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Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 3 7 ( 5 ) :4 2 4 , set-out, 2 0 0 4
Erucismo
Erucism
En de r e ço par a cor r e spon dê n ci a:Pro f. Jo ffre Marc o ndes de Rezende. R. Jo ão de Abreu 7 4 4 /0 2 , Seto r Oeste, 7 4 1 2 0 -1 1 0 Go iânia, GO. e-mail: j mrezende@ mail.c ultura.c o m.br
Rec ebido para public aç ão em 1 4 /6 /2 0 0 4 Ac eito em 1 6 /6 /2 0 0 4
Senho r Edito r :
A p r o p ó s i to d o te r m o e r u c i s m o, p r a ti c a m e n te desc onhec ido na terminologia médic a, c onsultamos algumas fo nte s b ib lio gr áfic as e c he gam o s à c o nc lusão de q ue o m e sm o , e m b o r a nã o e ste j a dic io na r iza do , é um te r m o c o rreto , que expressa c o m pro priedade a aç ão tó xic a de larvas peç onhentas c omo a lagarta do gênero Lo n o m i a.
É um neo lo gismo híb r ido , fo r mado c o m a r aiz latina
e ru c a + sufixo grego i sm o .
O s ufixo i s m o, c o n fo r m e a s s in a la Ho ua is s e m s e u dic io n á r io , é us a do e m m e dic in a p a r a d e s i gn a r u m a
i n to x i c a ç ã o d e u m a ge n te o b vi a m e n te tó x i c o.
Horác io, o c lássic o esc ritor e poeta latino do séc ulo I a.C., deu o nome de e ru c a a uma planta c ultivada na Europa
(Eru c a sa ti va) , usada c omo c omestível, c ujas folhas têm a
superfíc ie aveludada.
Com o signific ado de larva, o termo e ru c a enc ontra-se registrado no Le x i c u m La ti n u m de Calepinus, de 1 7 5 8 , c om a referênc ia históric a de que o mesmo fora empregado por Co lumela no séc ulo I d.C., em seu livro Re i Ru sti c a 1 .II ( ...ge n u s ve rm i s q u i i n o le ru m f o li a re p i t) . Provavelmente Columela deu este nome à larva por seu c orpo rec oberto de c erdas, lembrando o aspec to das folhas da planta desc rita por Horác io.
Outras fontes, c omo o Di c i o n á ri o La ti n o - Po rtu gu ê s, de Saraiva, atribuem a ac epç ão de larva a Plinius, em sua c lássic a obra Na tu ra li s Hi sto ri a e.
Co n s ulta n do o te x to o r igin a l de s s a o b r a , n o livr o XI.xxxvii, verific amos que Plinius, na verdade, não usou e ru c a
e sim u ru c a (i n d e p o rri gi tu r ve rm i c u lu s p a rvu s e t tri d u o
m o x u ru c a) .
A existênc ia de variantes da palavra e ru c a é explic ada por Ernout et Meillet, em seu Di c ti o n n a i re e tym o lo gi q u e
d e la la n gu e la ti n e . A planta à qual Ho r ác io der a o no me
de e ru c a e r a c o nside r ada afr o disíac a e , po r e ssa r azão ,
surgiram as formas u ru c a ( usada por Plinius) e u ri c a, ambas por influênc ia do radic al u ro ( do grego o û ro n , que, segundo B ailly, além de urina, signific a também líquido seminal) .
Ac e i ta e s ta e x p l i c a ç ã o , p a r e c e e vi de n te q u e de ve prevalec er a forma e ru c a na formaç ão de c ompostos c omo
e ru c i f o rm e e e ru c i sm o, o primeiro dos quais já averbado
nos léxic os.
Er u c i s m o p o de s e r c o m p a r a do a o u tr o s ti p o s de
envenenamento por peç onha de origem animal, a exemplo de ofidismo, esc orpionismo, arac nidismo ou arac noidismo. Uma vez legitimado pelo uso, c ertamente o termo e ru c i sm o
i r á i n te gr a r o a c e r vo l e x i c a l n ã o s o m e n te da l í n gu a po r tuguesa, c o mo de o utr o s idio mas de c ultur a, c o m as adaptaç õ e s m ó r fic as apr o pr iadas a c ada um de le s. Em inglês, por exemplo, seria e ru c i sm , tal c omo em o p h i d i sm ,
sc o rp i o n i sm e a ra c h n i d i sm .
Joffr e Mar condes de Rezende
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 . B ailly A. Dic tio nnaire Grec -Franç ais. 1 6th editio n, Library Hac hette, Paris,
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5 . Plinius. Natur alis Histo r ia. The lo eb c lassic al libr ar y, vo l. III. Har var d
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