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Mistérios do Tanakh O Teste Secreto de Avraham Por Sha ul Bensiyon. I - Introdução

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Academic year: 2021

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Mistérios do Tanakh O Teste Secreto de Avraham

Por Sha’ul Bensiyon

I - Introdução

Antes de adentrar o tema em questão, gostaria de enfatizar que este texto é uma continuação do tema abordado no artigo “O Sacrifício de Yis’haq”, da mesma série.

O autor sugere fortemente a leitura do referido material, antes de dar prosseguimento no texto, uma vez que este artigo partirá da premissa de que o leitor está familiarizado com a ideia nele apresentada.

Este artigo foi motivado pelo fato de que o autor teve a sensação de que algo ainda faltava ao estudar a questão da `aqedá (amarração) de Yis’haq (Isaque). E se debruçou dia e noite sobre as Escrituras, como um detetive procura pistas, até que algo saltou aos olhos.

Há um teste que o Eterno realiza para com Avraham, que escapa aos olhos em uma leitura menos atenta. Algo que só se percebe observando cada detalhe e cada sutileza da narrativa, mas cujo conteúdo é surpreendente e revelador.

Mas, é algo que demanda bastante atenção, bem como leitura cuidadosa. O autor recomenda fortemente que este material só seja lido quando houver tempo e disposição para se ler cada detalhe, dada a complexidade das nuances da questão.

Este artigo é fruto de várias semanas de estudo sobre o tema, e o autor espera que o leitor, independentemente de suas conclusões, possa crescer em conhecimento ao percorrer a mesma trajetória de reflexão sobre a Torá, e assegura que percorrer esse intrigante caminho valerá à pena.

II - A Promessa

“Ora, ADONAY disse a Avram: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra. Assim partiu Avram como ADONAY lhe tinha dito, e foi Lot com ele; e era Abrão da idade de setenta e cinco anos quando saiu de Haran.” (Bereshit/Gênesis 12:1-4)

Como se pode perceber, o princípio da jornada de Avram (Abrão) tinha um chamado: Sair da terra da parentela. Mas, também tinha uma promessa.

A promessa era a de que Avram se transformaria numa grande nação. Ou seja, há uma promessa aqui de que ele teria uma descendência.

Logo no início da trajetória de Avram, a promessa é enfatizada uma segunda vez, e nesse momento de uma forma ainda mais clara:

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"E passou Avram por aquela terra até ao lugar de Shekhem, até ao carvalho de Moré; e estavam então os cananeus na terra.E apareceu ADONAY a Avram, e disse: À tua semente [ֲָערְַזְל - lezar'akhá] darei esta terra. E edificou ali um altar a ADONAY, que lhe aparecera.” (Bereshit/Gênesis 12:6-7)

O uso do termo ‘semente' (zera`), já na segunda vez em que é reforçada, não deixa nenhuma dúvida de que a promessa é para uma descendência física.

III - A Primeira Falha

"E aconteceu que, chegando ele para entrar no Egito, disse a Saray, sua mulher: Ora, bem sei que és mulher formosa à vista. E será que, quando os egípcios te virem, dirão: Esta é sua mulher. E matar-me-ão a mim, e a ti te guardarão em vida. Dize, peço-te, que és minha irmã, para que me vá bem por tua causa, e que viva a minha alma por amor de ti. Eaconteceu que, entrando Abrão no Egito, viram os egípcios a mulher, que era mui formosa. E viram-na os príncipes de Faraó, e gabaram-na diante de Faraó; e foi a mulher tomada para a casa de Faraó.” (Bereshit/Gênesis 12:11-15)

Neste momento, Avram (Abrão) comete sua primeira falha em sua jornada. Mesmo tendo confiança suficiente no Eterno para deixar a casa de sua parentela, parece que Avram não acredita na promessa do Eterno.

Se Avram perdesse a vida no Egito, como poderia se cumprir a promessa do Eterno de que a sua semente herdaria a terra?

Além de não confiar na proteção do Eterno, parece à primeira vista que Avram ainda tinha dúvidas sobre se a promessa dada por Ele iria se realizar.

Mesmo assim, o Eterno o livra daquela situação, confirmando a sua promessa de ter grandes planos para Avram:

"Feriu, porém, ADONAY a Faraó e a sua casa, com grandes pragas, por causa de Saray, mulher de Avram.” (Bereshit/Gênesis 12:17)

Apesar da falta de confiança de Avram (Abrão), o Eterno foi paciente e agiu em seu favor.

IV - Mais Repetições

"E disse ADONAY a Avram, depois que Lot se apartou dele: Levanta agora os teus olhos, e olha desde o lugar onde estás, para o lado do norte, e do sul, e do oriente, e do ocidente; Porque toda esta terra que vês, te hei de dar a ti, e à tua descendência, para sempre. E farei a tua descendência como o pó da terra; de maneira que se alguém puder contar o pó da terra, também a tua descendência será contada.”

(Bereshit/Gênesis 13:14-16)

Nada do que está na Torá é por acaso. Principalmente no que se refere a coisas que o Eterno diz. Observe que o teor da mensagem é praticamente idêntico ao que o Eterno já havia prometido anteriormente a Avram (Abrão). Por que repetir a promessa?

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A resposta está na própria Torá. Foi necessário relembrar a Avram (Abrão) a promessa depois que Lot (Ló) se apartou dele.

Avram (Abrão) certamente considerava que Lot, seu sobrinho, seria seu herdeiro. Quando Lot se aparta, Avram fica possivelmente perplexo acerca do futuro. O sobrinho que viria a herdar a sua casa e os seus bens já não estava mais com ele.

Isso significa que Avram ainda não confiava na promessa do Eterno de que a sua semente, isto é, seus descendentes biológicos, herdaria a terra.

Essa é a razão pela qual Avram precisa ouvir pela terceira vez a mesma promessa! "Avram, porém, disse ao rei de Sedom: Levantei minha mão a ADONAY, o El-Elyon, o Possuidor dos céus e da terra, jurando que desde um fio até à correia de um sapato, não tomarei coisa alguma de tudo o que é teu; para que não digas: Eu enriqueci a Avram; Salvo tão-somente o que os jovens comeram, e a parte que toca aos homens que comigo foram, `Aner, Eshkol e Mamre; estes que tomem a sua parte.”

(Bereshit/Gênesis 14:22-24)

Depois de auxiliar os cananeus na guerra contra Kedarla`omer, Avram (Abrão) afirma ter jurado ao Eterno que recusaria qualquer despojo de guerra. Em contra-partida, o Eterno lhe ressalta que a recompensa que ele teria seria muito maior:

"Depois destas coisas veio a palavra de ADONAY a Avram numa visão, dizendo: Não temas, Avram; eu sou o teu escudo, o teu galardão será grandíssimo.”

(Bereshit/Gênesis 15:1)

Ao que Avram (Abraão) responde:

"Então disse Avram: Ó ADONAY Elohim, que me darás, visto que morro sem filhos, e o herdeiro de minha casa é o damasceno Eli`ezer?” (Bereshit/Gênesis 15:2)

Avram (Abrão) estava desgostoso. Não via sentido em receber nada, porque já tinha muitos bens, e ainda não tinha filhos para que herdassem tais bens.

Isso mostra que Avram, mesmo depois de ter ouvido a promessa do Eterno por três vezes, ainda não confiava que o Eterno lhe daria um herdeiro!

Pacientemente, o Eterno lhe confirma a promessa pela quarta vez:

"Ao que lhe veio a palavra de ADONAY, dizendo: Este não será o teu herdeiro; mas aquele que sair das tuas entranhas, esse será o teu herdeiro. Então o levou para fora, e disse: Olha agora para o céu, e conta as estrelas, se as podes contar; e acrescentou-lhe: Assim será a tua descendência.” (Bereshit/Gênesis 15:4-5)

Em seguida, a Torá traz uma das passagens mais mal compreendidas de todas as Escrituras:

"E confiou Avram em ADONAY, e ADONAY imputou-lhe isto como justiça.” (Bereshit/ Gênesis 15:6)

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Reflita o leitor: Avram (Abrão) precisou ouvir a mesma promessa quatro vezes, e como ainda será visto na continuação da narrativa, ainda voltaria a exibir dúvida acerca da promessa do Eterno.

Ou seja, é errônea a ideia de que Avram tenha sido considerado justo por causa de uma suposta fé inabalável na promessa do Eterno.

Por que, então, a Torá diz que ele foi considerado como justo?

A resposta é: Pelo mesmo motivo que ele inicialmente foi escolhido. Por sua capacidade de obedecer ao Criador, independentemente de seus medos, angústias e anseios.

Em quê o Avram obedeceu ao Eterno? A resposta está no começo da narrativa: Avram estava preste a colocar Eli`ezer como herdeiro de todos os seus bens, inclusive da terra que o Eterno havia destinado aos herdeiros biológicos de Avram.

Ou seja, quando o Eterno diz “este não será seu herdeiro”, Avram acata a ordem do Eterno e desiste da ideia de tornar Eli`ezer seu herdeiro.

Por essa razão, por ter dado ouvidos à ordem do Eterno, Avram foi considerado justo mesmo tendo dificuldade de aceitar a promessa.

V - A Segunda Falha

"Ora, Saray, mulher de Avram, não lhe dava filhos. Tinha ela uma serva egípcia, que se chamava Hagar. Disse Saray a Avram: Eis que ADONAY me tem impedido de ter filhos; toma, pois, a minha serva; porventura terei filhos por meio dela. E ouviu Avram a voz de Saray.” (Bereshit/Gênesis 16:1-2)

No episódio acima, Avram (Abrão) e Saray resolvem dar um jeitinho para tentar ‘ajudar' o Eterno. Já que o herdeiro não vinha, Saray resolve dar a Avram a sua serva, para que concebesse por ela.

Trata-se de mais um momento de hesitação de Avram (Abrão), que acaba dando ouvidos à esposa. Observe que em momento algum o Eterno é consultado a respeito de tais planos.

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VI - Novas Repetições

Por causa disso, o Eterno reafirma a promessa uma quinta vez, para que não houvesse dúvidas de que as coisas seriam realizadas do jeito dEle:

"Sendo, pois, Avram da idade de noventa e nove anos, apareceu ADONAY a Avram, e disse-lhe: Eu sou o El-Shaday, anda em minha presença e sê perfeito. E porei a minha aliança entre mim e ti, e te multiplicarei grandissimamente. Então caiu Avram sobre o seu rosto, e falou Elohim com ele, dizendo: Quanto a mim, eis a minha aliança contigo: serás o pai de muitas nações; E não se chamará mais o teu nome Avram, mas Avraham será o teu nome; porque por pai de muitas nações te tenho posto; E te farei frutificar grandissimamente, e de ti farei nações, e reis sairão de ti; E estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência depois de ti em suas gerações, por aliança perpétua, para te ser a ti por Elohim, e à tua descendência depois de ti. E te darei a ti e à tua descendência depois de ti, a terra de tuas peregrinações, toda a terra de Kena`an em perpétua possessão e ser-lhes-ei o seu Elohim.” (Bereshit/Gênesis 17:1-8)

Avram, agora denominado Avraham (Abraão), ouve a promessa do Eterno mais uma vez, de que ele teria uma descendência numerosa, que herdaria a terra.

Ainda assim, Avraham não acredita na promessa, mesmo dita uma quinta vez, e ainda acha graça do que o Eterno estava dizendo:

"Disse Elohim mais a Avraham: A Saray tua mulher não chamarás mais pelo nome de Saray, mas Sará será o seu nome. Porque eu a hei de abençoar, e te darei dela um filho; e a abençoarei, e será mãe das nações; reis de povos sairão dela. Então caiu Avraham sobre o seu rosto, e riu-se, e disse no seu coração: A um homem de cem anos há de nascer um filho? E dará à luz Sará da idade de noventa anos?”

(Bereshit/Gênesis 17:15-17)

Não só Avraham (Abraão) está descrente da promessa acerca de ter um filho com Sara, como ainda tenta argumentar com o Eterno acerca de Yishma`el (Ismael), pois ainda pensa que o jeitinho dado por ele e Sara eram necessários para o cumprimento da promessa:

"E disse Avraham a Elohim: Quem dera que viva Yishma`el diante de teu rosto!” (Bereshit/Gênesis 17:18)

Depois disso, o Eterno precisa lhe confirmar uma sexta vez que a promessa dada a ele iria se cumprir:

"E disse Elohim: Na verdade, Sará, tua mulher, te dará um filho, e chamarás o seu nome Yis'haq, e com ele estabelecerei a minha aliança, por aliança perpétua para a sua descendência depois dele.” (Bereshit/Gênesis 17:19)

O Eterno deixa claro que a aliança será com Yis’haq (Isaque). Ou seja, Ele operaria o milagre, sem depender da ajuda de ninguém, para demonstrar que Ele é o Senhor sobre todas as coisas.

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"E disseram-lhe: Onde está Sara, tua mulher? E ele disse: Ei-la aí na tenda.E disse: Certamente tornarei a ti por este tempo da vida; e eis que Sará tua mulher terá um filho. E Sará escutava à porta da tenda, que estava atrás dele. E eram Avraham e Sara já velhos, e adiantados em idade; já a Sara havia cessado o costume das mulheres. Assim, pois, riu-se Sará consigo, dizendo: Terei ainda deleite depois de haver envelhecido, sendo também o meu senhor já velho? E disse ADONAY a Avraham: Por que se riu Sará, dizendo: Na verdade darei eu à luz ainda, havendo já envelhecido? Haveria coisa alguma difícil a ADONAY? Ao tempo determinado tornarei a ti por este tempo da vida, e Sará terá um filho.” (Bereshit/Gênesis 18:9-14)

Esta é a sétima vez que a promessa é lembrada. Certamente porque ainda havia dúvida da parte do casal. Dessa vez, é Sara quem ri da promessa, por já ser idosa demais para ter um filho.

No entanto, o Eterno pacientemente reafirma a promessa mais uma vez, e diz que Sara conceberia brevemente.

VII - Conclusão sobre as Promessas Repetidas

Como se pode ver, longe de ser a figura intrépida e confiante o tempo todo, Avraham (Abraão) se mostrava uma pessoa disposta a obedecer o Eterno, porém cética e temerária com relação às promessas que o Eterno lhe havia feito.

O Eterno precisou reafirmar suas promessas repetidamente, e ainda assim Avraham tinha muita dificuldade de acreditar nelas.

VIII - O Problema

Devido justamente às suas incertezas, Avraham (Abraão) viria ainda a passar por um grande problema, que a Torá narra abaixo:

"Partiu Avraham dali para a terra do Neguev, e habitou entre Qadesh e Sur; e peregrinou em Guerar. E havendo Avraham dito de Sará, sua mulher: É minha irmã; enviou Avimelekh, rei de Guerar, e tomou a Sará. Elohim, porém, veio a Avimelekh, em sonhos, de noite, e disse-lhe: Eis que estás para morrer por causa da mulher que tomaste; porque ela tem marido. Ora, Avimelekh ainda não se havia chegado a ela: perguntou, pois: ADONAY matarás porventura também uma nação justa? Não me disse ele mesmo: É minha irmã? e ela mesma me disse: Ele é meu irmão; na sinceridade do meu coração e na inocência das minhas mãos fiz isto. Ao que Elohim lhe respondeu em sonhos: Bem sei eu que na sinceridade do teu coração fizeste isto; e também eu te tenho impedido de pecar contra mim; por isso não te permiti tocá-la; agora, pois, restitui a mulher a seu marido, porque ele é profeta, e intercederá por ti, e viverás; se, porém, não lha restituíres, sabe que certamente morrerás, tu e tudo o que é teu. Levantou-se Avimelekh de manhã cedo e, chamando a todos os seus servos, falou-lhes aos ouvidos todas estas palavras; e os homens temeram muito. Então chamou Avimelekh a Avraham e lhe perguntou: Que é que nos fizeste? e em que pequei contra ti, para trazeres sobre mim o sobre o meu reino tamanho pecado? Tu me fizeste o que não se deve fazer. Perguntou mais Avimelekh a Avraham: Com que intenção fizeste isto? Respondeu Avraham: Porque pensei: Certamente não há temor de Elohim neste lugar; matar-me-ão por causa da minha mulher.” (Bereshit/Gênesis 20:1-11)

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Infelizmente, Avraham (Abraão) não aprendeu a lição do que passou com faraó, e fez exatamente a mesma coisa com Avimelekh: Por medo de morrer, disse que Sara era sua irmã, e não sua esposa.

Mais uma vez, não há confiança na concretização da promessa por parte do Eterno, pois se ele morresse, como é que Sara conceberia e daria a ele um herdeiro?

No entanto, é justamente essa sequência de eventos que dará origem a um dos maiores problemas na vida de Avraham.

Avimelekh (Abimeleque) quase morreu, mas até então não havia tocado em Sara. Ele se defende perante o Eterno, dizendo que não sabia que ela era esposa de Avraham, e o Eterno afirma que foi por isso que o impediu de tocar nela.

É provavelmente aí, contudo, que Avraham começa a desconfiar.

"E a Sara disse: Vês que tenho dado ao teu irmão mil moedas de prata; eis que ele te seja por véu dos olhos para com todos os que contigo estão, e até para com todos os outros; e estás justificada.” (Bereshit/Gênesis 20:16)

Avimelekh está preocupado. Ele faz questão de dar a Avraham (Abraão) mil moedas de prata, porque está preocupado com o que as pessoas iriam pensar a respeito da relação dele com Sara.

Ele sabia que as pessoas insinuariam, e que o próprio Avraham poderia desconfiar, que Avimelekh teria tido relações com Sara.

Logo em seguida, a esse evento, o que acontece?

"ADONAY visitou Sará, como ele tinha dito, e cumpriu em seu favor o que havia prometido. Sará concebeu e, apesar de sua velhice, deu à luz um filho a Avraham, no tempo fixado por Elohim.” (Bereshit/Gênesis 21:1-2)

Perceba agora o leitor o problema: Imediatamente depois desse incidente - causado pela própria insegurança de Avraham (Abraão) - Sara concebe um filho.

Observe a sequência dos eventos:

Sara esteve com Avraham durante anos, e não conseguia engravidar. Sara passa pelo menos uma noite na casa de Avimelekh que, atribulado e temeroso, faz questão de restituir a Sara e dar uma indenização generosa a Avraham. Em seguida, Sara concebe um filho.

Junte essa sequência inusitada com o próprio contexto da insegurança de Avraham quanto a ter um herdeiro dado pelo Eterno. O que se passaria na cabeça de Avraham acerca desse filho?

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IX - O Deboche de Yishma`el A história diz ainda:

"E concebeu Sará, e deu a Avraham um filho na sua velhice, ao tempo determinado, que Elohim lhe tinha falado. E Abraão pôs no filho que lhe nascera, que Sará lhe dera, o nome de Yis’haq. E Avraham circuncidou o seu filho Yis’haq, quando era da idade de oito dias, como Elohim lhe tinha ordenado. E era Avraham da idade de cem anos, quando lhe nasceu Yis’haq seu filho.” (Bereshit/Gênesis 21:2-5)

A narrativa é pouco usual. Em apenas quatro versículos, a Torá destaca quatro vezes que Yis’haq (Isaque) é filho de Avraham.

Deve-se lembrar, neste ponto, que a repetição é um artifício de linguagem semita que é usado para enfatizar uma ideia.

Especialmente quanto se lê o restante da história:

"E cresceu o menino, e foi desmamado; então Abraão fez um grande banquete no dia em que Isaque foi desmamado. Sara viu que o filho nascido a Avraham de Hagar, a egípcia, escarnecia de seu filho Yis'haq, e disse a Avraham: 'Expulsa esta serva com o seu filho, porque o filho desta serva não será herdeiro com meu filho Yis'haq.’ Isso desagradou muitíssimo a Avraham, por causa de seu filho Yishma`el. Mas Elohim disse-lhe: 'Não te preocupes com o menino e com a tua serva. Faze tudo o que Sará te pedir, pois é de Yis'haq que nascerá a posteridade que terá o teu nome. Mas do filho da escrava também farei um grande povo, por ser de tua raça.” (Bereshit/Gênesis 21:8-13)

Yishma`el (Ismael) escarnecia de Yis’haq (Isaque). E certamente foi algo com alguma gravidade, considerando a reação de Sara. É importante lembrar que Yishma`el não era mais uma criança. Supondo que Yis’haq tinha pelo menos uns 2 anos quando foi desmamado, Yishma`el já teria pelo menos uns 16.

O que poderia ter dito Yishma`el para fazer Sara se irar tanto? Teria ele feito insinuações sobre se Yis’haq era mesmo filho de Avraham? Embora a Torá não dê detalhes, o autor deste material considera essa uma possibilidade bastante plausível.

Na sequência, Avraham (Abraão) precisa ouvir uma oitava vez que a sua descendência seria reconhecida em Yis’haq. Pelo texto, ele ainda se mostrava confiante de que isso ocorreria por intermédio de Yishma`el.

Ou seja, ao que tudo indica, Avraham ainda não conseguia acreditar na promessa do Eterno. Mas, como isso se justifica pelo texto, uma vez que Yis’haq já era nascido.

A não ser, como visto anteriormente, se Avraham realmente tivesse dúvidas sobre se o filho era mesmo seu.

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X - O Receio de Avimelekh

A história se torna mais intrigante ainda quando se observa que Avimelekh (Abimeleque) retorna a Avraham (Abraão), aparentemente sem motivo, e logo em seguida é dito:

"E aconteceu naquele mesmo tempo que Avimelekh, com Fikhol, príncipe do seu exército, falou com Avraham, dizendo: Elohim é contigo em tudo o que fazes; Agora, pois, jura-me aqui por Elohim, que não mentirás a mim, nem a meu filho, nem a meu neto; segundo a beneficência que te fiz, me farás a mim, e à terra onde peregrinaste.”

(Bereshit/Gênesis 21:22-23)

O autor deste material entende que a cronologia dos eventos não é por acaso. Lembre-se o leitor que a disputa ocorreu no meio do banquete dado por Avraham (Abraão) em honra a Yis’haq.

Nessa época, Avraham habitava em meio às terras sobre as quais reinava Avimelekh (Abimeleque), conforme fica evidente pelos versos (20:1,15).

Ou seja, certamente que se houve um banquete, Avimelekh teria sido convidado. E provavelmente teria presenciado o deboche de Yishma`el (Ismael) e a ira de Sara, culminando na expulsão de Hagar e seu filho.

Por que, imediatamente depois, Avimelekh procura Avraham (Abraão) para selar um acordo de paz?

O autor deste material não acredita que isso seja coincidência. É possível que Avimelekh ainda temia que Avraham realmente pensasse que Yis’haq pudesse não ser seu filho, fato que pode ter sido insinuado pelo adolescente Yishma`el na frente de todos os convidados de Avraham!

XI - Admitindo o Problema

Poucos sabem, mas os próprios exegetas judeus da antiguidade admitiam o problema gerado pelos atos de Avraham (Abraão), e o desconforto gerado pela identidade da paternidade de Yis’haq.

No Midrash Rabá, é dito:

“Avraham gerou Yis’haq: Pois as pessoas teriam dito que Yis’haq era filho de Avimelekh, e assim o Sagrado, bendito seja Ele, fez a face de Yis’haq semelhante à de Avraham para que fosse conhecido que Yis’haq era filho de Avraham, e não filho de Avimelekh. Por isso diz: ‘Avraham gerou Yis’haq’, e todos que viam Yis’haq diziam que ele certamente era filho de Avraham, uma vez que Avraham gerou Yis’haq.” (Bereshit Rabá 25:19)

Deve-se, neste ponto, lembrar o leitor de que o Midrash é uma coletânea de histórias alegóricas e folclóricas, utilizadas nos sermões da antiguidade, e que não deve ser tomado literalmente, ou como fonte histórica.

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Mas, esse Midrash em particular só existe justamente porque o autor percebeu o desconforto. Pela narrativa, era muito fácil que Yis’haq (Isaque) fosse tido pelas pessoas como sendo filho de Avimelekh.

XII - A Confirmação da Torá

No entanto, é na Torá que encontramos a confirmação de que realmente isso passou pela cabeça do inseguro Avraham (Abraão), pois mesmo após a oitava vez que o Eterno confirmou sua promessa, logo no início da história do sacrifício de Yis’haq, encontramos:

"E disse: Toma agora o teu filho, o teu único filho, Yis’haq, a quem amas, e vai-te à terra de Moriyah, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi.” (Bereshit/Gênesis 22:2)

Observe como o Eterno menciona Yis’haq (Isaque) não uma, mas três vezes. Uma por nome, e mais duas enfatizando que ele é filho de Avraham (Abraão).

Não é por acaso que o Eterno o chama de “único filho”. O objetivo não era ignorar Yishma`el (Ismael), que também é abençoado, mas sim enfatizar que Yis’haq (Isaque) é o único que havia sido prometido pelo Eterno.

Ao longo de toda a narrativa do capítulo 22, encontramos essa ênfase na identidade de Yis’haq (Isaque), que passa desabercebida se não houver grande atenção na linguagem:

"…e tomou consigo dois de seus moços e Yis’haq seu filho” (22:3)

"E tomou Avraham a lenha do holocausto, e pô-la sobre Yis’haq seu filho…” (22:6)

"Então falou Yis’haq a Avraham seu pai, e disse: Meu pai! E ele disse: Eis-me aqui, meu filho…” (22:7)

"E disse Avraham: Elohim proverá para si o cordeiro para o holocausto, meu filho…” (22:8)

"e amarrou a Yis’haq seu filho” (22:9)

"…não me negaste o teu filho, o teu único filho…” (22:12) “…em lugar de seu filho.” (22:13)

"…não me negaste o teu filho, o teu único filho…” (Gn. 22:16)

Há nada menos do que 12 referências ao fato de Yis’haq (Isaque) ser filho de Avraham tão somente nesse capítulo! Considerando que o capítulo tem 24 versículos, há uma média uma referência a cada dois versículos.

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Nenhum outro relato em todo o Tanakh possui esse tipo de linguagem, ou essa quantidade de repetições, ou ênfases. O que indica que realmente há uma mensagem que a Torá deseja comunicar.

No final da história do sacrifício de Yis’haq, lê-se:

"E disse: Por mim mesmo jurei, diz ADONAY: Porquanto fizeste esta ação, e não me retiveste o teu filho, o teu único filho, que deveras te abençoarei, e grandissimamente multiplicarei a tua descendência como as estrelas dos céus, e como a areia que está na praia do mar; e a tua descendência possuirá a porta dos seus inimigos; E em tua descendência serão benditas todas as nações da terra; porquanto obedeceste à minha voz.” (Bereshit/Gênesis 22:16-18)

Essa é a nona e última vez em que o Eterno repete a Avraham (Abraão) a promessa que havia sido feita desde o começo.

Há novamente a ênfase na identidade de Yis’haq (Isaque), que é chamado de “teu filho, teu único filho”.

Essa ênfase aparece até mesmo no fim da vida de Avraham, já no capítulo 25: "E estas são as gerações de Yis’haq, filho de Avraham: Avraham gerou a Yis’haq.” (Bereshit/Gênesis 25:19)

Essa estrutura também é singular, não encontrando paralelo em nenhum outro registro do Tanakh, em dois aspectos.

O primeiro, a própria repetição da informação de que Yis’haq (Isaque) era filho de Avraham.

O segundo, começar o registro das gerações pelo pai. Em todos os demais registros, começa-se imediatamente falando dos filhos.

A grande ênfase, em toda a narrativa da Torá, no fato de Yis’haq ser filho de Avraham, não pode ser coincidência.

XIII - Uma Interpretação Alternativa

Certamente que alguém poderia interpretar que ela ocorre tão somente por Yis’haq (Isaque) ser o filho prometido a Avraham (Abraão), em contraste com Yishma`el (Ismael), apesar do último ser o primogênito.

No entanto, há dois bons motivos para duvidar dessa ideia: O primeiro é que esse não é o único caso na Torá em que a promessa, ou mesmo a primogenitura, não é transmitida ao primeiro filho. Pode-se citar ainda os casos de `Essaw (Esaú), Re'uven (Rúben), e Menashe (Manassés), onde ainda assim não há essa ênfase. Especialmente na história de `Essaw (Esaú) e Ya`aqov. Também não se encontra tal ênfase na história de Shemu`el (Samuel), apesar de também ter sido um filho prometido.

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O segundo motivo é que o embaraço da situação com Avimelekh (Abimeleque) é muito bem documentado pela Torá, ao ponto de ter chamado a atenção até mesmo dos exegetas da antiguidade.

Diferentemente de quando se supõe que a ênfase seja simplesmente por conta da promessa em si, quando se traz à tona uma figura mais humana, e menos idealizada, de Avraham, situação na qual todas as peças parecem se encaixar.

O autor deste material deixa a opção da melhor leitura a cargo do leitor, mas acredita que quando se olha o todo da narrativa da Torá, a ideia se torna bastante clara.

Independentemente da conclusão do próprio leitor, o autor deste material espera que o simples estudo do tema já tenha sido suficiente para estimulá-lo a ler a Torá cuidadosamente, buscando absorver cada detalhe. E esse tipo de exercício é, por si só, bastante precioso.

XIV - Conclusão

No artigo “o sacrifício de Yis’haq”, o autor deste material expressa algumas leituras que indicam que, na realidade, o teste do sacrifício de Yis’haq seria não verificar se Avraham estava disposto a oferecer seu filho, mas sim se Avraham confiava na promessa do Criador, e ensiná-lo a quebrar com os costumes abomináveis da região onde habitava.

Este estudo sobre as nuances do texto da Torá revela ainda mais uma faceta: A dúvida de Avraham sobre a paternidade de Yis’haq.

É indiscutível que Avraham amava Yis’haq (Isaque), assim como a Yishma`el (Ismael). Mas, a narrativa mostra uma pessoa conflitada, dividida entre acreditar ou não na promessa de um descendente por parte de Sara.

Talvez Avraham pensasse que se sacrificasse Yis’haq, ainda teria, e através dele teria descendentes. O que significaria que ainda não acreditava plenamente na promessa do Eterno - e explicaria a razão pela qual teve que ouvir a promessa uma nona vez!

É importante ressaltar, apesar disso, que certamente Avraham sofreu com a questão da dúvida da paternidade, visto que ele também sabia que a responsabilidade era dele, uma vez que partiu dele a iniciativa de dizer que Sara era sua esposa.

No primeiro artigo, observou-se que o teste de Avraham só chegou ao final quando ele obedeceu à voz do mal’akh (mensageiro) que lhe disse para não tocar no menino, e lhe declara que foi essa fidelidade dele, de não impedir a promessa do Eterno de se realizar, que fez com que ele finalmente se tornasse digno da promessa.

Talvez parte disso também passasse por reconhecer, finalmente, que Yis’haq era seu filho legítimo e que era a partir dele, e não de Yishma`el, que a sua descendência seria conhecida.

Referências

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