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TRIBUTAÇÃO DO SEGURO, DO RESSEGURO E DOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA, DAS SEGURADORAS, RESSEGURADORAS E ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR, SOB A ÓPTICA DO CONSTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO

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(1)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

JULIA

DE

MENEZES

NOGUEIRA

TRIBUTAÇÃO DO SEGURO, DO RESSEGURO E DOS PLANOS

DE PREVIDÊNCIA PRIVADA,

DAS SEGURADORAS, RESSEGURADORAS E ENTIDADES DE

PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR,

SOB A ÓPTICA DO CONSTRUCTIVISMO

LÓGICO-SEMÂNTICO

DOUTORADO EM DIREITO

São Paulo

(2)

JULIA

DE

MENEZES

NOGUEIRA

TRIBUTAÇÃO DO SEGURO, DO RESSEGURO E DOS PLANOS

DE PREVIDÊNCIA PRIVADA,

DAS SEGURADORAS, RESSEGURADORAS E ENTIDADES DE

PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR,

SOB A ÓPTICA DO CONSTRUCTIVISMO

LÓGICO-SEMÂNTICO

DOUTORADO EM DIREITO

Tese apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção

do título de Doutor em Direito

Tributário sob a orientação do Prof.

Dr.

Paulo de Barros Carvalho

.

São Paulo

(3)

Banca Examinadora:

______________________________

______________________________

______________________________

______________________________

(4)

RESUMO

Nosso objetivo, neste trabalho, é analisar, sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico, as normas tributárias incidentes sobre o seguro, o resseguro e os planos de previdência privada. Também nos ocupamos da tributação incidente sobre as receitas e lucros (ou superávit) das entidades que são partes necessárias nesses contratos: seguradoras, resseguradoras, entidades abertas e fechadas de previdência complementar. A análise desses conjuntos normativos sob ponto de vista único se justifica, pois os contratos em foco e as atividades desenvolvidas pelas referidas entidades têm como objetivo comum garantir cobertura de riscos. No caso do seguro, riscos de qualquer natureza, bastando que sejam lícitos e submetidos às categorias de seguro de dano e seguro de pessoas. No caso da previdência privada, protege-se primordialmente o risco social da velhice. No último capítulo, nos concentramos sobre o sistema construído no País, nas últimas duas décadas, voltado à tributação dos planos de previdência privada. Analisamos cada uma de suas etapas, para concluir que atualmente se adota regime denominado “IIT”, segundo o qual há isenção e dedutibilidade na etapa das contribuições, isenção na etapa da acumulação dos recursos no plano, havendo tributação somente por ocasião da percepção dos benefícios, ou resgate, pelo beneficiário, privilegiando-se a poupança de longo prazo em detrimento do consumo imediato.

(5)

ABSTRACT

The goal of this thesis is to analyze, from the perspective of Logical-Semantic Constructivism, all the tax norms incident on insurance, reinsurance and pension plans. We also went through the tax rules applicable to revenues and profits (or surplus) of the

entities that are necessary parties to those contracts: insurers, reinsurers, open and closed private pension entities. The analysis of these normative sets under a single point of view is justified, since the contracts on focus and the activities of these entities have a common goal of ensuring risks. In the case of insurance risks, the risks must only be lawful and subject to the categories of damage insurance and personal insurance. In the case of private pension, it protects primarily the social risk of old age. Regarding the taxation of the entities, identity is shown in many aspects, especially the requirement for establishment of technical provisions to meet the future obligations, providence that must necessarily be observed by the Tax Law. In the last chapter, we concentrate on the system built in Brazil, during the last two decades, regarding the taxation of private pension plans. We analyzed each of its stages, to conclude that currently a scheme called "EET" (exemption/exemption/taxation) is adopted, according to which in the first step exemption and deductibility of contributions are granted, in the second step there is also income tax exemption during the accumulation of resources in the plan, with taxation only in the third stage, when the perception of benefits or redemption by the beneficiary occurs, privileging the long-term savings as opposed to the immediate consumption of the income.

(6)

Sumário

INTRODUÇÃO ... 9

1 PREMISSAS METODOLÓGICAS ... 15

1.1 O Risco na Sociedade Contemporânea ... 15

1.2 Sistema Jurídico sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico ... 17

1.3 Norma Jurídica como expressão mínima irredutível de manifestação do dêontico ... 22

1.4 Teoria da Regra-Matriz de Incidência Tributária ... 26

2 PRINCÍPIOS RELACIONADOS À ATIVIDADE SECURITÁRIA ... 29

2.1 Noção de Princípio ... 29

2.2 O Seguro e a Previdência Complementar na Constituição ... 31

2.3 O Princípio do Mutualismo ou Solidariedade ... 35

2.4 O Princípio da Capitalização ... 38

2.5 Outros princípios aplicáveis ao Seguro e à Previdência Privada ... 43

3 TRIBUTAÇÃO DO SEGURO E DO RESSEGURO ... 46

3.1 Definição do conceito de seguro ... 46

3.2 Definição do conceito de resseguro ... 51

3.2.1 Peculiaridades dos contratos de seguro e resseguro a serem consideradas pelo Direito Tributário ... 54

3.2.2 Imposto sobre Operações Financeiras – Seguro ... 56

3.2.2.1 Competência constitucional para a instituição do IOF – Seguro ... 56

3.2.2.2 Enunciados de competência do CTN acerca do IOF – Seguro ... 59

3.2.2.3 RMIT do IOF – Seguro ... 61

3.3 Imposto sobre a Renda na Fonte sobre remessas de prêmio de seguro ao exterior ... 62

3.2.1 Princípios da Territorialidade e da Universalidade ... 63

3.2.2 Definição da alíquota aplicável a remessas de prêmio de seguro e resseguro ... 66

3.2.3 Redução da base de cálculo do IRRF nas remessas de prêmio de resseguro ... 71

(7)

3.2.5 Aplicação do artigo 7º do Tratado Modelo da OCDE aos pagamentos de

prêmio de seguro e resseguro ao exterior ... 74

3.2.5.1 Tratados Internacionais – Modelo da OCDE ... 74

3.2.5.2 Tratamento atribuído aos rendimentos de serviços ... 76

3.2.5.3 Aplicabilidade do artigo 7º aos prêmios de seguro e resseguro ... 83

3.4 PIS e COFINS-Importação sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro ao exterior – Hipótese de não-incidência tributária ... 85

3.5 Tributação da indenização recebida pelo segurado ... 87

3.5.1 Definição do conceito de indenização ... 87

3.5.2 A indenização no contrato de seguro ... 88

3.5.3 Distinção entre os conceitos de indenização e renda ... 91

3.5.3.1 Renda versus transferências patrimoniais ... 94

3.5.3.2 Indenização por prejuízos extrapatrimoniais versus renda ... 98

3.5.3.3 Pagamento do capital segurado versus renda ... 103

3.5.3.4 Indenização por lucros cessantes versus renda ... 107

3.5.3.5 Indenização superior ao valor contábil versus renda ... 108

3.5.4 Não incidência de PIS e COFINS sobre indenizações ... 111

3.5.4.1 Jurisprudência do CARF e da CSRF ... 115

4 TRIBUTAÇÃO DAS SEGURADORAS E RESSEGURADORAS ... 120

4.1 Definição dos conceitos de Seguradora e Resseguradora ... 120

4.2 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário ... 123

4.3 PIS e COFINS devidos pelas Seguradoras e Resseguradoras – Hipótese de não-incidência tributária ... 126

4.3.1 Legislação aplicável ... 126

4.3.2 Declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º, da Lei nº 9.718/98, e seus efeitos sobre as seguradoras e resseguradoras ... 128

4.3.3 Da adequada definição de faturamento e consequências para o PIS e a COFINS das Seguradoras e Resseguradoras ... 131

4.3.4 Prêmio versus receita ... 133

4.4 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos por Seguradoras e Resseguradoras ... 137

5 TRIBUTAÇÃO DAS ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA ... 140

(8)

5.2 Entidades de Previdência Complementar Privada ... 144

5.2.1 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário ... 144

5.2.2 Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) ... 147

5.2.2.1 A questão da imunidade das EFPC ... 151

5.2.2.1.1 Jurisprudência do STF ... 154

5.2.2.2 PIS e COFINS e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ... 162

5.2.2.2.1 Aplicabilidade da isenção do artigo 15 da Lei nº 9.532/96 às EFPC ... 165

5.2.2.2.2. Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EFPC ... 167

5.2.2.2.3 Contribuições recebidas por EFPC versus receita ... 170

5.2.2.3 IRPJ, CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ... 174

5.2.2.3.1 Lucro versus superávit ... 174

5.2.2.3.2 IRPJ e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ... 179

5.2.2.3.3 O tratamento atribuído pela MP nº 2.222/01 aos rendimentos das entidades de previdência privada ... 181

5.2.2.3.4 A isenção concedida pela Lei nº 11.053/04 ... 184

5.2.2.3.5 CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ... 187

5.2.3 Entidades Abertas de Previdência Complementar - EAPC ... 190

5.2.3.1 PIS e COFINS e as EAPC – Hipótese de Não-Incidência Tributária ... 191

5.2.3.1.1 Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EAPC ... 192

5.2.3.1.2 Contribuições a planos de previdência privada aberta versus receitas ... 195

5.2.3.2 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos pelas EAPC ... 199

6 TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ... 203

6.1 Definição do conceito de plano de previdência privada ... 203

6.2 Tratamento tributário das contribuições efetuadas aos planos ... 208

6.2.1 Contribuições dos participantes ... 208

6.2.1.1 Definição do conceito de contribuições ... 209

6.2.1.2 Dedução das contribuições na legislação ordinária ... 210

6.2.1.3 Aspectos constitucionais da dedutibilidade das contribuições ... 214

6.2.2 Contribuições da Patrocinadora ou Instituidora ... 215

6.2.2.1 Dedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e da CSLL ... 215

(9)

6.2.2.3 Jurisprudência do CARF ... 221

6.2.2.4 Isenção de IRPF para os participantes ... 223

6.2.2.5 Isenção de contribuição previdenciária ao INSS ... 228

6.2.2.6 Contribuições em favor de beneficiário residente no exterior ... 229

6.3 Isenção de IRRF sobre os rendimentos dos planos ... 231

6.4 Tratamento tributário dos benefícios e resgates recebidos pelos participantes ... 234

6.4.1 Regime tradicional – Incidência do IR / tabela progressiva ... 236

6.4.2 Regime optativo – Incidência do IR / alíquotas regressivas ... 239

6.4.3 RMIT do IRRF incidente sobre resgates e benefícios da previdência privada ... 244

6.5 Benefícios e saldos de conta recebidos pelos beneficiários ... 246

6.5.1 Tributação dos benefícios de pensão por morte ... 247

6.5.2 Isenção do capital segurado pago por entidades de previdência privada ... 248

6.5.3 Tributação do saldo de conta pago a beneficiários ... 249

6.5.4 Entendimento da RFB ... 250

6.5.5 Jurisprudência do STJ ... 253

6.6 VGBL – Seguro de Vida com cláusula de cobertura por sobrevivência ... 258

6.6.1 RMIT do IRRF incidente sobre benefícios e resgates de VGBL ... 262

6.7 Portabilidade ... 263

6.8 Benefícios e resgates pagos a domiciliados no exterior ... 264

(10)

INTRODUÇÃO

Quando iniciava a elaboração desta tese, emergiram, inesperadamente, os protestos precipitados pela centelha do “Movimento Passe Livre”, que se alastraram rapidamente por todo o País. Essas manifestações deixaram a todos atordoados e nem mesmo seus participantes pareciam estar seguros quanto ao que se opunham. Eram movidos, basicamente, por um sentimento de revolta contra as motivações e os meios utilizados tradicionalmente na política, mas as bandeiras variavam desde a rejeição à PEC 37, que limitava os poderes de investigação do Ministério Público, até a repulsa ao projeto de “Cura Gay” defendido por um deputado e pastor evangélico. Fato é que nem os políticos, nem a mídia, sabiam como reagir a acontecimentos tão imprevistos. O emergir desse movimento fez crescer em mim, ainda mais fortemente, a percepção do quão complexa é a sociedade em que vivemos.

A globalização e o amplo acesso à informação, proporcionados pelos meios de comunicação de massa, em especial pela internet, aumentam progressivamente essa complexidade. As informações obtidas por esses meios nem sempre provêm de fontes seguras. Aliás, as fontes, na internet, são majoritariamente obscuras ou desconhecidas. Bombardeados por um emaranhado de informações e nelas fundados, obrigamo-nos, na vida cotidiana e profissional, a um sem-número de tomadas de decisões que, por sua vez, nos expõem a erros, falhas e seus decorrentes prejuízos. Como consequência dessa realidade, o risco é uma das mais fortes marcas do mundo contemporâneo.

(11)

Todavia, com a modernização, à medida que o mundo se torna mais complexo, os riscos de todos os tipos se multiplicam e agravam. Sua existência é inerente à vida e aceita como inevitável, mas, conquanto inafastáveis, podem ser controlados e por isso, enquanto se agravam, se aperfeiçoam também as técnicas para lhes dar combate. O próprio Direito é encarado pela Sociologia como tendo a função de atenuar riscos1.

Como é patente, uma das formas mais eficientes encontradas pelo Direito para minimizar riscos são os sistemas normativos securitários, ou seja, conjuntos de normas que visam oferecer compensações financeiras, ante a ocorrência de evento danoso, em razão de risco previamente identificado. Esses sistemas tiveram origem no fim da Idade Média, com o crescimento da atividade comercial e das viagens marítimas e, consequentemente, de seus riscos.

Ensina BURANELLO que “a primeira forma de seguro na Idade Média foi o seguro marítimo. No contrato de seguro marítimo o capitalista se obrigava a pagar determinada soma ao segurado, caso o navio não chegasse ao local de destino. Só posteriormente, na Inglaterra, apareceu o seguro terrestre”.2 Já o seguro de vida é

derivado do seguro de escravos, que eram considerados bens móveis. Muito depois é que se criou seguro de vida para os navegantes, a fim de que seus dependentes fossem indenizados na hipótese de seu falecimento durante as viagens. O revogado Código Comercial, curiosamente, proibia a contratação de seguro sobre a vida de homem livre, algo que somente veio a ser derrogado pelo Código Civil de 1916.

Inicialmente, o seguro era estruturado de forma alheia ao Direito, como jogo, aposta, baseado exclusivamente na alea. Com o tempo, foi se especializando e sendo normatizado, tornando-se cada vez mais técnico e organizado, de modo a dar conta dos riscos atuais, muito mais complexos que os medievais.

Desde então, a Humanidade passou pela Revolução Industrial e há quem diga, como o festejado sociólogo ULRICH BECK, que hoje se vive numa “Sociedade de

1 ZOVICO, Marcelo Luis Roland. Os limites do direito diante da teoria do risco: uma abordagem sobre

a (in)eficiência das políticas de segurança pública. 2012. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 14.

2 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações

(12)

Risco”, ou seja, numa sociedade marcada pela insegurança. Afirma esse autor que os riscos e ameaças de hoje diferem

[…] de seus equivalentes medievais, com frequência semelhantes por

fora, fundamentalmente por conta da globalidade de seu alcance (ser

humano, fauna, flora) e de suas causas modernas. São riscos da

modernização. São um produto de série do maquinário industrial do

progresso, sendo sistematicamente agravados com seu

desenvolvimento ulterior3.

A ideia de risco como elemento marcante da sociedade contemporânea também é assinalada fortemente na obra de NIKLAS LUHMANN. Ele ressalta em seus escritos que

[…] o risco é ligado ao saber, poder, poder escolher e possuir alternativa, e essas são todas no mesmo sentido, característica da modernidade e da sociedade moderna. Só na Sociedade Moderna a Ação é livre, no sentido de que pode ser realizada de outra maneira. Nesse sentido, a ação que segue uma direção pode ou deve se dar de

outro modo, ou mesmo em outra forma, não sendo determinada.4

Sob esse ponto de vista, “o risco é uma técnica como o Direito voltada para o futuro. Assim, risco possui um caráter estrutural de ação na sociedade moderna”5. A

ideia central de LUHMANN é: a multiplicidade de escolhas é a marca da sociedade contemporânea, e isso implica riscos cada vez maiores.

J. J. CALMON DE PASSOS também refletiu com argúcia sobre esse tema, tal como inserido na sociedade atual, distinguindo as noções de perigo e risco:

A ciência, a tecnologia, a economia de nossos dias contribuíram para a redução do perigo. A previsibilidade e o controle que a tecnologia já permite no tocante aos acontecimentos externos autorizam esta conclusão. O que é danoso por determinação externa se tornou altamente previsível e controlável, graças aos avanços da ciência. Contudo, na medida em que se tornam evidentes e mais numerosas as possibilidades de decisão em relação a comportamentos, ou na medida em que podem se tornar visíveis as possibilidades das quais depende a ocorrência de danos futuros efetivos, impõe-se a tematização dos riscos. O horizonte do futuro se retrai, a sua prospectiva se desloca do âmbito do perigo para o âmbito do risco. Os riscos, agora, estão estreitamente relacionados ao desenvolvimento da própria sociedade, ao desenvolvimento da ciência, da tecnologia, da medicina, da política

3 BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Trad. Sebastião Nascimento. São

Paulo: 34, 2010, p. 26.

4 Apud ZOVICO, Marcelo Luis Roland. Os limites do direito diante da teoria do risco: uma abordagem

sobre a (in)eficiência das políticas de segurança pública. 2012. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 61

5 Quem resume o entendimento de Luhmann sobre essa questão é Marcelo Luis Roland Zovico (ibid.,

loc. cit.).

(13)

e em geral às transformações da estrutura nas quais se torna possível a comunicação social. Em suma, concluem, o risco se fez integrante do

próprio modo de ser da sociedade contemporânea.6

Quanto mais ampla a possibilidade de diferentes decisões, ou seja, quanto maior a liberdade de escolha, mais elevado o risco, e mais forte a insegurança. Por isso, como diz J. J. CALMON DE PASSOS, o risco se fez integrante do modo de ser da sociedade contemporânea. Pouco há, hoje, que falar em perigo, ou seja, fatores externos

danosos, imprevisíveis e incontroláveis. Cresceu, porém, exponencialmente, a exposição ao risco, ou seja, a variabilidade de resultado conhecida e enfrentada como condição para o desenvolvimento.

As seguradoras, resseguradoras, entidades abertas e fechadas de previdência privada, assim como os institutos jurídicos do seguro, do resseguro e do plano de previdência privada, nada são além de mecanismos criados, por feixes de normas jurídicas, para permitir que se enfrentem os riscos das atividades complexas da sociedade atual, inerentes às pessoas e empresas, com maior eficácia e estabilidade.

A noção de risco é, portanto, o elemento que reúne e assemelha a atividade

exercida por essas entidades e os seus produtos e, consequentemente, a legislação que os rege. Com efeito, as seguradoras, resseguradoras e entidades de previdência privada se especializaram na avaliação de riscos, com utilização do instrumental oferecido pela ciência atuarial. Feita a avaliação, chamada no jargão securitário de underwriting (ou,

em português, subscrição) é estabelecido um valor a ser pago pelo

segurado/participante em contraprestação a uma cobertura para o caso de sinistro (prêmio, no seguro, ou contribuição, na previdência privada). A partir daí, essas entidades vão envidar esforços para acumular recursos (reservas ou provisões e seus rendimentos no mercado financeiro) para fazer frente à possível (ou certa, no caso da previdência privada e do seguro de vida) necessidade de indenização.

Os sistemas securitários, conjuntos de normas jurídicas criados para oferecer cobertura a riscos, são subsistemas normativos bastante peculiares. A tributação aplicável às riquezas geradas e auferidas pelas entidades que operam nesses

6 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade

civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro

(14)

sistemas deve atentar para seus caracteres distintivos, assim como a tributação dos contratos e das empresas de seguro, resseguro e previdência privada.

O objetivo deste trabalho é observar e descrever como se estruturaram, no Brasil, os subsistemas tributários que regulam as atividades econômicas securitárias e previdenciárias privadas, as quais têm o risco como denominador comum.

Dentre muitas peculiaridades a que o Direito Tributário deve estar atento acha-se o fato de que, como essas entidades têm o objetivo de indenizar sinistros (seguradoras e resseguradoras) ou pagar benefícios na velhice ou incapacidade dos participantes (entidades de previdência privada), precisam acumular riquezas para arcar com o pagamento de indenizações decorrentes de tais acontecimentos. Portanto, o patrimônio poupado para essa finalidade não podem ser amesquinhado indiscriminadamente por tributos, de forma inadequada à sua natureza, sob pena de frustrar seu objetivo, que tem relevante papel social.

Com efeito, o fim análogo de dar cobertura a riscos naturais e sociais faz com que seguradoras, resseguradoras e entidades de previdência privada tenham características comuns, merecendo tratamento tributário com notas semelhantes.

Diferentemente de outras pessoas jurídicas de direito privado, essas entidades são verdadeiros repositórios de poupança (inclusive por isso as seguradoras e entidades abertas são consideradas parte do “sistema financeiro nacional”), na medida em que precisam acumular fundos para o pagamento de futuras indenizações e benefícios. Por serem, do ponto de vista econômico, gestoras de grandes volumes de recursos de terceiros, sua atividade é regulada pelo Estado e, portanto, são obrigadas a constituir reservas técnicas suficientes para satisfazer seus prováveis compromissos futuros com os segurados e participantes.

(15)

Considerando as semelhanças que unem as atividades de seguradoras, resseguradoras e entidades de previdência privada aberta e fechada, bem como os respectivos contratos, o seguinte percurso será trilhado. Primeiramente, serão expostas as premissas metodológicas, quando se investigará o conceito de risco, vetor comum a

todos os institutos cuja tributação é estudada nesse trabalho. Em seguida, se discorrerá sobre a visão do sistema jurídico pelo prisma do Constructivismo Lógico-Semântico. Tal exposição é essencial, pois o método científico utilizado é norteado, do começo ao fim, por tal perspectiva. Ainda neste capítulo será abordada a teoria da regra-matriz de incidência tributária, utilizada para a demonstração da estrutura normativa de todos os tributos incidentes sobre os contratos e entidades securitárias objeto de análise.

O segundo capítulo é dedicado à análise dos princípios constitucionais que fundamentam toda a legislação complementar e ordinária que trata das atividades e contratos securitários objeto do presente estudo.

No terceiro, munidos das premissas colocadas no primeiro e no segundo capítulo, adentraremos o estudo da tributação aplicável aos contratos de seguro e resseguro, construindo as regras matrizes dos diversos tributos que os oneram, seja quando firmados entre partes domiciliadas no País, seja vinculando parte domiciliada no exterior. Nesse contexto, fez-se necessário tratar de assuntos de Direito Tributário Internacional, como os princípios da territorialidade e da universalidade e a aplicação das convenções para evitar a dupla tributação da renda.

Em seguida, nos capítulos 4º e 5º, trataremos da tributação aplicável às entidades securitárias, e não mais aos respectivos contratos. Assim, o Capítulo 4º será dedicado à tributação das seguradoras e resseguradoras, e o 5º cuidará da tributação disciplinadora das entidades abertas e fechadas de previdência complementar.

Por fim, no Capítulo 6º, abordaremos o regime tributário especial aplicável aos planos comercializados pelas entidades abertas e fechadas de previdência privada.

(16)

1 PREMISSAS METODOLÓGICAS

1.1 O Risco na Sociedade Contemporânea

A vida na sociedade moderna se tornou tão complexa que aceitamos o risco como inseparável de toda e qualquer atividade. São muitos os exemplos que o comprovam. Um deles é expressivo: o uso de placebos em testes com medicamentos. Médicos e pacientes aceitam, por um lado, correr o risco de os novos medicamentos não terem a eficácia esperada e até mesmo gerarem danosos efeitos colaterais e, por outro, o fato de que parte dos pacientes não receberá tratamento, o que implicará em agravamento do seu quadro. Esses riscos são enfrentados conscientemente, para que se alcance um resultado benéfico à coletividade: a identificação de droga eficiente contra certa enfermidade.

O risco é, pois, parte indissociável da vida contemporânea. A sociedade aprendeu a com ele conviver e até a extrair dele benefícios. Tanto o seguro quanto a previdência privada têm o objetivo comum de “satisfazer interesses derivados do risco”, como ensina PÓVOAS7. Os sistemas securitários, por um lado, permitem às pessoas e empresas lidar melhor com os riscos que inexoravelmente enfrentam e, por outro, obter lucro com sua atividade empresarial (no caso da previdência privada, somente as entidades abertas).

Sobre a importância social do controle dos riscos, ensina GAUDENZI:

Há uma convergência dos interesses individuais com os interesses coletivos: importa a todos individualmente e à sociedade como um todo (ao país, por exemplo) que possíveis infortúnios não se transformem em prejuízos irreparáveis. A lógica do seguro é de uma racionalidade cristalina e se move única e exclusivamente com base no cálculo de probabilidades. Todo um sistema é criado, todo um

mercado funciona apenas em função de acontecimentos virtuais, os

7 “[…] como qualquer contrato, o previdenciário desempenha uma função social e uma função

econômica. Nas várias classificações atendendo a estas funções, aparecem os de seguro como os que objetivam a satisfação de interesses derivados do risco, considerado este como o evento cuja materialização leva a seguradora a proporcionar os meios materiais para compensar o segurado das respectivas consequências danosas” (PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p.

270).

(17)

chamados “riscos previsíveis” – e quanto mais riscos forem previstos, mais a sociedade estará coberta.8

PÓVOAS classifica os riscos sociais, cobertos pelas previdências social e privada, como endógenos ou exógenos:

Em nossa concepção, riscos sociais são os perigos a que estão submetidos os homens, em sociedade, e cuja materialização se reflete sempre, negativamente, em seu bem estar e no de sua família, criando problemas sociais.

Distinguimos duas classes de riscos sociais: os exógenos que se materializam por causas alheias ao indivíduo; e os endógenos que se materializam por causas inerentes à natureza biossocial do indivíduo. Na primeira classe, temos os causados pela natureza e os causados pela conjuntura econômica e social, e na segunda classe temos os causados pela degradação da vida humana. Assim, as enchentes, as secas, as alterações ambientais, podem determinar migrações, fome, doença, morte, desemprego e invalidez; as conjunturas desfavoráveis podem ter as mesmas consequências; a degradação da vida humana

pode determinar a doença, a invalidez e a morte.9

Ensina BURANELLO que

[…] a função do seguro é socializar entre as pessoas expostas a determinado risco as repercussões econômicas de sua verificação, o chamado “mutualismo”. Por essa razão, é inegável que o seguro e a previdência privada configuram atividades de interesse público, estando, portanto, sujeitas a intensa supervisão estatal. Continua o autor assinalando que “as seguradoras lidam, na prática, com a economia de incontáveis segurados, com a economia popular e a captação de poupança, que levam à constituição de fundo comum para garantir os riscos, atividade estrita ao elo principal do ciclo

econômico. Isso ressalta a importante função social do seguro”.10

Também sobre a importância social do seguro (e, permitimo-nos acrescentar, da Previdência Privada) na sociedade de risco e o interesse geral nessa atividade, mais uma vez vale transcrever preciosa lição de J. J. CALMON DE PASSOS:

Para se tornar operacional a teoria do risco, sem disfuncionalidade, impôs-se a solução pelo seguro, que institucionaliza, em termos técnicos, o imperativo da solidariedade numa sociedade de riscos. O que surgiu como um contrato entre pessoas, no qual uma delas assumia os riscos de indenizar a outra por força de algum sinistro que viesse a atingir o seu patrimônio ou a sua pessoa, bem mais próximo do jogo e da aposta que de algo relacionado com algum interesse

8 ALBERTI, Verena et al. (Coords.). Entre a solidariedade e o risco: história do seguro privado no

Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2001, p. 12.

9 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 65.

10 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações

(18)

social relevante, o que antes fora assim pensado, tornou-se uma técnica a serviço do interesse geral, mais adequadamente definível como seguridade social ou segurança social, publicizando-se, ou socializando-se, se assim se preferir. Deixou de ser possível, por conseguinte, entender-se a atividade securitária como de natureza estritamente privada, passando a ser vista, em muitas de suas manifestações, como vinculada ao interesse geral, retirada do campo da pura autonomia da vontade, passando a ser regulada, de forma

cogente e minuciosa, pelo Poder Público.11

J. J. CALMON DE PASSOS qualifica como “transindividual” a natureza do direito protegido pelo seguro. Direito transindividual ou difuso seria aquele em que, “à semelhança das universalidades de direito, uma pluralidade é juridicamente concebida como constituindo uma unidade”12. Os direitos individuais, para além dos direitos

privados, são de interesse geral e por isso merecem regulação do Estado.

Embora as atividades securitária e de previdência privada sejam distintas e exibam peculiaridades muito marcantes, sua característica comum de amenizar a lida com os riscos, oferecendo cobertura a sinistros, permite-nos dar-lhes tratamento razoavelmente homogêneo neste trabalho.

A relevância do risco na sociedade contemporânea dá cada vez maior importância social aos sistemas que buscam amenizar seus efeitos. Esse papel social pode e deve ser levado em conta pelo Direito Tributário e por isso passaremos a analisar as normas que preveem a tributação dos contratos de seguro e previdência e das respectivas partes, sob essa ótica.

1.2 Sistema Jurídico sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico

O objetivo deste trabalho é conhecer (que, segundo PAULO DE BARROS CARVALHO, significa “construir proposições sobre”) o subconjunto das normas tributárias que incidem sobre o seguro, o resseguro, os planos de previdência privada e sobre as entidades que operam esses contratos.

Contudo, antes de iniciar essa análise, imprescindível expor o método a ser utilizado para a abordagem desse conjunto de normas. O primeiro passo para tanto é a

11 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade

civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro

de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 2.

12 Ibid., p. 5.

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externalização do que entendemos sobre “Direito”. Só depois poderemos aproximar as lentes para identificar as normas que compõem o subsistema jurídico tributário brasileiro e, enfim, o subconjunto que trata do seguro, do resseguro e da previdência privada.

Já assinalamos que o Direito, Sistema ou Ordenamento Jurídico13, exerce

importante papel na estabilização dos riscos sociais. Embora não tenha o condão de prevenir a ocorrência de condutas indesejadas e os efeitos delas decorrentes, incumbe ao aparato do Estado a aplicação de medidas sancionatórias como consequência da sua prática. Naturalmente, na medida em que a sociedade se torna mais complexa, o Direito precisa ajustar-se a essa complexidade, criando regras para regular condutas cada vez mais numerosas e multifacetadas. O ordenamento jurídico se torna progressivamente mais vasto e intrincado.

Em face desse cenário, nunca foi tão necessário um modelo de aproximação do objeto que o simplifique e permita que seja estudado de forma científica e sistemática. Não é por outro motivo que PAULO DE BARROS CARVALHO aponta a “cientificidade” como característica essencial do método que deve ser utilizado para estudar o Direito. Ensina que “o saber científico dos tempos atuais é enfático em um ponto: todos entendem que não há como abrir mão da uniformidade na apreciação do objeto, bem como da rigorosa demarcação do campo sobre o qual haverá de incidir a proposta cognoscitiva” 14. Com essa afirmação, ressalta alguns axiomas científicos

importantes para o estudo do Direito. O primeiro é o da uniformidade na apreciação do objeto. Uma ciência deve entender seu objeto de forma homogênea. No caso da Ciência do Direito, e seguindo-se na linha positivista adotada pelo Professor, toma-se como premissa que é um sistema composto exclusivamente por normas. Trata-se de uma visão uniforme, pois não permite a presença de elementos estranhos no sistema. Todos os elementos identificados no ordenamento – como fatos e valores – são reconduzidos à norma jurídica.

13 Utilizamos as expressões “sistema” e “ordenamento” como sinônimos, na linha dePAULO DE BARROS

CARVALHO: “Sistema é o discurso da Ciência, mas sistema também é o domínio finito, mas

indeterminável, do direito positivo. Advirto, portanto, que emprego, livremente, no curso desta obra, ‘ordenamento’ como sinônimo de ‘ordem positiva’, ‘direito posto’ e ‘direito positivo’.” (Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 218). 14 Ibid., p. 17.

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A fim de analisar o sistema jurídico e as normas jurídicas que o compõem, adotaremos a premissa do “Construtivismo Lógico-Semântico”15, segundo a qual a

realidade é constituída pela linguagem. Os seguidores do Construtivismo Lógico-Semântico tomam o Direito como linguagem, estudando-o sob essa perspectiva. Esta constatação permite que o estudioso se valha do rico instrumental teórico desenvolvido pela Filosofia da Linguagem e pela Semiótica, obtendo resultados teóricos e práticos surpreendentes.

PAULO DE BARROS CARVALHO situa essa corrente de pensamento na filosofia atual e demonstra, com precisão analítica, a utilidade científica de suas premissas:

Certo é que o Direito, tomado como um grande fato comunicacional, é concepção relativamente recente, tendo em vista a sua perspectiva histórica, numa análise longitudinal da realidade. Situa-se, como não poderia deixar de ser, no marco da filosofia da linguagem, mas pressupõe interessante combinação entre o método analítico e a hermenêutica, fazendo avançar seu programa de estruturação de uma nova e instigante Teoria do Direito, que se ocupa de normas jurídicas enquanto mensagens produzidas pela autoridade competente e dirigidas aos integrantes da comunidade social. Tais mensagens vêm animadas pelo tom da juridicidade, isto é, são prescritivas de condutas, orientando o comportamento das pessoas de tal modo que se

estabeleçam os valores presentes na consciência coletiva.16

Com efeito, a filosofia da linguagem entende a própria sociedade como um grande sistema comunicacional. O sistema do Direito seria, então, um subsistema comunicacional inserido num sistema comunicacional social mais amplo. Contudo, o Direito se distingue do sistema social amplo por ser especializado na regulação de condutas intersubjetivas. São diversos os subsistemas sociais, cada qual com sua especialização funcional, como o Direito, a Economia, a Psicologia e a Sociologia, devendo-se evitar transitar inadvertidamente entre eles, uma vez que operam com sistemas binários distintos. Nesse sentido é esclarecedora a afirmação de FABIANA DEL PADRE TOMÉ:

15 “Construtivismo lógico-semântico” é expressão que vem sendo utilizada por PAULO DE BARROS

CARVALHO para designar o “método de trabalho, simples na sua concepção, mas objetivo e fecundo nos seus resultados, apto para explorar, com o rigor possível, as estruturas lógico-sintáticas do texto examinado, abrindo desse modo o caminho às atribuições de sentido, dentro delas as estipulações axiológicas tão vivas no ato cognoscente dos objetos da cultura” (Prefácio. In: CARVALHO, Aurora

Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo Lógico-Semântico). São Paulo:

Noeses, 2009, p. XXVII).

16 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

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Dentro da rede de comunicações que é o sistema social, identificamos subsistemas compostos por comunicações diferentes entre si, como é o caso do subsistema do direito. Este se apresenta como um conjunto comunicacional peculiar e com função específica, sendo inadmissível transitar livremente entre o sistema jurídico e os demais sistemas verificados no interior do macrossistema da sociedade, como o

econômico, o político e o religioso.17

A contextualização filosófica do estudo do Direito no âmbito da Filosofia da Linguagem conduz a resultados práticos impressionantes. Foi após tal exercício, quando passou a estudar o Direito sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico, que PAULO DE BARROS CARVALHO chegou à revolucionária conclusão – entre outras – de que a norma não “incide automática e infalivelmente”, sendo necessária linguagem competente para converter o fato social em fato jurídico, irradiando assim as consequências previstas pela norma geral e abstrata. A partir desta, surgiram diversas outras implicações, como a conclusão de que o lançamento é constitutivo da obrigação tributária, e não declaratório; de que a decadência só opera quando vertida em linguagem competente, e de que as fontes do Direito são única e exclusivamente os enunciados introdutores de normas no sistema.

Já explicitamos a nossa convicção de que, para conhecer bem um objeto é necessário demarcá-lo, separá-lo de todos os outros. Não recusamos a existência de relações entre os sistemas (por exemplo, Direito e Economia), mas entendemos que o trabalho jurídico se limitará a estudar normas jurídicas, fazendo-se o corte epistemológico necessário para separar o seu objeto de elementos que digam respeito a outras ciências. Com isso, consegue-se maior profundidade e analiticidade no estudo.

Importante ressaltar, também, que o sistema jurídico, tal como o compreendemos, se organiza de forma hierarquizada18. Trata-se não apenas de um

17 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 40. 18 Esclarecedora a lição de PAULO DE BARROS CARVALHO sobre o hierarquização das normas jurídicas:

“O sistema do direito oferece uma particularidade digna de registro: suas normas estão dispostas numa estrutura hierarquizada, regida pela fundamentação ou derivação que se opera tanto no aspecto material quanto no formal ou processual, o que lhe imprime possibilidade dinâmica, regulando, ele próprio, sua criação e suas transformações. Examinando o sistema de baixo para cima, cada unidade normativa se encontra fundada, material e formalmente, em normas superiores. Invertendo-se o prisma de observação, verifica-se que das regras superiores derivam, material e formalmente, regras de menor hierarquia. A Carta Magna exerce esse papel fundamental na dinâmica do sistema, pois nela estão traçadas características dominantes das várias instituições que a legislação comum posteriormente desenvolverá. Sua existência imprime, decisivamente, caráter unitário ao conjunto, e a multiplicidade de normas, como entidades da mesma índole, lhe confere o timbre de homogeneidade”. (Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p.

218).

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axioma, mas também de uma necessidade do objeto. É de fato absolutamente necessário que existam regras para determinar a hierarquia entre as normas, a fim de que se possa identificar qual norma aplicar em caso de incompatibilidade.

Ensina PAULO DE BARROS CARVALHO:

Chega a ser um contra-sentido falar em sistemas de normas sem organização hierárquica. Se o valor integra a própria raiz do dever-ser e se um de seus predicados sintáticos é a gradação dos preceitos em escala de hierarquia, o deôntico vem, desde logo, marcado pela

presença indispensável dessa cadeia de vínculos de subordinação.19

Dissemos que, além de axioma, a hierarquia é também uma necessidade do objeto, pois o Direito precisa se autoproduzir, de acordo com as normas de competência que o compõem, e para isso tem de haver hierarquia. As normas de superior hierarquia dão fundamento de validade àquelas que lhes estão submetidas hierarquicamente, inclusive determinando as regras para sua produção (normas de competência). Explica TACIO LACERDA GAMA:

São justamente as normas de competência que qualificam quem pode ser o sujeito X, que prescrevem o que compreende o ato Y e indicam as materialidades sobre as quais pode versar a norma Z. Ao fazer isso, programam como deve ser enunciadas e fundamentam a validade das

normas criadas segundo seus preceitos.20

A hierarquização das normas que compõem o Sistema do Direito Positivo as conduz a terem, todas, o mesmo fundamento de validade, obtendo-se a coesão do sistema. Também permite que nos refiramos ao Direito Positivo como “sistema”, “conjunto de elementos inter-relacionados que e se aglutinam perante um referencial comum. Assim, onde houver a possibilidade de reunirmos, de forma estruturada, elementos que se conectam sob um princípio unificador, estará presente a noção de sistema”21, como ensina AURORA TOMAZINI DE CARVALHO.

Ora, se para tipificar um conjunto como sistema é necessário colocar todos os seus elementos sob um denominador comum, então essa construção dependerá sempre do uso da inteligência e da interpretação.

19 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. V. II. São Paulo:

Noeses, 2013, p. 247.

20 GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária – fundamentos para uma teoria da nulidade. São

Paulo: Noeses, 2008, p. 30-31.

21 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo

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Os sistemas são, portanto, obtidos pela interpretação (linguagem), mediante a análise de determinado conjunto de objetos. No caso do Direito, esses objetos são, também eles, empíricos e linguísticos, como as normas jurídicas, das quais trataremos a seguir.

1.3 Norma Jurídica como expressão mínima irredutível de manifestação do dêontico

A partir da premissa de que o Direito é um sistema comunicacional homogêneo, composto exclusivamente de normas jurídicas, cabe esclarecer como as entendemos. Todo o estudo científico que se seguirá deverá estar fundado nessa premissa e apreender seu objeto sob a óptica de que é composto apenas por tais elementos linguísticos, chamados por PAULO DE BARROS CARVALHO de expressão

mínima irredutível de manifestação do deôntico22, ou seja, a estrutura mínima

necessária para transmitir um comando apto a regular condutas intersubjetivas, objetivo essencial do Direito.

Numa primeira aproximação (plano da interpretação “S1”), encontramos o Direito como texto veiculado em suportes físicos, de forma ainda incompreensível, ainda “tinta sobre o papel”. Num segundo momento (“S2”), já poderemos identificar conjuntos de grafemas, com sentido, nos artigos, parágrafos, incisos e outros dispositivos grafados em instrumentos introdutores de normas, veiculando os chamados enunciados prescritivos. Uma vez compreendidos pelo intérprete, esses enunciados assumem a natureza de proposições prescritivas, ou seja, enunciados com sentido atribuído pela interpretação (S3), com a função linguística de regulação de condutas, estruturados sintaticamente na forma lógica da implicação deôntica. Depois, o intérprete deverá concatenar essas proposições prescritivas com as outras que compõem o sistema e com elas se inter-relacionam por coordenação e subordinação (“S4”)23.

22 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

São Paulo: Noeses, 2011, p. 609.

23 É necessário, portanto, interpretar os grafemas encontrados nos suporte físico até se chegar à

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Há quem chame os enunciados ou as proposições prescritivas obtidos no plano “S2” de normas jurídicas latosensu, ou em sentido amplo, pois já nessa segunda

etapa do percurso interpretativo apresentam a função, o objetivo de prescrever condutas. Contudo, só se estará diante de uma prescrição eficaz e completa de condutas quando for construída a norma jurídica em sentido estrito – strictosensu – que na maioria das

vezes exige a conjugação de vários enunciados prescritivos (“S3”). Essa estrutura se compõe de antecedente, no qual é descrito um determinado fato, e de um consequente, onde se descreve uma relação jurídica modalizada (pelos modais permitido, proibido ou obrigatório), que nasce como consequência da realização daquele fato.

Nossa linha de raciocínio é a mesma adotada por AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, quando afirma:

Uma significação, para expressar a completude da mensagem legislada, além de ser construída a partir dos textos do direito positivo, deve estar estruturada na forma hipotético-condicional, pois esta é a fórmula lógica das ordens, é assim que as linguagens prescritivas se

manifestam formalmente.24

Importante esclarecer que a norma jurídica está no Direito Positivo e é objeto de estudos da Ciência do Direito. Ora, o coração está no corpo humano ou na Medicina cardíaca? Não há dúvida de que está no corpo humano, assim como as normas jurídicas fazem parte do Direito Positivo. Mas o entendimento, as proposições sobre o que é o coração e sobre o que são as normas jurídicas estão nas ciências que estudam esses objetos.

No caso do Direito, a separação entre a Ciência e seu objeto é mais tênue, pelo fato de o objeto em questão – as normas jurídicas – ser linguístico, assim como a ciência que o estuda. Todavia, continua válida a mesma conclusão.

A linguagem não tem sentido completo sem que estejam integrados os seus três planos de significação: sintático, semântico e pragmático. Por isso se diz que as normas são a significação atribuída ao texto de direito positivo. Isso não significa que o objeto passe a ser parte da Ciência, mas sim que, como objeto linguístico, só é compreendido em sua inteireza no plano da significação.

articulado de significações normativas; e d) os vínculos de coordenação e de subordinação que se estabelecem entre as regras jurídicas” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem

e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 186).

24 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo

Lógico-Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. 281.

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No terceiro plano (“S3”), do domínio articulado das significações normativas, é que estão as normas jurídicas, também chamadas proposições

jurídico-normativas. Essas unidades são sintaticamente homogêneas, isto é, têm todas a mesma

configuração lógica. Por primeiro, há uma proposição (também chamada antecedente ou hipótese) veiculadora das características de um evento de possível ocorrência. Esta proposição está ligada a outra (consequente ou tese), em que se descrevem as notas de uma relação jurídica. Para demonstrar essa estrutura sintática, nada melhor que a formalização:

Hip.  F Nj DSn

Cons.  S’R S” DSm

Nesta formalização da norma jurídica (Nj), temos Hip. (hipótese), que corresponde a F (notas de um fato) e Cons. (consequência), correspondente às notas de um fato relacional entre dois sujeitos de direito (S’ R S”). A hipótese se liga à consequência pelo dever-ser neutro (DSn), que estabelece entre a primeira e a tese uma relação de causalidade deôntica, ou imputação. Tal causalidade faz com que, ocorrido o fato jurídico tributário tal qual descrito na hipótese, nasça, automática e infalivelmente, a relação jurídica descrita no consequente. Formalmente, essa relação é uma implicação (Se A, então B), porém difere da causalidade natural por derivar de um ato de vontade do legislador, decorrente do exercício de sua competência legislativa.

Dentro da consequência, por seu turno, há outro dever-ser, dessa vez modalizado – DSm – (convertido em obrigado, proibido ou permitido), regulando a conduta do sujeito passivo perante o sujeito ativo. Todos os elementos do repertório do direito positivo exibem essa configuração sintática. Cada qual deles, porém, terá conteúdo semântico próprio, ou seja, descreverá diferentes eventos possíveis, para os quais serão imputadas as consequências relacionais cabíveis.

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organizadas. HANS KELSEN, por exemplo, distingue o Direito da Moral afirmando que “a reação do Direito consiste em uma medida de coerção decretada pela ordem e socialmente organizada, ao passo que a reação moral contra a conduta imoral não é nem estabelecida pela moral, nem é, quando estabelecida, socialmente organizada”25.

KELSEN tem razão quando diz que o Direito – como sistema – não pode prescindir da coação. Todavia, entendemos que as normas jurídicas primárias não-sancionatórias – que descrevem na sua hipótese fatos lícitos de possível ocorrência – têm existência autônoma, não sendo imprescindível que conformem estrutura dual (norma primária e norma secundária, ou endonorma e perinorma). Como bem assevera AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, “a norma secundária atribui juridicidade à primária, caracterizando-a como jurídica”26.

A estrutura lógico-semântica das normas jurídicas, acima descrita, aplica-se igualmente às “sanções” (entendidas como normas que em sua hipótese descrevem um ilícito), seja àquelas chamadas normas primárias sancionatórias – que preveem uma consequência de direito material para o descumprimento de obrigação prevista no consequente de norma primária –, seja às normas secundárias propriamente ditas – que preveem a possibilidade de movimentação do aparato estatal para promover coação no sentido do inadimplemento daquela obrigação27.

Sendo o Ordenamento Jurídico um sistema comunicacional composto exclusivamente por normas jurídicas, o método de aproximação do objeto utilizado neste trabalho consistirá na construção, mediante interpretação, das normas que se relacionam, direta ou indiretamente, à tributação do seguro, do resseguro e da previdência privada. Discorreremos sobre essas normas, especialmente sobre as regras-matrizes de incidência tributária identificadas, tratando de sua adequação aos princípios que regem tais atividades e aos demais princípios constitucionais em matéria tributária.

No próximo tópico, trataremos, por necessário, da teoria da regra-matriz de incidência tributária, preconizada por PAULO DE BARROS CARVALHO.

25 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 28. 26 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo

Lógico-Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. 308.

27 Quanto aos diferentes tipos de norma sancionatória, LOURIVAL VILANOVA salienta que “temos sanções integrantes da relação jurídica substantiva (de direito privado ou de direito público); e sanções integrantes da relação jurídica processual”. (Causalidade e Relação no Direito. 4. ed. São

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1.4 Teoria da Regra-Matriz de Incidência Tributária

Já vimos, linhas acima, que as leis não trazem normas jurídicas prontas e logicamente organizadas. É necessário ao intérprete percorrer os vários planos da interpretação, a fim de construir estruturas hipotético-condicionais modalizadas, que contemplem todas as variáveis necessárias à orientação da conduta.

A esse respeito, vale transcrever o preciso ensinamento de PAULO DE BARROS CARVALHO:

Certamente ninguém entenderia uma ordem, em todo seu alcance, apenas com a indicação, por exemplo, da conduta desejada: ‘pague a quantia de x reais’. Adviriam desde logo algumas perguntas e, no segmento das respectivas respostas, chegaríamos à fórmula que tem o condão de oferecer o sentido completo da mensagem, isto é, a identificação da pessoa titular do direito, do sujeito obrigado e, ainda, como, quando, onde e por que deve fazê-lo. Somente então estaríamos diante daquela unidade de sentido que as prescrições jurídicas necessitam para serem adequadamente cumpridas. Em simbolismo

lógico represento assim: D [F → (S’RS’’)], que interpreto: deve ser que, dado o fato F, então se instale a relação jurídica R, entre os

sujeitos S’ e S”.28

Estamos convencidos de que somente através dessa estrutura lógica o Direito se manifesta, não importando se estamos diante de Direito Civil, Penal ou Tributário. Esse sistema comunicacional especializado só logra regular condutas intersubjetivas através de proposições linguísticas modalizadas, valendo-se da coercitividade imposta pelo aparato do Estado através de normas secundárias com a mesma estrutura que, invariavelmente, são encontradas no sistema para se lhes acoplar, quando necessário.

No Direito Tributário não poderia ser diferente. As normas que compõem esse subsistema, destacado para fins didáticos, pretendem extrair dinheiro do particular para ser entregue aos cofres públicos. Com efeito, os subsistemas penal e tributário estão entre os mais invasivos do Direito, pois o primeiro cerceia a liberdade do indivíduo (e em alguns países até a vida) e o segundo, o seu patrimônio. As normas que compõem esses ramos do Direito precisam estar, portanto, organizadas mediante forma lógica precisa, a fim de poderem atingir seu intento da forma esperada. Por isso vigora o

28 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

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princípio da tipicidade cerrada, tanto no Direito Tributário quanto no Direito Penal, justamente pela necessidade de perfeita descrição dos fatos que devem compor o antecedente da norma, com todos os seus elementos identificados da forma mais pormenorizada possível, não deixando margem a qualquer dúvida, para que possam fazer incidir a relação jurídica prevista no consequente, através, é claro, da aplicação.

Identificando a peculiaridade da norma que perfaz a incidência tributária, PAULO DE BARROS CARVALHO palmilhou minucioso percurso, visando atingir o útil e importante intento de especificar a estrutura lógico-semântica de norma jurídica para o âmbito da incidência dos tributos, criando a chamada regra-matriz de incidência tributária. Esta consiste num juízo composto por duas proposições, unidas pelo dever-ser interproposicional29. Expõe o precursor da fórmula:

Efetuadas as devidas abstrações lógicas, identificaremos, no descritor da norma, um critério material (comportamento de uma pessoa, representado pelo verbo pessoal e de predicação incompleta, seguido pelo complemento), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência, observaremos um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e um critério

quantitativo (base de cálculo e alíquota).30

Embora o Direito Tributário tenha, como objeto de estudo, todas as normas direta ou indiretamente relacionadas à exigência de tributos, a regra-matriz de incidência tributária trata especificamente da percussão tributária. Consiste, assim como qualquer norma jurídica, num juízo composto por duas proposições concatenadas pelo dever-ser neutro.

Chama-se à primeira proposição hipótese tributária, antecedente ou

descritor, pois nela se encontra a descrição de um evento que se terá como ocorrido em

determinadas coordenadas de espaço e tempo. Esse evento é sempre uma conduta humana, composta por um verbo e um complemento especificadores, escolhidos pelo legislador para produzir efeitos jurídico-tributários. A esse conjunto de verbo e complemento chama-se critério material do antecedente. Compõe também a hipótese a

indicação do momento em que a conduta se considerará realizada, que se denomina

critério temporal, e do local onde sua realização se dará, o critério espacial.

29 Conferir, a respeito, CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo:

Saraiva, 2007, p. 338-340.

30 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

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A segunda proposição que forma o juízo é o consequente ou prescritor.

Nela está especificada a relação jurídica que surgirá se e quando realizado o fato lícito descrito no antecedente. Essa especificação exige que dois critérios estejam presentes: o

subjetivo, onde se determinam os sujeitos passivo (devedor) e ativo (credor) da

obrigação, e o quantitativo, onde se encontram os elementos que identificarão o objeto

da prestação de que será incumbido o sujeito passivo, em expressão pecuniária: base de

cálculo e alíquota.

A estruturação da norma tributária nos termos acima expostos, além de permitir aprofundamento máximo ao estudo da incidência tributária, tem outras utilidades práticas, permitindo, como salienta PAULO DE BARROS CARVALHO, “quase que de forma imediata, penetrarmos na secreta intimidade da essência normativa, devassando-a e analisando-a de maneira minuciosa”. Além disso, “experimentando o binômio base de cálculo/hipótese de incidência, colhido no texto constitucional para marcar a tipologia dos tributos, saberemos dizer, com rigor e presteza, da espécie e da subespécie da figura tributária que investigamos”31.

O conceito, logicamente anterior, de norma jurídica, e a definição da regra-matriz de incidência tributária, orientarão todo o curso deste trabalho.

Procurar-se-á analisar, assim, o conjunto de normas relacionadas à tributação do seguro, do resseguro e da previdência privada no Brasil e, dentre elas, diversas regras matrizes de incidência tributária. Esse instrumental permitirá identificar os fatos que ensejam cada incidência tributária, assim como os respectivos sujeitos passivos e a estipulação do montante devido a título de tributo. Trata-se do terceiro plano de interpretação dos textos jurídicos, no qual, como já afirmado, se articulam as proposições normativas.

Seguiremos nesse percurso para estarmos aptos a chegar ao quarto e último plano da interpretação, no qual confrontaremos as regras identificadas com as demais, com que se inter-relacionam por coordenação e subordinação, a fim de podermos avaliar o subsistema que dispõe sobre a tributação do seguro, do resseguro e da previdência privada.

31 Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007,p. 343.

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2 PRINCÍPIOS RELACIONADOS À ATIVIDADE SECURITÁRIA

2.1 Noção de Princípio

Ao tratar do Sistema Jurídico, em capítulo anterior, reiteramos a premissa de que seus componentes são uniformes, ou seja, de que só são aceitos como elementos desse conjunto normas jurídicas, todas com idêntica organização sintática. A esse respeito, vale recapitular a observação de PAULO DE BARROS CARVALHO:

O direito positivo, então, apresentar-se-á aos olhos da Dogmática como um conjunto finito, mas indeterminado de normas jurídicas, nas quais surpreendemos fatos jurídicos e relações jurídicas, associados por um ato de vontade de quem pôs as regras no sistema, ato psicológico este que o cientista coloca entre parênteses metódicos, para não se imitir em territórios alheios como, por exemplo, a Psicologia e outras Ciências que poderiam explicar aspectos parciais

do fenômeno.32

Mantemo-nos firmes nessas premissas. Sendo assim, não poderíamos afirmar, em relação aos princípios, que são outra coisa senão norma jurídica, sob pena de serem sumariamente excluídos do sistema do Direito Positivo, em razão de sua homogeneidade sintática.

Princípios são normas jurídicas. Contudo, recebem designação especial pela grande influência que exercem nos subsistemas que integram, seja pela sua supremacia hierárquica (hierarquia constitucional, por exemplo, ou matéria tratada em lei complementar), seja por apresentarem forte carga axiológica. Como explica PAULO DE BARROS CARVALHO, “é o nome que se dá a regras do direito positivo que introduzem valores relevantes para o sistema, influindo vigorosamente sobre a orientação de setores da ordem jurídica”33. Nessa mesma linha, FABIANA DEL PADRE TOMÉ:

Os princípios não existem ao lado das normas, justapondo-se ou contrapondo-se a elas. Impossível admitir a coexistência de normas e princípios, como se fossem entidades diferentes convivendo no sistema do direito positivo. Princípios nada mais são que normas

jurídicas carregadas de forte conotação axiológica.34

32 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

São Paulo: Noeses, 2011, p. 260-261.

33 Ibid., p. 261.

34 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 216.

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É de grande utilidade a classificação proposta por PAULO DE BARROS CARVALHO, entre princípios que encartam valores e os que veiculam limites objetivos. Em ambos os casos se estará diante de normas jurídicas de alta hierarquia e expressividade no sistema. Contudo, os primeiros estabelecem nortes axiológicos para orientar o legislador e o intérprete em relação a situações incertas e indeterminadas. Já os outros são normas que estabelecem comandos precisos para o legislador, também podendo ser utilizados como critérios objetivos para a solução de antinomias e lacunas eventualmente encontradas no sistema jurídico.

Exemplo desse uso dos princípios para suprir lacunas de regras é dado por HUMBERTO ÁVILA, quando trata daquilo que chama de “eficácia interna” dos princípios: “se não há regra expressa que oportunize a defesa ou a abertura de prazo para manifestação da parte no processo – mas elas são necessárias –, elas deverão ser garantidas com base direta no princípio do devido processo legal”35. Este, a nosso ver, é

um princípio limite objetivo36.

Os princípios “limites objetivos” também servem para viabilizar a aplicação de outros, que impõem valores, como é o caso do princípio da anterioridade em relação ao da segurança jurídica. Como esclarece PAULO DE BARROS CARVALHO, “trabalham no sentido de realizar tais valores, funcionam como verdadeiros mecanismos que dão força de eficácia a esses primados axiológicos do direito”37.

E como saber se estamos diante de uma norma jurídica que merece ser tida como princípio? A orientação de PAULO DE BARROS CARVALHO é precisa:

35 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12. ed.,

ampliada. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 97.

36 HUMBERTO ÁVILA discorre longamente sobre as distinções que entende existentes entre “regras” e

“princípios”. Não adotamos, neste trabalho, essa distinção, tampouco suas consequências. Contudo, observamos que mesmo este autor parte da premissa de que ambos – regras e princípios – são normas jurídicas: As regras podem ser dissociadas dos princípios quanto ao modo como prescrevem o comportamento. As regras são normas imediatamente descritivas, na medida em que estabelecem obrigações, permissões e proibições mediante a descrição de uma conduta a ser cumprida. Os princípios são normas imediatamente finalísticas, já que estabelecem um estado de coisas cuja promoção gradual depende dos efeitos decorrentes da adoção de comportamentos a ela necessários. Os princípios são normas cuja qualidade frontal é, justamente, a determinação da realização de um fim juridicamente relevante, ao passo que característica dianteira das regras é a previsão do comportamento” (ibid., p. 216). Além da distinção entre princípios e regras quanto ao modo como

prescrevem o comportamento, o autor ainda os distingue quanto ao modo como contribuem para a decisão. Todavia, ao tratar da matéria sempre faz questão de frisar que ambos são normas jurídicas que podem ser reconduzidos à sua estrutura hipotético-condicional, ficando resguardada, portanto, a homogeneidade sintática do sistema jurídico.

37 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

(32)

Toda vez que houver acordo, ou que um número expressivo de pessoas reconhecerem que uma norma ‘N’ conduz um vector axiológico forte, cumprindo papel de relevo para a compreensão de segmentos importantes do sistema de proposições prescritivas, estaremos diante de um “princípio”. Quer isto significar; por outros torneios, que “princípio” é uma regra portadora de núcleos significativos de grande magnitude influenciando visivelmente a orientação de cadeias normativas, às quais outorga caráter de unidade relativa, servindo de fator de agregação para outras áreas do

ordenamento.38

No presente trabalho, trataremos de diversas normas que identificamos como verdadeiros princípios relacionados à atividade securitária, bem como de princípios tributários propriamente ditos. Ao longo do estudo, esses princípios serão sopesados e relacionados às regras-matrizes de incidência tributária que oneram o seguro, o resseguro, e a previdência privada.

2.2 O Seguro e a Previdência Complementar na Constituição

A estrutura hierarquizada do Direito exige que o estudo de qualquer matéria jurídica se inicie pela interpretação das normas constitucionais que irradiam efeitos sobre o subsistema enfocado.

A Constituição contempla normas da mais alta hierarquia, em geral voltadas para o regramento da produção de normas pelo legislador, e densamente carregadas de valores. Com efeito, são as chamadas normas de competência, algumas delas

identificadas como princípios, que vão regular a conduta dos legisladores

complementares e ordinários aos quais for atribuída a função de criar normas sobre toda e qualquer matéria. É imprescindível conhecê-las, interpretá-las e, em seguida, avaliar se as normas sujeitas ao seu influxo estão de acordo com as regras de competência constitucionalmente previstas.

A Constituição de 1988, desde seu artigo primeiro, inclui a dignidade da pessoa humana entre os fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1o, IV). Ao

tratar da ordem econômica, estabeleceu estar fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, impondo-lhe como fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados, entre outros princípios, o da redução

38 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada.

Referências

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