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O despedimento por justa causa procedimento

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Academic year: 2022

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– procedimento

diogo VAz MArecoS*

1. Introdução

Percorrendo as normas do Código do Trabalho deparamo-nos com os mais variados procedimentos, necessários à efectivação de direitos.

A este título, merecem especial atenção os procedimentos consagrados na maioria dos casos de cessação do contrato de trabalho. E entre estes, o procedimento disciplinar com intenção de despedimento por justa causa assume uma importância inexcedível, não só pelo efeito extintivo que se visa obter, como pelas dúvidas que suscita. Recorde-se que o despedimento de um trabalhador por um empregador é ilícito, se não for precedido do respectivo procedimento.

Apesar do procedimento disciplinar com intenção de despedimento se encontrar regulado, são várias as questões de índole prática não resol- vidas cabalmente pelo legislador. É sob este procedimento laboral que nos propomos deter, o despedimento por justa causa, procurando com este estudo debruçarmo-nos sob a sua tramitação concreta.

A presente análise tem subjacente a Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que procedeu à aprovação do Código do Trabalho, diploma para o qual, salvo expressa indicação em contrário, são feitas, de ora em diante, todas as remissões. Este diploma procedeu à revogação faseada do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, mantendo-o

* Advogado.

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parcialmente em vigor durante alguns meses, uma vez que a revogação de algumas das matérias nele reguladas só produziu efeitos após a entrada em vigor dos vários diplomas que regularam a mesma matéria, cfr. artigo 12.º da própria Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro. Doutrinalmente designado como Código do Trabalho Revisto, o Código do Trabalho aprovado pela a Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, foi posteriormente alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de Setembro, 53/2011, de 14 de Outubro, 23/2012, de 25 de Junho, 47/2012, de 29 de Agosto, 69/2013, de 30 de Agosto, 7/2014, de 8 de Maio e 55/2014, de 25 de Agosto.

Do âmbito deste trabalho excluímos desde já os regimes especiais consagrados para alguns profissionais (advogados, solicitadores, magistra- dos judiciais, magistrados do Ministério Público, funcionários de justiça, Polícia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana, médicos, militares, trabalhadores que exercem funções públicas, entre outros).

2. A tramitação do procedimento disciplinar com vista ao despedi- mento por justa causa

2.1. A instrução e acusação

Antes de avançarmos pela tramitação do procedimento disciplinar com vista ao despedimento com justa causa, impõe-se fazer uma breve noção deste. Em termos sintéticos pode definir-se como a sucessão de actos, sujeitos a certas formalidades, através dos quais se investigam factos concretos que constituíram a violação dos deveres de um traba- lhador e a gravidade da sua culpa, para que, em face dessa violação, se possa licitamente punir o seu infractor, através da aplicação da sanção de despedimento sem indemnização ou compensação, tipificada na lei, cfr. alínea f) do n.º 1 do artigo 328.º

A acção disciplinar encontra-se sujeita a prazos de exercício, os quais se encontram estabelecidos nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 329.º1 Num

1 De acordo com o n.º 2 do artigo 329.º, o procedimento disciplinar deve iniciar-se nos sessenta dias subsequentes àquele em que o empregador, ou o superior hierárquico com competência disciplinar, teve conhecimento da infracção, sob pena de caducidade.

É interrompido com a instauração de procedimento prévio de inquérito ou com a nota de culpa. Para além deste prazo de caducidade, deve ainda ser observado o prazo de prescrição do n.º 1, ou seja, o direito de exercer o poder disciplinar prescreve em um ano após a prática da infracção, ou no prazo de prescrição da lei penal se o facto consti- tuir igualmente crime, independentemente do conhecimento. Este prazo de prescrição é

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primeiro momento, o empregador deve controlar estes prazos, para que possa licitamente dar início ao procedimento.

O primeiro acto de tramitação do procedimento disciplinar com vista ao despedimento por justa causa, deve ser a nomeação do Instrutor, quando não seja o próprio empregador. O Instrutor é a pessoa que, em nome do empregador, procede às várias diligências probatórias que tenham de se realizar no procedimento disciplinar2/3. De facto, o empregador pode man- datar alguém que por ele proceda à instrução do procedimento disciplinar, desempenhando o cargo de Instrutor, desde que a decisão da sanção a aplicar seja, em princípio, tomada pelo próprio empregador ou pelo supe- rior hierárquico do trabalhador, com competência disciplinar, cfr. n.º 4 do artigo 329.º Frequentemente, a nomeação de Instrutor recai sobre um advogado, atento o seu conhecimento jurídico. Contudo, o desempenho do cargo de Instrutor não implica o exercício da advocacia4, podendo ser exercido por um outro trabalhador que não aquele contra quem foi ins- taurado o procedimento disciplinar. Trata-se de um mandato5, cfr. artigos 1157.º e seguintes do Código Civil6. Este mandato será necessariamente

interrompido com a instauração de procedimento prévio de inquérito ou com a nota de culpa. O procedimento disciplinar prescreve ainda, estabelece o n.º 3 do mesmo artigo 329.º, decorrido um ano contado da data em que é instaurado quando, nesse prazo, o trabalhador não seja notificado da decisão final. Não é interrompido com a instauração de procedimento prévio de inquérito ou com a nota de culpa.

2 Neste sentido, cfr. o n.º 1 do artigo 356.º: “O empregador, por si ou através de instrutor que tenha nomeado, deve realizar as diligências probatórias requeridas na res- posta à nota de culpa, a menos que as considere patentemente dilatórias ou impertinentes, devendo neste caso alegá-lo fundamentadamente por escrito.”

3 Na realidade, quando um empregador atinge uma determinada dimensão, não consegue em tempo útil praticar todos os actos e negócios próprios da sua actividade, justificando-se por isso o recurso a alguém que no âmbito interno da organização, ou fora dela, possa por ele desempenhar esses actos ou negócios, ou seja, representando-o, repercutindo-se os efeitos desses actos e negócios na esfera jurídica do empregador.

4 As diligências realizadas por Instrutor em procedimentos disciplinares, quando desempenhadas por um representante legal, empregado, funcionário ou agente de pessoas singulares ou colectivas, públicas ou privadas, e nessa qualidade, não constituem actos próprios dos advogados, cfr. n.º 8 do artigo 1.º da Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto.

5 Por mandato entende-se o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra.

6 Seguimos portanto iNocêNcio gAlVão telleS, Contratos Civis, Revista da Facul- dade de Direito da Universidade de Lisboa X, 1954, página 71: “Sempre que uma pessoa promete a outra a sua colaboração jurídica, pondo à disposição dela a sua capacidade de agir no mundo do direito, contratando com terceiros ou praticando outros actos jurí- dicos em face deles, constitui-se um vínculo de mandato. O mandatário não se encontra

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com representação cfr. artigo 1178.º e seguintes do Código Civil, ao qual se aplicam os artigos 258.º e seguintes do mesmo diploma, por força do n.º 1 daquele artigo 1178.º, poderes esses de representação que, no caso de Instrutor que seja trabalhador do empregador, decorrem automatica- mente do seu contrato de trabalho. Atendendo ao n.º 2 do artigo 262.º do Código Civil, a forma depende do negócio que deva ser realizado, pelo que quando o procedimento disciplinar vise o despedimento, deve o mandato ser reduzido a escrito. Se não o for, é ineficaz a representação do empregador, a não ser que este a venha a ratificar, cfr. artigo 268.º do Código Civil. A prova da ineficácia da representação incumbe ao trabalhador, cfr. n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil7.

O procedimento disciplinar inicia-se com a comunicação da nota de culpa ao trabalhador. Contudo, é também admissível que o procedimento tenha início com a instauração de um procedimento prévio de inquérito.

Detenhamo-nos um pouco mais sobre este procedimento prévio de inquérito, sabendo-se que nem sempre este dá início ao procedimento disciplinar. Para tanto, têm de ser referidos os pressupostos cumulativos que advém da letra do artigo 352.º – onde se institui o procedimento prévio de inquérito – bem como o entendimento que sobre este preceito tem vindo a ser dado pela jurisprudência. O procedimento prévio de inquérito tem assim de se mostrar necessário para fundamentar a nota de culpa, o que sucede quando não é conhecido o autor da infracção, ou sendo-o, não são conhecidos os factos na sua plenitude, designadamente quanto à sua extensão e gravidade, cfr.

forçosamente, por essa sua qualidade, investido em poderes representativos. Pode não os ter, e então executa em nome próprio a gestão de que está incumbido, o que quer dizer que se torna ele, formalmente, o sujeito dos direitos e obrigações promanados da actividade exercida, embora os deva depois transferir ao mandante, no interesse de quem essa actividade foi realizada. Tais direitos e obrigações só se projectam directamente no património do mandante, se o mandatário tiver poderes de representação e proceder à sombra deles. O simples mandatário age por conta do mandante, mas em nome próprio, só o mandatário-representante age ao mesmo tempo por conta do mandante e em nome dele […]. No mesmo sentido, PireSde liMA e ANtuNeS VArelA, Código Civil Anotado, volume II, 4.ª edição, Coimbra Editora, páginas 787 e seguintes.

7 Tendo-se referido supra que a regra é a decisão da sanção dever ser tomada pelo empregador ou pelo superior hierárquico com competência disciplinar, impõe-se aferir se poderá, em alguma circunstância, ser o Instrutor – quando, observado o procedimento, se chegar à fase da decisão – a despedir o trabalhador? A resposta terá de ser necessariamente afirmativa, desde que o mandato com representação seja especial, cfr. n.º 2 do artigo 1159.º do Código Civil – ou seja, nele se especificando os actos compreendidos no exercício do mandato, concretizando os actos que forem conferidos – e seja reduzido a escrito.

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Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Maio de 2007, documento n.º SJ20070530006734, disponível em www.dgsi.pt. Outros dos pressupos- tos é que o inquérito seja iniciado nos 30 dias subsequentes à suspeita de comportamentos irregulares; que seja conduzido de forma diligente; e que não medeiem mais de 30 dias entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa. A violação de algum destes pressupostos traduz-se na ilicitude, por caducidade8 do procedimento disciplinar. O procedimento prévio de inquérito consubstancia-se na realização, pelo empregador, ou através de Instrutor para tanto nomeado, de diligências probatórias, para apuramento dos factos que serão em momento posterior imputados a um trabalhador9.

Permite-se também, que antes de notificar o trabalhador da nota de culpa, o empregador suspenda preventivamente o trabalhador infractor, cfr. n.º 2 do artigo 354.º A suspensão preventiva é uma das raras situações em que se admite que o empregador possa obstar à prestação efectiva de trabalho10. A figura da suspensão preventiva exige a verificação dos seguintes pressupostos cumulativos:

1) Realização por escrito;

2) A presença do trabalhador tem de se mostrar inconveniente, o que tem de constar da notificação de suspensão preventiva;

3) Não ter sido ainda possível elaborar a nota de culpa, o que tem de constar da notificação de suspensão preventiva;

4) Que o trabalhador seja notificado da nota de culpa nos 30 dias subsequentes à suspensão;

5) Que se mantenha o pagamento da retribuição.

A suspensão preventiva do trabalhador que seja realizada com vio- lação dos seus requisitos confere ao trabalhador uma indemnização por danos não patrimoniais, cfr. artigo 483.º do Código Civil. Neste sentido

8 A caducidade não é de conhecimento oficioso, cfr. Acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 4/03, de 21 de Maio de 2003, documento n.º SJ20030521004524, disponível em www.dgsi.pt, tendo de ser invocada por aquele a quem aproveita.

9 Nada veda que das diligências probatórias realizadas resulte que os factos são insusceptíveis de ser imputados a um trabalhador, ou que esses mesmos factos não constituem qualquer infracção, pelo que a consequência seja o arquivamento do pro- cedimento prévio de inquérito, sem que qualquer trabalhador venha a ser notificado de qualquer nota de culpa.

10 Já será proibido ao empregador obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho, cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 129.º

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vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de Abril de 2008, documento n.º SJ200804020041044, disponível em www.dgsi.pt.

Depois de concluído o procedimento prévio de inquérito, seguir-se- -á, em simultâneo, a comunicação escrita ao trabalhador da intenção do empregador proceder ao seu despedimento11 e a comunicação escrita da nota de culpa, cfr. n.º 1 do artigo 353.º Não tendo havido lugar ao procedimento prévio de inquérito, o procedimento disciplinar com vista ao despedimento com justa causa é, como se disse supra, iniciado com a comunicação escrita da intenção de proceder ao despedimento e a comunicação escrita da nota de culpa. Caso o empregador não comunique a intenção de despedimento, ou comunicando-a, não o faça por escrito, a consequência é que o procedimento é inválido cfr. alínea b) do n.º 2 do artigo 382.º Além desta consequência, e por força do n.º 4 do artigo 353.º, o empregador incorre na prática de uma contra-ordenação12 grave, ou muito grave, no caso de o trabalhador ser representante sindical13, caso venha a despedir o trabalhador sem lhe ter comunicado por escrito essa sua intenção. De acordo com aquele que tem sido o entendimento maioritário da jurisprudência – quanto a nós bem – e não obstante a letra da lei ser susceptível de parecer apontar noutro sentido, não se verifica a nulidade da falta de comunicação da intenção de despedir, se a intenção constar não da comunicação (que falta), mas da nota de culpa14, cfr., por todos, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4 de Junho de 1997, documento n.º SJ199706040002474, sumários em www.dgsi.pt.

Independentemente de ter havido procedimento prévio de inquérito, e se não o fez antes, com a nota de culpa o empregador pode suspender preventivamente o trabalhador, cfr. n.º 1 do artigo 354.º A suspensão preventiva efectuada apenas com a nota de culpa requer a verificação de requisitos menos exigentes do que a suspensão preventiva efectuada em

11 Ou seja, o empregador, por força da lei, tem de formular, antecipadamente, um juízo de prognose acerca do desfecho do processo.

12 A responsabilidade contra-ordenacional encontra-se prevista nos artigos 548.º e seguintes.

13 O empregador tem conhecimento da identificação dos delegados sindicais, bem como dos que fazem parte de comissão sindical ou intersindical, porquanto esses dados têm de lhe ser comunicados por escrito pela direcção do sindicato, o mesmo ocorrendo no caso de destituição ou cessação de funções, cfr. n.os 4 e 5 do artigo 462.º

14 Ou seja, e apesar da letra do n.º 1 do artigo 353.º parecer resultar a existência de dois documentos diversos: um para a comunicação da intenção de despedir e outro para a nota de culpa, tal não é absolutamente necessário, podendo a intenção de despedimento constar da própria nota de culpa. É uma lacuna suprível pela própria nota de culpa.

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momento anterior, e supra tratada. A suspensão preventiva realizada com a nota de culpa basta-se com a inclusão na própria nota de culpa, que a presença do trabalhador na empresa se mostra inconveniente, exigindo-se ainda que o empregador mantenha o pagamento da retribuição. Inexistindo fundamento para a suspensão preventiva do trabalhador, o empregador incorre no dever de indemnizar o trabalhador por danos não patrimoniais, cfr. artigo 483.º do Código Civil.

A nota de culpa assume uma importância que se diria vital, dado que, quando está concluída a instrução do procedimento disciplinar, não podem ser invocados na decisão do procedimento que aplique a sanção de despedimento ao trabalhador, factos não constantes daquela peça procedimental, cfr. n.º 4 do artigo 357.º Da letra do n.º 1 do artigo 353.º resulta expressamente que a nota de culpa obedece a determinadas particularidades. Uma delas, e como já referido, é que a nota de culpa tem de ser reduzida a escrito, sob pena do procedimento dever ser con- siderado inválido, cfr. alínea a) do n.º 2 do artigo 382.º, além de fazer incorrer o empregador numa contra-ordenação, caso venha a despedir o trabalhador sem antes lhe ter comunicado a nota de culpa reduzida a escrito, cfr. n.º 4 do artigo 353.º Enquanto peça acusatória, a lei não se basta com a sua redução a escrito, exigindo ainda que a nota de culpa descreva circunstanciadamente os factos imputados ao infractor, parti- cularizando o lugar, o tempo e o modo dos comportamentos atribuídos ao trabalhador, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 2004, Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 2004, tomo II, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Dezembro de 2007, documento n.º SJ200712190034224, disponível em www.dgsi.pt. Caso não sejam particularizados o lugar, tempo e modo dos factos imputados ao trabalhador, a consequência é, mais uma vez, a mais grave, ou seja, a própria invalidade do procedimento, cfr. alínea a) do n.º 2 do artigo 382.º Acresce que o empregador incorre na prática de uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, se vier a despedir o trabalhador sem a descrição circunstanciada.

Outra das particularidades é que a nota de culpa não tem que proceder ao arrolamento das testemunhas que a suportam. Neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Fevereiro de 2004, documento n.º SJ200402040039464, disponível em www.dgsi.pt. Também não tem que ser referido o local onde pode ser consultado o processo, cfr. o mesmo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Fevereiro de 2004. E não tem igualmente na nota de culpa, de se indicar quando pode

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ser consultado o processo, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Outubro de 1995, Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal de Justiça, 414.º, e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Abril de 1996, Boletim do Trabalho e Emprego, 2.ª Série, n.º 7-8-9/97.

Outra particularidade digna de referência é que na nota de culpa não tem de se proceder à junção dos documentos que a suportam. Realizada a descrição circunstanciada, permitir-se-á ao trabalhador conhecer os factos que lhe são imputados, em termos de sobre os mesmos se poder defender, não se exigindo por isso a junção de quaisquer documentos.

Contemporaneamente com a comunicação da nota de culpa e a intenção de despedimento, impõe-se ao empregador o envio de cópia integral destes dois documentos à comissão de trabalhadores15 e à associação sindical, quando o trabalhador seja representante sindical, cfr. n.º 2 do artigo 353.º Caso não sejam enviados aqueles documentos a estas estruturas, e ainda assim o empregador venha a despedir o trabalhador, incorre na prática de uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, por aplicação do n.º 4 do artigo 353.º

2.2. A defesa e instrução subsequente

Nos três dias úteis após a recepção da nota de culpa, o trabalhador pode comunicar ao empregador a identificação da associação sindical que poderá pronunciar-se relativamente ao procedimento disciplinar, cfr.

n.º 6 do artigo 356.º Voltaremos a este ponto infra.

No prazo de dez dias úteis após a recepção da nota de culpa tem lugar a consulta do procedimento disciplinar, sendo que nesse mesmo prazo pode o trabalhador apresentar a resposta à nota de culpa, cfr. n.º 1 do artigo 355.º Sendo actos procedimentais distintos trataremos cada um deles isoladamente, começando pela consulta do processo.

Quanto à consulta, entende-se que é um direito abrangido pelo direito de audiência e defesa, direito este decorrente dos direitos, liberdades e garantias, com assento constitucional, cfr. n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. Contudo, não é um dever do trabalhador, mas um direito que lhe assiste. É ao trabalhador, perante a

15 O empregador tem conhecimento da existência da comissão de trabalhadores e das subcomissões de trabalhadores, bem como da identificação dos seus membros, porquanto a constituição da comissão e das subcomissões de trabalhadores, é precedida de votação cujos resultados têm de ser comunicados ao órgão de gestão da empresa, cfr. n.º 6 do artigo 432.º

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factualidade descrita na nota de culpa, que cabe aferir da necessidade ou não de proceder à consulta do processo, cabendo ao empregador facultar o processo apenas quando o trabalhador o solicite. Concretizando-se uma violação do direito de consulta do procedimento, a consequência é a invalidade do procedimento cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo 382.º A mais, consubstancia uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, o empregador que despedir o trabalhador com violação do direito de consulta, cfr. n.º 2 do artigo 355.º

A consulta do procedimento disciplinar revela algumas particulari- dades. Assim, e por aplicação subsidiária da lei processual penal16 é de admitir que, depois de notificado da Nota de Culpa, o trabalhador tem direito a consultar o processo disciplinar com vista ao despedimento a todo o tempo, por aplicação subsidiária da Lei Processual Penal, artigos 86.º e 89.º A consulta inclui o procedimento prévio de inquérito, se já terminado, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10 de Maio de 2001, processo 340-2001, disponível em www.dgsi.pt, incluindo também a reprodução escrita do processo. Quando o Instrutor e man- datário do trabalhador sejam ambos advogados, a reprodução deve ser

16 A aplicação da lei processual penal decorre do n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece que: “Nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.” Este preceito da Lei Fundamental prevê assim que sejam assegurados ao arguido, nos processos sancionatórios, os direitos de audiência e defesa, incluindo, enquanto processos sancionatórios típicos, os próprios procedimentos disciplinares.

O direito de audiência e defesa corresponderá assim a um direito fundamental o que impõe, segundo a jurisprudência, que se apliquem subsidiariamente, com as necessárias adaptações, as regras da lei processual penal que se destinem a preservar o núcleo essencial do direito de defesa e audiência, começando por aquelas que visem assegurar um tratamento justo e imparcial do arguido. Neste sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de Setembro de 2003, processo 02S3739, disponível em www.dgsi.pt. Também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de Novembro de 2003, processo 02S3502, disponível em www.dgsi.pt, entendeu aplicável ao procedimento disciplinar laboral o artigo 121.º do Código de Processo Penal, no sentido de que as nulidades, mesmo que se não encontrem dependentes da arguição das partes, ficam sanadas, designadamente, se os interessados “se tiverem prevalecido da faculdade a cujo exercício o acto anulável se dirigia” [n.º 1, alínea c)] ou, no caso nulidade respeitante a vício de notificação ou de convocação para acto processual, se “a pessoa interessada comparecer ou renunciar a comparecer ao acto” (n.º 2). Já o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 27 de Novembro de 2002, processo 0054504, disponível em www.dgsi.pt, entendeu que:

“Ainda que se admita que, atento o fim sancionatório em vista, o processo disciplinar deve ser imbuído de uma filosofia garantística de algum modo paralela à do processo penal, isso não significa, sem mais, a aplicação estrita das normas do processo penal.”

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mecânica, através de telecópias sob pena de responsabilidade disciplinar, cfr. artigo 106.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro17, salvo se a reprodução mecânica constituir motivo grave. Outra das particularidades da consulta, é que esta pode ser realizada perante as pessoas designadas pelo empregador, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13-07-1988, docu- mento n.º RL198807130001870, sumários em www.dgsi.pt. De acordo com o artigo 5.º do Código de Processo do Trabalho18, as associações sindicais têm legitimidade para proceder à consulta do processo, o que resultaria ainda da aplicação subsidiária do artigo 90.º do Código de Processo Penal. Nada obsta a que o empregador, ou o Instrutor em nome daquele, proceda à prorrogação do prazo para exercício do direito de consulta, por aplicação subsidiária do n.º 6 do artigo 107.º do Código de Processo Penal. Note-se contudo que a prorrogação do prazo não é um direito que assiste ao trabalhador. O que poderá suceder é que, sendo requerida a prorrogação, o empregador a conceda, não existindo nada na lei que o obrigue a fazê-lo. Quanto ao local onde deve realizar-se a consulta, a lei é omissa. Não obstante, o procedimento disciplinar há-de poder ser consultado num dos seguintes locais: i) no local de trabalho; ii) no estabelecimento onde se situa o departamento de recur- sos humanos da empresa; iii) na sede; ou iv) no escritório do Instrutor.

Dever-se-á atender à prática da empresa em processos anteriores, em nome de princípio da boa-fé, cfr. n.º 1 do artigo 126.º e n.º 2 do artigo 762.º do Código Civil. O que não se admite, sob pena de invalidade do procedimento disciplinar, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Janeiro de 2005, processo 04S3040, disponível em www.dgsi.

pt, é a deslocação do processo, sem justificação, tornando a consulta mais difícil e onerosa, o que viola o direito de consulta do trabalhador, cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo 382.º

Como se disse supra, no mesmo prazo de dez dias úteis, após a recepção da nota de culpa, em que tem lugar a consulta do procedimento disciplinar, pode o trabalhador apresentar a resposta à nota de culpa, cfr. n.º 1 do artigo 355.º A apresentação de resposta à nota de culpa

17 E alterado pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, e pela Lei n.º 12/2010, de 25 de Junho.

18 Cfr. Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de Dezembro, 38/2003, de 8 de Março, e 295/2009, de 13 de Outubro, e pela Lei n.º 63/2013, de 27 de Agosto.

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entende-se que é um direito abrangido pelo direito de audiência e defesa, direito este decorrente dos direitos, liberdades e garantias, com assento constitucional, cfr. n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. Preterindo-se o direito do trabalhador apresentar a resposta à nota de culpa, a consequência é a invalidade do procedimento cfr.

alínea c) do n.º 2 do artigo 382.º Caso seja violado o direito do traba- lhador apresentar a sua defesa, através da resposta à nota de culpa, e ainda assim o empregador venha a despedir o trabalhador, incorre o primeiro na prática de uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, por aplicação do n.º 2 do artigo 355.º A resposta à nota de culpa apresenta algumas particularidades que se exige delinear, para conhecer o seu regime. Antes de mais, o trabalhador não é obrigado a apresentar a resposta à nota de culpa, não existindo qualquer cominação se o não fizer. É que, o princípio do contraditório não vigora na sua plenitude no procedimento disciplinar, antes sendo reservado para a eventual impugnação judicial do despedimento, a que o trabalhador decida recorrer, podendo entender o trabalhador no decorrer da tramitação do procedimento disciplinar que só em tribunal se deverá pronunciar relativamente aos factos que lhe são imputados na nota de culpa. A opção por não responder à nota de culpa, não implica por isso qualquer confissão por parte do trabalhador. Assim, a apresentação da resposta à nota de culpa não é um dever do trabalhador, mas um direito que lhe assiste. Por outro lado, a resposta à nota de culpa é uma decla- ração receptícia19, que necessita de ser dada a conhecer ao destinatário, sendo eficaz logo que chega ao poder do destinatário ou dele é conhecida, cfr. artigo 224.º do Código Civil, pelo que a sua apresentação deve ser feita até ao termo dos dez dias úteis. O ónus da prova de que a resposta à nota de culpa foi apresentada fora do prazo incumbe ao empregador, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de Janeiro de 1988, BTE, 2.ª série, n.os 4-5-6/90.

Uma vez apresentada a resposta à nota de culpa, procedimentalmente seguir-se-á a realização das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador. Nos termos do n.º 1 do artigo 356.º, a realização das dili- gências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa é obrigatória,

19 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Março de 1990, Recurso n.º 2402, Actualidade Jurídica, 7.º/90, página 23.

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salvo se patentemente dilatórias ou impertinentes20, devendo nesse caso tal ser alegado fundamentadamente por escrito21. Consubstanciando-se uma violação da realização das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador arguido, a consequência é a invalidade do procedimento, porquanto a efectivação das diligências se acham abrangidas pelo direito de audiência e defesa que decorre dos direitos, liberdades e garantias, cfr.

n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. Admite- -se que o trabalhador utilize, no âmbito da prova que se propõe fazer, todos os meios de prova: testemunhal (sendo permitida a acareação), documental (documentos escritos, reproduções mecânicas) e pericial22. Usualmente, os trabalhadores a quem foi instaurado um procedimento disciplinar recorrem maioritariamente – sem desprimor da prova docu- mental – à prova testemunhal, no intuito de lograrem fazer prova dos

20 A Lei não diz o que se deve entender por diligências probatórias patentemente dilatórias ou impertinentes. Por estas devem entender-se aquelas diligências probatórias que não se relacionam nem com os factos imputados ao trabalhador, nem com os factos constantes da resposta à nota de culpa, ou ainda que constem desta última não são sus- ceptíveis de atenuar a responsabilidade do trabalhador, e o seu desígnio é tão-somente protelar a prolação da decisão final. Por outras palavras, são diligências probatórias desnecessárias.

21 Para tanto, e atendendo a que a diligência probatória foi indicada pelo trabalhador, e que a sua defesa é, como se disse, um direito que lhe assiste, com tutela constitucional, deve o empregador, ou o Instrutor nomeado, comunicar ao trabalhador a não realização da diligência, antes mesmo da prolação da decisão final, bem como a fundamentação da sua não efectivação. Caso o trabalhador, em resposta à comunicação, venha a solici- tar a substituição da diligência probatória por uma outra que não deva ser considerada patentemente dilatória ou impertinente, deve entender-se esta nova diligência como sendo de realização obrigatória. Em sentido contrário, entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, de 19 de Janeiro de 2011, processo 673/09.9TTVFX.L1-4, disponível em www.

dgsi.pt: “Por outro lado, não se diga que a justificação para a não audição das referidas testemunhas deveria ter sido comunicada ao trabalhador arguido antes da elaboração do relatório final e da decisão final do processo disciplinar. É que a lei nada dispõe a esse respeito, o que releva é que o trabalhador fique a saber quais os motivos da não realização de uma diligência requerida na resposta à nota de culpa, nada obstando a que essa indicação fundamentada possa ser efectuada no relatório final que é entregue ao trabalhador com a decisão final.”

22 Se o trabalhador indicou um dos meios de prova, não deve o empregador, nem o Instrutor em seu nome, substituir um desses meios por um outro, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de Setembro de 2010, processo 235/07.5TTMAI.P1.S1, dis- ponível em www.dgsi.pt, que entendeu que: “A junção ao procedimento disciplinar de uma cópia da resposta à nota de culpa que cada uma das três testemunhas não inquiridas apresentou no respectivo procedimento disciplinar não substitui a sua inquirição.”

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argumentos por eles aduzidos na resposta à nota de culpa. É ao traba- lhador que incumbe assegurar a comparência das testemunhas que tenha indicado, cfr. n.º 4 do artigo 356.º, pelo que, e para dar cumprimento a este dever, deve o trabalhador ser notificado do local, hora e data em que as inquirições das testemunhas de defesa terão lugar. De notar que o advogado do trabalhador pode estar presente nas inquirições das testemunhas indicadas, cfr. n.º 3 artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, e n.º 2 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa. Não obstante poder estar presente, o advogado do trabalhador não tem direito a proceder à inquirição das testemunhas apresentadas, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4 de Fevereiro de 2004, documento n.º SJ200402040039464, disponível em ww.dgsi.pt. Não obstante, quando o Instrutor e o mandatário do trabalhador sejam ambos advogados, o Instrutor deverá permitir a intervenção do mandatário do trabalhador na inquirição das testemunhas por este último apresentadas, sob pena de poder o Instrutor incorrer em responsabilidade disciplinar, por violação do dever de lealdade, cfr. alínea d) do n.º 1 do artigo 107.º do Estatuto da Ordem dos Advogados e do dever de solidariedade previsto no artigo 106.º daquele mesmo Estatuto da Ordem dos Advogados23.

Nada veda que o empregador aproveite a realização das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador, para realizar ele próprio, por si, ou através de Instrutor para tanto nomeado, as diligências probatórias do seu interesse, designadamente para prova dos factos que imputa ao arguido, e que possam vir a ser úteis à decisão, por uma das sanções possíveis de aplicar, que o empregador terá de vir a tomar24.

Uma vez realizadas as diligências probatórias, deve proceder-se ao envio de cópia integral do processo à comissão de trabalhadores e à associação sindical respectiva, quando o trabalhador seja representante sindical, cfr. n.º 5 do artigo 356.º No prazo de cinco dias úteis, pode a comissão de trabalhadores e a associação sindical respectiva, quando o trabalhador seja representante sindical, emitir um parecer fundamentado, para junção ao processo disciplinar. Quando o trabalhador tenha, nos

23 A violação de qualquer dever deontológico previsto para os Advogados no seu Estatuto, não acarreta qualquer consequência jurídica para o procedimento disciplinar, cingindo os seus efeitos ao poder disciplinar que a Ordem dos Advogados mantém sobre os seus membros, cfr. n.º 1 do artigo 109.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

24 Voltaremos a este ponto infra.

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três dias úteis após a recepção da nota de culpa, comunicado ao empre- gador a identificação da associação sindical que poderá pronunciar-se relativamente ao procedimento disciplinar25, não há apresentação de cópia do processo à comissão de trabalhadores. Consubstancia uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sin- dical, o empregador que despedir o trabalhador com violação do dever de realização das diligências probatórias, cfr. n.º 7 do artigo 356.º O mesmo sucede, incorrendo o empregador em contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, quando aquele despe- dir o trabalhador com violação do dever de envio de cópia integral do processo às estruturas definidas por lei e supra identificadas, cfr. n.º 7 do mesmo artigo 356.º

O envio de cópia integral do processo à comissão de trabalhadores (quando exista), e à associação sindical (quando o trabalhador seja repre- sentante sindical), deve fazer-se após a recepção da resposta à nota de culpa (quando não tenham sido requeridas pelo trabalhador a realização de diligências probatórias), ou após o prazo para apresentação daquela resposta (se o trabalhador a não apresentou) ou ainda após a realização das diligências probatórias.

No mesmo momento em que o empregador deve enviar cópia inte- gral do processo à comissão de trabalhadores e à associação sindical respectiva, quando o trabalhador seja representante sindical (ou seja, depois de realizadas as diligências probatórias), deve remeter cópia do processo à entidade competente na área da igualdade de oportunidade entre homens e mulheres, a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE). Esta exigência abrange apenas o arguido em procedi- mento disciplinar com intenção de despedimento, que tenha a qualidade de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, ou de trabalhador em gozo de licença parental, cfr. n.º 1 do artigo 63.º, e destina-se a que aquela entidade possa emitir o seu parecer prévio, dado que o despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, ou de trabalhador no gozo de licença parental, carece de parecer prévio26.

25 Não obstante esta identificação, da interpretação conjunta do n.º 6 do artigo 356.º, com as normas relativas às associações sindicais, cfr. artigos 440.º e seguintes, a intervenção da associação sindical identificada está condicionada à verificação de dois pressupostos: a necessidade de filiação do próprio trabalhador, e exercício pelo trabalhador de profissão cujos interesses a associação sindical defenda e promova.

26 O parecer da CITE em caso de despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, ou de trabalhador no gozo de licença parental é, por força do regime estatuído no

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A CITE deve comunicar o seu parecer ao empregador e ao trabalha- dor, nos 30 dias subsequentes à recepção do processo, considerando-se em sentido favorável ao despedimento quando não for emitido dentro daquele prazo, cfr. n.º 4 do mesmo artigo 63.º

Constitui uma contra-ordenação grave o despedimento de trabalha- dora grávida, puérpera ou lactante, ou de trabalhador em gozo de licença parental, sem ter sido antecedido de parecer favorável da CITE a esse despedimento, cfr. n.º 9 do artigo 63.º

Após o envio de cópia do processo para emissão dos necessários pareceres, quando aplicáveis, deve o empregador, subsequentemente, juntar ao processo aqueles pareceres que lhe forem enviados.

2.3. A ponderação e a decisão da sanção

Depois de recebidos os pareceres devidos, ou decorrido o prazo para tanto, quando aqueles devam ter lugar, ou, não o tendo, após a realização da última diligência probatória, o empregador tem o dever de proferir a decisão final. É na decisão final que o empregador aprecia a justa causa do despedimento27. Esta decisão tem de ser proferida no prazo de trinta dias, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de Maio de 2008, documento n.º SJ2008051406434, disponível em www.dgsi.pt.

O prazo dos 30 dias só começa a correr, a partir da recepção pelo empregador dos pareceres supra referidos, cfr. n.º 1 do artigo 357.º ou, quando não exista comissão de trabalhadores e o trabalhador não seja

artigo 63.º, não só obrigatório, como vinculativo. Neste sentido, o n.º 6 deste artigo 63.º estabelece que se o parecer for desfavorável ao despedimento, o empregador só o pode efectuar após decisão judicial que reconheça a existência de motivo justificativo, devendo a acção ser intentada nos 30 dias subsequentes à notificação do parecer. Refira-se ainda que, nos termos do n.º 5, cabe ao empregador provar que solicitou o parecer da CITE.

27 A noção de justa causa de despedimento, cfr. artigo 351.º, exige a verificação cumulativa de dois requisitos: i) um comportamento ilícito e culposo do trabalhador, violador de deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral, grave em si mesmo e nas suas consequências; ii) que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral. Verifica-se a impossibilidade prática e imediata de sub- sistência da relação laboral quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do primeiro a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral. Nestes termos, a sanção expulsiva deve ser reservada a situações extremas, em que não seja razoavelmente equacionável a aplicação de uma qualquer outra sanção conservatória.

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representante sindical, da ultimação das diligências probatórias, cfr. n.º 2 do artigo 357.º Como já mencionado, as diligências probatórias tanto podem ser as requeridas pelo trabalhador, como aquelas que o empre- gador, ou o Instrutor, considera úteis efectuar28.

Importa mencionar que em lado algum o Código do Trabalho impõe que seja realizado um qualquer relatório de procedimento disciplinar.

A prática mostra que é frequente estes relatórios serem realizados, talvez por influência do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas29, onde são em regra obrigatórios. Trata-se de um documento escrito, elaborado pelo Instrutor, ou mesmo pelo emprega- dor, onde são sistematizados os factos imputados, a defesa apresentada, as diligências empreendida, o que deve ser ponderado, e comumente o respectivo enquadramento jurídico. Quando efectuados, estes relatórios não relevam por isso para a contagem do prazo dos 30 dias.

O prazo de 30 dias determinado pelo n.º 1 do artigo 357.º não é o prazo que o empregador deve observar para notificar o trabalhador da sanção de despedimento decidida pela empresa, mas tão só o prazo para proferir a decisão final de despedimento sem indemnização ou compensação, de acordo com os mais recentes entendimentos jurisprudenciais30. Por outras palavras, o prazo de 30 dias é para o empregador proceder à prolação ou pronúncia da decisão, não se incluindo nesse prazo a tomada de conheci- mento da decisão pelo trabalhador, que pode ser posterior. Ou seja, desde que o empregador decida a sanção de despedimento, sem indemnização

28 Já há muito, cfr. o nosso Prática e Procedimentos do Processo Disciplinar, Princípia Editora, Março 2007, páginas 43 e seguintes, que vínhamos defendendo que a referência a “diligência probatória” efectuada actualmente no n.º 5 do artigo 356.º abrange as diligências probatórias indicadas pelo empregador e que possam ser proveitosas à decisão pela sanção que vier a ser tomada, não se limitando às diligências probatórias requeridas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa. Neste sentido tem vindo ultima- mente a entender a jurisprudência, cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de Maio de 2008, documento n.º SJ2008051406434, de 7 de Outubro de 2010, processo 887/07.6TTALM.L1.S1, de 7 de Março de 2012, processo 17/10.7TTEVR.E1.S1, e de 13 de Novembro de 2013, processo 196/12.9TTBRR.L1.S1, todos disponíveis em www.

dgsi.pt, e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19 de Janeiro de 2011, processo 673/09.9TTVFX.L1-4, disponível em www.dgsi.pt.

29 Aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.

30 Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de Maio de 2008, documento n.º SJ2008051406434, de 7 de Outubro de 2010, processo 887/07.6TTALM.L1.S1, de 7 de Março de 2012, processo 17/10.7TTEVR.E1.S1, e de 13 de Novembro de 2013, processo 196/12.9TTBRR.L1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

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ou compensação, dentro do prazo legal dos 30 dias, o trabalhador a quem aquela decisão será comunicada, poderá só ter conhecimento da sanção decidida em momento posterior ao termo do prazo de 30 dias31.

A decisão final tem também de ser realizada por escrito, cfr. n.º 5 do artigo 357.º e tem de ser fundamentada, cfr. o mesmo n.º 5 do artigo 357.º A violação de algum destes requisitos da decisão final tem como consequência a invalidade do procedimento, cfr. alínea d) do n.º 2 do artigo 382.º O despedimento é ainda ilícito se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente, cfr. alínea b) do artigo 381.º Acresce ainda que consubstancia uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, o empregador que despedir o trabalhador com violação dos requisitos a que deve obedecer a decisão final, cfr. n.º 8 do artigo 357.º

A decisão final tem também algumas particularidades que importa conhecer. Desde logo, a decisão final tem de ser proporcional, cfr. n.º 1 do artigo 330.º Tem também de ser adequada à culpabilidade do trabalhador, cfr. n.º 4 do artigo 357.º, não podendo ser invocados factos não constantes da nota de culpa ou da resposta à nota de culpa, salvo se atenuarem a responsabilidade do trabalhador, cfr. n.º 4 do artigo 357.º32 Tem de ser tomada, em princípio pelo empregador e não pelo Instrutor33, constituindo uma declaração receptícia. A prática disciplinar anterior da empresa deve ser atendida. Se não for tida em conta a prática disciplinar da empresa, o ónus da prova é do trabalhador, cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 7 de Fevereiro de 2007, documento n.º SJ200702070028394, de 22 de Março de 2007, documento n.º SJ200703220046094, e de 30 de

31 Assim entendido, o trabalhador de uma sociedade anónima pode só ter conhecimento da decisão de despedimento, sem indemnização ou compensação, várias semanas após o conselho de administração ter decidido aplicar-lhe aquela sanção, desde que aquele conselho de administração decida no prazo de 30 dias após a recepção dos pareceres, ou da última diligência probatória, quando não haja lugar há emissão de pareceres.

32 Quando na decisão final de despedimento se invocarem factos que não consta- vam da nota de culpa – e estes factos não foram referidos na defesa do trabalhador, nem servem para atenuar ou diminuir a sua responsabilidade – tal consubstancia uma extrapolação dos factos da acusação efectuada ao trabalhador, violando-se o disposto no n.º 4 do artigo 357.º, o que tem como consequência a invalidade do procedimento disciplinar, cfr. alínea d) do n.º 2 do artigo 382.º Igual efeito terá a decisão final inade- quada à culpabilidade do trabalhador.

33 Só assim não é quando o Instrutor beneficie de mandato reduzido a escrito, com representação especial, cfr. n.º 2 do artigo 1159.º do Código Civil. Vide o que se disse supra.

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Abril de 2008, documento n.º SJ2008043002414, todos disponíveis em www.dgsi.pt, ou seja, é ao contraente trabalhador que incumbe provar que o empregador não aquilatou o modo como vinha exercendo o poder disciplinar no interior da organização.

Uma vez proferida a decisão final, o empregador deve comunicá-la, através do envio de cópia da decisão final escrita ao trabalhador, à comis- são de trabalhadores e à associação sindical, quando aplicável, cfr. n.º 6 do artigo 357.º Na eventualidade de não o fazer, o empregador incorre na prática de uma contra-ordenação grave, ou muito grave, no caso de representante sindical, quando despedir o trabalhador sem comunicar a decisão final escrita de despedimento ao trabalhador e às estruturas devidas, cfr. n.º 8 do artigo 357.º

2.4. A execução da sanção e sua impugnação

A sanção disciplinar de despedimento é eficaz logo que chega ao poder do trabalhador ou é dele conhecida ou, ainda, quando só por culpa do trabalhador não foi por ele oportunamente recebida, cfr. n.º 7 do artigo 357.º Significa isto que, quando for eficaz a sanção disciplinar, de despedimento sem indemnização ou compensação, determina a cessação do contrato de trabalho. Esta cessação é imediata após o conhecimento, ou após a recepção não conseguida da comunicação, apenas por facto imputável a título de culpa ao trabalhador. E é igualmente eficaz nos casos de suspensão do contrato de trabalho34, uma vez que a suspensão do contrato de trabalho não impede que qualquer das partes – trabalhador ou empregador – faça cessar o contrato nos termos gerais, cfr. n.º 3 do artigo 295.º

Proferida a decisão final de despedimento, o empregador deve registar esta sanção em registo actualizado das sanções disciplinares, registo esse que se destina a permitir facilmente a verificação do cumprimento das disposições legais aplicáveis, nomeadamente por parte da autoridade competente, a Autoridade para as Condições do Trabalho, que solicite

34 Entre as situações de suspensão podem indicar-se, exemplificadamente, o estado de doença do trabalhador, que não lhe seja imputável e se prolongue por mais de um mês, cfr. n.º 1 do artigo 296.º, o acidente do trabalhador que também não lhe seja imputável e se prolongue igualmente por mais de um mês, cfr. o mesmo n.º 1 do artigo 296.º, o encerramento e diminuição temporários de actividade do empregador, cfr. artigos 298.º e seguintes, a licença sem retribuição, cfr. artigo 317.º, ou a pré-reforma, artigos 318.º e seguintes.

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a sua consulta, cfr. n.º 1 do artigo 332.º A ausência de registo, ou a sua desactualização constitui contra-ordenação leve, cfr. n.º 2 do artigo 332.º

Conhecendo a decisão final de despedimento, o trabalhador poderá desde logo requerer a suspensão judicial preventiva do despedimento35. Para este efeito, dispõe do prazo de cinco dias úteis, a contar da data da recepção da comunicação de despedimento, para instaurar a providência cautelar, cfr. artigo 386.º

Independentemente do trabalhador requerer a suspensão judicial preven- tiva do despedimento, poderá intentar uma acção judicial de impugnação do despedimento. Esta acção está sujeita a um prazo, que é de apenas 60 dias, contados a partir da recepção da comunicação de despedimento, cfr. n.º 2 do artigo 387.º36 Nesta acção judicial, por imposição legal, para a sindicância judicial do despedimento, o empregador está limitado nos factos e fundamentos de que pode lançar mão, apenas podendo invocar aqueles que constem da decisão de despedimento comunicada ao traba- lhador, cfr. n.º 3 do artigo 387.º Na acção judicial de impugnação do despedimento o ónus da prova da verificação do despedimento incumbe ao trabalhador, cfr. n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil. Já o ónus da prova dos factos que integram a justa causa37 incumbe ao empregador38.

A impugnação do despedimento terá início com a apresentação, pelo trabalhador, de requerimento em formulário próprio39, junto do tribunal competente, cfr. o mesmo n.º 2 do artigo 387.º Quando seja intentada uma acção de apreciação judicial do despedimento por facto imputável ao trabalhador, sem prejuízo da apreciação de vícios formais, os tribu- nais têm sempre de se pronunciar sobre a verificação e procedência dos

35 Através de providência cautelar especificada regulada nos artigos 34.º e seguintes do Código de Processo do Trabalho.

36 Relativamente ao prazo para instaurar a acção judicial de impugnação do despe- dimento, quando não exista uma decisão final de aplicação da sanção de despedimento, reduzida a escrito, é de um ano, a contar da data do despedimento, cfr. n.º 1 do artigo 337.º Ou seja, nas situações de despedimento oral do trabalhador, este último, pretendendo impugnar aquele despedimento deverá recorrer a uma acção comum, cfr. artigos 51.º e seguintes do Código de Processo do Trabalho, dentro do prazo de um ano.

37 Sobre a justa causa vide artigo 351.º

38 Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 4 de Junho de 1997, documento n.º SJ199706040001614, sumários em www.dgsi.pt, que entendeu que: “incumbe à entidade patronal provar os factos integradores do despedimento e a demonstração da sua licitude; ao trabalhador, a prova dos factos impeditivos da licitude”.

39 O modelo do formulário foi aprovado pela Portaria n.º 1460-C/2009, de 31 de Dezembro.

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fundamentos invocados para o despedimento, cfr. n.º 4 do mesmo artigo 387.º Por fim, quando ocorra uma mera irregularidade formal, por omissão das diligências probatórias referidas nos n.os 1 e 3 do artigo 356.º, se o tribunal entender que apesar daquela deficiência do procedimento ainda assim existiam motivos justificativos para o despedimento, o trabalhador tem direito a apenas metade da indemnização prevista para a ilicitude de despedimento, cfr. n.º 2 do artigo 389.º Significa isto, que nesta situação concreta de mera irregularidade formal, e por consequência do disposto naquele n.º 2 do artigo 389.º, o trabalhador deixará, de auferir os salá- rios intercalares, ou seja, os salários que se venceriam entre a data do despedimento e a data em que a decisão do tribunal se torna definitiva, ou seja, o trânsito em julgado da decisão do tribunal.

2.5. O regime especial em microempresas

Este estudo não ficaria completo se não atentássemos no regime especial das microempresas, ainda que sumariamente.

Na verdade, o legislador consagrou relativamente a estas empresas que empregam menos de 10 trabalhadores, cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 100.º uma tramitação menos formalística, com vista a tornar o procedimento disciplinar com intenção de despedimento mais célere, quando compa- rativamente à tramitação que deverá obedecer o empregador de qualquer outra empresa privada. Este regime encontra-se previsto no artigo 358.º A tramitação a seguir é a mesma que qualquer empregador deve adoptar quando seja intenção aplicar o despedimento, dispensando-se, nas microempresas, a apresentação de cópia da nota de culpa e da comu- nicação de intenção de despedimento, bem como de cópia integral do processo disciplinar, à comissão de trabalhadores e à associação sindical, a não ser que o trabalhador seja membro da primeira estrutura, ou seja, representante da segunda, cfr. o n.º 1 do artigo 358.º

O trabalhador pode utilizar, no âmbito da prova que se proporá fazer, todos os meios de prova: testemunhal, documental, e pericial40. A sua

40 Não era assim no Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, dado que o trabalhador de microempresa, a quem fosse instaurado um proce- dimento disciplinar com intenção de despedimento, estava condicionado na sua defesa.

Permitia-se além da junção dos documentos que o trabalhador apresentasse na sua defesa, que o trabalhador requeresse apenas a audição de testemunhas. Não lhe era lícito requerer outras diligências de prova, cfr. n.º 2 do artigo 418.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, como sucedia relativamente a uma peritagem.

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indicação é feita, como no processo que não seja em microempresa, no momento que a Lei lhe concede para apresentar a sua defesa: a resposta à nota de culpa.

Quando a trabalhadora de uma microempresa seja grávida, puérpera ou lactante, ou tratando-se de trabalhador em gozo de licença parental, e a intenção do empregador seja proceder ao seu despedimento, concluídas as diligências probatórias, ou se estas não forem requeridas na resposta à nota de culpa, após o fim do prazo para apresentar aquela resposta, deve ser remetida cópia integral do processo à CITE, para emissão de parecer prévio, nos termos supra expostos.

Na decisão e fundamentação da própria decisão, são ponderadas as circunstâncias do caso, nomeadamente no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros de traba- lho, a adequação do despedimento à culpabilidade do trabalhador, não podendo ser invocados factos não constantes da nota de culpa ou da resposta do trabalhador, salvo se atenuarem a responsabilidade. A ausên- cia da ponderação assim empreendida, ou de fundamentação na decisão de despedimento que seja comunicada ao trabalhador, tem por efeito a invalidade do procedimento disciplinar, cfr. alínea d) do artigo 382.º

Os pareceres de representantes dos trabalhadores não são tidos em conta, excepto, claro, se o trabalhador da microempresa for membro da comissão de trabalhadores, ou representante sindical.

O prazo para o empregador proferir a decisão é o mesmo, 30 dias, a contar do termo do prazo para resposta à nota de culpa, se o trabalhador não a apresentou, ou a contar da conclusão da última diligência. Se o empregador não proferir a decisão até ao termo do prazo referido, o direito de aplicar a sanção caduca, como sucede no procedimento que não seja em microempresa, cfr. o n.º 4 do artigo 358.º Valem, na microempresa, as mesmas considerações quanto à prolação da decisão de despedimento e à comunicação da mesma ao trabalhador.

A decisão é comunicada, por cópia ou transcrição, ao trabalhador, cfr.

n.º 5 do artigo 358.º, pelo que a sanção tem de ser efectuada por escrito, à semelhança do que sucede em qualquer outra empresa. Caso tal não suceda, o empregador incorre na prática de uma contra-ordenação grave, cfr. n.º 6 do artigo 358.º e torna inválido o procedimento.

Nas microempresas, desobriga-se igualmente o empregador de ter de enviar a decisão da sanção de despedimento à comissão de trabalha- dores, ou à associação sindical respectiva, excepto se o trabalhador da

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microempresa for membro daquela comissão, ou se for representante daquela associação, cfr. o mesmo n.º 1 do artigo 358.º

Valem nas microempresas o demais que se disse relativamente à invalidade do procedimento para aplicação da sanção de despedimento em empregador que não seja microempresa. Ou seja, consubstancia-se a invalidade do procedimento quando falta a nota de culpa, ou esta não seja reduzida a escrito ou não contenha a descrição circunstanciada dos factos assacados ao trabalhador. O procedimento é também inválido se o trabalhador for despedido quando não lhe foi comunicado com a nota de culpa que existia essa intenção por parte do empregador, e não tiver sido respeitado o direito do trabalhador a consultar o processo ou a responder à nota de culpa ou, ainda, se não tiverem sido realizadas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador e não consideradas patentemente dilatórias ou impertinentes.

3. Contra-ordenações laborais, breve referência

Por fim, e antes de dar por terminada a análise da tramitação do procedimento disciplinar com vista ao despedimento com justa causa, importa ainda referir, ainda que de modo sumário, que o regime das contra-ordenações laborais se encontra regulado nos artigos 548.º e seguintes, aí se dispondo, entre outros, relativamente aos valores das coimas a aplicar.

Já o regime processual aplicável às contra-ordenações laborais está previsto na Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, alterada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de Agosto.

Nos termos do artigo 560.º, a coima prevista para as contra-ordenações referidas no n.º 4 do artigo 353.º, no n.º 2 do artigo 355.º, no n.º 7 do artigo 356.º, no n.º 8 do artigo 357.º e no n.º 6 do artigo 358.º, não se aplica caso o empregador assegure ao trabalhador os direitos a que se refere o artigo 389.º41 Ou seja, estabelece-se no artigo 560.º uma dispensa de coima. Não obstante, sempre se diga que a dispensa de coima não desresponsabiliza o empregador pela prática de uma contra-ordenação laboral. O que sucede é que o empregador não tem de pagar a coima.

Assim, e ainda que tenha sido dispensado, o sujeito responsável pela

41 Ou seja, desde que o empregador indemnize o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais, e o reintegre no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º, a coima não é aplicada.

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contra-ordenação é, para todos os efeitos condenado, pelo que deve constar do registo individual organizado pela Autoridade para as Condições do Trabalho, cfr. artigo 565.º e alínea k) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de Julho, que aprovou a orgânica da Autoridade para as Condições do Trabalho. Sendo condenado, a conse- quência é que essa condenação releva para efeitos de reincidência, cfr.

artigo 561.º, o que deve ser tido em conta caso o empregador cometa nova infracção punida como contra-ordenação.

4. Conclusão

Como súmula final, julgamos poder concluir que o procedimento disci- plinar com vista ao despedimento, apesar de se encontrar especificamente regulado no Código do Trabalho, cumprindo uma tradição legislativa que se vem manifestando há vários anos, suscita ainda algumas questões não resolvidas pelo legislador, cabendo ao intérprete, em primeira linha, à doutrina e à jurisprudência, fazê-lo.

Não se trata de matéria despicienda ou de menor importância para nenhuma das partes em causa, empregador e trabalhador, com interesses opostos, o primeiro com interesse na cessação do contrato de trabalho, e o segundo na sua manutenção, pois e como resulta da análise empreendida, a violação de algumas normas e princípios aplicáveis a este procedi- mento laboral específico, é susceptível de determinar a sua invalidade.

Atentas as dúvidas de que algumas normas causam na sua aplicação concreta, julgamos que seria conveniente uma maior clarificação do iter procedimental. E até simplificação. Salvo melhor opinião, não existe uma celeridade muito superior pelo regime especial concedido ao pro- cedimento disciplinar com intenção de despedimento em microempresa, pelo que a sua eliminação não traria certamente grande desconforto aos operadores jurídicos.

Uma correcta obediência do empregador à tramitação do procedimento disciplinar com vista ao despedimento por justa causa, embora só por si não seja suficiente para colocar o empregador a salvo de um tribunal vir a determinar a ilicitude da sanção de despedimento aplicada, concorre de modo relevante para procurar diminuir as possibilidades de esse vir a ser o entendimento judicial. Por este motivo, conhecer a tramitação deste procedimento revela-se da maior importância. Esperamos ter contribuído para tal desígnio.

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Referências

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