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REFLEXÕES ACERCA DE CONFLITOS ESCOLARES: A COMPREENSÃO DE UMA PROFESSORA DO ENSINO FUNDAMENTAL I

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

JOANA TAVARES DE FIGUEIREDO

REFLEXÕES ACERCA DE CONFLITOS ESCOLARES: A COMPREENSÃO DE UMA PROFESSORA DO ENSINO FUNDAMENTAL I

Mestrado em

Educação: Psicologia da Educação

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

JOANA TAVARES DE FIGUEIREDO

REFLEXÕES ACERCA DE CONFLITOS ESCOLARES: A COMPREENSÃO DE UMA PROFESSORA DO ENSINO FUNDAMENTAL I

Mestrado em Educação: Psicologia da Educação

Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação: Psicologia da Educação pelo Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: Psicologia da Educação, sob a orientação da Profª. Drª. Heloisa Szymanski.

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Banca examinadora

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer aos meus pais e meu marido que não pouparam

esforços para contribuir com meu crescimento pessoal.

Aos meus colegas de profissão pelas práticas compartilhadas possibilitando a

ampliação do meu olhar enquanto educadora.

À professora participante que contribuiu com sua experiência.

Aos professores Roberto Heloani e Marília Marino pelas sugestões e

participações.

À professora Heloisa pela parceria e construção de aprendizados ao longo

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RESUMO

O presente trabalho trata-se de uma pesquisa qualitativa que teve por objetivo compreender o sentido das ações desenvolvidas por uma professora do Ensino Fundamental I diante dos conflitos entre alunos. Partindo de alguns conceitos da Fenomenologia e do referencial teórico de Paulo Freire e sua concepção de diálogo como um caminho para solucionar os problemas surgidos entre os alunos, foi feita uma entrevista reflexiva. A partir de uma análise fenomenológica da entrevista, percebeu-se que a professora apresentou valores como: outro digno de respeito; construir ativamente modos de resolver conflitos pela reflexão, responsabilidade do educador e compromisso com a educação. Concluiu-se que a dimensão dos conflitos escolares é muito ampla e não se reduz à sala de aula e a propostas de intervenções. Por essa razão, é preciso pensar em projetos educativos que englobem todos os segmentos voltados a um trabalho planejado para a questão da violência e agressões dentro da instituição e na formação continuada dos docentes, partilhando práticas e experiências diante dos conflitos.

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ABSTRACT

The present paper is a qualitative study that aimed to understand the meaning of the actions developed by a teacher of elementary school before the conflicts between students. Based on concepts from phenomenology and theoretical framework of Paulo Freire and his conception of dialogue as a way to solve the problems that exist between students, it was taking a reflective interview. From a phenomenological analysis of the interview, it was noticed that the teacher has a value to enrich the relation of respecting between each other; actively build ways of solving conflicts by reflection, responsibility of the educator and commitment to education. It was concluded that the dimension of conflicts is not limited to classroom and proposed interventions. For this reason, one must think about educational projects covering all segments geared to a plan for the issue of violence and aggression within the institution and in the continuing education of teachers work, sharing experiences and practices on conflict.

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SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO...6

2. INTRODUÇÃO 2.1 Justificativa e contextualização ...9

2.2 Referencial de Paulo Freire: a compreensão do diálogo como encontro entre homens...14

2.3 Conflito na perspectiva dialógica...25

2.4 Objetivos...26

3. MÉTODO 3.1 Pesquisa qualitativa em referencial fenomenológico ...28

3.2 A entrevista reflexiva ...31

3.3 Planejamento da entrevista ...32

3.4 Procedimentos de análise ...33

3.5 Contexto de pesquisa...34

3.6 Participantes ...36

3.7 Procedimentos éticos...36

4. RESULTADOS 4.1 Síntese da entrevista...37

4.2 Constelações...39

4.3 Síntese...50

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...52

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...56

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1. APRESENTAÇÃO

Meu percurso na área da Educação iniciou-se em 2004, na PUC-SP, cursando Pedagogia. Logo nos primeiros anos da graduação, fui estagiar em um colégio da rede particular de São Paulo no qual estou até hoje como professora do 1° ano do Ensino Fundamental.

A escolha do tema para o meu Trabalho de Conclusão de Curso da graduação surgiu da observação constante dos diálogos entre as crianças de seis anos. Tive o privilégio de testemunhar e participar das Rodas de Conversa da série inicial e analisar o quanto, para os alunos e para um espaço de diálogo, essas rodas faziam a diferença. Ampliei os meus conceitos compreendendo a importância que os espaços para a conversa em sala de aula têm, funcionando como possibilidade de aprendizados relacionados ao ato de se posicionar, compartilhar opiniões e insatisfações.

Após me graduar, em 2007, caminhei em busca de um curso de pós-graduação para aperfeiçoar meus conhecimentos em relação à aprendizagem e assim ampliar a eficiência da minha prática. Iniciei, assim, Especialização em Psicopedagogia, em 2009.

Meu Trabalho de Conclusão da pós, naquela ocasião, já apontava para a direção da prática do diálogo, só que daquela vez, abordava reflexões sobre a importância da relação dialógica entre escola e família, e as implicações dessa relação com a aprendizagem do aluno.

Em 2009, fui convidada pela direção da escola em que trabalho para contribuir com a formação dos professores, apresentando, durante o Congresso do colégio, uma prática de sucesso ocorrida no decorrer dos meus anos de atuação. Dividi com docentes presentes minha experiência com a Roda de Conversa, como instrumento para a construção de um espaço de diálogo, explicitando-lhes os resultados positivos dessa prática em que a criança tem o direito à palavra, o que colabora para que ela venha a desenvolver o respeito à fala e ao posicionamento do outro.

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escola, discussões são feitas, artigos são escritos, porém como são solucionados os tais conflitos interpessoais?

Ao buscar pesquisas recentes na área, deparei-me com a apresentação dos conflitos como os geradores de indisciplina e violência, como sendo o “grande problema” da escola. Foi então que busquei novamente um aprofundamento teórico e prático, desta vez em um curso de Mestrado em Psicologia da Educação.

Esses aspectos da Educação me inquietam e me mobilizam. Diante de todas essas indagações e da necessidade de explicitar uma questão de pesquisa, debrucei-me sobre os conflitos da sala de aula e as alternativas de solução, resgatando, mais uma vez, minha defesa das práticas dialógicas como possibilidade para desenvolver aprendizados.

Com crenças teóricas bastante enraizadas, iniciei o curso no Programa de Psicologia da Educação. Em razão dessas crenças, minha postura inicial era de bastante segurança por acreditar que estava no caminho “certo”.

Ao participar do projeto Articulação e Diálogo: formação de multiplicadores (Szymanski, Projeto de pesquisa. PEPGE – Psicologia da Educação. PUC-SP), juntamente com os encontros de orientação da dissertação, ambos oferecidos pela professora Heloisa Szymanski, pude vivenciar um grupo que trabalha segundo um referencial fenomenológico existencial. Essa experiência possibilitou-me entrar em contato com autores dessa linha de pensamento. Passei, então, a refazer minhas indagações, a questionar minhas crenças teóricas e a rever o problema que eu havia formulado.

Sair daquele posicionamento teórico conhecido, para questioná-lo, possibilitou-me novos conhecimentos. Pude aprender a enxergar um fenômeno sem fazer afirmações prévias sobre ele. No momento em que passei a retratar minhas certezas e a questioná-las, compartilho que me vi perdida e até angustiada diante da possibilidade de um novo conhecimento, constituído sem afirmações anteriores e sem necessidade de comprovar verdades universais e atemporais.

Um percurso científico convencional busca, a partir de uma teoria já estabelecida, respostas diante do objeto estudado. Creio que eu tenha abandonado essa ideia convencional para, diante de um fenômeno, ao invés de buscar afirmações, passar a questionar as já existentes e a olhar para o que aparecesse.

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desenvolver novos conhecimentos, mas sim a cristalizar os já construídos. Aprendemos com o diferente, com o que ainda não temos. Despedir-se de óculos velhos experimentando novos e diferentes modos de olhar o contexto que nos cerca, para mim, é um caminho coerente diante de tantas possibilidades e conhecimentos.

Nesta pesquisa, de modo mais flexível e aberto, refleti, por meio de entrevistas e observações, como foram feitas as mediações dentro da sala de aula, nos momentos dos conflitos interpessoais com crianças na faixa etária de seis e sete anos e qual a compreensão da professora a respeito dos conflitos.

Minha pretensão foi estudar como uma professora compreendia o conflito entre alunos e suas possibilidades de solução. Acredito que, ao final, pudemos ampliar as alternativas reflexivas dos educadores, enxergando os conflitos como uma preciosa oportunidade educativa de aprender a conviver por meio de relações respeitosas e cooperativas.

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2. INTRODUÇÃO

2.1 Justificativa e contextualização

Ao buscar dados sobre os conflitos escolares e suas intervenções, me deparei com um fenômeno multidimensional, com diversas demandas, compreendido de diferentes perspectivas. É preciso esclarecer, de antemão, que o conflito é visto neste trabalho como um fenômeno complexo que envolve questões culturais, sociais, de grupo, de clima escolar, entre outras. Também é possível buscar compreendê-lo a partir de diferentes perspectivas como: a identidade do professor, a formação, crenças e valores da instituição, entre outros. Sendo assim, é importante neste momento delimitar o campo de pesquisa. O fenômeno foi observado a partir das ações de uma professora dentro do espaço escola, buscando apresentar, a partir de sua ótica, a prática que ela desenvolvia no manejo dos conflitos.

Portanto, o objetivo desta pesquisa foi entender como a professora, participante ativa desse espaço escola, compreendia e atuava diante do fenômeno do conflito entre alunos. E, neste capítulo, pretendo apresentar, contextualizar e justificar a escolha do meu tema, expondo, através de pesquisas recentes, a importância e relevância social atribuída a violência, indisciplina e conflitos vividos no ambiente escolar. Os dados científicos apresentados, a seguir, revelam a necessidade de se buscarem novos conhecimentos.

Algumas pesquisas realizadas recentemente despertaram-me a atenção e preocupação, enquanto professora e também enquanto cidadã.

Segundo pesquisa feita com base em questionários respondidos por diretores de todo o Brasil, a indisciplina por parte dos alunos é apontada como o problema da escola por 64% dos diretores das instituições estaduais, 54% das municipais e 47% das instituições particulares (BIONDI, 2008 apud VINHA; TOGNETTA, 2008).

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Fante (2003) constatou que 95% dos professores acreditavam que o fenômeno da violência e conflitos deve ser considerado um problema para a convivência escolar. 65% notavam frequentemente os maus tratos ocorridos entre os alunos; e 47% dedicavam entre 21% a 40% da sua rotina escolar à resolução dos problemas que surgiam entre os alunos. Uma vez que até 40% do dia escolar é afetado em detrimento da resolução ou intervenção dos conflitos em sala de aula, podemos entender que, além de ser um obstáculo ao desenvolvimento do conteúdo planejado pelo professor, os conflitos interpessoais interferem diretamente na formação dos alunos, caso não compreendidos pelos educadores como possibilidade de novos aprendizados.

É importante pensar neste momento sobre o Projeto Político Pedagógico como um documento que reúne as propostas e objetivos da instituição bem como os caminhos para atingi-las. Além de definir e organizar as atividades e projetos educativos, o PPP encaminha os professores diante do processo de ensino e aprendizagem e das especificidades pensadas para tal instituição.

Os resultados das pesquisas acima não fizeram menção ao Projeto Político da escola nem apresentaram sua concepção diante dos conflitos escolares. Uma vez que a demanda sobre os conflitos é grande e seus modos de intervenção corriqueiros, vale a consideração da necessidade de incluir nesse documento a concepção de conflitos que permeia as ações da escola, uma vez que se trata de uma questão que transcende a sala de aula.

Em outra investigação, Chrispino (2007) pesquisou qual a importância atribuída pelo jovem à educação, à escola e ao professor. Os resultados obtidos pelo pesquisador mostram que o jovem identifica a violência como o maior problema da sociedade e que a escola ocupa o segundo lugar como instituição importante para o seu futuro. “Apesar de todas as dificuldades, o jovem ainda crê na educação como alternativa e na escola como instrumento de mobilidade social e de diferenciação para o futuro”(CHRISPINO, 2007, p. 15).

Ao buscar entender a origem que caracteriza esse cenário, o autor conclui e entende que a violência se estabelece na medida em os conflitos entre alunos não são solucionados.

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interesses, de desejos e de aspirações. Percebe-se que não existe aqui a noção estrita de erro ou de acerto, mas de posições que são defendidas frente a outras, diferentes. (CHRISPINO, 2007, p. 16)

Por essa definição Álvaro Chrispino esclarece o conflito como parte constituinte não só das relações escolares, mas também das relações humanas. Compartilho dessa visão de conflito e compreendo-a como necessária para desenvolver ações educativas no sentido de enxergar os problemas como oportunidades de aprendizagem de convivência humana.

Pacievitch, Girelli e Eyng (2009), em investigação sobre as violências nas escolas com ênfase no clima escolar e na mediação dos conflitos para a melhoria desse clima, entrevistaram cento e noventa e seis alunos de 3º e 4º anos e 7º e 8º anos, de duas escolas públicas – uma estadual e outra municipal de Curitiba – a fim de registrar sua percepção dos problemas da escola.

Na escola estadual verificou-se que a bagunça e a indisciplina foram citadas como o segundo maior problema da escola por 13,9% dos alunos, perdendo apenas para uma particularidade desta instituição que se refere à falta de professores, citadapor 21,8%dos estudantes.

Já na percepção de 41,1% dos alunos da escola municipal, a escola não apresenta problemas, enquanto para 22,1% dos alunos desta mesma instituição as brigas representam um problema para a escola.

As conclusões das pesquisadoras caminharam para uma percepção e proposta da necessidade de construção de uma cultura de mediação, uma vez que consideram que situações de violência se agravam na medida em que não há intervenção diante dos conflitos originários.

Em um ambiente em que há grande diversidade cultural, e em que as identidades estão se constituindo, como no ambiente escolar, os conflitos entre sujeitos são inevitáveis. A forma como esses conflitos são resolvidos (ou não) influencia as relações interpessoais, a relação do sujeito com a escola e consequentemente, o clima escolar. (PACIEVITCH; GIRELLI; EYNG, 2009, p. 10)

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Enxergando o fenômeno da perspectiva dos pesquisadores, entendo que as intervenções nas situações conflituosas podem contribuir para construção de espaços menos violentos além de gerar aprendizados entre os sujeitos. Uma vez que são os profissionais da Educação – gestores, orientadores e professores – que vivenciam e podem propor alternativas para a modificação e melhora desses espaços, e sendo as intervenções por eles mediadas, é importante enxergar como o fenômeno da violência é percebido por esses profissionais.

A pesquisa seguinte tem como objetivo trazer dados obtidos a partir da participação dos gestores na investigação. Trevisol e Lopes (2008) pesquisaram os sentidos atribuídos pelos próprios profissionais da Educação diante da temática do conflito na escola. A amostra do estudo era composta por dezesseis (16) profissionais da Educação atuantes em diferentes instituições escolares localizadas na Região Oeste de Santa Catarina. Dentre os pesquisados, estão quatro (4) gestores escolares, quatro (4) orientadores educacionais e oito (8) professores que atuam no Ensino Fundamental.

Por meio de entrevistas, o objetivo era identificar: a) as significações que são atribuídas à disciplina e à indisciplina pelos profissionais que compõem o contexto escolar; b) as causas geradoras das manifestações de indisciplina; c) os encaminhamentos que vêm sendo tomados pelos diretores, especialistas e professores frente às manifestações de indisciplina.

As respostas apresentadas pelos profissionais diante do sentido dado por eles para a questão da indisciplina despertam a atenção. Primeiramente é possível perceber certa culpabilização às famílias e aos próprios alunos, uma vez que esses gestores não revelam sua responsabilidade para com a formação desses educandos também em aspectos atitudinais.

Essa palavra indisciplina caracteriza exatamente um aluno que esteja incomodando.

A indisciplina passa a ser hoje, para nós professores, avaliada como o aluno que apronta em sala de aula. (Trechos das entrevistas, TREVISOL; LOPES, 2008, p. 31)

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... sempre coloco que a indisciplina do aluno não é a indisciplina da escola, é o reflexo da sociedade ou da família. (Trecho das entrevistas, TREVISOL; LOPES, 2008, p. 31)

A essas falas as pesquisadoras atribuem uma negligência da responsabilidade dos profissionais diante dos comportamentos conflituosos e chamam a atenção para o fato de o aluno ser apontado como o sujeito da indisciplina. Além disso, propõem uma revisão e diversificação de estratégias para lidar com essas questões, valorizando o investimento na formação desses profissionais.

A coerência nos encaminhamentos do fenômeno indisciplina escolar requer, de antemão, o conhecimento e a análise da rede de elementos que constituem esse problema. Compreender os sentidos e significados que são atribuídos pelos personagens que constituem a escola, ou seja, gestores, orientadores, professores, alunos, entre outros, é indispensável. A partir do olhar que eles dirigem sobre essa questão conseguiremos tomar consciência de onde se deve iniciar o processo de intervenção. (TREVISOL; LOPES, 2008, p. 33)

Percebemos por meio das falas dos gestores entrevistados que o conflito entre os alunos não é compreendido por eles como parte constituinte de relações sociais e nem como um potencial educativo e oportunidade de aprendizagem.

Esses estudos possibilitam a conclusão de que a indisciplina e as situações de conflito atormentam atualmente as instituições escolares e solicitam novas alternativas de intervenção.

Além de serem apresentados como “o problema” de muitas escolas, os gestores escolares se queixam da demanda de tempo exigida para sua resolução. A falta do professor também foi apontada pelos alunos como o maior problema de uma das instituições e isso revela a necessidade demonstrada pelos próprios estudantes da presença e importância do professor como figura necessária para o bom cotidiano.

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uma vez que diante de brigas entre alunos sabemos que a sala da coordenação é um lugar ao qual são direcionados os envolvidos.

Os artigos compartilhados até agora apresentam a ligação entre indisciplina, violência e conflito, mas não abordaram o Projeto Político Pedagógico das instituições pesquisadas e seus objetivos e direcionamentos dados a essa formação necessária. Uma vez que os conflitos são apontados como “o problema escolar” e que existe a preocupação em lidar com eles para a melhora do espaço escola, percebemos a demanda em estudar o tema. Por outro lado, já é possível com esses dados enxergar a importância e responsabilidade da intervenção como instrumento para contribuir com o fenômeno.

Minha prática como professora do Ensino Fundamental me fez acreditar e vivenciar que escutar os alunos e possibilitar espaços para troca de opiniões geram um ambiente de respeito e diálogo.

Focalizando o papel do professor diante dessas alternativas é preciso buscar compreender como ele entende os conflitos ocorridos e como, diante do sentido por ele atribuído, intervém diante das situações cotidianas em sala de aula.

Diante dessa breve apresentação do cenário atual, concluímos que existe a necessidade de uma cultura de mediação que tem no diálogo seu meio privilegiado de realização. Diálogo entendido segundo o referencial de Paulo Freire que será apresentado a seguir.

2.2 Referencial de Paulo Freire: A compreensão do diálogo como encontro entre homens

Conforme registrado anteriormente, os referenciais que pautam essa pesquisa são as obras do atual patrono da educação brasileira: Paulo Freire. Antes de assumir essa importante e reconhecida titulação, Freire foi professor. Um professor que, como ele mesmo diz a respeito de sua trajetória, “tornou-se uma realidade para mim, depois que comecei a lecionar; tornou-se uma vocação depois que comecei a fazê-lo.” E complementa dizendo que aprendeu “como ensinar na medida em que mais amava ensinar e mais estudava a respeito” (FREIRE; SHOR, 1986, p. 38-39).

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diante da educação que testemunhou e vivenciou no decorrer de seus anos de experiência; em seguida a essa contextualização, é importante compreender o modo como o autor entende o homem, enxergando-o como um ser de possibilidades, para assim alcançarmos com mais clareza seus outros conceitos: opressor e oprimido; prática de liberdade; consciência; e o diálogo, compreendido aqui como modo privilegiado de mediar e solucionar os conflitos surgidos.

Como professora do Ensino Fundamental, na troca de experiências e teorias com demais colegas, percebo que Freire não é compreendido na complexidade de suas produções e referenciais. Muitas vezes seus conceitos, frases e ideias são transmitidos como senso comum sem serem entendidos em seu detalhamento. Esse dado aponta para a necessidade de divulgar seu pensamento de modo mais aprofundado. Ao buscar o aprofundamento de suas ideias recorrendo a outros autores que estudaram de modo mais enraizado suas produções, me vi no desconhecido, me vi diante de uma nova teoria.

Já em seu primeiro estudo “Educação como prática de liberdade”, Paulo Freire (1967) revelava sua preocupação com a Educação brasileira, no qual, assumindo uma postura crítica, refletia sobre o funcionamento da educação escolar da época. Partindo de um posicionamento de construir uma sociedade independente e democrática, o autor se propôs a repensar alguns aspectos da Educação que despertavam sua inquietação. São eles: as situações de aprendizagem centralizadas no saber do professor; a ausência de entrosamento entre a educação e a realidade vivida pelos alunos; a rigidez e autoritarismo que permeavam as relações; e o caráter de atividades assistencialistas (BEISIEGEL, 1982).

Suas críticas voltavam-se com insistência sobretudo para outras características da educação escolar brasileira: por sua feição autoritária, rigidamente centralizadora e avessa a quaisquer modalidades de diálogo e participação, por sua orientação assistencialista, e também pela extrema passividade alimentada na ausência do debate, da pesquisa e da reinvenção, a escola existente não atendia às exigências educacionais da fase de transição porque não estimulava a formação do sentimento de responsabilidade, aceitação do diálogo, o hábito da reflexão e busca de participação na construção da vida coletiva. (BEISIEGEL, 1982, p. 94)

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década de oitenta, ainda existe uma demanda em relação ao diálogo e à reflexão e participação dos alunos na escola.

Para a compreensão das críticas de Paulo Freire à educação escolar e seus ideais, é necessário entender sua visão de homem e mundo, visão essa situada em um determinado tempo e espaço, afinal “Não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio” (FREIRE, 1967/2011).

Entendemos que, para o homem, o mundo é uma realidade objetiva, independente dele, possível de ser conhecida. É fundamental, contudo, partirmos de que o homem, ser de relações e não só de contatos, não apenas está no mundo, mas com o mundo. Estar com

o mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é. (FREIRE, 1967, p. 39)

No entanto que homem é esse?

Paulo Freire entendia o homem como um ser que habita determinado tempo e espaço e por essa razão deve ser compreendido como tal, sujeito de relações e que diferentemente dos animais pode refletir sobre si e assim compreender e se descobrir como inacabado e em constante busca. Nessa constante busca e no vivenciar as relações, ele vai se humanizando. “Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser humano determinado e o ser condicionado”(FREIRE, 1967/2011, p. 53).

Quando o autor se refere ao inacabamento, a ideia que quer expressar é bastante ampla. Para ele a natureza dos humanos não é determinada por estruturas inatas, ao contrário disso, ele acredita que os sujeitos buscam descobrir os conhecimentos de si e do mundo. Esse modo de existir do humano é a busca do ser

mais. Para Freire o homem é um ser de possibilidades, é deixar de ser “coisa” para

se humanizar na e com as relações entre homens, esse é o nosso desafio: aventurar-nos para liberdade e humanização acreditando na possibilidade de mudarmos a nós mesmos e o mundo.

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Para ele, a liberdade não é a possibilidade de realizar todos os desejos, no sentido de almejar a liberdade acima de qualquer limite [...]. Isto é, a liberdade do outro não se opõe à liberdade alheia, como na vontade despótica, nem termina onde começa a liberdade do outro, mas ela se realiza quando se encontra com outras pessoas na luta pela sua liberdade e pela das outras. (STRECK; REDIN; ZITKOSKI, 2010, p. 241)

Para Freire seriam essas possibilidades e características que deveriam ser desenvolvidas na instituição e na sociedade, pois seriam elas que levariam os sujeitos a compreender e dominar sua existência pessoal e social além de assegurar a participação e realização da democracia, conscientizando-se e humanizando-se.

Por isso, desde já, saliente-se a necessidade de uma permanente atitude crítica, único modo pelo qual o homem realizará sua vocação natural de integrar-se, superando a atitude do simples ajustamento ou acomodação, apreendendo temas e tarefas de sua época. (FREIRE, 1967, p. 45)

Essa noção de homem em processo, em continua humanização, fundamenta o trabalho realizado por educadores na mediação do conflito. As crianças se humanizam nas relações, portanto, a mediação é parte de um processo educativo através do qual aprenderão novos modos de convivência. O tempo em que se aprendem esses novos modos de convivência não é um tempo perdido, mas é um tempo de aprendizagem.

Dentro dessa perspectiva, faz-se importante considerar o grupo de alunos uma vez que é o mesmo que, além de contribuir para a humanização entre sujeitos, testemunha e vivencia tanto os conflitos como suas intervenções. Para tanto, descreverei o que é entendido por grupo dentro do espaço escola.

Dentro da instituição escolar encontramos agrupamentos formados de modo multifacetado: entre alunos e professores; entre alunos e alunos; entre funcionários e professores; entre funcionários e alunos.

Como esclarece Marino (1999) dependendo da visão do ensino, o olhar para esse grupo se transforma. Dentro da perspectiva tradicional, trazida pela autora como exemplo:

Professor-ensina, aluno-aprende; a vida do grupo acontece a despeito do enquadro formal de uma programação de ensino, das tarefas solicitadas e da avaliação. Quando a vida do grupo surge em cena na percepção do professor, se mostra como incomodo, em

momentos de “indisciplina” perturbadores do ensino. (MARINO,

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Cuidar dos conflitos e de suas possibilidades inclui o modo como se cuida também desse grupo e de suas relações, possibilitando além de outras coisas a expressão e liberdade de seus membros. Dentro da perspectiva de Freire, Marino complementa:

Numa visão emancipadora, o professor disponibiliza-se à relação, abre-se à espontaneidade-criatividade própria e dos educandos [...]. Aí a sala de aula é vista como espaço da cultura, laboratório da vida social. As redes intersubjetivas são catalisadas para troca, somos convidados a nos trazermos em nosso mundo e construirmos, assim, um mundo comum: no encontro com o conhecimento e na participação que organiza a vida partilhada. (MARINO, 1999, p. 92)

O grupo participa, aprende e atua diante do dia a dia partilhado. Seguindo na mesma linha, por sua experiência, olhar reflexivo e crítico relacionado com a visão marxista diante da realidade das massas (camadas mais populares da sociedade), Paulo Freire visou que a educação deveria buscar conscientizar politicamente essas camadas. Para o educador a prática da liberdade se traduz como a participação livre e crítica dos educandos, sendo essa um movimento contrário à dominação/ opressão. Essa é a tarefa da educação: proporcionar aos alunos que conheçam e se apropriem da liberdade se construindo como sujeitos críticos, reflexivos, abertos ao mundo, conscientes enxergando-se como classe e como transformadores.

Considerando os conceitos trazidos acima, entendemos que, quando se possibilita aos alunos o espaço para a reflexão de modo crítico diante das situações de conflito, trata-se de prática de liberdade, de cidadania.

Muitas vezes as condições encontradas são inversas às apresentadas até então. Creio que se a educação atualmente comprometesse com esses ideais, os resultados das pesquisas apresentadas no início deste trabalho teriam melhores índices. Muitas vezes o que se apresenta são relações de opressão.

Compartilho da opinião de Freire que entende a prática dos ideais libertadores como essencial e, acima de tudo, necessária para a transformação da sociedade. Entretanto, a educação libertadora só se sustenta em si, na medida em que são proporcionadas ao oprimido condições para descobrir-se, refletir sobre o mundo e conquistar-se. Entretanto, quem são os opressores e oprimidos? No dicionário de Paulo Freire, Avelino da Rosa Oliveira define oprimido e opressor como:

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antagônicas e em luta. No entanto é possível que se instaurem relações de opressão entre os próprios oprimidos. (STRCK; REDIN; ZITKOSKY, 2010, p. 294)

Para enxergar opressores e oprimidos, é necessário olhar para as relações entre os homens. Diante destas relações é possível notar que algumas delas se configuram por meio de atitudes de opressão, na medida em que existe uma postura de autoritarismo e de dominação entre homens. Vale esclarecer que a opressão não se limita ou instaura apenas entre classes sociais, raças, crenças religiosas. Para Paulo Freire os oprimidos não são os pobres e não escolarizados apenas, os oprimidos são os sujeitos diferentes dos padrões impostos social e culturalmente. As relações de opressão não se dão apenas entre educadores e educandos, opressão restrita à instituição de ensino. Essas relações dominadoras se dão na sociedade e na cultura, entre homens.

Na sua obra “Pedagogia do Oprimido” o autor esclarece que:

A nossa preocupação, neste trabalho, é apenas apresentar alguns aspectos do que nos parece constituir o que vimos chamando de pedagogia do oprimido: aquela que tem que ser forjada com ele e não para ele [...] Pedagogia que faça da opressão e de suas causas objeto de reflexão dos oprimidos [...]. (FREIRE, 1972, p. 43)

Como o próprio título da obra nos demonstra, é por meio da Educação que se pode buscar garantir e consolidar a prática de libertação, sendo esta vista pelo autor como tarefa de ambos, opressores e oprimidos.

A agressão entre alunos, seja ela física ou verbal, instaura o domínio do mais forte sobre o mais fraco. Se os conflitos não são discutidos, refletidos, instalam-se relações de opressão. Entretanto, para alcançar opressores e oprimidos é preciso anteriormente conscientizar. A atitude de discutir essas situações de conflito é uma ação de conscientização e o que viabiliza essa conscientização é o diálogo.

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A influência das propostas de Freire destaca e localiza o leitor para o lugar a partir do qual olho a Educação, o professor, os alunos, suas relações humanas e seus propósitos.

Na continuidade dos ideais que baseiam este estudo, outro conceito de extrema importância para a compreensão da Educação como prática de liberdade e consequentemente para o entendimento desta pesquisa é o diálogo, afinal o que mobiliza a reflexão crítica e a conscientização é prática do diálogo.

Quando tentamos um adentramento no diálogo como fenômeno humano, se nos revela algo que já poderemos dizer ser ele mesmo: a palavra. Mas, ao encontrarmos a palavra, na análise do diálogo, como algo mais que um meio para que ele se faça, se nos impõe buscar, também, seus elementos constitutivos. (FREIRE, 1972, p. 44)

Talvez esse termo possa ser considerado famigerado uma vez que enxergado como uma técnica aplicada à Educação, entretanto, não é essa sua real função. O diálogo é o caminho através do qual se consolidam as relações com o objetivo da reflexão e ação para a transformação e humanização do social. Não se configura com um depositar ideias, ou trocá-las sem o comprometimento com elas. O monólogo nada mais é do que uma educação bancária que fecha a consciência, na medida em que estar consciente é estar aberto ao outro e ao mundo.

Para o autor o método dialógico é uma atuação além da prática, é uma proposta de libertação de oprimidos e opressores. Freire entendia que a busca pela dialogicidade compreendia duas dimensões: ação e reflexão de modo interacional. Nesse sentido cabe ao próprio sujeito, diante de suas ações, refletir sobre elas, ou contar com a mediação do professor e colegas para essa reflexão. “O diálogo é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu” (FREIRE, 1972, p. 109).

Quando Paulo Freire se refere à pronúncia do mundo por ele defendida, retrata a possibilidade que cada sujeito tem de praticar a reflexão e agir diante da transformação sem impor suas ideias depositando e impondo “saberes” ao outro.

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A formação da personalidade democrática e a emergência da consciência crítica implicavam a aceitação das mudanças, e abertura ao diálogo, a tolerância diante dos desacordos, a introjeção da autoridade, o sentimento de responsabilidade e a busca na participação da vida coletiva a procura do aprofundamento da capacidade de reflexão. (BEISIEGEL, 1982, p. 37)

Como afirma Beiseigel, Paulo Freire apresenta: “crença ilimitada nas possibilidades do diálogo enquanto alicerce de uma modalidade superior de convivência” (1982, p. 40). Uma educação problematizadora, ao contrário da bancária, promove o diálogo entre educando e educador e ambos são mediados pelo mundo. Nesse encontro de sujeitos o propósito não deve ser uma disputa com a intenção de fazer o outro consumir ideias de quem fala, mas a concretização da reflexão e da ação de homens com o intuito de transformar o mundo mediante a palavra.

Para pensarmos a palavra, considerando que o diálogo está subordinado a ela, recorrerei a uma situação vivenciada em uma sala de aula de 1° ano do Ensino Fundamental de alunos de seis anos.

Em uma partida de Futebol, testemunhei um conflito como professora e fui convidada a intervir. Um dos jogadores, Leonardo, estava chorando. Chamei-o de canto e perguntei:

- Leonardo, percebi que você está chorando, posso te ajudar?

- Pode. É que eu errei o gol e por isso o David disse que eu sou um mau jogador de futebol e eu fiquei muito triste com isso. – As lágrimas continuavam a escorrer com intensidade.

Percebendo a fala de Leonardo, David se aproximou e começou a chorar.

- Leonardo, acho que o David deve estar chateado com alguma coisa. Vamos ouvir o que ele tem pra dizer também?

- É que eu fiquei triste. - disse David.

- Triste por ele ter errado o gol para o seu time? – e as lágrimas de David aumentaram.

- Não. Fiquei triste porque vi que deixei ele triste. Desculpa, Leonardo.

Quando perguntei aos dois de que maneira eles gostariam de resolver o conflito vivido, ambos abriram um sorriso e continuaram a partida. Ao final, o time de David e Leonardo ganhou o jogo. E acredito que, além da partida, outros foram os ganhos dos meninos.

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preocupação de procurar um culpado, mas com a intenção de possibilitar a ambos um espaço para que se posicionem diante do acontecimento.

Na medida em que a professora foi fazendo perguntas sobre como poderia ajudá-los e como poderiam resolver, disponibilizou-se a ouvir sobre como cada um estava se sentindo. Nesse espaço de escuta, foi assegurando a prática do diálogo e auxiliando os próprios envolvidos a buscarem, por meio da palavra, um caminho para resolver o problema. A reflexão surgiu entre eles sem ser necessário endossar discursos moralistas, ou recorrer a punições e castigos.

É importante salientar que as intervenções tidas pela professora partem do pressuposto de que ela compreende o conflito como a possibilidade de aprender a conviver, e convivendo de modo respeitoso.

Vale aqui uma reflexão: será que as sanções, as perdas, as visitas à sala de coordenação e direção, bem como o próprio discurso do “não faça isso!” possibilita aos alunos, independentemente da idade, recorrerem ao diálogo como modo de tentativa de resolução dos problemas que surgem?

Se, ao invés do espaço tido, a professora resolvesse parar o jogo e acabar com a brincadeira, sua estratégia não possibilitaria aos alunos pronunciar seu próprio mundo. Se o espaço não fosse proporcionado, sancionar-se-ia o direito de ambos de perceberem a si e ao outro se respeitando e acima de tudo encontrando liberdade para se posicionar frente aos demais colegas e frente à professora. É perceptível, portanto, a importância da mediação e intervenção do professor para auxiliar o processo de formação de seus alunos.

Ao proporcionar o parto da palavra a professora acredita que seus alunos têm perfeitas condições de dialogar e eles o fazem. É possível, assim, desconstruir a ideia de que crianças pequenas não conseguem recorrer à palavra ou pronunciar seu mundo. Nesta vivência, ao parir a palavra por meio da sua mediação, a professora propiciou um espaço de diálogo.

Para Paulo Freire o professor possui papéis essenciais. O autor não nega a importância da autoridade docente; entretanto, diferente do que foi visto historicamente, essa autoridade deve ser desempenhada em conjunto com a liberdade dos educandos, pois é a partir dessa autoridade que se alcança a liberdade.

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autoridade moral toma conta do solo básico a inserção no mundo das pessoas e a imperativa compreensão e ação a favor da realização da ontológica vocação humana à humanidade. A tarefa seguinte da autoridade, colada à prática cotidiana, é a geração de condições à disponibilização de todos ao diálogo e à crítica. (STRECK; REDIN; ZITKOSKY, 2010, p. 54)

Nota-se assim que o docente, além do compromisso com o saber e com a inserção dos alunos no mundo, deve, segundo Freire, gerar e disponibilizar o espaço à crítica e ao diálogo.

Sob uma ótica filosófica e política, Hannah Arendt também traz importantes contribuições acerca do papel do professor. Considerando a educação como uma das atividades humanas mais essenciais para a sociedade, Arendt a apresenta como tendo dinamismo uma vez que está em constante renovação assim como a renovação dos sujeitos sociais. Em detrimento dessa renovação, as crenças de Arendt se pautam, assim como Freire, no não acabamento dos sujeitos. Assim sendo, tanto as crianças, recém-chegadas à sociedade, como a própria sociedade estão em um constante estado de novo, de diferente de algo que já veio a ser.

Sendo assim, qualquer educador (Arendt considera também educadores não formais, esclarecendo que esses são os pais, familiares etc.) tem como função apresentar o mundo a esse novo sujeito em constante formação.

Se a criança não fosse um recém-chegado nesse mundo humano, porém simplesmente uma criatura viva não concluída, a educação seria apenas uma função da vida e não teria que consistir em nada além da preocupação para com a preservação da vida e no treinamento e na prática do viver que todos os animais assumem em

relação a seus filhos.” (ARENDT, 2011, p. 235)

Quem possibilita a introdução dessas crianças no mundo já existente apresentando-o a elas são os pais e educadores, assumindo a responsabilidade pela sobrevivência das mesmas bem como pela continuidade do mundo. Justamente por meio dessa responsabilidade do adulto pelo mundo é que se manifesta sua autoridade – autoridade por um conhecimento de mundo e pela sua capacidade diante de instruir os outros sobre este novo que se apresenta.

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20, Arendt nos diz: “Qualquer pessoa que se recuse a assumir a responsabilidade coletiva pelo mundo não deveria ter crianças, e é preciso proibi-la de tomar parte em sua educação” (ARENDT, 2011, p. 239).

Como apontado nos parágrafos acima, Paulo Freire lembra a necessidade de trazer a responsabilidade pelo mundo para o processo educativo. Ou seja, como tarefa das escolas.

Em meio a essas considerações educacionais, Arendt resgata e defende a importância do passado considerando o mesmo como sinônimo de conservação de modelos.

Parece-me que o conservadorismo, no sentido de conservação, faz parte da essência da atividade educacional, cuja tarefa é sempre abrigar e proteger alguma coisa: a criança contra o mundo, o mundo contra a criança, o novo contra o velho, o velho contra o novo. (ARENDT, 2011, p. 242)

Mediando o velho e o novo, o mundo e a criança, a criança e o mundo, os educadores devem respeitar o passado enxergando sua qualidade, “isto é, o homem envelhecido é um modelo para os vivos” (ARENDT, 2011, p. 244).

Sendo assim, Arendt compartilha que o problema da educação do mundo moderno estaria no fato de não se poder ignorar nem a tradição e nem a autoridade.

A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumir a responsabilidade por ele e, com tal gesto, salvá-lo da ruína que seria inevitável não fosse a renovação e a vinda dos novos jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mundo e abandoná-las a seus próprios recursos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando-as em vez disso com antecedência para a tarefa de renovar um mundo comum. (ARENDT, 2011, p.247)

Na continuidade do pensamento, a autoridade é vista por Arendt como natural ao mundo político, social e familiar uma vez que, seguindo a tradição, os mais velhos transmitem o mundo aos mais novos. A responsabilidade pelo mundo e pela tradição se manifesta sob a forma de autoridade e essas são relações de poder uma vez que implicam obediência e hierarquia, entretanto não implicam violência. Se há a coerção de um sobre o outro, é autoritarismo.

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do mundo aos alunos, bem como o de instruí-los da responsabilidade por esse mundo, possibilitando, além do acesso ao saberes já construídos, a disponibilização e espaços para o diálogo, a reflexão, a crítica e a ação.

2.3 Conflito na perspectiva dialógica

Encerramos o tópico anterior atribuindo à Educação e a seus responsáveis, segundo as teorias que pautam esta pesquisa, tanto a apresentação do mundo, como a necessidade de criação de espaços para que seus novos membros construam conhecimentos.

A educação formal é um processo que ocorre dentro do espaço escolar, espaço esse que, por vivenciar situações de convivência, tanto possibilita o encontro entre homens, como situações de desencontros também, quando colidem em diferentes crenças, conhecimentos, estados de humor, desejos, interesses. Diante de tais diferenças surgem conflitos e nesse momento o diálogo é o caminho para buscar o encontro necessário para o processo de educação. Vale esclarecer que, mesmo em trocas dialógicas, a possibilidade de conflitos sempre existe, então vamos a ele.

A seguir discutiremos a origem da palavra conflito, os conceitos a ela atribuídos teoricamente e a reflexão diante desse olhar para eles como possibilidade de aprendizado.

A origem da palavra conflito é esclarecida por Deonisio da Silva (2004) como:

do latim conflictum, conflito, choque, luta, bater uma coisa em outra. Sua formação alude também ao particípio conflectum, do verbo

conflere, chorar junto. (SILVA, 2004, p. 208)

Etimologicamente a palavra conflito já tem em si um princípio de combate entre sujeitos, como a própria definição. O resultado do combate é uma situação em que ambos se magoam, se ferem e choram juntos. Será que o resultado deverá sempre ser danoso?

Moacir de Goés retrata que:

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culturas não se consegue eliminar essas tensões tão presentes nas relações humanas. (GOÉS, apud STRECK; REDIN; ZITKOSKY, 2010, p. 84)

O conflito é entendido, então, como natural em meio às relações humanas, uma vez que cada sujeito está em processo de humanização, de decisão do vir-a-ser, cada um possuidor de desejos e interesses próprios.

O conflito nas obras de Freire é fundamental para o exercício do diálogo, para a construção do conhecimento decorrente da criação, recriação dos homens e mulheres, para a reflexão sobre temas geradores e conteúdos programáticos no contexto da educação libertadora, para a conscientização do processo dialético das ações políticas e dialógicas. (STRECK; REDIN; ZITKOSKY, 2010, p. 85)

Diante das situações de conflitos, compreende-se o diálogo como o caminho para proporcionar a esses sujeitos em processo, espaços para refletirem sobre atitudes bem como oportunidade de construção de saberes. E, diante dessa demanda, o professor é o mediador que participa dessa construção.

Em sua obra “Pedagogia da Autonomia”, Paulo Freire leva seus leitores a uma reflexão: Por que não estabelecer uma “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduo? (FREIRE, 2011, p. 32). As situações conflituosas são encaradas como prejudiciais por alguns educadores com argumentos de que, quando há divergências entre educandos, prevalece o barulho, atrapalha-se o ensino, atrasa-se o conteúdo. Se considerarmos a “intimidade” proposta por Freire, o tempo utilizado na solução dos conflitos constitui um momento educativo.

A visão de conflito como um desconhecimento de sua particularidade educativa reflete a falta de formação do educador ao considerá-lo como algo que atrapalha a condução das situações conflituosas ocorridas na escola. Entretanto, como vimos até então, os conflitos dentro do espaço escolar são oportunidades de aprender a conviver entre homens de modo dialógico.

A seguir serão apresentados os objetivos desta pesquisa.

2.4 Objetivos

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bem como solicitam novos modos de intervenção. De acordo com a teoria de Paulo Freire apresentada e com alguns conceitos da Fenomenologia a serem apresentados no capítulo seguinte, compreendemos que, no encontro entre homens, os conflitos são naturais e podem contar com o diálogo como meio de reflexão e contribuição para o processo de humanização. Ao final, repensamos o papel do professor enquanto participante.

Em razão deste cenário, os objetivos propostos para esta pesquisa são:

Objetivo geral

- Compreender o sentido das ações desenvolvidas por uma professora do Ensino Fundamental diante de conflito entre alunos.

Objetivos específicos

- Apresentar as ações descritas pela professora para solucionar os conflitos que surgiram.

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3. MÉTODO

Neste tópico apresentarei a opção metodológica escolhida para investigar a questão acima. Vale resgatar, conforme já apresentado no início deste trabalho, que a minha experiência com um grupo que trabalha segundo um referencial fenomenológico existencial me possibilitou conhecer e escolher um novo modo de buscar enxergar os fenômenos.

3.1 Pesquisa qualitativa em referencial fenomenológico

Para que o leitor possa compreender o modo pelo qual pretendo olhar o fenômeno, faz-se necessária uma breve apresentação do que designa essa pesquisa como um estudo qualitativo na área da Educação.

Ludke e André (1986) trazem cinco aspectos que caracterizam a pesquisa qualitativa:

1. A pesquisa qualitativa supõe um contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e situação que está sendo investigada [...]. 2. O material obtido nessas pesquisas é rico em descrições de pessoas, situações, acontecimentos. Todos os dados da realidade são considerados importantes. 3. O interesse do pesquisador ao estudar um determinado problema é verificar como ele se manifesta nas atividades, nos procedimentos, e nas interações cotidianas [...]. 4. Nesses estudos há sempre uma tentativa de capturar a

“perspectiva do participante” [...]. 5. Os pesquisadores não se

preocupam em buscar evidências que comprovam hipóteses definidas antes do início dos estudos. (LUDKE e ANDRÉ, 1986, p. 11)

Em síntese, a pesquisa qualitativa em Educação busca a obtenção de dados diante do contato direto do pesquisador com seu objeto de estudo, valorizando o processo de pesquisa mais que os resultados. Outra característica importante é que esse tipo de pesquisa possibilita a perspectiva do participante diante do objeto estudado.

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Para a compreensão do método escolhido para esta pesquisa, faz-se necessária uma breve apresentação do que seja um método fenomenológico de conhecimento. É importante esclarecer que não pretendo trazer um aprofundamento teórico da Fenomenologia, mas apenas trazer alguns conceitos.

A Fenomenologia é antes de tudo “uma alternativa de buscar-se compreender o mundo, de modo diferente daquele comum às Ciências Naturais Positivistas...” (MARTINS; BICUDO, 1983, p. 10). É a procura pela compreensão de um determinado fenômeno sem encaminhar a ele conceitos estabelecidos previamente. Foi justamente a partir do questionamento da Antropologia ao modo tradicional (empírico) de fazer ciência, que surge a Fenomenologia nas Ciências Sociais.

A Fenomenologia procura abordar o fenômeno, aquilo que se manifesta a si mesmo, de modo que não parcializa ou explica a partir de conceitos prévios, de crenças, ou de afirmações sobre o mesmo, enfim, de um referencial teórico. Mas ela tem a intenção de abordá-lo diretamente, interrogando-o, tentando descrevê-lo e procurando captar a sua essência. (MARTINS; BICUDO, 1983, p. 10)

O próprio conceito da palavra fenômeno é compreendido como algo situado que se mostra a alguém também situado. Em outras palavras, a observação de um fato/objeto pelo seu pesquisador pode ser contaminada por teorias já explicativas diante desse fenômeno, bem como pelos próprios pré-conceitos do observador.

Dentro de uma postura fenomenológica o que se espera é que o investigador reconheça os próprios pré-conceitos sobre o objeto pesquisado e busque “voltar a coisa” mesma superando as representações já postuladas sobre ela (CRITELLI, 2007).

Exemplifico através da minha própria experiência diante da perspectiva de realizar este trabalho de dissertação. Ao chegar ao curso, as minhas crenças teóricas já possibilitavam hipóteses em relação às perguntas por mim elaboradas diante do problema que eu buscava estudar. Uma vez com as respostas já prontas, eu deixaria de investigar para, diante de uma determinada teoria, encaminhar respostas prontas sobre um o fenômeno dos conflitos escolares.

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tentando aplicar sobre ele uma resposta já sabida sobre ele mesmo” (Critelli, 2007), ou seja, as explicações e justificativas teóricas já estabelecidas não nos permitem entrar em contato com o que está se mostrando.

Entendemos, assim, que essa postura fenomenológica é, sobretudo, uma busca que se dá na experiência com o fenômeno e, por ser única e particular, não tem como objetivo a generalização de seus resultados, tampouco a sugestão de um caminho validado a ser seguido.

Minayo (2010) complementa esclarecendo que

a Fenomenologia (...) defende a ideia de que as realidades sociais são construídas nos significados e através deles, e só podem ser identificadas na medida em que mergulha na linguagem significativa da interação social. (MINAYO, 2010, p. 34)

O que a autora nos diz é que tanto as linguagens como as práticas para a Fenomenologia não podem ser vistas separadamente, tais como o homem e o mundo. Não existe homem fora do mundo e não existe o mundo sem o homem.

Inserido nessa perspectiva fenomenológica, encontra-se outro conceito importante para esta pesquisa uma vez que é para ele que olharemos no decorrer da análise dos dados. Será indicado, neste momento, o que se entende por modo de existir, antes de apresentar o que se entende por sentido.

Falamos de um modo através do qual aquilo que aparece se abre para alguém, mostra-se, manifesta-se como aquilo que é e o é (...) pelos estados de ânimo, as coisas manifestam-se em seu significado existencial mais genuíno e em seu sentido. (CRITELLI, 2007, p. 107)

Critelli esclarece, dentro da perspectiva fenomenológica, que “os estados de ânimo são modos de cuidar de existir” (CRITELLI, 2007, p. 134). O que a autora nos diz é que estamos cuidando o tempo todo de existir. Esses modos de cuidar das nossas ações, intervenções, relações são o direcionamento que atribuímos a nossa vida, ou seja, entendemos que os professores cuidam de suas aulas selecionando matérias, planejando-as, avaliando-as, entretanto os estados de ânimo que os dirigem diante dessas tarefas também são um modo de cuidar do modo de cuidar de suas aulas. Esse modo de cuidar, do modo de cuidar, pode se dar em diferentes estados de ânimo.

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o controle do grupo e o desenvolvimento do conteúdo, com raiva da atitude das crianças. Esse estado de ânimo é uma disposição afetiva que direciona a intervenção do professor. Como essa professora soluciona os conflitos, modo esse adquirido em sua experiência, refere-se a um sentido que a dirige. Em outras palavras, se os conflitos são vistos com interesse como uma possibilidade educativa, esse será o sentido que dirigirá as intervenções do educador, se for percebido de outra forma, outros serão os sentidos.

Para atingirmos o desvelamento do sentido das ações da professora, utilizaremos a entrevista reflexiva como recurso.

3.2 A entrevista reflexiva

Pela ênfase em conhecer a perspectiva do participante, pela atitude interrogativa, pela ênfase na particularidade do fenômeno e pelo reconhecimento de que crenças e atitudes são construídas num mundo com os outros, optou-se pela entrevista reflexiva que propõe um diálogo – a co-construção de uma nova compreensão. Vamos a ela.

Szymanski (2004) esclarece que “a entrevista face a face é fundamentalmente uma situação de interação humana, em que estão em jogo as percepções do outro e de si, expectativas, sentimentos, preconceitos e interpretações para os protagonistas: entrevistador e entrevistado” (SZYMANSKI, 2004, p. 12).

Diante da necessidade de entrevistar para assim se aproximar da compreensão do que se quer conhecer, cabe ao entrevistador a definição dos seus objetivos.

É importante salientar que tanto o entrevistador quanto o entrevistado estão situados em um tempo e espaço. O entrevistador busca conhecer algo que será apresentado pelo entrevistado de forma única e singular, tornando essa experiência, vivida por esses protagonistas, uma possibilidade de construção de novos conhecimentos.

Entretanto, por que reflexiva?

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Reflexividade tem aqui também o sentido de refletir sobre a fala de quem foi entrevistado, expressando a compreensão dela pelo entrevistador e submeter tal compreensão ao próprio entrevistado, o que é uma forma de aprimorar a fidedignidade [...]. (SZYMANSKI, 2004, p. 15)

Minha experiência com esse procedimento acontece no projeto do qual participo – Articulação e Diálogo (SZYMANSKI, Projeto de pesquisa. PEPGE – Psicologia da Educação. PUC-SP) – e onde, em razão da formação dos multiplicadores, discutimos de forma teórica e prática.

Revelo brevemente que, ao vivenciar a entrevista reflexiva no projeto de formação de multiplicadores, os próprios multiplicadores passaram por um processo de reconhecer os próprios pré-conceitos já estabelecidos previamente sobre os pais dos alunos da instituição, para se aproximarem do modo como esses pais enxergam seus filhos bem como suas dificuldades.

3.3 Planejamento da entrevista

Apresento agora o processo de condução da entrevista reflexiva para atingir os objetivos propostos. Inicialmente, após a apresentação formal do trabalho, iniciei um período preparatório para obtenção de dados do participante tais como: sua formação, percurso profissional, tempo em que leciona. Além da obtenção de dados, esse momento foi fundamental também para um encontro amigável anterior à entrevista (SZYMANSKI, 2004).

Em seguida, apresentei como ponto de partida uma questão desencadeadora para possibilitar à professora trazer, de modo aberto, suas contribuições em relação aos conflitos entre os alunos por ela vivenciados.

A respeito da questão desencadeadora, Heloisa Szymanski esclarece:

Ela deve ser o ponto de partida para o início da fala do participante, focalizando o ponto que se quer estudar e, ao mesmo tempo, ampliando o suficiente para que ele escolha por onde começar. Com isso, já teremos um direcionamento das reflexões do entrevistado, ao qual será oferecido, inicialmente, um tempo para a sua expressão livre a respeito do tema que se quer investigar. (SZYMANSKI, 2004, p. 29)

(35)

Perguntas desencadeadoras: “Conte uma situação de conflito que você gostou do modo como se resolveu na sua sala? Dá para fazer sempre deste modo? O que você queria dos alunos naquele momento? Aconteceu o que você queria? Você vivenciou alguma situação de conflito que você não gostou do modo como se resolveu?”

Durante a condução da entrevista é importante ao pesquisador apresentar a sua compreensão a respeito da fala do entrevistado pedindo que o participante valide a interpretação do pesquisador. “A compreensão tem um caráter descritivo e de síntese da informação recebida” (SZYMANSKI, 2004, p. 37). A partir dessas sínteses, o pesquisador vai configurando o delineamento dado pelo participante sobre sua compreensão de conflito.

Após a entrevista inicial, agendarei outro momento para dar uma devolutiva à professora. Neste momento, será exposta a compreensão que tive a partir de sua fala, podendo ser a própria transcrição da entrevista.

Nesse momento, há a possibilidade de se ter conhecimento do impacto da primeira entrevista no modo de perceber o fenômeno por parte do entrevistado e obter-se uma ampliação da compreensão dele por parte do pesquisador. É quando o entrevistado pode apresentar modificações eventualmente geradas pelo processo de reflexão. (SZYMANSKI, 2004, p. 55)

Ao encerar esses dois momentos repletos de dados e reflexões sobre o fenômeno dos conflitos, parto para a análise dos dados.

3.4 Procedimentos de análise

Os trabalhos de Szymanski, Prandini e Almeida (2004) e Martins e Bicudo (1989) trazem o aporte para os procedimentos de análise. Os mesmos contribuem para “uma atividade de interpretações que consistem no desvelamento do oculto” (SZYMANSKI; PRANDINI; ALMEIDA, 2004, p. 65).

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que o mundo daquele que descreve revele-se na descrição” (MARTINS; BICUDO, 1989, p. 57).

Após o procedimento de transcrição da entrevista, o pesquisador tem como tarefa a leitura cuidadosa das descrições do entrevistado. Nesse processo de leitura, “o pesquisador marca ou põe em evidência os significados na descrição. Isso quer dizer que ele está diferenciando as partes nas descrições” (MARTINS; BICUDO, 1989, p. 95). Neste momento já se percebe que não há um esgotamento diante das possibilidades do fenômeno, uma vez que o olhar do pesquisador é apenas uma perspectiva.

É possível perceber, em outro procedimento proposto por Martins e Bicudo (1989), aspectos que dizem respeito diretamente ao fenômeno que se busca estudar. Nesse momento, os dados serão separados por unidades de significados que são entendidas como “discriminações espontaneamente percebidas nas descrições dos aspectos em comum apresentados pelo pesquisado”. Essas unidades de significados “não estão prontas no texto. Existem somente em relação à atitude, disposição e perspectiva do pesquisador” (MARTINS; BICUDO, 1989, p. 99).

Ao categorizar seus dados e unidades de significados e o que deles se tornou aparente, novas configurações vão surgindo e dirigirão a compreensão do sentido que a professora tem em relação aos conflitos.

Após a análise dos dados, produzo uma narrativa procurando desvelar o sentido que se abriu. “O trabalho termina neste ponto, pois chega-se à descrição dos significados que emergiram dos relatos” (SZYMANSKI; PRANDINI; ALMEIDA, 2004, p. 70).

Ao final, faço uma reflexão sobre o princípio educativo que os conflitos em sala de aula têm, revisitando a formação do professor dentro dessa perspectiva.

3.5 Contexto da pesquisa

A escola municipal de ensino fundamental que recebe, nesta pesquisa, um nome fictício de Esperança, está situada na Zona Norte de São Paulo próxima a uma avenida importante do bairro e de fácil acesso.

(37)

aos finais de semana. As portas ficam abertas à população, e os espaços são usufruídos tanto pelos estudantes regulares, como pela comunidade.

A equipe pedagógica é composta por dois diretores, duas coordenadoras – gestores estes que se revelam bastante interessados e comprometidos com a instituição, reforçando sempre que possível manter projetos em parceria com universidades visando o bem da instituição. Totalizando são trinta e três professores sendo 21 turmas do primeiro ao nono ano do Ensino Fundamental, divididos entre manhã e tarde. O total de alunos é de 598 alunos, em ambos períodos.

Em minha primeira visita me surpreendi em relação a muitos aspectos. Logo na entrada, encontramos um segurança que nos pergunta a razão da visita, bem como nos encaminha ao estacionamento da instituição. De modo bastante acolhedor, me levou até a secretaria.

Fui recebida pelo diretor da escola também de modo acolhedor e prontamente ele fez questão de apresentar a instituição. Foi possível perceber o orgulho revelado através de suas palavras, ao contar as conquistas com a qualidade dos espaços e o sucesso de seus projetos.

Passando o portão principal, vemos no canto esquerdo uma biblioteca sem paredes. É um espaço aberto com prateleiras repletas de livros e dois bancos de praça. A disposição do espaço bem como o título no alto da parede são um convite irrecusável para um bom momento de leitura.

Nesse mesmo andar encontra-se o refeitório, extremamente limpo e vidrado para que as crianças possam ver a preparação da alimentação. Ao lado de fora o parque e a quadra também preservados.

A estrutura desperta a atenção. O prédio é novo e mantido sempre muito limpo. Além da escada principal que dá acesso às salas de aula, existe um elevador também em ótimo estado.

As paredes do corredor revelam os projetos que ali acontecem. Títulos como “Quais espaços da escola podemos usar mais?”, “O que podemos ter de diferente nas aulas?” e “O que mais falta na sua escola?” concretizam que ali existe escuta aos alunos e espaços para se registrarem opiniões e sugestões. Essas paredes revelaram de antemão que ali acontece o diálogo e escuta dos alunos.

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As salas têm nomenclaturas indicando o que acontece. Uma em especial me chamou a atenção: “Sala Diálogos (Multiuso)”, que, segundo o diretor, é usada para muitas conversas e formação, seja dos professores seja dos alunos. Salas de informática, de filme, de apoio pedagógico, de inglês ficam no segundo andar, enquanto que, no primeiro andar, ficam as turmas de 1° a 5° ano. No corredor do andar onde estão as salas de aula também encontramos uma inspetora que auxilia alunos e professores no decorrer da rotina escolar.

Minha primeira visita me permitiu quebrar pré-conceitos sobre a escola pública. Surpreendi-me com o cuidado de todos os espaços e com a disposição dos profissionais às crianças e suas necessidades.

3.6 Participantes

A professora e turma foram escolhidas pelo diretor que, sabendo do tema da pesquisa, selecionou um grupo que apresenta conflitos constantemente desde sua formação inicial. Em um primeiro contato com a entrevistada, ela já se mostrou bastante interessada e disponível para compartilhar sua prática e auxiliar para uma pesquisa em Educação.

3.7 Procedimentos éticos

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4. ANÁLISE DA ENTREVISTA

4.1 Síntese da entrevista

Conforme apresentado anteriormente, a entrevista feita com a professora foi transcrita e, após uma leitura atenta e cuidadosa, alguns aspectos sobre o sentido atribuído por ela aos conflitos escolares foram evidenciados. Como se trata de uma entrevista reflexiva, a todo momento questionou-se a respeito da coerência ou não da minha compreensão sobre os aspectos que ela trazia.

A síntese apresentada a seguir foi lida juntamente com a participante e a mesma fez correções ou apontamentos a respeito de seu olhar sobre o fenômeno pesquisado.

Iniciamos o encontro com uma breve apresentação da entrevistada. Luisa, como será chamada na entrevista, relata brevemente sobre sua formação em Pedagogia e Psicopedagogia, tempo de carreira e os dezesseis anos de docência pública e particular em escolas de São Paulo.

No decorrer da entrevista Luisa compartilha situações de conflito entre os seus alunos pontuando suas intervenções e ressaltando que é importante estar bem para fazer as intervenções uma vez que “tento me colocar no lugar do outro”.

Reforça que é importante ter cautela para “conversar quando não tem outras crianças ouvindo” e assim não expor os envolvidos. Enxergando o educador como responsável pelo processo de aprendizagens atitudinais, Luisa aponta também sua preocupação antes de falar para não falar coisas que não serão produtivas para a criança e esclarece ser importante ao professor possibilitar ao aluno um momento para pensar sobre o que fez. “Mesmo os conflitos não sendo do professor e muitas vezes ele não dando conta, cabe a ele tentar mudar alguma coisa e fazer alguma coisa”.

Referências

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