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Globalização e Custos de Ajustamento no Mercado de Trabalho

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Academic year: 2021

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Globalização e Custos de Ajustamento no Mercado de Trabalho

Joana Silva1

School of Economics e GEP, University of Nottingham

1. Introdução

As consequências da globalização para o mercado de trabalho são controversas. Receios de que este processo implique um aumento do desemprego e uma diminuição dos salários resultam muitas vezes na procura de mediadas proteccionistas. Ao nível da comunidade política assiste-se a um acentuar da consciência do impacto económico, social e político destes custos de ajustamento. Este não é um debate inconsequente: o Programa Norte-Americano de compensação a trabalhadores que perderam o seu emprego na sequência de um aumento das importações foi recentemente alvo de importantes reformas; um Fundo Europeu de assistência a trabalhadores face à globalização foi recentemente instituído.

Tradicionalmente, a comunidade académica responde aos receios do público em geral e da comunidade política argumentando que, no longo prazo, a liberalização das trocas comerciais gera benefícios líquidos em termos agregados. O debate sobre as consequências de longo prazo do processo de liberalização tem ocupado um lugar central na literatura do comércio internacional. Menos atenção tem sido dedicada à dinâmica que a transição envolve, isto é, às fricções de curto e médio prazo. No entanto, para que os potenciais ganhos de longo prazo sejam realizados tem que existir um processo de realocação de trabalhadores. Na realidade, este processo demora algum tempo e origina perdas salariais importantes, especialmente para trabalhadores com características associadas a maiores dificuldades de ajustamento. Acresce que a escala dos custos de ajustamento decorrentes da liberalização depende da natureza da expansão das trocas comerciais.

A presente comunicação sintetiza os resultados de um projecto de investigação que pretende avaliar ao nível microeconómico os custos de ajustamento induzidos por uma expansão do comércio internacional. Em particular, o projecto pretende responder às seguintes questões:

1 Endereço para correspondência: Office B52, School of Economics, University of Nottingham, Nottingham, NG7 2RD, Tel. +44 115846 6131. E-mail: lexjcgs@gwmail.nottingham.ac.uk

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1) Ao nível sectorial, uma expansão das trocas de forma equilibrada em cada sector

(expansão intra-industrial) causa menores custos de ajustamento do que a expansão das trocas de forma desequilibrada (expansão inter-industrial)?

2) Ao nível do trabalhador, quais são os efeitos da liberalização do comércio

internacional nos salários, na probabilidade de desemprego, nos retornos do investimento em capital humano (educação e formação profissional) e nos incentivos à mudança de profissão e/ou sector? De que modo é que este impacto é influenciado pela idade, habilidade, escolaridade e experiência profissional dos trabalhadores?

O mercado de trabalho português é uma unidade de análise particularmente interessante para o estudo destas questões por duas razões principais. Em primeiro lugar, pela importância das trocas comerciais no PIB português. Em segundo lugar, pelo tipo de choques de comércio a que o país foi sujeito ao longo dos últimos 20 anos: inicialmente, aquando do processo de integração europeia; anos mais tarde, aquando da descida das barreiras tarifárias face às importações de países com baixos salários (como a China e a Índia) e do alargamento da EU a Leste.

Acreditamos que a resposta a estas questões acrescenta informação sobre o impacto social da integração comercial. Tal, por sua vez, poderá ser útil para a definição e implementação de políticas de redistribuição de rendimento, formação profissional e promoção activa de emprego num contexto de crescente integração económica internacional.

2. Expansão intra-industrial do comércio e mudança entre sectores e

profissões

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Uma dimensão importante da discussão dos efeitos da globalização no mercado de trabalho é a da relação entre a natureza da expansão das trocas comerciais internacionais e os custos de ajustamento por si induzidos. Neste particular, a hipótese inicialmente avançada por Balassa (1966), e posteriormente desenvolvida por Greenaway e Milner (1986) e Brulhart e Elliott (2002), de que a expansão intra-industrial do comércio induz

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menores custos de ajustamento que a inter-industrial – hipótese do ajustamento suave (HAS) – assume um papel central na literatura. Serviu mesmo para fundamentar o argumento de que os processos de integração entre países de igual nível de desenvolvimento, em que dominam as trocas intra-industriais, são os mais vantajosos (ver, por exemplo, Krugman 1987, Greenaway e Hine 1991).

Na sequência do índice de comércio intra-industrial-marginal proposto por Brulhart (1994), foram desenvolvidos vários estudos testes empíricos da HAS3. Porém,

embora alguma evidencia tenha sido encontrada em seu favor, os resultados empíricos não são totalmente conclusivos. Estes estudos sofrem de duas importantes limitações: (1) usam um método de estimação limitativo; (2) medem os custos de ajustamento de um modo desajustado face à natureza económica do fenómeno de reestruturação industrial decorrente da expansão das trocas comerciais. No domínio metodológico, as abordagens empíricas utilizadas não apresentam uma relação próxima com a teoria em que se baseiam. Tal reflecte-se também na forma como o ajustamento é medido. A teoria do comércio internacional sugere que para medir o ajustamento é necessário ter em consideração que uma expansão do comércio pode implicar não só uma variação na procura total do factor trabalho como também uma alteração na composição da mesma. A primeira traduz-se numa alteração do volume de emprego sectorial (efeito na dimensão do emprego sectorial). A segunda implica uma alteração na composição do emprego sectorial (por exemplo, uma diminuição da procura de operários acompanhada por um aumento da procura de engenheiros e vendedores). Estudos empíricos recentes da economia do trabalho sugerem que do efeito na composição da procura de trabalho podem decorrer custos de ajustamento significativos. Esta questão é particularmente relevante quando se admite que uma parte substancial das trocas intra-industriais é de bens verticalmente diferenciados.

Os dados do emprego sectorial português da base de dados “Quadros de Pessoal” permitiram-nos calcular os valores assumidos pelos dois tipos de efeitos. Tal criou a possibilidade de realizarmos um estudo econométrico com referência à indústria

2 Nesta secção apresentamos uma síntese do artigo Cabral e Silva (2006).

3 Brülhart e Elliot (1998), Sarris et al (1999); Tharakan e Calfat (1999), Porto e Costa (1999), Rossini e Burattoni (1999), Smeets e Reker (1999), Kol e Kuijpers (1999), Brülhart (2000), Brülhart e Elliott (2002).

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transformadora de Portugal. Foi estimado um modelo econométrico utilizando dados em painel para o período 1995-1999.

A estimação do modelo veio confirmar as nossas expectativas. Encontramos evidência clara de que a HAS se verifica, evidência que parece robusta. Para além disso, o efeito na composição do emprego sectorial é o efeito dominante de uma expansão do comércio, seja ela do tipo intra- ou inter-industrial. Medir a realocação considerando apenas efeitos na dimensão do emprego sectorial implica subestimar consideravelmente os custos de ajustamento. Em ambos os períodos, em média, mais de 30% das alterações na procura de trabalho em cada sector consistiram numa mera alteração da importância relativa de diferentes grupos profissionais sem afectar o emprego sectorial total.

2. Liberalização do Comércio, Investimento em Capital Humano e

Custos de Ajustamento no Mercado de Trabalho

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A análise dos efeitos da liberalização do comércio nos salários ocupa um lugar central na literatura do comércio internacional. De acordo com o paradigma teórico dominante (modelo de Heckscher-Ohlin-Samuelson, e em particular o teorema de Stolper Samuelson), a liberalização das trocas comerciais induz um aumento da remuneração do factor abundante e uma diminuição da remuneração do factor escasso. Em países relativamente abundantes em trabalho não qualificado, os trabalhadores não qualificados são ganhadores e os qualificados perdedores. O inverso ocorre em países abundantes em trabalho qualificado. Porém, este modelo não considera a existência de heterogeneidade entre trabalhadores com o mesmo nível de qualificação. Recentemente Falvey, Greenaway e Silva (2006) desenvolveram um modelo teórico explorando um novo mecanismo: a relação entre a liberalização do comércio, a educação de adultos e a idade dos trabalhadores. Este modelo trata o processo de ajustamento (transição entre sectores e/ou profissões) como uma cadeia de decisões de investimento, considerando explicitamente o papel que a educação pode desempenhar no sentido de facilitar o ajustamento face a uma liberalizarão do comércio. O modelo prevê que os trabalhadores mais velhos difiram dos mais jovens, quer na proporção de trabalhadores negativamente

4 Nesta secção apresentamos uma síntese do trabalho em curso baseado no artigo teórico Falvey, Greenaway e Silva (2006).

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afectados, quer na severidade das perdas. Os seus resultados sugerem que a assistência à globalização se deve centrar nos trabalhadores mais velhos e menos qualificados nos países relativamente abundantes em trabalho qualificado e nos trabalhadores mais jovens e mais qualificados nos países abundantes em trabalho não qualificado.

Com base neste enquadramento teórico, pretendemos avaliar os custos de ajustamento induzidos pelo processo de liberalização do comércio em Portugal, ao longo do período 1985-presente. O estudo em curso recorre a métodos econométricos para estimar de que modo trabalhadores de diferentes idades, habilidades e experiência profissional são afectados pela liberalização das trocas. Analisamos o seu impacto ao nível do salário, probabilidade de desemprego e retorno face ao investimento em capital humano (educação e formação profissional).

3. Implicações de Politica Económica

É necessário avaliar os custos de ajustamento decorrentes de uma expansão das trocas comerciais de forma a dar-lhes resposta através da adopção de políticas e instrumentos financeiros adequados. Conhecer (ou prever) a estrutura da alteração do padrão de comércio é importante para compreender o ajustamento induzido. Este será de maior escala se a expansão das trocas for do tipo inter-industrial. A reestruturação em cada sector ocorre via alterações no emprego total mas também alterações na composição ocupacional da forca de trabalho. O ajustamento decorrerá do efeito conjunto de movimentos de trabalhadores entre sectores e profissões. Ambos acarretam perdas salariais difíceis de recuperar e que dependem de características individuais dos trabalhadores. Estas incluem características difíceis de quantificar, como o nível de habilidade do trabalhador, mas também de características mensuráveis como a idade e o nível de escolaridade. Para trabalhadores mais velhos, o período de retorno ao investimento em capital humano (educação ou formação profissional) é mais curto, o que constitui um importante desincentivo à reconversão profissional. Considerar este aspecto poderia melhorar a definição e implementação de políticas de redistribuição do rendimento e formação profissional.

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Referências

Balassa, B. (1966), “Tariff Reduction and Trade in Manufactures Among Industrial Countries”, American Economic Review, vol. 30, 27-42.

Brülhart, M. (1994), “Marginal Intra-Industry Trade: Measurement and Relevance for the Pattern of Industrial Adjustment”, Weltwirtschaftliches Archiv, vol. 130, 600-613. Brülhart, M. (2000), “Dynamics of Intra-Industry Trade and Labour-Market

Adjustments”, Review of International Economics, vol. 8(3), 420-435.

Brülhart, M. and Elliott, R. (1998), “Adjustments to the European Single Market: Inferences from Intra-industry Trade Patterns”, Journal of Economic Studies, vol. 25 (3), 225-247.

Brülhart, M. and Elliott, R. (2002), “Labour-Market Effects of Intra-Industry Trade: Evidence for the United Kingdom”, Weltwirtschaftliches Archiv, vol. 138, 207-228. Cabral, Manuel e Silva, Joana (2006), “Intra-Industry Trade Expansion and Employment Reallocation Between Sectors and Occupations”, Review of World Economics/Weltwirtschaftliches Archiv (forthcoming).

Falvey, Rod, Greenaway, David e Silva, Joana (2006), ‘Trade, Human Capital and Labour Market Adjustment’ (with and David), GEP Working Paper 06/03, 2006. Greenaway, D. and Hine, R. (1991), “Intra-Industry Specialization, Trade Expansion and

Adjustment” in the European Economic Space”, Journal of Common Market Studies, vol. 24, 603-622.

Greenaway, D. and Milner, C. (1986), “Adjustment to Trade Expansion” in David Greenaway and Chris Milner: The Economics of Intra-Industry Trade, Basil Blackwell, Oxford.

Kol, J. and Kuijpers, B. (1999), “The Netherlands” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.): Intra-industry Trade and Adjustment: The European Experience, Macmillan, London.

Krugman, P. (1987), “Economic Integration in Europe: Some Conceptual Issues”, reprinted in A. Jacquemin and A. Sapir (eds.): The European Internal Market, Oxford University Press, Oxford.

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Porto, M. and Costa, F. (1999), “Portugal” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.):

Intra-industry Trade and Adjustment: The European Experience, Macmillan, London.

Rossini, G. and Burattoni, M. (1999), “Italy” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.):

Intra-industry Trade and Adjustment: The European Experience, Macmillan, London.

Sarris, A., Papadimitriou, P. and Mavrogiannis, A. (1999), “Greece” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.): Intra-industry Trade and Adjustment: The European

Experience, Macmillan, London.

Smeets, H. and Reket, H. (1999), “Germany” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.):

Intra-industry Trade and Adjustment: The European Experience, Macmillan, London.

Tharakan, P. K. and Calfat, M. (1999), “Belgium” in Marius Brülhart and Robert Hine (eds.): Intra-industry Trade and Adjustment: The European Experience, Macmillan, London.

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