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EducaçãodeJovenseAdultos Possibilidades,realidadeepráticadocente

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

ESPECIALIZAÇÃO EM INTEGRAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL À EDUCAÇÃO BÁSICA NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS

Educação de Jovens e Adultos:

Possibilidades, realidade e prática docente

Rose Boeira Ramos Francisco

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Sandra dos Santos Andrade

Porto Alegre 2009

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FICHA CATALOGRÁFICA

___________________________________________________________________________

F819e Francisco, Rose Boeira Ramos

Educação de Jovens e Adultos: possibilidades, realidade e prática docente / Rose Boeira Ramos Francisco ; orientadora Sandra dos Santos Andrade. – Porto Alegre, 2009.

59 f.

Trabalho de conclusão (Especialização) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Curso de Especialização em Educação Profissional integrada à Educação Básica na Modalidade Educação de Jovens e Adultos, 2009, Porto Alegre, BR-RS.

1. Educação. 2. Educação de Jovens e Adultos. 3. EJA. 4. Parâmetros Curriculares Nacionais – EJA – Prática docente. I. Andrade, Sandra dos Santos. II. Título

CDU 374.7 _____________________________________________________________________________ CIP-Brasil. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço pelo acolhimento de Sandra Andrade quando a convidei para ser minha orientadora, pois ela já contava com quatro orientandos e encontrava-se no início de sua gestação, o que implicava mais trabalho durante sua licença-maternidade; ainda assim, ela aceitou meu convite, e isso me deixou muito feliz. A escolha do orientador para o trabalho de conclusão sempre me preocupou. À medida que ia conhecendo os professores ao longo do curso, sempre avaliava o perfil do professor e relacionava a disciplina com a temática que pretendia abordar no trabalho de conclusão. Identifiquei-me com alguns professores, mas não encontrava um elo entre a disciplina e minha temática. Já andava bastante apreensiva com a escolha de um orientador, não sabia quem deveria convidar, até assistir à primeira aula da professora Sandra Andrade – foi no decorrer dessa aula que descobri que havia encontrado minha orientadora. Agora era torcer para que me aceitasse. Mesmo já bastante atribulada, ela me aceitou como sua quinta orientanda.

Os meses que se seguiram confirmaram que minha escolha foi muito feliz. A professora Sandra me orientou sobre todos os elementos textuais que um trabalho de conclusão deveria conter, explicou o funcionamento de cada parte do trabalho, orientou minha pesquisa e forneceu sugestões que me foram muito úteis, assim como todas as informações e esclarecimentos que solicitei ao longo de minha escrita – informações e referências que, infelizmente, não recebi no processo de orientação de minha graduação e que muito me fizeram falta na época.

Sandra, muito obrigada pela paciência e pelas palavras de apoio durante o problema pessoal que enfrentei. Obrigada pela gentileza de me receber em sua casa para os encontros de orientação. Por tudo isso, sou muito grata!

Agradeço também:

Ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação por ser uma das selecionadas a participar do Curso de Especialização em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

Aos professores e direções das escolas Instituto Estadual Madre Benícia e Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso por acolherem minha pesquisa.

Aos colegas da turma B pela convivência, discussões e infinitos questionamentos que caracterizaram o perfil da turma ao longo do curso. Também pela descontração e pela boa conversa durante nossos almoços, eventos dos quais participamos e festas de confraternização.

Em especial, aos colegas e amigos queridos, Ricardo e Marisa, pelo companheirismo e carinho em todas as horas.

Ao meu esposo, Ricardo, pela infinita paciência e compreensão de minhas ausências no decorrer do curso e, sobretudo, pelo seu cuidado e amor incondicional, dispensados a mim em todos os momentos.

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A educação necessita tanto de formação técnica e científica como de sonhos e utopias. (Paulo Freire)

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RESUMO

FRANCISCO, Rose Boeira Ramos. Educação de Jovens e Adultos: possibilidades, realidade e prática docente. Porto Alegre, 2009. 59f. Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.

Este trabalho aborda o descompasso existente entre as possibilidades oferecidas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para e Educação de Jovens e Adultos (EJA) e a realidade da prática docente nos bancos escolares da EJA na rede estadual do Rio Grande do Sul. O foco da pesquisa é o professor da EJA, e o principal objetivo foi investigar se os professores da EJA usufruem das possibilidades oferecidas nos PCNs, a fim de pôr em prática a tão sonhada educação emancipatória. Uma de minhas hipóteses, posteriormente comprovada através da pesquisa, foi a de que há desinformação dos professores da EJA. O material empírico é constituído de entrevistas semi-estruturadas, com o objetivo de conhecer a realidade do educador da EJA em relação às suas práticas pedagógicas, identificar seus conhecimentos sobre os PCNs para essa modalidade de ensino e, em alguma medida, refletir sobre o preparo que esse profissional recebeu para realizar seu trabalho com a EJA. Foram entrevistados cinco professores de diferentes áreas da EJA em duas escolas estaduais: o Instituto Estadual Madre Benícia e a Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso. A pedagogia freiriana auxiliou-me na reflexão sobre as propostas de acesso à educação básica destinada a jovens e adultos e os processos de escolarização praticados nas escolas. As análises evidenciaram a necessidade de uma articulação mais eficaz entre o Ministério da Educação e secretarias estaduais e municipais no que diz respeito às políticas públicas e diretrizes relacionadas à EJA, a fim de que as informações cheguem até as escolas e aos professores. Também há necessidade de um processo de formação continuada para os professores, primando pela articulação teoria/prática, que inclua a superação da desarticulação entre as propostas pedagógicas de formação e os objetivos específicos da EJA, assim como a integração entre universidades e escolas, com o propósito de prepararem os futuros professores e aprimorarem suas práticas pedagógicas de acordo com as necessidades da EJA. É fundamental que se tenha um cuidado especial tanto com os educadores quanto com os educandos da EJA para que esta cumpra não só seu papel de política pública compensatória, mas também o de estender a cidadania a todos que ainda não usufruíram de seus direitos básicos. Com essa perspectiva, entendo que o PROEJA (Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos) traz uma nova possibilidade para a educação brasileira, não só no sentido de elevar a escolaridade e também as condições de vida do povo brasileiro através da educação profissional, mas também pela formação de educadores. Assim, a primeira etapa da especialização em PROEJA foi a formação de professores para que essa política pública seja capaz de ampliar a inclusão social de milhões de brasileiros que não tiveram acesso à educação básica e que atualmente sobrevivem na economia informal, nos chamados subempregos.

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ABSTRACT

FRANCISCO, Rose Boeira Ramos. Educação de Jovens e Adultos: possibilidades, realidade e prática docente. Porto Alegre, 2009. 59f. Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.

This work approaches the incongruence existing between the possibilities offered by Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) for Educação de Jovens e Adultos (EJA) and the reality of the teaching practice in EJA state schools in Rio Grande do Sul. The focus of this research is the EJA teacher, and its main objective is investigating whether EJA teachers enjoy the possibilities offered in PCNs to put into practice the so much desirable emancipating education. One of my hypotheses, which was later confirmed through the research, was that EJA teachers have been misinformed. The empirical material has comprehended semi-structured interviews aiming at knowing the reality of EJA educators as to their pedagogical practices, identifying their knowledge of PCNs in this teaching modality, and, to a certain extent, reflecting upon the preparation those professionals were provided to do their job in EJA. Five teachers from different areas of EJA were interviewed in two state schools: Instituto Estadual Madre Benícia and Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso. Freirean pedagogy has helped me to reflect both upon the proposals of access to basic education assigned to youths and adults and upon the schooling processes carried out in the schools. The analyses have evidenced the need for a more effective articulation between Ministry of Education and state and city departments regarding EJA public policies and guidelines in order to make information get to schools and teachers. There is also a need for teachers having access to a continued education process, considering the theory/practice articulation, and including the overcoming of the disarticulation between pedagogical proposals of education and the specific objectives of EJA, as well as the integration between universities and schools, aiming at preparing teachers-to-be and improving their pedagogical practices according to EJA needs. It is fundamental to give special attention both to EJA educators and their students so that EJA can play its role as a compensatory public policy, but also as a vehicle to extend citizenship to all those who have not enjoyed their basic rights yet. In this perspective, I think that PROEJA has brought a new possibility for Brazilian education, not only to raise schooling levels, but also to form educators. The first stage in the specialization in PROEJA was the education of teachers so that this public policy is able to broaden the social inclusion of millions of Brazilians that have not had access to basic education and that currently survive through informal economy, in the so-called under-employment conditions.

Keywords: Parâmetros Curriculares Nacionais, EJA and teaching practice.

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SUMÁRIO 1. APRESENTANDO ... 7 1.1. O QUE É O QUE É? ...7 2. COMPORTAMENTO GERAL ...10 3. REDESCOBRIR ...16 4. E VAMOS À LUTA ... 24 5. DESENREDO ...29

5.1. PROEJA: MAIS UM AVANÇO EM BUSCA DA CIDADANIA E DA AUTONOMIA DO POVO BRASILEIRO...45

6. COLHEITA ...49

REFERÊNCIAS ...53

APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ...56

ANEXO A- UMA DAS ENTREVISTAS, COMO MODELO DA PESQUISA REALIZADA. ...57

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1. APRESENTANDO...

1.1. O QUE É O QUE É?

A escolha dos títulos dos capítulos deste trabalho de conclusão de curso é resultado da reflexão sobre o tema do trabalho, associada à sugestão da professora orientadora: “você pode usar títulos criativos”. Na busca de um referencial, optei por usar títulos de músicas do compositor Gonzaguinha. Eu o escolhi devido ao perfil de seu trabalho, que em grande parte abordou temas políticos e sociais num período muito conturbado de nossa história – período no qual a educação e o professor no Brasil não usufruíam de autonomia e liberdade no seu trabalho com os educandos. Muitos professores, assim como sociólogos, políticos, artistas, entre outros, tiveram de abandonar o Brasil durante um longo período. Entre eles, destaco Paulo Freire e Darcy Ribeiro, que foram muito importantes em minha formação acadêmica. Para apresentar o tema de pesquisa, que é o momento em que o leitor irá descobrir sobre o que trata o trabalho, escolhi como título a música “O que é o que é?”.

A reflexão sobre o tema foi um longo caminho, pois a ideia inicial era relacionar a disciplina que leciono – história – com a Educação de Jovens e Adultos (EJA), abordando o currículo dessa modalidade de ensino. Porém, as leituras realizadas levaram-me a outro caminho, cujos objetivos antecedem as análises e construções de currículos específicos para EJA. Ao verificar os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs1) para a EJA, constatei que eles abrem um leque de possibilidades aos professores, dentre as quais, destaco a autonomia para elaboração de currículos, metodologias de ensino e avaliações. Entretanto, essa não é a realidade presente ou atuante na rotina dos professores da escola pública, ao menos no Rio Grande do Sul. Mas o que ocorre ou o que falta ser feito para que essas

1 PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais, “[...] são orientações gerais para cada área do conhecimento,

elaboradas pelo Ministério da Educação, para que sirvam de apoio às discussões e ao desenvolvimento do projeto educativo de cada escola, à reflexão sobre a prática pedagógica, ao planejamento de suas aulas, à análise e seleção de materiais didáticos e de recursos tecnológicos e, em especial, que possam contribuir para a formação e atualização profissional do professor” (MEC, SOUZA, 1998, p. 5).

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informações saiam do papel e cheguem às salas de aula? Responder essa indagação é um dos principais objetivos do presente trabalho.

Essas constatações colaboraram para a construção do tema central da pesquisa, que por sua vez necessitou de um instrumento de pesquisa adequado para que o tema fosse contemplado. Assim, destaco que a questão central de minha investigação é:

• Os professores da EJA usufruem das possibilidades oferecidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a fim de pôr em prática a tão sonhada educação emancipatória?

Tendo como desdobramentos:

• Em que instância as informações se perdem ou não chegam às escolas e professores da EJA?

• Qual é a realidade da prática docente nos bancos escolares da EJA? • Como o professor da EJA organiza e realiza seu trabalho?

Formuladas as questões de pesquisa, parti para a escolha de uma metodologia de investigação que fosse capaz de respondê-las. Optei pela pesquisa qualitativa, realizando entrevistas semi-estruturadas e em profundidade cujo foco foi o professor da EJA. Para a realização das entrevistas, foi elaborado um instrumento contendo 21 questões e alguns desdobramentos. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para serem analisadas. Foram feitas cinco entrevistas em duas escolas estaduais. Quatro entrevistas foram realizadas na escola onde atuei como professora da modalidade de ensino de jovens e adultos, localizada na zona rural do município de Novo Hamburgo (RS), Instituto Estadual Madre Benícia. A quinta entrevista foi realizada na Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso, no município de Alvorada.

Através da pesquisa, busco conhecer a realidade do educador da EJA em relação às suas práticas pedagógicas e identificar seus conhecimentos sobre essa modalidade de ensino. Procuro descrever que tipo de preparo esse profissional recebeu para atuar na EJA, ou ainda, se for o caso, determinar por que o professor da EJA não recebeu as informações necessárias para a realização de seu trabalho e o que pode e deve ser feito para mudar essa realidade.

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O foco da pesquisa é o professor da Educação de Jovens e Adultos porque, sem ele, não será possível estender na prática o que a lei já garante a milhões de brasileiros que não tiveram acesso – e boa parte ainda não tem – à educação básica. Conforme o artigo 205 da Constituição Federal de 1988: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 2002, p. 155).

Sem educação de qualidade, não se constrói cidadania, tampouco autonomia. Educação de qualidade não se faz sem bons educadores, que são aqueles que realmente querem fazer a diferença perante seus educandos. E educadores precisam, como disse Paulo Freire, “[...] ser tratados com dignidade e decência pela administração privada ou pública da educação” (FREIRE, 2000, p.107) .

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2. COMPORTAMENTO GERAL

Entendo “Educação” como um direito social, garantido pela Constituição de 1988, reafirmado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/1996) e fundamental para a construção da cidadania. Sob esse ponto de vista, vejo a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como uma política compensatória a um direito que foi e continua sendo tolhido de uma grande parte dos brasileiros. As raízes deste problema estão arraigadas desde a colonização do nosso país, através do modelo escravocrata adotado pelos colonizadores europeus e posteriormente pelas classes dominantes da nação independente em que o Brasil se constituiu.

De acordo com Carvalho (2001), a cidadania desdobra-se em três direitos: civis, políticos e sociais. Logo, um cidadão pleno é aquele que usufrui dos direitos civis, ou seja, dos direitos fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei; dos direitos políticos, como a liberdade de opinião e organização e, fundamentalmente, ao voto; e dos direitos sociais, que incluem o direito à educação, à saúde, ao trabalho e a um salário justo, à aposentadoria, entre outros.

Para entender a EJA como um avanço, embora ainda funcione como medida compensatória na educação brasileira, faço um breve retrospecto dos avanços e retrocessos mais significativos na construção da educação como base para aquisição da cidadania ao longo da história do Brasil. Para esse retrospecto, revisitei alguns autores, como Carvalho (2001), Fausto (2002) e Kucinski (2001), além de consultar a atual Constituição da República Federativa do Brasil (2002).

Do período colonial até as vésperas da República, a única alteração importante no processo de cidadania foi a abolição da escravidão, em 1888. A Lei Áurea incorporou os ex-escravos aos direitos civis, sem os benefícios dos direitos políticos e sociais. Assim, foi mais formal do que real, pois aos libertos não foram dadas escolas, terras ou emprego. Muitos dos ex-escravos retornaram ao trabalho nas fazendas por um baixo salário ou dirigiram-se às cidades, onde não tinham emprego fixo.

As conseqüências disso foram duradouras para a população negra. Até hoje essa população ocupa posição inferior em todos os indicadores de qualidade de vida.

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É a parcela menos educada da população, com empregos menos qualificados, os menores salários, os piores índices de ascensão social. Nem mesmo o objetivo dos defensores da razão nacional de formar uma população homogênea, sem grandes diferenças sociais foi atingido. A população negra teve que enfrentar sozinha o desafio da ascensão social e freqüentemente precisou fazê-lo por rotas originais, como o esporte, a música e a dança (CARVALHO, 2001, p.52-53).

Contudo, a carência na escolarização do povo brasileiro não se restringia apenas aos ex-escravos. Segundo Fausto (2002), os primeiros dados gerais sobre instrução no Brasil datam de 1872, e mais de 80% da população livre, incluindo as mulheres, era composta de analfabetos. Entre os escravos, esse índice atingia 99,9%, sendo que apenas 17% da população entre 6 e 15 anos frequentava escolas. Entre as mulheres, o índice de analfabetismo era de 90%, e sua escolarização visava basicamente à puericultura, como preparação para o casamento.

No período da República Velha, os direitos civis e políticos eram muito precários, e os sociais, quase inexistentes. A assistência social era feita através de associações particulares, como irmandades religiosas – muitas delas eram heranças do período colonial –, voltadas para o atendimento aos pobres. Apesar da gradual articulação do movimento operário, o governo não cogitava a criação de leis trabalhistas para a proteção do trabalhador. No campo, a assistência social que existia era exercida pelos coronéis e resumia-se a algumas medidas relacionadas à saúde, como compra de remédios, ser levado a um hospital e ser enterrado. Na educação, a Constituição republicana de 1891 retirou do Estado a obrigação de fornecer educação primária. Foi um retrocesso em relação à Constituição de 1824, que havia assegurado a instrução primária e gratuita a todos os cidadãos.

Na década de 1920, ocorreram tentativas de reforma na área da educação, com grande influência norte-americana, através do filósofo John Dewey. No Brasil, foram Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho e Almeida Júnior, entre outros, que lideraram o movimento e tentaram implantar os ideais da Escola Nova, cuja proposta era educação para todos e de forma igualitária, para só assim criar uma igualdade de oportunidades. Esse grupo passou a defender uma escola pública, universal e gratuita. Porém, apesar do ideário escolanovista, as propostas do grupo “[...] tinham um lado de pura adaptação do ensino ao mundo industrial, que se tornava cada vez mais dominador. O ensino deveria ser mais técnico e menos acadêmico” (CARVALHO, 2001, p.92). Em

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síntese, o grupo combinava o lado democrático, em que colocava a educação como um direito de todos e como parte essencial de uma sociedade industrial e igualitária, com as necessidades do país. Entretanto, o Brasil se constituía num país de analfabetos, e suas pretensões de reformas para formação dos cidadãos não atingiram êxito.

Após a Revolução de 1930, com a Constituição de 1934, houve um avanço nos direitos sociais, com a legislação trabalhista e previdenciária. Em termos gerais, pode-se dizer que a “Era Vargas” promoveu avanços sociais de grande importância nas áreas do trabalho e previdência social. Na área da educação, também houve avanços significativos, incorporando muito do que havia sido debatido em anos anteriores. No entanto, em 1937, instaurou-se o Estado Novo, concedendo ao país uma Constituição autoritária, registrando-se em decorrência um grande anacronismo.

Com o retorno da democracia após a queda do Estado Novo, muitos dos ideais foram retomados e depositados no Projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, enviados ao Congresso Nacional em 1948. Após difícil trajetória, foi finalmente aprovado em 1961, Lei nº 4.024.

Durante o período democrático, compreendido entre 1945 e 1964, ano em que se inaugurou um novo período autoritário, o sistema educacional brasileiro passou por importantes mudanças, como o surgimento, em 1951, da atual Fundação CAPES, que é a Coordenação do Aperfeiçoamento do Pessoal do Ensino Superior; a instalação do Conselho Federal de Educação, em 1961; campanhas e movimentos de alfabetização de adultos, além da expansão do ensino primário e superior. Na fase que precedeu a aprovação da LDB/61, ocorreu um movimento em defesa da escola pública, universal e gratuita. Contudo, o movimento de 1964 interrompeu essa tendência, cerceando drasticamente a liberdade e autonomia dos educadores brasileiros, assim como a de tantos outros profissionais. A muitos deles, restaram o silêncio e a discrição, ou o exílio, quando não optavam, através de suas ações, pela clandestinidade.

Em 1969 e 1971, foram aprovadas respectivamente as Leis 5.540/68 e 5.692/71, introduzindo mudanças significativas na estrutura do ensino superior e do ensino de 1º e 2º graus. Enquanto isso, educadores como Darcy Ribeiro e Paulo Freire permaneciam longe da pátria, exilados não só do país, mas do direito de participar e ajudar a construir

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mudanças na educação brasileira. Estes só retornariam ao país após a decretação do projeto de anistia, em 28 de agosto de 1979 (KUCINSKI, 2001).

A Constituição de 1988, promulgada após amplo movimento pela redemocratização do país, procurou introduzir inovações e compromissos, com destaque para a universalização do ensino fundamental e erradicação do analfabetismo. Na década seguinte, um novo horizonte na educação brasileira começa a se formar, primeiro com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal 8.069/1990, seguido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº9394 de 20/12/1996, e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de 1998. Assim, as primeiras mudanças na educação ocorrem exatamente no período de uma década após a promulgação da Constituição. E é neste contexto que a Educação de Jovens e Adultos, a EJA, passa a se delinear.

Como se pode perceber por esta breve retomada histórica, a consolidação da educação como direito de todos não se deu de forma tranqüila, nem de uma vez para sempre. Foram necessárias lutas e embates de cunho pedagógico, sociológico, político e econômico, atendendo a interesses de distintas ordens, o que implicou o que venho chamando de avanços e retrocessos na educação.

Entre os conceitos e “possibilidades” presentes na LDB, destaco aqui alguns que considero pertinentes para o entendimento da Educação de Jovens e Adultos. Primeiramente, a EJA faz parte das modalidades de educação e ensino, logo, é uma modalidade de educação básica e, ao mesmo tempo, modalidade de ensino. Como tal, deve ser oferecida nos níveis de ensino fundamental e médio. Se regular, deve observar as mesmas normas do ensino fundamental e médio, respeitando as necessidades e interesses desses alunos específicos, por meio de metodologias e conteúdos adequados.

Para atender aos principais objetivos dessa modalidade de ensino, como o respeito às necessidades e interesses dos educandos, com metodologia e conteúdos adequados a eles,é fundamental a ferramenta humana, ou seja, o professor, pois será ele que fará toda a diferença no processo ensino-aprendizagem. Entretanto, esse profissional da educação deve estar preparado para atuar na EJA. É necessário que ele entenda o que é a EJA e tenha o conhecimento de seus objetivos, assim como das possibilidades de trabalho com esses alunos. Do contrário, a engrenagem até pode vir a se movimentar, mas nunca funcionará com precisão. Para detectar esse mau funcionamento, basta consultar as listas de frequência

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dos alunos de EJA em qualquer escola estadual do Rio Grande do Sul. As turmas iniciam as aulas com um número bem grande de alunos, mas, ao final do período letivo, a frequência cai para até menos de 50% dos alunos. Isso causa um problema organizacional grave, pois inicialmente muitos alunos ficam fora da escola por falta de vagas, e, no fim do semestre, as turmas estão esvaziadas, denotando outro problema da EJA no RS: a dificuldade de fazer com que os estudantes que entram na EJA permaneçam nela.

As razões do abandono dessa nova oportunidade com frequência estão relacionadas às dificuldades desses jovens e adultos em conciliar a dupla jornada de atividades – trabalho e escola –, às vezes tripla, como é o caso de muitas mulheres, que, além do trabalho e da escola, ainda têm os afazeres domésticos de sua casa e filhos para tomar conta, entre outras implicações. Quanto a essas questões, pouco ou quase nada o professor pode fazer. Entretanto, o trabalho desenvolvido na EJA pelos educadores pode pesar em favor do não-abandono dos estudos. A questão pedagógica, considerando-se a defasagem entre o que os alunos querem e precisam da escola e aquilo que dela recebem, também contribui, de forma intensa, para o abandono da escola.Para que a balança pese em favor da educação, é fundamental que os educadores pensem na sua turma de EJA e desenvolvam um trabalho que atenda às necessidades desses alunos, e não simplesmente reproduza nos bancos da EJA a mesma proposta de aula e metodologia preparada para os bancos regulares, pois muitos dos nossos educandos já fugiram desse modelo.

A intenção deste trabalho não é salientar o que os profissionais que atuam na Educação de Jovens e Adultos fazem de correto ou não, nem o que deixam de fazer. O propósito é, isso sim, entender por que não são devidamente preparados para atuar na EJA. Quero verificar “se os professores da EJA, mesmo não recebendo as informações necessárias, usufruem das possibilidades oferecidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a fim de pôr em prática a tão sonhada educação emancipatória”. A partir dessa questão, também busco entender o motivo pelo qual as informações sobre essa modalidade de ensino não chegam até as escolas e professores da EJA ou não são devidamente esclarecidas.

Entendo que, primeiramente, para responder a questão central, faz-se necessário pesquisar e relatar, para então analisar, informações básicas sobre o funcionamento da sala de aula dessa modalidade de ensino, através da seguinte pergunta: qual é a realidade da

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prática docente nos bancos escolares da EJA, ou como o professor da EJA organiza e realiza seu trabalho? Para responder essas questões, utilizei como metodologia de trabalho a pesquisa qualitativa, através de entrevistas com professores atuantes ou que já atuaram na Educação de Jovens e Adultos. Para as entrevistas, que foram gravadas e posteriormente transcritas para a análise, elaborei um instrumento contendo 21 questões, juntamente com uma das entrevistas, que segue como exemplo (Anexo A), referentes ao cotidiano do trabalho com a EJA.

Como professora que também já trabalhou com a EJA, conheço as dificuldades não só dos alunos, mas também dos professores, devidas à falta de informações ou de conhecimento de a quem recorrer para melhor desenvolver seu trabalho. Almejo, dentre outros objetivos, evidenciar aos profissionais da área da educação a falta de cuidado com que é tratada atualmente essa modalidade de ensino (tanto por professores e alunos, quanto pelo Estado, na figura da SEC), cujo grande objetivo é dar a muitos brasileiros a possibilidade de conquistar sua dignidade e cidadania.

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3. REDESCOBRIR

A partir da questão central da pesquisa realizada e seus desdobramentos, saliento a distância existente entre o direito formal ao ensino fundamental, garantido a toda a população maior de 15 anos, e a realidade presente nos bancos escolares, distância essa que passa pelas práticas docentes. Isso porque existe resistência, por parte de uma parcela significativa dos professores da EJA e até mesmo das escolas, que já têm sua estrutura pedagógica solidificada nas bases do ensino regular, em criar e aplicar um currículo mais compatível com a proposta dessa modalidade de ensino: “a crescente institucionalização da EJA nas redes municipais é acompanhada por uma forte tensão entre uma concepção mais flexível de currículo, que se aproxima da tradição da educação popular, e a tradição escolar dos sistemas regulares de ensino” (HADDAD, 2007, p.197-198).

Outro ponto de igual importância, que considero como uma das causas da resistência e/ou da dificuldade na elaboração de currículos específicos para a EJA, é o despreparo de muitos docentes em trabalhar com essa modalidade de ensino. Tal fato é confirmado através da presente pesquisa, porém já diagnosticado anteriormente por vários autores, dentre eles, Haddad (2007), em sua pesquisa “A ação de governos locais na educação de jovens e adultos”. De acordo com Haddad, a participação das instituições de ensino superior na elaboração de projetos e estudos, tanto em pesquisas quanto em extensão de ensino, ainda é muito pequena. Em outras palavras, as instituições que têm o compromisso de preparar e formar os docentes, na sua maioria, não têm preparado esses futuros profissionais para atuarem com a modalidade de ensino EJA.

Num país onde milhões de brasileiros maiores de 15 anos não tiveram acesso à educação básica, apesar do empenho de parte do governo, da sociedade civil e também de organismos internacionais, como a UNESCO – segmentos que estiveram envolvidos nas metas para a chamada década de Educação para Todos –, grande parte dessa população ainda não completou o ensino fundamental ou não teve acesso a ele.

Ao longo da década de Educação para Todos, não houve uma ampliação significativa das oportunidades educacionais para a população brasileira jovem e adulta e, conseqüentemente, o país não conseguirá atingir ao final do milênio a meta de redução dos índices de analfabetismo à metade daqueles vigentes em

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1990. Os avanços obtidos no campo da alfabetização durante a década não resultaram dos esforços empreendidos na educação de jovens e adultos [...]. (HADDAD; DI PIERRO, 2000, p.37).

Os objetivos ainda não foram alcançados, mesmo tendo se passado quase mais de uma década. Portanto, essa é mais uma razão para as instituições que oferecem cursos de licenciatura se envolverem e incluírem em seus programas curriculares o conhecimento e o preparo de seus alunos para um trabalho de qualidade com esses jovens e adultos que ainda não usufruíram de seus direitos à educação básica.

Aqui retomo meu objeto de pesquisa a partir da questão central. Afinal, os professores da EJA usufruem das possibilidades oferecidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a fim de pôr em prática a tão sonhada educação emancipatória?

Ainda que a universidade não prepare especificamente para a EJA, os cursos de licenciatura possuem nos seus currículos disciplinas relacionadas às políticas educacionais, teorias e metodologias relacionadas com a educação. Os trabalhos acadêmicos relacionados a essas disciplinas exigem do aluno leituras das leis brasileiras referentes à educação. Talvez o que esteja faltando nos cursos de graduação seja um aprofundamento no que se refere ao entendimento e às implicações dessas políticas educacionais na prática docente. Outro fator que contribui para o pouco aprofundamento dessas questões é o fato de essas disciplinas serem comuns a todos os cursos de licenciaturas. Dessa forma, geram-se turmas mistas com estudantes de várias áreas. Se, por um lado, promove-se a integração entre os estudantes dos diversos cursos de licenciaturas, por outro, perde-se no aprofundamento e discussões dos PCNs específicos de cada área, o que mais tarde fará falta, principalmente no momento de os docentes exercerem a profissão. Essa é uma questão importante que deveria ser revista pelas universidades.

Entretanto, independentemente do curso de licenciatura ou do teor de aprofundamento que as disciplinas tenham fornecido a seus acadêmicos, em algum momento, todo aluno que opta pela profissão de educador deve ter lido pelo menos uma das obras de Paulo Freire e conhecido um pouco de sua história como educador. Portanto, deve ter consciência de sua própria presença em uma sala de aula e de como suas atitudes como educador podem provocar a transformação em seus educandos, tanto para o desenvolvimento positivo e emancipatório deles, quanto sua anulação ou até mesmo a evasão escolar. Por isso, revisito Freire:

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A responsabilidade do professor, de que às vezes não nos damos conta, é sempre grande. A natureza mesma de sua prática eminentemente formadora, sublinha a maneira como a realiza. Sua presença na sala é de tal maneira exemplar que nenhum professor ou professora escapa ao juízo que dele ou dela fazem os alunos. E o pior talvez dos juízos é o que se expressa na “falta” de juízo. O pior juízo é o que considera o professor uma ausência na sala (FREIRE, 2000, p. 73).

Esclareço, entretanto, que a evasão escolar na EJA não é estritamente uma consequência única do despreparo do professor ou da maneira como ele conduz sua sala de aula; também está relacionada a fatores externos, como as condições socioeconômicas dos alunos.

[...] a evasão escolar [é] reconhecidamente elevada em programas de EJA, em função não só de fatores internos aos processos de ensino-aprendizagem, provocados pelas dificuldades inerentes a essa modalidade de educação, mas também por fatores externos vinculados às difíceis condições de vida dos alunos. Para superar tais dificuldades, é importante que ocorram incentivos à permanência dos alunos (HADDAD, 2007, p. 207).

Dessa forma, o fator humano – o professor –, embora não seja o responsável pela evasão escolar, pode contribuir no processo inverso e torna-se um fator positivo para que ocorra o incentivo à permanência de jovens e adultos nas salas de aula. É preciso que esses alunos sintam que os sacrifícios a que se dispõem valem a pena. Nessa perspectiva, professores e escola podem e devem contribuir para a redução da evasão escolar nos programas de EJA através da flexibilização do currículo e da sensibilidade dos gestores escolares para algumas particularidades de alguns alunos. Cito como exemplos: aquele aluno que trabalha e não consegue chegar até a escola antes que os portões fechem e é obrigado a aguardar o início do segundo período do lado de fora da escola – muitas vezes, espera 50 minutos devido a um atraso de cinco; uma mãe de família que, não podendo comparecer a uma avaliação importante porque o filho pequeno está doente, não consegue uma nova oportunidade, tendo que repetir toda a etapa novamente. Enfim, esses são apenas alguns exemplos das realidades dos alunos que frequentam a EJA, e saliento que o leque é bem maior. Como professora nessa modalidade, já tive alunas que tinham de caminhar de dois a três quilômetros até suas casas após descerem do ônibus escolar, mesmo em dias de chuva e frio. Elas só continuaram a frequentar as aulas pelo incentivo de alguns dos

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docentes, pois é preciso acreditar que todo sacrifício, mesmo para os alunos de idade mais avançada, de alguma maneira, vale a pena.

Acredito que este cuidado, que está faltando aos professores, no que se refere a informações, deve não só permear as instituições de ensino superior, mas também as secretarias de educação, que de tempos em tempos devem promover a formação de professores que atuam na EJA trazendo assuntos concretos, como as leis e regulamentações de políticas e o funcionamento para essa modalidade de ensino. Não que nunca tenha havido cursos ou formações de professores, mas o âmago da questão é que, por também ser um trabalho desenvolvido no período noturno e com um público diversificado, que exige muito mais dos profissionais, a rotatividade de professores nessa modalidade de ensino é grande. Quem chega não recebe o devido preparo sobre o que é e como acontece a EJA.

No ano de 2006, o governo do Estado do Rio Grande do Sul promoveu uma formação de professores para além do perímetro das escolas. Foram feitas parcerias com universidades a fim de atender professores dos diversos campos do conhecimento que trabalhavam com a EJA. As quartas-feiras foram destinadas às reuniões e “formação” de professores da EJA – coloco “formação” entre aspas porque, pelo menos na escola em que atuava, as reuniões passavam bem longe do significado que essa palavra agrega. Voltando à formação oferecida pelo governo estadual, quem participou notou que a organização foi realizada às pressas, sem definição de programa ou metas. O motivo para aquela repentina convocação era que havia uma verba da UNESCO que deveria ser gasta na EJA com a formação dos professores e o tempo estava se esgotando. Como participante do evento, pude constatar a ausência de relação entre um encontro e outro, objetivos e propostas. Concluí o período dos encontros de formação sem ampliar meus conhecimentos, na época muito escassos, sobre essa modalidade de ensino.

Faço esse breve relato pessoal para salientar que só tive conhecimento de que existe uma proposta curricular do Ministério da Educação (MEC) com diretrizes específicas para a EJA no ano de 2008, durante o curso do PROEJA, sendo que a publicação deste documento é do ano de 2001. Aí retomo um dos desdobramentos de minha pesquisa: em que instância as informações se perdem ou não chegam às escolas e professores da EJA ou mesmo aos alunos das licenciaturas? Recebi minha titulação no ano de 2004 e ingressei na EJA no ano de 2005, datas posteriores à publicação aos Parâmetros Curriculares para EJA,

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que eu desconhecia. Por que os professores que hoje estão nos bancos escolares da EJA não sabem que existe essa proposta própria para EJA? Tentarei responder essa questão através da análise do instrumento de pesquisa aplicado em professores de EJA.

Saliento que a proposta do MEC2 para toda a educação básica, inclusive para EJA, é bastante flexível e garante uma considerável autonomia para os educadores dessa modalidade de ensino. Na sua construção, houve a preocupação na flexibilidade necessária para atender às particularidades de cada parte do nosso país, resultado de uma série de questionamentos feitos pelo grupo que construiu o documento, com o cuidado em sua elaboração para que não se tornasse um modelo prescritivo e limitador da flexibilidade necessária à EJA (RIBEIRO et al., 2001).

Considerando esses questionamentos, é essencial reafirmar que o espírito de nossa iniciativa foi o de oferecer uma proposta curricular como subsídio ao trabalho dos educadores e não o de estabelecer “o currículo” que merecesse ser simplesmente aplicado seja em escala local, regional ou nacional. Animar o debate em torno da questão curricular, suscitar a divulgação de propostas alternativas ou complementares elaboradas por outras equipes, impulsionar iniciativas de formação de educadores e provimento de materiais didáticos são as metas mais importantes que almejamos como resultado deste trabalho.

Certamente, a mera existência de uma proposta curricular como esta não possibilitará o alcance dessas metas sem que haja decidido empenho dos poderes públicos em apoiar iniciativas nesse sentido, com o espírito democrático e pluralista que convém ao desenvolvimento curricular no campo da educação de jovens e adultos (RIBEIRO et al., 2001, p.9).

Porém, o debate não vem ocorrendo em todas as esferas da educação. Falta também o repasse das informações às escolas e aos seus respectivos professores de que o objetivo do documento acima citado é “[...] oferecer um subsídio que oriente a elaboração de programas de educação de jovens e adultos e, conseqüentemente, também o provimento

2 Os Parâmetros Curriculares Nacionais referenciam a renovação e reelaboração da proposta curricular,

reforçam a importância de que cada escola formule seu projeto educacional, compartilhado por toda a equipe, para que a melhoria da qualidade da educação resulte da co-responsabilidade entre todos os educadores. A forma mais eficaz de elaboração e desenvolvimento de projetos educacionais envolve o debate em grupo e no local de trabalho.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais, ao reconhecerem a complexidade da prática educativa, buscam auxiliar o professor na sua tarefa de assumir, como profissional, o lugar que lhe cabe pela responsabilidade e importância no processo de formação do povo brasileiro.

Dada a abrangência dos assuntos abordados e a forma como estão organizados, os Parâmetros Curriculares Nacionais podem ser utilizados com objetivos diferentes, de acordo com a necessidade de cada realidade e de cada momento. Neles encontram-se subsídios para reflexão e discussão de aspectos do cotidiano da prática pedagógica, a serem transformados, continuamente pelo professor (MEC/ Documento Introdutório, 1998).

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de materiais didáticos e a formação de educadores a ela dedicados” (RIBEIRO et al., 2001, p. 13). A partir desse subsídio, fica a cargo dos educadores a elaboração de currículos e planos de ensino de acordo com as necessidades e objetivos específicos do programa da escola ou a realidade na qual está inserida a comunidade escolar. Lembro que “[...] a educação de jovens e adultos tem sido, no Brasil, um tema polêmico e controvertido desde os primeiros momentos em que começou a ser pensada em suas especificidades com relação ao ensino regular” (OLIVEIRA; PAIVA, 2004, p. 85).

É necessário ao professor, antes mesmo de pensar na formulação dos planos de ensino e posteriormente nos planos de aula, conhecer quem são os educandos a que estes se destinam. Não se deve esquecer que o público da EJA é composto pela população que não teve acesso à escolarização regular. Segundo Oliveira (2003), isso deve ser considerado para que esses alunos não sejam submetidos a propostas e práticas inadequadas tanto aos seus perfis socioeconômico-culturais quanto às suas possibilidades e necessidades reais.

Ou seja, os processos de aprendizagem vividos, sejam eles formais ou cotidianos, envolvem a possibilidade de atribuição de significado, por parte daqueles que aprendem, às informações recebidas do exterior — da escola, da televisão, dos amigos, da família etc. (OLIVEIRA, 2003, p.86).

Dessa forma, Oliveira (2003) retoma o que está expresso nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jovens e Adultos, do parecer 11/2000, com a importância de se considerar que os alunos dessa modalidade de ensino diferem dos alunos presentes nos anos adequados à faixa etária. Os alunos da EJA “são jovens e adultos, muitos deles trabalhadores, maduros, com larga experiência profissional ou com expectativa de (re)inserção no mercado de trabalho e com um olhar diferenciado sobre as coisas da existência, que não tiveram diante de si [...]” (CURY, 2000, p.33). É fundamental que o professor construa sua metodologia de trabalho integrando os saberes vivenciados por seus alunos com os saberes escolares, de forma que os alunos possam reconstruir suas experiências de vida, ressignificando seus conhecimentos, possibilitando seu avanço na escolarização.

Assim, as colocações de Oliveira (2003) e Cury (2000) expressam os desafios que a EJA estabelece aos educadores, como a formulação de propostas curriculares específicas para a EJA, uma vez que terão de “[...] dialogar com os saberes, valores, crenças e

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experiências dos educandos, [...] relevantes para a ação pedagógica” (OLIVEIRA, 2007, p. 87). É provável que um dos caminhos para se alcançar o diálogo entre o conhecimento dito científico e empírico dos educandos seja a interdisciplinaridade, e não mais um modelo de currículo em que o conhecimento está fragmentado em disciplinas isoladas umas das outras. No entanto, a elaboração de currículos específicos para EJA deverá ser o resultado da ação conjunta entre professores e escola.

As propostas de uma interdisciplinaridade postas hoje sobre a mesa apontam, no contexto de uma perspectiva arbórea, para integrações horizontais e verticais entre as várias ciências; numa perspectiva rizomática, podemos apontar para uma transversalidade entre as várias áreas do saber, integrando-as, se não em sua totalidade, pelo menos de forma muito mais abrangente, possibilitando conexões inimagináveis no paradigma anterior (GALLO, 1999, p. 33).

O paradigma que Gallo (1999) menciona refere-se a uma visão formalista e cientificista do currículo em que as disciplinas não dialogam entre si, muito menos com o mundo real das experiências dos alunos. Trago um exemplo bem claro, do ensino regular, em que os alunos da 5ª série frequentemente aprendem sobre o universo e sistema solar, tanto nas disciplinas de ciências quanto na de geografia, porém em momentos separados. Esse é um exemplo da falta de comunicação, não só entre os planos de estudos de cada disciplina numa mesma escola, como também entre os docentes.

Segundo Oliveira (2007), é preciso repensar tanto os diversos espaços de discussão curricular criados nas escolas quanto os outros espaços de debate. Creio que é essencial que também se criem esses espaços nos cursos de licenciatura nas universidades.

E com relação à seleção dos conteúdos é preciso uma lógica que os compreenda não como uma finalidade em si, mas como meio para uma interação mais plena e satisfatória do aluno com o mundo físico e social à sua volta, oportunizando a essas populações a valorização dos saberes tecidos nas suas práticas sociais em articulação com saberes formais que possam ser incorporados a esses fazeres/ saberes cotidianos, potencializando-os técnica e politicamente. Na seleção dos conteúdos a constar dos programas de escolarização, a prioridade seria, então, a da abordagem de conhecimentos relacionados à vida social e à compreensão dos elementos que intervêm na vida cotidiana (OLIVEIRA, 2007, p. 97).

O trabalho com a modalidade de ensino de jovens e adultos é relativamente novo, mas também árduo, requerendo dos educadores muita pesquisa, dedicação e até mesmo experimentação para a construção de um currículo que atenda, na prática, ao direito de

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milhões de brasileiros. Caberá aos educadores fazer da EJA algo muito maior do que uma política compensatória e transformá-la no caminho para a cidadania de muitos brasileiros.

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4. E VAMOS À LUTA

Para atender aos objetivos deste trabalho, optei pela pesquisa qualitativa, através de entrevistas semi-estruturadas. Os sujeitos da pesquisa são os professores que atuam ou atuaram na EJA. Sobre a entrevista, Selltiz (1987) argumenta que o pesquisador deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas que ele o faz em um contexto muito semelhante ao de uma conversa informal.

A primeira etapa foi a de elaboração e estruturação de um instrumento de pesquisa que fosse capaz de responder minhas questões e também confirmar ou não algumas de minhas hipóteses, como a de que faltam informações sobre como encaminhar o trabalho na EJA ou mesmo sobre o que é e qual o objetivo da EJA, entre outras.

De acordo com Lakatos (1996), a preparação da entrevista é uma das etapas mais importantes da pesquisa. Requer o campo e exige alguns cuidados, tais como o planejamento, que deve ter em vista o objetivo a ser alcançado e a escolha dos entrevistados, entre outros.

O segundo passo foi fazer o convite para as entrevistas e, posteriormente, aplicá-las. Escolhi a escola em que lecionava com EJA para desenvolver meu trabalho de campo. Entrevistei quatro professores do Instituto Estadual Madre Benícia, situado na zona rural do município de Novo Hamburgo. Contudo, considerei importante buscar para a pesquisa outro entrevistado, de outra escola, outro município, a fim de encontrar ou não outra perspectiva em relação à EJA. Por intermédio de uma colega, realizei minha quinta entrevista, na Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso, no município de Alvorada. Foi uma escolha muito feliz, pois a professora que a colega indicou, além de trabalhar com a EJA há muito tempo, também participou da implantação da EJA na rede municipal de Alvorada em 1998.

Antes de falar um pouco sobre cada um dos entrevistados, esclareço que optei por trocar o nome de todos, uma vez que três deles optaram pela não-identificação de seus nomes. Procurei, para a substituição dos nomes, seguir a mesma linha da escolha dos títulos. Novamente, me reportei à época das liberdades restritas e encontrei os nomes dos autores de uma peça de teatro que faz sucesso em todo o Brasil há muitas gerações, através de várias montagens. Falo dos autores de Bailei na Curva; dentre eles, escolhi os nomes de

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Júlio Conte, Márcia do Canto, Regina Goulart, Claudia Acurso e Lúcia Sepa. Saliento que usarei apenas o primeiro nome desses artistas.

No Instituto Estadual Madre Benícia, onde comecei meu trabalho de campo, as turmas de EJA têm ficado cada vez menores, isso quando não são extintas definitivamente. Atualmente, a escola oferece à comunidade vagas em apenas três totalidades3: T4, T5 e T6, que correspondem às últimas etapas do Ensino Fundamental. A tendência para o próximo ano é continuar a redução de turmas de EJA.

Os principais fatores que ocasionaram a redução das turmas de EJA foram: a enturmação4 ou extinção de turmas e o período de inscrições para matrícula, que, além de ser curto, é muito pouco divulgado. Esses fatores são medidas promovidas pela atual gestão da Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande do Sul.

No segundo semestre de 2007, ocorreu enturmação na escola. Em 2008, foram extintas as Totalidades 1,2 e 3, devido ao número reduzido de alunos. As Totalidades 1 e 2 correspondiam às séries iniciais, sendo responsáveis pela alfabetização dos alunos. Ambas as totalidades já ocupavam o mesmo espaço e uma única professora. No ano de 2009, a escola, seguindo as orientações de sua coordenadoria, não abriu inscrições para as totalidades extintas. Além disso, o período para as inscrições das totalidades possíveis é muito restrito, geralmente em dezembro, e muito pouco divulgado. A maioria dos candidatos a alunos da EJA procura as instituições de ensino nos meses de janeiro, fevereiro e, principalmente, no início do mês de março e acaba indo embora sem a possibilidade de regressar aos estudos.

A primeira professora entrevistada foi Márcia. Ela tem 28 anos e trabalhou cinco anos com a EJA, com a disciplina de ciências. Este é seu primeiro ano, desde que começou a lecionar, que não está trabalhando com EJA. Uma das razões para isso é que o número de turmas têm se reduzido a cada ano.

Júlio tem 37 anos e trabalha com a EJA há quatro anos, desde que começou a lecionar no Estado, sempre nessa mesma escola. Sua área de atuação é a língua portuguesa. Ele confirma a redução de turmas a cada ano, mas não porque estão formando toda a população local que não tinha escolaridade, e sim por que muitos desistem mediante as

3 Totalidade: cada totalidade corresponde a uma etapa de conhecimentos nos diferentes campos do saber,

similar à organização do ensino regular, que está dividido por séries.

4

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dificuldades ou porque, se quiserem continuar estudando, terão de buscar outra escola, em outro bairro, pois a que está inserida na comunidade não mais oferece a totalidade de que o aluno necessita.

Já Regina, 47 anos, apesar de lecionar há bastante tempo, está há pouco tempo na EJA. Foi para a EJA a fim de completar sua carga horária. Iniciou seus trabalhos com essa modalidade de ensino nos últimos quatro meses de 2008 e neste ano começou a trabalhar com as turmas de EJA já no início do período letivo. Sua disciplina de atuação é a educação física, que por lei libera grande parte dos alunos da atividade.

Claudia, 46 anos, trabalhou com a EJA durante seis anos. Atualmente, não mais leciona na EJA porque sua área de atuação é o currículo, e ela trabalhava com as Totalidades 1 e 2, que já não mais existem no Instituto Estadual Madre Benícia. Ela conta que seus poucos alunos, mesmo não estando totalmente alfabetizados, foram dispensados da escola por determinação da Coordenadoria, que, por sua vez, cumpre a determinação da Secretaria Estadual de Educação.

A Educação de Jovens e Adultos no Instituto Estadual Madre Benícia data de 1998 e já chegou a oferecer duas turmas das totalidades finais – T4, T5 e T6 –, cada uma com aproximadamente 30 alunos, tamanha era a procura. Atualmente, como já foi mencionado antes, a escola oferece vagas em apenas três modalidades, T4, T5 e T6, que juntas somam pouco mais de 50 alunos, ainda assim, mediante um número mínimo de matrículas e de frequência, pois, caso a frequência seja inferior a 15 alunos, a Coordenadoria pode pedir o fechamento da turma e sugerir o encaminhamento dos alunos remanescentes a outras escolas do Município de Novo Hamburgo. Não seria nada demais, uma vez que o município oferece passagem escolar a seus alunos, se não fosse pelo fato de o Instituto Estadual Madre Benícia estar situado numa zona rural e de, após as 20 horas, não haver mais linhas de ônibus em funcionamento, com exceção da linha escolar que percorre o próprio bairro, atenuando as grandes distâncias que separam os alunos da escola. Mas como ir para outra escola se não há ônibus para retornar para casa, já que a modalidade de EJA ocorre sempre à noite? Como continuar estudando? Assim, boa parte da população do bairro Lomba Grande que não pôde ainda concluir toda a educação básica continuará não tendo acesso a um direito seu, assegurado pela Constituição Federal.

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Minha quinta entrevistada é Lúcia, 35 anos, professora de história que trabalha há dez anos com a EJA. Atualmente, ela leciona na Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso, no município de Alvorada. Nessa escola, não vem ocorrendo o fechamento de turmas; entretanto, essa é a única escola estadual do município de Alvorada que oferece para a comunidade toda a educação básica na modalidade de EJA. Há desde turmas de alfabetização até do final do ensino médio, ou seja, da Totalidade 1 até a Totalidade 9, que correspondem respectivamente à alfabetização e ao terceiro ano do ensino médio. Quanto ao número de alunos que a modalidade atende, a entrevistada não soube me informar. Durante a visita à escola para realização da entrevista, que ocorreu no período noturno, não encontramos uma pessoa da administração que pudesse nos fornecer essa informação.

O trabalho de campo, para a realização das entrevistas, ocorreu em dois momentos: uma visita a cada uma das escolas mencionadas. As impressões que tive de cada uma dessas visitas foram totalmente opostas e ambíguas. Explico por quê. Na escola em que já trabalhei, minha chegada foi bastante tranquila, pois já conhecia os colegas que iria entrevistar, assim como a direção e secretários. Fui muito bem recebida e me deixaram bem à vontade; afinal, trabalhei nessa escola por quase três anos. Já na escola de Alvorada, onde trabalha minha colega, meu elo com a escola, cheguei um pouco apreensiva, sem saber como seria recebida, pois nem sempre visitantes são bem-vindos, ainda mais buscando informações sobre a escola. No entanto, durante a realização das entrevistas, senti certo desconforto inicial por parte dos entrevistados na Escola Madre Benícia. Já na Escola Gentil Viegas, minha entrevistada mostrou-se bem à vontade para responder o instrumento de pesquisa.

Saliento que, na Escola Madre Benícia, ocorreram duas situações durante o trabalho de campo. Apesar de já ter sido colega dos professores que entrevistei, senti certa tensão durante as entrevistas. A primeira situação foi que dois deles queriam responder as perguntas por escrito ou, ainda, ler o instrumento de pesquisa antes que a entrevista começasse a ser gravada. Expliquei que tanto as respostas por escrito quanto a leitura prévia do instrumento poderiam alterar o foco ou mesmo causar perda de parte do que eu buscava. As outras duas entrevistas ocorreram com mais tranquilidade, sendo que,

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inclusive, as entrevistadas continuaram a expor suas ideias após a aplicação do instrumento, falando de seu trabalho.

Na escola de Alvorada, a entrevistada, que eu não conhecia, mostrou-se muito interessada pelo trabalho e também mais à vontade para a entrevista, tanto que esta foi a mais longa das cinco.

Após a realização do trabalho de campo, procurei analisar as diferentes recepções que tive, assim como o acolhimento das entrevistas. Atribuo um pouco da apreensão dos meus ex-colegas do Instituto de Educação Madre Benícia no decorrer das entrevistas como reflexo da instabilidade pela qual vem passando a EJA nos últimos anos. Ao invés de se cumprir uma antiga promessa de se estender essa modalidade de ensino para as séries finais da educação básica, ou seja, implantar o ensino médio da modalidade da EJA, vem ocorrendo o contrário, o desmantelamento do que já existia. Já na Escola Estadual de Educação Básica Professor Gentil Viegas Cardoso, cada vez mais se solidifica essa modalidade de ensino, seja porque a grande maioria da comunidade não teve acesso à educação básica, seja porque vem ocorrendo o gradativo rejuvenescimento dos bancos da EJA, provavelmente por ser aquela a única escola estadual a oferecer educação básica na modalidade de EJA no município. É fato que a EJA nessa escola vem realizando um trabalho ininterrupto, oportunizando à sua comunidade o acesso à educação básica, com início meio e fim. Mesmo que muitos, ainda assim, desistam de concluir seus estudos, a escola está aberta a todos e oferece toda a educação básica na modalidade de EJA.

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5. DESENREDO

Procurei respostas para minha problemática através de um tipo de sujeito bem específico, aquele que é o elo entre a educação e tudo que a ela se refere e o educando: o professor. Mas qual será a definição de ser professor nos dias atuais? Segundo Gadotti (2000), ser professor hoje é viver intensamente o seu tempo, conviver; é ter consciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro para a humanidade sem educadores, assim como não se pode pensar num futuro sem poetas e filósofos. Os professores não só transformam a informação em conhecimento e em consciência crítica, como também formam pessoas. Porém, na EJA, essa tarefa torna-se mais árdua, na medida em que nos deparamos com muitas realidades diferentes e as mais variadas histórias de vida. E encontrar a justa medida para realizar um trabalho satisfatório e até mesmo transformador e emancipatório com nossos jovens e adultos não é tarefa fácil. Depende não só da persistência e obstinação do educador, mas do diálogo entre escola, governo, secretarias de educação, direção e corpo docente, ou seja, depende do trabalho em conjunto, que muitas vezes não acontece. Enfim, como disse Freire (2000, p.73), “a responsabilidade do professor, de que às vezes não nos damos conta, é sempre grande”. Escolhida está profissão, não há como negar ou se desvencilhar desta responsabilidade.

Procurando contemplar de forma mais abrangente a EJA, entrevistei professores de diferentes áreas do conhecimento. Entrevistei cinco professores entre 28 e 47 anos, sendo que, desses, quatro são mulheres. Seu tempo de atuação na EJA é bem variado: Regina está há menos de um ano; Júlio, há quatro anos; Márcia trabalhou cinco anos; Claudia trabalhou seis anos, não-consecutivos; e Lúcia já está há dez anos trabalhando com a EJA. As percepções desses educadores com relação à EJA são bem variadas sob alguns aspectos, mas assemelham-se em determinados momentos, como veremos mais adiante. É importante relembrar que cada um deles atua ou atuou em uma área diferente da EJA: Márcia leciona ciências; Júlio é professor de língua portuguesa; Regina é professora de educação física; Claudia é professora das séries iniciais do ensino fundamental; e Lúcia leciona história.

(31)

Para viabilizar a análise do material produzido no decorrer das entrevistas, selecionei algumas questões de caráter mais objetivo e respostas mais diretas e as tabulei para fins comparativos e de análise do todo. As questões tabuladas são as: 1, 3, 6, 7, 12, 13, 14, 15,16, 18 e 21. As demais serão analisadas separadamente.

Entrevistados→ Questões da pesquisa↓

Márcia Júlio Regina Claudia Lúcia

Idade dos

entrevistados →

28 anos 37 anos 47anos 46 anos 35 anos

1. Tempo que trabalha com a EJA →

5 anos 4 anos - de 1 ano 6 anos 10 anos

3. Área de atuação na EJA→

Ciências Língua Portuguesa

Educação Física Currículo (alfabetização)

História

6. Já trabalhou com a EJA em outras escolas→

Não. Não. Não. Não. Somente como

assessora.

7. A escola possui um currículo próprio para EJA→

Não possui.

Não possui. Não. E, se tem,

não foi

informada.

Não havia. Acredita que atualmente exista e que tenha sido copiado.

Se possui, eu não conheço.

12. Você conhece os PCNs→

Sim. Em parte. Sim. Pouca coisa. Sim.

13. Você já leu os PCNs da sua área de atuação→

(32)

14. De quais orientações sobre políticas públicas voltadas para EJA

você tem

conhecimento→

Nenhuma. Praticamente nenhuma.

Nenhuma. Nenhuma. Respondeu sem

muita clareza. 15. Tem conhecimento da existência de algum material didático específico para EJA→ Recebemos alguma coisa [...] Sim, a gente tem algum material [...] Li alguns livros, mas foi por acaso [...]

Não tinha nada na época em que trabalhei. Se existe aqui, eu não sei. Li folhetins, cadernos pedagógicos, principalmente de São Paulo [...]. 16. Você tem conhecimento se já existem PCNs próprios para EJA→

Não. Não tenho

conhecimento.

Não tenho. Não tenho

conhecimento e acredito que não tenha.

Não sei te dizer.

18. Você realiza pesquisas sobre como trabalhar com a EJA, ou sobre mudanças que o MEC vem promovendo para EJA→ Não, porque às vezes o teórico não funciona na prática [...]. Não, muito pouco. Algumas, como as propostas de trabalhar com o conhecimento já existente no aluno [...]. Naquela época, a gente pesquisava, mas hoje em dia mudou completamente a EJA. Não, não realizo, eu estou muito cansada.

(33)

21. Em sua opinião, a EJA é eficaz como política compensatória para que os alunos tenham acesso à educação básica→ Acho que não [...] na EJA não estão preparados para o ensino médio ou vestibular, para o futuro.

Acho que não. [...] fica mais em nível de proporcionar ao aluno um certificado [...].

Com certeza, mas ela teria que ter um acompanhamento, um suporte muito melhor e professores mais treinados para isso.

Não acho que seja, porque a maioria só sai com um diploma, sem todo o conhecimento necessário; e muitos desistem no meio, porque não conseguimos segurá-los na escola. Depende, eu acho que, como política

compensatória, pode ser, mas, como política de jovens e adultos, não. Ela compensa a certificação, [...] não a qualificação [...].

Todos os entrevistados só atuaram na EJA nas respectivas escolas, portanto, não possuem outra experiência com educação de jovens e adultos para fins de comparação. No entanto, a professora Lúcia pode ser considerada como uma exceção parcial, porque manteve contato com a EJA das escolas da rede pública do município de Alvorada, não como professora, mas como assessora pedagógica, conforme já foi anteriormente mencionado. Ela participou da implantação do SEJA, um programa voltado para a educação de jovens e adultos, que começou a ser implantado no município no ano de 1998. O envolvimento dos docentes com a EJA não se constituiu como uma opção, estando atrelado às contratações dos professores ou a mudanças organizacionais na escola, como ajustamento de carga horária. Outra característica deste grupo de professores é que todos eles atuam ou atuaram concomitantemente na EJA e no ensino regular – característica que cada vez mais se solidifica como uma realidade dos professores das escolas estaduais. A justificativa é simples: os baixos salários levam a maioria dos docentes a trabalhar de 40 a 60 horas semanais, e essas horas são distribuídas nos três turnos que a escola oferece. Consequentemente, isso os leva a lecionar em turmas do ensino fundamental, do ensino médio e da EJA, quando também não lecionam outras disciplinas para as quais sua formação acadêmica não os habilita. Assim, considero o excesso de carga horária e a necessidade de um preparo prévio e constante do educador para lecionar uma disciplina

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