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Interação Social e Mediação em Ambientes Digitais de Aprendizagem com Sujeitos com Autismo

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Academic year: 2021

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EM

A

MBIENTES

D

IGITAIS

DE

A

PRENDIZAGEM

COM

SUJEITOS

COM

A

UTISMO

1. AUTISMO

O Autismo forma parte das síndromes conhecidas como desordens de desenvolvimento específicas ou também denominada de Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD). O termo global significa que o transtorno ou desordem afeta profundamente o processo de desenvolvimento especialmente nas áreas de cognição, linguagem, motora e social. Para Oliver Sacks [1] descrever o autismo implica em ser um “antropólogo em Marte” de forma a desvendar o seu mundo, muitas vezes impenetrável. O motivo dessa dificuldade reside no fato de precisar explicar e compreender como é o relacionamento com uma Liliana M. Passerino

Centro Interdisciplinar de

Novas Tecnologias na Educação - CINTED Pós-Graduação em Informática

na Educação - PGIE Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (UFRGS) - RS -Brasil liliana@cinted.ufrgs.br

Lucila M. Costi Santarosa Núcleo de Informática

na Educação Especial - NIEE/UFRGS Pós-Graduação em Informática na Educação - PGIE

Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (UFRGS) - RS -Brasil lucila.santarosa@ufrgs.br

Liane M. R. Tarouco Centro Interdisciplinar de

Novas Tecnologias na Educação - CINTED Pós-Graduação em Informática

na Educação - PGIE Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (UFRGS) - RS -Brasil liane@penta.ufrgs.br

Resumo: A partir de uma concepção sócio-histórica da interação social e

considerando as Tecnologias de Comunicação e Informação (TICs) disponíveis atualmente para a construção de Ambientes Digitais de Aprendizagem (ADA) procurou-se sanar a inexistência de dados empíricos relativos ao fenômeno de interação social de pessoas autistas mediado pela tecnologia. A presente pesquisa propõe uma visão diferenciada sobre os processos de interação e mediação que se estabelecem em ambientes digitais. Estruturada como um estudo multicasos com observação de grupos de autistas em atividades de interação mediadas por ADAs ao longo de 3 anos identificaram-se categorias relevantes emergentes dessa mediação tecnológica com contribuições importantes para as areas envolvidas (Psicologia, Educação e Computação) na construção de um ambiente digital de aprendizagem especialmente projetado levando em conta os resultados obtidos.

Palavras-Chave: ambientes digitais de aprendizagem, autismo, mediação, interacão.

Abstract: This work aims to supply the lack of empirical data relative to

technological mediated social interaction of people with autism, based on a socio-historical perspective about social interaction and taking into account information and communications technology currently used in Digital Learning Environments (DLE). This research proposes another vision about how interaction and mediation processes are established in DLEs. This proposal is structured as a multi-case study with the observation of the DLE mediated interaction of several groups of autitic subjects in interaction during a 3-year period. Based on these observations where identified relevant analysis categories that emerge from the technological mediation and provide important contributions to related areas of Psychology, Education and Computer Science, and also can be used as guidelines for the construction of DLEs specially designed for people with social interaction problems.

Keywords: Digital Learning Environments, autism, mediation, interaction.

pessoa autista, pois, até certo ponto é “[...] um ser estranho

que se movimenta num plano diferente de existência, [...] uma pessoa com a qual não podemos conectar”[2:16].

Estudos recentes indicam que seu índice de incidência poderia ser maior que o afirmado em décadas passadas quando se acreditava que a incidência correspondia a 4/ 10.000 nascimentos. Segundo NASH [3] poderia ser cinco vezes mais comum que a Síndrome de Down e três vezes mais comum que o diabetes, chegando a ser 1/175 nascimentos. Por outro lado, 75% das pessoas com autismo sofrem também de defasagens cognitivas [4;5]. O que talvez chame mais a atenção na síndrome, é que essas defasagens

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sociais afetivas e cognitivas, não se apresentam uniformemente em todos os processos cognitivos. Por exemplo, em geral, sujeitos com autismo têm um ótimo desempenho em funções perceptivas visuais e espaciais, como quebra-cabeças, mas apresentam dificuldades se nesse processo perceptivo é requerido compreender o significado de uma situação, como, por exemplo, compreender uma seqüência de imagens que constituem uma historia [2;4]. Isso se deve, de acordo com Peeters[4], ao fato que os sujeitos com autismo tem um estilo cognitivo diferente “[...]

eles sentem, ouvem e vêem, mas seu cérebro administra estas informações de maneira peculiar (por este motivo a definição do autismo no DSM IV é relacionada com desajustes qualitativos na comunicação e interação social)”

(p. 9). Para Hobson [2] esse estilo cognitivo é derivado da limitação ou deficiência na capacidade de ter um “sentido da relação pessoal” e de experimentar essa relação, ou dito de outra forma, de criar um significado para a interação social e conseqüentemente participar da mesma. Evidentemente, isto traz dificuldades inerentes à generalização de conhecimento a partir da imitação que diferentemente da imitação do desenvolvimento normal que é criativa e ativa, no autismo parece ser “engessada” como uma cópia exata [6]. Também se percebe que na atenção conjunta, sujeitos com autismo raramente compartilham a atenção do parceiro ou mesmo do adulto sobre algum objeto ou evento particular “...

crianças autistas têm em geral pouca ou nenhuma estratégia para compartilhar a atenção com os outros”

(p.18). Um outro déficit presente no autismo é na simbolização, tal déficit poderia estar associado aos problemas lingüísticos apresentados na síndrome [7; 2; 4; 6]. No desenvolvimento normal, conceber ou representar um objeto implica em desenvolver um modelo. Para isso, algumas funções cognitivas são necessárias, entre elas: capacidade de percepção do conjunto sistêmico ou totalidade e não de partes isoladas, capacidade de abstração, e capacidade de utilizar símbolos para representação.

2. CONCEPÇÕES

SOBRE DESENVOLVIMENTO

C

OGNITIVO

, I

NTERAÇÃO

S

OCIALE

M

EDIAÇÃO

Baseados nos pressupostos sócio-históricos consideramos que o desenvolvimento cognitivo somente pode ser compreendido quando inserido no contexto social e histórico no qual se produz. Os meios pelos quais o desenvolvimento cognitivo se manifesta é através de processos psicológicos superiores (PPS) que se caracterizam por serem de origem é social, conscientes, auto-regulados, e mediados pelo uso de instrumentos e símbolos de mediação. Assim, consideramos o desenvolvimento cognitivo como a transformação dos processos psicológicos elementares em processos psicológicos superiores (PPS) que ocorre na e pela interação social com a mediação de instrumentos e símbolos culturalmente determinados, em particular a linguagem [8]. Para Diaz et al. [9] essa “transformação” é evidenciada na auto-regulação, denominador comum a todos os PPS. A capacidade de auto-regulação não é somente originada na interação social, mas é uma capacidade que deve ser promovida e desenvolvida através de estratégias específicas nas interações entre sujeitos mais experientes e menos experientes o que genericamente denominamos de ações mediadoras. Na nossa pesquisa a observação e posterior análise das ações mediadoras utilizou-se como indicador do processo de regulação entendido como o processo no qual o sujeito começa a participar de uma ação mediadora com maior controle por parte do mediador culminando na autonomia do sujeito, ou auto-regulação. Partindo, portanto, da ação mediadora procuramos indícios de regulação e estudamos o processo de desenvolvimento e apropriação presentes ao longo das interações. Para isso, adaptamos a pesquisa de Diaz et al. [9] com dimensões e categorias adicionais decorrentes desta pesquisa e das pesquisas desenvolvidas no NIEE [10] como apresentamos na figura 1. Dividimos, então, o processo de regulação em três sub-processos: controle, autocontrole e auto-regulação, cada um com duas dimensões (direto e indireto) que indicando o grau de controle/autonomia da relação mediador/aluno.

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No caso do Controle que é realizado pelo sujeito mais experiente e externo ao aluno consideramos a dimensão direta constituída por ordens, diretivas, perguntas diretivas e modelo. Já o indireto acontece quando o mediador, por meio de perguntas perceptivas, perguntas conceituais, perguntas procedimentais, gratificações, renuncia direta, confirmação passiva e afastamento físico, orienta o aluno na execução de uma ação mediadora [11].

Já o Autocontrole é a realização pelo aluno de uma ação esperada obedecendo a um tutor internalizado. Ou seja, a figura do sujeito mais experiente antes real e externa transforma-se em interna, mas ainda independente do aluno como um sujeito virtual que representa o mediador anterior. Assim como no caso anterior, existem duas dimensões a

Direta, que acontece pela manipulação de instrumentos de

mediação pelo aluno como imitação direta, modelo, fala dirigida ao mediador e indireto com produções verbais dirigidas a si mesmo. Por último, na Auto-regulação, o plano de ação é totalmente concebido pelo sujeito que se converte no seu próprio tutor, “[...] é a capacidade que a criança

tem de projetar e supervisionar seu comportamento desde seu interior e adaptá-la de acordo com as mudanças do meio.” [9:156-157]. A diferenciação central entre

autocontrole e auto-regulação não passa pela internalização das ordens e diretivas do tutor, mas na capacidade emergente de planejar e definir objetivos próprios organizando funcionalmente sua conduta para os mesmos e adaptando-a de acordo com o contexto. As capacidades de auto-regulação se desenvolvem na e pela interação social e segundo Diaz et al [9] somente a auto-regulação poderia ser constatado como indicação de aprendizagem que leva ao desenvolvimento do sujeito [8].

Paralelamente, abordamos a Interação Social como uma ação conjunta e interdependente de dois ou mais participantes e que produz mudanças tanto nos sujeitos como no contexto no qual a interação se desenvolve [12]. Seus principais elementos sâo:

• Presença conjunta de pelos menos dois sujeitos não necessariamente física;

• Reciprocidade entre os participantes: ação de um sujeito orientada ao outro, e as respostas sucessivas na corrente de interação;

• Meio cultural compartilhado;

• Instrumentos ou meios de comunicação; O domínio sobre instrumentos de mediação e sistemas de representação implica numa reorganização de PPS existentes para a formação de novos PPS [8]. Para Tomasello [13] esse domínio é construído na interação social, principalmente na participação de interações triádicas denominadas de atenção conjunta. A interação diádica (sujeito - objeto ou sujeito - pessoas) é mais simples, mas é na interação triádica na qual requere-se uma coordenação de interações entre sujeitos e objetos resultando num triângulo referencial composto do sujeito A, o sujeito B e o objeto e/ou evento ao qual prestam

atenção. Numa cena de atenção conjunta os sujeitos precisam se identificar como agentes intencionais, ou seja, cenas de atenção conjunta são definidas intencionalmente ao “... fornecer o contexto intersubjetivo em que se dá o

processo de interação” [13: 137]. Esta compreensão das

outras pessoas como agentes intencionais iguais a si mesmo dá origem a

(os) processos de sociogênese por meio dos quais vários indivíduos colaboram entre si para criar artefatos e práticas culturais com histórias acumuladas e, (b) processos de aprendizagem cultural e internalização por meio dos quais indivíduos em desenvolvimento aprendem a usar e depois internalizam aspectos dos produtos criados pela colaboração entre co-específicos. [13: 19-20].

Portanto, as habilidades cognitivas humanas não são diretamente herança biológica, mas produto de uma variedade de processos históricos e ontogenéticos e o desenvolvimento do homem surge a partir da combinação de duas linhas de desenvolvimento: a natural (biológica e de maturação) e a cultural formando uma linha sócio-biológica de desenvolvimento [8]. Certamente que um aspecto importante que deve ser identificado durante um processo de interação social é a existência de

intencionalidade de comunicação presente num diálogo

entre dois ou mais sujeitos. Segundo Tomasello [13] justamente a percepção do outro como agente intencional é um dos principais requisitos desta identificação. Um agente se tornaria intencional quando possuísse metas, agisse ativamente para atendê-las, fosse capaz de compreender as metas das ações do outro e prestasse atenção às mudanças no meio. Estes indícios são presentes na fase diádica do desenvolvimento da comunicação intencional. Numa fase posterior (denominada triádica) também se encontram como características de intencionalidade em ordem crescente de complexidade:

• Afiliação: utilização de comportamentos não verbais para manter o foco da atenção em si mesmo; • Regulação: para busca de assistência quanto à

aquisição de objetos ou execução de tarefas; • Atenção compartilhada: coordenação da atenção

entre os parceiros sociais com fins de compartilhar experiências com objetos e/ou eventos.

Por outro lado, de acordo com Wertsch[14], a existência de intencionalidade de comunicação também é perceptível através de outros indícios como: Nível de

Abreviação Predicativa presente nos diálogos e Perspectiva referencial que é a capacidade dos interlocutores de dirigir

a atenção de seu parceiro a um objeto ou acontecimento específicos. Com relação à abreviação predicativa, Wertsch[14] considera que não são as palavras as que contêm a maior parte do significado numa mensagem, mas sim o contexto que é construído no processo de interação social na medida em que os interlocutores realizam um “intercambio verbal” por meio do uso do signo

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contextualizado, elevando o contexto extralingüístico ao

nível semântico da fala. Para Wertsch[14] numa interação encontraremos a representação lingüística (diálogos) e a definição de situação (contexto extralingüístico).

Ambos os elementos mantém uma relação inversamente proporcional, isto é, quanto menos elementos da definição de situação encontram-se explícitos na fala maior será seu nível de abreviação. Um interlocutor irá produzir comunicações com informações explícitas quando compartilha poucos aspectos da definição da situação com

o outro interlocutor, ou seja, quando o nível de intersubjetividade é baixo entre eles. Com relação à perspectiva referencial, “[...] é a perspectiva ou ponto de

vista utilizado pelo falante para identificar um referente. Qualquer ato referencial supõe necessariamente uma perspectiva referencial” [14: 178]. Segundo Wertsch[14]

os adultos utilizam amplamente a perspectiva referencial para manter a comunicação no caso de falta de intersubjetividade, em especial o uso de dêiticos que pressupõe a existência cognitiva do referente para os interlocutores.

Figura 2: Categorias de análise da interação social.

3. P

ROBLEMAE

M

ETODOLOGIADE

P

ESQUISA

A partir do arcabouço teórico exposto e da nossa experiência no trabalho com sujeitos com autismo, abordamos o seguinte problema de pesquisa: Quais processos de interação social evidenciam-se em sujeitos com autismo e que ações mediadoras emergem no desenvolvimento cognitivo desses sujeitos em ambientes digitais de aprendizagem? Com os objetivos de 1) Estruturar/organizar ambientes digitais de aprendizagem como ações mediadoras para o desenvolvimento da interação social de sujeitos com autismo; 2) Observar/ acompanhar o processo de mediação e de interação social em sujeitos com autismo nos ambientes digitais de aprendizagem (ADA) e 3)Identificar as ações mediadoras que se evidenciam mais efetivas no desenvolvimento cognitivo de sujeitos com autismo.

A pesquisa envolveu um trabalho total de três anos e meio, sendo a mesma dividida em quatro etapas:

i) Pesquisa de Campo de Observação Exploratória, com a finalidade de identificar os sujeitos da pesquisa e análise de requisitos necessários para os ADAs que seriam utilizados; ii) Desenvolvimento de ADAs: projeto de um ADA orientado a projetos de aprendizagem que permitisse estabelecer as formas de interação e mediação desenvolvidas pelos sujeitos autistas. A estrutura geral do ADA pode ser visualizada na figura 3;

iii) Pesquisa de Campo para Intervenção e Coleta: desenvolveu-se de forma paralela à etapa 2 e permitiu ir alimentando o projeto de desenvolvimento de ambiente, assim como coletar os dados de interação e mediação dos sujeitos autistas;

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iv) Análise e Interpretação dos dados: para definição final das categorias emergentes e re-modelagem do ambiente de aprendizagem projetado;

No trabalho de campo desenvolvido se realizaram intervenções a partir de ADAs selecionados e um deles especialmente projetado para acompanhar o processo de interação e regulação evidenciado por sujeitos com autismo. A questão de pesquisa era verificar quais processos de interação se faziam evidentes na interação mediada por ambientes digitais e, também, se pessoas com autismo poderiam mostrar níveis de auto-regulação na apropriação de tecnologias de informação e comunicação (TICs) e se caso não tivessem seria possível através de uma mediação com um sujeito mais experiente e através da utilização de TICs promover a apropriação de estratégias que visem à auto-regulação. No nosso estudo procuramos abranger todo o “espectro autista” e por isso foram selecionados quatro sujeitos com autismo em níveis diferenciados, do leve ao moderado, todos do sexo masculino com faixa etária variando entre 15 e 28 anos. O nível lingüístico foi importante na escolha, todos os sujeitos partiram de uma oralização mínima necessária para as mediações sendo dois alfabetizados. Cada sujeito foi acompanhado em sessões semanais de duas horas ao longo de aproximadamente três anos. Na análise e interpretação dos dados nos centramos principalmente na interação social do grupo e na apropriação de ferramentas e procedimentos tecnológicos pela mediação. Este processo duplo de análise permitiu abordar o fenômeno em dois planos: interpessoal e intrapessoal como um processo integrado sem distinção de processos cognitivos envolvidos, centrados apenas na forma como o sujeito se apropria de instrumentos e signos de mediação. Evidentemente que este enfoque, está embasado na perspectiva vygotskiana do desenvolvimento do sujeito com ênfase não somente ao processo de regulação, mas ao papel do mediador e dos símbolos como ferramentas de mediação nesse processo. O registro do processo de pesquisa foi individual por meio de protocolos e registros em vídeo.

Figura 3: Representação da Estrutura e Recursos do Eduquiito.

5. AMBIENTE DIGITAL

DE APRENDIZAGEM EDUQUITO

Um ambiente de aprendizagem constitue-se por elementos presente num processo educativo: os sujeitos que nele participam, os recursos e metodologias utilizadas no processo e os espaços e tempos possíveis dentro do processo imbuído também de uma concepção de aprendizagem que permea todo o processo. Evidentemente, nosso interesse especial centra-se em ambientes que incorporam entre seus recursos, ferramentas digitais/computacionais e embasados numa concepção sócio-histórica da aprendizagem. Desta forma definimos ambiente digital de aprendizagem como ambiente centrado no aprendiz e nas suas necessidades, com recursos tecnológicos digitais (de hardware e de software) para apoio à comunicação/interação e construção de conhecimento. Os ADE são constituídos então, por um conjunto de programas (integrados ou não) o professor/mediador e os seus alunos, as ações desenvolvidas nele apoiadas por uma metodologia de ensino e aprendizagem calcada na epistemologia construtivista/interacionista permitindo aos alunos, a partir da interação/manipulação dos objetos e do ambiente e da interação com os demais participantes do processo de ensino e aprendizagem (professor e colegas) a construção do seu conhecimento.[11]

Do ponto de vista da teoria sócio-histórica os ADAs são signos estruturados fortemente na linguagem que os transforma em ferramenta cognitiva e semiótica e como tal em mediadores culturais que atuam sobre cada ZDP dos sujeitos participantes. A mediação entre sujeito e objeto é feita, não apenas pelos recursos projetados e disponíveis dentro do ambiente (instrumentos), mas também pela interação com outros sujeitos que constituem um contexto semiótico repleto de novas significações que infleunciam o processo de construção do próprio pensamento e da tomada de consciência.

O Eduquito1 foi idealizado e projetado pela equipe do

NIEE2 (Núcleo de Informática na Educação Especial) da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul com apóio do CNPq – Comissão Nacional de Pesquisa do Brasil. O objetivo fundamental do Eduquito é ser um ambiente computacional que possibilite o trabalho por Projetos de Aprendizagem seguindo a concepção epistemológica embasada na Teoria Sócio-Histórica. O termo projeto ganhou recentemente um uso bastante freqüente na escola pensado como um guia para a ação do aluno. Foi Dewey que em 1886 trouxe esta noção para a educação e influenciou a pedagogia moderna, numa crítica à pedagogia por objetivos. Dewey propus uma pedagogia aberta que coloca-se o aluno como ser ativo no centro do processo de formação através de aprendizagens contextualizas e significativas [15].

De encontro a essa visão, e partindo de uma perspectiva Sócio-Histórica, a equipe do NIEE preocupa-se em depreocupa-senvolver ADAs centrandos na pedagogia por projetos. Desta forma, foi criado o ambiente Eduquito que

1 http://www.niee2.ufrgs.br/~eduquito 2 http://www.niee.ufrgs.br

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parte de uma concepção diferenciada de ambiente de Educação a Distância deixando de lado a ênfase em cursos Web para centrar-se em projetos de aprendizagem promovendo a interação e comunicação, espaços para reflexão e de produção pessoal e colaborativa. O Eduquito foi desenvolvido, também, pensando em Pessoas com Necessidades Especiais(PNEs) de diversas faixas etárias para promover a inclusão digital.

A estrutura do Eduquito tem como elemento central, a ferramenta que cria e disponibiliza Projetos (como visto da na figura 3). Que conta com outros recursos de forma a apoiar a organização do trabalho do grupo, como por exemplo, a ferramenta Agenda de Atividades onde os participantes podem definir as etapas necessárias no projeto e controlar o andamento das mesmas. A comunicação entre os participantes e o compartilhamento dos trabalhos desenvolvidos são pontos centrais no desenvolvimento de projetos e por isso são apoiados por ferramentas de comunicação e de colaboração como o Correio, Grupos, Recados, Diário, Bate-Papo etc.

De forma geral podemos agrupar os recursos em quatro áreas: comunicação, ação, reflexão e acompanhamento. Sinteticamente cada área descreve-se a seguir:

a) Recursos de Comunicação:

Correio: permite a comunicação entre os participantes, a partir de um correio interno do ambiente com as mesmas funcionalidades de um correio tradicional; Chat: são salas de conversas que podem ser criadas por qualquer participante, na versão atual em formato de texto e figuras, mas encontra-se em desenvolvimento uma versão com áudio para atender pessoas com deficiência visual e com escrita de sinais para atender as pessoas surdas;

Quadro de Avisos: este é um espaço para deixar avisos para os participantes. O recado fica disponível e visível para todos os participantes, podem ter texto, imagens e formatar a fonte e o fundo do mesmo;

Informações Urgentes: espaço para comunicações importantes seja do administrador, do mediador ou do criador do projeto;

Fórum: é possível criar vários fóruns dentro de um projeto, e como no chat, qualquer participante pode abrir fóruns e participar dos mesmos;

Histórias Colaborativas: é um espaço para criação de histórias em quadrinhos de forma colaborativa, onde cada participante pode acrescentar textos ou imagens a uma história grupal.

b) Recursos para a Ação:

Projetos: o usuário pode ver e visitar os projetos disponíveis além de propor seu próprio projeto. Para isso basta preencher um formulário simples com o resumo do projeto e convidar as pessoas a participar.

Agenda de Atividades: Este recurso permite organizar o projeto com atividades sugeridas por qualquer participante.

Grupos: neste espaço são definidos os grupos. Como no resto do ambiente, o aluno pode optar por criar um grupo, participar num grupo já existente ou trabalhar individualmente;

Espaço de Produção: é uma área de trabalho, que segue a metáfora do Windows Explorer, na qual é possível armazenar trabalhos referentes aos projetos, ou particulares de cada aluno. O aluno pode compartilhar ou não esses materiais

Midiateca: espaço para compartilhamento de materiais em diversos formatos que possam servir para o desenvolvimento do projeto (tutoriais, programas, vídeos, áudios, etc.)

c) Recursos para a Reflexão:

Quem sou eu: oferece um espaço para o usuário fornecer uma série de informações pessoais e, se desejar, enviar sua fotografia ou escolher um personagem que o represente, gravar um pequeno vídeo ou um áudio.

Meu Diário de Bordo: é um espaço reservado para reflexões pessoais com acesso restrito.

d) Recursos de Acompanhamento (configurar): Acessos: são relatórios de acessos quantitativos organizados por ferramentas ou por datas. A finalidade destas ferramentas é auxiliar o professor no acompanhamento do aluno.

Relacionamento: são relatórios por sujeito sobre as suas interações no ambiente organizada por pessoas que interage e ferramentas utilizadas.

e) Recursos do Administrador: formam parte do ambiente, mas seu acesso é restrito. Estes recursos permitem realizar backup, autorizar usuários, tornar alunos em mediadores, entre outros.

6. ANÁLISE E RESULTADOS DOS DADOS

Com relação à análise e interpretação dos dados, a mesma foi de caráter qualitativo indutivo, realizada ao longo de todo o estudo através da análise dos registros de campo da pesquisadora complementados com registros em vídeo das sessões .

O modelo de análise apresentado na figura 4 procurou seguir o método dialético da matriz sócio-histórica abordando o fenômeno em dois planos de análise (interpessoal e intrapessoal) denominados de:

• Macro: orientado para contexto sócio-cultural das ações, centrou-se principalmente na interação social seguindo a linha do tempo;

• Micro: orientado ao âmbito de uma ação determinada, centrou-se principalmente nas estratégias de mediação adotadas pelos sujeitos em interação e no processo de desenvolvimento evidenciado pelo sujeito individualmente. Também acompanhando a ordem cronológica.

(7)

Figure 4 : Modelo de Análise.

O motivo de escolher a ação mediadora (AM)1 como

unidade de análise foi procurar estabelecer uma análise com três componentes que não podem ser compreendidos separadamente: os sujeitos, as relações intersubjetivas e o contexto cultural. É importante lembrar que qualquer unidade de análise mantêm uma dupla função numa pesquisa: orientar o processo de coleta de dados e auxiliar na sua análise e interpretação. A primeira função diz respeito à divisão do processo continuum de observação em divisões perceptíveis que orientem a coleta de dados. A segunda corresponde à divisão de dados brutos em subconjuntos significativos e manipuláveis. Para identificar a AM dividimos as atividades em tarefas com objetivos simples envolvendo um ou mais processos cognitivos e instrumentos de mediação que foram sugeridos inicialmente pelo mediador e apropriado paulatinamente pelo sujeito até sua internalização evidenciada na auto-regulação. Levando em conta que projetos de aprendizagem são compostos por um conjunto de atividades e procedimentos e vários objetivos dentro de um eixo temático definido pelo grupo, a ação dos sujeitos para cumprir um determinado objetivo com ajuda de instrumentos de mediação constitui uma AM. É importante lembrar que a ação mediadora pode ser “disparada” pelo professor ou pelo sujeito e o nível de controle-autocontrole e auto-regulação apresentado pelo sujeito no desenvolvimento da AM fornecerá indícios do processo de internalização da AM. Dessa forma, a partir da micro-análise das AM e retornando para o nível macro (necessariamente cronológico) poderemos ter uma noção do processo de desenvolvimento estabelecido nos sujeitos.

Evidentemente que em função do nosso problema de pesquisa, nosso maior foco foram AM que utilizaram instrumentos de mediação vinculados ao ambiente digital de aprendizagem.

Apresentamos no quadro abaixo um exemplo de AM recolhida com um dos sujeitos e sua respectiva análise em dois planos.

Exemplo de registro:

Sessão 6 (16/05) Trecho 1:

L- como procuras na internet? A1. com o terra

L - e qual mais? A1- // cadê Trecho 2:

A1- (depois de entrar no site ficou olhando como que esperando e finalmente perguntou) // como começo? L - procura em palavras chave (a pesquisadora não deu nenhum tipo de orientação gestual para esta fala direta) A1- (identificou rapidamente o local aonde iriam as palavras chave) o que escrevo?(1)

L -coloca planetas ou sistema solar (ele digitou sistema solar)//

A1 - o que faço agora?

Trecho 3

L - agora tens que escolher um planeta e procurar algumas informações dele. por qual gostarias começar? A1. pelo sol.

L - vamos gravar imagens então para o nosso livro virtual e anotar algumas informações, ok? (2)

1 Toda ação desenvolvida na interação social que implique no uso de instrumentos de mediação orientada ao próprio sujeito, aos outros sujeitos ou ao meio físico.

(8)

A1. (gravou as imagens sozinho sem problemas)(...)

Trecho 4

L - vamos pegar vídeos?

A1.- (sem falar encontrou rapidamente os vídeos) //

A1 - não sei como fazer.

L- primeiro tens que clicar com o botão direito encima dos vídeos e depois pedir para salvar destino como(A1 realiza a primeira parte da operação, mas para no momento de salva, não sabendo onde clicar)

L - olha, eu vou fazer um exemplo para ti e depois tu faz igual, certo?

A1- certo

(mostrei um exemplo passo a passo e depois ele repetiu a ação imitando)

Análise do registro (nível macro):

Nesta sessão estabeleceu-se uma interação diádica como definida por [16] na qual A. mostrou claramente possuir metas (embora definidas externamente pela mediadora) e agir ativamente para atingi-las(1). L (mediadora) utilizou um nível de abreviação predicativa importante nas orientações sobre a ação que A. deveria executar(2). Essa abreviação, não foi em função de um contexto compartilhado, mas principalmente para utilizar a abreviação semiótica como um mecanismo de transição entre o plano interpsicológico e o intrapsicológico apoiando o processo de internalização. [...] a abreviação

é outro mecanismo que permite a um tutor propor desafios semióticos a seu aluno. Usando una diretiva abreviada1, o tutor convida ao seu aluno identificar e

realizar as etapas implícitas da tarefa” [14: 190]).

Nesse sentido a ação de L permite identificar o nível de autonomia e autocontrole de A1.

Análise do registro (nível micro - registro fragmentado em elementos menores):

No trecho (1) A aparenta ter autocontrole do tipo direto na parte de pesquisa mas a partir da pergunta da mediadora vemos que A possui um conhecimento simples de procedimento de busca sempre utilizando um mesmo site de forma mecânica, sem, no entanto, compreender sua significação. O que a pesquisadora identifica através de perguntas perceptivas(3) num controle do tipo indireto que tem a finalidade de estabelecer os conhecimentos prévios do sujeito identificando seu nível

de desenvolvimento [8]No trecho (2), A encontra-se numa

etapa de controle direto que se caracteriza pela realização de imitações por parte do aluno ou pelas respostas

verbais dirigidas pelo aluno para as perguntas do

mediador. Também pelas perguntas orientadas que A faz quando diz “o que faço agora”, procurando um

controle do pesquisador/mediador. Respondendo a esse controle direto que o aluno estabelece a pesquisadora, que tinha iniciado a atividade com um controle indireto, troca sua estratégia para um controle direto através de

ordens e diretivas. Então, a mediadora que inicia com

um controle indireto, logo passa para um controle direto ao perceber que o aluno não tem autocontrole da operação que está sendo realizada e que precisa, portanto, do auxílio de um sujeito mais experiente, ajustando dessa maneira a ajuda oferecida. Considerando, então, o processo de ensino como “ajuda ajustada” partimos da realização colaborativa e compartilhada da tarefa visando aumentar a compreensão e atuação autônoma do sujeito.Esse ajuste é novamente evidente no seguinte trecho, no qual a pesquisadora volta a realizar um controle indireto através de perguntas perceptivas, tentando novamente passar o controle do procedimento para o aluno que demonstra ter auto-regulação na tarefa de salvar imagens, como apresentamos a seguirNo fim deste registro (trecho 3) vemos novamente a pesquisadora num processo de controle indireto passando para um direto ao identificar novamente o NDR do sujeito para o novo procedimento. Neste caso, a pesquisadora oferece um controle direto do tipo modelo para A este imita de forma direta (controle direto). No trecho 4 a pesquisadora se mantém no controle indireto, através do afastamento físico que é quando o sujeito mais experiente deixa o menos experiente agindo sozinho, mas fica observando o desempenho do mesmo e intervém quando acha necessário. Esta dimensão do controle indireto está relacionada com a próxima dimensão que é o autocontrole. Mas como podemos ver no registro, a passagem de uma dimensão para outra, não é linear, pelo contrário, resulta num processo de iteração sucessiva. No nosso caso, A ao afirmar “não sei como fazer” é o indício que a mediadora precisa para retornar a um controle mais direto. Essa

solicitação de ajuda identificada pelo sujeito mais

experiente é uma dimensão de controle direto do aluno que os estudos Diaz et alli [9] não identificaram e que nos acrescentamos ao modelo de análise, pois foi identificada em diversas sessões com todos os sujeitos analisados. Definimos, assim a solicitação de ajuda direta como uma nova categoria do controle direto que se soma às já existentes, ficando: imitação, respostas verbais,

solicitação de ajuda. Sessão 23-25 (6/11)

(interação por mail entre sessões – sujeito A1)

oi liliana

te mandei mais receitas pra ti querida liliana tchau liliana

quanto ao filme poderia ser nesse fim de semana

resposta:

Oi A.

obrigada, vou verificar no livro virtual (é ai que colocastes?) neste fim de semana vou trabalhar o dia todo do sábado e no domingo vou ficar em casa descansando e lendo uns trabalhos.

1 Diretiva abreviada é aquela na qual o sujeito mais experiente orienta a ação do menos experientes através de orientações verbais na forma de ordens, mas sem mostrar um modelo que possa ser imitado pelo sujeito menos experiente (esta última trata-se de uma diretiva não abreviada) [14].

(9)

Talvez no outro, tá amigo? beijo

liliana

PS: gostei do “querida”

Análise do registro (nível macro):

Essa interação acontece de forma totalmente espontânea dentro de um projeto de aprendizagem que é a construção de um livro virtual de culinária e que o A. começou a procurar e enviar receitas para L. de forma espontânea, apresentando uma interação ativa. Analisando este e-mail, do ponto de vista da interação social, percebemos que A. está numa fase triádica da comunicação, mas precisamente na atenção compartilhada, que é a fase mais avançada da intencionalidade, pois o sujeito interage com o seu interlocutor procurando compartilhar experiências com objetos/eventos (neste caso, as receitas do livro).

Assim as interações com cada sujeito foram organizadas e tabuladas como o exemplo apresentado na tabela 1. As ações mediadoras foram organizadas e tabuladas como o exemplo apresentado na tabela 2.

Embora cada sujeito tivesse um processo de desenvolvimento único, mesmo sujeitos com pouca ou nenhuma interação social evoluíram ao longo da pesquisa para níveis de interação na qual a intencionalidade de comunicação era evidenciada.

Com relação à mediação, a estratégia de mediação adotada predominantemente pela pesquisadora nas sessões iniciais foi de controle indireto combinando com direto em algumas situações necessárias. Especialmente foram utilizadas perguntas perceptivas, conceituais e procedimentais, como forma de identificar os conhecimentos prévios dos alunos como apresentamos na figura 5.

Tabela 1: Evolução da Interação Social num conjunto de sessões com o sujeito A2.

Tabela 2: Exemplo de Ações Mediadoras realizadas para e pelo sujeito A1.

Nas últimas sessões, foram utilizadas de forma mais acentuada a renuncia direta, confirmação passiva e afastamento físico, evidenciando um processo de autonomia pelo autocontrole ou auto-regulação dos sujeitos, como pode ser observado na tabela 2. O sujeito inicia na categoria de controle direto, imitando, solicitando ajuda e paulatinamente passa para o controle indireto e

autocontrole valendo-se de perguntas orientadas, modelos e fala dirigida ao mediador. Nas ações mediadoras para o aluno podemos perceber que a estratégia adotada nas primeiras sessões foi uma mistura entre controle direto e indireto através de diretivas, modelo e perguntas conceituais e procedimentais. Mas, posteriormente, a estratégia mais utilizada foi a de perguntas perceptivas,

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embora a mediadora continuasse utilizar todas as outras ações correspondentes ao controle indireto. Apesar de ter a intenção de oferecer maior autonomia ao aluno, em muitas ocasiões a mediadora teve que orientar com um controle direto. Os sujeitos que apresentam um grau mais profundo de autismo

também partiram do controle indireto para identificar os conhecimentos prévios dos mesmos. O afastamento físico não foi utilizado com estes sujeitos, pois, os mesmos requeriam uma presença maior da pesquisadora para manter a atenção focada na atividade que estava sendo realizada.

Figura 5: Modelagem de Processo de Mediação.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS E TRABALHOS FUTUROS

Quando iniciamos a nossa pesquisa pretendíamos verificar como as pessoas com autismo interagiam e participavam de processos de mediação mostrando níveis de auto-regulação. Mas, não somente pudemos compreender esses processos como que uma das principais conseqüências da pesquisa foi que os sujeitos aumentaram

seu nível de interação social e alguns puderam iniciar um processo de inclusão em escolas pois mostraram que seria possível através de uma mediação com um sujeito mais experiente e por meio da utilização de TICs promover a apropriação de estratégias visando à auto-regulação e, portanto, à aprendizagem. Também houve aumento nos níveis de autonomia dos sujeitos que atingiram auto-regulação ou autocontrole indireto. Assim, os processos

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de interação social e de comunicação foram se desenvolvendo e na medida que isso acontecia os níveis de autonomia dos alunos também melhoravam, evidenciando que ambos processos: desenvolvimento cognitivo e interação social se influenciam mutuamente. Estes resultados parecem confirmar que o processo de desenvolvimento do sujeito acontece numa espiral ascendente, iniciando no processo interpessoal (interação social) e passando para o intrapessoal, uma passagem não linear até atingir a auto-regulação, exatamente como Vygtosky [8] previa nas suas pesquisas. Os instrumentos de mediação, especialmente as tecnologias de informação e comunicação mostraram-se eficientes no apoio ao processo de autocontrole dos sujeitos. A metodologia de construção de apoios visuais e auditivas orientada à tarefa e adaptada ao sujeito se mostrou mais eficiente que o uso de manuais ou help on-line disponíveis em cada ferramenta. Isto pode auxiliar na futura construção de sistemas de ajuda inteligentes para suporte à aprendizagem. Um outro resultado da pesquisa e que indica uma linha de trabalho futuro tem a ver com as estratégias de mediação. As ações mediadoras adotadas como estratégias podem ser transformadas e inseridas em ambientes computacionais como o nosso através de agentes (inteligentes). Mas sugerimos que sejam testadas em outras pesquisas envolvendo outros sujeitos antes de serem transformadas em ações de agentes inteligentes. A metodologia de construção de apoios visuais, que comentamos antes, pode contribuir na construção de helps adaptados ao sujeito e à sua aprendizagem. É importante destacar que as estratégias utilizadas (ações mediadoras) não são específicas para o autismo e podem ser aplicadas no processo educativo de outras pessoas principalmente se possuem pensamentos do tipo concreto-visual

Com relação à computação, tivemos resultados diretos relacionados à construção e melhoramento do ambiente Eduquito, já que a metodologia utilizada nesta pesquisa contribuiu para o desenvolvimento do mesmo. Mas também resultados indiretos, pois as categorias encontradas e aprofundadas na pesquisa tanto no relativo com a interação social como com as ações mediadoras podem ser aplicadas no desenvolvimento de ambientes de aprendizagens digitais mais adaptados aos sujeitos sejam estes ou não com necessidades especiais.

A questão da mediação, discutida neste artigo, mostra-se de grande importância no desenvolvimento de processos educativos. Os dados coletados a partir da pesquisa empírica desenvolvido mostram que do ponto de vista pedagógico, o papel do mediador e seu ajuste nas ajudas oferecidas dentro das categorias identificadas de controle, autocontrole e auto-regulação são importantes para a autonomia do aluno e a apropriação do conhecimento. Num processo de educação, muitas vezes “esses ajustes” são feitos no andamento das aulas presenciais a partir da “leitura” do contexto intersubjetivo estabelecido no grupo. Tal contexto contem elementos lingüísticos e extra-lingüísticos que aportam conhecimento sobre a definição

de situação compartilhada. Porém nos ambientes digiais de aprendizagem a “leitura” do contexto intersubjetivo é empobrecida pois as interfaces de tais ambientes são estruturada em torno a elementos linguisticos. Uma das possibilidades de solução é construir sistemas de agentes que permitam detectar aspectos extra-lingüístico a partir de marcadores verbais que possibilitem uma mediação compartilhada entre agentes e humanos. Desta forma, o mediador teria mais tempo para acompanhar o processo de auto-controle dos seus alunos concentrando-se em ajudas qualitativamente superiores buscando a auto-regulação. Para isto estamos atualmente pesquisando alternativas para a formalização e o reconhecimento das estrategias de mediação utilizando conceitos e técnicas da IA Cognitiva e de agentes pedagógicos para promover a mediação compartilhada [17]

Finalmente, gostaríamos de destacar que o uso do computador e em especial de ambientes digitais de aprendizagem acompanhados de estratégias de mediação adequadas e adaptados aos sujeitos mostram relevantes e importantes no desenvolvimento cognitivo e na promoção da interação social de sujeitos com autismo levando em consideração o grau de autismo e as próprias características pessoais dos sujeitos [11]. Principalmente porque os ambientes digitais permitem modelar níveis de complexidade controláveis ajustando o uso do às necessidades de cada sujeito. Em segundo lugar, e como conseqüência do anterior, esses ambientes são suficientemente complexos como para que as pessoas que interagem com eles precisem realizar níveis de abstração diferenciados (interação sujeito-computador, interação sujeito-computador-sujeito) levando a criar modelos mentais. É claro que os modelos mentais representacionais de uma interação homem-máquina são infinitamente mais simples que os modelos mentais necessários para compreender uma relação homem-homem, mas, o computador pode ser o primeiro passo no desenvolvimento de modelos mais complexos.

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EFERÊNCIAS

[1] O. Sacks. Um antropólogo em Marte: sete histórias paradoxais. São Paulo: Companhia das Letras. 1995 [2] P. R. Hobson. El autismo y el desarrollo de la Mente.

Madrid: Alianza Editorial. 1993

[3] J. M. Nash. The Secrets of Autism. In Reportagem TIME 6/05/2002, p.33-42. 2002.

[4] T. Peeters. Autism: From Theoretical Understanding to Educational Intervention. Whurr Publishers. 1998. [5] E. C. Gauderer. Autismo. São Paulo: Livraria Atheneu

Editora. 1993.

[6] R. E. Jordan, S. Powell.. Understanding and Teaching Children with Autism. West Sussex, England: John Wiley&Sons Ltd. 1995

[7] M. E. Sigman, L. Capps. Niños y Niñas autistas. Série Bruner. Madrid: Ediciones Morata. 2000.

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[8] L. S. Vygotsky. Formação Social da Mente. 6º Edição.-São Paulo: Martins Fontes. 1998.

[9] R. Diaz, C. Neal, M. Amaya-Williams. Orígenes sociales de la autorregulación. In Moll, L.C (comp) (1993). Vygotksy y la educación: connotaciones y aplicaciones de la psicologia sociohistórica en la educación. Bs. As.: Aique Grupo Editor. 1993.

[10] L. M. C. Santarosa. Inclusão Digital: espaço possível para pessoas com necessidade educacionais especiais. In: Cadernos de Educação Especial, n° 20. 2002 [11] L. M. Passerino. Pessoas com Autismo em Ambientes

Digitais de Aprendizagem: estudo dos processos de Interação Social e Mediação. Tese de Doutorado, UFRGS. 2005.

[12] P. Watzlawick et al. Pragmática da Comunicação Humana: um estudo dos padrões, patologias e paradoxos da interação. São Paulo: Editora Cultrix. 1967.

[13] M. Tomasello. Origens Culturais da Aquisição do Conhecimento Humano. São Paulo: Marins Fontes. 2003.

[14] J. Werstch. Vygotsky y la formación social de la mente. Serie Cognición y desarrollo humano. Barcelona: Ed. Paidós. 1988.

[15] J. P. Boutinet. Antropologia do Projeto. Porto Alegre: ArtMed, 2002.

[16] C. A. Bosa. Autismo: atuais interpretações para antigas observações. In: Baptista et alli. Autismo e Educação:reflexões e propostas de intervenção. Porto Alegre: ArtMed, 2002, p. 21-40

[17] J. C. Gluz et. R. M. Vicari e C. D Flores. Formal Aspects of Pedagogical Negotiation in AMPLIA System?, in Nedjah, N.; Mourelle, L. M. (Eds.) Intelligent Educational Machines, Series: Intelligent Systems Engineering Book Series. Springer. 2006.

Imagem

Figura 1: Categorias de Mediação no Processo de Regulação.
Figura 2: Categorias de análise da interação social.
Figura 3: Representação da Estrutura e Recursos do Eduquiito.
Figure 4 : Modelo de Análise.
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