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Associação de agricultores periurbanos: uma alternativa de desenvolvimento local na região Missioneira do Rio Grande do Sul

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

Departamento de Ciências Administrativas, Contábeis, Econômicas e da Comunicação Departamento de Estudos Agrários

Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO

GISELDA APARECIDA GHISLENI

ASSOCIAÇÃO DE AGRICULTORES PERIURBANOS: UMA ALTERNATIVA DE DESENVOLVIMENTO LOCAL NA REGIÃO MISSIONEIRA DO

RIO GRANDE DO SUL

Ijuí (RS) 2012

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GISELDA APARECIDA GHISLENI

ASSOCIAÇÃO DE AGRICULTORES PERIURBANOS: UMA ALTERNATIVA DE DESENVOLVIMENTO LOCAL NA REGIÃO MISSIONEIRA DO

RIO GRANDE DO SUL

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento, área de concentração Desenvolvimento Local Sustentável, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUI), como requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profª Drª Sandra Beatriz Vicenci Fernandes

Ijuí (RS) 2012

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G426a Ghisleni, Giselda Aparecida.

Associação de agricultores periurbanos : uma alternativa de desenvolvimento local na Região Missioneira do Rio Grande do Sul / Giselda Aparecida Ghisleni. – Ijuí, 2012. –

71 f. ; 29 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Desenvolvimento.

“Orientadora: Sandra Beatriz Vicenci Fernandes”.

1. Agricultores periurbanos. 2. Desenvolvimento local. 3. Pluriatividade da agricultura familiar. I. Fernandes, Sandra Beatriz Vicenci. II. Título. III. Título: Uma alternativa de desenvolvimento local na Região Missioneira do Rio Grande do Sul.

CDU: 631(816.5) 631.115.1

Catalogação na Publicação

Aline Morales dos Santos Theobald CRB10/1879

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UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento – Mestrado

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação

A ASSSSOOCCIIAAÇÇÃÃOODDEEAAGGRRIICCUULLTTOORREESSPPEERRIIUURRBBAANNOOSS::UUMMAAAALLTTEERRNNAATTIIVVAADDEE D DEESSEENNVVOOLLVVIIMMEENNTTOOLLOOCCAALLNNAARREEGGIIÃÃOOMMIISSSSIIOONNEEIIRRAADDOORRIIOOGGRRAANNDDEEDDOO S SUUL L elaborada por

GISELDA APARECIDA GHISLENI

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Sandra Beatriz Vicenci Fernandes (UNIJUÍ): _____________________________

Profa. Dra. Jana Koefender (UNICRUZ): _________________________________________

Profa. Dra. Leonir Terezinha Uhde (UNIJUÍ): ______________________________________

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus, fonte de vida, luz e sabedoria, por me fazer ver que não há vitória sem luta, mas que com sua presença é possível superar todas as dificuldades da vida.

A toda minha família, pelo incentivo e por entender as razões de minha ausência neste período, em especial, a minha filha Mariana, pela compreensão, respeito e encorajamento durante o processo de realização deste trabalho.

À minha orientadora, Professora Doutora Sandra Beatriz Vicenci Fernandes, que foi mais que uma orientadora, uma grande amiga, pelo apoio, atenção e pelas contribuições feitas ao bom desenvolvimento e êxito na conclusão deste trabalho.

À Universidade Regional do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí, pela oportunidade de engrandecimento; aos professores e aos colegas do mestrado, pela amizade e companheirismo construído durante o curso.

À Escola Estadual Técnica Guaramano, pelo incentivo e auxílio prestado, e, em especial, a todos os agricultores familiares associados da APLAME, que, com seus depoimentos, contribuíram na oferta de dados e informações para a realização deste estudo.

Aos colaboradores, prof. Jose Carlos Mello e a jornalista Carmem Ghisleni, pelo auxílio recebido na realização das entrevistas e na sua transcrição, acompanhando-me na execução do trabalho de campo.

Às demais pessoas que, de um ou outro modo, contribuíram para a realização deste trabalho.

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“[...] Na verdade somente os sonhadores são os que alcançam os postos vanguardeiros da

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RESUMO

O desenvolvimento evoluiu ao longo das últimas décadas, caracterizando-se hoje pela efetivação universal do conjunto dos direitos humanos individuais e coletivos, contemplando aspectos de caráter social, cultural econômico, político, cívico. Partindo do pressuposto de que o desenvolvimento ocorre mediante a contemplação de um contingente de variáveis, dentre as mais relevantes, o capital social e o capital humano, este estudo propõe-se a analisar uma experiência da constituição de uma Associação de Agricultores Familiares para Produção de Espécies Fitoterápicas, com o objetivo de geração de renda adicional e também cuidados com a saúde. Visa a compreender o dinamismo deste modelo de desenvolvimento a partir das relações sociais estabelecidas entre produtores, estudantes e associados. Procura analisar, especialmente, o papel que a Associação desempenha no contexto da vida familiar desses agricultores, na participação do projeto proposto. Neste sentido, os conceitos de desenvolvimento local, endógeno, rural e urbano, além de considerar o contexto espacial - o espaço periurbano e a pluriatividade inerente à agricultura familiar, são norteadores para compreensão desta realidade. O presente trabalho foi estruturado a partir de um estudo de caso, valendo-se de abordagem quali-quantitativa que possibilitou tomar conhecimento da realidade de vida dos atores sociais envolvidos no projeto da Associação de Produtores de Plantas Medicinais de Santo Ângelo - RS. Os resultados obtidos mostraram que ações como estas, de estratégias de reprodução social local, geram desenvolvimento diferenciado, que não converge somente para um ganho financeiro, mas, especialmente, para um desenvolvimento humano e social.

Palavras-chave: Agricultores periurbanos. Desenvolvimento local. Pluriatividade da agricultura familiar.

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RESUMEN

El desarrollo ha evolucionado a lo largo de las últimas décadas caracterizándose hoy por la efectuación universal del conjunto de los derechos humanos individuales y colectivos, contemplando aspectos de carácter social, cultural económico, político, cívico. Se extiende del presupuesto de que el desarrollo ocurre mediante a la contemplación de uno de un contingente de variables, entre las más relevantes, el capital social y el capital humano, este estudio propone analizar una experiencia de la constitución de una asociación de labradores familiares para producción de especies fitoterapias, con el objetivo de generación de renta adicional y también cuidados con la salud. Apunta la comprensión el dinamismo de este modelo de desarrollo partiendo de las relaciones sociales establecidas entre los productores, estudiantes y asociados. Busca analizar, especialmente, la función que el Asociación desempeña en el contexto de la vida familiar de esos labradores, antes y durante la participación en el proyecto propuesto. En este sentido, los conceptos de desarrollo local, endógeno, rural y urbano, además de llevar en cuenta el contexto espacial-el espacio periurbano y la pluriactividad inherente a la agricultura familiar, son norteadores para la comprensión de esta realidad. El presente trabajo fue estructurado partiendo de un estudio de caso, validándose de abordaje Cali cuantitativa que posibilitó llevar a conocimiento de la realidad de la vida de los actores sociales arrollados en el proyecto del asociación de productores de las plantas medicinales de Santo Angelo-RS.Los resultados obtenidos mostraran que acciones como estas, de estrategias de reproducción social local, generan desarrollo diferenciado, que no convergen solamente para el gano financiero,pero,especialmente,para un desarrollo humano y social.

Palabras llaves: Labradores periurbanos. Desarrollo local. Pluriactividad de la agricultura familiar.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Distribuição do tamanho das áreas (superfície agrícola total) dos integrantes da APLAME- Associação dos Produtores de Plantas Medicinais e Essências ... 54

Figura 2: Distribuição do tamanho da Superfície agrícola útil destinada à produção de plantas medicinais dos associados da APLAME ... 55

Figura 3: Distribuição das principais atividades desenvolvidas pelos associados da APLAME ... 56 Figura 4: Distribuição do grau de escolaridade e principais profissões dos associados da APLAME ... 56

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LISTA DE ABREVIATURAS

APLAME - Associação dos Produtores de Plantas Medicinais e Essências de Santo Ângelo CONTAG - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

EETG - Escola Estadual Técnica Guaramano

EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

ONU - Organização das Nações Unidade PIB - Produto Interno Bruto

PNPIC - Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar RENISUS - Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesses do SUS SUS - Sistema Único de Saúde

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 O DESENVOLVIMENTO E SUAS MÚLTIPLAS INTERFACES ... 14

1.1 Contextualizando o desenvolvimento ... 14

1.2 Agricultura familiar no contexto do desenvolvimento ... 18

1.3 A dicotomia desenvolvimento rural/desenvolvimento urbano ... 24

1.4 Desenvolvimento local/endógeno... 28

1.5 O desenvolvimento humano sinônimo de capital social ... 35

1.6 A espacialidade do desenvolvimento local – áreas periurbanas ... 38

1.7 Pluriatividade familiar ... 41

1.8 A emergência de uma nova visão do rural ... 43

2 UMA EXPERIÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO LOCAL ... 48

2.1 APLAME – uma experiência de Desenvolvimento Local Periurbano ... 50

2.2 Caracterização dos arranjos produtivos da APLAME ... 53

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 61

REFERÊNCIAS ... 63

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INTRODUÇÃO

O debate acadêmico e científico sobre desenvolvimento, principalmente no aspecto conceitual, está longe de ser uma ideia que transmita consenso. Durante fases distintas, vários foram e são os adjetivos anexados ao substantivo desenvolvimento cada um com seu foco específico, mas que muitas vezes geram diferentes interpretações no seu uso, uma vez que seus significados podem ser diferentes.

Desde o início da primeira Revolução Industrial até os dias atuais, o conceito de desenvolvimento sofreu várias transformações. Vários autores consideram que a base do processo de desenvolvimento tenha sido a Revolução Industrial, pois promoveu uma grande transformação social, política e cultural, melhorando qualitativamente as condições de vida da população de muitos países. Desde então, o desenvolvimento foi associado ao processo de industrialização.

Por sua vez, o debate acerca do desenvolvimento rural local vem crescendo gradativamente nos últimos anos, baseado num conceito abrangente que não se restringe somente às atividades produtivas de bens originados da terra, mas sim, o rural considerado um espaço onde ocorrem variadas atividades de apoio ao processo produtivo e ao desenvolvimento socioeconômico ambiental. A partir dos anos 90, uma estratégia de desenvolvimento rural, centrada no fortalecimento da agricultura familiar, vem sendo gestada no Brasil.

Um dos pontos que emergem quando se foca a questão do desenvolvimento é a separação entre os espaços urbano e rural. Historicamente, as áreas rurais eram aquelas que se dedicavam essencialmente às atividades agropecuárias, caracterizavam-se pela baixa densidade populacional e eram tidas como uma categoria residual frente ao processo de urbanização, tratando as áreas rurais como opostas ao meio urbano. Mais recentemente, passou-se a observar mudanças importantes no meio rural nos países desenvolvidos, que deixou de ser exclusivamente agrícola para se tornar uma mescla de atividades produtivas e de serviços da mais diferente natureza. Hoje, uma divisão entre rural e urbano deixou de ser importante, pois as relações de troca se diversificaram, e o enfoque passou a ser nos espaços

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(territórios) que dão suporte físico aos fluxos econômicos e sociais, relegando a um plano inferior a preocupação com os seus limites geográficos.

Uma das alternativas para superar as dicotomias tradicionais, seja rural ou urbano, agrícola ou não agrícola, é a adoção dos princípios da economia local e regional, que considera as várias formas de integração e troca, que se desenvolvem entre os segmentos espaciais e os setores de atividades. Saraceno (1994), por exemplo, considera que na Itália as diferenças locais e regionais explicam melhor as mudanças espaciais da competitividade com o tempo do que a dicotomia urbano/rural.

Há um consenso entre Romeiro (2000), Sen (2000) e Veiga (2005), de que o desenvolvimento econômico é condição não única, mas necessária para promover o desenvolvimento, uma vez que o incremento na renda deve gerar melhoria na vida da população, sendo a condição econômica o meio que pode permitir às pessoas o acesso a bens e serviços, capaz de colocá-las em situações mais confortáveis. Assim, os incrementos positivos no produto e na renda – crescimento econômico ou desenvolvimento econômico – deveriam ser utilizados ou direcionados na promoção do desenvolvimento humano, uma vez que o homem é o principal ator de todo o processo.

Da mesma maneira que a renda é importante e necessária na promoção do desenvolvimento humano - condições favoráveis -, o homem e as relações sociais estabelecidas, juntamente com o meio - seu entorno -, são fatores determinantes, uma vez que todo o processo está condicionado às ações e relações estabelecidas pelo homem em uma determinada sociedade.

Este estudo propõe-se analisar uma experiência de constituição de uma associação de agricultores familiares para produção de espécies fitoterápicas, com o objetivo de geração de renda adicional e também cuidados com a saúde. Visa compreender esta experiência como um processo de desenvolvimento, a partir das relações sociais estabelecidas entre produtores, alunos e associados. Busca-se, principalmente, analisar o papel que a associação desempenha no contexto da vida familiar destes agricultores antes e durante a participação no projeto proposto.

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Neste sentido, o presente estudo se constitui de revisão bibliográfica que possibilita fazer uma reflexão sobre as mais diferentes abordagens e qualificações do desenvolvimento, que pode ser local, endógeno, rural e urbano, além de considerar o contexto espacial - o espaço periurbano e a pluriatividade inerente à agricultura familiar. Na sequência, são apresentados os aspectos metodológicos utilizados, que possibilitaram tomar conhecimento da realidade de vida dos atores sociais envolvidos no projeto da Associação. A análise da experiência protagonizada na Associação dos Produtores de Plantas Medicinais e Essências de Santo Ângelo (APLAME), bem como o projeto na qual a associação está envolvida, partiu de sua caracterização e do papel que ela representa nesse contexto local, é apresentado na sequência, Por fim, a sistematização da análise deste processo é apresentada a guisa de conclusão.

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1 O DESENVOLVIMENTO E SUAS MÚLTIPLAS INTERFACES

1.1 Contextualizando o desenvolvimento

Até os anos de 1970, o conceito de desenvolvimento estava relacionado com a noção de crescimento, privilegiando o avanço do conhecimento científico em detrimento das questões sociais e ambientais. Mas, a partir dessa década, com a crescente preocupação com os impactos destrutivos do modelo de desenvolvimento vigente, esse conceito passa a ser alvo de uma nova reconceitualização, no sentido de considerar a problemática ambiental, dando origem ao termo de ecodesenvolvimento, o qual foi renomeado de desenvolvimento sustentável. Com base nisso, pode-se dizer que a discussão acerca dos rumos do desenvolvimento, foi marcada, na década de 70, pela Conferência de Estocolmo, organizada pela Organização das Nações Unidade (ONU), com a presença de 113 países e 250 organizações não-governamentais, sendo esta a primeira reunião oficial a tratar das questões ambientais no âmbito mundial.

Sachs (2004, p. 37) assegura que se pode resumir a “evolução da ideia de desenvolvimento, no último meio século, apontando para a sua complexificação, representada pela adição de sucessivos adjetivos – econômico, social, político, cultural, sustentável e, o que é mais importante, pelas novas problemáticas”. Nesse sentido, entendendo o desenvolvimento como um processo complexo, pode-se inferir, segundo Silva Neto (2004, p. 30) que,

A abordagem da complexidade, enquanto um novo paradigma, pode se constituir em um quadro geral interessante para os estudos sobre desenvolvimento. A adoção do paradigma da complexidade pode inclusive proporcionar uma certa unidade conceitual e metodológica para uma série de abordagens relativamente recentes do desenvolvimento local que enfatizam a análise da diversidade dos agentes sociais e das relações que estes mantêm entre si, como os estudos baseados nas noções de Aglomerados, “Clusters”, Sistemas Locais de Produção, Redes de Cooperação, Capital Social e Sistemas Agrários.

A abordagem da complexidade à análise do desenvolvimento tem sido bastante enfatizada atualmente, devido à sua capacidade de proporcionar interpretações originais e bastante sugestivas em relação à formulação de políticas. A adoção da abordagem da complexidade para conceituar o desenvolvimento implica entendê-lo como um processo adaptativo auto-organizado. Assim, o mais importante, segundo Silva Neto (2004, p. 27), “não é seu estado final, mas sim os fatores que condicionam a evolução da sociedade de

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forma que esta mantenha características consideradas desejáveis”. Teoricamente, a abordagem da complexidade implica a interpretação do desenvolvimento como um processo que apresenta três componentes inseparáveis: sobrevivência, adaptação e aprendizado. Para o autor, o desenvolvimento significa a manutenção de um equilíbrio entre a maleabilidade e estabilidade. Assim, para atingir o estado de um sistema complexo auto-organizado, a sociedade deve ser maleável para poder adaptar-se, porém suficientemente estável para evitar rupturas destrutivas na sua estrutura.

Segundo Silva Neto (2004), a maneira mais adequada de abordar a complexidade das situações de desenvolvimento, tanto regional quanto local, são procedimentos que permitam eliminação progressiva das variáveis menos pertinentes, ao invés de procurar defini-las “a priori”. De acordo com o autor, as variáveis e suas inter-relações que determinam e caracterizam uma situação concreta de desenvolvimento são impossíveis de serem selecionadas adequadamente sem um acúmulo mínimo de conhecimento sobre a situação. Silva Neto (2004, p. 29) salienta que “as implicações da adoção da abordagem da complexidade sobre o projeto de sociedade relacionado à promoção do desenvolvimento dizem respeito ao foco das políticas propostas”.

Assim, a abordagem da complexidade parece ser bastante persistente ao conceito de desenvolvimento como liberdade proposto por Amartya Sen. Segundo Sen (2004, p. 10), “para combater os problemas que enfrentamos, temos de considerar a liberdade individual um comprometimento social, [...] sendo que a expansão da liberdade é vista como o principal fim e o principal meio do desenvolvimento”. O conceito de desenvolvimento fundamentado nas ideias defendidas por Sen (2004) é entendido como um processo que busca a melhoria das condições de vida, através da expansão e consolidação das liberdades substantivas que as pessoas desfrutam. O desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer ponderamente sua condição de agente. A eliminação de privações de liberdades substanciais, argumenta-se aqui, é constitutiva do desenvolvimento.

Nesse sentido, o desenvolvimento requer que se eliminem os principais fatores de privação de liberdades: a pobreza; carência de serviços públicos, como educação, saúde; desemprego, ou carência de oportunidades econômicas, ou seja, a liberdade de participação

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política, acesso à educação e à saúde estão entre os componentes constitutivos do desenvolvimento. Em referência a essa realidade, Sen (2004) explica que a liberdade é central para o processo de desenvolvimento por duas razões. A primeira é a razão avaliatória, segundo a qual a avaliação do progresso tem de ser feita verificando-se primordialmente se houve aumento das liberdades das pessoas. A segunda é a razão da eficácia, sendo que nessa razão, a realização do desenvolvimento depende inteiramente da livre condição de agente das pessoas.

Desse modo, entende-se que o desenvolvimento é assegurado por estratégias ou políticas que otimizem as liberdades substantivas das pessoas, oportunizando acesso à saúde, à educação e, principalmente, melhorando as oportunidades econômicas, diminuindo o desemprego que é um dos maiores causadores da exclusão social.

Nesse contexto, salienta Sen (2004), que o desenvolvimento é um processo integrado de expansão de liberdades substantivas interligadas, ou seja, é um processo que integra considerações econômicas, sociais e políticas. Contudo, segundo o autor, as liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas também os meios principais. Além de reconhecer a importância avaliatória da liberdade, precisa-se entender a notável relação empírica que vincula umas às outras, as liberdades diferentes. Liberdades políticas ajudam a promover a segurança econômica. Oportunidades sociais facilitam a participação econômica. Facilidades econômicas podem ajudar a gerar abundância individual, além de recursos públicos para os serviços sociais. Liberdades de diferentes tipos podem fortalecer umas às outras.

Com oportunidades sociais adequadas, é possível ter um processo de desenvolvimento que promova efetiva melhoria na qualidade de vida das pessoas. Contudo, essa melhoria não pode estar relacionada somente à maximização da renda ou da riqueza, pois o crescimento econômico não necessariamente se traduz na efetiva melhoria da qualidade de vida. De acordo com as ideias defendidas por Sachs (2004, p. 35),

O desenvolvimento pretende habilitar cada ser humano a manifestar potencialidades, talentos e imaginação, na procura da auto-realização e da felicidade, mediante empreendimentos individuais e coletivos, numa combinação de trabalho autônomo e heterônomo e de tempo dedicado a atividades não produtivas. A boa sociedade é aquela que maximiza essas oportunidades, enquanto cria, simultaneamente, um ambiente de convivência e, em última instância, condições

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para a produção de meios de existência viáveis, suprindo as necessidades materiais básicas da vida – comida, abrigo, roupas – numa variedade de formas e de cenários – famílias, parentela, redes, comunidades.

Portanto, o desenvolvimento precisa melhorar a qualidade de vida no sentido de expandir e otimizar as liberdades substantivas que as pessoas desfrutam, pois a qualidade de vida se concentra no modo de vida das pessoas e não apenas nos recursos ou na renda de que elas dispõem. Segundo Sen (2004, p. 33), “ter mais liberdade melhora o potencial das pessoas para cuidar de si mesmas e para influenciar o mundo, questões centrais para o processo de desenvolvimento”.

Quando se avalia o desenvolvimento a partir da noção de expansão das liberdades substantivas, Sen (2004) assevera que não se está sugerindo que exista algum “critério” de desenvolvimento único e preciso segundo o qual as diferentes experiências de desenvolvimento sempre podem ser comparadas e classificadas. A motivação que fundamenta a abordagem do “desenvolvimento como liberdade” não consiste em ordenar todos os estados ou todos os cenários alternativos em uma “ordenação completa”, e sim em chamar a atenção para aspectos importantes do processo de desenvolvimento, cada qual merecedor de atenção.

Nesse sentido, pode-se afirmar que não existe um modelo de desenvolvimento que pode servir de exemplo a ser seguido. Para Silva Neto (2004, p. 11), “as trajetórias de desenvolvimento são específicas de cada local, região ou país”. Contudo, existem sociedades capazes de mudar de forma a melhorar o padrão de vida da sua população, de acordo com a sua realidade ou especificidades. De acordo com Silva Neto (2006, p. 12), “ao analisarmos tais sociedades, o importante não é o que diretamente proporciona uma melhor qualidade de vida as suas populações, mas sim as propriedades sistêmicas que permitem que estas sociedades consigam se adaptar e evoluir adequadamente”. Para o autor, a evolução de uma sociedade é determinada, fundamentalmente, pelo equilíbrio entre a liberdade que ela proporciona aos agentes sociais e pela regulação à qual estes são submetidos. Liberdade e regulação são, portanto, propriedades sistêmicas fundamentais a serem estimuladas para a promoção do desenvolvimento sustentável (SILVA NETO, 2004).

(19)

1.2 Agricultura familiar no contexto do desenvolvimento

Tem-se apostado na agricultura familiar como a forma de organização de produção mais ajustada aos preceitos de desenvolvimento local sustentável, à medida que suas organizações são estimuladas por políticas públicas a fazerem parte como protagonistas das ações de construção do desenvolvimento local. Ela tem sido vista como um setor estratégico para a manutenção e recuperação de emprego, redistribuição de renda e garantia da soberania alimentar do país. A importância da agricultura familiar no processo de desenvolvimento sustentável tem sido consenso tanto no meio acadêmico quanto político (VIANNA; WEHRMANN; DUARTE, 2007). As funções da agricultura familiar vão além do plano estritamente econômico, em especial destacam-se:

[...];

i) a garantia da sobrevivência da unidade familiar, ii) geração de emprego, que também é analisada como fator de melhoria social, iii) preservação ambiental, iv) o resgate de um modo de vida que associa conceito de cultura, tradição e identidade, v) a valorização do local e de seu desenvolvimento, especialmente na conformação de novas territorialidades. (DUARTE; ZAYAGO, 2006 apud VIANNA; WEHRMANN; DUARTE, 2007, p. 103).

Desse modo, pode-se afirmar que a agricultura familiar vem-se afirmando nos debates, e as políticas agrícolas voltadas a este segmento poderão constituir-se em importantes estratégias de combate à fome e à pobreza, à medida que se intensificar a produção e a oferta de alimentos às populações. Segundo Norder (2004), a agricultura familiar não pode ser analisada simplesmente como produtora de alimentos necessários para a construção de segurança alimentar, mas deve ser vista também como um segmento que é, ao mesmo tempo, produtor e beneficiário da segurança alimentar de um país. Trata-se, portanto, da necessidade de considerá-la como parte do projeto estratégico de desenvolvimento social e econômico, pois políticas agrárias, agrícolas e sociais devem aumentar a oferta de alimentos e também aperfeiçoar as condições de vida do conjunto da população rural. Por isso, é importante que o segmento familiar rural seja cada vez mais reconhecido pelos governantes e pela sociedade, devido ao poder de resolução econômico e social que exerce no processo de desenvolvimento e segurança alimentar de um país. No entanto, ao se discutirem políticas de fomento da agricultura familiar, é preciso ter clareza dos múltiplos conceitos acerca dessa categoria. Gonçalves e Souza (2005 apud TINOCO, 2008) ressaltam que, na legislação brasileira, a

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definição de propriedade familiar consta no inciso II do artigo 4º do Estatuto da Terra, estabelecido pela Lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964, com a seguinte redação:

propriedade familiar: o imóvel que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalhado com a ajuda de terceiros. (BRASIL,

1964, grifo do autor).

Na definição da área máxima, a Lei nº 8629, de 25 de fevereiro de 1993, estabelece como pequena os imóveis rurais com até 4 módulos fiscais e, como média propriedade, aqueles entre 4 e 15 módulos fiscais (BRASIL, 1993). Já Bittencourt e Bianchini (1996 apud TINOCO, 2008), em um estudo feito na região sul do Brasil, adotam a seguinte definição: Agricultor familiar é todo aquele (a) agricultor (a) que tem na agricultura sua principal fonte de renda (+ 80%), e que a base da força de trabalho utilizada no estabelecimento seja desenvolvida por membros da família. É permitido o emprego de terceiros temporariamente, quando a atividade agrícola assim necessitar. Em caso de contratação de força de trabalho permanente externo à família, a mão-de-obra familiar deve ser igual ou superior a 75% do total utilizado no estabelecimento.

Analisando a visão dos autores supracitados, além de outros trabalhos recentes sobre o tema, percebe-se que a maioria das definições ou concepções sobre agricultura familiar baseia-se na mão-de-obra utilizada, no tamanho da propriedade, na direção dos trabalhos e na renda gerada pela atividade agrícola. Em todas há um ponto em comum: ao mesmo tempo em que é proprietária dos meios de produção, a família assume o trabalho no estabelecimento. Buainaim e Romeiro (2000 apud TINOCO, 2008, p. 2) afirmam que “a agricultura familiar desenvolve, em geral, sistemas complexos de produção, combinando várias culturas, criações de animais e transformações primárias, tanto para o consumo da família como para o mercado”. Baseados em estudos sobre sistemas de produção familiares no Brasil, os autores afirmam que os produtores familiares apresentam frequentemente características como a diversificação de produções, tendo assim uma grande capacidade de adaptação às rápidas transformações impostas pelo meio; estratégia de investimento progressivo além da combinação de subsistemas intensivos e extensivos (BUAINAIM; ROMEIRO 2000 apud

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No meio rural, os agricultores familiares são os que geram maior número de empregos e fortalecem o desenvolvimento local, pois distribuem melhor a renda. Eles são responsáveis por uma parte significativa da produção nacional, respeitam mais o meio ambiente e, principalmente, potencializam a economia nos municípios onde vivem. Importantes problemas estruturais e conjunturais vividos pelos agricultores não obscurecem a importância e representatividade da agricultura familiar na economia brasileira.

Segundo Picinatto et al (2000), parte significativa dos agricultores familiares não tem acesso à terra (são arrendatários, ocupantes ou parceiros), 39,8% deles possuem, sob qualquer forma, menos de 5 ha de área total (o que, na maioria dos casos, inviabiliza sua sustentabilidade econômica através da agricultura) e apenas 16,7% têm acesso a algum tipo de assistência técnica. Além disso, 44,1% dos estabelecimentos comercializam menos de 50% do valor da sua produção, sendo classificados como pouco integrados ao mercado (GUANZIROLI et al, 2001). Esses dados deixam clara a importância social e econômica da agricultura familiar no Brasil, assim como suas fragilidades e potencialidades. Por um lado, observa-se a capacidade de geração de renda e emprego, além da importante contribuição da agricultura familiar para a produção agropecuária. Por outro lado, fica claro também que a agricultura familiar ainda é depositária de um grande contingente de pessoas vivendo em condições sociais e de produção extremamente heterogêneas, muitas vezes, formando bolsões de pobreza rural.

A agricultura familiar tem suas raízes no campesinato, com grande destaque nas relações propriedade, trabalho e família. Porém, diferencia-se na relação econômica, e isso principalmente por consequência da modernização e capitalização do setor agropecuário. Desse modo, poder-se-ia afirmar que a agricultura familiar modifica-se conforme a sociedade se transforma. Um dos maiores méritos da agricultura familiar reside no reconhecimento da sua forma social, legitimada na maioria dos países desenvolvidos, nos quais a estrutura agrária é majoritariamente composta por explorações, e o trabalho da família assume importância decisiva. Embora sejam múltiplas as conceituações sobre agricultura familiar, há um consenso entre alguns autores (MOLINA FILHO; BURKE, 1979; VEIGA, 2001a) de que a produção familiar se caracteriza pelo trabalho familiar na exploração agropecuária e pela propriedade dos meios de produção.

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Para Wanderley (1994), a agricultura familiar se constitui na atualidade em um conceito genérico, que incorpora uma diversidade de situações específicas e particulares e nas quais o campesinato corresponde a uma dessas formas particulares dessa agricultura. A agricultura familiar é compreendida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (FAO/INCRA, 2000, p. 15) pela reunião de um conjunto de atributos: “a gerência da propriedade rural é feita pela família; o trabalho é desempenhado na maior parte pela família; os fatores de produção pertencem à família (exceção, às vezes, a terra) e são passíveis de sucessão em caso de falecimento ou aposentadoria dos gerentes”. Assim, a agricultura de propriedade familiar é caracterizada por estabelecimentos com áreas relativamente pequenas ou médias, cuja gestão e trabalho estão intimamente ligados, ou seja, os meios de produção pertencem à família, e o trabalho é exercido pelos proprietários.

A concepção que prioriza a agricultura familiar como unidade de análise centra-se nos estudos da FAO/INCRA (1994), que divide a exploração agrícola em modelo patronal e familiar (VEIGA, 2001b). Considera-se modelo agrícola patronal aquelas unidades que apresentam completa separação, em que a organização está centralizada, com ênfase na especialização e nas práticas padronizáveis, com predomínio do trabalho assalariado e uso de tecnologias dirigidas à eliminação das decisões “de terreno” e “de momento”. Já o modelo agrícola familiar caracteriza-se pela relação íntima de trabalho e gestão; processo produtivo diretamente assegurado pelos proprietários ou arrendatários; ênfase na diversificação; ênfase na durabilidade dos recursos e na qualidade de vida; com trabalho assalariado complementar; tomada de decisões imediatas, adequadas ao alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo.

Iniciativas relativamente recentes propostas em âmbito governamental, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), objetivam estabelecer diretrizes e ações que levem ao desenvolvimento rural e à integração dos produtores familiares no mercado. Para tanto, realiza-se uma classificação dos agricultores familiares brasileiros, distinguindo-os em três categorias: consolidados, em transição e periféricos ou de subsistência, segundo metodologia proposta por Molina Filho e Burke (1979) e FAO/INCRA (2000). Empresários do setor são caracterizados como produtores consolidados, com boa liderança nas comunidades, que buscam assistência técnica e creditícia, possuem poder de análise e gerenciamento. São propriedades geralmente menores

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de 100 hectares, com concentração próxima a 50 hectares. Com menor nível de organização que os consolidados, os produtores em transição buscam, em menor intensidade, a assistência técnica e creditícia e possuem médio poder de análise e gerenciamento. São propriedades geralmente menores de 100 hectares, com concentração próxima a 20 hectares. Ainda, de acordo com a FAO/INCRA (2000), os produtores familiares periféricos ou de subsistência

caracterizam-se por utilização do crédito rural nula ou incipiente, pois não possuem

viabilidade econômica para ter acesso a ele e geralmente têm dificuldades quanto ao gerenciamento da propriedade.

Segundo pesquisa recentemente, realizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG/CUT), em várias áreas do País a agricultura familiar ainda é a forma preponderante de produção agrícola. Se, devidamente apoiada por políticas públicas e ancorada em iniciativas locais, pode transformar-se no grande potencializador de um desenvolvimento descentralizado e voltado para uma perspectiva de sustentabilidade. Conforme Santos (2001), presidente da CONTAG, o desenvolvimento e o fortalecimento da agricultura familiar dar-se-á pela implementação e diversas iniciativas, que deverão estar interligadas para que possam produzir os efeitos desejados. O PRONAF e os Fundos Constitucionais são algumas iniciativas, não podendo, entretanto, a ação estatal se limitar apenas à disponibilização de recursos para crédito de custeio. É fundamental agilizar os procedimentos das linhas de crédito de custeio e investimento, assim como a reformulação de toda a infraestrutura produtiva e social para atender às necessidades da agricultura familiar de forma que possa ter facilitado o seu acesso aos mercados.

As políticas de apoio à agricultura familiar devem, inclusive, contemplar aquelas atividades não agrícolas, como a industrialização, a produção artesanal e o turismo rural, atividades com grande potencial de geração de renda e ocupação. Outro elemento que deve estar integrado às políticas fundamentais de fortalecimento da agricultura familiar diz respeito à priorização de investimentos públicos para garantir serviços de pesquisa, experimentação, difusão, assistência técnica e extensão rural, comprometidos com a sustentabilidade e adaptados aos meios de produção familiar.

Existe um conjunto de iniciativas em andamento para o fortalecimento da agricultura familiar que dependem muito da ação sindical, como a organização, a comercialização e

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gestão da produção, a diversificação agroecológica e os planos de desenvolvimento local. Este conjunto de proposições deve estar articulado a uma política de produção de alimentos e soberania alimentar da população brasileira como parte integrante da estratégia de desenvolvimento. Por outro lado, a gestão da unidade produtiva precisa ser considerada como o exercício prático da democracia. Se todos os membros da família têm um papel e uma função no processo produtivo, têm direito a tomar parte nas decisões e nos resultados. Para isso, é preciso valorizar o trabalho das mulheres e dos jovens na agricultura em regime de economia familiar, construindo relações sociais de gênero, geração e etnia igualitárias e solidárias no cotidiano dos trabalhadores e trabalhadoras. É preciso também entender que a agricultura familiar só se viabiliza a partir de uma economia solidária. Neste sentido, a gestão coletiva da produção se apresenta como uma alternativa concreta, pela prática da cooperação.

Dessa forma, Veiga et al (2001b) ressaltam a importância da presença da agricultura familiar no meio rural brasileiro, visto que uma região rural terá um futuro tanto mais dinâmico quanto maior for a capacidade de diversificação da economia local impulsionada pelas características de sua agricultura. As economias rurais mais dinâmicas são as que, simultaneamente, conseguem atrair consumidores de seus atributos territoriais e vender suas produções em mercados diferenciados. Exatamente o avesso das economias especializadas em commodities agrícolas. Estas podem até dar a ilusão de grande dinamismo em sua fase inicial, quando sugam a renda diferencial propiciada pela exploração da fertilidade natural. No entanto, depois dessa acumulação primitiva, tudo passa a depender do grau de diversificação dos negócios criados no entorno dessa fonte primária. Sem diversificação, em vez de uma economia rural dinâmica, surgirá, no máximo, um grande enclave.

1.3 A dicotomia desenvolvimento rural/desenvolvimento urbano

O desenvolvimento rural deve ser “percebido como a expressão da dinâmica econômica espacial em que interagem as atividades agropecuárias com as atividades comerciais, agroindustriais e de serviços a partir da geração e da forma de distribuição e apropriação da renda agropecuária”, segundo Frantz e Silva Neto (apud SILVA NETO; BASSO, 2005).

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As comunidades rurais representam o primeiro passo e constituem a escala de maior relevância nos processos de diagnóstico e de planejamento participativo para o desenvolvimento agrícola e rural, pois se trata de um processo microssocial de construção coletiva no qual prevalecem as necessidades sociais e culturais, mas que devem estar sincronizadas com as oportunidades locais de desenvolvimento quanto nos aspectos econômicos da inserção no mercado, como nos aspectos dos recursos naturais disponíveis e de sua conservação. Acerca dessa discussão, os autores ainda defendem a ideia de que os Planos de Comunidades são centrais na perspectiva de novos desenhos de planejamento, especialmente na forma de agregar informações para a elaboração de Planos Municipais de Desenvolvimento Rural de maior abrangência para a elaboração de Planos de Desenvolvimento Rural Microrregional e Regional, levando-se em conta as tendências e variáveis macro, mas sem perder de vista as particularidades e as especificidades locais e comunitárias (BEBER; CAPORAL, 2002). Assim, através dessas estratégias é possível alcançar níveis de desenvolvimento locais mais amplos, com resultados positivos diretos aos envolvidos, garantindo maior participação e, consequentemente, maior protagonismo dos agricultores nos projetos de desenvolvimento locais.

Um dos precursores deste processo foi o professor José Eli da Veiga, que vem, desde os anos 80, publicando livros e artigos sobre a necessidade e a viabilidade da estratégia de desenvolvimento rural ser balizada pelo fortalecimento da agricultura familiar. Uma de suas publicações, sob o título “Desenvolvimento rural: o Brasil precisa de um projeto”, sintetiza sua contribuição acerca das estratégias para o desenvolvimento rural (VEIGA, 1998). Suas ênfases estão na crítica à agricultura patronal como estratégia de desenvolvimento agrícola e ao viés urbano das políticas públicas brasileiras. Sendo o desenvolvimento rural um fenômeno intrinsecamente local e regional, seu eixo propositivo de política centra-se na necessidade de pensá-lo a partir desses espaços. Para isso, torna-se inadiável, além do fortalecimento de programas tipo Pronaf, Proger-Rural e a política dos assentamentos, um amplo programa-rede voltado ao fortalecimento da família rural, cuja principal ênfase deva ser a educação. Esta deveria incluir o ensino regular básico, a necessária formação profissional e a relação dos dois anteriores com as redes de ciência, tecnologia e extensão.

Para Veiga e Abramovay (1999), qualquer estratégia de desenvolvimento rural no Brasil deve, necessariamente, passar pelo fortalecimento da agricultura familiar. Os autores

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argumentam embasados na experiência dos países desenvolvidos que fortaleceram suas estruturas sociais agrícolas familiares como pilares, não só do desenvolvimento rural, mas, também do seu desenvolvimento integrado, rural e urbano. Embora com ênfases distintas, as correntes acabam aproximando-se em questões como a formulação de políticas de forma ascendente, a participação dos protagonistas e a ênfase no modelo de desenvolvimento endógeno-local. Enfatizam também a necessidade de um processo ascendente de formulação de políticas de desenvolvimento rural envolvendo a participação dos atores sociais locais.

Outra base empírica utilizada como argumento para a defesa da agricultura familiar é a publicação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que mostra que municípios com alto IDH têm predominância da agricultura familiar. O município de Feliz, no Rio Grande do Sul, ficou em primeiro lugar no IDH no Brasil, e tem estrutura socioeconômica com preponderância da agricultura familiar. Além deste, outros 20 com os mesmos índices estão entre os 50 melhores municípios colocados no ranking brasileiro do IDH. Abramovay (1999) assegura em várias publicações, a importância da agricultura familiar para o desenvolvimento rural e vem enfatizando a importância da incorporação das noções de território e de capital social para repensar o desenvolvimento rural. Sua análise está centrada na noção de que um território representa uma trama de relações com raízes históricas, configurações políticas e identidades que desempenham um papel ainda pouco conhecido no próprio desenvolvimento econômico.

Kageyama (1998) também se posiciona a favor do enfoque na economia local em substituição às categorias urbano/rural, uma vez que a integração entre espaço e setores – industrialização difusa, novas funções de lazer das áreas rurais, descentralização dos serviços públicos - surge um novo tipo de área com maior dinamismo e com, pelo menos, duas vertentes: a diversificação interna e a integração externa. As áreas diversificadas privilegiam a identidade territorial, a cooperação e a solidariedade intersetorial; têm formas bastante variadas de integração externa e visam a mercados segmentados ou “nichos”.

Nesse mesmo sentido, Silva Neto e Basso (2005) reafirmam que, a partir do novo contexto de revalorização rural, supera-se a tradicional visão setorial e dicotômica na qual o rural correspondia ao agrícola, e o urbano ao industrial. Ou seja, que o rural era somente um espaço de produção agrícola, geradora de matéria-prima para a industrialização do país. O

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rural não se confunde com o agrícola, e a perspectiva setorial tende a ser substituída pela perspectiva territorial, tendo como elemento central as potencialidades específicas de cada local, valorizadas pela dinâmica da globalização. Nesse contexto, o meio rural tende a ser crescentemente percebido (e valorizado) em quatro dimensões centrais: a de espaço produtivo (dominantemente agrícola e agroindustrial), a de espaço de residência, a de serviços (inclusive os de lazer, turismo etc.) e a de espaço patrimonial (valorização pela função de preservação de recursos naturais e culturais) (MATOS et al, 1998). Uma forma de fomentar o desenvolvimento rural local é estimular, através de programas e políticas públicas, a integração entre agricultura familiar e as atividades do setor secundário e terciário nos municípios, oferecendo assim amplas oportunidades de ocupação e geração de renda.

Nesse sentido, Sachs (2004) destaca que estimular a geração de emprego e renda é primordial para se alcançar o desenvolvimento local sustentável. A capacidade local de planejamento e o estímulo à capacidade de mobilizar recursos e iniciativas locais são condições necessárias para se alcançar esse objetivo. Segundo o autor, por meio do emprego decente e/ou autoemprego para todos, é possível assegurar, simultaneamente, a sustentabilidade social e o crescimento econômico. Conforme salienta o autor, o estímulo ao autoemprego, ou seja, mudança na distribuição primária de renda, em vez de manter o padrão excludente de crescimento, exige a combinação de várias políticas públicas complementares, como explorar todas as oportunidades de crescimento induzido pelo emprego e com baixo nível de importações; desenhar políticas para consolidar e modernizar a agricultura familiar como parte de uma estratégia para estimular o desenvolvimento rural com base na pluriatividade da população rural; promover ações afirmativas para melhorar a condição de trabalhadores por conta própria e microempresas; estabelecer conexões mutuamente benéficas entre grandes e pequenas empresas; usar compras governamentais para promover micro e pequenas empresas e fortalecer as empresas industriais de grande porte e transformá-las em atores competitivos em escala global.

1.4 Desenvolvimento local/endógeno

Na conceituação de Buarque (1999), o desenvolvimento local é um processo endógeno registrado em pequenas unidades territoriais e agrupamentos humanos capaz de promover o dinamismo econômico e a melhoria da qualidade de vida da população. Representa uma

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singular transformação nas bases econômicas e na organização social em âmbito local, resultante da mobilização das energias da sociedade, explorando as suas capacidades e potencialidades específicas. Para ser um processo consistente e sustentável, o desenvolvimento deve elevar as oportunidades sociais e a viabilidade e competitividade da economia local, aumentando a renda e as formas de riqueza, ao mesmo tempo em que assegura a conservação dos recursos naturais.

Assim sendo, o desenvolvimento local, analisado dentro das condições contemporâ-neas de globalização, pode caracterizar-se como um processo de integração econômica com o contexto regional e nacional, que gera oportunidades e ameaças, exigindo um poder maior de competitividade e, consequentemente, um processo constante de especialização. O desenvolvimento local dentro da globalização é uma resultante direta da capacidade dos atores e da sociedade local de se estruturarem e se mobilizarem, com base nas suas potencialidades e sua matriz cultural, para definir e explorar suas prioridades e especificidades, buscando a competitividade num contexto de rápidas e profundas transformações (BUARQUE, 1999). Portanto, tanto a abertura de espaços nos mercados internacionais quanto à disputa por espaços nos mercados locais, regionais e nos segmentos de maior capacidade e vantagem locacional, são alcançados pelo poder competitivo, dinâmico e seletivo maior de cada localidade. Consequentemente, segundo Buarque (1999, p. 15), “se as vantagens competitivas são criadas e construídas com investimentos e aproveitamento das potencialidades e diversidades de cada localidade, os atores sociais têm uma responsabilidade fundamental para a promoção do desenvolvimento local”.

O processo de desenvolvimento regional abarca outra caracterização, que é a chamada endogeneização. Trata-se de um conceito que qualifica o desenvolvimento “germinado no interior da região, que contempla as necessidades e aspirações da coletividade regional e resulta de uma sólida e ativa consciência de territorialidade”. Dallabrida (2008, p. 7) reforça que algumas expressões-chave inerentes a este processo são a convergência e a interação. É o desenvolvimento impulsionado por elementos internos, ou seja, de dentro para fora. Nesse processo, o território atua decisivamente na formação de estratégias que influenciam sua dinâmica de desenvolvimento. A interação entre os atores públicos e privados é fundamental para gerar a sinergia necessária para o processo de desenvolvimento. Trata-se, portanto, de

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um projeto coletivo de desenvolvimento que se articula dentro de um território, daí a ideia de endógeno.

Os sistemas produtivos locais, gerados a partir de processos endógenos de desenvolvimento territorial, operam com base em relações de trabalho e de produção peculiares que estão diretamente relacionados ao ambiente social e à estrutura econômica, permitindo assim uma articulação das novas formas de produção com o modo de vida local. Essa articulação do tecido produtivo local com o ambiente socioeconômico levou à crescente utilização do conceito de entorno (termo francês milieu, conforme referiram Maillat (1996) e Aydalot (1986 apud BARQUERO, 2001), entendido como o espaço (físico, mercantil, cultural, identitário etc.) onde se dá a atuação dos agentes. De fato, milieu possui essa conotação e passa a ser entendido como o território. Seguindo esta perspectiva, Reis (1992) definiu os territórios como espaços organizadores de funções econômicas, onde se iniciam, desenvolvem-se e se potencializam processos relacionais de estruturação produtiva, originando materialidades econômicas particulares em cujo contexto de funcionamento as referências de ordem local podem ser significativas.

À medida que a noção de desenvolvimento territorial foi se fortalecendo, as discussões sobre o papel da agricultura e do espaço rural também se modificaram. Na verdade, a abordagem territorial promoveu a superação do enfoque setorial das atividades econômicas (agricultura, indústria, comércio, serviços etc.) e suplantou a dicotomia espacial entre o rural e urbano ou o campo e cidade. Na perspectiva territorial, as dicotomias e os antagonismos são substituídos pelo escrutínio da diversidade de ações, estratégias e trajetórias que os atores (indivíduos, empresas ou instituições) adotam visando à sua reprodução social e econômica. Não há determinismo de qualquer ordem ou evolução predeterminada, pois a viabilização dos atores e dos territórios dependerá do modo particular e específico de cada tipo de interação, das decisões e racionalidades. Como resultado, emergem a diversidade e a heterogeneidade social e econômica dos territórios, que se constituem no traço característico dos distintos caminhos e trajetórias que podem ser seguidos em direção ao desenvolvimento (PECQUEUR, 1992; 1996).

Desenvolvimento local tornou-se um conceito e um instrumento de concertamento e diálogo social que coloca nas mãos dos seus beneficiários, os atores locais, a responsabilidade

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de desenhar e pôr em prática estratégias sustentáveis de inclusão social. Um dos fundamentos desse processo é a mobilização do potencial endógeno do território, os pontos fortes de cada meio local para melhorar a qualidade de vida dos seus habitantes.

Pode-se afirmar, portanto, que as fórmulas tradicionais de desenvolvimento traduzidas aos países periféricos pelos países centrais não asseguram sequer condições mínimas de promover o bem-estar social, ou seja, desenvolvimento. Seguindo nesta lógica e partindo do pressuposto de que os programas, as políticas devam considerar tanto as necessidades locais quanto as potencialidades existentes para convencionar as questões socioeconômicas, o desenvolvimento local parece ser o mais adequado.

De acordo com Buarque (1999), desenvolvimento local são processos endógenos, percebidos em pequenas unidades territoriais e agrupamentos humanos capazes de promover o dinamismo econômico e a melhoria da qualidade de vida da população. Em âmbito local representa uma singular transformação nas bases econômicas e na organização social, fruto da mobilização das energias da sociedade, explorando as suas capacidades e potencialidades específicas. Para que o processo contemple a sustentabilidade, o desenvolvimento deve elevar as oportunidades sociais e a viabilidade e competitividade da economia local, aumentando a renda e as formas de riqueza, ao mesmo tempo em que assegura a conservação dos recursos naturais.

Para Barquero (1988), a capacidade de a sociedade liderar e conduzir o seu próprio desenvolvimento regional/local, condicionando-o à mobilização dos fatores produtivos disponíveis em sua área e ao seu potencial, traduz a forma de desenvolvimento denominado endógeno. Podem-se identificar duas dimensões no desenvolvimento local, endógeno: a primeira, econômica, na qual a sociedade empresarial local utiliza sua capacidade para organizar, da forma mais producente possível, os fatores produtivos da região; a segunda, sociocultural, em que os valores e as instituições locais servem de base para o desenvolvimento da região. Por sua vez, o desenvolvimento endógeno surge como reação ao paradigma produtivo fordista e a difusão de inovações tecnológicas “centro-periferia” (VASCONCELOS et al, 2007).

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O desenvolvimento endógeno, para Long e Ploeg (1994), é construído principalmente, ainda que não exclusivamente, sobre os recursos localmente disponíveis, tais como as potencialidades da ecologia local, da força de trabalho, conhecimentos e modelos locais para articular produção e consumo etc. Ao contrário da modernização, o desenvolvimento endógeno tem como ponto de referência as características socioculturais, ecológicas e, por que não dizer, econômicas locais como suporte na hora de estabelecer relações. Isto é, o desenvolvimento cobra um redirecionamento no sentido de qualquer processo de câmbio social. De maneira alguma significa romper relações externas na esperança de evitar simplesmente o desaparecimento de elementos socioculturais e ecológicos vinculados ao lugar. Trata-se de buscar formas de integrar as identidades culturais e os processos globais num esforço para impedir que nos tornemos simples consumidores de modelos culturais elaborados pelos mercados (TOURAINE, 1997), mas não significa a exacerbação fundamentalista das identidades culturais, nacionais ou locais como forma de evitar intercâmbios externos na tentativa de evitar ver-nos arrastados pelas mensagens ao mesmo tempo sedutoras e impessoais da sociedade de massas (TOURAINE, 1997). Então, o desenvolvimento endógeno não significa ausência de elementos externos; significa localização do desenvolvimento.

Para Remmers (2000), o desenvolvimento endógeno é aquele que entende e fomenta a capacidade localizadora dos atores locais. Nas palavras de Remmers (1998), localização é um processo que não significa só a produção e o consumo de recursos num contexto espacial reduzido, ainda que possa significá-lo. Sobretudo, é um

processo social em que as pessoas progressivamente percebem que tem um maior controle sobre a direção de suas vidas, num esforço para expressar e fazer valer, dentro de um contexto global e articulando-se com ele, a peculiar qualidade de seu lugar de vida, tanto na sua vertente de recursos naturais e humanos como na vertente de controle do processo de desenvolvimento. (REMMERS, 1998, p. 11).

Um processo que pode reverter e modificar o processo de globalização. Ou, como define Guzmán (2001), o endógeno não pode ser visualizado como algo estático e que refaz o externo. Ao contrário, o endógeno “digere” o que vem desde fora, mediante a adaptação à sua lógica etnoecológica e sociocultural de funcionamento.

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O potencial endógeno estaria associado então ao conjunto de recursos disponíveis localmente (naturais e culturais) que podem ser potencializados para promover o desenvolvimento local. Neste aspecto, pode-se defender que as regiões onde o processo de modernização é incompleto ou inacabado são as que apresentam grandes vantagens para o desenho de modelos alternativos de desenvolvimento. Isso em função da possibilidade de conservação de elementos que podem proporcionar a geração de produtos agrícolas, artesanais e serviços de qualidade diferenciada.

Guzmán (1995) aponta duas dimensões fundamentais do potencial endógeno. Uma humana e outra ambiental ou ecológica. Para o autor, a dimensão social envolve todos os esforços dos grupos locais para resistir aos processos de modernização industrial. Neste caso, pode-se considerar como elementos-chave a organização, os processos participativos, a autonomia, a identidade, a cooperação, a força e a organização social do trabalho e o conhecimento local. Na dimensão ecológica, poder-se-ia citar uma agricultura de baixos inputs, a escala de produção, a base energética e o manejo dos agroecossistemas e de sua diversidade. Há quem vincula o potencial endógeno de desenvolvimento menos à habilidade para resistir ao capitalismo e mais à capacidade de “trabalhar” com ele (SLEE, 1994).

Um dos pontos centrais da teoria do desenvolvimiento endógeno, na visão de Barquero (2001), reside no fato de os sistemas de empresas locais e as relações entre estas criarem condições capazes de produzir os processos de crescimento e mudança estrutural nas economias locais e regionais. Barquero (2001) esclarece que esse modelo de desenvolvimento tem como base o local e, por isso, considera que as ações da sociedade civil e suas iniciativas organizacionais assumem caráter imprescindível dentro deste processo. Observa que tal modelo, por vislumbrar questões de natureza microeconômica, permite que a região atinja um crescimento equilibrado e sustentado no longo prazo, sem que haja conflitos com questões de ordem cultural e social. Para o autor,

O desenvolvimento endógeno pode ser visto como um processo de crescimento econômico e de mudança estrutural, liderado pela comunidade local ao utilizar seu potencial de desenvolvimento, que leva à melhoria do nível de vida da população. [...]. A distribuição da renda e riqueza e o crescimento econômico são dois processos que não ocorrem paralelamente. Na verdade, só adquirem uma dinâmica comum pelo fato de os atores públicos e privados tomarem decisões de investimentos que visam elevar a produtividade e a competitividade das empresas, solucionar os problemas locais e aumentar o bem-estar da sociedade. (BARQUERO, 2001, p. 41).

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Tal conceituação, analisada do ponto de vista regional, leva a crer que o conceito de desenvolvimento endógeno pode ser entendido como um processo de crescimento econômico que implica uma contínua ampliação da capacidade de agregação de valor sobre aquilo que é produzido, bem como da capacidade de absorção do locos, cujo desdobramento é a retenção do excedente econômico gerado localmente, além de gerar uma atração de excedentes que provêm de outras regiões. Desta relação, surge um leque de possibilidades dentre as quais cabe destacar a ampliação do emprego, do produto e da renda do local ou da região. Seria, portanto, uma estratégia através da qual as regiões poderiam resistir aos impactos negativos da globalização.

O modelo endógeno de desenvolvimento seria, dessa forma, baseado, embora não exclusivamente, sobre os recursos localmente disponíveis, dando a estes uma nova dinâmica de maneira a torná-los mais “utilizáveis”. As formas empíricas de desenvolvimento endógeno precisam, sim, ser valorizadas, uma vez que este é, sem dúvida, o modelo mais capaz de responder aos desafios ecológicos. Outro ponto importante dentro do conceito de desenvolvimento endógeno é que ele tende a manter os benefícios do desenvolvimento na economia local gerando maior satisfação da sociedade como um todo. Para isso, o desenvolvimento regional endógeno deve compreender três elementos estreitamente interligados: a capacidade cultural de pensar em si mesmo e de inovar; a capacidade político-administrativa de tomar decisões autônomas e de organizar a execução das mesmas; a capacidade do aparelho de produção de assegurar sua reprodução, em conformidade com os objetivos sociais estabelecidos coletivamente (SACHS, 1986 apud DALLABRIDA, 2008). Desenvolvimento endógeno também supõe desenvolvimento local, o que, na opinião de Buarque (2008, p. 26),

É o resultado de múltiplas ações convergentes e complementares, capaz de quebrar a dependência e a inércia do subdesenvolvimento e do atraso em localidades periféricas e de promover uma mudança social no território. Não pode se limitar a um enfoque econômico, normalmente associado às propostas de desenvolvimento endógeno, mas não pode minimizar a de renda e da riqueza locais, por meio de atividades econômicas viáveis e competitivas, vale dizer, com capacidade de concorrer nos mercados locais, regionais e, no limite, nos mercados globais. Apenas com economia eficiente e competitiva gerando riqueza local sustentável pode-se falar efetivamente em desenvolvimento local, reduzindo a dependência histórica de transferências de rendas geradas em outros espaços.

De acordo com esta concepção, o desenvolvimento local supõe mudanças institucionais relativas à gestão das instituições públicas locais, incluindo o município onde os

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excedentes necessitariam ser investidos para melhoria das questões sociais e estratégicas para a localidade. É importante destacar que desenvolvimento local não pode ser confundido com aquele gerado através do capital externo e que, na verdade, não se internaliza e não se irradia na economia local. Tais investimentos não produzem mudanças efetivas na organização da sociedade, não fixam raízes e por consequência não solucionam os problemas relativos à concentração de renda.

O desenvolvimento local, à medida que ocorre de fato, é também sustentável e resulta, segundo Buarque (2008, p. 27, grifo do autor), “da interação e sinergia entre a qualidade de vida da população local - redução da pobreza, geração de riqueza e distribuição de ativos-, a eficiência econômica - com agregação de valor na cadeia produtiva - e a gestão pública eficiente”. Assim, qualquer estratégia de desenvolvimento local, para ser considerada sustentável, deve demandar a elevação das oportunidades da sociedade, compatibilizando, dessa forma, no tempo e no espaço, “o crescimento e a eficiência econômicos, a conservação ambiental, a qualidade de vida e a equidade social” (BUARQUE, 2008, p. 27). Tudo isso firma um compromisso com o futuro e solidariedade com as futuras gerações, apesar de ser um processo carregado de dificuldades e resistências estruturais. Essas questões, associadas a alguma alternativa de distribuição de ativos sociais, principalmente aqueles ligados ao conhecimento e à própria tecnologia inerente a ele, seriam, por assim dizer, os pontos-chave para a viabilização consistente e sólida do desenvolvimento local.

O desenvolvimento local baseia-se, portanto, na execução de políticas de fortalecimento e qualificação das estruturas internas de um território, visando à consolidação de um desenvolvimento verdadeiramente endógeno e criando condições sociais, políticas e econômicas para a geração e atração de novas atividades produtivas e fortalecimento dos laços orgânicos de solidariedade local. Apesar do meio rural ser entendido como local, onde a população dispõe de condições, mesmo que mínimas, de prover seus alimentos a fim de colocá-los em melhores situações que a população urbana, essa situação nem sempre se verifica. É bem provável que possa estar intimamente relacionada às políticas nacionais de desenvolvimento rural adotadas até há pouco tempo, que não consideravam as particularidades sociais existentes.

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