• Nenhum resultado encontrado

Pâmela Torres Michelette (Mestranda UNESP/Assis CAPES)

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Pâmela Torres Michelette (Mestranda UNESP/Assis CAPES)"

Copied!
9
0
0

Texto

(1)

II Colóquio da Pós-Graduação em Letras UNESP – Campus de Assis

ISSN: 2178-3683 www.assis.unesp.br/coloquioletras coloquiletras@yahoo.com.br 900 R REEFFLLEEXXÕÕEESSSSOOBBRREEAAFFOONNTTEE HHIISSTTÓÓRRIIAADDOOSSGGOODDOOSS,,VVÂÂNNDDAALLOOSSEESSUUEEVVOOSS,, D DEEIISSIIDDOORROODDEESSEEVVIILLHHAA

Pâmela Torres Michelette (Mestranda – UNESP/Assis – CAPES)

R

REESSUUMMO:O: A elaboração da fonte História dos Godos, Vândalos e Suevos de autoria do bispo Isidoro de Sevilha (560-636), que viveu na passagem do século VI para o VII na Hispania Visigoda, está inserida em um período de transformações, no qual se buscava a unidade religiosa, política, legal, administrativa e de identidade deste reino. Este documento representa para a historiografia alto-medieval uma mudança decisiva em comparação com as produções anteriores, pois a superioridade de Roma não está mais em primeiro plano, evidenciando um sentimento de desvencilhamento da tutela imperial, isto é, apresenta uma visão universal e providencialista no quadro da história dos visigodos. Essa obra é, concomitantemente, um panegírico do povo visigodo e de seus reis – realçando o triunfo sobre o Império Romano – com caráter de história eclesiástica, manifestado por seus aspectos didático-morais e apologéticos.

P

PAALLAAVVRRAASS--CCHHAAVVEE:: Reino Visigodo; Isidoro de Sevilha; monarquia; igreja.

Percebemos que, grosso modo, ocorreu no decorrer do século V, um lento processo de enfraquecimento do poder imperial diante dos poderes regionais que estavam estabelecidos nas diversas regiões do Império Romano Ocidental. Em outras palavras, percebe-se, nesta fase, uma gradual substituição da prioridade política e ideológica do imperador pelo rei germânico, tanto em termos jurídicos como religiosos, o que possibilitou a fragmentação do Império em novas unidades políticas e religiosas. Não obstante, a mudança de fato do poder político, ocorrida em um contexto geral, tornou-se completa em aspectos ideológicos após a conversão desses reis ao catolicismo de Niceia e com a consequente oficialização desta religião no interior dos respectivos reinos. Neste sentido, a tarefa teorizante realizada pela Igreja no Ocidente teve uma vertente sacralizadora desses governantes.1 Esse apoio clerical à instituição

1

Deve-se ressaltar que, apesar dessa vertente sacralizadora, a assimilação pelos príncipes cristãos das competências que pertenciam normalmente aos clérigos tinha certos limites. A simbiose entre a função real e a função sacerdotal no mundo cristão não teria nunca sido completa e jamais poderia sê-lo. O sacerdócio comportaria, no entender de um católico, privilégios de ordem supraterrestre perfeitamente definidos e que só a ordenação conferiria. De acordo com M. Bloch, nenhum monarca na Idade Média jamais se creu capaz de celebrar o santo ofício da missa e, consagrando o pão e o vinho, de invocar a presença de Deus no altar. Outras civilizações, a antiga Germânia, a Grécia dos tempos homéricos, teriam conhecido reis-sacerdotes; na cristandade medieval, a existência desta dignidade híbrida seria inconcebível. (BLOCH, 1993, p. 186)

(2)

901

régia foi de fundamental importância para o fortalecimento da figura do rei dentro de seu reino.

No caso visigodo percebemos que sua história política esteve vinculada a sua história religiosa bem como as suas relações com o Império Romano. Visto que, uma vez estabelecidos no interior das fronteiras romanas conseguiram manter certa independência política e social, muito em virtude de terem-se convertido ao arianismo (AGUILERA, 1992, p. 13). Este fato, possibilitou a manutenção de certa autonomia, subtraindo mais facilmente a ação unificadora e centralizadora dos imperadores romanos e da Igreja oficial. Posteriormente, com o “desaparecimento” do Império Romano do Ocidente e a consolidação dos visigodos como povo independente, desenvolveu-se a última fase da conversão oficial. Esta se concretizou devido à necessidade de unidade do respectivo reino (VALVERDE CASTRO, 2000, p. 17-68).

Neste sentido, o objetivo deste trabalho é identificar como o ambiente do reino visigodo, no século VII, influenciou a construção de algumas das ideias políticas de Isidoro de Sevilha2 na elaboração de sua obra História dos Godos3. Pois, acreditamos que este bispo procurou estabelecer, em alguns de seus trabalhos, uma conduta moral direcionada à monarquia visigoda. Ou seja, desenvolveu uma concepção teológica política vinculada ao princípio de que a realeza4 está a serviço da

Igreja, portanto, inserida no plano da salvação.

A noção cristã de realeza no reino visigodo alcançou sua plena maturidade no século VII, tanto em virtude das definições da doutrina política isidoriana como da obra legislativa levada a término pelos concílios gerais de Toledo (VIVES, 1963). Todo esse processo se iniciou com o III Concílio de Toledo (589) – que foi uma iniciativa do rei Recaredo (568-601) e da Igreja –, episódio de fundamental importância para a compreensão dessas mudanças, pois, esse sínodo marcou a oficialização do catolicismo niceísta como religião oficial do reino visigodo. Além disso, percebemos que a essa conversão conferiu um novo caráter à Monarquia, contudo esta ainda não alcançou uma consolidação e estabilidade total no reino.

2

Isidoro de Sevilha (560-636). Pertenceu a uma família católica de origem bizantina ou hispano-romana. Como bispo de Sevilha, o irmão de Isidoro, Leandro de Sevilha, foi o instrumento decisivo para conseguir a renúncia oficial ao arianismo dentro do reino visigodo, proclamada no III Concílio de Toledo. Isidoro sucedeu a Leandro como bispo por volta de 600 e, durante o seu bispado, Sevilha desfrutou de preeminência como centro intelectual do reino visigodo (LOYN, 1997).

3 ISIDORO DE SEVILHA. Historia Gothorum, Vandalorum et Suevorum. Ed. Bilíngue (Latim-Espanhol) de C. Rodriguez Alonso. Leon: Centro de Estúdios y Investigación "San Isidoro", 1975.

4

Uma boa noção de sacralidade é o verbete de V. Valeri, “Realeza”. Aqui, Valeri afirma que o que define a Realeza é o fato de que no exercício de suas prerrogativas, o rei encarnaria os valores fundamentais da sociedade sobre a qual ele reina, sendo considerado como um ser sagrado e às vezes divino: “Mesmo quando o rei não é sagrado stricto sensu, ele tem relações privilegiadas com aquilo que é sagrado: Deus ou clérigo que é seu intérprete” (VALERI, 1994, p. 415).

(3)

902

A asserção acima se deve, entre outros fatores, à ambição da nobreza em tomar o poder, pois apesar dos reis serem considerados a cabeça da organização judicial, financeira, administrativa, militar e inclusive religiosa do reino visigodo, eles foram forçados, devido às necessidades de governar, a delegar parte de suas competências organizacionais com os nobres, que passaram a ocupar certos “cargos públicos”. Em termos práticos, podemos afirmar que, um dos caminhos para apontarmos o status de uma família aristocrática laica era a sua capacidade de inserção na corte régia.

Contudo, o que verdadeiramente determinava a importância política da nobreza era a sua força econômica e social, que gradualmente foi aumentando à medida que os monarcas a recompensavam pelos serviços prestados com a entrega de terras, homens e bens móveis, na tentativa de criar vínculos de dependência pessoal que assegurassem a fidelidade desse grupo ao soberano. Entretanto, tendo em mãos a possessão de extensos domínios e muitos homens que neles habitavam, a nobreza dispunha de poder suficiente para defender seus próprios interesses, ficando evidente que tanto os reis como os nobres embasaram sua força nas mesmas fontes de riqueza, o que necessariamente originava a busca, de ambas as partes, pelo controle das mesmas (VALVERDE CASTRO, 2000, p. 255-275).

Portanto, as contestações das facções nobiliárquias relacionadas às tentativas de centralização empreendidas pelos monarcas pode ser apontada como um dos fatores que refletiram essa necessidade de afirmação da Monarquia visigoda, na primeira metade do século VII (FRIGHETTO, 2000, p. 30-32.). A insubmissão da nobreza visigótica desestabilizou, em alguns momentos, a capacidade centralizadora do poder real debilitando a posição do rei. E mais, não podemos nos esquecer que, a instituição da realeza não se fundamentava teoricamente sobre o direito de sangue, mas sim sobre a eleição que era realizada pela nobreza e os bispos que designavam, em comum acordo, o sucessor ao trono.

Já o episcopado visigodo tem um comportamento paradoxal que, por um lado, fortalece a Monarquia com a formulação da doutrina teocrática e, por outro, junto à nobreza laica, constituía um poder limitador da autoridade real. Condição que se consolidou com a abjuração do arianismo no III Concílio de Toledo. Tal episódio não foi apenas uma mera mudança de crenças religiosas, provocou também uma radical alteração nas relações que mantinham Igreja e Monarquia, que teve importantes consequências para ambas. No terreno econômico, a conversão provocou um notável aumento do patrimônio eclesiástico. No âmbito político abriu-se caminho para a

(4)

903

intervenção do poder eclesiástico em assuntos civis, obtendo o clero paulatinamente uma maior participação na vida política do reino (VALVERDE CASTRO, 2000, p. 256.). A partir destas circunstâncias, a Igreja sentiu a necessidade de elaborar teorias e práticas político-religiosas que começaram a se desenvolver diretamente com a conversão dos reis ao catolicismo, que foram se aperfeiçoando até o fim do reino visigodo em 711 (VALVERDE CASTRO, 2000, p. 256.). Acreditamos que Isidoro de Sevilha, através de alguns de seus trabalhos, foi um dos principais responsáveis pela construção da teoria política relativa à Monarquia visigoda, bem como a solidificação e normatização dessa instância de poder.

Como vimos, o sevilhano viveu durante um período de transformações no qual se buscava a unidade religiosa, política, legal, administrativa e de identidade do reino. Esse ambiente teve forte influência na construção de suas ideias. Em razão de sua força e de sua riqueza intelectual e episcopal exerceu uma preeminência sobre o reino visigodo e seus príncipes (FONTAINE, 2002, p. 99.).

Dentro desse panorama histórico, percebemos que a doutrina e os conceitos políticos formulados por Isidoro de Sevilha foram uma tentativa de traçar o perfil de príncipe ideal, espelhando-se, inicialmente, em Recaredo. Rei que oficializou o cristianismo e que para o sevilhano reunia as principais características favoráveis de um bom governante, desse modo, esta elaboração consistiria em um modelo de conduta governamental político-religiosa a ser seguido pelos reis que o sucedessem (ORLANDIS, 1993, p. 55-64). Como podemos observar abaixo:

[Recaredo] Fue apacible, delicado, de notable bondad, y reflejó en su rostro tan gran benevolencia y tuvo en su alma tan gran benignidad, que influía en los ánimos de todos e, incluso, se atraía el efecto y el cariño de los malos; fue tan liberal, que restituyó a sus legítimos dueños los bienes de los particulares y las propiedades de las iglesias, que el error de su padre había asociado al fisco. Fue tan clemente, que muchas veces exoneró al pueblo de los tributos con indulgente liberalidad. Enriqueció a muchos con bienes y elevó a muchos con honores, guardando sus riquezas en los míseros y sus tesoros en los necesitados, sabedor de que el reino le había sido encomendado para disfrutar de él con miras a la salvación, alcanzando con buenos principios un buen fin; y así, la fe de la verdadera gloria, que recibió al principio de su reino, la acrecentó, hace muy poco tiempo, con la profesión pública de arrepentimiento. Pasó a mejor vida, en paz, en Toledo. Reinó Recaredo durante quince años (SEVILHA, 1975, p. 55-56.).

Devido a sua posição no seio da hierarquia eclesiástica, o bispo sevilhano foi um expectador privilegiado da sociedade visigótica, visto que conviveu com muitos dos

(5)

904

reis5 descritos em sua obra História dos Godos, exercendo uma espécie de “tutela” no

reino (REYDELLET, 1981, p. 554). Não há dúvida, de que a doutrina política de Isidoro resulta de seu contato com a realidade política e social do reino visigodo (RIBEIRO, s/d., p. 104).

Neste sentido, percebemos que o perfil do rei visigodo-católico foi desenhando-se progressivamente pelos eclesiásticos e concílios de inspiração doutrinal isidoriana, até compor uma imagem bastante acabada. Recaredo, o precursor, encarnou suas virtudes, porém não faltaram no século VII outros soberanos que foram considerados por seus contemporâneos e pelo bispo de Sevilha como virtuosos governantes e exemplares príncipes católicos (ORLANDIS, 1993, p. 63-64).

O grande problema que se coloca a Isidoro de Sevilha, e a seus contemporâneos, é saber qual caminho tomar depois da conversão de Recaredo. Em outros termos: qual o significado da realeza em uma sociedade cristã? Não se tratava apenas de definir as relações entre Igreja e a Monarquia no momento em que esta última procurava seu caminho. Era importante revesti-la de uma justificação ideológica (RIBEIRO, s/d., p. 109).

O pensamento político do bispo sevilhano repousa no princípio de que a realeza está a serviço da Igreja. Neste sentido, a Monarquia não era vista mais como uma falsa imitação do Império, mas sim como uma instituição a serviço da causa cristã, segundo a vontade de Deus (RIBEIRO, s/d., p. 106). Desta forma, há duas fontes de poder para a concepção de realeza de Isidoro: Deus e o povo cristão. É Deus quem dá o poder, mas o rei é também convocado pela comunidade de fiéis. O rei apresenta, no domínio laico, o sinal da unidade orgânica do povo, da mesma maneira que o bispo o é no plano espiritual. Temos, assim, uma realeza fundada, não nas pessoas, mas na comunhão de fiéis (REYDELLET, 1981, p. 592-593). Tal sistema político parte da afirmação de que a Igreja constitui o regnum Christi. O que permite afirmar, segundo M. Reydellet (1981, p. 557), que a teologia política de Isidoro era cristológica por excelência.6

5

Recaredo (568-601); Liuva II (601-603); Witérico (603-610); Gundemaro (610-612); Sisebuto (612-621); Recaredo II (612); Suintila (621-631); Sisenando (631-636).

6 O sistema político-religioso isidoriano parte da afirmação de que a Igreja constitui o regnum Christi e, portanto, da realeza de Cristo. Diferente da concepção de Monarquia divina, que servia de fundamento ao antigo poder imperial romano.

(6)

905 E

Elleemmeennttoossccoonntteexxttuuaaiissddaaffoonnttee::

A História dos Godos, Vândalos e Suevos de Isidoro de Sevilha representa para a historiografia alto-medieval uma mudança decisiva em comparação com as produções anteriores, pois a superioridade de Roma não está no plano divino. Aparece aqui o sentimento de um povo totalmente desvencilhado da tutela imperial, isto é, apresenta uma visão universal e providencialista no quadro da história dos visigodos (ALONSO, 1975, p.11). Esta concepção de independência considera que os destinos da Península já estavam indissoluvelmente ligados aos godos, que já haviam instaurado uma monarquia e alcançado uma unidade religiosa e territorial (ALONSO, 1975, p.19).

Segundo C. R. Alonso (1975, p.22), essa obra é, concomitantemente, um panegírico do povo visigodo e de seus reis – realçando o triunfo sobre o Império Romano – com caráter de história eclesiástica, evidenciado por seus aspectos didático-morais e apologéticos. Do ponto de vista técnico, o tratado apresenta, em geral, as características de uma obra medieval. É original nas narrações dos reinados mais próximos cronologicamente do autor, os de Recaredo (568-601), Liuva II (601-603), Witerico (603-610), Gundemaro (610-612), Sisebuto (612-621), Recaredo II (621) e Suintila (621-631), para os demais seguiu de uma modo bastante literal as fontes: a continuação da Crônica de Eusébio por Jerônimo, até o ano 378; as Histórias de Orosio, até o ano 417; a Crônica de Hidácio, para o que se refere a Espanha entre os anos 379-469; a de Victor Tunnense, para a história dos vándalos na África nos anos 444-566; a Crônica de Próspero, para os anos 405-453; a Crônica de João de Bíclaro, para o período que vai desde 569-590; a Crônica de Máximo de Zaragoza, perdida em partes, para os acontecimentos relacionados aos francos (ALONSO, 1975, p.21).

É digno de nota ressaltar que A História dos Godos possui duas redações bem distintas em seu conteúdo, uma curta e uma longa. A curta, é a mais antiga, contém um número escasso de códices e termina no ano de 619, já a versão longa possui um número maior de códices e se finaliza no ano de 624. A versão longa, a mais recente, é uma obra consagrada pelo elogio aos godos, as suas origens bíblicas (Gog e Magog, e não mais os escitas da versão curta), a celebração da vitória definitiva de Suintila (621-631) sobre os bizantinos. Podemos identificar três elementos diferenciadores das duas versões. A versão longa possui um prólogo (Laus Spaniae) e um epílogo (Recapitulatio ou Laus Gothorum), mais capítulos com outras informações de conteúdos diversos e sentido completo em si mesmos, que a curta não contêm (ALONSO, 1975, p.27). Outra característica da versão longa, é que esta tem mais

(7)

906

aspectos de história eclesiástica que narra as vicissitudes do catolicismo frente ao arianismo até o triunfo desse com a conversão do rei Recaredo.

Ambas as versões possuem um apêndice, que se manteve sem alterações nas duas versões, sobre a História dos Vândalos e dos Suevos. Uma possível razão pode ter sido em decorrência de ressaltar a história dos visigodos, outros motivos se devem a estes dois povos serem co-habitantes temporais dos visigodos na Península e nas relações que estes três povos mantiveram. Na História dos Vândalos e dos

Suevos a história eclesiástica também foi tratada no mesmo plano de interesse que a

história política (ALONSO, 1975, p. 20).

Como já foi dito, a versão longa conclui com uma Recapitulação, que constitui um elogio das virtudes e das proezas dos visigodos. E, sobretudo, precedida por um (Alabanza de Hispania – Laus Spaniae) elogio a Hispania, que contrasta com todo o restante de suas obras, pelo refinamento da prosa artística, ao mesmo tempo oratória e poética. Este Elogio mescla os ritmos da prosa oratória e do estilo sinonímico isidoriano com ecos de temas e palavras tomadas da poesia romana – desde Virgílio a Prudêncio –, assume a favor da Espanha a prolongada tradição latina dos “elogios de províncias”.

Isidoro na datação utiliza o termo “era”, agregando os reinados dos imperadores e por último dos reis visigodos. O bispo não foi fiel, em diversos momentos e omite em outros fatos importantes de alguns reinados. Foi tendencioso em algumas de suas analises, ressaltando alguns reinados e discriminando outros uns como bons exemplos e outros maus exemplos a serem seguidos. Desta forma, podemos perceber que houve uma intencionalidade na seleção das fontes, levando o autor a retirar delas aquilo que melhor se adaptava a sua intenção, em prejuízo de notícias mais interessantes para a compreensão dos fatos.

Por outro lado, não podemos julgar o trabalho de um historiador medieval com critérios anacrônicos. Sucessos que apresentam um interesse mais que local e atuações pouco mais que anedóticas formavam parte importante da história medieval: o milagre, o castigo providencial etc., interpretam-se como fatos históricos. A história era, para Isidoro de Sevilha, como para qualquer homem de sua época, uma trama de sucessos humanos e de portentos divinos. Esta sua concepção o levou a selecionar fatos que continham um estímulo ou consequência moral, já como causas da ação divina, já como instrumentos de sua mesma justiça, determinando algumas vezes o prêmio ou o castigo e sendo outras execuções desta ou aquela decisão divina (FONTAINE, 2002, p. 230-233).

(8)

907

Para J. Fontaine (2002, p.171-172), a tese fundamental de Isidoro de Sevilha nesta crônica é provar que os visigodos superaram os romanos pela antiguidade de sua descendência, apoiando-se, na versão curta, pela assimilação aos escitas, cujo reino era considerado como o mais antigo de todos. Todavia, a versão longa, o bispo coloca os visigodos como os descendentes de Magog, que foi neto de Noé e filho de Jafé (BÍBLIA DE JERUSALÉM, Gn 10.1-2). Esses posicionamentos do bispo sevilhano com relação ao reino fortalecem nossa pesquisa, principalmente para dar base na construção do pensamento ideológico que este autor presente e participante de seu tempo desenvolveu. Estas concepções que Isidoro de Sevilha desenvolveu na maior parte de seus escritos demonstram não apenas as preocupações e anseios de um indivíduo isolado, mas os desejos e temores também do restante do corpo, em sua maioria, que compõe a Igreja hispano-visigoda e a instituição monárquica.

R

Reeffeerrêênncciiaassbbiibblliiooggrrááffiiccaass

AGUILERA, Abilio Barbero. El pensamiento político visigodo y las primeras unciones regias en la Europa medieval. In: IDEM. La sociedad visigoda y su entorno histórico. Madrid: XXI siglo veintiuno de España, 1992, p. 01-77.

BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulus. 3ª impressão. 2004

BLOCH, Marc. Os reis Taumaturgos. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

FONTAINE, J. Isidoro de Sevilla: Génesis y originalidad de la cultura hispánica en

tiempos de los visigodos. Madrid: Encuentro, 2002.

FRIGHETTO, R. Cultura e Poder na Antiguidade Tardia Ocidental. Curitiba: Juruá, 2000, p. 30-32.

ISIDORO DE SEVILHA. Historia Gothorum, Vandalorum et Suevorum. Ed. Bilíngue (Latim-Espanhol) de C. Rodriguez Alonso. Leon: Centro de Estúdios y Investigación "San Isidoro", 1975.

LOYN, H. R. Dicionário da Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

ORLANDIS, J. “El rey visigodo catolico”. In: AA. VV., De la Antiguedad al Medievo –

Siglos IV-VIII. III Congreso de Estudios Medievales. sl.: Fundacion Sanchez Albornoz,

(9)

908

REYDELLET, M. La royauté dans la litterature latine de Sidonio Apollinaire à Isidore de

Séville. Roma: École Française de Rome – Palais Farnése, 1981.

RIBEIRO, D. V. A sacralização do Poder Temporal: Gregório Magno, e Isidoro de Sevilha. In: Souza, José Antônio de C. R. (org.). O Reino e o Sacerdócio – O

pensamento político na Alta Idade Média, s/d. p. 91-112.

VALERI, V. “Realeza”. In: R. Romano (ed). Enciclopédia Einaudi. Religião-Rito, Lisboa: Casa da Moeda, 1994, v. 30, p. 415-445.

VALVERDE CASTRO, M. R. Ideologia, simbolismo y ejercicio del poder real en la

monarquía visigoda: un proceso de cambio. Salamanca: Ediciones Universidad de

Salamanca, 2000.

VIVES, J. (Ed.) Concílios Visigóticos e Hispano-Romanos. Barcelona/Madrid: CSIC, 1963.

Referências

Documentos relacionados

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

Isso será feito sob o ponto de vista dos conceitos apresentados pelo físico Serge Nahon, em “ Contribuição ao Estudo das Ondas de Formas a Partir da Mumificação

De qualquer modo, espero que os fu- turos responsáveis governativos perce- bam, de uma vez por todas, que todas as soluções para os problemas da Justi- ça passam por auscultar com

Preferencia não embutido Não adequado Não adequado Aço inoxidável Não embutidas (g) Não adequado Não adequado Não adequado a) Não adequado a) Ferro fundido (1)

A monitorização do sistema de distribuição de água tem como objectivo poder prever os possíveis fenó- menos de incrustação e de corrosão na tubagem das redes, permitindo

Thereby the goal of this paper is to recognize gamma-ray signatures of the main volcanic rocks of Paraná Basin, using a portable gamma-spectrometer, getting data in

seus representantes devidamente credenciados, assim como pela utilização da senha de acesso ao sistema, ainda que indevidamente, inclusive por pessoa não credenciada como

ideologia
preservacionista
é
utilizada
para
garantir
a
reprodução