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Manifesto sobre a osmose das artes - A metamorfose do espaço, Nadir Afonso

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

A metamorfose do Espaço na obra de Nadir Afonso

Adriana Faísca

M

2020

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO INTEGRADO APRESENTADA À FACULDADE DE ARQUITECTURA DA UNIVERSIDADE DO PORTO EM

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

A metamorfose do Espaço na obra de Nadir Afonso

Adriana Faísca 2020

Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura

Apresentada à Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto Sob a orientação do Prof. Doutor Rui Américo Branco da Silva Cardoso

e co-orientação do Prof. Doutor Luís Sebastião da Costa Viegas

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Um especial agradecimento à minha Família, amigos, Carla, Filipa, Matos, Bruna e Tiago, aos meus orientadores Rui Cardoso e Luís Viegas. Com destaque, a Laura Afonso, pela dedicação em manter viva a obra do artista, Nadir Afonso.

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Dedico-te esta conquista, Mãe

pelo incentivo que me deste desde o primeiro dia

e por seres o pilar de toda a minha vida.

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

RESUMO

A presente dissertação tem como objectivo investigar a relação de du-alidade entre Pintura e Arquitectura, numa afinidade de relações que põem em paralelo as duas artes, na qual o desenho surge como ferramenta de trabalho.

Apesar da pintura estar presente ao longo da história da arquitectura, observável na obra de Alberti e Brunelleschi, com o avanço da industriali-zação e tecnologia, consequência da Revolução Industrial, a relação criativa entre as duas artes perde vigor. Deste modo, o Manifesto sobre a Osmose das Artes tenciona investigar a relação entre estas duas artes na qual o jogo céni-co, a metafísica do espaço, a forma e ritmo, a luz e sombra, a cor e a textura, comunicam poeticamente transmitindo sentimentos e sensações, indiferente-mente do seu plano, bidimensional ou tridimensional.

A obra de Nadir Afonso surge neste contexto como o objecto de es-tudo, onde o artista se destaca pelas suas multi-facetas, enquanto arquitecto, pintor, teórico e investigador, um artista que devido ao seu interesse pela geo-metria desenvolve uma arte científica. Deste modo na obra pictórica de Nadir Afonso, a forma não surge meramente como um elemento bidimensional, mas antes, arquitectural. Assim, e embora o arquitecto/pintor abandone a sua prá-tica profissional na década de 60 a sua obra continua ainda hoje a destacar-se pela composição de carácter metafísico e singular, uma vez que o arquitecto/ pintor relaciona singularmente forma e espaço.

Por fim, e após a interpretação da obra teórica e prática de Nadir Afon-so desenvolve-se um estudo pesAfon-soal no qual o autor concentra-se em entender a relação das formas existentes na matriz do desenho, que une por conseguinte as duas artes, Pintura e Arquitectura.

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

ABSTRACT

This dissertation aims to understand the relationship of duality betwe-en Painting and Architecture, in an affinity of relations that put the two arts in parallel, in which drawing emerges as a work tool.

Although painting has been present throughout the history of archi-tecture, as can be seen in the work of Alberti and Brunelleschi, with the ad-vance of industrialization and technology, a consequence of the Industrial Re-volution, the creative relationship between these two arts has lost vitality. In this way, the Arts Osmosis Manifesto intends to look into this relationship in which the scenic game, the metaphysics of space, the form and rhythm, the li-ght and shadow, the color and the texture, poetically communicate conveying feelings and sensations, regardless of their framework, two-dimensional or three-dimensional

With this in mind the work of Nadir Afonso appears as the object of study, as it presents a multi-faceted artist, as an architect, painter, theoreti-cian and researcher, an artist who due to his interest in geometry developed a scientific art. Thus, in Nadir Afonso’s pictorial work, form does not appear merely as a two-dimensional element, but rather, architectural. Although the architect / painter abandoned his professional practice in the 1960s, his work still stands out today for its metaphysical and singular composition, since it uniquely relates form and space.

Finally, and after the interpretation of Nadir Afonso’s theoretical and practical work, an individual study developed in which the author concen-trated on understanding the relationship of the existing forms in the matrix drawing, thus uniting the two arts, Painting and Architecture.

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NOTA I

Nesta dissertação optou-se pela redacção sem as alterações introduzi-das pelo acordo ortográfico de 1990.

É utilizado itálico para excertos de texto cuja língua é escrita segundo o idioma da publicação, e ainda para palavras que não são oficialmente portu-guesas. Esta opção foi igualmente utilizada na escrita de títulos de livros cuja língua pode ser (ou não) segundo o idioma da publicação.

O negrito destaca citações cuja pertinência pode levantar questões ou concluir alguma ideia enquanto que o sublinhado reforça questões pertinentes ou evidencia alguma ideia do autor.

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

ÍNDICE

Introdução

1. A Arte de pintar formas e de projectar espaços

1.1. O arquitecto enquanto Artista

1.2. A obra de arte - A Pintura Arquitectónica 1.3. O metamorfismo da arte no século XX

1.3.1. A ascendência do artista moderno 1.3.2. A obra de arte no Movimento Moderno

2. Nadir Afonso, O pintor das formas matemáticas

2.1. Primeiros trabalhos e primeira modernidade 2.2. Colaboração com Le Corbusier

2.2.1. A Geometria como essência da obra de arte

2.3. De São Paulo a Paris

2.3.1. O arte cinética - O Espacillimité 2.4. O abandono da prática da Arquitectura

2.4.1. A Pintura Arquitectónica 2.5. A Fundação Nadir Afonso, por Siza Vieira 2.6. Fernando Lanhas, O pintor do abstraccionismo

2.6.1. A obra de arte, Nadir Afonso e Lanhas

3. O metamorfismo da Forma 3.1. O Ser arquitecto/pintor Considerações Finais Fontes Bibliográficas Fontes de Imagens Apêndices Anexos 15 19 23 29 35 41 49 59 65 75 85 95 101 107 115 123 129 139 149 175 187 199 202 210 215

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

INTRODUÇÃO

O Manifesto sobre a Osmose das Artes visa entender a relação que existe entre as diferentes áreas artísticas, com particular atenção na relação de dualidade entre Pintura e Arquitectura.

Deste modo, e durante a investigação presente nesta dissertação, será possível observar-se a constante reunião das várias áreas artísticas como pin-tura, escultura e arquitecpin-tura, no entanto, e com a evolução do Homem, essa relação têm-se tornado cada vez menos evidente resultando assim na perda da sua relação plástica, e consequentemente, no questionamento da profissão do arquitecto enquanto artista, sendo que a obra de arte é filha de seu tempo e, muitas vezes, mãe dos nossos sentimentos.1

Deste modo, a presente dissertação tem como objectivo estudar o de-senho como ferramenta de trabalho, tanto na pintura como na arquitectura, de modo a evitar o seu afastamento enquanto ferramenta criativa, desenvolvida ao longo dos séculos, e por fim, na anulação da arquitectura enquanto arte. Neste sentido interessa entender o papel do arquitecto/artista e o processo artístico que origina a obra de arte.

Após este entendimento, não se visa portanto comprovar a relação de dualidade entre Pintura e Arquitectura, mas antes entender os motivos que as unificam sem perderem a sua unidade individual, numa metafísica harmonio-sa entre Forma/Espaço e Ser/Universo.

1 KANDINSKY, Wassily, (1912) Do Espiritual na Arte - E na pintura em particular, Álvaro Cabral, Antonio Danesi, Martins Fontes, São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.27

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1.

A ARTE DE PINTAR FORMAS

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2. Nascimento da Virgem, Leon Battista Alberti, 1467. 1. Desenhos da igreja de Santa Maria Nouvella, Leon Battista Alberti, 1456-70

Manifesto sobre a Osmose das Artes

1.

A Arte de pintar formas e de projectar espaços

A relação entre Pintura e Arquitectura remonta a história da civili-zação humana, contudo a presença de códigos conceptuais e morfológicos que permitem o entendimento entre as duas artes evoca o trabalho de mestres renascentistas. Neste sentido, e com base no ensino greco-romano nascem ar-tistas singulares como, Filippo Brunel leschi, Leon Battista Alberti e Leonardo Da Vinci, que se destacam pelas suas compe tências disciplinares nas áreas da arquitectura, da pintura, da escultura, da ciência, da matemática e da filosofia.

Deste modo, e para uma melhor percepção da arte na Idade Moderna é necessário entender o motivo que conduziu à evolução artística deste perío-do, na qual o desapego por motivos unicamente religiosos e o interesse numa unificação das artes originou o surgimento de temas associados à geometria, ao estudo do corpo humano e, por fim, à mitologia.

No que diz respeito à relação de dualidade entre Pintura e Arquitectu-ra, Alberti destaca-se pelo seu papel fundamental e revolucionário na teoriza-ção do pensamento humanista com os tratados Della Pintura, e, posteriormen-te, De Re Aedificatoria.2 Nas suas obras, o mestre florentino proclama regras

rígidas sobre as proporções das formas e a instauração do Homem como cen-tro do pensamento e estudo renascentista. Esta mentalidade é consequência de uma nova óptica sobre o real que se baseia na relação objeto/espaço.3

Nos seus tratados, Alberti afirma ainda que o conhecimento deve ser utilizado como uma ferramenta matemática, evolutiva, associada directamente

2 Alberti se estaba dirigiendo hacia una revolución artistica. Su impacto poderoso e

instantá-neo se siente a través de Della pinttura y se demora en la bastante posterior De re aedificatoria.

ALBERTI, Leon Battista, Tratado de Pintura, Universidad Autónoma Metropolitana, México: Azcapotzalco, 1998, p.14

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à experiência sensorial, e por isso, à prática.4 Esta visão demonstra, mais uma

vez, a posição central do Homem no Renascimento, visto que, é pelo meio da prática humana que se constrói a ciência enquanto teoria.

A utilização da geometria, no século XV, adquire aos olhos de Alberti uma dimensão de cariz investigativo, visto que tem como intenção a relação entre Homem/Espaço. Assim, pelo meio da geometria, o mestre florentino põe em paralelo duas vertentes de utilização da mesma nas quais relaciona pintura e arquitectura. Na primeira, Alberti apresenta a perspectiva central, desenvol-vida por Brunelleschi, para representar o real, e na segunda uma óptica em que os arquitectos apropriam-se da linguagem formal dos pintores para o desenho de novas medidas de proporção (cânones).

Quem pode duvidar que a pintura é a arte mais elevada? (...) O arquitecto (...) apropria-se das arquitraves do pintor, das bases, dos capitéis, das colunas, das fachadas e outras coisas parecidas. Todos os ferreiros, escultores, artesãos regem-se pelas regras de arte do pintor.5

A Obra de Alberti revela essa presença fundamental que a pintura assume no processo projectual da arquitectura, uma vez que intencionava a relação entra as duas artes, na qual o artista se responsabilizava pela criação de uma novalinguagem formal.6 Desta maneira, na obra de Alberti a

pin-tura não têm uma papel de decoração, mas antes adquire uma dimensão de

6 ALBERTI, Leon Battista, Tratado de Pintura, Universidad Autónoma Metropolitana, Méxi-co: Azcapotzalco, 1998, p.79

4 Idem, p.18

5Quién puede dudas de que la pintura es el arte más elevado (...) O arquitecto (...) toma del pintor los

ar-quitrabes, las bases, los capiteles, las columnas, las fachadas y otras cosas parecidas. Todos los herreros, los escultores, los oficios y los gremios se rigen por las reglas y el arte del pintor.Idem, p.79

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representação do real, quer seja de uma linguagem estética, quando se refere ao desenho canônico do espaço, quer representativa, quando descreve a utili-zação da perspectiva. É nesta procura pela evolução formal, fortificada com o progresso na área do desenho que a Arte de pintar formas e de projectar espaços se relacionam.

Neste contexto Alberti sublinha ainda, a importância que o objecto ad-quire quando se posiciona sobre o plano, o que permite no caso da utilização da perspectiva a visão real do objecto no espaço.7 Em contrapartida, no que

diz respeito às suas obras pictóricas, que aludem a temas do quotidiano, Al-berti subscreve que a intenção do artista não passa pela representação do real, mas antes representar um espaço, assim o artista deve descobrir com linhas e qualificar com cores qualquer esquema de desenho, de modo a ter em con-sideração a sua proporção, (...) de tal maneira que a certa distância e numa determinada posição a respeito do centro, adquirem relevo e pareçam massa.8

A Obra de Alberti resume assim a importância que o desenho tem na sua relação entre Pintura e Arquitectura, onde surge como ferramenta do processo criativo, e não como um registo gráfico do real, tal como o próprio afirma, na pintura a vitalidade não é menos agradável que a riqueza.9

7 Idem, p.23

8descobrir com líneas y matizar com colores sobre cualquier tablero o muro que se le proporcione (...) de

tal manera que a cierta distancia y en una determinada posición respecto al centro, adquieran relieve y parezcan temer masa, Idem, p.115

9en la pintura la vitalidad no es menos agradable que la riqueza,Idem, p.120

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Manifesto sobre a Osmose das Artes

3. Chute de Barcelona, Le Corbusier, 1960

1.1.

O arquitecto enquanto Artista

A Obra de Alberti realça a importância que a pintura tem na con-cepção prática da arquitectura, visto que o artista desta época personifica a unidade das artes. Neste sentido, o Manifesto sobre a Osmose das Artes procura afirmar a relação entre ambas as artes, tal como observamos na obra teórico-prática de Alberti, numa relação entre pintura e arquitectura que não corresponde à imitação morfológica de uma linguagem, mas sim à criação de um método de trabalho em comum.10 Deste modo, a relação entre a arte de

pintar formas e de projectar espaços deve promover a autonomia plástica de cada arte, e unificá-las na matriz do desenho.

Neste sentido, e uma vez que Bruno Zevi enfatiza a problemática da análise da arquitectura, esta dissertação pretende investigar o papel da arqui-tectura enquanto arte, bem como a do arquitecto enquanto artista, de modo a prevalecer a obra de arte e evitar a errada interpretação da mesma. Assim, e antes de entender o processo que dá origem à obra de arte, desde a intenção do artista à concepção da obra, é preciso clarificar os motivos que resultam na errada interpretação sob a mesma.

Em primeiro lugar, um dos motivos é a errada utilização de voca-bulário criado pelos próprios artistas para expressar condicionantes técnicas, que devido à pecularidade o público não adapta, resultando na utilização de vocabulário inadecuado, visto que o vocabulário evoluí em concordância com a própria Arte. No que diz respeito às obras arquitectónicas, tal observação acontece quando um crítico inexpriente sugere uma opinião sobre uma obra de arte, originando uma opinião errada do leitor, pela ausência de fundamentos.11 10 Idem, p.15

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Outro motivo que influência a observação ilusória sobre a obra de arte é o fac-to do vocabulário não se adaptar à individualidade a própria Arte, persistindo ao longo do tempo. Por exemplo, Alberti, arquitecto/pintor, utilizava um vo-cabulário adaptado à sua circunstência, contudo o surgimento das vanguardas que renovaram completamente a Arte, através do abstraccionismo das formas, permitiu ao artista assumir a ideia de que poderia criticar objectivamente artes distintas, analisando artes diferentes segundo valores iguais.

[Assim ressalta-se o] defeito característico da maneira de tratar a arquitectura (...) [que] consiste no fato de os edifícios serem

apreciados como se fossem esculturas e pinturas, ou seja, externa e superficialmente, como simples fenômenos plásticos. Em vez de

uma falta de método crítico, trata-se de um erro de postura filosófica. Afirmada a unidade das artes e, portanto outorgada a todos os que são entendidos numa atividade artística a autorização para compreender e julgar todas as obras de arte.12

Da arquitectura assumiu-se portanto a percepção “romântico-psico-lógica” que idealizava a compreensão da obra de arte através das sensações. Outro exemplo, que normalmente é associado a esta interpretação abstracta das artes, é a música, pelo meio das ondas sonoras, variações e pausas, na qual esta associação nada é mais do que um abstracionismo da sinfonia, que decomposta em momentos únicos é equiparada ao descobrimento arquitectó-nico espacial.13 Assim, a problemática não passa pela associação/relação das

diferentes áreas, como arquitectura, pintura, escultura e música, mas antes, na

12 Idem, p.5 13 Idem, p.6

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errada utilização do vocabulário, uma vez que não se deve analisar com o mes-mo valor de comparação artes distintas, comes-mo podemes-mos observar nos seguin-tes exemplos; 1) a Le Corbusier associa-se a prática cubista na arquitectura, através da ideia de movimento que resultou na utilização de pilotis bem como na separação entre estrutura e espaço construído, originando por fim plantas e fachadas livres. 2) a Mies van der Rohe, a concepção do construtivismo de Terragni, ou neoplasticismo de Piet Mondrian, onde o arquitecto sintetiza o espaço pelo desenho de elementos unicamente necessários. Em atenção a esta sensibilidade no diálogo plástico da arte conclui-se que, artes distintas não devem ser equiparadas, visto que não possuem o mesmo valor estético.

[Visto que] com esse método apenas continuam aplicados à arquitectura os critérios da crítica pictórica, com a única diferença de que atribuem-se agora à arquitectura contemporânea os

concei-tos válidos para a pintura contemporânea, enquanto anteriormente

atribuíam-se os da pintura tradicional à arquitectura tradicional (...) desse modo a crítica e a história da arquitectura não progridem.14

O arquitecto enquanto Artista, e por ser sensível à percepção pictóri-ca/formal que a arquitectura tem enquanto arte, deve saber fazer a separação de duas realidades distintas. Primeiro, uma arquitectura que ostenta decoração pictórica, e segundo, uma arquitectura cujo método de trabalho consiste no desenho de matrizes que unem as diferentes artes.15 Desta maneira, plantas,

cortes e alçados, apesar de terem um papel fundamental na interpretação e

14 Idem, p.7 15 Idem, p.22

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concepção da obra, e de existirem numa essência de harmonia, esses elemen-tos são de carácter construtivo, e visíveis apenas nas dimensões espaciais.

Para o arquitecto/pintor, a obra de arte encontra-se completa quando o artista encontra a sua essência, numa arte que visa tanto o desenho das formas como o dos espaços. Esta óptica foi observada na obra de Alberti, onde as duas artes se relacionam através do desenho como método de trabalho. Esta arte, que responde a cálculos matemáticos e origina composições, tem no caso da Arquitectura, como expoente máximo a procura pela harmonia do espaço, sentida especialmente pelo desenho do seu interior.

Quem quer se iniciar no estudo da arquitetura deve, antes de mais nada, compreender que uma planta pode ser abstractamente

bela no papel; quatro fachadas pode parecer bem estudadas pelo equilíbrio dos cheios e vazios, dos relevos e das reentrâncias; volu-me total do conjunto pode volu-mesmo ser proporcionado, e no entanto o edifício pode resultar arquiteturalmente pobre. O espaço interior

(...) não pode ser presentado perfeitamente em nenhuma forma, que

não pode ser conhecido e vivido a não ser pela experiência direta.16

16 ZEVI, Bruno, (1948) Saber Ver a Arquitectura, São Paulo: Martins Fontes, 5ª Edição, 2002, p.18

4. Planta do projecto Casa de Campo de Tijolo, Mies van der Rohe, 1924

5. Composição com grande avião vermelho, Piet Mon-drian, 1921

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1.2.

A obra de arte - A Pintura Arquitectónica

O desenho apresenta-se como uma ferramenta necessária ao Homem pela flexibilidade do pensamento associado à sua práctica diária. Neste senti-do, o desenho caracteriza-se pelo seu papel principal de criador, onde através desta ferramenta o Homem cria a sua própria matéria. No contexto artístico permite ao artista desenvolver a sua Arte.

A descoberta da perspectiva central, por Brunelleschi, possibilitou colocar, pela primeira vez, um corpo no espaço, e através dele idealizar a sua relação com o real.17 A utilização da perspectiva permitiu que a pintura

desen-volvesse a sua relação com a arquitectura, tanto na formalização linguística das suas secções como na projecção a três dimensões de um espaço inexisten-te. Esta linguagem de representação foi ainda alvo de vários estudos ao longo dos séculos, de maneira a que a sua expressão se torna-se no mais real possível. Assim, Masaccio, Angelico e Benzo Gozzoli a Bramante, aos seiscentistas, e continuando até ao século XIX, um sem-número de pintores alinha-se aos desenhistas e arquitectos na representação em perspectiva da arquitectura.18

No século XX, a utilização da perspectiva como ferramenta de repre-sentação, e por isso, instrumento que relacionava pintura e arquitectura (direc-tamente) perdeu o seu valor, consequência da comercialização da fotografia, que posteriormente afastou o artista da sua arte. Neste contexto, os artistas do século XX viram-se obrigados a desenvolver outra linguagem formal, na qual reconheceram a possibilidade de representarem o místico e o desconhecido.

17Encontramos a vontade de estabelecer planos de simetria e acentuações plásticas sobre o eixo central dos edifícios, onde existem geralmente vazios de rarefacção atmosférica no eixo mediano. Ele conhecia somente a perspectiva central, e isso explica sua insistência sobre o eixo mediano. Idem, p.143

18 Idem, p.21

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Esta percepção, de que a arte poderia exceder o limite da óptica real, leva-nos a dar entrada na quarta dimensão, a que Zevi apelidou de Tempo. A nova di-mensão, que parecia estar esquecida, abre num momento em que a arte esta-va a estagnar uma série de possibilidades infinitas de desenho. Deste modo, a presença do Tempo possibilitou aos artistas do século XX a reformulação das belas-artes e por fim, a criação da unidade existente entre as mesmas.

Pablo Picasso foi um dos artistas fundamentais nessa alteração for-mal/plástica e física, uma vez que reformulou o pensamento moderno pela teorização da sua obra, na qual objecto/espaço e Homem convivem. Na sua teorização Picasso afirmou o “impossível” até ao momento, onde não só que-brou com a rigidez dos corpos no espaço, como entendeu que, por meio do movimento, o objecto poderia ultrapassar as leis da realidade. Na sua obra, pictórica e escultórica, Picasso destaca a idealização da mesma segundo dife-rentes pontos de vista que iriam dar origem a difedife-rentes percepções, ressaltan-do assim movimento e tempo.19

Na arquitectura associou-se portanto ideais como movimento, (di-rectamente relacionado com obra de Picasso) espaço e lugar,20 enquanto que

na pintura e na escultura essa relação era determinada pelo próprio objecto, uma vez que o Homem não poderia habitar o espaço. A obra, “Únicas Formas de Continuidade no Espaço”, por Umberto Boccioni, Figura 7, evidencia esse limite, na qual a escultura representa o movimento da matéria, observável em vários pontos, contudo sem noção de espaço.

19 Idem, p.22

20 MONTANER, Josep Maria, A modernidade superada: arquitectura, arte e pensamento do

século XX, Barcelona: Editorial Gustavo Gil, S.A., 4ª Edição, 2001, p.31

A obra de arte - A Pintura Arquitectónica

6. Bouteilles et verres, Pablo Picasso, 1911

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A quarta dimensão adquire um valor importante no desenvolvimento da arte do século XX, onde se identifica que obra arquitectónica é qualquer matéria que contenha espaço interior (dependendo do desenho sensível do arquitecto). Deste modo, cenografia e pintura arquitectónica não devem ser consideradas como obra arquitectónica. Esta distinção é importante nesta dis-sertação para um melhor entendimento da relação entre pintura e arquitectura, já que do método plástico, que é inerente às duas áreas artísticas, pode resul-tar uma obra de arte.21 No desenvolvimento do Manifesto sobre a Osmose

das Artes, pretende-se portanto entender essa relação entre pintura e arqui-tectura que assenta sobre um sustento-científico e que origina a obra de arte.

Sem a quarta dimensão do cubismo, Le Corbusier nunca teria pensado em suspender a Villa Savoye sobre estacas (...) nem

igualar as quatro fachadas, rompendo assim a distinção entre pros-pecto principal, elevados laterais prospros-pecto posterior que estava im-plícita na representação perspectiva, em que se estabelecia um ponto de vista, em relação ao qual todos os elementos eram hierarquica-mente coordenados.22

É neste contexto que se deve interpretar a obra de Le Corbusier, um manifesto de arquitectura com ideias do período cubista. Esta sensibilidade que permite a relação entre as várias artes, relembra o método de trabalho de Alberti, que recorreu ao desenho da geometria e da perspectiva para criar novos elemen-tos arquitectónicos e por conseguinte, utilizá-los na sua obra arquitectónica.21

21 A Casa Ugalde (...) forma orgânica (...) com ressonâncias surrealistas e formas pertencentes

ao repertório de Joan Miró, Jean Arp ou Alexander Calder. Idem, p.38

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7. Únicas Formas de Conti-nuidade no Espaço, Umberto Boccioni, 1913

Na obra de Le Corbusier observa-se essa relação através dos ideias da pintura cubista, que aludiu a uma nova maneira de habitar o espaço, criando assim elementos arquitectónicos até então inexistentes.23

Outro acontecimento que marcou igualmente a revolução formal das vanguardas, do início do século XX, foi a teoria de Einstein, onde a percepção do tempo/espaço motivou a criação de outras correntes, que se distanciavam do cubismo, como os neoplasticistas, os futuristas, e os construtivistas.24 Estes

ar-tistas, ao contrário de Picasso e Le Corbusier, sustentavam a teorização da sua obra segundo a física quântica, que motivava o seu afastamento na relação en-tre a unidade das artes. Contudo o seu papel nas vanguardas do início do século XX, foi igualmente importante pela relação de uma arte associada às ciências.

Assim, pintura e arquitectura evoluem autonomamente através do de-senho, no qual a criação de matrizes de estudo se revela fundamental para a unificação das várias artes artísticas.25 Não obstante, o artista deve ter em

consideração a individualidade e unidade de cada arte, que motiva no caso do Manifesto sobre a Osmose das Artes, a concepção de uma Pintura Arquitec-tónica. Neste sentido, deu-se seguimento à investigação sobre a unidade das artes na Obra de Nadir Afonso (arquitecto/pintor) que idealizava a teorização de uma arte científica, contudo, e para um melhor entendimento do seu tra-balho, é necessário recorrer ao estudo de artistas que o antecederam e que consequentemente influenciaram a arte deste século.

23 ZEVI, Bruno, (1948) Saber Ver a Arquitectura, São Paulo: Martins Fontes, 5ª Edição, 2002, p.124 24 Idem, p.144

25 BENEVOLO, Leonardo,História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001,p.26

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1.3.

O Metamorfismo da Arte no século XX

Do Renascimento ao século XIX, a Arte é marcada por uma série de acontecimentos que condicionavam a sua formalização plástica, contudo, só com a Revolução Industrial é que a Arte volta a ter um papel directamente as-sociada ao povo, de modo a testemunhar a realidade em que a sociedade vivia, e promover uma melhor condição social.

Neste sentido, e após algumas manifestações proletárias, que tiveram início em França, e que posteriormente se estenderam até ao Reino Unido, nas quais o povo tinha como intenção definir um salário base e criar uma lei que os protegesse, é debatida na Assembleia Nacional francesa, a lei de Chapelie, em 1791. Esta lei pretendia manter a estabilidade política do país, assegurando o respeito entre os proprietários das empresas e os seus respectivos operários através da fixação de um salário mínimo, com o qual o trabalhador pode-se ter alguma segurança e qualidade de vida.26

Paralelamente a estes acontecimentos surgem outros igualmente im-portantes na história do século XIX, que consequentemente condicionaram a Arte deste período, como o avanço da medicina, que permitiu aos países subdesenvolvidos terem pela primeira vez acesso a cuidados de saúde, e o desenvolvimento da industrialização que tornou produtos economicamente inalcançáveis, acessíveis a todos os estratos sociais. Outro acontecimento que também se destacou neste período e que promoveu a qualidade de vida do povo foi a industrialização da produção agrícola, que originou um aumento do número de produtos directamente proporcional ao aumento da população.

26 BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.20

Manifesto sobre a Osmose das Artes

8. Ilustrações do interior do Palácio de Cristal, Joseph Paxton, Inglaterra, 1851

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O aumento de população é acompanhado por um desenvolvi-mento na produção jamais visto antes: a produção de ferro passa (...) de vinte mil para setecentas mil toneladas; a produção de carvão, de quatro milhões e trezentos mil, a centro e quinze milhões; a indústria algodoeira (...) quatro milhões (...) duzentos e setenta milhões de li-bras. O incremento é, ao mesmo tempo, quantitativo e qualitativo: multiplicam-se os números das indústrias, diferenciam-se os produ-tos e os processos para fábrica-los.27

Neste contexto, é necessário entender que a evolução no que diz res-peito aos vários campos não foi linear, dela fizeram parte uma série de avan-ços e recuos, que marcaram a transição entre uma realidade clássica para o mundo contemporâneo.28 Esta reforma social, que visionava um pensamento

humanista, teve início, primeiramente, no Renascimento, contudo foi no sé-culo XVIII com os iluministas que o seu pensamento se estruturou e definiu o Homem que conhecemos hoje.

O pensamento iluminista tinha como intenção o debate científico de várias áreas sobre a realidade que circunscrevia o homem. No que diz respeito ao campo das artes, os iluministas defendiam que era necessário uma reformu-lação linguística dos motivos clássicos que operavam as edificações, uma vez que cada arte estaria associada a um período histórico. É neste sentido surge a reformulação da arquitectura, pela incoerência entre os edifícios construí-dos e a sua ornamentação, visto que os elementos que caracterizavam certos

27 BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.22

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ao longo da história. Esta percepção que os iluministas idealizavam sobre a necessidade de contextualizar uma linguagem formal com o seu tempo, deu-se com a descoberta das cidades obstruídas pelo vulcão Vesúvio,Pompeia, Her-culano,29 observável na Figura 9.

Ainda no campo da arquitectura, os iluministas acreditavam que era necessário tratar com a mesma importância todos os constituintes de um edi-fício, por exemplo, a técnica de construção de uma parede deveria ser tão cui-dada quanto uma peça do caixilho.30 Desta maneira, e para proteger o trabalho

dos artesãos com a industrialização, optou-se pela permanência de técnicas tradicionais, desenvolvidas minuciosamente, mas que tivessem o mesmo de-talhe quando adaptadas à nova realidade industrial. Neste contexto, não só os materiais anteriormente desenvolvidos por carpinteiros, artesãos e construto-res, começavam a ser executados industrialmente, como ainda permitiriam a uma melhoria na sua qualidade e durabilidade.

Em paralelo, dá-se a corrente utilização do vidro nas janelas, em subs-tituição do tradicional pano, e a utilização da telha, em subssubs-tituição da cobertura em palha. O ferro torna-se for fim, num dos materiais mais dominantes no mer-cado da construção, logo a seguir à madeira que se adapta a qualquer situação. A este período de transformação formal e social no qual se inserem todos os acon-tecimentos acima descritos, dá-se o nome de Neoclassicismo, de 1760-1830.

29 Idem, p.148

30BENEVOLO, Leonardo,História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.256

O Metamorfismo da Arte no século XX

9. Fotografia de restos arque-ológicos da cidade Pompeia

(38)

38

O espírito iluminista, aplicado ao repertório da tradição re-nascentista, reconhece naquelas formas dois motivos de validade: a correspondência com os modelos da arquitetura antiga, grega e ro-mana, e a racionalidade das próprias formas, naquilo que os elemen-tos arquitetônicos tradicionais podem ser assimilados a elemenelemen-tos de construção: as colunas de sustentação vertical, o travejamento de sustentação horizontal, as cornijas no cimo dos telhados, os tímpa-nos tímpa-nos encontros entre dois platímpa-nos de cobertura, etc.31

Deste modo, saliente-se que na área da arquitectura a preocupação passava pela transformação de temas ornamentativos em elementos de cons-trução, e por isso associados à evolução do tempo, uma vez que neste período os materiais de arquitectura encontravam-se em desenvolvimento. Neste con-texto, surgem novas linguagens formais como é o caso do romantismo, que expressava uma flexibilidade plástica através da união de diferentes estilos, onde a margem de liberdade individual, (...) é reduzida a zero, e, em outro, aumentada desmesuradamente. Na aplicação concreta de cada estilo vale o critério da fidelidade histórica.32

Esta visão permitiu ao artista do século XIX o conhecimento entre Arte e Técnica, característica que se tinha iniciado no Renascimento mas que agora voltava a ser intrínseca aos arquitectos deste período. Estes aconteci-mentos que ambicionavam o desenvolvimento artístico associado à industria-lização e que, consequentemente, impulsionaram uma melhoria dos materiais,

31 Idem, p.62 32 Idem, p.29

(39)

originaram a dualidade entre o arquitecto, que se preocupava com o desenho do espaço, e o engenheiro, que se afiliava à técnica estrutural das edificações. Embora esta “separação” tenha motivado uma série de tensões e críticas face à perda da qualificação do arquitecto, a mesma possibilitou uma reformulação formal e estrutural da arquitectura, enquadrando-a às necessidades existentes da industrialização, num período em que a evolução de diferentes áreas se fazia num curto espaço de tempo.

A Arte deste período caracteriza-se assim, pela investigação de uma diversidade formal, não só na área da arquitectura como também na pintura e escultura, que igualmente foram levadas ao limite, nas quais se encerrou o capítulo da linguagem clássica, presente nos últimos três séculos e iniciou-se um período de abstracção da linguagem tradicional.33

33O historicismo pode ser considerado como uma espécie de redução ao absurdo da cultura re-nascentista, e surge como um epílogo que encerra o ciclo três vezes secular do classicismo eu-ropeu. Entretanto, relacionando-o com as mudanças econômicas e sociais e com os desenvol-vimentos subsequentes, o historicismo parece também uma abertura para o futuro,Idem, p.29 O Metamorfismo da Arte no século XX

(40)
(41)

1.3.1.

A ascendência do artista moderno

Uma das problemáticas inerentes ao tema da industrialização do sé-culo XIX nasceu com o novo pensamento humanista, no qual o trabalhador surge como figura fundamental. Neste sentido, denotou-se uma maior preocu-pação pela condição do trabalhador que, deu origem, através do processo de industrialização, a uma generalizada melhoria das condições de vida.

Embora tal acontecimento seja marcante na história da sociedade ac-tual, é importante sublinhar que, com a evolução industrial que promoveu o progresso da condição do operário, o artesão viu o seu papel a ser substituído pela máquina.34 Seguindo este raciocínio, e como manifestação de uma arte

não industrializada, e por isso “do povo para o povo”35 nasceu o movimento

Arts and Crafts, que acreditava que, a Arte para a qual trabalhamos é um bem do qual todos podem participar, e que serve para melhorar a todos; na realidade se todos não participarem dela, ninguém poderá participar.36

As-sim, Willian Morris idealizava uma realidade na qual cada cidadão poderia participar, visto que cada objecto seria desenhado conforme a necessidade do utilizador, anulando por fim a diferença entre os estratos sociais.

Esta óptica marca, tal como Benevolo afirmou, o início do Movi-mento Moderno europeu, que coincidiucom a entrada no mercado da firma Morris, Faulkner, Marshall & Co., em 1862.37 Apesar da intenção de Morris

ter em atenção a identidade do artista, bem como o conforto do habitante,

34 FRAMPTON, Kenneth, (1980) História Crítica de la Arquitectura Moderna, Editorial Gus-tavo Gili, S.A., Barcelona, 7ªEdição, 1993, p.20

35 BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p. 198

36 Idem, p.12 37 Idem, p.13

Manifesto sobre a Osmose das Artes

10. Impressão nascer do sol, Claude Monet, 1872 11. Mont Sainte-Victoire, Paul Cézanne, 1906

(42)

42

a sua ideologia não ia de encontro com a realidade de expansão do seu produto, já que a execução de produtos artesanais tornava-os dispendiosos e monetaria-mente inacessíveis a todo o público. Posteriormonetaria-mente, e com o desenvolvimen-to do mercado, Morris adapdesenvolvimen-tou a sua empresa às adversidades incondesenvolvimen-tornáveis da industrialização. Embora, continuasse a proteger o papel do artista, a sua firma assumiu a posição de que o homem controlava os movimentos da má-quina. Estas atitudes que valorizavam o papel do artesão enquanto artista tra-dicional, bem como a relação entre o design e o Homem, fez com que Morris fosse baptizado como um dos pioneiros do desenho moderno, dando origem ao que viria a ser o Movimento Moderno.

No que diz respeito à evolução repentina do último século, que pro-moveu a formalização linguística e estrutural da arquitectura provocada pri-meiro pelos românticos e, posteriormente, pelo movimento Arts and Crafts, o artista adquiriu uma liberdade plástica na qual procurava uma nova maneira de se comunicar. Neste contexto, verificou-se o surgimento de pequenos gru-pos, que ambicionavam ideias e experiências sempre mais audaciosas (...) eliminando do repertório arquitectónico os usuais pontos de referencia esti-lísticos e transformando repetidamente o repertório assim renovado.38

Parale-lamente, surgiram as primeiras teorias de arte, que se manifestaram, tal como Morris, precursoras do Movimento Moderno com a presença de teóricos como K.Fiedler, com o seu ensaio sobre a origem da arte, de 1887.

Fiedler expôs no seu ensaio, o lado da natureza enquanto obra de arte e a percepção da beleza na matéria. Em Fiedler, esta percepção valorizou a

(43)

estética clássica, contudo não submeteu a Arte a qualquer regra formal, o que afastou a ideia de pertencer a algum grupo ou movimento. Assim para Fiedler, a verdadeira arte expressava-se singularmente.

O ponto de partida é o novo conceito de arte como experi-ência ativa, construtiva, “elemento integrante da moderna concep-ção do mundo”; sob esse aspecto, Fiedler pode ser considerado um precursor não somente da vanguarda, mas também do movimento moderno (...)39

Outro pensador que se posicionou como Fiedler, foi B.Croce, em 1902, com a publicação da primeira edição de Estética, na qual defendeu o carácterinstintivo do artista, contrapondo a racionalidade e ordem. Esta fase, ainda que controversa, foi fundamental para a percepção do Movimento Mo-derno, visto que neste período os arquitectos começaram a dividir-se em vá-rios grupos, separados por ideologias, nos quais expuseram publicamente as suas crenças e preocupações face à realidade industrial. Tais preocupações culminaram num ponto mais avançado do século XIX na reestruturação for-mal da arquitectura enquanto arte.

Neste mesmo período, é perceptível uma relação entre pintura e ar-quitectura contrariamente ao que tinha acontecido nos períodos antecedentes como, barroco, neoclassicismo e romantismo. Este período a que se apelidou de pré-modernismo, pelo facto de relacionar ideias materializados mais tarde pelos modernistas, caracterizou-se pela relação entre pintura e arquitectura, na qual se destaca a obra dos pintores impressionistas, Figura 10, que retrataram

39 Idem, p.268

12. Peça de tapeçaria, William Morris, 1876

(44)

44

a realidade observada e a expressaram pelo meio do cromatismo pictórico.40

Outra vertente plástica que foi pioneira na relação entre pintura e arquitectura manifestou-se na obra de Paul Cézanne, percursor dos ideais que deram ori-gem ao cubismo, e explorador do desenho planométrico dos corpos, Figura 11.

A natureza é sempre a mesma, mas nada resta dela, daquilo

que parece. Nossa arte deve dar o estremecimento de sua duração. Deve fazer com que tenha o gosto eterno. O que está por trás do fe-nômeno natural? Talvez nada, talvez tudo.41

Após as descobertas de pintores como Monet e Cézanne, os artistas do século XX tiveram a preocupação de inovar nas temáticas (visto que os temas associados à realidade tinham sido substituídos pela fotografia) bem como, no desenvolvimento das técnicas de execução, que proporcionaram o isolamento do artista, que procurava uma experimentação pessoal da sua arte. Neste con-texto, os artistas do século XX começaram a desenvolver os seus estudos e a teorizar a sua prática , numa tentativa de melhorar formalmente as suas obras, como Benevolo expôs, demonstrar a validade geral e a transmissibilidade dessa linguagem, fixando uma série de preceitos formais e apoiando-os com discursos teóricos.42 Assim, enquanto que os impressionistas tiveram que

en-tender a decomposição da paleta cromática para a realização das suas obras, no caso dos neo-impressionistas, essa realidade era indiscutível.43

40 Idem, p.270 41 Idem, p.270 42 Idem, p.270 43 Idem, p.271

(45)

O mesmo se irá se passar com a Arte das vanguardas, na qual os ar-tistas exploraram várias linguagens e teorizaram as suas experiências. Entre estes destacou-se Pablo Picasso (com o cubismo) ou Kandinsky ( com o abs-traccionismo). Neste período, deu-se ainda início a uma Pintura experimental, do mesmo modo que a arquitectura, embora numa execução mais lenta

Tanto arquitetos quanto pintores trabalham para

mu-dar as convenções culturais recebidas como herança do

passado, mas uma de tais convenções é exatamente a

exis-tência da pintura e da arquitetura como atividades

separa-das (...) Pintores e arquitetos, portanto, não apenas

influen-ciam-se entre si como, a rigor, fazem o mesmo trabalho.

44

Embora a prática de pintores e arquitectos visasse finalidades distin-tas, uma vez que as duas artes servem naturezas diferentes, o pintor associado a uma introspecção do Ser e o arquitecto do Espaço, ambas poderiam relacio-nar-se, através do pensamento e experimentação plástica do desenho. Neste sentido, enquanto que o pintor executa uma obra que tende a ser singular e crítica, na arquitectura essa percepção pode ser vivada pelo público, no entan-to é igualmente inerente ao arquitecentan-to, onde através das formas os dois artistas procuram o mesmo fim, a harmonia na obra de arte.

Esta realidade deu origem à criação de manifestos que tendiam à ide-alização deuma nova arquitectura, tal como Adolf Loos com a publicação de

44 Idem, p.271

13. Small Words II, Kan-dinsky, 1922

(46)
(47)

14. Casa Battló, Antoni Gaudi, 1877

17. Casa da Cascata, Frank Lloyd Wright, 1939

16. Casa Steiner, Adolf Loos, 1910

Ornamentação e crime. Loos, sucessor de Wagner, e por isso percursor do pensamento wagneriano, acreditava numa arquitectura despojada de orna-mentos,45 entre as suas experiências realizadas nasceu a Casa Steiner, na qual

Loos eliminou todos os elementos que não fossem estruturais para dar origem a uma obra completamente verdadeira e por isso, despojada de decoração.

Os termos da polémica de Loos são, contudo, os da cultura tradicional; ele aceita a priori a contraposição entre beleza e

utili-dade, entre objectos decorados e não decorados, depois toma partido

pela utilidade e pela eliminação de ornamentos. O movimento mo-derno começa revogando na discussão exatamente esses termos.46

Contrariamente à óptica de Loos, destacam-se igualmente neste perí-odo outros arquitectos que denotavam um sensibilidade diferente na relação entre as várias artes como é o caso de Antoni Gaudí, que pôs em paralelo, decoração pormenorizada/técnica e sensibilidade plástica, associada à Art Nouveau, com obras como a Casa Battló,47 e Frank Lloyd Wright, que se torna

referência dos arquitectos europeus pela expensão da escola de Chicago, e do estilo internacional, onde relacionava a arte japonesa com inovação técnica.

Estas personalidades tornam-se importantes no Manifesto sobre a Os-mose das Artes, uma vez que revelam diferentes sensibilidades associadas aos valores intrínsecos de cada autor, que resulta em obras de carácter único, e por isso, exemplo da ascendência do artista moderno através da sua Arte.

45 LOOS, Adolf, Ornamentação e Crime, Lisboa: Cotovia, 2ª Edição, 2014, p. 225

46 BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.302

47 Idem, p.322

15. Casa Battló, Antoni Gaudi, 1877

(48)
(49)

1.3.2.

A obra de arte no Movimento Moderno

A Obra de Arte é um dos temas principais de investigação no Mani-festo sobre a Osmose das Artes, uma vez que reflecte a essência e a alma do artista, primeiro teorizada e exposta nos seus estudos e finalmente objectivado na matéria construída. Neste contexto, e após a análise da interpretação teórica da Obra de Alberti, nos subcapítulos, 1.1 e 1.2., que restruturou não só a Arte mas inclusive a óptica do observador, interessa neste subcapítulo entender a relação entre Homem e Arte face às adversidades da revolução industrial.

No início do século XX, entre 1905 e 1914, deu-se o início da reforma plástica das vanguardas, que iria influenciar de modo directo o Movimen-to Moderno bem como as obras arquitectónicas que surgiram neste período. Neste seguimento, destaca-se em primeiro lugar os fauves, que com o recurso a cores fortes e primárias pintaram temas bidimensionais, tendo como refe-rência a obra de Van Gogh. Paralelamente, neste período começam-se a de-senvolver os primeiros estudos cubistas e abstraccionistas com Pablo Picasso e Wassily Kandinsky, (Cronologia A). Apesar de se saber que estes artistas influenciaram o pensamento arquitectónico através de experiências sobre a abstracção das composições e do movimento, deles deve-se reter que essa influência foi praticamente nula no início da sua obra.

Nenhuma dessas experiências tem uma ligação (...) com a arquitectura, pelo contrário, parece que os pintores - dessa geração - com exceção dos futuristas - preferem abandonar as relações com os outros campos de atividade e concentrar suas energias nos problemas da pintura pura.48

48 BENEVOLO, Leonardo, História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.382

(50)

Pintura

Ar

quitectura

Impressionismo, 1860

Impressão do real Fig. A - Impressão, nascer do sol, Monet, 1872

Neoimpressionismo, 1880

Cores puras, em pontilhismo Fig B - A Sunday on La Grande Jatte, Seurat, 1884

Fauvismo, Futurismo, Expressionismo, 1904

Cores violentas Fig C - Dance, Matisse 1910

Cubismo, 1907

Decomposição da matéria Fig. D - Guitar, Glass, and (...), Braque, 1919

Surrealismo, 1920

Místico e o mundo irreal Max Ernst, Salvador Dali Fig E - Celebes, Ersnt, 1920

Abstraccionismo, 1914

Composições

Fig. F - Delicate Tension No. 85, Kandinsky, 1923 Neoplasticismo, 1917 Composições Geométricas Fig G - Composição XX, T. Van Doesburg, 1920 Bahaus Instituto académico Fig. N - Edifício da Bahaus, 1919 - 1933

Arts&Crafts, 1862 Art Noveau, 1880

Fig. H - La Pedrera, Antoni Gaudí, 1907

Estilo Internacional, Escola de Chicago, 1880

Fig. I - Adler &Sullivan, The Auditorium Building, 1887

Racionalismo Europeu

Eliminação do ornamento Fig. J - Casa Steiner ,

Adolf Loos, 1912

Funcionalismo

Estilo Internacional Fig. L - Vila Savoye, Le Cor-busier, 1928

Funcionalismo

Estilo Internacional Fig. M - Casa Lange, Mies van der Rohe, 1927

Movimento Orgânico

Estilo Internacional Fig. O - Casa da Cascata, Frank Lloyd Wright, 1939

(51)

Esta reforma reflecte-se com a resposta dos artistas à formalização do desenho e da perspectiva, em contraste com a comercialização da fotografia, que permitiu aos pintores criar obras sensíveis ao seu interior, e aos arquitec-tos desenvolver a sua obra associada ao crescimento da engenharia.

A linguagem formal do pintor do século XX é, deste modo, consequ-ência dos acontecimentos marcados nos séculos anteriores que provocaram no pintor uma vontade de procurar a sua linguagem individual na qual explorou valores já compreendidos desde o Renascimento, como a harmonia. Este perí-odo destaca-se especialmente por esta alteração da percepção óptica do artista sobre a obra de arte, uma vez que explora nos seus estudos a decomposição das formas e materializa-as em matéria.49

A obra de arte no Movimento Moderno caracteriza-se, no caso da pin-tura, pelo surgimento de obras livres, investigações individuais e experimen-tais, onde os pintores desenvolvem a sua obra segundo estudos de execução, virando-se para o seu interior, tal como Picasso afirma, Um quadro não é pen-sado e estabelecido desde o momento inicial.50Apesar de no cubismo Picasso

visionar a matéria além do visível e com isso representar o irreal, no abstrac-cionismo, Kandinsky projecta-se na própria tela como um “olhar interior”, num limbo entre a aparência e o real, tal como o próprio descreve, a verdadei-ra abstverdadei-racção que os cubistas não conseguiverdadei-ram chegar, visto que a arte é o fer-mento que fez crescer a massa do mundo: tais épocas estão hoje longínquas. Até que elas não voltem, o artista deve manter-se distante da vida oficial.51

49 Idem, p. 382 50 Idem, p.384 51 Idem, p.390

A obra de arte no Movimento Moderno

Cronologia A, objecto de estudo realizado pelo autor

(52)

52

Com a I Guerra Mundial, vários artistas tiveram uma atitude inter-ventiva e terminaram a participar na guerra resultando no desaparecimento de algumas vanguardas, como o Futurismo. Em simultâneo deu-se início ao Dadaísmo, que tal como o Futurismo associava-se a partidos políticos. Em contrapartida, surgiram vanguardas como o Surrealismo que se manifestava pela dissociação política e pela entrada num mundo introspectivo. Esta nova manifestação originou o afastamento de alguns artistas relativamente a outras vanguardas anteriores (como é o caso de Max Ernst), e por fim, o desenvolvi-mento de uma linguagem pessoal.

No que diz respeito à arquitectura, surge com a I Guerra Mundial o avanço de técnicas construtivas que previam a resolução urbana das cidades. Neste contexto o arquitecto torna-se mediador entre a situação precária da sociedade e a Arte (associada à concepção plástica da arquitectura), pelo facto de ter que repensar os valores culturais e associá-los à sensibilidade do espaço. Isto resume-se na práctica das teorias desenvolvidas pelos primeiro teóricos arquitectos que relacionavam não só a evolução contínua dos materiais com a estrutura, como ainda tinham em consideração as circunstâncias imprevisíveis.

Essa é a parte mais visível da vanguarda pós-bélica e, para muitos quintessência da “arte moderna”. A outra parte - aquela que

dura além das circunstancias e que conta realmente para o destino da sociedade contemporânea - esforça-se por motivar

racionalmen-te sua ação inovadora, distinguindo aquela que deve ser mantido e aquela que deve ser destruído; a arquitetura moderna começa a par-tir destas linhas.52

(53)

É neste período que surgem também os princípios do purismo, 1915-1917, publicados por Ozenfant em Elan, e por Le Corbusier em Après le Cubisme. Os dois artistas subscreveram a importância do cubismo como fonte de inovação e interpretação das formas primárias, onde entenderam a decom-posição da forma segundo a dimensão do tempo, e associaram-na à arquitectu-ra. Deste modo, ao espaço habitável da arquitectura juntaram conceitos como tempo/movimento, no qual estruturaram o espaço, e posteriormente aplica-ram-no às técnicas desenvolvidas na área da engenheira. Estes dois artistas mais tarde criam a revista L´Espirit Nouveau, embora algum tempo após a sua fundação seguissem caminhos distintos, onde Ozenfant dedicou-se intei-ramente ao desenvolvimento da sua obra pictórica, e o multifacetado Le Cor-busier dedicou-se à arquitectura, à pintura e à escultura.53

Em continuidade, desenvolvem-se práticas plásticas aplicadas ao pro-cesso arquitectónico, como o suprematismo, o construtivismo e o não-objec-tivismo, que põem em prática o pensamento de Malevitch, exposto no seu manifesto, no qual subentendia que, para se evoluir era necessário a criação de uma realidade a partir do zero. Outra vertente da vanguarda também explora-da nesta época, é o neoplasticismo, de T. Van Doesburg e P. Mondrian54

(Cro-nologia A - Fig. G) uma vez que os seus ideais pretendiam de maneira clara a relação entre as várias artes, numa tentativa de clarificar a sua concepção e formalização, motivo principal de estudo e investigação no Manifesto sobre a Osmose das Artes.

53 Idem, p.428

54 FRAMPTON, Kenneth, (1980) História Crítica de la Arquitectura Moderna, Editorial Gus-tavo Gili, S.A., Barcelona, 7ªEdição, 1993, p.144

(54)
(55)

Van Doesburg vê claramente que esse processo não serve

so-mente para pintar quadros ou para fazer esculturas abstractas, mas também para reconstruir o ambiente urbano em seu conjuntos, de

acordo com as necessidades técnicas e psicológicas.55

Os neoplasticistas apresentam-se assim como personalidades impor-tantes do Movimento Moderno, visto que idealizavam a arte associada à vida das cidades, já que acreditavam que a arte iria desaparecer como manifestação individual quando o artista atingisse o seu ponto clímax, e assim viveria per-manentemente no espaço da cidade, A arte desaparecerá da vida na medida em que a própria vida ganhe em equilíbrio.56

No que diz respeito à unidade das artes, instala-se no final da I Guerra Mundial, em 1919, a Bauhaus, fundada por Walter Gropius, em Weimar, que defendia a ideia de que tanto o artista como o artesão deveriam ser instruídos segundo o processo das belas-artes, que relembra os ideais de Morris (pionei-ro do desenho moderno) como também a importância de que todas as artes se poderiam relacionar através dos vários artistas instruídos segundo a sua ver-tente que daria origem a objectos mais detalhados e sensíveis para o utilizador.

Todos estes acontecimentos tornam-se importantes nesta dissertação

como introdução ao pensamento estruturante na obra de Nadir Afonso, caso de estudo, extremamente influenciado pelo Movimento Moderno, como refle-xo não só na sua obra teórica, mas observável na sua pintura e arquitectura.

55 Idem, p.124

56 BENEVOLO, Leonardo,História da Arquitectura Moderna, São Paulo: Editora Prespectiva S.A, 3aEdição, 2001, p.398

A Obra de Arte no Movimento Moderno

18. Contra-Construction, Theo van Doesburg, 1923

(56)
(57)

2.

NADIR AFONSO, O PINTOR

(58)
(59)

2.

Nadir Afonso, O Pintor das Formas Matemáticas

A investigação sobre a obra de Nadir Afonso, arquitecto/pintor, torna--se importante no Manisfesto sobre a Osmose das Artes, uma vez que relacio-na o processo criativo do artista presente relacio-nas duas artes, pintura e arquitectura. Nadir Afonso expôs ao longo de toda a sua vida a problemática exis-tente na concepção artística da obra de arte, na qual explicou pelo meio dos seus estudos de cariz científico-teórico os motivos que a caracterizam. Nes-te sentido codificou a existência de objectos naturais e objectos artificiais, onde explicou as suas características que permitiam ao observador entender o objecto. Deste modo, Nadir estabeleceu à partida que o objecto natural exis-tia segundo as regras da natureza e por isso respondia aos próprios atributos extrínsecos.57 Em contrapartida, o objecto artificial subdivide-se em, objecto

(que segue apenas a função, e por isso responde à qualidade qualitativa) e objecto artístico, que define por conseguinte a obra de arte.

Neste contexto a obra de arte, caracteriza-se pela permanência eterna dos seus valores qualitativos e quantitativos independentemente do período em que se insere, o que leva a que uma obra do Renascimento seja harmoniosa embora estejamos num período contemporâneo.

A obra de arte deveria, por conseguinte, obedecer como

qualquer outro produto da acção humana às funções mutáveis... mas não obedece: a obra de arte não é evolutiva; não há arte que esteja ultrapassada, nem há, a despeito do que entende o esteta, arte de “vanguarda”. A matemática, a essência da arte não é evolutiva.58

57 AFONSO, Nadir, (2010) Manifesto - O Tempo Não Existe, Lisboa: Dinalivro e Nadir Afonso, p.55 58 Idem, p.56

19. O Arquitecto, Auto-retrato de Nadir Afonso, 1942 20. Nadir Afonso, com 86 anos

(60)

60

Esta óptica salienta em suma a diferença clara entre o objecto comum e a obra de arte, a qual aos olhos de Nadir Afonso, se destaca como uma ci-ência inquestionável, que alude à sensibilidade intrínseca do artista pelo meio das formas matemáticas.59

Nadir Afonso expõe ainda na teorização da sua obra a relação existen-te entre a percepção do real, que origina a obra de arexisten-te, e a física relativista, na qual rejeita a existência de tempo, afirmando que, Julgamos que lemos no mostrador do relógio o ritmo do tempo e lemos a cadência do espaço.60

O tempo afasta-se assim, das características que definem a obra de arte pelo facto de ser incompatível com os próprios atributos intrínsecos, como é o caso da harmonia, qualidade universal e omnitemporal.61

Ao contrário desta observação que elimina o factor tempo como elemen-to que caracteriza a obra de Arte, Nadir aponta antes a duração universal como suporte estático do movimento contínuo dos corpos. A duração universal vem responder à necessidade que o Homem tem em registar a passagem do tempo, pela interpretação de uma lei física que põem em paralelo espaço/movimento.

Há sim, uma lei física, imensurável, inerte, constante - a

du-ração universal que é o suporte estático do movimento dos corpos

como, por exemplo, a tela é o suporte estático das tintas, incriável como o continente universal e como as normas geométricas de que temos falado com mais amplo desenvolvimento.62

59 Idem, p.57 60 Idem, p.24

61 AFONSO, Nadir, (1999) O Sentido da Arte, Lisboa: Livros Horizonte, p.64

(61)

A percepção sobre o cosmos adquire aqui uma relação prática com a obra de arte no seu sentido transcendente e imutável, visto que ambas adqui-rem valores exteriores ao Homem.Deste modo, o arquitecto/pintor observa a obra de arte como uma ciência, uma vez que se apresenta exata, objectiva e imutável, igualmente, tal como a lei física inerente ao universo, onde o ho-mem habita e resulta dele, contudo, são as leis universais, entre o espaço e o movimento dos corpos, que determinam a sua existência.

No caso da obra de arte, as leis universais são igualadas às leis ma-temáticas, nas quais a matéria se transforma em forma/espaço e o movimento dos corpos na distância harmoniosa das composições.63 Assim, e embora estas

leis consistam na caracterização de matérias distintas, uma universal e outra criativa, elas partilham a mesma energia, expressa em atributos qualitativos a que Nadir chamou de exactidão e constância.

No que diz respeito às leis matemáticas que originam a harmonia na obra de arte, caracterizam-se pelo entendimento e equilíbrio dos seus atribu-tos intrínsecos, os atribuatribu-tos qualitativos (que respondem à função do objecto) e quantitativos (que são inerentes à obra de arte).64 Os primeiros dão lugar à

sensação de harmonia do observador, no entanto são os atributos quantitativos que originam essa sensação sobre a obra de arte. Neste sentido, os atributos quantitativos destacam-se pelo equilíbrio que provocam as formas. Se qua-lidade segue a função, a quantidade de elementos que constituem a obra são determinantes pela a sua harmonia. Assim, os atributos quantitativos vivem

63 AFONSO, Nadir, (1999) O Sentido da Arte, Livros Horizonte, Lisboa, p.111

64 AFONSO, Nadir, (2010) Manifesto - O Tempo Não Existe, Lisboa: Dinalivro e Nadir Afonso, p.23 Nadir Afonso, O Pintor das Formas Matemáticas

21. Capa para o livro O Sen-tido da Arte, Nadir Afonso, sem data

22. Capa para o livro O Sen-tido da Arte, Nadir Afonso, sem data

(62)

62

na intuição do artista, onde sem que tenha consciência o Homem que trabalha a natureza é trabalhado por ela.65 Deste modo, numa obra de arte, não são os

atributos qualita tivos e quantitativos que se alteram mas antes a capacidade do artista os sentir.66

O paralelismo existente entre as leis universais e as leis matemáticas mantém-se pela atracção da forma, nas quais as leis universais apresentam-se sob a forma de elementos naturais, enquanto que as leis matemáticas são de origem geométrica, como o quadrado, triângulo, círculo. Nadir salienta que, embora as formas geométricas elementares ou deformadas, sejam perceptíveis na natureza, elas existem pela associação de afinidades (que remonta desde a Grécia Antiga).67 A este entendimento da forma, que põem em paralelo a suas

propriedades, constantes e exactas, reflectindo-se na Harmonia, Nadir apeli-dou de Morfometria.68

O artista sente na geometria da forma a única

qualida-de - eterna, universal - capaz qualida-de se opor à irreprimível efemeri-dade das coisas. Ele sente esse absoluto matemático que realça, numa aparência de eternidade, os outros atributos eventualmente expressos na obra de arte; sente numa ilusão de imanência, a per-feição mais justa, a evocação mais sincera a originalidade rara.69

Do mesmo modo que de Nadir teorizou sobre as leis que regem a obra de arte, Kandinsky teorizou o seu pensamento sobre a Obra de arte, afirmando que,

65 Idem, p.34 66 Idem, p.38 67 Idem, p.29 68 Idem, p.41 69 Idem, p.41

(63)

As formas que coexistem “de qualquer maneira” têm, não

obstante, em última análise, relações rigorosas e precisas. Enfim, es-sas relações deixam-se igualmente exprimir de uma forma

matemá-tica (...) esse objectivo permitirá à obra de arte atual também dizer,

no futuro, em vez de “eu fui”, “eu sou”70

Esta percepção de Kandinsky têm sobre a intemporalidade da obra de arte é semelhante à que Nadir Afonso observa em Karl Marx,71 onde a obra do

artista se apresenta como o resultado de um estudo intuitivo e formal.72 Esta

atitude é contrária à visão do filósofo/esteta que descreve a essência da obra simplesmente como belo, uma vez que Nadir sustenta a sua visão na teoria das leis matemáticas e nos seus atributos qualitativos e quantitativos.73

A obra de Nadir Afonso resulta assim de uma investigação sobre as formas matemáticas, que o arquitecto/pintor desenvolveu ao longo de toda a sua vida. Embora Nadir abandone a práctica da arquitectura na década de 60, a sua obra, tanto arquitectónica como pictórica, representam parte desse processo que visionava o entendimento intuitivo da obra do artista, onde não só projectou formas como também pintou espaços.74

70 KANDINSKY, Wassily, (1912) Do Espiritual na Arte - E na pintura em particular, Álvaro Cabral, Antonio Danesi, Martins Fontes, São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.121

71 AFONSO, Nadir, (2010) Manifesto - O Tempo Não Existe, Lisboa: Dinalivro e Nadir Afonso, p.41 72 Idem, p.56

73 Idem, p.43 74 Idem, p.49

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Referências

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