n c i a esta, e m ú l t i m a i n s t â n c i a , progressista, e m c o n t r a s t e c o m u m a Á s i a c e n t r a l i z a d a e s u p o s t a m e n t e estática, o n d e s o b e r a n o s d e s p ó t i c o s e x p l o r a v a m seus s ú d i t o s p a r a p r o v e i t o p r ó p r i o . A p ó s 1492, a c o m p e t i ç ã o d e n t r o da E u r o p a foi e s t e n d i d a a o u t r a s p a r t e s d o m u n d o e — d a d a u m a c u l t u r a m a i s " d i n â m i c a " (no s e n t i d o de ser m a i s c i e n t í f i c a , p r o p e n s a à i n o v a ç ã o , v o l t a d a p a r a o l u c r o ) — os e u r o p e u s r a p i d a m e n t e d o m i n a r a m a m e r í n d i o s p r i m i t i v o s ( t e c n o l o g i -c a m e n t e f a l a n d o ) e asiáti-cos e s t a g n a d o s e d e s p ó t i -c o s .

Por m a i s q u e o t o m direto de L a n d e s possa soar triunfalista e q u e seu t r a t a m e n t o das c o m p l e x a s e c o n o m i a s e s o c i e d a d e s do m u n d o n ã o O c i d e n t a l seja, c l a r a m e n t e , superficial ( q u a n d o n ã o c a r i c a t u r a l ) , n ã o se p o d e n e g a r a força de sua a r g u m e n t a ç ã o . O fato é q u e , e n q u a n t o a Eu¬ ropa, n o i n í c i o d a Idade M é d i a , era u m a r e g i ã o p o b r e e p e r i f é r i c a d a e c o n o m i a g l o b a l , e m m e a d o s d o s é c u l o XVI j á h a v i a c h e g a d o à Ásia e às A m é r i c a s , e n ã o o c o n t r á r i o . Ao m e s m o t e m p o , n ã o resta d ú v i d a de q u e , a partir do s é c u l o XIX, f o r a m as t e c n o l o g i a s e as i n s t i t u i ç õ e s saídas da E u r o p a q u e se e s p a l h a r a m p e l o m u n d o , o q u e , j u n t a m e n t e c o m o c o n t í n u o a v a n ç o do O c i d e n t e , c o n s t i t u i a força d i n â m i c a da e c o n o m i a m u n d i a l na Era M o d e r n a2 4. C h a m a r a isto de " e u r o c e n t r i s m o " é u m a

2 3 Para a dificuldade operacional de se integrar os conceitos de "cultura" e "instituições" na história econômica, ver V R I E S , Peer, " T h e R o l e of Culture and Institutions in Economic History: can economics be of any h e l p ? " NEHA Jaarboek, n. 64,

2 0 0 1 : 2 8 - 6 0 .

2 4 Por outro lado, não há como negar que até então o Ocidente fora amplamente beneficiado pela importação de insumos tecnológicos e institucionais (e, de um modo geral, ideias) provenientes do Oriente. Para uma argumentação eloquente desta

(9)

q u e s t ã o d e g o s t o2 5. L a n d e s , p r o v a v e l m e n t e , n ã o s e i m p o r t a r i a c o m tal r ó t u l o . E n ã o foi p o r acaso q u e se t o r n o u a bête noire dos revisionistas californianos

O p r i m e i r o t r a b a l h o a c o l o c a r de f o r m a e x p l í c i t a os três p o n t o s p r i n c i p a i s da c r í t i c a a esta v e r t e n t e da o r t o d o x i a " e u r o c ê n t r i c a " foi de W o n g (1997). E m b o r a u m especialista n a h i s t ó r i a d a C h i n a , W o n g co¬ m e ç a por defender o r e s t a b e l e c i m e n t o da v i s ã o t r a d i c i o n a l acerca da R e v o l u ç ã o Industrial b r i t â n i c a , p e l o m e n o s n a q u i l o q u e c o n c e r n e a seu caráter r e v o l u c i o n á r i o , de d e s c o n t i n u i d a d e . O a u t o r sustenta, adicional¬ m e n t e , q u e , até o final do s é c u l o XVIII, t a n t o a C h i n a c o m o a Europa e x p e r i m e n t a r a m c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o s m i t h i a n o . Tal fato seria ca¬ r a c t e r i z a d o , entre outros, p e l a e x p a n s ã o das i n d ú s t r i a s r u r a i s , u m a agri¬ c u l t u r a c a d a v e z m a i s p r o d u t i v a e r e d e s c o m e r c i a i s cada v e z m a i s exten¬ sas (p. 2 7 8 ) .

Tal tipo de c r e s c i m e n t o , c o n t u d o , o c o r r i a dentro dos m a r c o s p r ó p r i o s de e c o n o m i a s a g r á r i a s , o q u e e n v o l v i a p r o b l e m a s r e l a c i o n a d o s à inse¬ g u r a n ç a das safras, às p o s s i b i l i d a d e s m a t e r i a i s l i m i t a d a s e a q u e s t õ e s d e m o g r á f i c a s específicas. M a i s d o q u e isso, a r g u m e n t a , e m n e n h u m a das duas r e g i õ e s ( C h i n a e E u r o p a ) este t i p o de c r e s c i m e n t o c o n t i n h a as s e m e n t e s da e c o n o m i a i n d u s t r i a l . C o n s e q u e n t e m e n t e , diz o autor, caso se o l h a s s e m a E u r o p a e a C h i n a no i n í c i o do s é c u l o XVIII, seria impos¬ sível d i z e r q u e q u a l q u e r u m a das duas r e g i õ e s i r i a dar o r i g e m à Era Industrial.

E m b o r a i d e n t i f i q u e g r a n d e s s e m e l h a n ç a s econômicas entre a E u r o p a e a C h i n a p r é - i n d u s t r i a i s , W o n g (1997) salienta q u e elas e r a m nitida¬ m e n t e diferentes do p o n t o de vista p o l í t i c o . A p r i m e i r a c a r a c t e r i z o u - s e p o r i n ú m e r o s estados c o m p e t i n d o entre si, no i n t e r i o r dos quais os soberanos l u t a v a m c o m a s elites p e l o d i r e i t o d e e x t r a i r recursos para fazer g u e r r a s (p. 2 8 1 ) . Para isso, d e s e n v o l v e r a m i n s t i t u i ç õ e s financeiras m a i s c o m p l e x a s , a fim de se s u s t e n t a r e m e, ao fazê-lo, l a n ç a r a m as bases i n s t i t u c i o n a i s para o capitalismo.

A C h i n a , e m c o n t r a p a r t i d a , era u m i m p é r i o a g r á r i o u n i f i c a d o e m q u e as elites d e t i n h a m , c o m p a r a t i v a m e n t e , m e n o s p o d e r , e o n d e os

"dívida" do Ocidente para com o Oriente, ver H O B S O N , John M . , The Eastern

Origins of Western Civilization, op. cit.

(10)

soberanos d e s e n v o l v e r a m p o l í t i c a s e i n s t i t u i ç õ e s v i s a n d o m a n t e r o status

quo. D e n t r o dos m a r c o s do c ó d i g o m o r a l do C o n f u c i o n i s m o , elites e

oficiais d o Estado c o o p e r a v a m n a m a n u t e n ç ã o d a o r d e m p ú b l i c a , p r o -v e n d o , c o n j u n t a m e n t e , escolas, o r g a n i z a ç õ e s de c a r i d a d e , silos de grãos, etc. O C o n f u c i o n i s m o t a m b é m n ã o p e r m i t i r i a e l e v a d o s n í v e i s de tri¬ b u t a ç ã o , o q u e , d a d a a g r a n d e e s t a b i l i d a d e da e c o n o m i a a g r á r i a c h i n e s a , retirava d a q u e l a s o c i e d a d e o e l e m e n t o de conflito entre soberanos e elites. N ã o obstante tais diferenças p o l í t i c a s entre a s duas r e g i õ e s , W o n g

(contra Landes) n ã o vê q u a l q u e r superioridade de um t i p o de arranjo

sobre o o u t r o e m t e r m o s d e seu " d i n a m i s m o " e c o n ô m i c o2 6.

Para o autor, p o r t a n t o , as r a z õ e s para o p i o n e i r i s m o e u r o p e u t ê m p o u c a r e l a ç ã o c o m a s e x p l i c a ç õ e s n o r m a l m e n t e a p o n t a d a s n a histo¬ r i o g r a f i a , e q u e f a z e m r e f e r ê n c i a a supostas v a n t a g e n s c u l t u r a i s (à la L a n d e s ) o u i n s t i t u c i o n a i s2 7 d o O c i d e n t e . E m ú l t i m a i n s t â n c i a , a r g u -m e n t a W o n g ( 1 9 9 7 : 4 9 - 5 2 ) , a d e s c o b e r t a do N o v o M u n d o e o acesso a q u a n t i d a d e s j a m a i s vistas de e n e r g i a de o r i g e m m i n e r a l são a chave para s e e n t e n d e r c o m o a E u r o p a (e, e m u m p r i m e i r o m o m e n t o , apenas ela) d e i x o u para trás o c r e s c i m e n t o instável, s m i t h i a n o , e a d e n t r o u u m a era d e c r e s c i m e n t o c o n t i n u a d o2 8.

R e c a p i t u l a n d o , a base do a r g u m e n t o revisionista tal c o m o e x p o s -to p e l o s s i n ó l o g o s da Escola da C a l i f ó r n i a - r e p o u s a em três ideias centrais, todas elas c o n t e n c i o s a s : p r i m e i r a m e n t e , a f i r m a - s e q u e antes da R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l b r i t â n i c a n ã o h a v e r i a n a d a d e e x c e p c i o n a l n a e x p e r i ê n c i a d e c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o d a Europa. D e c o r r e r i a daí q u e

2 6 Ver B U C K , David D., "Was it Luck or Pluck that Made the West Grow Rich?"Journal

of World History, vol. 10, Issue 2, Fall 1999:423-24. Vries (VRIES, Peer, "Governing

Growth: a comparative analysis of the role of the state in the rise of the

West".Jour-nal of World History, vol. 13, Issue 1, Spring 2002) chega a conclusão semelhante, ao

comparar as características do sistema de estados europeus e os impérios do Oriente, no início da Era Moderna.

2 7 Dois trabalhos influentes e que oferecem uma explicação "institucional" para a ascensão do Ocidente são de N O R T H , Douglass & T H O M A S , Robert P., The Rise

of the West: a n e w economic history. Cambridge: Cambridge University Press, 1973,

e Idem & W E I N G A S T , Barry R., "Constitutions and Commitment: the evolution of institutions governing public choice in seventeenth-century England". Journal

of Economic History, vol. XLIX, n. 4, December 1989.

2 8 Argumento semelhante já havia sido feito anteriormente por Thomas ( T H O M A S , Brinley, "Escaping from Constraints: the Industrial Revolution in a Malthusian context". Journal of Interdisciplinary History, vol. XV, n. 4, Spring 1985:729-753).

(11)

a G r a n d e D i v e r g ê n c i a entre estas duas r e g i õ e s do m u n d o s o m e n t e t e r i a t i d o i n í c i o c o m a p r ó p r i a R e v o l u ç ã o Industrial, isto é, no final do sé¬ c u l o XVIII.

J á a s e g u n d a h e r e s i a (ao m e n o s aos o l h o s d a h i s t o r i o g r a f i a t r a d i c i o ¬ n a l ) dos revisionistas seria d e s c a r t a r q u a l q u e r p r e t e n s a v a n t a g e m - p e l o m e n o s até o s é c u l o XVIII - na r e l i g i ã o , na t e c n o l o g i a , no c o m é r c i o , no s i s t e m a de l e i s e de g o v e r n o do O c i d e n t e , q u e o t e r i a i m p u l s i o n a ¬ d o r u m o à i n d u s t r i a l i z a ç ã o e a o c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o m o d e r n o (GOLDSTONE, 2 0 0 9 ) . Para a u t o r e s c o m o W o n g (1997) - e, c o m o se v e r á em s e g u i d a , P o m e r a n z (2000) - o q u e p e r m i t i u à E u r o p a d i v e r g i r d o O r i e n t e f o r a m , e m ú l t i m a i n s t â n c i a , fatores c o n t i n g e n t e s , d o acaso, l i g a d o s à g e o g r a f i a / g e o l o g i a . Este é o t e r c e i r o p o n t o do r e v i s i o n i s m o c a l i f o r n i a n o .

A fim de reforçar o p o n t o a c e r c a da s e m e l h a n ç a m a t e r i a l entre O c i -d e n t e e O r i e n t e , os revisionistas r e c o r r e m ao i n f l u e n t e c o n c e i t o -de e c o n o m i a orgânica, proposto p o r W r i g l e y (1988, 2004). N o s t e r m o s con¬ sagrados p o r a q u e l e autor, a n t e s d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l , a e c o n o m i a b r i t â n i c a (e, d e resto, e m t o d o o m u n d o ) c a r a c t e r i z a v a - s e p o r p o s s u i r a m a i o r p a r t e dos b e n s m a t e r i a i s d e v a l o r p a r a o h o m e m , d e r i v a d a d e p r o d u t o s a n i m a i s o u v e g e t a i s , cuja oferta era l i m i t a d a pela p r o d u t i v i d a d e da t e r r a2 9. C r u c i a l m e n t e , as fontes e n e r g é t i c a s3 0 nas e c o n o m i a s o r g â n i c a s , e m geral, e r a m d e o r i g e m a n i m a l o u v e g e t a l , i m p o n d o u m teto intrans¬ p o n í v e l a o c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o sustentado nas s o c i e d a d e s p r é i n -d u s t r i a i s3 1.

A i n d a q u e sujeitos aos l i m i t e s i n e r e n t e s a u m a base e n e r g é t i c a org⬠n i c a , é fato q u e o c o r r e r a m diversos episódios de c r e s c i m e n t o e c o n ô m i ¬ c o d u r a d o u r o n o m u n d o p r é - i n d u s t r i a l . N e s t e sentido, G o l d s t o n e (2002)

2 9 Daí o pessimismo dos economistas clássicos, como Smith, Ricardo e, mais eloquen-temente, Malthus, todos eles assombrados pelos retornos decrescentes característicos de economias orgânicas.

3 0 A exemplo dos alimentos para humanos e animais e combustível para aquecer casas, assar o pão, fabricar tijolos, vidro, cerveja, corantes, metais, etc.

3 1 Não é difícil perceber que economias deste tipo não podem crescer indefinidamente, visto que mais produção exige mais energia. Em algum ponto, tal economia esbar¬ rará n u m teto energético representado pela fotossíntese realizada pelo seu estoque de plantas que, em última instância, alimentam pessoas e animais, proveem fibras para o setor têxtil e fornecem a madeira utilizada na construção civil e naval e na produção de carvão vegetal para aquecer lares e fábricas.

(12)

p r o p õ e o uso d o t e r m o " f l o r e s c ê n c i a " (efflorescence, n o o r i g i n a l ) para d e s i g n a r u m a " d e s c o n t i n u i d a d e a c e n t u a d a , g e r a l m e n t e i n e s p e r a d a , e m i n d i c a d o r e s d e m o g r á f i c o s e e c o n ô m i c o s i m p o r t a n t e s , n o r m a l m e n t e a c o m p a n h a d a d e e x p a n s ã o p o l í t i c a e c o n s t r u ç ã o i n s t i t u c i o n a l [ . . . ] "3 2. Tais e p i s ó d i o s , a i n d a s e g u n d o o autor, g e r a l m e n t e e n v o l v e r i a m a com¬ b i n a ç ã o d e c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o s m i t h i a n o e s c h u m p e t e r i a n o , s e n d o p e r c e b i d o s p e l o s c o n t e m p o r â n e o s c o m o " e r a s d e o u r o " d e c r i a t i v i d a d e e r e a l i z a ç õ e s , i n c l u s i v e no c a m p o t e c n o l ó g i c o . Este seria o caso, p o r e x e m p l o , d a alta dinastia Q i n g ( m a n c h u ) , n a C h i n a , q u e t e r i a e x p e r i -m e n t a d o u -m a florescência, grosso -m o d o , entre 1680 e 1 7 8 03 3.

G o l d s t o n e (2002) cita, c o m o t e s t e m u n h o desta era de o u r o especí¬ fica, entre outros e l e m e n t o s , a e n o r m e e x p a n s ã o d e m o g r á f i c a v e r i f i c a d a n a C h i n a (passando d e 160 m i l h õ e s d e h a b i t a n t e s , e m 1700, para 350 m i l h õ e s e m 1800), p a r a l e l a m e n t e a o a u m e n t o d o p a d r ã o d e v i d a . Tal c o m b i n a ç ã o t e r i a sido possível graças à e l e v a ç ã o da p r o d u t i v i d a d e agrí¬ cola, p o r sua v e z d e c o r r e n t e de m a i o r uso de capital (sobretudo, fertili¬ zante à base de torta de soja) no setor.

O aparente d i n a m i s m o da e c o n o m i a c h i n e s a no s é c u l o XVIII serve de base para a c r í t i c a m a i s i n f l u e n t e da Escola da C a l i f ó r n i a , a c a r g o de K e n n e t h P o m e r a n z e seu l i v r o The Great Divergence.

N a p r i m e i r a parte d e P o m e r a n z (2000), o a u t o r p r o c u r a d e m o n s t r a r q u e a e c o n o m i a m u n d i a l , n o i n í c i o d a Era M o d e r n a , c o n t i n h a diversos centros (multiple cores) a l é m d o noroeste da E u r o p a , e q u e t o d o s eles p a d e c i a m de r e s t r i ç õ e s e c o l ó g i c a s , típicas de e c o n o m i a s o r g â n i c a s , a e x e m p l o de falta de m a d e i r a e fibras, e do e s g o t a m e n t o dos solos, a m b o s os f e n ô m e n o s e m p u r r a n d o a q u e l a s s o c i e d a d e s para o teto m a l t h u s i a n o . Do l a d o i n g l ê s , p o r é m , u m a diferença m o s t r a r - s e - i a c r u c i a l , a saber, a e x i s t ê n c i a de a m p l o s depósitos de c a r v ã o , f a c i l m e n t e e x p l o r á v e i s , e q u e

3 2 G O L D S T O N E , Jack, "Efflorescences and Economic Growth in World History", op. cit, p. 3 3 3 .

3 3 Já para Jones (JONES, Eric L., Growth Recurring: economic change in world his-tory. Ann Arbor: The University of M i c h i g a n Press, 2a ed., 2 0 0 0 ) a Revolução Industrial foi apenas um de muitos episódios na história da Humanidade em que se observou crescimento econômico intensivo. Outros casos seriam a Pérsia Abássida (século IX), a China durante o período Song (séculos X a XIII) e o Japão Tokugawa (séculos X V I I - X I X ) .

(13)

t e r i a m p r o p o r c i o n a d o à q u e l a r e g i ã o u m a oferta i n f i n i t a m e n t e s u p e r i o r de e n e r g i a , fator indispensável à i n d u s t r i a l i z a ç ã o s u b s e q u e n t e .

N o s dois c a p í t u l o s s e g u i n t e s dessa p a r t e do livro, o a u t o r b u s c a desmistificar supostas v a n t a g e n s das e c o n o m i a s e das s o c i e d a d e s e u r o p e i a s antes d e m e a d o s d o s é c u l o X I X , a e x e m p l o d e seu sistema d e m o -g r á f i c o - n u p c i a l3 4, m a i o r e s t o q u e de capital físico, t e c n o l o g i a e l i b e r d a -de n o s m e r c a d o s -de fatores -de p r o d u ç ã o (capital, t e r r a e t r a b a l h o ) . As " i n c r í v e i s s e m e l h a n ç a s " ( q u e d ã o o t í t u l o à P r i m e i r a P a r t e do l i v r o ) entre áreas c e n t r a i s (core areas) d a Eurásia, a i n d a s e g u n d o P o m e r a n z (2000), m a n i f e s t a r - s e - i a m , t a m b é m , n a c o i n c i d ê n c i a d e u m c r e s c i m e n ¬ t o d o tipo s m i t h i a n o , b a s e a d o e m c r e s c e n t e divisão d o t r a b a l h o e q u e p r o d u z i a b a i x o s n í v e i s d e e x p a n s ã o d o P r o d u t o I n t e r n o B r u t o (PIB)

per capita. D i a n t e de r e s t r i ç õ e s t e c n o l ó g i c a s e e c o l ó g i c a s básicas, n a d a

g a r a n t e q u e o p a d r ã o d e d e s e n v o l v i m e n t o e c o n ô m i c o e m q u a l q u e r das duas áreas i r i a " n a t u r a l m e n t e " d e s e m b o c a r n a i n d u s t r i a l i z a ç ã o (POME-R A N Z , 2 0 0 0 : 1 0 7 ) . Na P a r t e 2 do l i v r o , o a u t o r analisa os p a d r õ e s de c o n s u m o de l u x o e c o m p a r a os r e g i m e s l e g a i s e sociais q u e g o v e r n a v a m a a c u m u l a ç ã o d e c a p i t a l n a C h i n a e n a E u r o p a . N o v a m e n t e , c o n c l u i q u e h á m a i s s e m e l h a n ç a s n a s d u a s e x p e r i ê n c i a s d o q u e d i f e r e n ç a s e q u e estas, q u a n d o e x i s t i a m , n ã o e r a m s u f i c i e n t e s para e x p l i c a r a d i v e r g ê n c i a d a E u r o p a . N a T e r c e i r a e ú l t i m a P a r t e , s e d e b r u ç a m a i s d e t a l h a d a m e n t e sobre a s r e s t r i ç õ e s a m b i e n t a i s c o m u n s à s d u a s e c o n o m i a s n a era p r é -i n d u s t r -i a l e o p a p e l de fatores c o n j u n t u r a -i s na d e t e r m -i n a ç ã o da Gran¬ d e D i v e r g ê n c i a .

Partindo do pressuposto - caro aos praticantes da H i s t ó r i a Global - de q u e a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l foi u m f e n ô m e n o n ã o a p e n a s l o c a l , m a s do m u n d o t o d o , o a u t o r enfatiza o p a p e l d e s e m p e n h a d o p o r o u t r o

3 4 Trata-se da hipótese, devida a John Hajnal (HAJNAL, John, "European Marriage Patterns in Perspective", in Glass, D.C. e EVERSLEY, D.E.C., Population in History. Chicago:Aldine, 1965) acerca da existência de um "padrão europeu de casamento", distinto daquele observado em outras sociedades (como na Ásia). Para aquele autor, em partes da Europa os indivíduos se casariam mais tarde, a idade dos cônjuges era mais próxima e uma parcela relativamente grande de pessoas jamais se casava. Esta singularidade da Europa ocidental teria permitido apenas aos europeus exercerem, em períodos de dificuldade econômica, um controle preventivo (moral check, nos termos de Malthus) do crescimento demográfico e, com isso, diminuir o risco de expansão populacional excessiva e crises de subsistência.

(14)

t i p o d e c o n t i n g ê n c i a , a l é m d a g e o l ó g i c a ( c a r v ã o ) , l i g a d a a processos g l o b a i s : o " b ô n u s e c o l ó g i c o " (ecological windfall), p r o p o r c i o n a d o p e l a e x p l o r a ç ã o d o N o v o M u n d o , e a s c o n s e q u ê n c i a s i n e s p e r a d a s deste b ô n u s . A s m a d e i r a s , o a ç ú c a r e o a l g o d ã o d o N o v o M u n d o f o r a m , c l a r a m e n t e , u m b ô n u s p a r a o O c i d e n t e , e m t e r m o s d a e x p a n s ã o d a área a g r i c u l t á v e l d a E u r o p a3 5. P o m e r a n z (2000) e s t i m o u a c h a m a d a

ghost acreage, o u seja, a área " p o u p a d a " n a G r ã - B r e t a n h a ao i m p o r t a r

a l i m e n t o s e m a t é r i a s - p r i m a s d o N o v o M u n d o ( a l g o d ã o , a ç ú c a r e ma¬ d e i r a ) e m 2 5 - 3 0 m i l h õ e s d e acres (100.000 a 120.000 k m2) , o u b e m m a i s q u e o s t e r r e n o s a g r i c u l t á v e i s n a q u e l e p a í s3 6. O s l u c r o s propor¬ c i o n a d o s p e l o c o m é r c i o c o m o N o v o M u n d o t a m b é m t e r i a m sido i m p o r t a n t e s , n a o p i n i ã o d o a u t o r p a r a a p o s t e r i o r i n d u s t r i a l i z a ç ã o b r i t â n i c a . As f o r m a s distintas c o m o a G r ã - B r e t a n h a e a C h i n a e x p l o r a r a m as suas p e r i f e r i a s t a m b é m t ê m p a p e l i m p o r t a n t e e m seu a r g u m e n t o . Para e l e , a s p e r i f e r i a s chinesas n ã o p r o p o r c i o n a r a m tantos g a n h o s , v i s t o q u e a q u e l a s r e g i õ e s e v e n t u a l m e n t e se t o r n a r a m d e n s a m e n t e p o v o a d a s e m e n o s d e p e n d e n t e s d o seu " c e n t r o " c h i n ê s . J á nas A m é r i c a s , o s e u r o p e u s p u d e r a m c o n t a r c o m m u i t o m a i s r e c u r s o s , e m p a r t e e m função d o d e s p o v o a m e n t o c a u s a d o p e l a a ç ã o das d o e n ç a s sobre o s a m e r í n d i o s . A d i c i o n a l m e n t e , a i m p l a n t a ç ã o do s i s t e m a de plantations no N o v o M u n d o , e s p e c i a l i z a d a s n a p r o d u ç ã o d e a r t i g o s tropicais e d e p e n d e n t e s d a i m p o r t a ç ã o d e m a n u f a t u r a d o s e u r o p e u s , d e u i m p u l s o a d i c i o n a l à e c o n o m i a do O c i d e n t e . F i n a l m e n t e - e n ã o m e n o s i m p o r t a n t e - o tráfico d e escravos, e m c o n j u n t o c o m o s fatores d e s t a c a d o s a n t e r i o r -m e n t e , c o n t r i b u i u para g e r a r u -m f l u x o c o n t í n u o d e l u c r o s para o s

3 5 A esta lista deve-se acrescentar a prata americana que, embora não cultivada, mos¬ trou-se indispensável para o funcionamento da economia global do início da Era Moderna - e, por conseguinte, no expansionismo comercial europeu. Ver FLYNN, Dennis O. & GIRÁLDEZ, Arturo, "Path Dependence, Time Lags and the Birth of Globalization: a critique of O'Rourke andWilliamson". European Review of Economic

History, vol. 8, Issue 1, April 2004.

3 6 Ver Pomeranz ( P O M E R A N Z , Kenneth, The Great Divergence, op. cit., p. 2 7 6 ) . Este número não inclui a área de floresta poupada para a produção de lenha, substituída pelo carvão mineral, estimada, pelo autor, em 15-21 milhões de acres (60.000 a 84.000 km2).A expressão ghost acreage é devida a Jones (JONES, Eric L., The European

Miracle: environments, economies and geopolitics in the history of Europe and Asia.

(15)

e m p r e s á r i o s b r i t â n i c o s e n v o l v i d o s n o c o m é r c i o a t l â n t i c o . S e , d e f o r m a isolada, n e n h u m destes fatores l e v a r i a à i n d u s t r i a l i z a ç ã o b r i t â n i c a , to¬ m a d o s e m c o n j u n t o c o n t r i b u í r a m para o seu p i o n e i r i s m o , a r g u m e n t a P o m e r a n z (2000).

A i n d a q u e - a e x e m p l o de W o n g (1997) e P o m e r a n z - Goldstone veja " i n c r í v e i s s e m e l h a n ç a s " entre a n a t u r e z a do c r e s c i m e n t o e c o n ô m i ¬ co c h i n ê s e O c i d e n t a l ( b r i t â n i c a , m a i s e s p e c i f i c a m e n t e ) antes da R e v o ¬ l u ç ã o Industrial, a d o t a postura m a i s c a u t e l o s a no t o c a n t e às razões da G r a n d e D i v e r g ê n c i a . A s s i m , ao i n v é s de r e c o r r e r a e x p l i c a ç õ e s q u e en¬ fatizam o papel do acaso (sob a f o r m a da e x i s t ê n c i a de c a r v ã o e de acesso às A m é r i c a s ) na e x p l i c a ç ã o da ascensão do O c i d e n t e , Goldstone (2009:167-9) se a p r o x i m a m a i s da l i t e r a t u r a t r a d i c i o n a l e sua ênfase na e x c e p c i o n a l i d a d e c u l t u r a l / i n s t i t u c i o n a l d a Europa. N e s t e sentido, para ele, a trajetória distinta t o m a d a p e l a E u r o p a a partir da R e v o l u ç ã o In¬ dustrial - e s o m e n t e após ela - deve ser vista c o m o o resultado da c o m b i n a ç ã o d e fatores " i n c o m u n s " , p r ó p r i o s d a E u r o p a (ou, e m c e r t o s casos, específicos da G r ã - B r e t a n h a ) . Entre eles, o a u t o r cita a a b o r d a g e m e m p í r i c a dos f e n ô m e n o s n a t u r a i s , a e x p e r i m e n t a ç ã o b a s e a d a e m ins¬ t r u m e n t o s , o c l i m a d e t o l e r â n c i a ( s o b r e t u d o , d a p a r t e d a I g r e j a An¬ g l i c a n a ) e as e s t r e i t a s r e l a ç õ e s s o c i a i s e n t r e e m p r e s á r i o s , c i e n t i s t a s , e n g e n h e i r o s e artesãos. N ã o obstante a t ô n i c a m a i s m o d e r a d a d a c o n t r i b u i ç ã o d e G o l d s t o -ne (2002), a repercussão p r o v o c a d a p e l o r e v i s i o n i s m o c a l i f o r n i a n o - em p a r t i c u l a r o r a d i c a l i s m o i m p l í c i t o no l i v r o de P o m e r a n z (2000), ao su¬ g e r i r q u e , e m ú l t i m a análise, o i n í c i o d a G r a n d e D i v e r g ê n c i a t e r i a sido tardio e fortuito (late and lucky)37 a b r i r i a as portas para um c o n t r a

-a t -a q u e n ã o m e n o s v i g o r o s o p o r p -a r t e d e -a u t o r e s d-as m -a i s divers-as o r i e n t a ç õ e s m e t o d o l ó g i c a s e i d e o l ó g i c a s , p o r é m d e a l g u m a f o r m a iden¬ tificados c o m a i d e i a da e x c e p c i o n a l i d a d e e u r o p e i a .

3 7 Em Pomeranz ( P O M E R A N Z , Kenneth, "Beyond the East-West Binary: resituating development paths in the eighteenth-century world". The Journal of Asian Studies, vol. 6 1 , n. 2, M a y 2 0 0 2 : 5 7 9 - 8 1 ) o autor refuta esta caracterização de seu argumento, e afirma que carvão e colônias, por si só, não explicariam a Grande Divergência.

(16)

2. Criticando os revisionistas

2.1 "Incríveis Semelhanças" entre a China e a Europa?

C o n f o r m e v i s t o , u m a das c r í t i c a s c e n t r a i s d o r e v i s i o n i s m o c a l i f o r -n i a -n o d i z r e s p e i t o a g e -n e r a l i z a ç õ e s tidas c o m o , e m g e r a l , e q u i v o c a d a s , a r e s p e i t o das c a r a c t e r í s t i c a s s o c i o e c o n ô m i c a s d o O r i e n t e . S e g u n d o e l e s , a o r t o d o x i a r e i n a n t e insiste e m a p o n t a r supostas v a n t a g e n s n a c o n f o r m a ç ã o i n s t i t u c i o n a l e u r o p e i a , q u e l h e t e r i a m p e r m i t i d o a b r i r o c a m i n h o p a r a o c a p i t a l i s m o e, a p a r t i r daí, a G r a n d e D i v e r g ê n c i a . Para a u t o r e s c o m o W o n g (1997) e P o m e r a n z ( 2 0 0 0 ) , s o b r e t u d o , até c. 1800 a s r e g i õ e s m a i s d i n â m i c a s d a C h i n a n ã o d e v i a m n a d a a suas c o n g ê n e ¬ res o c i d e n t a i s e m t e r m o s d e a r c a b o u ç o p o l í t i c o , r e g i m e d e m o g r á f i c o , v i g o r c o m e r c i a l , d i s s e m i n a ç ã o d e m e r c a d o s , etc., d e tal m o d o q u e n ã o s e r i a l í c i t o e n x e r g a r " v a n t a g e n s " c u l t u r a i s o u i n s t i t u c i o n a i s e u r o p e i a s antes d a o c o r r ê n c i a (fortuita, s e g u n d o o s r e v i s i o n i s t a s ) d a R e v o l u ç ã o I n d u s t r i a l . Em o u t r a s p a l a v r a s , a d i v e r g ê n c i a e n t r e E u r o p a e C h i n a t e r i a sido t a r d i a - c e r t a m e n t e , m u i t o m a i s do q u e p o s t u l a m os early

modernists, c o m sua ênfase n o s e l e m e n t o s d e d i n a m i s m o d a e c o n o m i a

e u r o p e i a p r é - i n d u s t r i a l . U m a c r í t i c a m a i s g e r a l feita a tal p o s t u l a d o d e " i n c r í v e i s s e m e l h a n -ç a s " e n t r e a Á s i a e a E u r o p a p a r t i u de M a d d i s o n ( 2 0 0 1 ) , q u e a r g u m e n t a q u e , e n t r e os s é c u l o s XIII e XVIII, a C h i n a e x p e r i m e n t o u , na v e r d a d e , c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o d e c a r á t e r m e r a m e n t e e x t e n s i v o (isto é , ba¬ s e a d o no m a i o r u s o dos fatores t e r r a e t r a b a l h o ) . A m u l t i p l i c a ç ã o p o r u m fator d e q u a t r o (de 100 p a r a 400 m i l h õ e s d e h a b i t a n t e s ) d a popu¬ l a ç ã o c h i n e s a n o p e r í o d o n ã o t e r i a sido a c o m p a n h a d a d e c r e s c i m e n t o s i g n i f i c a t i v o da r e n d a per capita e, p o r t a n t o , n ã o s e r i a l í c i t o a f i r m a r c o m o G o l d s t o n e (2002) q u e h o u v e r a u m a " f l o r e s c ê n c i a " e c o n ô m i -ca e n t r e 1 6 8 0 - 1 7 8 03 8. A d i c i o n a l m e n t e , M a d d i s o n (2001) descarta a i d e i a de s e m e l h a n ç a n o s efeitos do a r c a b o u ç o i n s t i t u c i o n a l c h i n ê s e e u r o p e u ,

3 8 Tal crescimento notável da população chinesa só foi possível a partir de uma combinação de expansão da área agricultável (ao sul do Yang-Tsé, sobretudo) e maiores rendimentos, estes últimos com base no cultivo de variedades mais pro¬ dutivas de arroz, introdução de milho e batata doce, vindos das Américas, e uso mais intensivo de fertilizante (estrume e torta de soja): M A D D I S O N , Angus, The

(17)

p r e f e r i n d o enfatizar, a o c o n t r á r i o , l i m i t a ç õ e s n o caso c h i n ê s , q u e "ini¬ b i r i a m o c r e s c i m e n t o da i n i c i a t i v a capitalista e r e s t r i n g i r i a m as oportu¬ n i d a d e s para o c o m é r c i o e x t e r i o r e a troca de i d e i a s "3 9.

B r e n n e r e Isett (2002) t a m b é m d i s c o r d a m da p e r i o d i z a ç ã o de P o m e -r a n z (2000) pa-ra o i n í c i o da G -r a n d e D i v e -r g ê n c i a . Pa-ra eles, desde 1500 (e n ã o 1800, c o m o q u e r e m os revisionistas) as trajetórias das duas r e g i õ e s já s e g u i a m cursos distintos, de sorte q u e , em m e a d o s do s é c u l o XVIII, a I n g l a t e r r a j á era, e m t e r m o s c o m p a r a t i v o s , u m a e c o n o m i a d e s e n v o l v i d a e r i c a e o delta do Y a n g - T s é , pobre. As diferenças nas trajetórias entre as duas r e g i õ e s - e, t a m b é m , da I n g l a t e r r a c o m r e l a ç ã o ao restante da Eu¬ ropa - d e c o r r e r i a da p r e v a l ê n c i a de r e l a ç õ e s sociais de p r o d u ç ã o no c a m p o (e fora dele) distintas. Em particular, do s u r g i m e n t o , na Inglaterra, de p r o d u t o r e s r u r a i s diretos (tenants e labourers), e n ã o m a i s senhores e c a m p o n e s e s e m formas d e c o e r ç ã o e x t r a e c o n ô m i c a4 0. C o m o c o n s e q u ê n -cia, a I n g l a t e r r a e x p e r i m e n t o u p r o d u t i v i d a d e a g r í c o l a e r e n d a per capita crescentes desde o s é c u l o XVII, ao c o n t r á r i o do restante da E u r o p a e d o O r i e n t e .

U m a das críticas m a i s v e e m e n t e s a o r e v i s i o n i s m o c a l i f o r n i a n o p a r t i u de B r y a n t (2006). O a u t o r n ã o vê e l e m e n t o s q u e d ê e m sustentação à posição revisionista de q u e antes da R e v o l u ç ã o Industrial as r e g i õ e s m a i s avançadas d a C h i n a e d a E u r o p a o c i d e n t a l estavam c a m i n h a n d o e m u m a m e s m a trajetória de d e s e n v o l v i m e n t o , e q u e esta só v i r i a a d i v e r g i r em função d e " a c i d e n t e s " g e o g r á f i c o s / g e o l ó g i c o s4 1. Para ele, n a r e a l i d a d e , h a v i a contrastes n í t i d o s entre a s duas r e g i õ e s . Por e x e m p l o , l e m b r a q u e , n a C h i n a dos p e r í o d o s M i n g - Q i n g (séculos XIV a X I X ) , h o u v e , sim, e n o r m e c r e s c i m e n t o d e m o g r á f i c o , p o r é m s e m ser a c o m p a n h a d o d e

3 9 Ibidem, p. 2 3 .

4 0 Para Pomeranz ( P O M E R A N Z , Kenneth, "Beyond the East-West Binary", op. cit., p. 5 5 2 ) , porém, esta ideia de que o caminho para a economia moderna devesse passar, necessariamente, pela "proletarianização" do campesinato não se sustentaria sequer na experiência histórica inglesa.

4 1 Goldstone ( G O L D S T O N E , Jack, "Capitalist O r i g i n s ' , op. cit., p. 120) contesta esta caracterização que Bryant ( B R Y A N T , Joseph M . , " T h e West and the R e s t Revisited", op. cit.) fez da posição revisionista e afirma que, na verdade, os califor-nianos argumentam que nenhuma das principais sociedades da Eurásia (à exceção da Grã-Bretanha, na visão particular de Goldstone) encontrava-se em uma trajetória de crescimento modernizante entre 1500 e 1800.

(18)

m e l h o r i a significativa das t é c n i c a s d e p r o d u ç ã o4 2. A i n d a n a q u e s t ã o a g r á r i a , B r y a n t (2006:4301) n o t a q u e , e n q u a n t o a Inglaterra e x p e r i m e n tara u m a R e v o l u ç ã o A g r í c o l a ( c o m e l e v a ç ã o d a p r o d u ç ã o e d a p o p u l a -ção, a o m e s m o t e m p o e m q u e c a í a a p r o p o r ç ã o d a força d e trabalho e m p r e g a d a n a a g r i c u l t u r a ) , n a d a s e m e l h a n t e s e passou n a C h i n a , a o c o n t r á r i o do q u e p o s t u l a m os revisionistas. F i n a l m e n t e , sustenta q u e a e x p a n s ã o d o setor t ê x t i l d o m é s t i c o (cottage industry) n a C h i n a , l o n g e de representar u m a m a n i f e s t a ç ã o a n á l o g a à m a i o r divisão de t r a b a l h o e R e v o l u ç ã o Industriosa d o O c i d e n t e , seria, n a v e r d a d e , u m a estratégia desesperada de c o m p e n s a r a q u e d a n o s r e n d i m e n t o s a g r í c o l a s .

B r y a n t (2006) v a i m a i s a l é m e m sua c r í t i c a a o a r g u m e n t o revisio¬ nista, t a x a n d o - o d e " a - h i s t ó r i c o " , " a - s o c i o l ó g i c o " (p. 410) e , p o r f i m , " i l ó g i c o " (p. 4 3 6 ) . C o m o q u e para provar o seu p o n t o , l a n ç a três per¬ g u n t a s para os a u t o r e s da Escola da C a l i f ó r n i a :

I. Se é v e r d a d e q u e as v a n t a g e n s decisivas da E u r o p a s o m e n t e s u r g i r a m após a i n d u s t r i a l i z a ç ã o , p o r q u e é q u e , n o s três séculos a n t e r i o r e s , os e u r o p e u s f o r a m capazes de c o n q u i s t a r partes da Ásia, s e m q u e as p o t ê n c i a s l o c a i s fossem capazes de e x p u l s á - l o s ?

II. Se a Á s i a era tão forte e c o n ô m i c a e t e c n o l o g i c a m e n t e q u a n t o a E u -ropa, p o r q u e é q u e isso n ã o se t r a d u z i u m i l i t a r m e n t e ? III. Se as s o c i e d a d e s da E u r o p a o c i d e n t a l e da Á s i a e r a m , grosso m o d o , e q u i v a l e n t e s e m t e r m o s d e d e s e n v o l v i m e n t o e c o n ô m i c o até c . 1800, c o m o é q u e foi possível u m a r u p t u r a r e v o l u c i o n á r i a (a R e v o l u ç ã o Industrial) s e m u m p e r í o d o a n t e r i o r " p r e p a r a t ó r i o " ?4 3. Esta ú l t i m a p e r g u n t a f o r m a o c e r n e da c r í t i c a de B r y a n t a u m a a p a -rente d e f i c i ê n c i a l ó g i c a d o a r g u m e n t o revisionista, q u e sustenta q u e dois

4 2 Para o autor, a situação de permanente crise agrária (agrarian distress) chinesa estaria na origem, inclusive, das inúmeras rebeliões camponesas observadas no século XIX, ocasionando a morte de dezenas de milhões de pessoas. Já para Pomeranz ( P O M E -R A N Z , Kenneth, "Beyond the East-West Binary", op. cit., p. 5 7 5 ) , as pressões demo-gráficas experimentadas pela China no século X I X ocorreram, justamente, fora da região economicamente mais dinâmica (o Delta do Yang-Tsé) e teriam prejudicado a capacidade do Estado de manter a ordem e a infraestrutura econômica bem antes de se tornarem um problema, propriamente, malthusiano.

(19)

tipos de s o c i e d a d e s " i n c r i v e l m e n t e s e m e l h a n t e s " p o d e m - a partir de fatores c o n t i n g e n t e s ( a c i d e n t e s h i s t ó r i c o s ou a g e o g r a f i a ) - d i v e r g i r r a d i c a l m e n t e . Para B r y a n t (2006:437) na H i s t ó r i a n ã o existe c r i a ç ã o a partir " d o n a d a " (ex nihilo), m a s s i m r e l a ç õ e s de c a u s a l i d a d e entre o passado e o presente, de tal f o r m a q u e m e s m o as t r a n s f o r m a ç õ e s m a i s r e v o l u c i o n á r i a s e n v o l v e m " r e - f a z e r " o u " i r a l é m " d e algo p r e e x i s t e n t e , ou seja, t ê m p o r base recursos e o p o r t u n i d a d e s q u e se v i n h a m a c u m u ¬ l a n d o n o p a s s a d o4 4.

A c r í t i c a à tese revisionista de " i n c r í v e i s s e m e l h a n ç a s " t a m b é m se dá n o n í v e l das e v i d ê n c i a s históricas m a i s específicas. N e s t e sentido, u m a das questões m a i s i m p o r t a n t e s d i z respeito a c o m p a r a ç õ e s do p a d r ã o de v i d a v i g e n t e nas duas r e g i õ e s , e x e r c í c i o q u e p a d e c e dos p r o b l e m a s ine¬ rentes à m e n s u r a ç ã o de i n d i c a d o r e s de salários reais confiáveis para o passado distante. E m b o r a os revisionistas i n s i s t a m q u e o p a d r ã o de v i d a no D e l t a do Y a n g - T s é e na I n g l a t e r r a fosse, grosso m o d o , s e m e l h a n t e , no i n í c i o da Era M o d e r n a , p r e f e r e m ater-se a m e d i d a s indiretas, tais c o m o o c o n s u m o d e b e n s d e l u x o o u estimativas d e e x p e c t a t i v a d e v i d a . N ã o obstante, tentativas p o s t e r i o r e s de c o m p a r a r os r e n d i m e n t o s per

capita nas duas r e g i õ e s i n d i c a m diferenças m a i s ou m e n o s significativas.

B r o a d b e r r y e G u p t a ( 2 0 0 5 ) , p o r e x e m p l o , a f i r m a m q u e o Y a n g - T s é e o sul da Í n d i a , de fato, a p r e s e n t a v a m e l e v a d o s n í v e i s de s a l á r i o s no p e r í o d o p r é - i n d u s t r i a l ( 1 5 0 0 - 1 8 0 0 ) , c o n f o r m e a r g u m e n t a d o p o r P o m e r a n z ( 2 0 0 0 ) . P o r é m , n o t a m q u e tal r e s u l t a d o s ó s e m a n t é m n o caso d e o s salários s e r e m m e d i d o s p e l o seu p o d e r d e c o m p r a , e m t e r m o s d a q u a n t i d a d e d e g r ã o s (ou c a l o r i a s ) . E m outras palavras, t r a b a l h a d o r e s i n d i a n o s e c h i n e s e s a p r e s e n t a r i a m u m a c a p a c i d a d e m é d i a d e a d q u i r i r arroz s e m e l h a n t e à d e u m t r a b a l h a d o r i n g l ê s a d q u i r i r t r i g o . Para o s autores, isso seria e v i d ê n c i a n ã o de s e m e l h a n ç a s no p a d r ã o de v i d a nas

4 4 Goldstone (GOLDSTONE, Jack, Capitalist Origins", op. cit., p. 121) atribui essa crítica a um raciocínio "linear" de Bryant, em que as mudanças devem sempre ser contínuas e, mais ainda, mudanças de monta dependem de mudanças anteriores. Em sua réplica, Bryant ( B R Y A N T , Joseph M., "A N e w Sociology for a N e w History?", op. cit., p. 160) reafirma sua posição, enfatizando a existência de "concatenação" na História, segundo a qual "todo o passado molda ou condiciona o presente que surge, e toda contingência exógena cruza com processos causais endógenos e arranjos estruturais existentes". Esta última visão da "dinâmica" dos processos históricos parece mais plausível que aquela sugerida por Goldstone.

(20)

duas r e g i õ e s , m a s s i m do fato de t a n t o a Índia c o m o a C h i n a s e r e m " n a t u r a l m e n t e " capazes d e p r o d u z i r g r a n d e q u a n t i d a d e d e arroz, p o r razões c l i m á t i c a s , e c o l ó g i c a s .

Para e l e s , caso o s salários s e j a m c a l c u l a d o s e m t e r m o s d e seu e q u i v a l e n t e e m prata ( a f i m d e facilitar c o m p a r a ç õ e s entre m o e d a s d i f e r e n -t e s ) , o s r e n d i m e n -t o s n a Á s i a m o s -t r a r - s e - i a m m u i -t o i n f e r i o r e s aos eu¬ r o p e u s , i n d i c a n d o s e r a q u e l a r e g i ã o c a r a c t e r i z a d a p o r b a i x o d e s e n v o l v i m e n t o e c o n ô m i c o . S o m a - s e isso a o t a m b é m b a i x o g r a u d e u r b a n i z a ç ã o , c o m p a r a t i v a m e n t e à E u r o p a o c i d e n t a l , e B r o a d b e r r y e G u p t a (2005) c o n c l u e m q u e a q u e l a s e c o n o m i a s a s s e m e l h a v a m - s e m a i s à E u r o p a O r i e n t a l p o b r e ( P o l ô n i a , p o r e x e m p l o ) do q u e às e c o n o m i a s d i n â m i c a s n o n o r o e s t e e u r o p e u , c o m o I n g l a t e r r a e H o l a n d a . Para eles, o s e l e v a d o s salários e m t e r m o s d e prata, n o n o r o e s t e d a E u r o p a , p o r seu t u r n o , r e f l e t i r i a m e l e v a d a p r o d u t i v i d a d e d o setor d e b e n s c o m e r -c i a l i z á v e i s , s e n d o forte i n d i -c a d o r de q u e a G r a n d e D i v e r g ê n -c i a se i n i c i a r a m u i t o antes d e 1800. V a l e n d o - s e d e u m a b a s e d e d a d o s d i s t i n t a - e t e n d o e m m e n t e a n a t u r e z a p r e p o n d e r a n t e m e n t e r u r a l das s o c i e d a d e s p r é i n d u s t r i a i s A l -l e n (2004) p r o c u r a c o m p a r a r estimativas d e r e n d i m e n t o s r u r a i s nas duas r e g i õ e s . A p ó s c o n c l u i r q u e , p o r v o l t a d e 1800, a p r o d u t i v i d a d e d o t r a b a l h o n a a g r i c u l t u r a d o Y a n g T s é e r a a p e n a s 10% i n f e r i o r à i n g l e -sa (à é p o c a , a m a i s p r o d u t i v a do m u n d o ) , A l l e n t e n t a e s t i m a r a renda n o setor, i n c l u s i v e a q u e l a a u f e r i d a p e l a s m u l h e r e s n o s e t o r t ê x t i l p r o t o i n d u s t r i a l . N o v a m e n t e , c o n c l u i q u e e l a s e r a m a p e n a s l i g e i r a ¬ m e n t e m a i s b a i x a s n a C h i n a , o q u e c o n f i r m a r i a o r e v i s i o n i s m o d e P o m e r a n z ( 2 0 0 0 )4 5.

A l l e n (2004) c h a m a atenção, a i n d a , para o fato de a e l e v a d a produti¬ v i d a d e a g r í c o l a4 6 observada h á séculos n o Y a n g - T s é ser resultante d o uso i n t e n s i v o d e fertilizantes. C r u c i a l m e n t e , p o r é m , isso n ã o i m p e d i r i a q u e a q u e l a e c o n o m i a j á esbarrasse e m l i m i t e s físicos, dados p e l o g r a n d e n ú m e r o d e t r a b a l h a d o r e s / h e c t a r e , reforçado p e l o sistema d e h e r a n ç a d e terras q u e n ã o p r i v i l e g i a v a o s p r i m o g ê n i t o s , c o m o n a Inglaterra. C o m o

4 5 O autor ressalta, porém, que o fato de a produtividade agrícola no Yang-Tsé ter permanecido estagnada entre 1600 e 1800 — ao passo que a da Inglaterra cresceu e continuaria a aumentar — permitiria concluir que a Grande Divergência se iniciara bem antes da Revolução Industrial.

Referências

Documentos relacionados

8- Bruno não percebeu (verbo perceber, no Pretérito Perfeito do Indicativo) o que ela queria (verbo querer, no Pretérito Imperfeito do Indicativo) dizer e, por isso, fez

A Sementinha dormia muito descansada com as suas filhas. Ela aguardava a sua longa viagem pelo mundo. Sempre quisera viajar como um bando de andorinhas. No

vassourar – varrer... Que género de texto acabaste de ler? Justifica a tua resposta. Transcreve alguns versos que ilustrem a azáfama da vassoura. A dona da casa está descontente com

2. Identifica as personagens do texto.. Indica o tempo da história. Indica o espaço da história. Classifica as palavras quanto ao número de sílabas. Copia do texto três

Em janeiro, o hemisfério sul recebe a radiação solar com menor inclinação e tem dias maiores que as noites, encontrando-se, assim, mais aquecido do que o hemisfério norte.. Em julho,

E, a certa altura, ela murmurava para o seu prostrado e inconsciente guerreiro: «não te deixarei morrer, David Crockett!» Não sei porquê, esta frase e esta cena viajaram comigo

5- Bruno não percebeu (verbo perceber, no Pretérito Perfeito do Indicativo) o que ela queria (verbo querer, no Pretérito Imperfeito do Indicativo) dizer e, por isso, fez

a) O polícia disse um palavrão, após ter saído da casa de Adrian. Corrige as falsas.. A mãe também está com gripe. “Quase que não consegui ficar calado quando vi que não