• Nenhum resultado encontrado

A escrita ao pé da Letra e a letra ao pé da escrita

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "A escrita ao pé da Letra e a letra ao pé da escrita"

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

Apresentação

(2)
(3)

A escrita ao pé da Letra e a letra ao pé da escrita

Regina L. Péret Dell´Isola Universidade Federal de Minas Gerais Não existe uma fórmula para transformar alguém em um escritor.

Existem caminhos que conduzem algumas pessoas à fama por terem escrito bons romances, bons poemas, boas crônicas, bons artigos, boas críticas, enfim, textos que, por sua qualidade e por suas características peculiares, agradaram muitos leitores ou um grupo específico de leitores. Ao agradar um bom número de pessoas, esses textos foram fonte do reconhecimento público que projetou seus autores e levou a maioria deles a escrever mais e mais, fazendo com que a escrita se transformasse em um ofício e deixando a impressão de que escrever é um dom de poucas pessoas.

É certo que bons textos favorecem a leitura fluente, não importando sua origem física, seja da página impressa seja da tela do computador.

Há textos que conduzem a uma leitura prazerosa, em que lemos “como quem viaja num raio de lua, num tapete mágico, num trenó, num sonho”, nos dizeres de Quintana. Há os que causam uma verdadeira revolta, indignação e há outros que recebem a plena aprovação do leitor. É certo que o texto nos envolve em um clima de cumplicidade na construção do sentido. A escrita é uma forma de expressão motivada por inúmeras razões que, inevitavelmente, gera reação no leitor. Afinal, quem escreve, escreve para ser lido.

Sabemos que um escritor não nasce escritor, assim como um médico não nasce médico, nem um jornalista nasce jornalista. As pessoas podem ter tendência para uma ou outra profissão, mas, para isso, devem se preparar, obter conhecimentos e se aperfeiçoar a cada dia. Qualquer profissional necessita, em um dado momento de sua vida, de escrever. Por

(4)

18 l Revista Ao pé da Letra – Volume 11.2 - 2009

isso, todos esses profissionais contam com o que há de comum entre eles, independentemente da área de atuação: o instinto da linguagem. Esse instinto, tal como propôs Noam Chomsky nos anos 50, favorece a comunicação, considerada a capacidade inata do homem para a linguagem. Mas, por que as pessoas encontram barreiras para se expressar por escrito?

É comum que as pessoas sintam-se tímidas em expor suas ideias no papel, talvez, porque, enquanto o texto oral voa com o vento, o escrito permanece, está registrado, visível e sobre a pedra, o papiro, a tela. Sobre este já não há mais controle. João Cabral de Melo Neto dizia que “escrever é estar no extremo de si mesmo, e quem está assim se exercendo nessa nudez, a mais nua que há, tem o pudor de que outros vejam o que deve haver de esgar, de tiques falhos, de pouco espetacular na torta visão de uma alma em pleno estertor de criar”. Certamente, existem outros obstáculos, que devem ser vencidos para se deixar fluir a criação textual. Criar não é exclusividade dos escritores de renome, dos cânones da literatura, dos pesquisadores que divulgam ciência. Quem escreve, tece, à sua maneira, a sua criação.

Não são poucos os renomados escritores que já confessaram algumas de suas dificuldades em produzir seus textos. Geralmente, esses autores, antes de apresentarem a versão final de suas obras, escrevem muitas outras versões preliminares. Muitos deles escreveram, leram, rasuraram, (re)escreveram, leram em voz alta, mudaram a ordem dos parágrafos, rabiscaram, cortaram, embolaram papel em que registravam seus textos e o jogaram na lixeira, abriram nova página em branco, voltaram a escrever, acrescentaram trechos, cortaram outros, transferiram ideias de um lugar do texto para outro... Nesse contínuo, esses escritores buscaram ideias nos papéis embolados dentro da lixeira, reformularam, insistiram em não alterar trechos que deveriam ser modificados, leram, corrigiram, releram, mudaram um trecho ou outro que já estava pronto, fizeram alterações inclusive daqueles trechos que já tinham sido considerados bons por eles mesmos. Quem já não passou por situações semelhantes?

(5)

Revista Ao pé da Letra – Volume 11.2 - 2009 l 19

A produção de um texto, independentemente de sua extensão, é construída de acordo com um estilo pessoal do escritor que é livre em sua criação. Estilo é de algum modo o espírito do artista, como disse Zamora, estilo é a constituição psicológica do artista, sua atitude perante a vida, sua cultura, suas inclinações e suas preferências, expresso na imagem que forma da realidade. A liberdade está na trajetória entre as ideias na cabeça de quem cria o texto e a versão final da escrita – quando termina a participação do escritor e inicia-se a participação do leitor, seu interlocutor. Como diz Ronald Claver (1992: 7)1:

O importante é o processo:

o escrever e o riscar o escrever e o mudar o escrever e o tentar o escrever e o arriscar tornar o branco impuro mas sem doer.

A escrita é um ato de expressão humana e não deveria ser uma tortura para os nossos estudantes, afinal, eles estão diariamente em contato com textos dentro e fora da esfera escolar. No ensino fundamental e no ensino médio, os alunos produzem textos orais e escritos relativos às diversas disciplinas de sua rotina escolar, mas também produzem textos para manter relacionamentos, para interagir socialmente. No ensino superior, o texto escrito deixa de ser aquela redação exigida nas aulas de Português ou nas aulas específicas de Redação e passa a ter autonomia.

Ainda resta a artificialização da escrita, embora a tendência atual seja levar o aluno da educação básica à percepção de que o texto escrito

1. CLAVER, Ronald. Escrever sem doer. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1992.

(6)

20 l Revista Ao pé da Letra – Volume 11.2 - 2009

está em toda parte: está na resposta de um problema de matemática, no bilhete de advertência para um colega, no cálculo de uma questão de física, na apresentação de argumentos para justificar uma falta, na descrição de um acontecimento, no recado deixado para o professor, na interpretação de um mapa de história, na explicitação de um gráfico de geografia ou de uma figura de biologia, enfim, na articulação de idéias para a expressão por escrito de um conhecimento, de uma impressão, de um pensamento, de uma observação, de uma comunicação ou de um sentimento. Apesar disso, ainda há os que finalizam os doze anos de educação básica sem ter plena autonomia de expressão verbal, de criação oral e por escrito.

No ensino superior, o aluno assume a tarefa de expor suas ideias tanto na sala de aula, quanto nos vários eventos que é levado a participar. A palavra não é mais limitada a um espaço restrito, ao contrário, ultrapassa os muros escolares. O texto não mais se restringe à leitura de um professor. Estimula- se que seja divulgado para os pares, para produzir novos conhecimentos, em todas as áreas dos cursos superiores, embora seja restrito o espaço para publicações discentes.

Quando se propõe a produção de um artigo acadêmico com vistas a ser publicado em uma revista de estudantes de graduação em Letras, abre-se uma porta para a voz de discentes que têm sua palavra. Abre-se a oportunidade do exercício do texto escrito e se apresenta um alvo a ser alcançado. A revista Ao Pé da Letra, antes de ser um meio de divulgação, é um desafio nacional a todos os estudantes de Letras que não se satisfazem em ouvir aulas, ler textos, mas que ousam argumentar e se expressar verbalmente, oral ou por escrito. Esse desafio exige que sejam ultrapassadas as barreiras da timidez, levando-os à produção de textos acadêmicos que, não raras vezes, são resultado de interessantes e relevantes pesquisas que partem de problemas cujas respostas não são evidentes. Cabe ao aluno ocupar seu espaço criador; conduzir seu leitor com argumentos satisfatórios, em estilo próprio; dirigir a interpretação de seu público, o

(7)

Revista Ao pé da Letra – Volume 11.2 - 2009 l 21

mais próxima à sua. Sem fugir das exigências e normas padronizadas pela Academia que preza pela clareza e objetividade, o estudante tem a chance de ouvir sua própria voz, abrindo novos horizontes para outras vozes.

A escrita ao pé da letra, leva a letra ao pé da escrita, viabilizando a transformação de discentes em escritores-divulgadores de conhecimento.

Mesmo sem fórmula, esses graduandos transitam caminhos que os conduzem ao debate, à reflexão e os tornam pessoas abertas a críticas e à avaliação da qualidade de seus trabalhos. Nesta revista há reconhecimento público que a escrita se transforma em um ofício que está longe de ser dom exclusivo de poucas pessoas.

Referências

Documentos relacionados

1595 A caracterização do repertório de habilidades sociais dos alunos do Grupo com Baixo Desempenho Acadêmico (GBD) e do Grupo com Alto Desempenho Acadêmico (GAD),

* Observar e anotar quanto tempo a água ficou pingando e o quanto dela foi liberado em cada amostra de solo, marcando com uma canetinha em seu suporte (parte da

Esta pesquisa discorre de uma situação pontual recorrente de um processo produtivo, onde se verifica as técnicas padronizadas e estudo dos indicadores em uma observação sistêmica

voce tom? Para que servem? Quantos relógios vocês têm em casa? onde?, etc... I G Um u dois SiU) LrOs.. MIL Urn e dois são

Muitas das proposições que encontramos na prática podem ser consideradas como construídas a partir de uma, ou mais, proposições mais simples por utilização de uns

SAIF (1989) propôs um algoritmo recursivo para a seleção da matriz peso de estado Q, e conseqüentemente de um controlador ótimo para um problema regulador quadrático

O objetivo deste ensaio foi apresentar um modelo conceitual que coloca as categorias de relacionamento confiança e comprometimento como as bases de equilíbrio

Bond strength of fibre glass and carbon fibre posts to the root canal walls using different resin cements. Ferrari M, Mannocci F, Vichi A, Cagidiaco MC,