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Cataratas no cão

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Cataratas no Cão

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Patrícia Lima Ferreira

Orientadora: Professora Doutora Justina Maria Prada Oliveira

Coorientador: Dr. Pedro Nuno da Costa Cunha e Silva Gonçalves

Vila Real, 2018

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Cataratas no Cão

Dissertação de Mestrado em Medicina Veterinária

Patrícia Lima Ferreira

Orientadora: Professora Doutora Justina Maria Prada Oliveira Coorientador: Dr. Pedro Nuno da Costa Cunha e Silva Gonçalves

Composição do Júri:

Presidente: Doutor Carlos Alberto e Silva Venâncio, Professor Auxiliar do Departamento de Zootecnia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Vogais: Doutor Luís Miguel Maltez da Costa, Professor Auxiliar do Departamento de Ciências Veterinárias da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Doutora Justina Maria Prada Oliveira, Professora Auxiliar do Departamento de Ciências Veterinárias da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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DECLARAÇÃO

NOME: Patrícia Lima Ferreira

CORREIO ELETRÓNICO: patricia.lima_21@hotmail.com

DESIGNAÇÃO DO MESTRADO: Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

TÍTULO DA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM MEDICINA VETERINÁRIA: Cataratas no Cão

ORIENTADOR: Professora Doutora Justina Maria Prada Oliveira

COORIENTADOR: Dr. Pedro Nuno da Costa Cunha e Silva Gonçalves

ANO DE CONCLUSÃO: 2018

Declaro que esta dissertação de mestrado resulta da procura de informação e do trabalho, não só pessoal, como também da minha Orientadora e Co-orientador. A informação nela contida é original, sendo que as devidas fontes bibliográficas são mencionadas no texto e na bibliografia no fim do documento. Declaro, também, que este documento não foi apresentado noutra instituição, com o objetivo de aquisição de algum grau académico.

Vila Real, 5 de Novembro de 2018

____________________________________ Patrícia Lima Ferreira

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“The eye, the window of the soul, is the chief means whereby the understanding can most fully and abundantly appreciate the infinite works of Nature” Leonardo da Vinci

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IX

Agradecimentos

O meu obrigada à Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, ao Magnífico Reitor, a todos os professores, técnicos e auxiliares que, de certa forma, contribuíram para a realização de um sonho.

À Dra. Justina Prada o meu obrigada, por ter aceite ser minha orientadora na fase final desta longa caminhada. Muito obrigada pela paciência, dedicação, cooperação, compreensão e ajuda.

Ao Centro Oftalmológico Veterinário do Porto – Clínica Veterinária de Serralves, o meu grande obrigada, por toda a aprendizagem, e por todos os bons momentos passados com a equipa que tem. Em especial, ao Dr. Pedro Cunha e Silva por ter aceite ser meu coorientador, por ter disponibilidade para me receber e esclarecer dúvidas, mesmo quando não tem tempo livre.

Aos Médicos Veterinários que fui conhecendo, não só nesta fase final de estágio curricular, mas também ao longo da minha formação, o meu obrigada. Todos eles contribuíram para eu ser uma boa profissional.

Aos meus amigos da minha cidade natal que me companharam em todas as etapas da minha vida. Obrigada Filipa, Diogo, Vânia, Nando e Zé por estarem sempre lá para mim, para o bom, e para o mau, e por nunca me deixarem desistir.

À minha amiga Açoriana, Ana Manuela, que foi um dos meus pilares ao longo de todo o curso, principalmente no 1º ano. É um exemplo de que a distância não é um entrave a uma bela amizade e que demonstra, por pequenos gestos, que a minha felicidade faz parte também da sua.

Um obrigada com um carinho especial à minha amiga mimi. Que sejas sempre o exemplo da tranquilidade e da calma, do empenho e dedicação. Que seja sempre tão fácil sermos amigas.

À Rita Marques, o meu obrigada. A todos os momentos passados contigo, a todas as alegrias e angústias que vivemos juntas. Tudo se alcança com esforço e dedicação, e nós somos um bom exemplo disso.

Um obrigada geral a todos os meus colegas de curso que contribuíram para que esta etapa chegasse ao fim. Sem eles, certamente, esta fase não seria lembrada com uma saudade e carinho tão grande.

Às minhas afilhadas do coração: Cheila, Maria e Inês. A estas 3 pestes o meu grande e sincero obrigada. Foi tão bom conhecer-vos e é sempre tão bom estar com vocês. É voltar a ser criança, longe de todas as responsabilidades que a vida nos impõe.

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X O meu obrigada à Oliveirinha, que sempre contribuiu para que me sentisse bem, tendo sempre disponibilidade para mim. É tão fácil gostar de ti.

À minha grande amiga Catarina, um especial obrigada. A toda a sua ajuda nesta batalha, em que não há palavras suficientemente justas para descrever todo o apoio e carinho. Obrigada por quereres que eu seja sempre o melhor de mim e por estares sempre presente não só quando não é fácil, mas também nas pequenas conquistas que vou fazendo ao longo da vida. É tão bom têr-te ao meu lado.

Aos meus amigos que Vila Real me deu, que estiveram sempre lá ao longo destes 5 anos + 1, o meu grande obrigada. Para eles, as palavras não chegam, pois tudo aquilo que vivemos juntos foi nosso, só fica a saudade. Juntos no bem, e no mal, nos estudos, nas revisões de última hora, nos trabalhos, nos momentos de confraternização, nas saídas, nas lágrimas derramadas por só faltar mais um ano para acabarmos, entre tantas outras coisas. Foi tão bom conhecer estas pessoas caídas do céu: Marta, Rita, Judite, André e Catarina. Realçam o melhor de mim e é tão simples ser feliz perto deles.

Um especial obrigada à minha grande família AEMV-UTAD. Foi tão bom crescer ao vosso lado, e aprender com vocês. Não vou ter saudades das longas e demoradas reuniões que nos fazia tantas vezes chegar a casa 5 horas após o início destas, mas sim do bom ambiente e companheirismo que existia, e de me sentir em família, seja onde for. Obrigada, família.

Ao Miguel, o meu namorado, tenho que agradecer toda a paciência demonstrada dia após dia, todo o carinho que tem por mim e pelo seu ombro amigo sempre disponível mesmo quando os momentos são complicados. Obrigada por estares sempre desse lado.

O meu enorme obrigada aos meus pais, à minha querida irmã e irmão que me ensinaram a acreditar em mim e a valorizar-me acima de tudo. Muitas vezes as limitações somos nós que as impomos, mesmo quando não existem. Obrigada por lutarem sempre pela minha felicidade e por me darem forças para ser capaz de alcançar e concretizar todos os meus sonhos. Foram e são o meu porto de abrigo. O meu obrigada, também, ao Fábio, pela sua disponibilidade e carinho que demonstra sempre.

Um enorme obrigada a toda a minha restante família que me deu apoio, em especial ao meu querido avô que me mostrou como ter força e como ser persistente na luta da vida, apesar de todas as limitações e entraves.

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XI

Resumo

Para que um animal apresente uma boa visão, é importante que os diferentes meios oculares se encontrem saudáveis. Em particular, a transparência é uma característica crucial para o atravessamento de feixes luminosos e consequente acuidade visual.

O cristalino, uma estrutura transparente, é responsável por fazer convergir os raios luminosos sobre a retina. Porém, diversos fatores podem influenciar a transparência da lente, tornando-a, em alguns casos, completamente opaca. Esta oftalmopatia tem a designação de catarata e é a doença mais comum responsável por défices visuais e cegueira em cães.

Atualmente o tratamento para restauro da visão é apenas cirúrgico. A taxa de sucesso da cirurgia de remoção de catarata tem aumentado nos últimos anos, principalmente com a técnica de facoemulsificação. Um dos fatores críticos para o sucesso cirúrgico passa pela prevenção de possíveis complicações pós-cirúrgicas, por exemplo através da administração de fármacos. Hoje em dia, estima-se que em 95% dos casos é possível restabelecer a visão do animal.

Na presente Dissertação de Mestrado, pretende-se apresentar uma abrangente revisão bibliográfica sobre a catarata em cães, complementada com diversos casos clínicos desta doença.

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XIII

Abstract

With the purpose of the animal having a good vision, it is important that the different ocular means are transparent, since the light beams will cross them.

The lens, which is a transparent structure, is responsible for converging these light rays into the retina. However, there are several factors that may influence the transparency of the lens, making it completely opaque in some cases. This ophthalmopathy is called cataract and it is the most common disease responsible for visual deficits and blindness in dogs.

Currently, the treatment to restore vision is only surgical. The success rate of cataract removal surgery has increased in recent years, especially with phacoemulsification technique. It is important to avoid and to prevent possible post-surgical complications, some of which are controlled by the administration of medication. Nowadays, it is estimated that in 95% of cases it is possible to restore sight of the animal.

Therefore, this present Masters dissertation will present a literature review on cataracts in dogs and several canine clinical cases with this pathology.

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XV

Índice

Resumo ... XI Abstract ... XIII Índice de figuras ... XVII Índice de tabelas ... XIX Lista de abreviaturas, siglas, símbolos ou acrónimos ... XXI

Introdução ... - 1 - Capítulo 1 - Olho ... - 3 - Anatomia ... - 3 - Cristalino ... - 4 - Embriologia ... - 5 - Anatomia ... - 5 - Fisiologia ... - 8 - Capítulo 2 - Catarata... - 11 - Definição ... - 11 - Patogenia ... - 11 - Classificação ... - 12 - Idade de aparecimento ... - 12 - Etiologia ... - 14 - Localização ... - 26 - Estado de maturação ... - 26 - Morfologia ... - 29 - Consistência ... - 29 - Evolução ... - 30 - Diagnósticos Diferenciais... - 30 - Diagnóstico ... - 31 - História clínica ... - 32 - Sinais clínicos ... - 32 - Testes Laboratoriais ... - 33 -

Outros exames complementares ... - 33 -

Tratamento ... - 46 -

Cirúrgico ... - 47 -

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XVI

Complicações e Prognóstico ... - 53 -

Profilaxia ... - 57 -

Capítulo 3 – Casos Clínicos ... - 59 -

Material e Métodos ... - 59 -

Caso clínico 1 ... - 60 -

Caso clínico 2 ... - 62 -

Caso clínico 3 ... - 64 -

Discussão ... - 68 -

Considerações e perspetivas futuras ... - 70 -

Conclusão ... - 71 -

Bibliografia ... - 73 -

ANEXO 1 ... - 83 -

ANEXO 2 ... - 84 -

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XVII

Índice de figuras

Figura 1 – Estruturas internas do olho do cão ……….…..………..… 4

Figura 2 - Cristalino adulto ………....………...6

Figura 3 - Catarata madura, vista com iluminação difusa ………...………... 8

Figura 4 - Catarata polar posterior (Y invertido) ………....………...8

Figura 5 - Visão geral das principais vias do metabolismo da glicose no cristalino ..….….. 10

Figura 6 - Classificação de cataratas de acordo com a posição dentro da lente ..…….….… 26

Figura 7 - Catarata incipiente ………..……….……….… 27

Figura 8 - Catarata incipiente cortical posterior, localizada na região de sutura em y ..…... 27

Figura 9 - Catarata imatura, o animal ainda vê ………..………...… 28

Figura 10 - Catarata madura ……….……….………... 28

Figura 11 - Catarata hipermadura, vista com iluminação difusa …...………29

Figura 12 - Catarata Morganiana ……….……….……… 29

Figura 13 - Esclerose Nuclear ………...………....… 31

Figura 14 - Esclerose Nuclear ………...……….…………...… 31

Figura 15 – Plano axial transcorneal de um olho normal ……….…………..…... 31

Figura 16 – Reflexo pupilar à luz avaliado com transiluminador Finoff …..….…………... 34

Figura 17 – Realização do teste da lágrima de Schirmer num cão ……..…..…………...… 35

Figura 18 – Aplicação de fluoresceína através de uma tira humedecida com soro fisiológico estéril ……….……….……….…….………..…………... 36

Figura 19 – Fluoresceína a delinear as margens de uma úlcera na córnea superficial ...… 36

Figura 20 – Utilização de uma TonoPen-Vet® num cão para mensurar a pressão intraocular ……….……….…….……….………..….. 38

Figura 21 – Uso de um biomicroscópio de lâmpada de fenda portátil num cão ...…..…… 39

Figura 22 – Oftalmoscopia direta monocular ………..……….…..……. 40

Figura 23 – Oftalmoscopia indireta binocular ….……….………..….…… 40

Figura 24 – Ultrassonografia de elevada resolução (12MHz) de um olho normal ..……… 42

Figura 25 – Ecografia que mostra uma catarata cortical anterior e posterior ……..……… 42

Figura 26 – Ecografia que demonstra uma catarata cortical axial posterior ……..…….…. 43

Figura 27 – Ecografia que demonstra uma catarata hipermatura/morganiana ….………... 43

Figura 28 – Eletrorretinograma de um cão ……… ………..….……….. 44

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XVIII

Figura 30 – Exame de gonioscopia a um cão ……… 45

Figura 31 – Visualização do ângulo iridocorneal através da técnica de gonioscopia ...….. 45

Figura 32 – Catarata hipermadura no OS ………. 60

Figura 33 – Catarata hipermadura cortical ……….……….………..… 60

Figura 34 – Catarata madura no olho direito (OD) ………..……….… 61

Figura 35 – Cataratas maduras ……….. 62

Figura 36 – Olho esquerdo com catarata madura cortical anterior e posterior ..………...… 62

Figura 37 – Olho direito com catarata madura …...….……….………. 63

Figura 38 – Olho direito no dia seguinte à cirurgia ……….……….……. 63

Figura 39 – Olho esquerdo no dia seguinte à cirurgia …….…….……….……… 63

Figura 40 – Catarata hipermadura no OS e madura no OD ...……….……….…..… 65

Figura 41 – Cristalinos removidos em cirurgia pela técnica intracapsular …….……..…….. 65

Figura 42 – Cadela após cirurgia ………... 65

Figura 43 – Ecografia de OS com catarata imatura …….…….……….……….… 66

Figura 44 – Ecografia ao OD que demonstra uma catarata madura …….……..…….…..… 67

Figura 45 – Ambiente cirúrgico ……….……..…….. 67

Figura 46 – Olho direito com a pupila em midríase ………67

Figura 47 – Olho esquerdo, após cirurgia ………….……….……… 68

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XIX

Índice de tabelas

Tabela 1 – Cataratas hereditárias isoladas no cão (adaptado de Slatter, 2005 e Gelatt et al., 2013) ……….……….……….……… 15 Tabela 2 – Plano farmacológico recomendado para cães com cataratas submetidos a cirurgia, sem uveíte induzida (Gelatt & Gelatt, 2011) ……….………. 46 Tabela 3 – Diferentes técnicas de remoção da catarata em animais (Gelatt & Gelatt, 2011) 51 Tabela 4 – Recomendações para o tratamento pós-operatório dos cães submetidos a remoção da catarata (Gelatt & Gelatt 2011) …………...……….……….………. 52 Tabela 5 – Complicações associadas a determinadas raças (Brian, 2002) ……….... 53 Tabela 6 – Complicações que podem resultar a curto e longo prazo da técnica intracapsular (adaptada de Ferreira et al, 1997; Gelatt & Gelatt, 2011) ……….……….. 54 Tabela 7 – Complicações que podem resultar a curto e longo prazo das técnicas extracapsular e facoemulsificação (Gelatt & Gelatt, 2011) ……….……….………… 56

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XXI

Lista de abreviaturas, siglas, símbolos ou acrónimos

AINE – anti-inflamatórios não esteróide AR - Aldose Redutase

Clˉ - ião de cloro cm – centímetros

cRPL - Reflexo pupilar à luz cromático D - dioptrias

DPR - Degenerescência Progressiva da Retina ERG - eletrorretinografia

H - horas

K⁺ - ião de potássio Kg - quilogramas LIO - lente intraocular MHz - megahertz Min - minutos mm - milímetros ms - milissegundos Na⁺ - ião de sódio nm - nanómetros OD - olho direito OS - olho esquerdo PIO – pressão intraocular Q - cada

QID - 4 vezes por dia

QSC - queratoconjuntivite seca RPL - reflexo pupilar à luz Sem - semanas

TLS - Teste da Lágrima de Schirmer α - alfa

β - beta

βH - beta pesadas βL - beta leves

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XXII γ - gama

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Introdução

As cataratas são a causa mais frequente de perda de visão e cegueira em cães(Gelatt, 2003). O termo catarata refere-se à presença de qualquer opacidade ao nível da lente do olho, ou da sua cápsula, que atua como uma barreira à visão. Etimologicamente, deriva da palavra latina cataracta que significa cascata, e da expressão grega kataraktes, que corresponde a algo que cai (Keil & Davidson, 2001). Apesar desta definição ter surgido em 1650 por Rolfinck, foi rejeitada pela maioria dos médicos, sendo apenas aceite um século depois. Até lá, assumia-se que a catarata era uma doença muito semelhante ao glaucoma, dado que ambos terminavam em cegueira e o olho adquiria uma aparência esbranquiçada (Souza et al., 2006).

São vários os fatores que podem estar na origem desta oftalmopatia. Porém, está determinado que a maior parte dos casos apresentam etiologia hereditária (Peiffer, 1998). De facto, existem várias raças com predisposição para este problema. Estas serão abordadas posteriormente, tal como outros fatores que estão relacionados com a origem da catarata.

Os parâmetros de avaliação das cataratas são variados, e o uso simultâneo destes é aconselhado para que a descrição de um determinado tipo de catarata seja precisa (Gelatt, 1999). Contudo, a avaliação do estado de maturação da catarata é considerado o parâmetro mais útil e, desta forma, o método mais usado para a classificar (Slatter, 2005). Para além deste, existem também outros parâmetros, tais como a idade de aparecimento, etiologia, localização anatómica, morfologia, consistência e evolução (Gelatt et al., 2013).

O médico veterinário deve efetuar o diagnóstico e a caraterização da catarata da forma mais precisa possível, de forma a distingui-la inequivocamente da esclerose nuclear do cristalino, uma doença senil e que não necessita de tratamento cirúrgico (Gelatt, 1999).

O único tratamento eficaz disponível é a cirurgia, que permite a remoção da catarata, com a possibilidade de se colocar uma lente (Bolzan & Laus, 1998). Atualmente, o método cirúrgico mais bem sucedido é a facoemulsificação (Safatle, et al., 2008).

Deste modo, esta Dissertação de Mestrado tem como objetivo elaborar uma revisão bibliográfica sobre a catarata no cão, desde a sintomatologia associada até à sua profilaxia. Após a revisão bibliográfica, serão apresentados diversos casos clínicos caninos com esta patologia.

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Capítulo 1 - Olho

A visão é um fenómeno sensorial fundamental que contribui para a sobrevivência da maioria dos animais (Maggs et al., 2013). Não pode ser descrita como algo singular, visto que são diversos os fatores envolvidos na sensação de visão. A capacidade de reconhecer a luz e o movimento, a perspetiva visual e a profundidade do campo de visão, a perceção da profundidade, a acuidade visual e a capacidade de discriminar cores são alguns deles (Slatter, 2008).

O olho é o único órgão sensorial que permite a perceção objetiva do meio envolvente, através do processamento da luz nos sinais elétricos que são interpretados (Turner, 2005).

A estrutura básica dos olhos é transversal a todos os mamíferos, mas o processo evolutivo levou a sua adaptação às necessidades particulares de cada espécie (Turner, 2005).

Anatomia

Cada parte do olho é responsável por funções específicas que permitem a visão. O globo ocular é constituído por 3 camadas. A camada externa corresponde à túnica fibrosa que é composta pela córnea, esclera e limbus, sendo responsável por conferir o tamanho e a forma ao olho. É importante referir que a córnea, estrutura transparente localizada anteriormente na túnica fibrosa, permite que a luz a atravesse, sendo uma lente poderosa na refração de raios de luz centralmente para o eixo visual do olho. A camada média ou túnica vascular é constituída pela úvea, que consiste na íris, corpo ciliar e coróide. A íris é uma estrutura ligeiramente pigmentada que possui músculos responsáveis por controlar a sua forma e o tamanho. Desta forma, é responsável pelo controlo da abertura pupilar consoante a quantidade de luz que alcança a retina, passando pelo segmento posterior. O corpo ciliar está envolvido na produção e drenagem do humor aquoso, fluido existente na câmara anterior. A coróide, que está localizada na metade posterior do olho, encontra-se entre a esclera e a retina. É responsável por suprir as elevadas necessidades metabólicas da retina e modificar a reflexão da luz interna. Por fim, a camada interna ou túnica nervosa é composta pela retina associada ao nervo ótico. A retina contém fotorrecetores que são responsáveis pela conversão da radiação eletromagnética (luz) em impulsos elétricos que são, subsequentemente, enviados para o cérebro, através do nervo ótico. Para além destas 3 camadas, existe, ainda no olho, o humor vítreo, conteúdo gelatinoso que ocupa a câmara posterior, bem como o cristalino, lente (Gelatt et al., 2017), que

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- 4 - se encontra ao nível do segmento anterior do olho, na fossa hialóideia (Stafford, 2001), e permite a formação de uma imagem (Gelatt et al., 2017). A Figura 1 ilustra as diversas estruturas pela qual o olho é constituído.

Cristalino

A lente cristalina é responsável pela focagem dos feixes luminosos, direcionando-os para a retina e permitindo a formação de uma imagem nítida e clara (Gelatt et al., 2017). É um dos meios refrativos ou dióptricos do olho, ou seja, uma estrutura através da qual os raios luminosos devem passar antes de chegarem às células recetoras localizadas na retina. Estas estruturas dióptricas são a córnea, o humor aquoso, o cristalino, o humor vítreo e a retina (Banks, 1992; Gelatt, 2003). A córnea é a estrutura refrativa mais importante do olho, contando com a maior parte do poder ótico. O cristalino é apenas responsável por 30% a 35% do poder de refração, mas permite a focagem adequada dos objetos a diferentes distâncias (Stafford, 2001).

Muitos mamíferos apresentam o cristalino com uma forma biconvexa, em que a convexidade da face anterior é menor do que a posterior (Gelatt, 1999). Este grau de

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convexidade altera-se devido à elasticidade da cápsula e à flexibilidade do conteúdo do cristalino (Gelatt et al., 2013).

Embriologia

O cristalino deriva de células ectodérmicas superficiais que se situam diretamente sobre a vesícula ótica. Estas células epiteliais são estimuladas e a sua diferenciação ocorre a partir da formação de um disco compacto, no qual os espaços intercelulares desapareceram e a altura das células aumenta. Este disco invagina para formar uma vesícula ótica cercada pela membrana basal, que irá corresponder à cápsula (Smelser, 1965). O tamanho da vesícula da lente é determinado pela área de contato da vesícula ótica com a ectoderme superficial e também pela capacidade do último tecido responder à indução (Aso et al., 1995). As células da porção posterior da vesícula alongam-se rapidamente e preenchem a vesícula, formando as fibras primárias e secundárias a partir de proteínas específicas do cristalino: α, β e γ “crystallin”. Nesta fase, o número de organelos citoplasmáticos vai diminuindo e são segregados nas terminações das células (fibras) (Smelser, 1965).

Alterações congénitas do cristalino podem ser causadas por fatores genéticos ou exógenos. O desenvolvimento adequado do cristalino é crucial na orquestração da embriogénese intraocular. Assim, os olhos com anomalias na lente apresentam, muitas vezes, defeitos oculares (Cook, 1995).

Anatomia

A lente canina apresenta aproximadamente 10mm de diâmetro equatorial e 7 mm de espessura anteroposterior (Getty, 1986), sendo que tem um volume de aproximadamente 0,5 mL e poder dióptrico entre 40 a 41 (Gelatt, 2003).

A superfície anterior do cristalino situa-se atrás da íris, e a superfície posterior está localizada numa depressão em forma de cúpula do humor vítreo, bem aderido à cápsula posterior pela membrana hialóide (fossa hialóideia) (Carneiro, 1997).

Os pontos centrais das faces são designados por pólo anterior e posterior. A linha que constitui o eixo do cristalino, como circunferência marginal, é denominada por equador (Gelatt, 1999).

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- 6 - Esta circunferência é suspensa por ligamentos zonulares (fibras de colagénio) que partem do epitélio ciliar e se fixam ao redor da cápsula do cristalino (Carneiro, 1997; Gelatt, 2013), no equador, apresentando aproximadamente 120 zónulas (pontos de fixação) no cão (Carneiro, 1997). Para além do sistema de suporte de fibras zonular, a lente contém uma cápsula externa (Getty, 1986).

Assim, o cristalino é constituído pela cápsula (anterior e posterior), epitélio e fibras. Encontra-se, ainda, dividido em duas regiões denominadas por córtex e núcleo, em que o córtex corresponde à parte mais externa próxima da cápsula e o núcleo mais central (Gelatt, 1999). Do córtex ao centro, as diversas zonas estão subdivididas em núcleos adulto, fetal e embrionário, respetivamente (Figura 2) (Maggs et al., 2013).

Figura 2: O cristalino adulto, mostrando as diferentes zonas nucleares, córtex, epitélio anterior e cápsula. É visível

a transformação das células epiteliais em fibras da lente, na região equatorial, tal como a espessura variável da cápsula da lente em várias zonas (Adaptado de Hogan, et al., 1971).

Cápsula

A cápsula do cristalino, tal como referido anteriormente, é uma membrana bastante elástica que engloba os elementos celulares da lente, sendo formada a partir do epitélio da membrana basal. Microscopicamente, evidencia uma estrutura laminar, sendo que cada lâmina corresponde a filamentos de colagénio tipo IV dispostos paralelamente (Gelatt, 1999; Stafford, 2001).

A espessura da cápsula não é uniforme, é mais fina na superfície posterior relativamente à anterior (Getty, 1986), e mais espessa próximo do equador relativamente aos pólos (Figura 2). Estas diferenças de espessura resultam da perda de epitélio durante o desenvolvimento

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embrionário. Relativamente à cápsula anterior, a espessura é de 50 a 70 µm, a posterior é de 2 a 4 µm e a zona do equador tem 8 a 12 µm (Brian, 2002).

Adicionalmente, a superfície anterior da lente é mais plana do que a posterior. A cápsula é impermeável a grandes moléculas como a globulina e a albumina, mas permite a passagem de água e de eletrólitos (Gelatt, 1999).

Epitélio

O epitélio do cristalino é uma monocamada de células cubóides que se localizam sob a cápsula anterior. Estas células proliferam por mitoses, em direção ao equador, tornando-se mais colunares e alongando-se em novas fibras. A atividade mitótica nesta área torna as células mais suscetíveis a influências tóxicas e outras alterações patológicas, podendo adquirir uma tonalidade mais opaca na região do equador (Gelatt, 1999).

A estrutura maioritariamente responsável pela produção de energia no cristalino é o epitélio. Esta energia é usada no transporte ativo de iões inorgânicos e aminoácidos e também intervém na síntese de proteínas. A bomba de Na⁺- K⁺ ATPase intervém no transporte de iões e de aminoácidos, mantendo no interior da lente elevadas concentrações de iões K⁺ e aminoácidos e concentrações baixas de iões Na⁺, Clˉ, e água. O movimento da água ocorre por difusão passiva e como consequência do transporte ativo de catiões. Uma falha na atividade desta bomba iónica pode resultar em catarata (Gelatt, 1999).

Fibras

O maior volume do cristalino corresponde às fibras que se encontram dispostas em camadas interdigitais. Estas são células epiteliais alongadas que perderam os núcleos e os restantes organelos (Stafford, 2001).

O núcleo é constituído pelas fibras primárias de origem embrionária que se encontram circundadas por fibras secundárias do núcleo fetal e, em seguida, pelas fibras pós natal do núcleo infantil e adulto. Estas fibras alongam-se, partindo do equador em direção aos pólos, onde encontram as fibras com origem no equador oposto, formando uma sutura em forma de Y. Nas cataratas, a sutura anterior é visualizada como um Y em pé (Figura 3) e a sutura posterior como um Y invertido (Figura 4) (Slatter, 2005).

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- 8 - Existem, em abundância, junções Gap especializadas, microdomínios de membrana plasmática construída a partir de conjuntos de proteínas designadas por conexinas (Evans & Martin, 2002), nas fibras da lente. Estas junções Gap estão associadas aos processos metabólicos da lente, estando adaptadas ao seu ambiente avascular. Relativamente aos outros epitélios do corpo, as junções Gap do cristalino são maiores, e o espaço disponível entre as membranas adjacentes é menor (Stafford, 2001).

Para além disto, as fibras possuem um citoesqueleto, como as células musculares. Este confere estrutura e suporte interno à célula, sendo constituído por diversos filamentos citoplasmáticos. Os filamentos citoplasmáticos formam uma rede que se encontra ancorada à membrana citoplasmática (Slatter, 2005).

O córtex também é formado por fibras, mas muito finas. Apresentam uma forma ligeiramente fusiforme, sendo mais largas e grossas na região do equador do cristalino. Em corte transversal são moderadamente hexagonais e muito longas. Nas camadas corticais profundas, as membranas podem encontrar-se altamente interligadas e as fibras serem tão finas que a sua natureza helicoidal se torna impercetível (Slatter, 2005).

Fisiologia

A lente é constituída, em média, por 35% de proteínas e 65% de água, sendo a quantidade de minerais escassa (Slatter, 2005). A sua transparência resulta da arquitetura complexa e da composição proteica única (Klein et al., 2002). Para que esta, a elasticidade capsular e a produção contínua de células sejam conservadas, o cristalino necessita de oxigénio e nutrientes (Slatter, 2005). Tratando-se de uma estrutura avascular, as suas necessidades metabólicas são da responsabilidade do humor aquoso. Quando há alterações na composição deste, verifica-se,

Figura 4: Catarata polar posterior num

Golden Retriever, com evidência da sutura do cristalino na zona posterior (Y invertido) (Gelatt & Plummer, 2017).

Figura 3: Catarata madura, vista com

iluminação difusa. É possível a visualização da sutura do cristalino na zona anterior (Y em pé) (Gelatt, 2014).

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consequentemente, alterações no metabolismo e na transparência da lente cristalina (Maggs et al., 2013).

“Crystallin” é um termo funcional que se o refere às proteínas solúveis (α-cristalino) altamente abundantes no cristalino do olho de um vertebrado (Bloemendal et al., 2004; Wistow, et al,. 2010). α-Cristalino preenchem as células das fibras muito alongadas e terminalmente diferenciadas, que devem sobreviver sem se renovarem durante toda a vida, mantendo a transparência e a organização molecular necessária para garantir as propriedades de refração da lente. Como tal, estas proteínas da lente têm sido particularmente sensíveis a pressões evolutivas, mostrando notável adaptação em diferentes linhagens de vertebrados (Wistow, et al., 2010). As proteínas solúveis são divididas em quatro grupos, tendo como base o seu tamanho molecular: α-, β-pesadas (βH), β-leves (βL) e γ (Gelatt, 2014).

A transparência dentro do cristalino é mantida por vários fatores complexos. Entre eles estão a baixa densidade citoplasmática (devido à falta de organelos intracelulares e núcleos celulares nas fibras do cristalino), pequenas flutuações espaciais do índice de refração do citoplasma e também o arranjo em rede de células (que é altamente organizado). As flutuações no índice de refração citoplasmática são pequenas em comparação com o comprimento de onda da luz, de tal forma que a dispersão da luz é minimizada. As flutuações espaciais dependem do peso molecular das α-Cristalino, das concentrações, da fração volumétrica das proteínas intracelulares e da organização das proteínas no citoplasma. Esses fatores, por sua vez, são influenciados pela hidratação citoplasmática, força iónica e outras funções metabólicas especializadas dentro da lente (Hejmancick & Piatigorsky, 2000; Kuszak et al., 2000).

O metabolismo da glicose fornece a maior parte dos requisitos energéticos do cristalino. A glicose é transportada do humor aquoso para o cristalino ocorre por difusão facilitada, sendo, depois, convertida anaerobicamente em ácido lático (lactato), pela via Pentose Fosfato, ação da enzima hexoquinase (Maggs et al., 2013). Minoritariamente, verifica-se igualmente ocorrência de glicólise aeróbica pelo ciclo de Krebs (Maggs et al., 2013). O ácido lático formado difunde-se para o humor aquoso. A taxa de glicólidifunde-se é controlada pela quantidade da enzima hexoquinase e pela taxa de entrada de glicose na lente. Quando as concentrações de glicose são elevadas (>175 mg/dL), o nível de glicose-6-fosfato aumenta e, por sua vez, inibe a enzima hexoquinase (Figura 5). Esta inibição limita a taxa de glicólise e, deste modo, previne a acumulação excessiva de ácido lático no cristalino que, por sua vez, seria responsável por baixar o pH e ativar a proteólise da lente (Gelatt, 1999).

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- 10 - Os distúrbios da lente compreendem alterações relacionadas com o desenvolvimento embriológico, a transparência e a posição correta dentro do olho. Isto reflete a sua anatomia simples, que inclui um sistema de suporte de fibra zonular, cápsula externa composta por membrana basal, epitélio e fibras de lentes diferenciadas (Gelatt, 2013).

Figura 5: Visão geral das principais vias do metabolismo da glicose no cristalino. As percentagens representam

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Capítulo 2 - Catarata

Definição

As cataratas são a causa mais frequente de perda de visão e cegueira em cães, afetando tanto cães sem raça definida, como de raças puras. São caraterizadas por uma focal ou difusa opacidade do cristalino, ou da cápsula deste (Gelatt, 2003; Lal, et al., 2017). A turvação progressiva do cristalino interfere na absorção da luz que chegará à retina (Gelatt, 2003).

Quando as cataratas são evidentes clinicamente, e especialmente em casos moderados a avançados, verifica-se que ocorrem alterações bruscas e irreversíveis no metabolismo do cristalino ao nível do conteúdo proteico do cristalino, bombas metabólicas, concentrações iónicas e atividade antioxidante(Hurst, 1993; Hejmancick & Piatigorsky, 2000; Kuszak et al., 2000).

Patogenia

As cataratas estão associadas a um aumento das proteínas de alto peso molecular insolúveis, albuminóides, que normalmente compreendem cerca de 15% das proteínas do cristalino. Simultaneamente, verifica-se uma diminuição da quantidade relativa de proteínas solúveis, as α-cristalino. Tipos específicos de catarata podem estar associados a alterações das concentrações relativas das α-cristalino (Hejmancick & Piatigorsky, 2000), como acontece, por exemplo, na raça Schnauzer Miniatura. Na catarata congénita desta raça há uma diminuição das α-cristalino e β-leves e um aumento das cristalinas β-pesadas e γ (Daniel et al., 1984). Estudos de microscopia eletrónica, em cataratas caninas, documentam uma redistribuição e/ou perda dessas proteínas citoplasmáticas, que contribuem para a formação da catarata (Freel et al., 2002).

As cataratas também são associadas, frequentemente, a uma diminuição da atividade da bomba epitelial de Na⁺ K⁺ ATPase que, por sua vez, pode causar um aumento de sódio e cálcio e uma diminuição do conteúdo de potássio dentro da lente. O consumo de oxigénio, a produção de ATP, e a atividade antioxidante diminuem. Isto resulta na diminuição dos níveis de glutationa reduzida e oxidada, vitaminas C e E e superóxido dismutase, e no aumento do nível de ligações dissulfureto (Gelatt et al., 2013). Um estudo documentou também a diminuição dos níveis das enzimas antioxidantes catalase e desidrogenase glicose-6-fosfato, no humor aquoso

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- 12 - de Caniche com catarata, comparativamente com outros sem catarata (Barros et al., 2004).Para além disso, foram encontrados níveis aumentados de ferritina, proteína de ligação de ferro, em lentes caninas com cataratas. Assume-se que isto ocorre para limitar o dano oxidativo catalisado pelo ferro (Goralska et al., 2009).

Segundo Bras et al., os níveis de marcadores associados à desregulação do ciclo celular e da proliferação estão aumentados na catarata diabética em cães. Este fenómeno pode ser explicado pelo rápido início de ação das cataratas diabéticas (Bras, et al., 2007).

Classificação

Existem vários parâmetros para classificar as cataratas, dado que é grande a diversidade de aparência e de natureza (Slatter, 2005). Geralmente, é apropriado usar, simultaneamente, os diferentes esquemas de classificação, para descrever com precisão um tipo específico de catarata. Deve-se notar que a maioria desses esquemas de classificação não implica, de facto, uma etiologia específica. Por exemplo, uma catarata congénita ou juvenil não implica necessariamente uma base hereditária, embora isso aconteça frequentemente (Gelatt et al., 2013).

Assim, os parâmetros mais comuns de classificação são: idade de aparecimento, etiologia, localização no cristalino, estado de maturação, morfologia, consistência e evolução (Gelatt et al., 2013).

Idade de aparecimento

Com base na idade em que esta surge, a catarata pode ser pode ser classificada como congénita-infantil, juvenil ou senil (Keil & Davidson, 2001; Gelatt et al., 2013).

A idade de início da catarata é variável, sendo que ocorre, geralmente, entre os 5 e os 8 anos (Cook, 2008). É comum que a sua manifestação ocorra numa idade específica de acordo com a raça (Tabela 1) (Peterson-Jones, 2002).

A catarata que ocorre em cães de raça pura jovens a meia-idade compreende o tipo mais comum das que são observadas clinicamente em medicina veterinária (Gelatt et al., 2013).

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Quando as opacificações já estão presentes no nascimento do animal são designadas por cataratas congénitas (Gelatt, 1991), sendo que aparecem durante o desenvolvimento (Gelatt, 1999). Qualquer perturbação no crescimento da lente, enquanto decorre a formação das fibras primárias, resulta em catarata. Esta geralmente não é progressiva e apresenta localização nuclear fetal (Gelatt, 1991), apesar de envolver, frequentemente, a região adjacente do córtex anterior e posterior (Gelatt et al., 2013). As cataratas congénitas podem, também, encontrar-se associadas a outros defeitos oculares. As alterações mais comuns incluem membrana pupilar persistente, artéria hialóide persistente, hiperplasia primária persistente do vítreo, microftalmia e anormalidades oculares múltiplas (Slatter, 2005).

Este tipo de catarata pode ser de caráter hereditário, como é comum nos cães da raça Cocker Spaniel Inglês, Schnauzer, Pastor Alemão (Barros, 1989; Carastro, 1993), Boston Terrier, Old English Sheepdog, Welsh Springer Spaniel, e West Highland White Terrier (Tabela 1) (Carmichael et al., 1965; Koch & Rubin, 1967). Por outro lado, a catarata congénita pode ter, origem materna, ou seja, decorrer de uma anormalidade sistémica sofrida pela mãe durante a gestação (Barros, 1989; Carastro, 1993). Por exemplo, pode resultar da exposição a agentes tóxicos ou infeciosos no útero (Carmichael et al., 1965; Koch & Rubin, 1967). Se este distúrbio sistémico ocorrer durante a gestação, as fibras primárias do cristalino são afetadas, resultando numa opacificação nuclear do cristalino (Barros, 1989; Carastro, 1993).

Deste modo, nem todas as cataratas congénitas resultam de uma predisposição genética. Este facto é relevante para os criadores de cães, no sentido de determinarem se estão a reproduzir raças que desenvolvem cataratas de forma hereditária (Slatter, 2005).

As cataratas juvenis são classificadas por English como aquelas que se desenvolvem em animais com menos de dois anos de idade (English, 1992).

Finalmente, a maioria dos cães sujeitos a cirurgia para catarata é de meia-idade ou mais velha (Peterson-Jones, 2002). São consideradas cataratas senis aquelas que se desenvolvem em animais com mais de seis anos de idade (Dziezyc, 1990).

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- 14 - Etiologia

Existem diferentes fatores específicos (internos e externos) que podem estar na origem das cataratas nos cães. Porém, pode ser difícil determinar a etiologia destas (Davidson & Nelms, 1998).

Segundo Maggs et al., as etiologias podem ser classificadas como primária (quando se trata de uma situação hereditária) ou secundária (todas as restantes etiologias) (Maggs et al., 2013). Assim, as diferentes etiologias são: hereditária, doença sistémica, fármacos ou outros tóxicos, deficiências nutricionais, lesões no cristalino, envelhecimento e inflamações (Gelatt et al., 2013). Estas possíveis causas correspondem a fatores predisponentes a um tipo morfológico específico de catarata (Gelatt, 1999).

O fenómeno de quando estão implícitos pelo menos dois fatores etiológicos é designado por co-cataratogénese (Slatter, 2005).

Hereditária

A maioria das cataratas, nos cães, apresenta componente hereditária (Dziezyc, 1990; Peiffer, 1998), com uma maior incidência em determinadas raças (Peiffer, 1998). Porém, somente uma minoria das raças afetadas por catarata tem base hereditária e o modo de transmissão determinado (Tabela 1) (Gelatt et al., 2013).

As cataratas herdadas e diabéticas caninas diferem da catarata humana senil típica na progressão e aparência (Gelatt & Mackay, 2005). O que sugere, muitas vezes, que a catarata apresenta etiologia hereditária é a sua frequente localização anatómica caraterística, opacidade do cristalino nos estágios iniciais, idade frequente de início e a evolução, natureza bilateral e a ausência de outros distúrbios oculares que poderão induzir a formação de catarata (Rubin, 1989; Gelatt & Mackay, 2005; ACVO Genetics Committee, 2010). Porém, estas cataratas raramente são simétricas quanto à opacificação (Dziezyc, 1990).

Em 2010, o Comité de Genética do Colégio Americano de Oftalmologistas Veterinários documentou 160 raças de cães em que se suspeitava ou estava comprovado que existia uma base hereditária para catarata (ACVO Genetics Committee, 2010). Um estudo determinou que 59 raças de cães apresentavam alta prevalência para desenvolver catarata. A maior prevalência estava associada a 7 raças de cães, nomeadamente Fox Terrier de pelo liso, Bichon Havanês,

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Bichon Frisé, Boston Terrier, Caniche Miniatura, Silky Terrier e Caniche Toy (10% a 12%). Por outro lado, o maior número de casos de catarata surgiu nas seguintes raças: Caniche Miniatura, Cocker Spaniel Americano, Boston Terrier, Caniche Standard e Schnauzer (5% a 12%) (Gelatt & Mackay, 2005).

Muito pouco se sabe sobre a patogenia das cataratas caninas hereditárias (Barnett, 1982; Gelatt & Das, 1984), pelo que estas informações ainda por descobrir podem ser extrapoladas dos casos de cataratas hereditárias de humanos e de animais de laboratório (Zigler, 1990; Merin, 1991). Porém, o caráter hereditário da catarata pode ser provado de forma conclusiva através da identificação do gene responsável ou pela realização de testes rigorosos de hereditariedade, envolvendo o cruzamento de cães de várias gerações. Estes testes têm efetivamente demonstrado a hereditariedade da catarata em diferentes animais, como em bovinos, equinos e cães (cerca de 20 raças) (Tabela 1) (Slatter, 2005).

Tabela 1: Cataratas hereditárias isoladas no cão (adaptado de Slatter, 2005 e Gelatt et al., 2013).

Raça Herança genética Idade Localização inicial

Afghan Hound Autossómica recessiva 6-12 meses Equador/córtex posterior Bichon Frisé Autossómica recessiva 2 -8 anos Córtex anterior/posterior Boston Terrier Autossómica recessiva Congénito Núcleo/sutura posterior

Desconhecida 3-4 anos Equador/córtex anterior Buhund Norueguês Autossómica dominante Congénita Núcleo fetal

Chesapeake Bey Retriever

Dominância incompleta > 1 ano Núcleo/córtex Cocker Spaniel

Americano

Autossómica

recessiva/poligénica > 6 meses Córtex anterior/posterior Cocker Spaniel Inglês

Desconhecida Congénito Cápsula anterior Entlebucher Moutain Autossómica recessiva 1-2 anos Córtex posterior

Golden Retriever Autossómica recessiva > 6 meses Subcapsular posterior Labrador Retriever Dominância incompleta > 6 meses Subcapsular posterior

Old English Sheepdog

Autossómica recessiva Congénito Núcleo/córtex

Pastor Alemão Dominância incompleta Congénito Nuclear Autossómica recessiva 8 semanas Sutura posterior/córtex Caniche Miniatura Desconhecida 2-6 anos Córtex

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- 16 - Tabela 1: Continuação (adaptado de Slatter, 2005 e Gelatt et al., 2013).

A influência genética nas cataratas hereditárias pode ser recessiva ou dominante. Todavia, o facto de se determinar um fator genético específico de um tipo particular de catarata numa raça não implica que seja o único. Pode existir outro fator genético responsável por causar outro tipo de catarata nessa mesma raça. A raça Golden Retriever é um exemplo da possibilidade de existirem, simultaneamente, mutações recessivas e dominantes que aumentam o risco de desenvolvimento de catarata (Slatter, 2005).

Segundo um estudo realizado por Gelatt e Mackay, a raça e a idade são mais importantes do que o género na determinação da prevalência da catarata no cão. Apesar das cataratas primárias serem mais frequentes em raças pequenas, existem exceções importantes como é o caso dos Retrievers, Standard Schnauzer e Caniche Standard (Gelatt & Mackay, 2005).

Tem-se conhecimento que a catarata subcapsular posterior nas raças Labrador e Golden Retriever é herdada e, embora isso justifique o início mais precoce desta condição com esta localização no cristalino destas raças, é muito provável que fatores genéticos tenham igualmente um papel significativo (Curtis & Bamet, 1989).

Associada a doença sistémica

As cataratas podem, igualmente, apresentar como etiologia alterações de cariz metabólico, como diabetes mellitus, hipocalcemia, hipercupremia, entre outros (Peiffer, 1998; Gelatt et al., 2013). Nestes casos, resultam de anormalidades bioquímicas de origem endócrina ou em defeitos enzimáticos (Slatter, 2005).

Caniche Standard Autossómica recessiva > 1 ano Córtex equatorial Schnauzer Miniatura

Autossómica recessiva Congénito Núcleo/córtex posterior > 6 meses Córtex posterior Staffordshire Bull

Terrier Autossómica recessiva > 6 meses Sutura posterior/córtex Rottweiler

Desconhecida > 10 meses Polo

anterior/posterior/córtex Welsh Springer

Espanhol Autossómica recessiva Congénito Núcleo/córtex posterior West Highland White

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Diabetes mellitus

A diabetes mellitus é frequentemente associada à rápida formação de cataratas, com simetria bilateral nos cães (Gelatt et al., 2013). Estas cataratas progridem rapidamente, pelo que, qualquer cão que apresente um desenvolvimento rápido de cataratas deve ser examinado (Gelatt, 1999).

Surgem a partir de alterações bem definidas nas vias metabólicas do cristalino. Com níveis elevados de glicose no sangue, os níveis de glicose no cristalino aumentam igualmente (Gelatt et al., 2013). Assim, quando a glicose no cristalino alcança concentrações em que a enzima hexoquinase se encontra saturada, outra enzima, aldose redutase (AR), pode converter a glicose em sorbitol (Hejtmancik et al., 2015). Isto conduz à acumulação de sorbitol nas células da lente (Gelatt, 1999), gerando-se, assim, um potencial osmótico mais elevado. Este gradiente osmótico atrai água para dentro do cristalino (Hejtmancik et al., 2015), resultando na formação de vacúolos na zona equatorial, que progridem, posteriormente, para o córtex (Figura 5). Este processo não é necessariamente bilateral e simétrico, e ocorre em todos os cães diabéticos (Hashim & Zarina., 2011). A hiperosmolaridade da lente leva à contínua entrada de água, podendo conduzir ao aumento repentino do seu volume, fenómeno conhecido por catarata intumescente. Esta situação pode conduzir ao deslocamento do cristalino para a câmara anterior, tornando-a rasa. Para além disso, o ângulo iridocorneal torna-se mais estreito, o que aumenta a predisposição para o animal desenvolver glaucoma (Slatter, 2005).

Deste modo, conclui-se que a via do sorbitol é um passo fundamental na patogenia da catarata diabética (Maggs et al., 2013), sendo que 75% de cães com diabetes apresentam cegueira induzida por catarata 2 anos após o diagnóstico desta patologia endócrina (Williams et al., 2017). As cataratas ocasionadas pelo desequilíbrio do conteúdo aquoso do cristalino em vigência de um estado hiperglicémico podem ser denominadas por cataratas dos diabéticos ou sugar cataracts (Roversi & Giavini, 1992).

A prevalência da formação da catarata diabética está relacionada com o nível de hiperglicemia, atividade lenticular e concentração de sorbitol (Chylack & Khu, 2000; Kubo et al., 2001; Lee & Chung, 1999; Lee et al., 1995). O cão é altamente suscetível à catarata diabética, e presume-se que isso possa estar relacionado com a dificuldade de controlar a diabetes nessa espécie e resultar em hiperglicemia crónica. No entanto, um estudo em 23 cães diabéticos não conseguiu identificar uma relação entre o desenvolvimento de catarata e o nível correspondente de hiperglicemia (Salgado et al., 2000). O que pode justificar nos cães,

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- 18 - comparativamente com gatos com mais de 7 anos, a incidência elevada de catarata diabética é o facto da atividade de AR ser significativamente superior na lente destes animais (Richter et al., 2002). É importante salientar a relevância da AR no desenvolvimento de catarata, e que são realizados diversos estudos com o intuito de desenvolver inibidores desta enzima, reduzindo a incidência e a severidade das cataratas (Slatter, 2005).

Para além disso, a catarata pode surgir em cães diabéticos com uma boa resposta terapêutica à insulina e níveis de glicose no sangue clinicamente aceitáveis (Richter et al., 2002). Deste modo, os tutores de cães diabéticos devem ser advertidos que, apesar do tratamento, há a possibilidade de desenvolvimento de cataratas (Slatter, 2005). Segundo um estudo realizado por Adkins e Hendrix, cerca de 68% a 80% dos cães com diabetes mellitus desenvolvem catarata (Adkins & Hendrix., 2003).

Um estudo recente demonstrou que alguns cães com diabetes mellitus apresentam expressão aumentada do recetor TGFβ1 na cápsula do cristalino. Assim, com base neste extenso estudo conclui-se que a elevação de TGF-β1 em cães com diabetes mellitus pode induzir complicações da doença e pode participar da alteração do cristalino (Neumann et al., 2017). Nesse estudo, investigou-se em segundo lugar a associação do TGF-β1 com a formação de cataratas caninas. Diferentes publicações na medicina humana têm assumido um papel do TGF-β1 na patogénese das cataratas (De Iongh et al., 2001; Lovicu et al., 2002). Para esse efeito, mediu-se a expressão dos recetores de TGF-β1 nas células epiteliais do cristalino. No entanto, não se conseguiu identificar os recetores em todos os casos. Uma possível explicação para este facto pode estar relacionado com uma expressão inconsistente do recetor na membrana celular durante o curso da doença (Neumann et al., 2017).

Hipocalcemia

A hipocalcemia, frequentemente relacionada com insuficiência renal ou hipoparatireoidismo, pode estar associada a cataratas específicas em cães. Estas manifestam-se por opacidades multifocais, pontuadas ou opacidades corticais lamelares coalescentes que são bilateralmente simétricas (Kornegay et al., 1980; Crawford & Dunstan, 1985; Bruyette &

Feldman, 1988; Adkins & Hendrix., 2003).

Na hipocalcemia, a alteração do transporte ativo de catiões no epitélio do cristalino origina um aumento do sódio e diminuição do potássio. Este desequilíbrio osmótico resulta em edema

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e rutura das fibras do cristalino. Considera-se que estas alterações estão relacionadas com o aparecimento das opacidades na lente (Gelatt et al., 2013).

O tratamento da hipocalcemia pode parar a progressão da catarata, mas não reverte as opacidades existentes na lente (Gelatt et al., 2013).

Hipercupremia

As cataratas associadas a um aumento da concentração de cobre no sangue apresentam forma de girassol, com localização subcapsular anterior (Gelatt et al., 2013).

Foi descrito em Bedlington e West Highland White Terriers um distúrbio familiar de armazenamento de cobre semelhante à doença de Wilson (Twedt et al., 1979; Fuentealba & Aburto, 2003). Porém, a catarata não foi descrita nestas raças. Isto pode dever-se ao facto de não só os níveis séricos de cobre serem geralmente normais ou elevados de forma transitória durante crises hemolíticas, mas também devido à curta vida útil dos cães severamente afetados (Gelatt et al., 2013).

Erros de metabolismo inato

Kunkle et al. descreveu um caso de catarata (e queratite concomitante), num pastor alemão, associado à tirosinemia congénita (Kunkle et al., 1984).

No Homem, as cataratas são relatadas associadas a formas de tirosinemia hereditária que sofrem de doença ocular superficial e da pele. Assume-se que possa resultar da resposta inflamatória a depósitos de cristais de tirosina em diversos tecidos (Hunziker, 1980). Porém, a patogenia associada a esta alteração ainda não é conhecida. Foi documentado por Barnett e Cottrell um caso de um cão com síndrome de Ehlers-Danlos, doença hereditária do tecido conjuntivo, que apresentava catarata bilateral com luxação do cristalino. Todavia, é bastante provável que a catarata seja secundária à luxação do cristalino, devido a defeitos zonulares (Barnett & Cottrell, 1987). Foram descritas, também, em pessoas com doença de Niemann-Pick cataratas capsular e subcapsular (Eagle & Spencer, 1995). Embora não tenha sido encontrada uma descrição semelhante para cães, é provável que ocorram, igualmente, cataratas em cães com este distúrbio, dado que a deficiência enzimática (esfingomielinase) é semelhante (Bandza et al., 1979).

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- 20 -  Fármacos ou outros tóxicos

Foi descrito que algumas toxinas ambientais e a administração sistémica de alguns agentes farmacológicos podem estar na origem de cataratas (Gelatt et al., 2013). Algumas destas drogas que induzem cataratas são: Diazóxido, Fenilpiperazina, Inibidores da hidroximetilglutaril coenzima A redutase, Sulfonilureia, Pefloxacina, Dinitrofenol, DNCA, contracetivos orais à base de progesterona, Ketoconazol e Dimetil sulfóxido (DMSO) (Gelatt, 2014).

Muitos destes agentes não têm muito significado clínico, uma vez que são tipicamente produzidos durante os estudos toxicológicos, em que os compostos de teste são administrados de forma crónica e em doses elevadas não terapêuticas (Eagle & Spencer, 1995; Heywood, 1971a). Para além destas, foram citadas outras substâncias indutoras de catarata, nomeadamente a clorpromazina, corticosteróides, mióticos, alopurinol, cloroquina e amiodarona (Brown, 2001).

A característica comum de muitos tipos de catarata tóxica são os distúrbios nas bombas de Na+-K+ ATPase, no equilíbrio iónico ou osmótico ou na permeabilidade da membrana celular (Gelatt et al., 2013).

As cataratas tóxicas podem aparecer inicialmente em vários locais dentro do cristalino, dependendo do princípio tóxico. Geralmente, começam na região cortical anterior e posterior próxima ao equador, na área de alongamento da fibra da lente, ou nas regiões de sutura em Y, e estão frequentemente associadas à formação de vacúolos nas lentes. Caso o agente tóxico responsável pela formação dos vacúolos no cristalino for removido, estes são reversíveis na maioria das vezes (Eagle & Spencer, 1995; Heywood, 1971a). As cataratas são, frequentemente, progressivas, e abrangem toda a lente (Gelatt et al., 2013).

O tipo de catarata mais relevante que se presume ser de natureza tóxica é aquele associado à atrofia progressiva da retina, ou a outros tipos de degenerescência da retina. A catarata é comummente observada em cães com estados moderados a avançados de atrofia progressiva de retina, que muitas vezes obscurece os detalhes oftalmoscópicos do fundo de olho (Gelatt et al., 2013). A etiologia das cataratas pode, também, estar relacionada com metais pesados (Gelatt, 1999).

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Deficiências nutricionais

As cataratas cuja etiologia está relacionada com a nutrição podem ser causadas pelo uso inadequado de substitutos orais de leite (Gelatt et al., 2013). Estas ocorrem devido à deficiência de aminoácidos essenciais na composição do substituto (Slatter, 2005), conduzindo, posteriormente, a uma síndrome específica de cataratas neonatais em cachorros (Gelatt et al., 2013).

Uma análise ao conteúdo de aminoácidos de um substituto de leite comercial mostrou que o teor de arginina apenas correspondia a metade do valor que é encontrado no leite materno (Ranz et al., 2002). No entanto, a patogenia destas opacidades parece ser mais complexa do que apenas a deficiência de um aminoácido. Há a possibilidade de estarem implícitas outras carências, como a de triptofano, fenilalanina e histidina. Adicionalmente, podem estar também relacionadas com o desequilíbrio de aminoácidos, deficiência relativa de proteína ou glicose induzida pela dieta (Vanisi et al, 1981; Martin & Chambreau, 1982; Remillard et al, 1993).

As opacidades costumam ser ligeiras, interferindo pouco com a visão (Gelatt et al., 2013). Experimentalmente, cachorros sem raça apresentaram opacidades a partir da terceira semana de vida (Martin & Chambreau, 1982). Normalmente, estão localizadas na zona do equador e na região subcapsular posterior (Slatter, 2005). Na maior parte dos casos, não é necessário resolução cirúrgica (Gelatt et al., 2013), dado que não progridem e tendem a regredir (Slatter, 2005). Todavia, a cirurgia pode ser uma solução nas situações mais avançadas de catarata que persistem até à idade adulta (Gelatt et al., 2013).

Tendo em consideração que as opacidades parecem ser mais comuns e avançadas em cachorros desprovidos de leite da mãe ou privados na primeira semana de vida, é importante atuar na prevenção desta situação. Deste modo, seria importante pelo menos uma amamentação dos cachorros durante esse período, podendo-se usar, como suplemento, substituto de leite mas de elevada qualidade (Gelatt et al., 2013).

Podem surgir casos de cataratas galactosémicas, quando os animais são alimentados com leite de vaca. Estes não têm a capacidade de converter a galactose em lactose, sendo convertida pela via do sorbitol. Assim, estas cataratas tendem a progredir, causando perda de visão (Slatter, 2005).

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- 22 -  Lesões no cristalino

Segundo Gelatt et al., as cataratas podem decorrer de diversos tipos de lesões no cristalino, como traumatismos, choques elétricos ou radiação (Gelatt et al., 2013).

Traumatismos

Um dos tipos de traumatismo mais comum é a contusão ocular (Gelatt et al., 2013). Um trauma contuso pode ser determinado pela sua localização, natureza unilateral e outros achados oculares concomitantes sugestivos, possibilitando a sua distinção de causas hereditárias (Gelatt, 1974).

É raro uma leve lesão contundente no globo ocular causar lesões na lente. Porém, quando a lesão é gerada com força moderada, pode resultar no deslocamento posterior da íris, causando deposição do pigmento do epitélio posterior da íris ao nível da cápsula anterior do cristalino. Inicialmente, a catarata de origem traumática pode surgir ao longo das suturas anterior e posterior do cristalino, sob a forma de estrela. Com o avançar do tempo, a catarata que é focal pode ser deslocada para as camadas mais profundas da lente, local onde são formadas as novas fibras da lente (Eagle & Spencer, 1995; Steeten, 2000).

Arranhadelas de gatos ou mordeduras de cães são também lesões comuns, principalmente em animais jovens, que conduzem à rutura da cápsula anterior do cristalino. Neste caso, acredita-se que uma lesão do tipo penetrante, que perfura a cápsula anterior da lente, leve à formação de uma catarata focal a difusa (Gelatt et al., 2013).

Nos casos em que se verifica ruturas capsulares > 1,5 mm ou córtex na câmara anterior é recomendada a remoção da lente, evitando, assim, o desenvolvimento de uveítes facoclásticas ou facolíticas (Davidson et al., 1991b).

A penetração na lente de corpos estranhos metálicos pode resultar, igualmente, numa catarata focal. O mais comum é gerar-se uma opacificação difusa a partir da rutura das fibras lenticulares. O efeito dos corpos estranhos metálicos intraoculares, mas que não penetram no cristalino, depende da inércia, posição e tamanho destes (Eagle & Spencer, 1995). Estes provocam, também, reação inflamatória, sendo que depende do metal envolvido (Slatter, 2005). O chumbo é dos metais mais bem tolerados, é inerte, não gerando catarata. Como relativamente inerte existe o ouro, prata, vidro e a borracha. Com potencial oxidativo severo existe o cobre, zinco e latão que causam panoftalmite (para além da catarata), e o ferro e aço que são os mais agressivos (Carter & Blevins, 1970). Os corpos estranhos intralenticulares de ferro podem

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causar deposição siderótica, o que resulta na formação de opacidades que progridem lentamente, focalmente avermelhadas ou enferrujadas (Eagle & Spencer, 1995; Steeten, 2000).

Choques elétricos

Foi descrito um caso de um cão com três anos que, após morder um cabo elétrico, desenvolveu uma catarata. Esta apresentava localização subcapsular anterior bilateral (Brightman et al., 1984). Acredita-se que a energia elétrica dos relâmpagos possa estar, também, na origem de cataratas progressivas, existindo o relato de um caso de um cão (Fraunfelder & Hanna, 1972; Polellos et al., 1996).

Radiação

A catarata é uma complicação crónica da exposição do olho à radiação ionizante sob diversas formas (Eldredge et al., 2007; Gelatt et al., 2013). Os tipos de radiação eletromagnética com mais relevância são os raios-X, ultravioleta e infravermelho (Gelatt et al., 2013).

Os raios-X afetam o epitélio germinativo da lente, conduzindo, inicialmente, à inibição da mitose. Porém, de seguida, inicia-se uma mitose anormal que produz detritos, vestígios de células, em vez de fibras da lente. Estes detritos agregam-se ao polo posterior do cristalino, após passarem a região sub-capsular (Brown, 2001).

Relativamente à radiação ultravioleta, os raios são absorvidos pela lente, criando radicais livres. O mesmo não acontece com a radiação infravermelha, em que se assume que a energia que é absorvida pelo epitélio pigmentar da íris leva ao aumento da temperatura nesse local (Brown, 2001).

Quando a origem é clínica, o mais comum é o seu aparecimento após radioterapia de neoplasias na região da cabeça, na qual o olho está no campo de radiação (Michaelson et al., 1971; Roberts et al., 1987; Jamieson et al., 1991; Theon, 1993).

A patogenia deste tipo de cataratas está relacionada com a mitose e subsequentes alterações degenerativas no epitélio do cristalino equatorial e na formação de fibras de lente recém-sintetizadas. Este processo resulta numa catarata que se localiza nas regiões subcapsular equatorial, anterior e posterior (Eagle & Spencer, 1995; Steeten, 2000).

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Envelhecimento

É muito frequente a presença de cataratas em cães idosos, sendo classificadas como “senis” ou “relacionadas com a idade”, se outro fator etiológico não for aparente (Eldredge et al., 2007; Gelatt et al., 2013).

A idade de início que carateriza a catarata como senil é arbitrária e relacionada com a raça. Embora a aparência clínica e a taxa de progressão das cataratas relacionadas com a idade possam variar, geralmente são vistas, numa fase inicial, desde um pontuado a uma opacificação mais linear no núcleo adulto do cristalino. Este fenómeno ocorre, geralmente, em simultâneo ou após a esclerose nuclear densa (Gelatt et al., 2013).

A taxa de progressão destas cataratas relacionadas com a idade é lenta, sendo que a perda de visão relevante pode demorar desde meses a vários anos. É comum em cães idosos algum grau de formação de catarata, apesar de a maioria não interferir com a visão de forma substancial (Gelatt et al., 2013).

A patogenia da catarata relacionada com a idade, em cães, é desconhecida (Gelatt et al., 2013). Considera-se um fator chave na etiologia de cataratas senis a foto oxidação das proteínas α-cristalino (Harding, 1996). A evidência de que o dano oxidativo ocorre durante a formação da catarata inclui níveis aumentados de dissulfureto mistos (Garner & Spector, 1980), proteínas de ligação cruzada (Buckingham, 1972), produtos de peroxidação lipídica (Bhuyan et al., 1981) e quebras na cadeia de DNA (Kleiman & Spector, 1993). Qualquer um destes fatores pode culminar em danos nas fibras da lente e, consequentemente, numa opacificação irreversível (Gelatt et al., 2013). O facto de proteínas nucleares existirem no olho antes do nascimento do animal pode torná-las mais suscetíveis à foto oxidação, pela mudança do meio. Porém, uma minoria argumenta contra esta hipótese (Harding, 1996).

Segundo um estudo efetuado por Williams et al., a prevalência da catarata na população canina geral aumenta com a idade e todos os cães com pelo menos 13,5 anos apresentavam algum grau de opacidade da lente. A maior parte destas opacidades não correspondia a cataratas maduras, nem todas progrediram neste sentido. Este mesmo estudo indica que a idade em que surge a catarata varia entre raças diferentes, estando relacionada com a longevidade de cada raça (Williams et al. 2004).

Imagem

Figura 1: Estruturas internas do olho do cão (Maggs, et al., 2013).
Figura 2: O cristalino adulto, mostrando as diferentes zonas nucleares, córtex, epitélio anterior e cápsula
Figura 5: Visão geral das principais vias do metabolismo da glicose no cristalino. As percentagens representam  as quantidades estimadas de glicose usadas nas diferentes vias (adaptado de Yanoff & Duker, 2004)
Figura 6: Classificação de cataratas de acordo com a posição dentro da lente (Maggs et al., 2013)
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Referências

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