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Academic year: 2021

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SER UM BOM PAI

Maria do Rosário Costa Pinto Ferreira Mendes

Nº. 12206

Tese submetida como requisito parcial para a obtenção do grau de

Mestre em Psicologia Aplicada Especialidade em Psicologia Clínica

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SER UM BOM PAI

Maria do Rosário Costa Pinto Ferreira Mendes

Nº. 12206

Dissertação orientada por Eduardo Sá

Tese submetida como requisito parcial para a obtenção do grau de

Mestre em Psicologia Aplicada Especialidade em Psicologia Clínica

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Dissertação de Mestrado realizada sob a orientação de Eduardo Sá, apresentada no Instituto Superior de

Psicologia Aplicada para obtenção do grau de Mestre na especialidade de Psicologia Clínica conforme o despacho da DGES, nº 19673/2006 publicado em Diário da

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Esta Tese não representa apenas o resultado de extensas horas de estudo, reflexão e trabalho durante as diversas etapas que a constituem. É igualmente o culminar de um objectivo académico, e que não seria possível sem a ajuda de um número considerável de pessoas.

Ao meu orientador, Prof. Eduardo Sá, pelos conselhos, sugestões, e paciência com as ansiedades e dúvidas sempre constantes.

À Irmã Mª das Dores, ao Conselho Directivo do Colégio do Sagrado Coração de Maria de Lisboa, e aos professores e alunos das turmas por que passei pela pronta disponibilidade em ceder o seu tempo e espaço para a realização deste estudo.

Ao Prof. João Maroco e ao Prof. Pedro Martins pela preciosa ajuda no tratamento estatístico dos dados.

Aos meus amigos e aos meus colegas de mestrado, pela ajuda em todas as pequenas coisas, e no imprescindível apoio e incentivo ao longo de todo o trabalho.

Aos meus pais e irmãos, pela incansável insistência, imprescindível apoio, todas as correcções, muita paciência, e contínua disponibilidade.

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Hoje em dia existem variados programas que ensinam as competências e funções parentais. Essas competências, após adquiridas, são utilizadas na relação entre pais e filhos. Mas, e estes filhos? O que pensam eles dos pais? O que é para os filhos ter um bom pai? Quais as funções que eles reconhecem como mais importantes nas figuras parentais? O presente estudo exploratório tem como objectivo responder a estas perguntas, dando voz às crianças. Aplicou-se um questionário aberto a 103 crianças entre os 7 e os 9 anos de idade. Após ter sido efectuada uma análise de conteúdo, obtiveram-se 7 funções principais que as crianças reconhecem num bom pai/mãe. Foram comparadas estatisticamente as respostas dadas às categorias conforme o sexo, idade, e a co-habitação das crianças (filhos de pais juntos vs pais separados). Analisou-se ainda a distinção entre boas características de um pai e boas características de uma mãe.

Palavras-Chave: Parentalidade, Percepção Infantil, Análise de Conteúdo, Estudo Exploratório.

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Today there are many programs that teach parenting skills and functions. After acquired, these skills are used in the relationship between parents and children. But what about these children? What do they think of their parents? What do children think is a good father? What are the functions that they recognize as most important in their parents? This exploratory study aims to answer these questions, giving voice to the children. An open questionnaire was applied to 103 children between 7 and 9 years old. Having made an analysis of content, 7 main functions were found that are recognized by children as good father / mother. The answers were statistically compared in the categories as concerns: sex, age, and co-housing of children (children of parents that are together vs separated parents). It was also analyzed the distinction between good father characteristics and good mother characteristics.

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Índice

I. Introdução 1. Olhar a Criança……….….1 1.1.A Criança na Latência………..…..3 1.2.O Olhar Da Criança………6 2. Os Pais e a Família………8 2.1. A Mãe e o Pai………...11 2.2. Boa e Má Parentalidade………13 II. Metodologia 1. Definição do Objectivo de Estudo………...17

2. Delineamento do Estudo………..18

3. Constituição e Caracterização da Amostra……….18

4. Instrumento………..20

5. Procedimento………...20

6. Organização dos Dados Recolhidos………21

III. Análise dos Resultados………25

IV. Discussão……….31

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Lista de Tabelas

Tabela 1 – Dados relativos à frequência e intensidade com que foram referidas as categorias de resposta………..24

Tabela 2 – Diferenças significativas entre sexos nas diferentes categorias………25

Tabela 3 – Diferenças significativas entre idades nas diferentes categorias…………..26

Tabela 4 – Diferenças significativas entre crianças que vivem com pais separados, ou com ambos os pais………...27

Tabela 5 - Dados relativos à frequência com que foram referidas as diferentes tarefas de pai e de mãe, para os 22,3% de sujeitos que diferenciaram os papéis de pai e mãe……28

Tabela 6 – Dados relativos à diferença estatística entre funções de pai e mãe para os 23 sujeitos em cada uma das categorias………...29

Lista de Figuras

Gráfico 1 – Género dos participantes………..19

Gráfico 2 – Idade dos participantes.………19

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Lista de Anexos

Anexo A – Questionário utilizado para a recolha da amostra………39

Anexo B – Outputs………..40 Output 1 - Estatística de teste Mann-Whitney U relativos às respostas dadas às categorias diferenciando o género.

Output 2 - Dados descritivos relativos à frequência de respostas dadas às categorias diferenciando o género.

Output 3 - Estatística de teste Mann-Whitney U relativo às respostas dadas às categorias diferenciando o Grupo 1 e o Grupo 2.

Output 4 – Dados descritivos relativos à frequência de respostas dadas às categorias diferenciando o Grupo 1 e o Grupo 2.

Output 5 - Estatística de teste Mann-Whitney U relativo às respostas dadas às categorias diferenciando os sujeitos que vivem com pais juntos vs sujeitos que vivem com pais separados.

Output 6 - Dados descritivos relativos à frequência de respostas dadas às categorias diferenciando os sujeitos que vivem com pais juntos vs sujeitos que vivem com pais separados.

Output 7 - Dados relativos à frequência com que foram referidas as diferentes tarefas de pai e de mãe, para os 22,3% de sujeitos que diferenciaram os papéis de pai e mãe.

Output 8 - Dados relativos à estatística de teste do Qui-Quadrado para verificar se há diferenças na referência às categorias para o Pai e para a Mãe.

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Introdução

A família, apesar de todas as transformações a que tem sido sujeita (estrutura familiar e desempenho de papéis parentais), continua a ser, por excelência, a estrutura através da qual ensinamos e transmitimos as nossas crenças e valores (Mendes, 2005). Torna-se, assim, cada vez mais importante o desenvolvimento de estratégias que permitam aos pais e educadores “ajustarem” ou desenvolverem alguns dos seus comportamentos/aptidões e atitudes logo nas primeiras etapas de desenvolvimento do ciclo vital da família.

A melhor compreensão do processo de desenvolvimento humano na sua globalidade, mostra-nos que, o processo de socialização da criança, é um dos primeiros e principais factores preditivos do comportamento infantil, reforçando assim o interesse em intervir cada vez mais cedo na família (Maccoby, 1992; Kumpfer, 2008).

1. Olhar a Criança

“What a person thinks about a relationship, may be more important than the interaction that actually occurs”

R. Hinde

Ao longo do desenvolvimento da criança, os pais vão tendo um papel fundamental. Desde o nascimento que os pais iniciam modalidades relacionais com os filhos, que lhes vão proporcionar um equilíbrio emocional e um crescimento equilibrado. Os pais assumem função de prestadores de cuidados primários ao seu bebé. Mas não o fazem apenas para conseguirem garantir a sua sobrevivência, como também para os integrar familiar e socialmente no mundo (Maccoby, citado por Sorbring, Rodholm-Funnemark, & Palmerus, 2003).

Como sugere Brazelton (1991), após o nascimento do bebé os pais tem funções altamente reguladoras e integradoras, passando por diferentes fases após o nascimento. Fases essas designadas por controlo homeostático, aumento da atenção e interacção, teste de limites, e surgir da autonomia. Estas fases da relação vão permitir que o bebé ganhe um ritmo vital essencial, vão permitir a entrada da criança no seio familiar, ajudando o bebé a tornar-se autónomo e tornando a relação gratificante para os pais e o bebé. É essencial reter que nestas relações precoces é fundamental para a criança a previsibilidade e estabilidades oferecidas

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pelo ambiente (sincronia, simetria, contingência e assimilação), mas também a capacidade de autonomia e independência, iniciando uma vinculação segura e independente mas estável oferecidas pelo jogo e autonomia. Os pais são, então, pessoas essenciais no bom desenvolvimento da criança, ainda que esta não tenha noção disso. Tal como refere Lebovici (1962), a vida psíquica do bebé começa quando ele se percepciona como diferente da mãe. Contudo, apesar de se afastar dela, e começar a desenvolver a diferenciação de objecto, a mãe continua a ser um elemento essencial para responder às suas necessidades.

Com o passar dos anos, as crianças vão tendo diferentes necessidades, e os pais, diferentes papéis. Esta criança vai crescendo no seio familiar, e apreendendo uma imagem parental que vai sofrendo modificações ao longo da vida (Magen, 1994). Estas modificações estão relacionadas com a fase do desenvolvimento da criança e as suas necessidades nesta fase (Winnicott, citado por Leal & Algarvio, 2004). Segundo Selman, citado por Magen (1994), as crianças mais pequenas, ao início, olham para os seus pais como prestadores de necessidades imediatas. Mais tarde começam a raciocinar os seus pais como prestadores de cuidados e ajudantes, mas com diferentes intenções para com a criança. Percebem então a natureza das relações interpessoais.

O tipo de relação que se estabelecerá entre pais e filhos vai ter influências em várias características da personalidade da criança, tais como: auto-confiança, auto-estima, autocontrolo, criatividade e adaptação social (Minzi, 2002). Mas, segundo uma perspectiva cognitivista, há estudos de Ausubel, Balthazar, Rosenthal, Blackman, Schpoont & Welkowitz, e Serot & Teevan, citados por Minzi, 2002, que referem que o aspecto que mais afecta o desenvolvimento da personalidade nas crianças é a forma como a relação com os pais é percebida pela criança.

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1.1.A criança na latência

O período da latência, que decorre entre os 5 e os 10 anos, é “definido como aquele intervalo, pausa ou período de acalmia que vai do declínio do Complexo de Édipo ao despertar da puberdade” (Malpique, 1986). Este adormecimento da sexualidade na criança vai permitir uma maior diferenciação na formação da personalidade, promovendo um reforço do eu, pelo investimento narcísico das suas funções. Como refere Ferreira (1993), “latência significa esforço de consolidação do Eu infantil – a luta pela maturidade, pela coerência e coesão do mundo interior”. É a procura da razão.

Esta maturação a nível psicológico é acompanhada por uma maior disponibilidade para as relações sociais, dentro e fora da família. Nesta idade já existe o sentimento de pertença a um grupo etário, “pelo sentimento de ser igual a outras crianças com características próprias e valores diferentes do grupo familiar.” (Ferreira, 1993).

O desenvolvimento social da criança é suportado por um desenvolvimento da sua cognição social. Segundo Heyman e Gelmann, citados por Shaffer (2005), “ser socialmente apropriado requer interacções com outras pessoas, e tais interacções são mais propensas a ser harmoniosas quando sabemos o que os nossos parceiros sociais estão pensando ou sentindo e conseguimos prever como poderão se comportar”. Esta cognição social tem por base a metacognição, que se designa como sendo a capacidade de pensar sobre o próprio pensamento (Couceiro Figueira, 2003; Cole, Cole & Lightfoot, 2005), e a teoria da mente da crença-desejo que é essencial para “a compreensão e apreciação do de crenças, motivações e intenções que estão na base do comportamento humano” (Shaffer, 2005) que se vão desenvolvendo com a criança. Este conhecimento que possuem sobre as pessoas, as suas capacidades, descrição das suas características e inferências realizadas sobre os seus sentimentos, pensamentos e acções, vai-se tornando mais apurado com a idade (Bartsch & London, e Flavell & Miller, citados por Shaffer, 2005).

Segundo Schaffer (1996), “não existem dúvidas de que os níveis de desenvolvimento cognitivo influenciam a compreensão que as crianças têm dos indivíduos”, corroborando a ideia de que a cognição social vai sofrendo evoluções à medida que a criança vai crescendo. Por cognição social entende-se não só as relações inter-sujeitos, como certas rotinas e regras sociais.

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Até aos 6 anos, as crianças são capazes de distinguir características pessoais dos seus colegas ou familiares, e compreendem certas atitudes por parte das pessoas, baseado no que conhecem das suas características, compreendem, por exemplo que alguém que fosse tímido prefere brincar sozinho, a ter muita gente à sua volta com quem brincar, que o deixaria desconfortável (Heyman & Gelman,citados por Shaffer, 2005). Mas ao descrever estas actividades são pouco expressivas verbalmente, o que faz com que utilizem sempre os mesmos rótulos de “mau” ou “bom”, sem compreender totalmente como utilizar seus conhecimentos emergentes sobre as características pessoais.

Já na fase da latência, as crianças deixam de se apoiar nas características pessoais concretas para descrever as pessoas, e passam a elaborar descrições psicológicas. Entre os 6 e os 8 anos utilizam maioritariamente descrições comportamentais, declinando após os 9 anos de idade onde elaboram construções psicológicas (Shaffer, 2005).

Segundo, Bolsoni-Silva & Marturano; Del Prette & Del Prette; Gomide; Hübner; Ingberman & Löhr; e McDowell & Parke, citados por Cia, Pamplin, & Prette, (2006), a “aprendizagem das habilidades sociais se inicia na infância, primeiramente com a família e depois em outros contextos (escolar, comunitário); o familiar constitui a base da estimulação inicial dos padrões de relacionamento e competência social”.

Para além da habilidade social de reconhecer o outro como um ser diferente de si, as crianças também desenvolvem a capacidade de empatia, como sugere Hoffman, citado por Schaffer (1996). Empatia é definida como “a capacidade que cada indivíduo possui de reagir emotivamente aos sentimentos vividos por outro indivíduo”. Na fase da latência, as crianças já se encontrarão na última fase do esquema desenvolvimental da empatia, que é denominado por “empatia pela condição de vida do outro”. Esta fase caracteriza-se pela maneira como “as crianças apercebem-se que os sentimentos dos outros podem não dever-se apenas à situação imediata mas derivar da sua situação de vida mais permanente”.

Este desenvolvimento social é acompanhado por um desenvolvimento cognitivo-desenvolvimental. Segundo Piaget (2002), o pensamento das crianças entre os 7 e os 10 anos altera-se em muitos aspectos, em comparação com a fase anterior de pensamento pré-operacional. Agora, as crianças encontram-se no estádio do funcionamento operatório concreto. Atingiram o conceito de conservação que faz com que as propriedades de um objecto permaneçam imutáveis, apesar das mudanças na sua aparência. Assim, há uma descentração das ilusões perceptivas, tendo as crianças a capacidade de pensar o objecto como

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ele na realidade é. E conseguindo fazer inferências sobre o outros e o que eles possam sentir e pensar. Antes desta fase, as crianças utilizam um pensamento mas intuitivo, como refere Bettelheim, (2003): “Quanto mais jovem é a criança mais ela se concentra com paixão sobre os seus pais e tira conclusões – nem sempre muito justas – das suas observações. Se sente que os pais agem de uma maneira que não é a sua maneira habitual (…), a criança considera-os com perplexidade e desconfiança”.

A par do desenvolvimento cognitivo, a criança, no seu contexto familiar, passa também por um desenvolvimento moral. O desenvolvimento da moral, nas crianças aparece como resultante da internalização das regras dos adultos através da punição/recompensa ou através da observação. É, portanto uma aprendizagem social. Mas, a autoridade parental, segundo Baumrind citada por Brazelton (1991), não pode ser factor único que explique a aprendizagem da moral por parte das crianças. Assim, pode tentar explicar-se o desenvolvimento moral infantil através da análise comparativa entre a influência o estilo parental dos pais, e a percepção que as crianças fazem do mundo, delas próprias e da outro. Brazelton (1991), reforça a necessidade de os pais explicarem aos seus filhos o motivo de existirem certas regras, de haver uma comunicação aberta e livre, onde se promova a igualdade de situações. Neste âmbito, denota-se que os pais de estilo permissivo têm filhos com um desenvolvimento moral mais elevado, pois eles não impõem as regras aos seus filhos, o que faz com que eles não fiquem com ideias difusas e abstractas, pensando apenas em obrigações.

Os pais devem passar aos filhos a ideia de que a sua superioridade moral é devida à sua experiência de vida, devendo os filhos respeitar a opinião dos pais, não os sentindo como rivais (Bettelheim, 2003).

Assim se pode verificar que a representação do objecto não é uma aquisição linear. Até porque, um objecto – e por objecto entenda-se qualquer pessoa tangível externa a nós – é composto por diferentes características individuais: físicas, psicológicas, emocionais, com passado histórico, ambições e aspirações próprias (Milrod, 2002; Spitz, 1978). A representação mental desse objecto não é a pessoa em si, é apenas a imagem que se tem dela, e é composta por: qualidades (mais ou menos objectivas), memórias, percepção, esperanças, desejos, fantasias, medos sobre a pessoa real. E é influenciada por factores psicológicos como

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influência emocional, afecto, admiração, inveja, ciúmes, raiva, culpa, etc. (Milrod, 2002; Spitz, 1978).

1.2.O Olhar Da Criança

Na investigação prática, vamos agora ver dois exemplos de como se expressam a crianças, relativamente à figura parental.

Dietrich (1974) entrevistou crianças entre os 10 e os 12 anos de idade, perguntando abertamente como desejaria que os adultos fossem. Na maioria todos referem que os melhores educadores são os pais, mesmo que mutas vezes os mandem fazer coisas que os desagradam. Em todas as respostas das crianças se sente “o desejo de um lar onde brilhe o amor, o calor, a confiança e a esperança de se sentir protegida”. Neste ponto, encontra-se opinião semelhante em Sá (1995), que refere que a filiação e a paternidade se desencontram “quando os pais silenciam os afectos” quando os pais são pessoas indisponíveis, criam crianças “medrosas, inseguras, indisponíveis para amar, pouco curiosas e tristes”. E também em Sandler (2003) que refere que se um pai não tiver uma relação securizante e empática com a criança, e se não se conseguir identificar com ela, vai fazer com que a criança tenha constantes experiências de ansiedade, e falta de segurança.

No entanto, as crianças criticam os pais por as punirem física e/ou verbalmente, e relativamente à falta de tempo que têm para brincar e estar com elas. Referem que os pais devem ser um modelo para os filhos, devendo ter, entre eles uma relação de entendimento. Apresentam ainda a noção de que a educação dos filhos depende da educação dos pais, citando uma das crianças que diz “A conduta das crianças depende da maneira como os pais as educam”. Esta noção já foi suprareferida numa referência a Brazelton (1991), quando referiu as características que têm que estar presentes para uma relação/interacção bem conseguida.

Num estudo exploratório, elaborado em Israel, por Magen (1994), compararam-se as percepções de crianças, adolescentes e pais sobre o que é ser um bom progenitor. O grupo das crianças era composto por participantes com idades entre os 8 e os 9 anos de idade. Uma pergunta aberta foi colocada, e depois de efectuada uma análise de conteúdo, houve oito

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categorias de resposta definidas. Dessas oito, apenas cinco foram referidas pelo grupo das crianças: expressão de sentimentos (dar abraços e beijos, dá alegria a vida, amor e carinho); educa, assume a autoridade, serve de exemplo (cumpre promessas, define limites, castiga se necessário); compreende, apoia (encoraja, percebe as necessidades da criança, posso contar-lhe tudo); compra, providencia (dá presentes, traz surpresas); passa tempo livre/lazer em conjunto (leva ao parque de diversões, brinca com os seus filhos).

Os resultados deste estudo mostraram que, independentemente da idade, as crianças esperam que os seus pais saibam estabelecer limites no seu comportamento, saibam ser um guia e seja um modelo para imitação. Segundo as suas próprias palavras, as crianças definem como bons pais aqueles que: “acompanham os filhos durante a vida”, “ensinam modos”, “impedem que as crianças se metam em sarilhos”, “zangam-se quando devem” e “comportam-se de modo a dar o exemplo aos seus filhos”, “não se dá as crianças tudo o que elas pedem”.

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2. Os Pais e a Família

“Um bom pai, uma boa mãe, são as duas condições essenciais de bem-estar físico e moral da criança” H. Hanselmann

Ser pai1 é, provavelmente, uma das tarefas mais complexas para o ser humano. Ao contrário dos outros seres vivos – o Homem – é o único que não nasce com instinto paternal. Esta tarefa tem que ser adquirida através de um processo de imitação, aprendizagem e experiência (Lessuk Namer, 1998). A parentalidade pode ser definida como o processo de transformação, activado pela ideia de ter um filho e pela interacção com esse filho, através da qual um rolo de capacidades afectivas e intelectuais é desenvolvido, promovendo o crescimento e mudanças a nível mental que vão evoluindo ao longo do tempo (Piovano, 2004).

O papel parental tem sido negligenciado, pois sempre se partiu do pressuposto que a mãe saberia o que fazer em quaisquer situações. O papel dos pais era visto como condutor do desenvolvimento, mas não como tendo um papel activo no desenvolvimento dos filhos (Heath, 2006). Contudo, é uma crença social de que os pais sabem como ser pais, e agem instintivamente como tal. É também por ser um papel social que este papel de pais implica um dever social e público. Enquanto que a conjugalidade é intima e vivida no privado, a parentalidade é um papel social, que visa educar uma criança, promovendo a sua protecção, segurança e bem-estar (Kamers, 2006). Esta crença social gera, muitas vezes, ansiedade nos pais, por não saberem se estão a agir do melhor modo para com os seus filhos. Mas tal como referem Leal & Algarvio (2004), as preocupações parentais integram-se no conceito mais abrangente de função parental.

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Neste trabalho de investigação, considera-se sempre a palavra “pai” como o papel de prestador de cuidados

indiferenciando o género, pai e mãe. O “pai” refere-se sempre ao progenitor e à parentalidade. Referências específicas à figura parental masculina ou à figura parental feminina estão bem diferenciadas no texto.

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Este papel social de pai implica: a) uma categoria de pessoas, b) uma relação social, e c) um conjunto de expectativas. As expectativas sobre o papel dos pais chegam até nós através de várias fontes (médicos, professores, sociedade em geral) e podem ser agrupadas em seis categorias. Espera-se que os pais sejam: prestadores de cuidados físicos, protectores, que criem uma ligação filial – vinculação, que sejam orientadores e professores (expliquem como funciona o mundo), que criem um bom ambiente para o desenvolvimento, e sejam um modelo espiritual (Heath, 2006).

Mas ser pai não é apenas um papel social. É uma aquisição de um estatuto pessoal incomparável, pela magnitude e impacto que este papel desempenha na vida dos sujeitos. Assim, e pela grande exigência deste papel, os pais têm que se reinventar e que se recriar na relação com os seus filhos. Nem sempre estes respondem do mesmo modo aos mesmos estímulos, e nem sempre estão de acordo com o que lhes é pedido. Estas são características que são comummente aceites como fazendo parte do papel de pais, tal como outras que têm sido estudadas ao longo dos tempos.

Como, por exemplo, a Parental Role Development Theory (PRDT), tem avaliado as seguintes características atribuídas aos pais: vinculação, disciplina, educação, protecção e bem-estar, sensibilidade e capacidade de se adaptar ao comportamento da criança (Lessuk Namer, 1998).

Este último ponto é de extrema importância, pois a parentalidade inclui influências bidireccionais entre pai e criança, em qualquer contexto. Ou seja, a parentalidade não um processo social apenas influenciado pelos métodos dos pais e outros adultos, mas é também influenciado pelas características da própria criança (Shaffer, 2005; Sorbring et al., 2003).

A parentalidade é, como se observa, um processo complexo e contínuo, influenciado por múltiplas variáveis, internas e externas. Mas a função parental, para além de ser uma função passível de ser aprendida, é considerada como uma função mental ligada ao carácter (que não pode ser separado da personalidade como um todo) e que é susceptível de ser sempre melhorada (Piovano, 2004). Hoje em dia, existem diversos modos de os pais potenciarem e desenvolverem as suas competências parentais através de:

• Escolas de Pais

• Programas para o desenvolvimento de modelos familiares e educativos

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• Programas de intervenção em situação de crise familiar

A frequência destes programas tem diversas consequências positivas para as famílias que os frequentam, mas essencialmente o facto de providenciar às crianças um ambiente mais saudável, acolhedor e protector (Kumpfer, 2008).

O contexto familiar tem ainda outro tipo de influência na vida das crianças. Segundo Papalia (2001), o meio familiar da criança apresenta duas componentes principais: a) a estrutura familiar – os pais, quer sejam os dois, ou só um, ou qualquer prestador de cuidados; e b)a atmosfera familiar – que engloba as componentes económica, social e psicológica. Da estrutura familiar ir-se-á falar mais adiante. Por agora focar-se-á a atmosfera familiar: a importância da qualidade da relação pais-filhos. Uma boa relação pais-filhos está directamente relacionada com a sua alta auto-estima e com o seu sucesso as tarefas académicas e capacidade de resiliência. As atitudes dos pais em relação às crianças reflectem-se no reflectem-seu comportamento e são percebidas pelas crianças, o que por sua vez afecta o reflectem-seu auto-conceito. Comportamentos parentais como o apoio, a participação e o interesse na vida da criança, reflectem-se de forma positiva na sua vida, tendo ainda repercussões positivas ao nível do seu auto-conceito (Warash & Markstrom, 2001).

É importante um ambiente familiar acolhedor, que organize contextos favoráveis ao desenvolvimento para a criança criar defesas em relação ao meio. Este ambiente prevê um padrão adequado de comunicação (pais que ajudam os filhos a identificarem emoções, que os aconselham com expressividade emocional positiva, e que estão dispostos à conversa com eles) entre pais e filhos (Cia et al., 2006). Um ambiente com estas características e uma relação de qualidade oferece várias competências às crianças em idade pré-escolar. Afecta áreas como: motivação, capacidade de adquirir conhecimentos. Também está documentado que crianças com elevada auto-estima têm melhores resultados escolares (Brookover, Thomas & Patterson, e Primavera, Simon & Primavera, citados por Warash & Markstrom, 2001; Papalia, 2001).

Outros autores sugerem que os pais devem fazer um uso efectivo das habilidades sociais educativas (HSE), pois são consideradas um factor de qualidade das relações. (Cia et al., 2006). Sete HSE que os pais devem promover são: transmitir ou expor conteúdos; mediar interacções; apresentar actividades; discriminar situações potencialmente educativas; estabelecer limites e disciplina; gerar reciprocidade positiva; promover a avaliação e a auto-avaliação.

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De acordo com estes dados, podemos esperar que as crianças se sintam sujeitos mais capazes, mais integrados e mais felizes se a sua atmosfera familiar for acolhedora, e contentora. E assim, sejam capazes de identificar nas suas famílias, aquilo que é bom para elas próprias.

2.1.A Mãe e o Pai

"Na medida em que cada criança tem um pai e uma mãe, presentes desde logo no seu mundo objectal, ela vai-se relacionando com ambos, de modo seguramente diferente."

A. Almeida

Da conjugalidade à parentalidade há diversas mudanças que ocorrem, nomeadamente a nível do: espaço, tempo, dinheiro, papéis, abertura ao exterior, relacionamento com as famílias de origem, expectativas/ fantasias, medos, trabalho, marido e mulher para pai e mãe (Relvas, 1996). E tal como na sociedade, e no plano da conjugalidade, também no plano parental os pais têm um papel distinto, como está bem suportado na teoria.

É, portanto, natural que os filhos de um casal se apercebam dessas diferenças de papéis. Está documentado que aos oito anos as crianças compreendem a diferença de atitudes do pai/ mãe pelo género, mostrando ter uma opinião menos estereotipada do que crianças mais velhas (Martin citado por Sorbring et al., 2003). Desde muito cedo se observa, nas crianças, o jogo dos “ pais e das mães”, jogo com papéis bem definidos e decalcados no comportamento social de cada um dos pais (Anna Freud, citada por Spitz, 1978). Estes jogos servem de suporte às fantasias da criança sobre a vida dos pais, e permitem que os mecanismos de identificação masculina e feminina se desenvolvam (Gonçalves, 1992).

A figura materna é quase sempre interpretada como a figura mais importante e mais privilegiada, assumindo quase totalmente os cuidados do bebé, permitindo-lhe bem-estar e satisfação das suas necessidades (Almeida, 1994). Desde a gravidez, passando pelos primeiros cuidados do recém-nascido, a amamentação, a mãe é a figura dominante da primeira fase do desenvolvimento da criança. Segundo Santos (1990), a recordação que é comum da figura maternal é : “qualquer coisa de envolvimento, de calor, de conforto, de aroma, de cheiro, a

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que toda a gente chega". Permanece sempre a imagem de afecto, de calor e de segurança. A mãe funda as bases sólidas para um funcionamento psíquico equilibrado. Transmite uma segurança que gradualmente se irá transformar em auto-estima. A criança irá crescer e depois a mãe terá de reconhecer que o seu filho já não necessita tanto de si, e terá de ajudá-lo a separar-se, evitando a culpabilidade que os filhos possam sentir por se autonomizarem, favorecendo uma verdadeira estima pela figura materna. Com a entrada na escola, os pais têm que mostrar em grande parte a capacidade destes de estarem ali para ser deixados (Almeida, 1994; Gonçalves, 1992).

Na sua prática parental, a mãe assume ainda o grande papel de educadora: passa mais tempo com os filhos, interage mais, ocupa-se dos cuidados do dia-a-dia, assume responsabilidade pelos cuidados mais gerais (actividades escolares e extra-curriculares, médico, etc.). Lamb (1992), Russell & Russell (1987), e Schaffer (1996) suportam esta ideia referindo que a responsabilidade pelos cuidados e educação da criança mantêm-se no domínio quase exclusivo das mães, enquanto os pais ajudam quando podem ou quando é conveniente.

À figura paterna são normalmente atribuídas funções mais passivas de facilitador da triangulação e consolidador da identificação sexual (Almeida, 1994), ou modelos de interacção mais físicos, tais como brincadeiras rudimentares, baloiçar, correrias, lançar ao ar (Schaffer, 1996).

Segundo Winnicott (1975) o pai tem 3 funções principais: a de ser um apoio para a mãe, fazer com que ela se sinta bem com o seu corpo e espírito para que tenha forças para tomar conta do seu bebé. A segunda função é de ser um complemento na autoridade, que deve ser feito frequentemente, num reforço à lei e ordem que a mãe impõe na casa. A terceira função é de ter vivacidade para acompanhar o filho nas suas brincadeiras, e ser uma presença constante na sua vida.

Contudo, hoje em dia as divisões entre os papéis de pai e de mãe são mais esbatidas. Segundo Wagner, Predebon, Mosmann, & Verza (2005), as famílias de hoje em dia estão a passar uma fase de transição na qual ambos os pais compartilham aspectos referentes às tarefas educativas e organização do dia-a-dia da família. Defendem que os papéis de pai e de mãe variam conforme: a configuração familiar, o nível de escolaridade, e o envolvimento com o trabalho. É curioso observar que, neste estudo 60% dos entrevistados (pais e mães) se sente em situação de coparentalidade. Nesse caso, pode-se observar que o exercício da disciplina, o

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suporte afectivo, a educação básica em termos de higiene, o compromisso com a escola e o sustento económico são tarefas as quais, na maioria das vezes, o pai e a mãe assumem de forma conjunta.

2.2.Boa e Má Parentalidade

“Os pais nem sempre vão dormir à mesma hora, quando não querem comer mais (..) deixam a sopa, nem sempre acordam frescos e bem dispostos de manhã. Os pais, às vezes, mentem, às vezes excedem-se em protestos, ainda às vezes, “batem o pé” …”

E. Sá

Todos os pais desejam ser bons pais. Podem desejar sê-lo por diversos motivos: seja pela necessidade de cumprir o seu papel, pela pressão social, ou pelo prazer da relação com os seus filhos. Para o atingir, e porque as relações nem sempre são completas e perfeitas, utilizam-se certas práticas parentais que nem sempre são as mais correctas, ou mais bem aceites pelas crianças. E, como já foi supra-referido, nem todas as crianças são iguais, portanto, nem todas as medidas têm o mesmo resultado em crianças diferentes. Para além do que é esperado por parte dos pais, que já foi referido em capítulos anteriores, existe o modo como esses motes são postos em prática na relação com a criança. É sobre este tema que trata o presente capítulo, e essencialmente, como essas práticas são sentidas pela criança. Como refere Bettelheim (2003), para a criança “o sentido da realidade é baseado nos sinais que recebe dos pais acerca dela.”, ou seja, para a criança a realidade é aquela que é percebida na relação com os pais, pelas suas reacções, atitudes e comportamentos perante ela.

O modo como os pais educam os filhos vai ter uma enorme influência sobre aquilo em que eles virão a tornar-se mais tarde. Certos modos de repreensão por parte dos pais provocam infelicidade e resistência nas crianças o que preocupa os pais. Por vezes o educar os filhos torna-se para os pais um maquinismo, e o que deveria ser íntimo e pessoal fica, assim, distorcido. Isso priva as relações da criatividade e espontaneidade que deveriam ter e que as torna humanas e cheia de experiências satisfatórias. Muitas vezes apenas a nossa própria

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recordação da infância é que nos torna pacientes e tolerantes, fazendo a ponta da empatia que deve existir entre o pai adulto e os seus filhos. Ou seja, os pais identificam-se na simples observação do agir dos seus filhos, e sentem-se felizes quando reconhecem nos filhos, traços deles próprios. Apesar da empatia que se deve criar entre pais-filhos, os pais devem conservar a sua autoridade (Bettelheim, 2003).

Os filhos, sempre em relação de empatia com os pais, apercebem-se ou avaliam (às vezes subjectivamente) o investimento quantitativo e qualitativo que os pais fazem neles. A aceitação e a existência de regras que comandem e dominem a relação pais-filhos, é um factor determinante para a não existência da empatia e da criatividade na relação. As regras são gerais e baseiam-se naquilo que não é individual, levando os pais a negligenciar aquilo que é único no seu filho, e no relacionamento com ele, mecanizando aquilo que deveria ser pessoal, humano e espontâneo. A existência das regras faz com que os filhos não tenham reacção aos pais e as suas opiniões, mas que vivam para as regras que estão estabelecidas, afastando assim todo o relacionamento, proximidade e conhecimento que deveria existir entre eles (Bettelheim, 2003).

A autoridade dos pais, durante o período escolar, passa pelo controlo do comportamento, no sentido de ensinar à criança a aquisição gradual do auto-controlo e de auto-regulação. Pode então definir-se este período escolar como um período de co-regulação no qual pais e filhos partilham poder (Papalia, 2001). Os pais devem guiar-se por regras mas não viver escravizados por elas. Este poder de decisão e iniciativa sobre as várias actividades do dia-a-dia, conferem confiança e crescente auto-estima à criança que, com o auxílio dos pais, toma decisões simples, que a ajudam a usar a liberdade, e a desenvolver a consciência moral e a consciência social (Isambert, 1974).

Neste período pais e filhos estabelecem regras para a boa convivência, algumas proibições e imposições, mas também conselhos e advertências. Contudo é necessário que fique bem explícito o motivo da existência de certas regras, e que haja uma comunicação aberta e livre, onde se promova a igualdade de situações. Neste âmbito, repara-se que os pais de estilo permissivo têm filhos com um desenvolvimento moral mais elevado, pois eles não impõem as regras aos seus filhos, o que faz com que eles não fiquem com ideias difusas e abstractas, pensando apenas em obrigações (Leman, 2005).

Contudo, convém não confundir autoridade com autoritarismo. Segundo Baumrind citada por Weber, Prado, Viezzer, & Brandenburg (2004), e Cruz (2005) os pais autoritários

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estimam a obediência como uma virtude e são a favor de medidas punitivas para lidar com aspectos da criança que entram em conflito com o que eles pensam ser certo. Mas, o abuso da autoridade, enfraquece-o, como sugere Berge (1974). E as práticas punitivas físicas podem ter consequências muito graves para as crianças, pois conduzem a estados ansiosos ou depressivos, mesmo que sejam com uma frequência de um estalo, uma ou duas vezes por ano. Isto acontece com maior frequência quando as crianças provêm de famílias que dão apoio, pois passam a ver os pais como imprevisíveis, e atribuem o castigo à falta de valor próprio (Papalia, 2001).

A segurança é um exemplo dos deveres parentais. Os pais têm uma enorme influência na criança neste ponto, pois se um pai não tiver uma relação securizante e empática com a criança, e se não se conseguir identificar com ela, vai fazer com que a criança tenha constantes experiências de ansiedade, e falta de segurança (Sandler, 2003). Uma vez que qualquer situação, mesmo uma situação negativa para uma criança (por exemplo uma hospitalização) pode ser sentida pela criança como “positiva, em virtude da devoção e carinho que recebeu dos pais e que a aproximou deles”, ou ainda a noção que os pais podem transmitir aos filhos de que são capazes de ultrapassar várias situações más, vivendo juntos essas situações (Bettelheim, 2003).

Quando é perguntado aos pais o que é boa parentalidade, obtêm-se respostas com conteúdos diversos. Na Suécia, após um grupo de pais ter frequentado um programa de educação parental, foi-lhes perguntado o que seria uma boa educação parental. As respostas que foram dadas revelaram quatro categorias: conhecimento das etapas de desenvolvimento da criança, qualidade das relações familiares, contacto com experiências de outros pais, e apoio da comunidade. (Petersson, Peterson & Hakansson, 2004).

Num estudo no sudoeste asiático levado a cabo por Xiong, Eliason, Detzner, & Cleveland (2005), perguntou-se a um grupo de pais e de adolescentes, o que eles pensavam ser as boas características de um pai. Chegaram a cinco categorias de resposta: afectividade (amor e cuidados; providenciar roupa, alimentação, e educação cultural); comunicação (ser simpático, não gritar nem bater, conversar), protecção (monitorar as actividades com amigos, observar os comportamentos dos filhos, afastar os filhos de qualquer problema), envolvência (passar tempo com os filhos, ser um apoio para os filhos), empatia (ser compreensivo).

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As opiniões variam entre culturas diferentes e entre pessoas diferentes. Acima de tudo é essencial que os pais se sintam confortáveis no seu papel de pais, que tenham segurança nas suas atitudes e que não projectem nas crianças as suas próprias inseguranças e medos (Sá, 1995; Smith, 1997). Na relação pais-filhos o que dá mais prazer a todos são os momentos de descontracção e relaxe onde a “linguagem de disponibilidade descontraída se cruza com a do amor” (Balancho, 2003).

Retomando Bettelheim (2003), quando diz: “as atitudes interiores dos pais, expressas pelo seu comportamento em situações importantes ou insignificantes, são aquilo que mais afecta a criança (…) É por este motivo que os pais suficientemente bons são aqueles cujas acções e reacções, as aprovações tanto como as críticas – ambas igualmente importantes e necessárias para a educação de um filho – são temperadas por tomarem em consideração, atentamente, as percepções do seu filho”, está-se apenas a confirmar toda a reflexão deste capítulo.

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Metodologia

1. Definição do Objectivo de Estudo

“Donde extraímos as informações sobre a atitude da criança para com o adulto? Encontrámo-las em obras de psicologia ou de pedagogia? Estas unicamente nos deram o ponto de vista dos adultos. O que nós queremos saber é o que a própria criança pensa dos seus problemas, qual a sua situação em relação a nós, como desejaria que os adultos fossem. É por isso que vamos dar a palavra a criança (…). Têm muitas coisas, e coisas importantes, a dizer-nos”

Dietrich, 1974

Este trabalho de investigação, tem como objectivo avaliar a percepção das crianças relativamente a uma relação fundamental, básica, primitiva e necessária, que é a relação com os pais. Para além de as crianças conhecerem os pais com quem habitam diariamente, há ainda outra representação de um “bom pai”, que terá as suas valências positivas e negativas, mas que será o pai ideal. Assim, ambicionou-se estudar quais as características que, crianças em idade escolar, pensam ser mais importantes num bom pai, ou numa boa mãe.

Este conceito de “bom progenitor” está intrinsecamente ligado aos conceitos de representação da relação, função materna e paterna, auto e hetero-representação, e ligação a objectos internos.

Acima de tudo, tentou-se que neste estudo se pusessem de parte os manuais e livros que ensinam a ser pais, que ensinam o melhor modo de agir, e libertar as crianças de escalas estereotipadas de resposta.

Não se pretendeu analisar a vinculação ou caracterizar o tipo de parentalidade percepcionada. Apenas saber pela própria boca das crianças, qual a sua opinião sobre um pai ideal. Dar voz às crianças.

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2. Delineamento do estudo

Para a elaboração deste estudo optou-se pela escolha de um método não experimental, devido a natureza do problema. Utilizou-se um plano descritivo (estudo exploratório), transversal. Este tipo de estudo caracteriza-se pela ausência de hipóteses empíricas, devido à impossibilidade de manipular variáveis independentes. Assim, apresentam-se questões de investigação. Para o estudo da percepção infantil da parentalidade, definiu-se como metodologia o estudo exploratório, uma vez que se pretendia desenvolver e esclarecer este conceito, com vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. O facto de não haver qualquer controlo sobre esta variável, justificou a utilização deste método.

Uma das limitações deste método não experimental é o facto de não se poder generalizar os dados a toda a população, e estatisticamente são menos válidos.

Uma das vertentes positivas na utilização desta metodologia, é que permitiu o uso de um questionário aberto, dando oportunidade aos sujeitos de expressarem livremente sobre o que sentiam sobre determinado assunto, deixando então abertas novas hipóteses e explicando melhor determinados conceitos.

3. Constituição e caracterização da amostra

Como alvo deste estudo, pretendeu-se atingir uma amostra de crianças em idade escolar. Esta escolha foi assim ponderada devido à facilidade de recolha, e obtenção de um maior número de dados para análise, e tendo em conta que, nesta idade, as crianças já têm capacidade de analisar as situações pedidas, como de as verbalizar. Esta capacidade era essencial visto que teriam que responder a um questionário de pergunta aberta.

A recolha da amostra foi efectuada em quatro turmas do 2º e 3º ano de escolaridade de um Colégio particular da região de Lisboa, em Março de 2008.

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O método de recolha da amostra foi por conveniência. De acordo com os objectivos do estudo, pretendia-se abranger sujeitos entre os 7 e os 9 anos de idade. A amostra recolhida foi de 103 sujeitos: 50 do sexo masculino, e 53 do sexo feminino. Não houve nenhum critério de exclusão. A média de idades dos participantes é de 8 anos (7,65).

Dos 103 participantes do estudo, 50 são do género masculino, que corresponde a 49% da amostra. Há 53 sujeitos do sexo feminino, correspondente a 51% da amostra total.

Gráfico 1 – Género dos participantes

49% 51%

Masculino Feminino

Para efeitos da análise de dados, dividiu-se a amostra em dois grupos etários. O grupo 1 que é constituído pelos participantes de 7 anos (equivalente a 43,7% dos participantes); e o grupo 2 que é constituído pelos participantes de 8 e 9 anos (equivalente a 56,3% dos participantes). Gráfico 2 – Idade dos participantes

47% 44% 9% 7 8 9

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Para a caracterização do agregado familiar pode observar-se o gráfico 3, onde se constata que 81,9% dos sujeitos habita com ambos os pais, 12,6% habita com a mãe, 1% com o pai, e 4,9% habita com os pais e pelo menos um dos avós.

89,3% dos participantes tem, no mínimo, um irmão.

81% 1% 13% 5% Pai e Mãe Pai Mãe Pais e Avós 4. Instrumento

Para concretizar os objectivos do estudo procedeu-se à elaboração de um questionário. No questionário constam perguntas de nível socio-demográfico, tendo em conta o anonimato dos sujeitos, e uma questão aberta sobre a opinião de cada sujeito sobre o que é ser um bom progenitor (ver anexo…).

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5. Procedimento

Depois de elaborados os contactos formais com um estabelecimento de ensino privado da cidade de Lisboa, a amostra foi recolhida durante o mês de Março de 2008. Foram alvo de estudo duas turmas da segunda classe, e duas turmas da terceira classe.

A recolha da amostra decorreu durante o horário lectivo, sendo que os professores dispensaram parte do seu horário para a passagem dos questionários na sala de aula. A aplicação foi efectuada colectivamente, numa turma de cada vez.

A instrução dada foi a seguinte: “Gostava que me dessem a vossa opinião sobre o que é ser um bom pai e uma boa mãe. Podem separar as funções de cada um, ou dizer no geral. Não quero que me falem dos vossos pais, mas do que é ser um bom pai. Podem ocupar o espaço que quiserem”.

Após a recolha dos dados, estes foram analisados e trabalhados no software S.P.S.S. (Statistical Package for the Social Sciences) versão 15.0.

Foi efectuada uma análise descritiva e foram utilizados testes não paramétricos para a interpretação dos dados visto que foram analisados numa escala ordinal.

Para além da obtenção das categorias do que é um bom pai, as respostas dadas foram comparadas quanto ao sexo, idade e co-habitação dos sujeitos (pais juntos vs pais separados). Analisou-se estatisticamente a diferença entre tarefas de pai, e tarefas de mãe.

6. Organização dos Dados Recolhidos

Após a recolha da amostra, definiu-se que o método para a leitura dos questionários seria a análise de conteúdo. A escolha desta metodologia procurou salvaguardar a riqueza e complexidade deste tema, facilitando o processo de respostas espontâneas.

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A questão de investigação foi escolhida de modo a reflectir as atitudes e valores dos seus autores. Através da análise de conteúdo, uma técnica de tratamento de informação (Vala, 1999), pode-se chegar às motivações e atitudes dos sujeitos, tal como é objectivo. “A análise de conteúdo é uma técnica de pesquisa que torna replicáveis e valida inferências de dados de um contexto e envolve procedimentos especializados para processamentos de dados de forma científica” (Pinto, 2005).

A análise de conteúdo permite obtenção de informação resumida e organizada, analisando em profundidade cada expressão específica de uma pessoa, ou de um grupo.

Através da leitura de Vala (1999) definiu-se que o método para definir as categorias da análise de conteúdo seria através de “ um trabalho exploratório sobre o corpus, o que lhe permite, através de sucessivos ensaios, estabelecer um plano de categorias que revela simultaneamente da sua problemática teórica e das características concretas dos materiais em análise.”. Ou seja, o material sobre o qual incide o estudo, pode servir para “reformulação ou alargamento das hipóteses e das problemáticas a estudar”, como será o caso.

Segundo Vala (1999), cada Categoria consiste num termo-chave que remete para a significação central do conceito que se deseja apreender, e de outros indicadores que ilustram o campo semântico do conceito.

Para cada categoria foi contabilizado o número de vezes que foi referida (frequência), mas também a intensidade com que foi referida para cada sujeito.

Definição das categorias: 1) Mimos

Esta categoria remete para a afectividade dos pais para os filhos. É uma categoria na qual de englobaram as respostas das demonstrações mais físicas do afecto, ou onde constam respostas do afecto no geral.

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2) Passatempos

Quando as crianças referiam actividades com os pais de lazer, algo que fugisse à rotina diária, eram respostas contabilizadas neste grupo.

Exemplos de respostas: “Passar tempo livre”, “jogar ps2”, “ir ao parque”, “andar de bicicleta”.

3) Punição

Esta categoria remete para uma noção do pai autoritário. Um pai que pune quando certas regras são quebradas. Todas as respostas relativas a uma punição física ou verbal, fizeram parte desta categoria.

Exemplos de respostas:”ralhar quando faço asneiras”, “ralhar quando mereço”.

4) Regras

Esta categoria remete para a noção de que um bom pai é aquele que estabelece limites, impõe regras, ensina as regras de boa educação. O pai é uma representação do ideal do comportamento. Não num sentido punidor, mas como um elemento educador.

Exemplos de respostas: “Não deixar fazer tudo o que quero”, “não comprar tudo o que quero”, “não deixar comer tudo o que quero”, “ensinar a dizer obrigado, se faz favor”, “ensinar boas maneiras”, “ensinar a ser obediente”, “ser exemplo”.

5) Apoio Escolar

Sempre que foi referido o apoio numa actividade relacionada com a escola, era contabilizada para esta categoria.

Exemplos de respostas:”Explicar um trabalho”, “ajudar nos trabalhos de casa”, “ajudar nos testes”, “ensinar a ser trabalhador”.

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6) Alimentação

Para esta categoria foram contabilizadas as respostas relacionadas com o providenciamento das refeições. Respostas que reflectiam um aspecto relacional funcional relativo à alimentação.

Exemplos de respostas: “Dar comida”, “comprar comida”, “fazer o jantar”, “dar água”, “saber cozinhar”.

7) Amizade

Ao contrário da categoria da afectividade, esta não engloba demonstrações de afecto, mas características de um progenitor que se podem assemelhar às de um amigo.

Exemplos de respostas: “ser amigo”, “ser simpático”, “ajudar nos medos”, “não mentir”, “protege”, “dar qualquer coisa quando mereço”.

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Análise dos Resultados

Após a leitura e a análise dos questionários obtiveram-se as sete categorias supra referidas. A tabela 1 refere-se à frequência das categorias nos 103 questionários recolhidos.

Tabela 1 – Dados relativos à frequência e intensidade com que foram referidas as categorias de resposta. Sem Referência % Referido Referido mais que uma vez % Mimos 15 14,6% 26 62 85,4% Passatempos 60 58,3% 30 13 41,7% Punição 81 78,7% 19 3 21,3% Regras 48 46,6% 41 14 53,4% Ap. Escolar 71 68,9% 27 5 31,1% Alimentação 75 72,8% 22 6 27,2% Amizade 31 30,1% 38 34 69,9%

Através da tabela apresentada, pode observar-se que a categoria mais referida foi a dos Mimos com uma prevalência de resposta de 85,4%. A categoria da Amizade, foi a segunda mais referida, obtendo 69,9%. Em terceiro lugar encontra-se a categoria das Regras, que foi referida em 53,4% dos casos. Seguem-se as categorias: Passatempos (41,7%), Apoio Escolar (31,1%), Alimentação (27,2%), e Punição (21,3%).

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Para a análise da diferença estatística na referência às categorias entre os sujeitos do sexo masculino e os sujeitos do sexo feminino, aplicou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney U. A tabela 2 apresenta esses resultados.

Tabela 2 – Diferenças significativas entre sexos nas diferentes categorias.

U (Mann-Whit) p. Mimos 980.5 0.009** Passatempos 1214,5 0,408 Punição 1197,0 0,236 Regras 1090,0 0,08900, Apoio Escolar 1048,0 0,024* Alimentação 1172,5 0,195 Amizade 1236,5 0,535 Significa: *p ≤ o,o5 **p ≤ 0,01

Observaram-se diferenças estatísticas significativas para a categoria dos Mimo (U = 980,5; p = 0,009) e para a categoria do Apoio Escolar (U = 1048,0; p = 0,024). Em todas as outras categorias não há diferenças estatísticas significativas (output 1 em anexo).

Através da observação do output 2 (em anexo) com os dados descritivos das respostas dadas às categorias, podemos concluir que os sujeitos do sexo feminino referenciaram mais vezes a categoria dos Mimos do que os sujeitos do sexo masculino. Mas na categoria do Apoio Escolar, foram os rapazes a dar mais relevância a esta característica dos pais.

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Para a análise da diferença estatística na referência às categorias entre os sujeitos do Grupo1 (7 anos) e os sujeitos do Grupo 2 (8 e 9 anos) aplicou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney U. A tabela 3 apresenta esses resultados.

Tabela 3 – Diferenças significativas entre idades nas diferentes categorias.

U (Mann-Whit) p. Mimos 775,5 0,0001*** Passatempos 1055,5 0,06 Punição 1210,0 0,375 Regras 1029,5 0,045* Apoio Escolar 1026,0 0,022* Alimentação 1200,0 0,369 Amizade 1222,5 0,560 Significa: *p ≤ o,o5 ***p ≤ 0,001

Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas para as categorias das Regras (U = 1029,5; p = 0,045). e Apoio Escolar (U = 1026,0; p = 0,022) (ver output 3 em anexo). Através da observação do output 4 (em anexo) com os dados descritivos, podemos concluir que os sujeitos do Grupo 1 relevaram mais o papel dos pais quanto a imposição de Regras do que o Grupo 2. Na categoria do Apoio Escolar, foi o Grupo 2 que mostrou dar maior importância do que o Grupo 1.

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Para a análise da diferença estatística na referência às categorias entre os sujeitos que vivem com os pais juntos (nesta definição foram incluídos os sujeitos que viviam com os pais e os avós) ou com os pais separados aplicou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney U. A tabela 4 apresenta esses resultados.

Tabela 4 – Diferenças significativas entre crianças que vivem com pais separados, ou com ambos os pais. U (Mann-Whit) p. Mimos 581,5 0,647 Passatempos 611,5 0,900 Punição 580,0 0,561 Regras 577,0 0,628 Apoio Escolar 504,0 0,157 Alimentação 572,5 0,532 Amizade 539,0 0,391

Através da tabela apresentada pode concluir-se que não se observaram quaisquer diferenças estatisticamente significativas na referência a nenhuma das categorias para os sujeitos com pais juntos vs sujeitos com pais separados.

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Tabela 5 – Dados relativos à frequência com que foram referidas as diferentes tarefas de pai e de mãe, para os 22,3% de sujeitos que diferenciaram os papéis de pai e mãe.

Mimos Passatempos Punição Regras Ap.Escolar Alimentação Amizade

Pai 13 11 3 6 5 3 12

Mãe 17 6 2 10 6 8 14

De acordo com a presente tabela verificam-se diferenças na referência às diferentes categorias, conforme os participantes se referem ao pai ou à mãe.

Relativamente ao Pai, este foi mais referido nas categorias: Passatempos e Punição.

A Mãe foi mais referenciada em todas as outras categorias: Mimos, Regras, Apoio Escolar, Alimentação e Amizade.

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Para verificar a existência de uma diferença estatisticamente significativa para as referências das categorias entre Pai e Mãe foi utilizado o teste do Qui-Quadrado. A tabela 6 apresenta esses resultados.

Tabela 6 – Dados relativos à diferença estatística entre funções de pai e mãe para os 23 sujeitos em cada uma das categorias.

χ

p.

Resultados do teste do

χ

relativos à comparação da referência de categorias para pai e mãe

4,896 0,573

De acordo com os resultados obtidos (

χ

=

4,896; p. = 0,573), pode concluir-se que não existem diferenças estatisticamente significativas na referência às tarefas de pai e de mãe.

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Discussão

O objectivo deste trabalho era saber pela voz das crianças, o que elas consideram ser um bom pai. Quais as tarefas que deve cumprir, quais os adjectivos que o qualificam, e quais as características que o definem. Está já bem documentado na literatura os efeitos de certas práticas parentais na vida das crianças. E existem classificações de estilos parentais e da vinculação entre pais e filhos, que definem a qualidade, quantidade e actividades desenvolvidas pelos sujeitos envolvidos nessas interacções. Apesar disso, essas classificações têm sido desenvolvidas através de um método observacional. Neste estudo foi tida em conta a opinião das crianças.

Após uma exaustiva análise de conteúdo dos questionários, obtiveram-se sete diferentes categorias de resposta. Os dados recolhidos demonstram que um pai deve ter como principais características e/ou qualidades:

a) ser meigo e afectuoso (categoria dos Mimos);

b) passar tempos livres em actividades com os seus filhos (categoria dos Passatempos);

c) castigar ou punir quando os filhos não se comportam do melhor modo (categoria da Punição);

d) ser um exemplo para os filhos, ensinar regras de boa educação (categoria das Regras);

e) dar apoio nas tarefas escolares, estudar em conjunto (categoria do Apoio Escolar); f) providenciar refeições, fazer compras de mercearia, cozinhar (categoria da Alimentação);

g) ser amigo, ajudar quando têm medo, não mentir (categoria da Amizade).

Algumas destas categorias estão já bem discutidas na literatura. Como por exemplo a categoria dos Mimos. Belsky, citado por Shaffer, 2005, refere que um prestador de cuidados carinhoso e sensível “é a dimensão mais influente da parentalidade durante a infância, além de estimular o funcionamento psicológico saudável durante a época de desenvolvimento, e de construir as bases para experiências futuras”. As crianças parecem ser da mesma opinião, visto que esta categoria foi referenciada em 85,4% dos casos. Noutro estudo, previamente referenciado, de Magen (1994), o grupo de crianças entre os 8 e os 9 anos referenciou a

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categoria da expressão de sentimentos em primeiro lugar. Para estas crianças é necessário sentir o carinho dos pais em todas as situações, mesmo quando estão zangados por motivos profissionais ou com os seus filhos. Precisam de sentir o conforto que esta relação lhes proporciona, pois ainda estão bastante ligadas a esta relação primária com os pais, sendo eles uma referência muito forte para a sua estabilidade. É curioso reparar que para além de esta ter sido a categoria mais referida, esta foi também a categoria que teve maior frequência de repetições dentro do mesmo questionário.

A segunda categoria mais referida foi a categoria da Amizade (69,9%), que se considera ser um complemento à categoria dos Mimos. Nesta categoria as crianças referiram a necessidade de serem acompanhadas e apoiadas pelos pais em qualquer situação. Referiram a necessidade de não serem apenas mimados afectivamente, mas sentindo o apoio de um amigo, numa atitude de companheirismo. Protegendo de quaisquer ameaças que existam no exterior. Como refere Shaffer (2005), pais competentes são aqueles que são carinhosos e aceitam os seus filhos, transmitindo sentimentos de preocupação e cuidado.

A terceira categoria mais referida pelos participantes foi a categoria das Regras, com 53,4% de referências. As crianças referiram que é fundamental que um bom pai é aquele que ensina boas maneiras, regras de educação básicas. Que é um modelo, um exemplo para os seus filhos, e que põe certos limites na relação não cedendo a todos os desejos da criança: “não me dá tudo o que eu quero”. Ou seja, um bom pai, é aquele que não cede a certas exigências e influências infantis. Mas também é aquele que utiliza poucos comportamentos punitivos. A categoria da Punição foi a categoria menos referida, estando presente em 21,3% dos casos, e na maior parte das vezes sem referência a punições físicas. Referindo apenas certas chamadas de atenção (“ralhar quando me porto mal”). Como refere Shaffer (2005), o pai competente é aquele que combina a afectividade com um controlo parental moderado e racional.

Outras práticas parentais, consideradas positivas, incluem a monitoria positiva e o comportamento moral (Cia, 2006). O acompanhamento escolar e noutras actividades extra-curriculares, o bom ambiente no casal e o bom ambiente familiar ajudam também ao sucesso no desenvolvimento da criança. Assim, temos o relato das crianças do reconhecimento desta ideia, quando referem em 41,7% o desejo que os pais passem tempo de qualidade com os seus

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filhos (categoria dos Passatempos), e em 31,1% a necessidade de terem apoio nas actividades escolares.

Houve uma certa surpresa quanto à presença da última categoria a referir. A categoria da Alimentação não era esperada, mas no entanto teve uma presença de 27,2% na amostra recolhida. Foi referido pelos participantes que a capacidade de os pais providenciarem as refeições era importante para ser um bom pai. Este aspecto refere a parte mais funcional de uma relação. Um pai não pode apenas estar presente, brincar, moderar, ser afectivo, tem também que saber cozinhar o jantar, ou, pelo menos, comprá-lo. A referência a esta categoria faz sentido para as crianças, pois, hoje em dia é o exemplo que têm em casa. Durante a semana acabam por, provavelmente, estar com os pais perto da hora da refeição da noite, e depois na refeição de manhã. A alimentação acaba por ser uma parte importante da relação, e um motivo para juntar a família.

Nesta discussão vai ainda referir-se a ausência de uma categoria. Talvez pela idade das crianças, ou pelo seu estatuto económico, era esperado que existisse uma categoria que referisse certas exigências das crianças, como prendas ou ofertas dos pais aos filhos. Apenas em dois questionários, que correspondem a 1,9% da amostra, houve referência de crianças que dizem “oferece-me jogos”, “dá-me presentes”. No estudo de Magen (1994), existe uma categoria referente a este aspecto, que foi referenciada em terceiro lugar, pelas crianças de 8 e 9 anos. A ausência desta categoria neste estudo representa uma certa maturidade destas crianças.

Para além de se terem obtido as categorias que definem o bom pai, neste estudo fez-se ainda a comparação de alguns dados. O primeiro cruzamento de dados a ser efectuado foi a comparação entre sexos na referência às categorias. Obtiveram-se diferenças estatisticamente significativas nas categorias Mimos e Apoio Escolar. Para um α = 0,01 na categoria Mimos os participantes do sexo feminino relevaram mais esta categoria que os participantes do sexo masculino. Esta diferença pode justificar-se pois às raparigas é, normalmente, dada mais atenção neste aspecto. Para um α = 0,05 na categoria Apoio Escolar, foram os elementos do sexo masculino que diferenciaram esta categoria. Nas restantes categorias não houve diferenças estatisticamente significativas.

O segundo cruzamento efectuado foi relativo à idade dos participantes. Aqui verificaram-se diferenças nas categorias Regras e Apoio Escolar. Para a categoria das Regras

Imagem

Tabela 1 – Dados relativos à frequência e intensidade com que foram referidas as categorias  de resposta
Tabela 2 – Diferenças significativas entre sexos nas diferentes categorias.
Tabela 3 – Diferenças significativas entre idades nas diferentes categorias.
Tabela  4  –  Diferenças  significativas  entre  crianças  que  vivem  com  pais  separados,  ou  com  ambos os pais
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Referências

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