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O matrimônio na ordem da criação

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Academic year: 2021

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Pe. Henrique Soares da Costa

É surpreendente e admirável que o amor humano, o amor entre um

homem e uma mulher – amor que envolve doação, carinho, carícias,

intimidade sexual e erótica! – seja marcado por Cristo com a sua graça e seja um sacramento. O amor de homem e mulher, amor carnal, também é matéria de sacramento, também é sinal do amor de Deus! Vejamos!

O Catecismo da Igreja afirma o seguinte: “O pacto matrimonial pelo

qual o homem e a mulher estabelecem entre eles a comunidade por toda a vida, por sua própria natureza ordenado ao bem dos esposos e à procriação e educação dos filhos, entre os batizados foi elevado por Cristo Senhor à

dignidade de sacramento” (CIC 1601).

A idéia é muito bonita: o homem e a mulher, pelo amor, assumem uma aliança por toda a vida. E para quê? Primeiro por amor, para curtirem e viverem o amor entre eles, e se amando “serem felizes para sempre” – é isso que o Catecismo quer dizer quando fala no “bem dos esposos” e, em segundo lugar, para partilharem esse amor com outros: os filhos que Deus enviar. O amor é assim, difusivo; ele se espalha, se difunde... quanto mais amor, mais partilha, mais expansão de amor. O Catecismo diz ainda que esse amor, entre um cristão e uma cristã, foi elevado por Cristo à dignidade, ao status de

sacramento, quer dizer, de sinal eficaz da graça de Cristo! Até São Paulo, admirado exclamou sobre isso:

“Mas é grande esse mistério (= esse sacramento)” (Ef 5,32).

O próprio Catecismo recorda que a Escritura, do começo ao fim, fala do matrimônio e do seu mistério tão profundo: basta pensar, logo no Gênesis, a criação do homem e da mulher e a ordem de crescerem e multiplicarem... basta recordar a primeira palavra do homem, que não foi uma oração a Deus, mas uma declaração de amor:

“Agora sim, é carne de minha carne; é osso dos meus ossos!”

Até o Apocalipse, que termina com a visão das núpcias do Cordeiro, Cristo, com sua Igreja, a Jerusalém celeste (cf. Ap 19,7.9).

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O matrimônio não começou a existir com o

cristianismo. Ele existe desde que o homem é homem. A Escritura diz que Deus nos criou à sua imagem, como sua semelhança... Entre outras coisas, isso significa que o homem tem um coração como o coração de Deus, capaz de amar e ser amado. Todos temos sede de dar e receber amor. Somente amando nos

humanizamos, amadurecemos. Quem não ama vira bicho, se desumaniza! Por isso mesmo, Deus vai criando e vai vendo que tudo era bom mas, ao criar o homem, exclama: “Não é bom que o homem esteja só!” (Gn

2,18) Deus, então, do homem, cria a mulher. É belíssima esta parábola, esta linguagem simbólica da Bíblia! A Escritura diz que Deus mandou um sono ao homem para deixar claro que o homem não participa da criação da mulher: ela é criada diretamente por Deus, como o homem! Deus a tira da costela, do lado do homem, do seu íntimo, para que lhe seja

companheira. Como dizia Santo Agostinho, não tirou a mulher dos pés do homem (ela não é inferior a este) nem lhe tirou da cabeça (ela também não lhe é

superior): tirou do lado! É muito significativo também o fato de Deus não ter novamente soprado sobre a mulher: ambos vivem do mesmo sopro de Deus, foram feitos um para o outro! Daí, as palavras

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sim, é osso de meus ossos; carne de minha carne”

(Gn 2,23) e o decreto de Deus:

“O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá a sua mulher e os dois serão uma só carne!” (Gn 2,24).

Assim, o matrimônio não é somente é uma

realidade cristã! Se somente o matrimônio entre cristãos é um sacramento, no entanto, os matrimônios, cristãos ou não, são santos e abençoados por Deus, pois estão inscritos naquele sonho inicial do Senhor para a humanidade! Em todas as culturas e épocas, enquanto o ser humano existir, homem e mulher

largarão tudo, sairão de seu ninho afetivo, da família em que nasceram, para uma aventura belíssima: formar uma nova família, um novo lar, uma nova vida,

totalmente compartilhada, na qual o destino dos dois esteja entrelaçado e desse laço dependa e nasça o

destino dos filhos! Realmente, “é grande este

mistério!”

O matrimônio sob o regime do pecado

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experiência do mal que cada um de nós e toda a humanidade faz: somos

quebrados, incoerentes, muitas vezes

egoístas. Tal situação atinge todos os aspectos da existência humana, também a relação afetiva entre o homem e a

mulher. Algo tão bonito como o amor de um casal não é um mar de rosas... Também o amor é ameaçado pela discórdia, pelo

espírito de domínio, pela infidelidade, pelo ciúme e por tantos conflitos que pode mesmo chegar a tornar-se ódio. Então, o amor não é algo que cai do céu... é um

sonho, um desejo do coração, mas

ameaçado pelo nosso desmantelo interior e mais ainda pelo desmantelo do mundo que nos cerca...

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fé nos diz que vem da situação de pecado, na qual a humanidade toda se encontra. Esta situação de pecado – chamamos

“pecado original” – provém do início da humanidade: o homem decidiu fazer sua vida do seu jeito... e, assim,

desarrumou-se totalmente com Deus,

consigo mesmo, com a natureza, com os outros... A relação homem-mulher

também foi gravemente prejudicada. Basta pensar na história do paraíso... O amor muitas vezes degenera em

egoísmo, o afeto em ciúme, a atração sexual em pura relação de

desfrutamento e domínio... Mas, apesar do desmantelo, o plano de Deus para o

amor humano continua de pé, belo, alto, nobre! Com a graça de Deus que nos vem por Jesus Cristo, o homem e a mulher podem se superar e viver um amor

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investir nele, construí-lo, sabendo

renunciar, dialogar, perdoar, aprendendo a ser feliz na felicidade do outro! O amor se aprende, o amor se constrói! Quem não está disposto a se construir e se formar no dia a dia não deveria nunca se casar... porque nunca saberá amar de verdade! Amar é ser feliz na felicidade do outro, é saber sair de si para ir ao encontro do outro, com seus sonhos, projetos e jeito de ser...

O amor real, de carne e osso

não se dá entre dois seres perfeitos e

totalmente integrados; mas entre duas pessoas com suas virtudes, defeitos e

feridas... pessoas que estão em

construção, pessoas que precisam ser

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Neste sentido, o matrimônio é um belíssimo meio para sair de si, para abrir-se para o outro, para aprender a partilhar. O

matrimônio é caminho de superação, humanização e amadurecimento!

O matrimônio sob a pedagogia

da Lei

Como aparece o

matrimônio no Antigo Testamento? No início não era muito clara toda a profundidade do amor

matrimonial e sua dignidade. Nos textos mais antigos da Escritura, vemos os patriarcas sendo

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uma esposa). Contudo, pelos

profetas, Deus vai comparando sua aliança com o povo de Israel a uma aliança matrimonial. E aí,

nessa relação de amor, Deus promete ser somente de Israel e

exige que Israel seja totalmente do seu Deus! Sobre isso há

páginas belíssimas no Antigo

Testamento (cf. Os 1-3; Is 54; Jr 2-3; Ez 16). Baste-nos o exemplo encantador de Os 2,16.21s: Deus se compara a um esposo

apaixonado que vai seduzir Israel, sua amada: “Eis que vou, eu

mesmo, seduzi-la, conduzi-la ao deserto e falar-lhe ao coração.

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Eu te desposarei a mim para

sempre, eu te desposarei na justiça e no direito, no amor e na

ternura. Eu te desposarei a mim na fidelidade e conhecerás o

Senhor!” E o

Cântico dos Cânticos, que

celebrando o amor humano, até com uma linguagem erótica,

recorda o amor entre o Senhor, Esposo cheio de amor, e sua esposa, o povo de Israel:

“Que me beije com beijos de sua boca! Teus amores são

melhores do que o vinho, o odor dos teus perfumes é suave, teu nome é como um óleo escorrendo,

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e as donzelas se enamoram de ti! Macieira entre as árvores do

bosque, é meu amado entre os jovens; à sua sombra eu quis

assentar-me, com seu doce fruto na boca. Levou-me ele à adega e conta mim desfralda sua bandeira de amor. Sua mão esquerda

está sob minha cabeça e com a direita me abraça! - Filhas de Jerusalém, pelas cervas e gazelas do campo, eu vos conjuro: não

desperteis, não acordeis o amor, até que ele o queira” (Ct 1,2-4; 2,1-7). S

ão Palavra de Deus: o amor

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sublimidade, capaz de exprimir o amor de aliança entre Deus e o seu povo! Tanto que os rabinos diziam: “O mundo não é digno do dia em que Deus deu a Israel o Cântico dos Cânticos!”

O matrimônio no Novo

Testamento

Cristo Senhor veio

para estabelecer uma nova aliança, não somente entre

Deus e Israel, mas, agora, entre Deus e a humanidade

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toda, congregada num novo

povo, que é a Igreja. Nesta aliança, que é nova e

definitiva, o esposo é o Cristo e a esposa é a Igreja. Esta aliança é selada no Espírito

Santo, simbolizado pelo vinho novo! Assim, podemos compreender por que o

primeiro sinal de Jesus foi numa festa de núpcias em

Caná da Galiléia (cf. Jo

2,1-12): a passagem é toda simbólica: as núpcias de

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Caná são imagem das

núpcias do Cristo com sua Igreja, as núpcias do

Cordeiro, de que fala o

Apocalipse (cf. Ap 19,7). É por isso que João não diz o

nome do noivo nem o da

noiva em Caná... O noivo é o próprio Cristo, a noiva é a Igreja, simbolizada pela

Virgem Maria, a Filha de Sião; o vinho novo e bom é o Espírito que sela a nova e

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também que Jesus contou parábolas sobre o banquete de casamento (cf. Mt

22,1-14), falou das virgens

que esperam o noivo (cf. Mt 25,1-13), falou em sentar-se à mesa do banquete com

Abraão, Isaac e Jacó (cf. Mt 8,11s) e João Batista

afirmou claramente que Jesus é o Esposo que vem

desposar Israel (e o novo

Israel, que é a Igreja) – cf. Jo 3,29). Então, Cristo é o

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Esposo e a Igreja, a Esposa, numa aliança de amor eterno. Por isso mesmo o

matrimônio entre um cristão e uma cristã, entre dois

batizados, é um

sacramento, isto é, é um sinal real e eficaz da graça de

Cristo: o esposo cristão é, no seu amor, imagem viva do amor do Cristo-Esposo pela Igreja-Esposa e a esposa

cristã é, no seu amor, imagem do amor da

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Igreja-Esposa pelo seu Cristo Jesus. É o que São Paulo

afirma de modo belíssimo na Carta aos Efésios: “Mar

idos, amai as vossas

mulheres, como Cristo

amou a Igreja e se entregou por ela”... (5,21ss)

Então, pela

graça do sacramento, o

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recebem a força do

Espírito Santo, Espírito de amor, Espírito da Nova e eterna aliança, para se amarem como Cristo e a

Igreja se amam, sendo, em suas vidas, sinal (=

sacramento) do amor entre Cristo e a Igreja. O esposo

cristão terá como ideal de amor e atitude esponsal o

Cristo que amou sua Igreja até entregar-se por ela, tornando-se com ela um só

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corpo; a esposa terá como modelo a Igreja, toda

dedicada ao Esposo Jesus, sendo seu corpo e a ele permanecendo fiel mesmo nos momentos de

perseguição, quando derrama seu sangue no sangue de seus mártires. Cristo e a

Igreja, uma só carne... numa aliança de amor eterno, que é celebrada em cada

Eucaristia, quando o

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carne à Igreja-Esposa... do mesmo modo, marido e mulher, uma só carne, uma só vida, na vida, no dia a dia, no leito conjugal, na mesa da família... São Paulo,

admirado, exclama: “Mas é grande este mistério!” –

que o amor humano seja sinal sacramental do amor divino!

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exatamente porque a relação entre marido e mulher

cristãos é

sinal/sacramento do amor entre Cristo e a Igreja,

somente quem realmente tem uma vida cristã deveria

receber o sacramento do matrimônio. Como duas pessoas que não têm uma

vida de fé, uma prática cristã, poderia viver essa relação em suas vidas? Como um

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uma experiência cristã poderá vivenciar esta

realidade maravilhosa: nosso amor é sinal de um amor maior, nosso amor tem o selo da graça que nos garante

viver na alegria e na tristeza, na saúde e na

doença a entrega amorosa entre o Cristo e sua

Esposa, a Igreja? É claro que o mundo não compreenderá nunca esta realidade! O

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somente na fé pode ser acolhido, somente na oração pode ser vivido e

somente na graça pode ser mantido!

Do fato de ser

sacramento da relação entre Cristo e a Igreja, a união

matrimonial tem três

características fundamentais, presentes na relação

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Cristo-Igreja: a fidelidade, a indissolubilidade e a

fecundidade. Sem estas três características não há nem pode haver sacramento do

matrimônio. Assim,

aqueles que se casam “no

Senhor”, ou seja, aqueles que desejam receber o

sacramento do matrimônio, devem ter bem consciência

de que estão assumindo o sonho e o projeto de Cristo

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homem e a mulher. Um

casal cristão não pode pensar em viver seu matrimônio do

seu jeito, como se o casamento fosse algo

meramente privado; casar no Senhor quer dizer assumir o sonho do Senhor, assumir o quer a Igreja do Senhor crê e professa sobre o

matrimônio!

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