Eletromagnetismo I
Cap. 2: Eletrostática
2.1: Campo elétrico
Prof. Marcos Menezes
Instituto de Física - UFRJ
2.1 – Campo elétrico
2.2.1 - Lei de Coulomb (1784)
Força elétrica que uma carga puntiforme 𝑞 em repouso exerce sobre outra carga puntiforme 𝑄:
(permeabilidade elétrica do vácuo)
• 𝑞𝑄 > 0 (cargas de mesmo sinal): repulsão
• 𝑞𝑄 < 0 (cargas de sinais opostos): atração Verificação experimental:balança de torção
2.1.2 - Campo elétrico
Pelo princípio da superposição, a força resultante que as cargas 𝑞1, 𝑞2, … exercem sobre a carga de teste 𝑄 vale:
Distribuição de cargas (discreta)
OBS: Lembre que o princípio da superposição não é óbvio. Ele vem de uma verificação experimental!
Podemos reescrever o resultado anterior como:
onde:
é o campo elétrico produzido pela distribuição no ponto P onde a carga 𝑄 é posicionada.
Distribuição de cargas (discreta)
Note que:
• 𝑬 depende da posição 𝒓 no espaço
• 𝑬 não depende da magnitude nem do sinal da carga de prova 𝑄, sendo portanto uma propriedade apenas da distribuição (no limite 𝑄 → 0)
• O princípio da superposição também vale para campos elétricos.
Interpretação física: distribuição de cargas produz um campo elétrico 𝑬, que “preenche” todo o espaço. Presença de 𝑬 é sentida por meio da força que ele exerce sobre objetos carregados.
Exemplo: campo produzido por duas partículas carregadas
Configuração 1: Cargas idênticas
(a) Determine o campo elétrico resultante em um ponto 𝑃 sobre o eixo 𝑍.
(b) Discuta o limite em que 𝑃 está muito distante, de forma que 𝑧 ≫ 𝑑.
(a) Na figura abaixo, identificamos os campos produzidos por cada partícula (supondo 𝑞 > 0). Como o arranjo é simétrico com relação ao eixo 𝑍, as componentes horizontais de 𝑬1 e 𝑬2 se cancelam, de forma que:
(b) No limite 𝑧 ≫ 𝑑, podemos aproximar 𝑧2 + 𝑑Τ2 2 ≈ 𝑧2, de forma que:
𝐄 ≈ 1 4𝜋𝜀
02𝑞 𝑧
2ො𝐳
que é o campo produzido por uma carga puntiforme 2𝑞.
Este resultado está de acordo com a nossa expectativa pois, a longas distâncias, as dimensões da distribuição se tornam irrelevantes e a enxergamos como uma carga puntiforme contendo a carga total da distribuição (quando ela é não-nula).
Configuração 2: Cargas opostas (dipolo elétrico físico)
(a) Determine o campo elétrico resultante em um ponto 𝑃 sobre o eixo 𝑍.
(b) Discuta o limite em que 𝑃 está muito distante, de forma que 𝑧 ≫ 𝑑.
(a) Como agora as cargas são opostas, vemos que as componentes verticais de 𝑬1 e 𝑬2 se cancelam, de forma que:
𝐄 = 1 4𝜋𝜀
0𝑞𝑑
𝑧
2+ 𝑑 2 Τ
2 3/2ො𝐱
(b) Novamente, no limite 𝑧 ≫ 𝑑, podemos aproximar 𝑧2 + 𝑑Τ2 2 ≈ 𝑧2. Com isso:
𝐄 ≈ 1 4𝜋𝜀
0𝑞𝑑 𝑧
3ො𝐱
Este não é o campo produzido por uma carga puntiforme, pois varia com 1/𝑧3 ao invés de 1/𝑧2. Por que obtivemos este resultado?
Mais adiante, veremos que este é o campo produzido por um dipolo elétrico puntiforme em pontos sobre o eixo 𝑍.
Podemos ainda reescrever esta expressão como:
onde 𝐩 = −𝑞𝑑 ො𝐱 é o momento de dipolo elétrico dessa distribuição.
Configuração 2: Cargas opostas (dipolo elétrico)
𝐄 ≈ − 1 4𝜋𝜀
0𝐩
𝑧
3Campo elétrico em pontos arbitrários do espaço:
Os campos estão representados por meio de linhas de campo:
• 𝐄 é tangente às linhas em cada ponto do espaço.
• Módulo de 𝐄 é indicado pela densidade de linhas
• Duas linhas não podem se cruzar, pois o campo ficaria indefinido no ponto de cruzamento.
2.1.3 - Distribuições contínuas de carga
Exemplos: objetos macroscópicos (dimensões >> distâncias interatômicas), densidade eletrônica em átomos, moléculas ou sólidos
Para um elemento infinitesimal de carga 𝑑𝑞, podemos escrever sua contribuição para o campo elétrico no ponto 𝑃 como:
Pelo princípio da superposição, o campo elétrico resultante neste ponto será:
Dimensionalidade
Para fazer a integral, devemos converter 𝑑𝑞 em um infinitésimo espacial utilizando a densidade de carga adequada para a dimensionalidade da distribuição:
1D: barras finas, anéis, ...
𝑑𝑞 = 𝜆 𝑑𝑙
′2D: placas finas, superfícies esféricas, cilíndricas, ...
𝑑𝑞 = 𝜎 𝑑𝐴
′𝑑𝑞 = 𝜌 𝑑𝑣′
3D: placas finas, superfícies esféricas, cilíndricas, ...
𝜆, 𝜎 e 𝜌 são as densidades linear, superficial e volumétrica de carga, respectivamente.
Exemplo: Campo produzido por um fio semicircular uniformemente carregado
(a) Determine o campo elétrico resultante em um ponto 𝑃 sobre o eixo 𝑍.
(b) Discuta o limite em que 𝑃 está muito distante, de forma que 𝑧 ≫ 𝑑.
Considere um elemento de carga infinitesimal 𝑑𝑞 do fio. Este
elemento está na posição definida pelo vetor 𝒓′e compreende uma porção de arco infinitesimal 𝑑𝑙′ = 𝑅d𝜑:
Desejamos calcular o campo elétrico no ponto P, definido pelo vetor 𝒓:
onde 𝜑 é o ângulo entre 𝒓′ e o eixo 𝑋.
A contribuição de 𝑑𝑞 para o campo elétrico no ponto 𝑃 é:
Substituindo as expressões de 𝑑𝑞, 𝒓, 𝒓′e , obtemos:
Integrando sobre cada componente:
Note que a expressão 𝑅2 + 𝑧2 3/2 não depende de 𝜑 e pode ser retirada de cada integral. O resultado final é:
Note que a componente 𝐸𝑥 é nula, como esperado pela simetria da distribuição de cargas com respeito ao plano 𝑌𝑍 (𝑥 = 0).
Para 𝑧 ≫ 𝑅, a componente 𝐸𝑧 é dominante. Aproximando 𝑅2 + 𝑧2 3/2 ≈ 𝑧3, obtemos:
onde 𝑄 = 𝜆 𝜋𝑅 é a carga total do fio (pois 𝜆 = 𝑐𝑡𝑒).
Portanto, neste limite o campo se reduz ao de uma carga puntiforme 𝑄, como esperado.
Exemplo: Campo produzido por uma superfície esférica uniformemente carregada
Problema 2.7 (livro-texto): Uma superfície esférica de raio 𝑅 encontra-se carregada com uma densidade superficial de carga constante e positiva 𝜎.
(a) Determine o campo elétrico resultante em um ponto 𝑃 sobre o eixo 𝑍.
(b) Generalize o resultado, obtendo o campo elétrico em todo o espaço.
Dica: Ao resolver a integral, analise cuidadosamente as regiões 𝑧 < 𝑅 (dentro) e 𝑧 > 𝑅 (fora da esfera).
Começamos identificando o elemento infinitesimal de carga 𝑑𝑞 e os parâmetros geométricos relevantes:
A contribuição de 𝑑𝑞 para o campo em 𝑃 é:
onde ො𝒓′é o unitário da direção radial no sistema de coordenadas esféricas.
Como a distribuição é simétrica em torno do eixo 𝑍, antecipamos que apenas a componente 𝐸𝑧 do campo elétrico resultante em 𝑃 será não-nula. Assim, é conveniente partirmos direto da componente 𝑑𝐸𝑧:
Substituindo os valores relevantes, encontramos:
A integral em 𝜑 é imediata, resultando em um fator 2𝜋. Com isso:
Fazendo a mudança de variável 𝑢 = cos 𝜃, podemos reescrever a integral como:
A integral acima pode ser resolvida por uma substituição simples. O resultado é:
onde o fator |𝑅 − 𝑧| vem da expressão 𝑅 − 𝑧 2 = 𝑅 − 𝑧 . Para simplificar este fator, devemos analisar separadamente as regiões 𝑧 < 𝑅 (dentro) e 𝑧 > 𝑅 (fora da esfera).
Para 𝑧 < 𝑅, temos 𝑅 − 𝑧 = 𝑅 − 𝑧 e:
Para 𝑧 > 𝑅, temos 𝑅 − 𝑧 = −(𝑅 − 𝑧) e:
onde 𝑄 = 𝜎 4𝜋𝑅2 é a carga total da superfície (pois 𝜎 = 𝑐𝑡𝑒).
Como qualquer eixo que passa pelo centro da esfera é um eixo de simetria equivalente ao que consideramos, podemos obter o campo elétrico em um ponto arbitrário do espaço fazendo as substituições 𝑧 → 𝑟 e 𝐸𝑧 → 𝐸𝑟 nas expressões anteriores. Assim:
Note que:
• 𝐄 se reduz ao campo de uma carga puntiforme 𝑄 em pontos fora da esfera. Este comportamento é típico de
distribuições de carga com simetria esférica, onde a densidade de carga depende apenas da distância 𝑟 até a origem.
• 𝐄 apresenta uma descontinuidade ao atravessarmos a superfície (𝑟 = 𝑅). Este comportamento é típico de distribuições superficiais de carga, como veremos mais adiante.
Referências básicas
• Griffiths (3ª edição) – cap.2
• Purcell – cap. 1