Eletromagnetismo I
Cap. 5: Magnetostática
5.1: Campo magnético e força magnética Prof. Marcos Menezes
Instituto de Física - UFRJ
5.1 – Campo magnético e força magnética
5.1.1 – Campo magnético
Até aqui, estudamos os fenômenos produzidos por cargas elétricas em repouso. Vamos começar a discutir agora o que acontece quando as cargas estão em movimento.
Na eletrostática, definimos o campo elétrico produzido por uma distribuição de cargas em repouso da seguinte forma:
Distribuição de cargas
𝐅
𝑒= 𝑄𝐄
• Distribuição de cargas produz 𝐄, que altera as propriedades do espaço ao seu redor.
• 𝐄 é sentido por meio da força elétrica 𝐅𝑒 que exerce sobre uma carga de teste puntiforme 𝑄 num dado ponto.
Analogamente, o campo magnético é definido da seguinte forma:
Fonte de campo magnético (a ser discutida)
• Alguma fonte produz um campo magnético 𝐁, que altera as propriedades do espaço ao seu redor.
• 𝐁 é sentido por meio da força elétrica 𝐅𝑚 que exerce sobre uma carga de teste puntiforme 𝑄 em movimento num dado ponto.
• A lei de força, verificada experimentalmente, é um pouco mais complicada.
• Veremos adiante que as fontes de 𝐁 são cargas em movimento (correntes)!
𝐅
𝑚= 𝑄 (𝐯 × 𝐁)
𝐯
: velocidade de 𝑄Propriedades da força magnética:
• Módulo: 𝐹𝑚 = 𝑄 𝐯 × 𝐁 = 𝑄𝑣𝐵 sen 𝜑
• Direção e sentido: regra da mão direita + sinal de 𝑄
• Note que 𝐹𝑚 = 0 se 𝑣 = 0 ou se 𝐯 tiver a mesma direção de 𝐁!
• Unidade de B no SI: 𝐵 = 𝐹𝑚
𝑄 𝑣 = 𝑁
𝐶.𝑚/𝑠 = 𝑁
𝐴.𝑚 ≡ 𝑇 (Tesla)
Exemplos de campos magnéticos (representação com linhas de campo):
Barra imantada
(Ferromagneto) Terra
• A bússola é formada por uma agulha imantada (pequeno dipolo magnético) que se orienta no sentido local de 𝐁.
• Note que as linhas de 𝐁 são fechadas, diferentemente das linhas de um campo eletrostático. O que isto significa?
Imagens: Física 3 – Young & Freedman
Correntes como fontes de campo magnético
Imagens: Física 3 – Young & Freedman
(i) Aspectos gerais:
5.1.2 – Movimento de partículas carregadas sob a ação de um campo eletromagnético
(ii) Movimento circular em 𝐁 uniforme (movimento de cíclotron):
• Se a velocidade inicial 𝐯0 é perpendicular a 𝐁, o movimento fica confinado a um plano.
• Como a força magnética 𝐅𝑚 é perpendicular à 𝐯, o movimento resultante é circular uniforme!
Raio da trajetória
𝐹
𝑚= 𝐹
𝑟𝑒𝑠|𝑞| |𝐯 × 𝐁| = 𝑚𝑣
2𝑅 𝑅 = 𝑚𝑣
⇒ |𝑞|𝐵
Pela 2ª lei de Newton (aplicada ao movimento de rotação):
Velocidade angular e frequência de ciclotron
𝜔 = 𝑣
𝑅 = 𝑞 𝐵 𝑚
Aplicações: aceleradores de partículas, magnétron (forno microondas), etc...
𝑓 = 1
𝑇 = 𝜔
2𝜋
(iii) Movimento helicoidal em 𝐁 uniforme:
Aplicações: garrafões magnéticos (confinamento de partículas carregadas), aurora boreal/austral Eixo da hélice
(direção de 𝐁)
• Se a velocidade inicial 𝐯0 possui uma componente 𝑣∥ paralela a 𝐁, o movimento deixa de ser planar.
• Como a força magnética 𝐅𝑚 é perpendicular à 𝐁, não há aceleração nessa direção e 𝑣∥ = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡 (MRU).
• No plano perpendicular à 𝐁, a partícula executa um MCU com velocidade escalar 𝑣⊥.
• Trajetória resultante é uma hélice!
Passo da hélice (distância horizontal percorrida ao longo de um período de revolução):
ℎ = 𝑣
∥𝑇 = 2𝜋𝑚 𝑣
∥|𝑞|𝐵
(iv) Movimento em campos 𝐄 e 𝐁 cruzados e uniformes:
Considere uma partícula de carga 𝑄 > 0 e massa 𝑚 inicialmente em repouso na origem. Como será seu movimento em uma região com os campos 𝐄 e 𝐁 abaixo (ambos uniformes)?
Qualitativamente:
1. A partícula é inicialmente acelerada no sentido de 𝐄 2. Ao adquirir velocidade, sua direção de movimento é
desviada por 𝐁
3. Quando sua velocidade passa a ter sentido contrário a 𝐄, ela é freiada até retornar ao repouso.
4. Movimento é reiniciado, voltando ao passo (1).
Pode-se mostrar (ver livro texto) que a trajetória resultante é uma cicloide! A partícula se move como se estivesse na periferia de um tambor cilíndrico rolando sem deslizamento sobre o eixo 𝑌!
Caso particular (filtro de velocidades): Suponha agora que a partícula tem velocidade inicial
𝐯 0 =
EB
𝐲 ො
. Como será a sua trajetória?5.1.3 – Corrente elétrica
Considere um fio condutor retilíneo e suponha que as cargas livres em seu interior são positivas:
• Para estabelecer o movimento de cargas no interior do condutor, devemos ter um campo elétrico 𝐄 não-nulo nele.
• Por isso, o condutor deve estar fora do equilíbrio!
• 𝐯 é a velocidade média dos portadores sob a ação de 𝐄 (velocidade de arraste).
Corrente elétrica: quantidade de carga positivaque atravessa uma seção transversal do fio por unidade de tempo
𝐼 = 𝑑𝑄 𝑑𝑡
Unidade SI: Ampère (A) = C/s
O que muda para portadores de carga negativa, como o elétron?
• Cargas negativas se movem em sentido contrário a 𝐄
• Como um fluxo de cargas negativas para a esquerda é equivalente a um fluxo de cargas positivas para a direita (de mesma intensidade), a corrente deve ter o mesmo sentido!
OBS: Embora estejamos atribuindo um sentido para a corrente nessa situação, note que ela é definida como uma grandeza escalar! Discutiremos as sutilezas por trás disso a seguir.
Dimensionalidade e densidade de corrente
1D: Cargas se movendo ao longo de uma linha (fios com espessura pequena)
𝑑𝑄 = 𝜆𝑑𝑙 = 𝜆𝑣𝑑𝑡 𝐼 = 𝑑𝑄
𝑑𝑡 = 𝜆𝑣
⇒
OBS: O livro-texto define um “vetor corrente” neste caso a partir do vetor velocidade 𝐯 dos portadores. Embora isso seja permissível neste caso (todos os portadores em uma seção transversal do fio se deslocam no mesmo sentido), esta não é uma definição conceitualmente adequada, como veremos nos próximos casos.
2D: Cargas se movendo sobre uma superfície
𝑑𝑄 = 𝜎𝑑𝐴 = 𝜎𝑑𝑙
⊥𝑑𝑙
∥= 𝜎𝑑𝑙
⊥𝑣𝑑𝑡
⇒
A corrente infinitesimal 𝑑𝐼 que flui na tira em destaque pode ser calculada como:
𝑑𝐼 = 𝑑𝑄
𝑑𝑡 = 𝜎𝑣 𝑑𝑙
⊥Isso nos motiva a definir um vetor densidade superficial de corrente:
𝐾 ≡ 𝑑𝐼
𝑑𝑙
⊥= 𝜎𝑣 ⇒ 𝐊 = 𝜎𝐯
Note que podemos definir um vetor 𝐊 pois esta é uma quantidade local!
A corrente total pode ser calculada como:
onde 𝐧ෝ é um unitário normal à superfície e a integral é feita sobre uma linha 𝐶 qualquer ao longo da superfície.
𝐼 = න
𝐶
𝐾𝑑𝑙
⊥= න
𝐶
𝐊 × ෝ 𝐧 ⋅ 𝑑𝐥 = න
𝐶
𝐊 ⋅ ෝ 𝐧 × 𝑑𝐥
• Note que a corrente é expressa como uma integral, portanto representa uma quantidade global. Por essa razão, não é conceitualmente correto defini-la como um vetor!
• A última integral na expressão acima mostra que apenas a componente de 𝐊 na direção perpendicular à 𝐶 contribui para a corrente que flui através dessa linha.
3D: Cargas se movendo dentro de um volume
𝑑𝑄 = 𝜌𝑑𝑣 = 𝜌𝑑𝐴
⊥𝑑𝑙
∥= 𝜌𝑑𝐴
⊥𝑣𝑑𝑡
⇒
A corrente infinitesimal 𝑑𝐼 que flui no tubo em destaque pode ser calculada como:
𝑑𝐼 = 𝜌𝑣 𝑑𝐴
⊥Isso nos motiva a definir um vetor densidade volumétrica de corrente:
𝐽 ≡ 𝑑𝐼
𝑑𝐴
⊥= 𝜌𝑣 ⇒ 𝐉 = 𝜌𝐯
Mais uma vez, podemos definir um vetor 𝐉 pois esta é uma quantidade local.
A corrente total pode ser calculada como:
onde a integral é feita sobre uma superfície 𝑆 qualquer (por exemplo, a seção transversal de um fio).
𝐼 = න
𝑆
𝐽𝑑𝐴
⊥= න
𝑆
𝐉 ⋅ 𝑑𝐀
• Note que a corrente representa o fluxo de 𝐉 através de uma superfície 𝑆!
• A última integral na expressão acima mostra que apenas a componente de 𝐉 na direção perpendicular à 𝑆 contribui para a corrente.
(a) Se a distribuição é uniforme, podemos calcular 𝐾 pelo valor médio:
𝐾 ≡ 𝑑𝐼
𝑑𝑙
⊥= 𝐼
𝐿 = 𝐼 2𝜋𝑎
(b) Neste caso, temos 𝐽 = 𝐽 𝑠 = 𝐶/𝑠, onde 𝐶 é uma constante a ser determinada e 𝑠 é a distância até o eixo do fio.
A corrente total que flui sobre uma seção transversal 𝑆 do fio pode ser calculada como:
𝐼 = න
𝑆
𝐉 ⋅ 𝑑𝐀 = න
𝑆
𝐽𝑑𝐴
⊥A seção transversal é um disco de raio 𝑎. Podemos representar um elemento de área infinitesimal desta superfície em coordenadas cilíndricas como:
𝑑𝐴
⊥= 𝑑𝑠 𝑠𝑑𝜙
Com isso:
𝐼 = න
𝑆
𝐽𝑑𝐴
⊥= න
0 𝑎
න
0 2𝜋
𝐽 𝑠 𝑠𝑑𝑠𝑑𝜙 = 2𝜋 න
0 𝑎
𝐽 𝑠 𝑠𝑑𝑠
= 2𝜋 න
0 𝑎
𝐶
𝑠 𝑠𝑑𝑠 = 2𝜋𝐶𝑎 𝐶 = 𝐼
⇒ 2𝜋𝑎 𝐽(𝑠) = 𝐼
⇒ 2𝜋𝑎𝑠
Note que 𝐾 tem dimensão de corrente por unidade de comprimento e 𝐽 de corrente por unidade de área!
Força magnética sobre correntes
Correntes são cargas em movimento, logo devem sentir a ação de forças magnéticas!
𝑑𝐅
𝑚= 𝑑𝑄 𝐯 × 𝐁 ⇒ 𝐅
𝑚= න
𝑑𝑖𝑠𝑡𝑟𝑖𝑏
𝑑𝐅
𝑚= න
𝑑𝑖𝑠𝑡𝑟𝑖𝑏
𝑑𝑄 𝐯 × 𝐁
onde a integral se estende por toda a distribuição de correntes.
2D:
𝑑𝑄 = 𝜎𝑑𝐴 e 𝐊 = 𝜎𝐯 ⇒ 𝐅
𝑚= න
𝑆
(𝐊 × 𝐁) 𝑑𝐴
3D:
𝑑𝑄 = 𝜌𝑑𝑣 e 𝐉 = 𝜌𝐯 ⇒ 𝐅
𝑚= න
𝒱
(𝐉 × 𝐁) 𝑑𝑣
1D:
𝑑𝑄 = 𝜆𝑑𝑙 e 𝐼 = 𝜆𝑣 ⇒ 𝐅
𝑚= න
𝐶
𝐼 (𝑑𝐥 × 𝐁)
Para fazer a integral, observamos a dimensionalidade da distribuição e utilizamos a densidade de corrente apropriada:
Utilizando a expressão apropriada para um fio (1D):
𝐅
𝑚= න
𝐶
𝐼 (𝑑𝐥 × 𝐁)
Como 𝐁 é uniforme e 𝐼 é constante, podemos retirá-los da integral:
𝐅
𝑚= 𝐼 න
𝑖𝑚𝑒𝑟𝑠𝑜
𝑑𝐥 × 𝐁
e a integral se estende apenas sobre a porção de 𝐶 imersa no campo.
Note agora que:
න
𝑖𝑚𝑒𝑟𝑠𝑜
𝑑𝐥 = Δ𝐋
= vetor que conecta as extremidades da porção de fio imersa no campo, orientado no sentido da correnteAssim:
𝐅
𝑚= 𝐼Δ𝐋 × 𝐁
Portanto, se o campo aponta para dentro da tela, 𝐅𝑚 aponta para baixo.
Seu módulo é:
Perguntas adicionais:
• 𝐅𝑚 tende a deslocar o circuito para baixo. A força magnética (resultante) está realizando trabalho nessa situação?
Se não, quem está? (veja o exemplo 5.3 do livro-texto)
• O que mudaria se a região do campo tivesse um formato irregular, mas permanecesse uniforme?
|𝐅
𝑚| = 𝐼 Δ𝐋 𝐁 = 𝐼𝑤𝐵
Referências básicas
• Griffiths (3ª edição) – cap. 5