PROTOCOLO DE NÓDULO TIREOIDIANO (NO ADULTO)
METODOLOGIA DE BUSCA DA LITERATURA: Base de dados Medline/Pubmed utilizando-se a estratégia de busca com os termos “thyroid nodules” e restringindo-se para estudos em humanos adultos, publicados nos últimos 7 anos. Os artigos foram revisados e identificados como de interesse para a elaboração deste protocolo. Também foram consultados livros-texto de Endocrinologia.
INTRODUÇÃO1,3:
Definição: Aumento do volume tireoidiano, com crescimento excessivo e transformação estrutural e/ou funcional de uma ou mais áreas do parênquima tireoidiano. Achado bastante comum na prática clínica. A maioria é de natureza benigna. Podem ser: solitários ou múltiplos; císticos, sólidos ou mistos; funcionantes ou não. Prevalência na população adulta: 4 a 7% à palpação (6% das mulheres e 1% dos homens); 19 a 67% à ultrassonografia (US); 30 a 60% em necrópsias; cerca de 80% dos indivíduos têm ou terão pelo menos um nódulo até os 80 anos de idade. US de alta resolução tem aumentado ainda mais a prevalência, que é maior em populações com baixa ingestão de iodo, mulheres, idosos e indivíduos expostos à radiação sobre o pescoço.
As causas mais comuns são:
Benignos (95%): nódulos hiperplásicos, cistos, tireoidites (85%); adenomas (15%).
Malignos (5%): carcinomas: papilífero (81%), folicular / células de Hürthle (14%), medular (3%) e anaplásico (2%); outros...
CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE DOENÇAS E PROBLEMAS RELACIONADOS À SAÚDE:
Engloba as classificações de CID 10: E04.1 (bócio não tóxico uninodular); E 04.2 (bócio não tóxico multinodular).
RASTREAMENTO DE PACIENTES COM NÓDULO(S) TIREOIDIANO(S)4,5: DIAGNÓSTICO:
CLÍNICO: Aparecimento de nodulação cervical anterior (tireoidiana) e/ou
linfonodomegalia cervical, em geral, assintomáticas; achado incidental de nodulação (ões) em ultrassonografia cervical ou por outro método de imagem (em geral, nódulos < 1 cm, não palpáveis e chamados de incidentalomas).
No exame clínico: detectável se > que 1cm e anterior.
Ao exame de imagem – US cervical ou de tireoide: pode detectar nódulos < 1 cm. É fundamental afastar malignidade e avaliar a função nodular.
Investigação: Anamnese e exame físico, Testes de função tireoidiana, Exames de imagem e
Punção aspirativa com agulha fina (PAAF), se necessário.
História clínica e fatores de risco p/ malignidade (vide tabela 1): Sexo: masculino (risco 2x maior);
Idade: crianças e idosos (<20 e >70 anos);
História familiar (parente de primeiro grau) de câncer de tireoide, especialmente se ≥ 2 membros afetados, no caso de carcinoma diferenciado de tireoide;
Neoplasia endócrina múltipla tipo 2; síndrome de Cowden, síndrome de Pendren, síndrome de Werner, Complexo de Carney, polipose adenomatosa familiar; Radioterapia prévia de cabeça ou pescoço;
Diagnóstico prévio de câncer de tireoide tratado com tireoidectomia parcial; Sintomas locais: nódulos de crescimento rápido ou volumoso, sintomas compressivos, nódulo endurecido, aderido a planos profundos, pouco móvel; associado à paralisia ipsilateral de corda vocal; ou linfonodomegalia cervical; Nódulo incidentalmente detectado no FDG-PET (como captação focal) em pacientes oncológicos.
Exame físico e fatores de risco p/ malignidade:
Exame do nódulo: tamanho, consistência, mobilidade e sensibilidade. Avaliar sinais de hiper ou hipotireoidismo.
Características suspeitas p/ malignidade à palpação: nódulo duro e aderido e presença de linfonodomegalias cervicais.
LABORATORIAL / EXAMES COMPLEMENTARES: A) Laboratoriais:
a.1) - TSH e T4 livre: o achado de hipertireoidismo por nódulo hiperfuncionante fala contra o diagnóstico de malignidade.
a.2) - Anticorpo antiperoxidase (e anticorpo antitireoglobulina): ver possibilidade de nodulações da tireoidite autoimune ou associação com a mesma.
a.3) - Calcitonina: na suspeita de carcinoma medular de tireoide.
B) Exames de Imagem (vide figura 1):
b.1) - Ultrassonografia de tireoide (US): Melhor exame de imagem. Baixo custo; operador dependente.
Características sugestivas de malignidade: Hipoecogenicidade
Contornos mal definidos
Presença de microcalcificações Fluxo sanguíneo intranodular
Tabela 1– Característica do nódulo ou da história do paciente e risco de
malignidade6.
CARACTERÍSTICA DO NÓDULO OU HISTÓRIA DO PACIENTE
RISCO AUMENTADO DE MALIGNIDADE
Altura> largura > 10.0x
Halo ausente > 07.0x
Presença de microcalcificações ou margens irregulares
> 06.0x
Hipoecogenicidade ou sólido > 05.0x
Vascularização intranodular > 03.0x
História familiar de carcinoma tireoidiano > 02.0x
Nódulo ≥ 4cm > 01.6x
Nódulo único > 01.4x
História de irradiação de cabeça e pescoço > 01.3x
Fortes Fracos
Tipo de lesão
Puramente cístico Espongiforme Misto: sólido/cístico Sólido / hipoecoico Microcalcificações, margens irregulares Linfonodos cervicais alteradosFigura 1 - US de tireoide: Fatores Sugestivos de Malignidade.
b.2) - Cintilografia de tireoide com 131Iodo:
Indicação: Quando TSH baixo. Define nódulos hiperfuncionantes. Não realizamos no HU/UFSC, apenas com serviço terceirizado.
C) Punção aspirativa com agulha fina (PAAF): Melhor método para diferenciar
lesões benignas das malignas; realizar em todos os nódulos > 1 cm ou 1 cm c/ características suspeitas à US (tabela 2). Usada com ou sem guia ultrassonográfico. Para o diagnóstico utilizamos o sistema Bethesda7 para classificação citopatológica de nódulos de tireoide: BI (Bethesda categoria I): material insatisfatório; BII (Bethesda categoria II): nódulo benigno: bócio coloide, nódulo hiperplásico, tireoidite linfocítica; BIII (Bethesda categoria III): atipia (ou lesão folicular) de significado indeterminado; BV (Bethesda categoria V): suspeito para malignidade; BVI (Bethesda categoria VI): maligno (tabela 3).
No HU/UFSC a PAAF é realizada por endocrinologista sob palpação do nódulo na sala de PAAF na área P (Serviço de Patologia) e sob guia ultrassonográfico no Serviço de Radiologia, com equipe da radiologia e patologia.
D) Estudos moleculares/genéticos: Podem auxiliar em casos de citopatologias indeterminadas, como Bethesda III e IV. Limitação: Exame caro e não dispomos no HU/UFSC. Disponível no Laboratório Fleury em São Paulo.
Tabela 2- Indicações de PAAF em pacientes com nódulo tireoidiano (exceto
hipercaptante ou puramente cístico)5.
TAMANHO DO NÓDULO INDICAÇÃO DE PAAF
< 5 mm Não indicada
≥ 5 mm Pacientes com alto risco clínico de
malignidade ou nódulo suspeito na US*
≥ 10 mm Nódulo hipoecoico
≥ 15 mm Nódulo sólido iso ou hiperecoico**
≥20 mm Nódulo complexo ou espongiforme**
Nódulo com aparente invasão extratireoidiana
Todos
Linfonodo suspeito na US PAAF do linfonodo
* Para nódulo < 10 mm, sem invasão aparente ou linfonodos suspeitos, o
acompanhamento com US é realizado, adiando-se a PAAF quando este limite for ultrapassado ou alteração na US com aspecto suspeito.
** Mesmo sem achados suspeitos na US.
Categoria Diagnóstica: Sistema Bethesda
Risco de Malignidade Recomendações
Insatisfatório (BI) 1-4% Repetir PAAF c/ US
Benigno (BII) 0-3% Seguimento
Atipia (ou Lesão Folicular) de Significado Indeterminado (BIII)
5-15% Repetir PAAF em 3m: se PAAF persistir como atipia:
considerar cirurgia Neoplasia Folicular (ou de Células de Hürthle) (BIV) 15-30% Lobectomia/(tireoidectomia total)
Suspeito p/ Malignidade (BV) 60-75% Tireoidectomia total /
lobectomia
Maligno (BVI) 97-99% Tireoidectomia total
Indeter-minados Tabela 3-Resultados da PAAF7.
Figura 2- Fluxograma de avaliação de nódulo tireoidiano (exceto gestantes)5.
a- Extensão da cirurgia: A tireoidectomia total é o procedimento de escolha quando a doença nodular é bilateral; está associada à radiação; a citologia é maligna; ou suspeita para malignidade; ou indeterminada e o nódulo > 4 cm ou ≤ 4 cm com alta suspeita clínica ou ultrassonográfica de câncer. Lobectomia é considerada suficiente na doença nodular unilateral e esporádica se nódulo ≤ 4 cm com citologia indeterminada e baixa suspeita clínica e ultrassonográfica de malignidade ou citologia insatisfatória. Se marcadores moleculares ou FDG-PET forem realizados, a extensão da cirurgia pode ser modificada em função dos resultados desses exames. Na suspeita de acometimento de linfonodos do compartimento central, indica-se o esvaziamento terapêutico desse compartimento. Se metástases forem confirmadas no pré- ou peroperatório, amplia-se a dissecção aos linfonodos dos compartimentos ipsilaterais. Na suspeita de acometimento de linfonodos dos compartimentos laterais, está indicado o esvaziamento terapêutico desses compartimentos. Se as metástases forem confirmadas no pré- ou peroperatório, a dissecção deve incluir os linfonodos do compartimento central. Nos pacientes sem suspeita de metástases na US pré- e avaliação peroperatória pelo cirurgião, a dissecção eletiva de linfonodos do compartimento central pode ser considerada em pacientes com tumores > 4 cm ou invasão extratireoidiana aparente. TSH Normal ou alto PAAF indicada Suspeito p/ maligno ou maligno (BV/VI) Cirurgiaa Neoplasia folicularb (BIV) Cintilografia131I Hipocaptante: cirurgiaa Hipercaptanted Lesão folicular/atipia de significado incertob (BIII) ou amostra inadequada (BI) Nova PAAF em 3-6meses Mesmo resultado Nódulo ≤ 2 cm e baixa suspeita clínica e US SeguimentoUSc Nódulo > 2 cm ou alta suspeita clínica ou US Cirurgiaa Benigno (BII) Tratamento/ seguimento USc PAAF não indicada Considerar seguimento US Baixo Cintilografia 131I Hipocaptante: PAAF Hipercaptanted
b- Marcadores moleculares são úteis, se disponíveis (Não disponíveis no HU/UFSC).
c- Se a PAAF não foi realizada na avaliação inicial, será solicitada se, durante o seguimento, o nódulo passar a atender os critérios da tabela 3. Em nódulo com citologia benigna, a PAAF será repetida se houver um crescimento significativo (> 50% em relação ao volume inicial). Cirurgia será considerada em nódulos com progressão durante o acompanhamento, cuja citologia inicial foi indeterminada ou insatisfatória.
d- A conduta seguirá o protocolo de nódulo autônomo – vide protocolo de hipertireoidismo/tireotoxicose e figura 3.
DINÂMICA DE ATENDIMENTO:
Nome: _________________________________________________________ Registro: ____________________ DN: ____/____/____ Raça: _______ Abordagem clínica: Anamnese / exame físico geral: (Avaliar dados sugestivos de
malignidade nodular). Vide acima em diagnóstico clínico e figura 2.
Abordagem laboratorial e exames complementares: Vide acima e figura 2.
DINÂMICA DE TRATAMENTO4,5,8-10 (Figuras 2 e 3):
Terapia supressiva não é indicada para nódulos benignos.
Não oferecemos a escleroterapia com álcool como procedimento alternativo à cirurgia em nódulos císticos ou predominantemente císticos (benignos) no HU/UFSC.
No SUS, não contamos com o TSH recombinante (Thyrogen) para otimizar a terapia de bócio multinodular atóxico com 131I.
Os casos benignos são acompanhados com US c/ ou s/ Doppler a cada 6-24 meses, dependendo do número de avaliações já realizadas e a mudança no volume do nódulo.
Considera-se cirúrgico os casos de nódulos benignos grandes com sintomas compressivos.
Nódulos com Bethesda III e I serão repuncionados (em 3 a 6 meses). Consideram-se cirúrgicos os casos com Bethesda IV (principalmente se nódulos grandes e hipocaptantes à cintilografia de tireoide com 131I); nódulos cuja repunção manteve-se Bethesda I ou III e são > 2 cm, ou há suspeita clínica ou US; todos os casos com Bethesda V e VI.
Nódulos quentes serão abordados conforme o protocolo de Hipertireoidismo/tireotoxicose (em resumo abaixo na figura 3).
Figura 3- Fluxograma para manuseio do bócio nodular tóxico10 ( = alto; = baixo; Nls = normais; PEI = injeção percutânea de etanol; 131I = radioiodo; PLA = ablação térmica percutânea com laser).
Condições especiais:
Gestantes: Gestantes com nódulo volumoso, com invasão aparente ou linfonodos
suspeitos à US são prontamente avaliadas com PAAF. Nas gestantes, quando o TSH estiver espontaneamente suprimido, acompanha-se com US. Se o TSH for normal ou elevado, a PAAF é indicada conforme a tabela 2, mas também poderão ser somente acompanhadas com US. Se a PAAF não foi realizada na avaliação inicial, será solicitada no caso da ocorrência de crescimento significativo do nódulo durante a gestação. Em caso de citopatologia indeterminada, a cirurgia será considerada no segundo trimestre, caso haja crescimento significativo do nódulo. Também podemos realizar cirurgia no segundo trimestre se a citopatologia for suspeita ou maligna, caso haja crescimento significativo do tumor ou se a doença for avançada. Pacientes com citopatologia positiva para malignidade serão mantidas com TSH diminuído (< 0,5 mUI/L) enquanto aguardam a cirurgia.
CONDIÇÕES CLÍNICAS QUE INDICAM A NECESSIDADE DE
ENCAMINHAMENTO PARA ENDOCRINOLOGIA: TSH diminuído (suspeita de nódulo quente); Nódulos com indicação de PAAF (tabela 2);
Nódulo Autônomo
TSH T4L e T3 Nls Adenoma pré-tóxico Idosos e/ou cardiopatas (nódulos > 3 cm) 131 I , PEI ou PLA Demais casos Avaliação anual TSH T4L e T3 Adenoma tóxico Idosos Cardiopatas Nódulo > 3-5 cm Radioiodo Jovens Nódulo > 3-5 cm Cirurgia ou 131 I Contraindicação ou recusa p/ cirurgia e 131I PEI ou PLA TSH, T4L e T3 Nls Avaliação anual (nódulos > 3 cm) Dosar TSH, T4 livre (T4L) e T3 Pacientes com sintomas compressivos e/ou sinais e sintomas sugestivos de malignidade atribuíveis ao nódulo;
Nódulos com PAAF prévia benigna que vem crescendo (> 50%); ou quando apareçam alterações US sugestivas de malignidade;
Indicação de tratamento cirúrgico ou iodo radioativo (bócio grande, bócio que está crescendo).
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10. Vaisman M, Vaisman F, Teixeira PFS. Manuseio do Bócio Uni e Multinodular Tóxico. In: Vilar L. Endocrinologia Clínica. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013. cap. 30, p. 339-46.