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Impressos / Caderno temático

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Academic year: 2021

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São Paulo · 2016 · 1ª Edição

Conselho Regional de Psicologia SP - CRP 06

cadernos temáticos CRP SP

Psicologia e Educação:

desafios da inclusão

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Caderno Temático n° 19 – Psicologia e Educação: desafios da inclusão

XIV Plenário (2013-2016) Diretoria

Presidente | Elisa Zaneratto Rosa Vice-presidente | Adriana Eiko Matsumoto Secretário | José Agnaldo Gomes Tesoureiro | Guilherme Luz Fenerich

Conselheiros

Alacir Villa Valle Cruces; Aristeu Bertelli da Silva; Bruno Simões Gonçalves; Camila de Freitas Teodoro; Dario Henrique Teófilo Schezzi; Gabriela Gramkow; Graça Maria de Carvalho Camara; Gustavo de Lima Bernardes Sales; Ilana Mountian; Janaína Leslão Garcia; Joari Aparecido Soares de Carvalho; Livia Gonsalves Toledo; Luís Fernando de Oliveira Saraiva; Luiz Eduardo Valiengo Berni; Maria das Graças Mazarin de Araujo; Maria Ermínia Ciliberti; Marília Capponi; Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso; Moacyr Miniussi Bertolino Neto; Regiane Aparecida Piva; Sandra Elena Spósito; Sergio Augusto Garcia Junior; Silvio Yasui

Organização do caderno

Paulo Paranhos

Revisão ortográfica

Paulo Paranhos | Vírgula & Crase

Projeto gráfico e editoração

Paulo Mota | Comunicação do CRP SP

___________________________________________________________________________ C755c Conselho Regional de Psicologia de São Paulo.

Psicologia do Esporte: Contribuições para a atuação profissional. Conselho Regional dePsicologia de São Paulo. - São Paulo: CRP SP, 2016.

180p.; 21x28cm.(Cadernos Temáticos CRP SP) ISBN: xxxxxxxxxx

1.Psicologia –Esporte. 2. Psicologia do Esporte. 3. Sistema Esportivo Brasileiro. I. Título

CDD 158.2 __________________________________________________________________________ Ficha catalográfica elaborada por Marcos Antonio de Toledo – CRB-8/8396.

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Cadernos Temáticos do CRP SP

Desde 2007, o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo inclui, en-tre as ações permanentes da gestão, a publicação da série Cadernos Temáti-cos do CRP SP, visando registrar e divulgar os debates realizados no Conselho em diversos campos de atuação da Psicologia.

Essa iniciativa atende a vários objetivos. O primeiro deles é concretizar um dos princípios que orienta as ações do CRP SP, o de produzir referências para o exercício profissional de psicólogas(os); o segundo é o de identificar áreas que mereçam atenção prioritária, em função de seu reconhecimento social ou da necessidade de sua consolidação; o terceiro é o de, efetivamente, garantir voz à categoria, para que apresente suas posições e questionamen-tos acerca da atuação profissional, garantindo, assim, a construção coletiva de um projeto para a Psicologia que expresse a sua importância como ciência e como profissão.

Esses três objetivos articulam-se nos Cadernos Temáticos de maneira a apresentar resultados de diferentes iniciativas realizadas pelo CRP SP, que contaram com a experiência de pesquisadores(as) e especialistas da Psico-logia, para debater sobre temáticas ou assuntos variados na área. Reafirma-mos o debate permanente como princípio fundamental do processo de demo-cratização, seja para consolidar diretrizes, seja para delinear ainda mais os caminhos a serem trilhados no enfrentamento dos inúmeros desafios presen-tes em nossa realidade, sempre compreendendo a constituição da singulari-dade humana como fenômeno complexo, multideterminado e historicamente produzido. A publicação dos Cadernos Temáticos é, nesse sentido, um convite à continuidade dos debates. Sua distribuição é dirigida a psicólogas(os), bem como aos diretamente envolvidos com cada temática, criando uma oportuni-dade para a profícua discussão, em diferentes lugares e de diversas maneiras, sobre a prática profissional da Psicologia.

Este é o 19º Caderno da série. O seu tema é “Psicologia e Educação: desafios da inclusão”.

Outras temáticas e debates ainda se unirão a este conjunto, trazendo para o espaço coletivo, informações, críticas e proposições sobre temas rele-vantes para a Psicologia e para a sociedade.

A divulgação deste material nas versões impressa e digital possibilita a ampla discussão, mantendo permanentemente a reflexão sobre o compro-misso social de nossa profissão, reflexão para a qual convidamos a todos.

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Os Cadernos já publicados podem ser consultados em www.crpsp.org.br:

1 – Psicologia e preconceito racial

2 – Profissionais frente a situações de tortura 3 – A Psicologia promovendo o ECA

4 – A inserção da Psicologia na saúde suplementar 5 – Cidadania ativa na prática

5 – Ciudadanía activa en la práctica

6 – Psicologia e Educação: contribuições para a atuação profissional 7 – Nasf – Núcleo de Apoio à Saúde da Família

8 – Dislexia: Subsídios para Políticas Públicas

9 – Ensino da Psicologia no Nível Médio: impasses e alternativas 10 – Psicólogo Judiciário nas Questões de Família

11 – Psicologia e Diversidade Sexual

12 – Políticas de Saúde Mental e juventude nas fronteiras psi-jurídicas 13 – Psicologia e o Direito à Memória e à Verdade

14 – Contra o genocídio da população negra: subsídios técnicos e teóricos para Psicologia 15 – Centros de Convivência e Cooperativa

16 – Psicologia e Segurança Pública

17 – Psicologia na Assistência Social e o enfrentamento da desigualdade social 18 – Psicologia do Esporte: contribuições para a atuação profissional

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Introdução

Núcleo de Educação do CRP-SP

I - racIsmo, HomofobIa e Inclusão educacIonal

apresentação

Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso

Problematizando Gêneros e sexualidades na escola

Leonardo Lemos de Souza

relações raciais e racismo na escola

Lauro Cornélio da Rocha

debates

II – dIreIto à educação de adolescentes em

cumPrImento de medIdas socIoeducatIvas

apresentação

Luciana Stoppa dos Santos

o trabalho do psicólogo junto aos adolescentes em

conflito com a lei: processos de escuta e a garantia de

direitos

Jorge Broide

adolescentes em cumprimento de medidas

socioeducativas: trajetórias escolares

Debora Cristina Fonseca

a política pública da assistência social e a garantia do

direito à educação

Jean Fernando de Sousa

debates

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Sumário

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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O presente Caderno Temático originou-se da necessidade do Núcleo de Educação do CRP-SP registrar os debates que vem produzindo sobre os processos de inclusão no âmbito es-colar. A ausência de referências técnicas para a atuação das(os) psicólogas(os) neste campo específico, a relevância de debater o tema da inclusão educacional articulado com os outros núcleos do CRP-SP, dada a sua complexidade e as distintas dimensões da temática, resultou na realização de dois ciclos de debates. O pri-meiro com o tema “Racismo, Homofobia e inclu-são Educacional”, realizado em 30 de agosto de 2014 e que contou com as parcerias do Núcleo Sexualidade e Gênero e do Sub Núcleo Psico-logia e Relações Raciais, ambos do CRP-SP. O segundo com o tema “Direito à Educação de Jo-vens em Cumprimento de Medidas Socioeduca-tivas”, realizou-se em 13 de julho de 2015 e teve a parceria do Núcleo da Assistência Social e do Núcleo da Criança e do Adolescente do CRP-SP. Os eventos foram transmitidos on-line e após as palestras dos convidados, foram promovidos debates com a participação da plateia.

Para a compreensão do que aqui estamos chamando de “Educação inclusiva” devemos enten-de-la como um paradigma, uma proposta de edu-cação pautada em direitos humanos, que não se destina somente ao trabalho junto aos estudantes público alvo da educação especial, mas que busca pensar práticas que rompam com processos histó-ricos de exclusão, democratizem o espaço e esco-lar, garantam direitos e respeitem as diferenças nos processos de aprendizagem e no desenvolvimen-to das crianças e adolescentes. A nós, psicólogos, cabe a defesa de uma educação inclusiva como meio de possibilitar reflexão sobre o que aparecer naturalizado na escola e que pode ser diferente.

Agradecemos as contribuições dos convida-dos as quais foram bastante enriquecedoras para o aprofundamento do tema e esperamos que as reflexões aqui contidas sejam disparadoras para à necessária transformação da escola: que seja mais inventiva e considere o seu cotidiano com suas singularidades, que rompa com a reprodução dos estigmas e preconceitos e desenvolva novos modos de operar as relações e o conhecimento.

Introdução

Núcleo de Educação do CRP-SP

(2013-2016)

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Racismo, Homofobia

e Inclusão Educacional

Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso

Conselheira do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo – CRP 06. Coordenadora do Núcleo e Educação do CRP SP e Coordenadora da Comissão Gestora do CRP SP – Subsede Baixada Santista e Vale do Ribeira.

Apresentação

Tratar de tema tão importante quanto este não é uma tarefa fácil. Sabemos que a escola tem papel de fomentar o conhecimento e, mais que isso, visa à promoção da cidadania e ao prepa-ro para fazer leituras críticas e autônomas da realidade. Contudo, sabemos que a escola aca-ba reproduzindo valores morais e culturais que reforçam a exclusão de certos segmentos da sociedade, sobretudo, os negros, os homosse-xuais, os deficientes, os idosos e as mulheres. As pessoas são categorizadas a partir de suas diferenças, sejam elas sociais, econômicas, físi-cas, psíquifísi-cas, religiosas, culturais, raciais e de gênero, o que pode gerar conflitos e desenca-dear violências físicas e simbólicas. As diferen-ças precisam ser compreendidas não como pro-blemas a serem resolvidos e, sim, como valores, possibilidades de aprendizagem que expressam a riqueza da diversidade humana e ajudam na ressignificação de uma escola plural baseada em princípios éticos e democráticos. Da mesma forma, as relações humanas, os conteúdos e os métodos desenvolvidos na escola, eles devem estar a serviço da aprendizagem dos estudan-tes e direcionados à construção da sua autono-mia e emancipação; para que a inclusão educa-cional se instale efetivamente, a escola precisa mudar, um novo paradigma educacional precisa ser construído baseado no princípio da igualda-de e da igualda-democracia.

Muitos foram os avanços nessa dire-ção, sobretudo a partir da mobilizadire-ção, dos movimentos sociais e políticos, podemos, por exemplo, destacar aqui os diversos marcos

normativos e legais que foram construídos co-letivamente para que crianças e jovens com deficiência pudessem ter uma educação que atendesse as suas singularidades. A política nacional, na perspectiva da educação inclusiva é o resultado de todo um processo de mobiliza-ção da sociedade, ainda que ajustes precisem ser feitos. Nesse mesmo sentido, o Plano Na-cional de Educação, que acaba de ser aprova-do com aprova-dois anos de atraso, avança em suas metas, mas não contempla, integralmente, as reivindicações de alguns segmentos excluídos. É preciso mais do que isso, é preciso garantir às crianças e jovens a igualdade de acesso e permanência na escola.

É preciso a mobilização de toda a socie-dade para que políticas públicas sejam efeti-vadas na direção de uma educação com quali-dade para todas as pessoas, com igualquali-dade de oportunidades e respeito às diferenças. A partir desse panorama amplo da diversidade, esta-mos trazendo como recorte os fenômenos so-ciais do racismo e da homofobia como fatores

“As diferenças precisam ser

compreendidas não como

problemas a serem resolvidos e,

sim, como valores, possibilidades

de aprendizagem que expressam

a riqueza da diversidade humana

e ajudam na ressignificação de

uma escola plural baseada em

princípios éticos e democráticos”.

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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que contribuem sobremaneira para que a into-lerância e a exclusão se instalem nos espaços educativos. Ainda que tais fenômenos tenham lutas próprias, ambos são fruto de uma história que marcou os séculos 19 e 20, período em que a naturalização das diferenças raciais e sociais desencadearam diversas consequências, den-tre elas, o sofrimento psíquico que cada uma dessas pessoas carrega, vivendo a diferença como defeito, que o desqualifica e promove de-sigualdade na relação com o outro. O alto índice de evasão escolar dessas pessoas demonstra o quanto ainda estamos distantes desse ideá-rio, de uma escola preparada e qualificada para a inclusão educacional. E sobre isso, nós, psi-cólogos e psicólogas, temos muito o que dizer e contribuir. A discriminação, seja ela qual for, traz inegáveis prejuízos à formação das subje-tividades, às relações sociais e ao exercício dos direitos. Temos, portanto, o compromisso social de sermos agentes dessa transformação, base-ando nosso trabalho na ética, no respeito e nos valores preconizados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.

“Ainda que tais fenômenos

tenham lutas próprias, ambos

são fruto de uma história que

marcou os séculos 19 e 20,

período em que a naturalização

das diferenças raciais e sociais

desencadearam diversas

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Problematizando Gêneros

e Sexualidades na Escola

Leonardo Lemos de Souza

Doutor em Educação pela UNICAMP. Psicólogo e Mestre em Psicologia pela UNESP. Professor Assistente Doutor da UNESP atuando na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Psicologia, sendo vice-coordenador do Programa e chefe do Departamento de Psicologia Evolutiva, Social e Escolar. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Sexualidades.

Bom dia a todos e todas. Eu queria agradecer muitíssimo ao CRP pelo convite, em especial, na pessoa da Lívia, que tinha conversado comigo ini-cialmente, Lívia Toledo, que é do Núcleo de Sexu-alidades e para falar desse tema que é homofobia e inclusão escolar, que é um tema que eu venho trabalhando já há algum tempo com as questões relacionadas à homofobia e à sexualidade, a ques-tão de gênero e sexualidade nas escolas. E eu vou organizar a minha fala, temos um tempo de meia hora, não é isso, mais ou menos? No sentido de, na verdade, realizar um conjunto de reflexões. A par-tir de dados de algumas pesquisas sobre gêneros e diversidades nas escolas e também de alguns operadores conceituais, que nos auxiliam um pou-quinho para problematizar a questão de saberes e práticas da Psicologia no contexto escolar. Então, na verdade, a minha proposta… na verdade, pos-sibilidades de pensar um pouco a diversidade de gênero nas escolas, como as escolas têm tratado essa população, do extermínio em relação a esse grupo, de fato, posso colocar nesse sentido de po-der pensar um pouco desses… e alguns conceitos podem nos ajudar a pensar isso, e a partir tam-bém de dados de pesquisas que eu tenho, de pes-quisas que eu fiz, que eu orientei de alunos que mapeiam um pouco algumas dessas realidades. Bom, começo, antes de tudo, falando rapidamen-te sobre o que é, de fato, homofobia, e também a questão da inclusão educacional. Então, por homofobia, estou entendendo aqui como Borrillo descreve, é a repulsa e ódio pela homossexuali-dade ou por tudo aquilo que ela representa nas estéticas e experiências de todas as sexualidades e gêneros dissidentes da heteronormatividade, homens, mulheres, travestis, transexuais, gays, lésbicas, enfim. Cunhado na década de 70, tendo na década de 90 ganhado mais destaque, pode-mos acrescentar que ainda pode se referir a uma

atitude de desprezo pela homossexualidade de si mesmo e do outro, porque a homofobia também existe em relação aos próprios homossexuais.

De qualquer maneira, ela é uma ação que busca inferiorizar e normalizar a homossexualida-de e quaisquer homossexualida-de suas manifestações. De alguma maneira, então, a homofobia também se articula com o sexísmo, dado que se volta para a repulsa diante da performatividade de papéis de gênero deslocados de corpos biológicos formatizados: homem, mulher, macho, fêmea, enfim… as estra-tégias decorrentes da homofobia buscam saber sobre sua origem para definir seu tratamento e re-torno à sexualidade dita normal. Assim, há uma sé-rie de projetos, técnicas que são produzidas com a finalidade de controlar, manipular e exterminar as dissidências sexuais e de gênero. Essas atra-vessam todo o corpo social, constituindo como lugar de expurgo, a escola como espaço tradicio-nalmente estratégico nos processos de subjeti-vação e cujo projeto, de fato, de alguma manei-ra, que vemos no espaço da escola é classificar, normalizar, reproduzir desigualdades, reafirmando hierarquias. Essa escola classificatória excluden-te permanece ao longo dos excluden-tempos, hoje, princi-palmente, pela supervalorização do desempenho, pela vinculação indiscriminada com o mercado de trabalho, pela negação do cotidiano e da ética das

“Assim, há uma série de projetos,

técnicas que são produzidas

com a finalidade de controlar,

manipular e exterminar as

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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diferenças. Aí, um dado do 9º Seminário Nacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis e Tran-sexuais de 2012 mostra um pouco dessa realidade para nós em relação à homossexualidade no Brasil e à homofobia. Mais de 40% dos homens homos-sexuais brasileiros já foram agredidos fisicamen-te duranfisicamen-te a vida escolar. Mais de 1/3 dos 15 mil alunos entrevistados para uma Pesquisa do ins-tituto de Pesquisas Econômicas, a FiPE, procuram não chegar perto de homossexuais; 21% acham que estudantes homossexuais não são normais; 26% dizem não aceitar a homossexualidade. Qual escola que inclui diante desse quadro? Para fa-lar de inclusão, temos que fafa-lar de exclusão, ób-vio. Entendemos que, na verdade, o excluído está nas franjas do corpo social, ele não é um excluído completamente, ele faz parte de uma lógica de funcionamento que o mantém sem direitos como menorizado, inferiorizado, destituído do estatu-to de direiestatu-to. Desse modo, os discursos, saberes e práticas habilitam um, desabilitam outros como sujeitos como humanos, como pessoas. Quem está fora da escola? Luiz falou algo também que eu achei muito interessante, quando pensamos na inclusão como algo só ligado às pessoas com de-ficiência, temos que pensar… o deficiente durante muito tempo não esteve presente na escola regu-lar normal, ele sempre esteve num lugar especial.

Pensando no espaço da escola como insti-tuição histórica, os homossexuais sempre estive-ram nas escolas, mas estou problematizando isso assim, pensar numa inclusão de algo que já está ali, na verdade, inclusão no ponto de vista dos di-reitos, óbvio, mas na verdade, essas pessoas tão ali, elas circulam, elas não estão fora, elas es-tão dentro. O que está fora é o discurso da escola sobre essas pessoas, sobre o cotidiano que elas vivem, não me refiro ao discurso oficial, porque nas políticas, vemos isso presente: “Tem que se discu-tir isso, tem que se trabalhar aquilo, os sistemas são importantes”, mas no cotidiano, ele não está presente. Nós que trabalhamos com formação de educadores para gêneros e diversidade, percebe-mos isso no discurso dos educadores todo tempo. A existência deles como sujeitos de direitos, que seja possível a expressão dos seus afetos, da sua

sexualidade, de seus gêneros, da sua diversidade que é negada, portanto, o que essas pessoas fa-zem, os gays, lésbicas que estão na escola, tran-sexuais, travestis, são produtos de estratégia de invisibilidade, muitas vezes, eles mesmos, para continuar permanecendo de algum modo: ficam no armário, se introduzem como outros possíveis na escola como figuração da dominância hetero-normativa, o amigo das meninas, a amiga que joga futebol junto, a travesti que se empodera do mas-culino por vezes, para circular com dignidade, sen-do mais violenta, usansen-do desses recursos e ainda, os que se afirmam como possíveis, de fato, se re-velando, organizando do ponto de vista identitário nos discursos que mantém a repulsa e a negação das suas existências e estéticas.

Diante disso, vou falar um pouquinho agora de algumas pesquisas, de algumas experiências, na verdade, não, eu quero pensar em algumas questões que são importantes para pensarmos no espaço da escola. Eu acho que pensar gêne-ro e diversidade na escola, pensar a questão da homofobia, portanto diante dessa diversidade no contexto escola, é necessário que pensemos algu-mas questões para problematizar a escola. Então, como psicólogos, temos que pensar a educação no sentido dessa produção de uma ética mesmo, e trazer o cotidiano para dentro da escola de fato, acho que esse e o papel do psicólogo realmente importante que, muitas vezes, os educadores por mais que o discurso oficial traga isso, há uma di-ficuldade muito grande de estabelecermos essas conexões com o concreto, com a vida real das pes-soas. Então, o primeiro grupo de perguntas ao qual eu me refiro se refere à ética e aos conhecimentos e uma delas é: “A escola é um espaço de cons-trução de conhecimentos e sociabilidades? Quais conhecimentos são esses? Qual o papel dos co-nhecimentos construídos na escola? Quais conhe-cimentos? Quais políticas cognitivas que a escola gesta? Qual a dimensão ética que a escola pode e deve se ocupar?”, o outro grupo de questões se refere especificamente à questão do gênero e das sexualidades: “Qual a potência de

inventabilida-“O que está fora é o discurso

da escola sobre essas pessoas,

sobre o cotidiano que elas vivem”.

“Então, como psicólogos, temos

que pensar a educação no

sentido dessa produção de uma

ética mesmo, e trazer o cotidiano

para dentro da escola de fato”.

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de da escola em se redefinir e mudar de foco e se

atrelar ao cotidiano? Onde os gêneros e as sexu-alidades se inserem nas políticas cognitivas ges-tadas tradicionalmente pela escola?”, por política cognitiva, estou pensando aqui do conhecimento que é produzido ali naquele espaço.

E por último e que cabe a nós sempre refle-tirmos: “Qual escola? Qual escola que temos e qual escola que queremos?”, não vamos dar conta de responder todas essas perguntas, lógico, neste momento, mas elas servem para iniciar a nossa discussão e para disparar o desdobramento de outras investigações e reflexões sobre o tema. Como eu disse antes, a minha proposta é proble-matizar o que denominamos gêneros e sexualida-des, o plural é necessário, e como produções que circulam no espaço escolar. Para isso, cabe es-clarecer que o que chamamos de circulação deve se dar no campo da produção discursiva de sen-tidos sobre as diversidades sexuais e de gêneros pelas pessoas que fazem o espaço escolar. Seja na perspectiva da normatização ou da transgres-são dessas subjetividades possíveis. Com isso, a dimensão do jogo de palavras impossível, trazen-do ele aqui, transita, ou melhor, atravessa entre o campo das potencialidades ou das inviabilidades impostas por modelos normatizadores.

Para Bruner, as narrativas representam o modo específico de construção e constituição de realidades experienciadas. Ela organiza e dá sen-tido ao conjunto de experiências do sujeito em re-lação ao mundo e a si mesmo. Nas narrativas, en-contramos produções discursivas sobre eventos e experiências do sujeito e sua cultura. Bakhtin, num texto chamado “Discurso na Vida e discurso na Arte”, para ele, discursos, palavras e enunciados são produzidos na experiência de vida do sujeito

sendo um processo de interação dialógico entre vozes constituintes das ações compartilhadas na cultura. Uma das funções da narrativa é também subjetivar o mundo e abrir espaço para o hipoté-tico, perspectivas possíveis capazes de constituir a vida da mente interpretativa; nesse sentido, seu uso dentro da Psicologia se mostra relevante na medida em que sua particular abertura e plastici-dade permitam maior qualiplastici-dade na criação de ou-tras formas de constituir realidades e significados e discursos. Portanto, trata-se de assumir a inse-parabilidade da linguagem com produções sociais humanas atravessadas pela história e pelo imagi-nário cultural, bem como da dimensão da autori-dade e da identiautori-dade na produção de realiautori-dades. Aquilo que não se diz e aquilo que se diz compre-endem espaços de possibilidades de existência em diferentes campos relacionais. No nosso caso, é entender como gêneros e sexualidades circulam, produzem sentidos e são produzidos no espaço escolar. Falando um pouquinho dessas pesquisas, eu tinha várias coisas, mas eu acho que não dá tempo para trabalharmos com tudo, mas nós fize-mos um trabalho com 400 jovens, na verdade, foi uma parte da minha tese de Doutorado, foram 400 jovens que nós trabalhamos com um questionário que se referia a uma situação de homofobia na escola, uma situação hipotética de homofobia na escola, que perguntávamos para eles em relação aos personagens dessas histórias, como eles se posicionavam. Eram três personagens: o agressor, aquele que cometia homofobia, na verdade, era um grupo de alunos, um que presenciava a situa-ção que era amigo dos dois, o agressor e a vítima e um que era o agredido, que sofria a homofobia. Fizemos isso em escolas de São Paulo, em esco-las também no Estado de Mato Grosso, tentamos fazer uma comparação, enfim. Uma outra pesqui-sa em que trabalhamos com espesqui-sa mesma história, mas com professores, como é que eles se posicio-navam diante dessa situação de homofobia. As

“A escola é um espaço de

construção de conhecimentos

e sociabilidades? Quais

conhecimentos são esses? Qual

o papel dos conhecimentos

construídos na escola? Quais

políticas cognitivas que a escola

gesta? Qual a dimensão ética que

a escola pode e deve se ocupar?”

“Trata-se de assumir a

inseparabilidade da linguagem

com produções sociais humanas

atravessadas pela história e pelo

imaginário cultural, bem como

da dimensão da autoridade e

da identidade na produção de

realidades”

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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perguntas dessa história, tanto para professores como para os alunos, jovens de ensino médio se referiam a que pensamentos, sentimentos e ações diante da situação que vivenciavam que essas pes-soas podiam ter, tentando também trabalhar uma perspectiva ética, o que deve ser feito numa situa-ção como essa, a vítima, quem presencia e agride, como é que se sentem nessa situação, como é que eles imaginam essas pessoas. E temos um pouco dessa realidade também em relação aos profes-sores. Se todo professor nessa situação também, o que o professor faz numa situação como essa.

É um trabalho que foi simulado, portanto, não trabalha necessariamente com dados reais, é uma simulação, é uma história hipotética, mas que nos permite pensar algumas coisas. Uma delas é especificamente em relação à vítima que é o que eu queria trazer, a pessoa que sofre homofobia na escola, 68,7% das pessoas que responderam, dos jovens estudantes, têm atitudes negativas diante da situação de homofobia. O que eu estou chamando de atitudes negativas? isolamento so-cial, negação da própria sexualidade, ou agressão ou a própria inércia, ou seja, não faço nada diante do problema, então, sofro homofobia, ou eu nego isso ou eu não ligo para isso, isso vai passar, é um problema que não adianta fazer nada, se isola, se distancia dos outros e percebemos também, no caso desses jovens que relatam isso, que dizem o que é geralmente feito, ou como se age diante disso, não existe uma pessoa para quem eles pos-sam recorrer: “Para quem que eu falo isso?”, isso aparece muito nessas narrativas, nesses textos que eles produzem sobre isso. Não existe uma pessoa com a qual eles podem contar, muito difícil eles, de fato, irem atrás de alguém. E as atitudes dispositivas que eles se referiam são 31,9%, que é a autoafirmação da sua sexualidade e alguns di-zem: “Eu faço alguma coisa”, mas a grande maioria não faz isso, não busca isso. Uma outra pesquisa que orientei, uma dissertação de mestrado de uma aluna no mestrado em Educação onde trabalho na Universidade Federal de Mato Grosso, Adriana Salles, Adriana trabalhou com meninas travestis na escola. Então, ela trabalhou com as narrativas

que essas meninas tinham sobre a experiência delas com a escola. Então, são alunas que estão no ensino regular, que se travestem ou estão em processo de construção de sua identidade de gê-nero feminino e elas falam um pouco como é a vida delas na escola, como essa atitude delas também que é discursiva circula ali naquele lugar. E uma das questões é o nome social, por exemplo, elas vão mostrando para nós as estratégias com que elas vão lidando para circular naquele espaço. Então, o nome social que é negado, embora haja uma série de normativas que garantem isso, nesse contex-to da pesquisa, ainda estava em discussão, mas já existia uma normativa sobre isso, do direito de usar o nome social e elas afirmavam, discutiam isso, algumas se empoderavam disso e outras não. E outras estratégias, como eu falei há pouco, de circular no universo masculino para também ser aceita, embora o universo delas, o que elas gos-tariam de assumir seria outro, que é a questão do jogo de futebol, que elas relatam, que é muito inte-ressante: “Jogo futebol também”, então… é o jogo todo também com a questão do gênero, assim, o que é masculino e o que é feminino? E por que ela não pode estar nos dois lugares? Enfim, e elas vão trazendo isso, enfim, que é um discurso um pou-co mais propositivo, mais afirmativo que elas ten-tam fazer. Com os professores, o que temos com os professores na pesquisa como nós aplicamos com os jovens. Esses professores falam que exis-tem duas possibilidades de lidar com a homofobia na escola, duas práticas que eles acham que são possíveis, que eles relatam, o que faz o professor diante de uma situação que ele presencia a homo-fobia. E aí, vemos o que chamamos de práticas de esclarecimento e práticas reflexivas. O que cha-mamos de práticas de esclarecimento é uma ação que verbalizamos o que é certo e o que é errado, ponto e acabou: “É errado fazer isso, menina, é er-rado fazer aquilo, menina”. Ainda nessa perspecti-va das práticas de esclarecimento, se busca justi-ficar o comportamento de quem foi discriminado, muitas vezes, se tenta de alguma forma promover relações mais igualitárias, mas, na verdade, exis-te uma série de discursos por traz falando assim: “Mas ele provoca”, “Mas ele faz isso, faz aquilo”, embora tente no discurso dele, ele acha que ele está esclarecendo que é errado ser homofóbico, é errado discriminar o colega pela sua diferença. E outras que chamamos de práticas reflexivas, que é, de fato, trabalhar com os alunos a questão da discriminação em relação à sexualidade, em rela-ção à diferença, mas propondo reflexões, mesmo, coletivas. As práticas que estamos chamando de

“Isolamento social, negação da

própria sexualidade, ou agressão

ou a própria inércia, ou seja, não

faço nada diante do problema”.

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esclarecimento nem sempre são coletivas, são

dirigidas só aos dois que tiveram o problema, não se trabalha isso coletivamente numa sala de aula, não é um tema dentro do cotidiano da sala de aula.

Ela é uma ação que busca… é uma ação no armário, que busca esconder que isso existe ou que minimiza isso como algo que faz parte, eles fa-zem isso todos os dias, eles brincam, né, chamam o outro de veado ou bichinha, travecona e tudo bem. Não que isso… pejorativamente, minimizan-do a condição dessas pessoas. Essas narrativas sobre sexualidades e gêneros nos levam a buscar ferramentas teóricas para compreender a escola em seu avesso, como espaço que deve transver-salizar e virtualizar o quê? Conteúdos, práticas, lin-guagens, afetos, etc. As práticas dos professores e as respostas dos alunos e alunas sobre os modos de enfrentamento à homotransfobia nos oferecem pistas de como a escola pode negar e despoten-cializar a diversidade de gênero e sexual. Como eu disse, práticas de esclarecimento, inércia, negação impossibilitam que elas circulem ética e politica-mente no espaço escolar, essas diversidades. A escola tem minadas potencialidades de existência, desde a negação de identidades, pelo nome social, das sociabilidades, tais como das alunas traves-tis e dos meninos e meninas de sexualidade dis-sidentes. Nega-se a aproximação com a vida con-creta das pessoas, tornando a escola operadora de abstrações descolando-a do cotidiano, tirando esse cotidiano de dentro da escola. que Najmano-vich é uma epistemóloga argentina, que faz uma discussão sobre o cotidiano na pesquisa contem-porânea, principalmente na Educação, ela destaca essa dimensão como parte de um lugar que é ne-gado pela escola na modernidade, escola que, na verdade, classifica, normaliza e continua fazendo isso, embora com uma outra proposta documental e, no discurso do documento oficial, Najmanovich

diz em sua análise, ela destaca: “O que já sabemos na carne sobre a fluidez, a instabilidade dos víncu-los nas relações e nas instituições”, novos fluxos que são possíveis aí nesse contemporâneo.

Ao mesmo tempo, a escola insiste nessas estratégias da modernidade em manter valores, conhecimentos e meios elegendo o que é viável e o que não é viável, e diz ela em um trechinho: “Pas-sado o ano 2000, não só os apocalíticos sentem a vibração da mudança, todos, em maior ou menor medida, concordamos que estamos atravessan-do uma época de transformações aceleradas. As instituições da modernidade prosseguem, mas se sustentam em um delicado equilíbrio que pode ser destruído por uma suave brisa ou uma mudança de orientação dos ventos políticos, tecnológicos, econômicos, afetivos e cognitivos. Nada tem a so-lidez de antes e tanto as dúvidas como as interro-gações surgem dia a dia, transformando à nossa maneira de aprender, de nos relacionar, comunicar, comprar, vender, amar, sofrer, de criar e produzir. Entretanto, a escola parece um museu de cera em si mesma, os uniformes, os bancos em fila indiana, o professor na frente, o sinal do recreio, embora os professores já tenham que pedir aos alunos que desliguem o celular na hora da aula”. Permite-nos ainda acrescentar as palavras dela como: “A exclusão do cotidiano como espaço cognitivo, um espaço de possibilidades de trocas e diversidades culturais, religiosas, étnicas e das diversidades se-xuais e de gêneros”. Jorge Larrosa, um filósofo es-panhol também nos apresenta uma análise dessa educação contemporânea, pelo o que ele chama de experiência sentido, pelo o qual podemos dizer que hoje, há um predomínio de uma política cogni-tiva na educação e a informação e a captação são os carros-chefes das práticas e valores destaca-dos pela escola. Para ele, essa exclusividade, que não é possível também perder o foco desses as-pectos da Educação, não estou dizendo que isso é desnecessário, tem que se capacitar, tem que se informar, a informação é importante, mas isso

“As práticas dos professores

e as respostas dos alunos

e alunas sobre os modos de

enfrentamento à homotransfobia

nos oferecem pistas de

como a escola pode negar e

despotencializar a diversidade de

gênero e sexual”.

“Nega-se a aproximação com

a vida concreta das pessoas,

tornando a escola operadora

de abstrações descolando-a do

cotidiano, tirando esse cotidiano

de dentro da escola”

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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desvia a possibilidade de articulação da Educação como espaço de experiências. Experiência que se atrela ao conceito de risco ou perigo e, portanto, de lançar-se a coisas novas.

Em suma, considerar o conhecimento como experiência que tenha sentido, que seja aconte-cimento, tratando das afecções que essa expe-riência e conhecimento implicam e não somente com a racionalidade que lhe é atribuída e valorada como genuína. Retomando a força das palavras da nomeação, Larrosa afirma que a linguagem é um potente mecanismo de subjetivação e ele diz: “As palavras com que nomeamos o que somos, o que fazemos, o que pensamos, o que percebemos ou o que sentimos são mais do que simplesmente palavras e por isso, as lutas pelas palavras, pelo significado, pelo controle das palavras, pela im-posição de certas palavras, pelo silenciamento e desativação de outras palavras são lutas em que se joga algo mais do que simplesmente palavras, algo mais que somente palavras, sob o domínio das palavras como razão, ensino, universalidade, capacitação, informação, competências, habilida-des, heterossexualidade, homem, mulher, cristia-nismo, a escola se orienta por uma política cog-nitiva que exclui outras. Urgente é a necessidade de repensarmos as políticas cognitivas da escola que abolem a experiência no sentido do conhecer e que também exclui outros possíveis nessa es-cola. Geralmente, ela, a escola afirma valores que se elegem a partir da normatividade, definir identi-dades e modelos necessários. Só para dar alguns exemplos, para ser homem e para ser mulher, ser uma família, ser pai, ser mãe, ter fé, todas adequa-das ao projeto da viabilidade da modernidade, uma fé viável, uma família viável, um sujeito viável, uma sexualidade e um gênero viáveis e não podemos esquecer, um corpo também viável. Buscamos al-guns intercessores para buscar a partir de alal-guns desses questionamentos iniciais, nas investiga-ções, como vimos, percebemos o desvelamento de discursos sobre os gêneros e sexualidades da e

na escola que pontuam zonas de rupturas e repe-tição do normativo. O conhecimento reproduzido deve rever a ideia de representação ao qual ele se assenta, a escola como um lugar de conhecimento deve manter com a ideia de representação recor-rente como repetição, cópia de modelos normati-vos”, como essas palavras que eu falei agora que se referem a essas representações, o que é ser homem, o que é ser mulher, o que é ter fé, o que é uma religião, o que se repete, o que se torna cópia. Então, precisamos, para isso, situar esses concei-tos: representação, linguagem e cognição.

Maturana e Varela entendem representa-ção como uma invenrepresenta-ção, como uma produrepresenta-ção de si mesmo e do mundo. O seu avesso é o concei-to de representação clássico nas teorias do co-nhecimento como cópia e reprodução do real. A escola tem operado com esse último e que tor-na o lugar de normatização e da cópia, por isso, se normatiza. Então, a cópia: qual é o modelo de homem? Qual é o modelo de sujeito? Qual é o modelo de homem, de mulher, de sexualidade, de religião… enfim. A linguagem como estratégia simbólica de representação deve fluir e circu-lar de modo a disparar novos fluxos de senti-dos e possibilidades. Desse modo, a linguagem, as palavras podem ser entendidas como uma disparadora de possíveis e não encerrar limi-tações, ela pode ser inventiva. Na verdade, ela tem o potencial de produção de subjetividades. As narrativas conhecidas e produzidas no coti-diano sobre as identidades de gênero e sexua-lidades de gêneros na escola tomam fluxos que ora potencializam, ora despotencializam a pro-dução de subjetividades. Aí, eu penso que o pa-pel do psicólogo e o papa-pel do educador, não só do psicólogo, mas do psicólogo junto com es-ses educadores é potencializar essa produção, é fazer circular outras experiências e sentidos dentro da escola, que ela possa escapar desse mecanismo da repetição da normatização. Não se trata de destruir a escola também no que se refere à transmissão de conhecimentos

cultu-“Urgente é a necessidade

de repensarmos as políticas

cognitivas da escola que abolem

a experiência no sentido do

conhecer e que também exclui

outros possíveis nessa escola”.

“A linguagem como estratégia

simbólica de representação deve

fluir e circular de modo a disparar

novos fluxos de sentidos e

(17)

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ralmente acumulados, de pensar uma escola

totalmente avessa a essa questão cultural de valores, princípios, enfim, éticas que são neces-sárias também para se trabalhar e pensar.

Conhecimentos como as disciplinas clás-sicas que são trabalhadas, não é abolir isso, Matemática, Português, Física, Química, muito pelo contrário, é trazer isso junto com o outro. Acho que é pensar a escola de um outro jeito, acho que é o nosso grande desafio, é pensar nessa escola de um outro jeito, pensar numa escola inclusiva é pensar uma escola que este-ja conectada com essa produção. É pensar uma escola que rompa com essa repetição, é pensar numa escola onde se possa reproduzir novos códigos que são éticos e estéticos e denunciar os velhos códigos. Outros e novos códigos, lin-guagens e sentidos podem ser produzidos nos espaços das relações escolares, o que se diz e o que não se diz sobre a diversidade pode po-tencializar conhecimentos nos moldes de uma representação cópia ou de uma representação relacionada à inventividade. Essa contribuição da cognição inventiva, que estamos dizendo no plano das práticas educativas de aprendiza-gem, implica na produção de uma ética discur-siva inventiva também, que promova práticas democráticas na escola. No entanto, é no plano desses códigos que se pode, ao mesmo tempo, perceber a redução e a normatização bem como a problematização e o desvio para outros fluxos de vida. Valendo-se da interseção da linguagem como narrativa e, portanto, como produção e invenção de realidades é que retomamos a pro-dução dos alunos e professores e professoras sobre gêneros e sexualidades nas escolas. Ora, as narrativas impossíveis na escola, quais têm sido? Cerceamento e exclusões dos travestis, dos gays e lésbicas nas relações sociais nas escolas, nas práticas dos professores.

As narrativas possíveis, as estratégias de afirmação de travestis, de gays, de lésbicas na escola, principalmente, não só alguns professo-res, mas também muito por parte dos alunos, pelo que podemos conhecer um pouco da ex-periência que temos. Pensarmos que a escola pode ser um espaço oientado por novas políti-cas cognitivas implicados numa nova ética da e para a vida é pensar uma educação inventiva, portanto, uma educação que rompa com essa trajetória da repetição. As transformações das práticas educativas devem ser um problema po-lítico como espaço de gestão de possibilidades e não, técnico. Para Najmanovich novamente, as contribuições de Deleuze e Pierre Lévy para isso, é para pensar o campo da educação; é muito interessante quando ela traz, na verdade, a ideia de virtualizar a educação, dando um sen-tido de Deleuze como possibilidade de aconte-cimentos e também de Lévy. É propor virtualizar a ação que muda de foco, que provoca outros campos de interrogação, citando o próprio Pier-re Lévy: “A virtualização passa de uma solução dada a um outro problema. A virtualização é um dos principais vetores da criação de reali-dades, torna fluida as diferenças instituídas, aumentando os graus de liberdade. Assim, po-demos dizer que virtualizar é problematizar as narrativas cristalizadas que construímos sobre si mesmos e os outros e disparar outras pro-blematizações”. Então, virtualizar a educação é pôr em movimento e é problematizar. Então, a ideia é essa da minha apresentação, pensar essa educação dessa outra perspectiva, sob o ponto de vista das diversidades, pensar em in-clusão, pensando em novas políticas cognitivas gestadas e pensar dentro da escola, que outros conhecimentos são possíveis e de que maneira vamos circular esse conhecimento. Eu acho que o papel do psicólogo aí é fundamental nisso. Obrigado.

“Acho que é pensar a escola

de um outro jeito, acho que é o

nosso grande desafio, é pensar

nessa escola de um outro jeito,

pensar numa escola inclusiva é

pensar uma escola que esteja

conectada com essa produção”.

“As transformações das práticas

educativas devem ser um

problema político como espaço

de gestão de possibilidades e

não, técnico”.

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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Lauro Cornélio da Rocha

Educador, graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora e mestre em História Econômica pela Universidade de São Paulo.

Bom dia a todos e a todas, eu vou falar de pé, eu acho que para mim é mais próprio pelo tama-nho, crescemos quando estamos com o micro-fone na mão. A ideia inicial é começar com um vídeo, vou começar com um pequeno vídeo, ele tem um minuto, ele foi feito pelo Kennedy Clark, tem algumas divergências quanto a primeira vez que foi apresentado, 1939 ou 1947. Ele trata de crianças e são crianças que recebem alguns ad-jetivos e eles têm de dizer se esses adad-jetivos são colocados para crianças negras ou para crianças brancas. É interessante do ponto de vista de uma provocação, provocação para vocês hoje, eu di-ria, que algumas vezes, alguém já deve ter visto esse vídeo, mas do ponto de vista de pensar Psi-cologia todo dia em todo lugar, talvez essa fosse uma experiência interessante de se fazer. Então, aprofundar um pouco no conhecimento do vídeo que veremos e avançar no ponto de vista de fazer as próprias experiências, porque algumas dessas experiências já foram feitas por alguns professo-res nas redes, mas algumas delas aparecem com um rigor muito pequeno, então, acho importante pensarmos isso, assim, qualifica o seu trabalho quanto mais você põe um rigor teórico, um rigor metodológico naquilo que você está fazendo. Então, é importante podermos ver e já começa… essa é uma primeira provocação para a nossa conversa aqui nesses trinta minutos. Por favor.

Que boneca é negra? Aquela.

Que boneca é bonita? Aquela.

Que boneca é bonita? Essa aqui.

Que boneca é legal? (menino aponta) Que boneca é má?

(menina aponta) Que boneca é legal? (menino aponta) Que boneca é má? (menino aponta)

Por que essa boneca é agradável? Porque ela é branca e tem olhos azuis. Qual boneca é feia?

(menino aponta)

Por que essa boneca é feia? Porque ela é negra.

Que boneca parece com você? Aquela ali.

Bom, essa é uma provocação, então na ver-dade, o trabalho feito por Kennedy Clark foi repe-tido aqui, vocês viram por que… em 2005 e das 21 crianças negras, 15 acharam que a boneca negra era a má, ou seja, 2005. Esse trabalho foi repetido e vocês podem ver que no YouTube tem algumas outras versões, no México, tem versão no Chile, tem versão no Brasil dessa mesma ação, guarda-das as deviguarda-das proporções, não há muita diferen-ciação. Então, quando eu estou na sala de aula, eu pergunto para os professores, ou quando eu estou nos espaços de formação, eu pergunto como e com quem as crianças aprendem, que essa é uma referência fundamental para entender um pouco desse universo. Então, partindo desse universo inicial para discutir sobre a questão de racismo dentro do espaço escolar, não podemos deixar de fazer um recuo histórico para fazer essa discus-são. Confesso que lendo os aparelhos aqui, eu lembro do Ariano Suassuna, ele diz o seguinte: “Eu não me adapto com eles e eles retribuem”, então vamos dialogar com isso aqui. Então, no primeiro momento, a ideia quando falamos de racismo, ho-mofobia e inclusão educacional, essa é uma refe-rência fundamental para pensarmos a escola hoje,

Relações Raciais

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pensar o espaço em que estamos na escola hoje,

porque estamos pensando em relações raciais e quando se fala em relações raciais, eu não estou falando apenas do universo da população negra, eu estou falando do universo da população negra, na relação com o branco, na relação com o indíge-na, porque eu estou falando de relações, ou seja, todos nós, independentemente de sermos negros, brancos ou os ditos pardos ou ser indígenas, es-sas relações se estabelecem e eu quero discutir um pouco com vocês como essas relações se es-tabelecem, como fazemos avançar isso.

E do ponto de vista hoje, da educação, nós temos duas legislações que são legislações bá-sicas para discutir isso, temos a Lei 2.639, que até aparece aqui no quadro de vocês e tem a Lei 11.645. Uma primeira, mais especificamente falan-do de história e cultura africana e afro-brasileira e a Lei 11.645 que coloca o aporte na questão in-dígena também dentro do espaço do trabalho na escola e isso dentro da nossa perspectiva de for-mação educacional, partindo do pressuposto que as nossas universidades hoje, salvo raras exce-ções, não tratam, não têm uma matéria específica ou têm apenas algumas disciplinas optativas que discutem relações raciais a partir desse referen-cial de cultura afro-brasileira. Um primeiro dado e um recuo histórico também fundamental para nós trabalharmos o tema é pensarmos no tráfico e escravidão, porque tráfico e escravidão molda-ram a forma de ser e de estar da população negra no Brasil. Então, um primeiro dado fundamental é processo de animalização de um povo e esse pro-cesso de animalização do tráfico ou da escravidão, ele não é um processo que ficou parado no tempo, isso perpetua. Um outro dado fundamental tam-bém para pensarmos a questão de relações raciais hoje na escola é pensar pessoas transformadas em mercadorias. Outro dado é pensar a opressão

e a resistência, então, quando falamos de opres-são, falamos da opressão sofrida pelos negros du-rante o regime escravista. Então, não houve uma escravidão branda, ou não houve, dentro dessa perspectiva, uma democracia racial. A violência era brutal e ao mesmo tempo que se vivia uma violên-cia brutal, se viviam espaços de resistênviolên-cia funda-mentais, como a formação dos quilombos, como a questão das religiões de matriz africana que se perpetuaram como espaço de resistência. Então, esse confronto, ele se estabeleceu diante de todo esse processo e, mais do que nunca, nós tivemos durante todo esse tempo 57 anos um processo de abolição gradual da escravatura no Brasil, 57 anos não é pouco tempo para pensarmos um proces-so abolicionista. E quando falamos do procesproces-so abolicionista, fala também que a perspectiva que nós vivemos, falamos da Lei 10.639, da Lei 11.645, mas a perspectiva vivida pelos negros no Brasil foi uma perspectiva legal e podemos tratar dessa perspectiva legal e os instrumentos de regulação para que as leis se efetivem ou não, então, para pensarmos isso. E nós tivemos, então, ao longo do processo, leis gerais, pelo menos cinco.

Duas leis antitráfico, uma aprovada em 1831, que a inglaterra determinou que essa lei fosse aprovada para reconhecimento da independên-cia do Brasil; uma outra em 1850, conhecida como Lei Eusébio de Queiroz, depois passamos pela Lei do Ventre Livre, aí é importante falarmos que as crianças ficavam livres, mas a mãe não, então, como é que é esse processo? Como vivenciar esse processo? Depois a Lei dos Sexagenários, que os negros tinham de ficar mais um tempo na es-cravidão para formar um pecúlio para depois sair desse processo escravista e, por fim, a Lei áurea, que se estabelece e, à época, segundo dados dos historiadores, apenas 6,7% dos negros eram ainda escravizados. E dada essa proporção, pensamos então: como é que foram esses fatores para o fim

“As nossas universidades hoje,

salvo raras exceções, não

tratam, não têm uma matéria

específica ou têm apenas

algumas disciplinas optativas

que discutem relações raciais

a partir desse referencial de

cultura afro-brasileira.

“A manutenção do poder na mão

daqueles que tinham o poder

dentro do período colonial; e as

ações coletivas dos escravizados

que deram esse panteão de

quilombos e de quilombolas que

nós temos no Brasil todo”.

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C A D E R N O S T E M áT iC O S C R P S P Psicologia e E

ducação: desafios da inclusão

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da escravidão, quer dizer, que forças estavam em jogo para pensar o final da escravidão no Brasil? Então, pressão externa falávamos na inglaterra; um abolicionismo militante preocupado com uma formação moderna, não preocupado com os es-cravizados; a sobrevivência do estado brasileiro, então, a manutenção do poder na mão daqueles que tinham o poder dentro do período colonial; e as ações coletivas dos escravizados que deram esse panteão de quilombos e de quilombolas que nós temos no Brasil todo. Então, na verdade, a campa-nha abolicionista no fim do século 19 teve um peso fundamental para a população negra do ponto de vista de legislação, mas depois da legislação não houve nenhum ganho adicional, nada que pudesse, na perspectiva de Florestan Fernandes, dizermos, de fato, integrar o negro na sociedade. Então, es-ses ganhos adicionais legais não se transforma-ram em ganhos sociais ou ganhos políticos ou ga-nhos econômicos para a população negra. Então, Florestan Fernandes, no livro “integração do Negro na Sociedade e Classe”, a desagregação do esta-do escravocrata senhorial se operou no Brasil sem garantias que os protegessem na transição para o sistema de trabalho livre. Os senhores foram eximidos de responsabilidade, o Estado e a igre-ja ou qualquer outra instituição não assumiram os encargos especiais que tivessem por objetivo pre-parar essas pessoas para um novo regime. Então, do ponto de vista geral, a abolição da escravidão também trouxe para a população negra um fator de extrema crueldade e é nesse contexto, então, que fazemos uma ponte para a atualidade e faz uma pergunta provocação que sempre fazemos nesse momento de conversa: por que nós temos a necessidade hoje de positivar a negritude? Essa trajetória histórica já nos dá a resposta para isso e nos dá a resposta dentro de uma perspectiva muito interessante, eu não saio pela rua e nenhum outro negro sai pela rua dizendo assim: “Eu sou ne-gro, eu sou nene-gro, eu sou negro”. Mas, de repente, alguém se encarrega de dizer que eu sou negro e sempre da pior forma possível. Então, isso nos traz hoje uma reflexão e alguns exemplos já foram cita-dos hoje que é a leitura que fazemos da sociedade hoje, alguns exemplos que temos. Então, do ponto de vista geral, sempre temos dialogado sobre essa questão de racismo individualmente. Aí, eu trago alguns exemplos: “Negro apanha suspeito de rou-bar o próprio carro”, isso aconteceu no Carrefour de Guarulhos há alguns anos, 2009. Ou seja, eu es-tou dentro de um mercado, eu vou abrir a porta do meu carro e eu apanho porque eu vou abrir a porta do meu carro. Que referencial que está atrás

des-sas pessoas que estão me batendo? Ou: “Dentista negro é morto pela polícia confundido com margi-nal”, estava no carro dele, foi morto, confundido com um marginal. Ou algo que está muito recorren-te hoje: “Jogador de furecorren-tebol é xingado de macaco”. Ou da jovem que também há poucos dias postou uma foto dela com o namorado na rede social e foi perguntado para eles onde que ele arrumou aquela escrava ou se esse aí é o seu dono. Então, as re-ferências iniciais do processo escravista perpetu-am. E esses são apenas alguns poucos exemplos. E nós vivemos isso no cotidiano. Então, uma das questões que pontuamos com relação a isso é que durante algum tempo, parecia que racismo esta-va mais no nível daquela questão da invisibilidade. Então, eu ia numa empresa para fazer uma ficha de trabalho, ele me tratava bem, mas, no entan-to, quando eu saía, ele rasgava a minha ficha. Ou poderia pensar dentro dessa mesma perspectiva, quantos negros cabem dentro de uma telenovela brasileira, independentemente do canal, quantos cabem? Quantos vocês já viram? E pensa a quanti-dade de população negra na sociequanti-dade brasileira. isso eu chamo e talvez seja um pouco radical esse exemplo, mas isso eu chamo de um tiro na nuca, eu tomo um tiro e eu não sei quem está atirando em mim dentro dessa perspectiva da invisibilidade. Agora, esses outros exemplos que estamos mos-trando aqui é um tiro na cara, ou seja, eles estão diante e afirmam o racismo presente.

Não prefiro o tiro na nuca e nem o tiro na cara, mas que isso é importante para pensarmos como a sociedade brasileira hoje está se organizando do ponto de vista da discussão das questões raciais. E essa coisa do tiro na nuca ou na cara não é mi-nha não, é do Sérgio Loroza, ele que fez essa refle-xão interessante sobre isso. Então, na Educação, partindo desse pressuposto de uma visão geral

“Então, na Educação, partindo

desse pressuposto de uma visão

geral de sociedade brasileira, na

Educação, nós temos essas duas

leis que nos possibilitam hoje

ampliar o universo de discussão

das relações raciais para além

de pura e simplesmente pensar

conteúdos”.

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de sociedade brasileira, na Educação, nós temos

essas duas leis que nos possibilitam hoje ampliar o universo de discussão das relações raciais para além de pura e simplesmente pensar conteúdos, porque nós precisamos pensar conteúdos escola-res, mas esses conteúdos escolaescola-res, eles devem se encarnarem em pessoas, em sujeitos e esses sujeitos são alunos, professores, coordenadores pedagógicos, são as pessoas que atendem na se-cretaria da escola, são as pessoas que entregam a merenda para as crianças porque, dependendo da sua visão de mundo, você trata essa ou aquela pessoa de uma forma ou de outra forma.

Então, são questões fundamentais que não podemos perder de vista quando estamos discu-tindo então relações raciais. Então, as duas leis nos amparam do ponto de vista de fazer essa dis-cussão, do ponto de vista de criarem conteúdos de discussão sobre relações raciais. Então, qual é a base fundamental ou por que elas nos dão esse marco legal, amplo de sociedade brasileira? Porque elas colocam a questão como sendo uma questão nacional. Então, você está no Amazonas, você está no Rio Grande do Sul, você está em São Paulo, es-sas questões têm que ser colocadas porque é um universo de país e eu não posso dizer que o ra-cismo no Brasil está circunscrito nesse ou naquele local, então, coloco como uma questão nacional. Visam o quê? Superar uma visão negativa que foi construída ao longo da História do Brasil e cons-truída, visão negativa do africano, visão negativa do afro-brasileiro, visão negativa do indígena. En-tão, essa construção negativa marcou esses po-vos e visaram o que também na escola? Uma per-manência bem-sucedida, porque tanto quanto as questões relativas a gênero, se você não permite um trabalho, se você não reconhece as pessoas, se você não viabiliza as pessoas de forma positi-va, também você está negando uma permanência bem-sucedida nas escolas para quaisquer desses sujeitos. E um outro dado fundamental é que as

leis estão num hall de políticas de ação afirmati-va, então essas políticas de ação afirmativa são também hoje muito interessantes e importantes para nós no nosso trabalho. Dentro da perspectiva da trajetória histórica da lei ou das leis, dizemos que a questão racial no Brasil, e eu já disse antes, repetimos, ela tem como marco fundamental a lei, marcos legais. E na verdade, é sempre um confron-to com uma desigualdade, que foi hisconfron-toricamente construída e, costumamos dizer, se a desigualda-de foi construída, ela podesigualda-de ser desigualda-desconstruída. Esse que é o processo, grande desafio nosso, como é que nós desconstruímos essas desigualdades construídas? E aí, reporta-se às crianças, mas reporta-se a nós, sujeitos dentro dos espaços escolares, como conseguimos desconstruir essas desigualdades? Uma outra questão fundamental quando nós estamos falando dessas leis e esta-mos falando de escola e estaesta-mos falando de inclu-são educacional, desafios para a aplicação da lei, qual é a concepção de Educação que perpassa a cabeça dos gestores públicos? E essa é uma gran-de questão, porque se eu não tenho uma concep-ção de Educaconcep-ção e de que a aprendizagem se dá em idas e voltas, se eu não tenho uma concepção de Educação que vai poder dizer que os sujeitos aprendentes são também sujeitos ensinantes, se eu não tenho uma concepção de Educação que o processo educacional vai se construindo, nada está pronto, nada está feito, a partir só dos con-teúdos que eu tenho no livro didático, eu limito a possibilidade de fazer com que essas leis se efeti-vem, de fato. Um outro dado fundamental é a con-cepção de currículo e na lei, a própria Lei 10.619, ela reconhece currículo como grade, não currículo como totalidade das relações que estabelecem

na escola. Por que se estabelece currículo como grade? Porque coloca: “Olha, História, Literatura e Artes”, aí o professor de Geografia diz para mim: “A questão de discutir relações raciais não é comigo,

“Essas questões têm que ser

colocadas porque é um universo

de país e eu não posso dizer

que o racismo no Brasil está

circunscrito nesse ou naquele

local, então, coloco como uma

questão nacional”.

“Se nós paramos no senso

comum e o conhecimento

do senso comum é um tipo

de conhecimento, mas ele é

eivado de preconceitos, nós

nos tornamos repetidores de

preconceitos”.

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ducação: desafios da inclusão

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não, porque a lei diz que é em História, Literatura e Artes”, ou o professor do Ensino Fundamental 1 e, aí é um espaço fundamental de poder fazer com que as crianças aprendam, e dizem: “Não é comi-go não, porque eu não trabalho com disciplinas, eu sou professor de todas as…”, ou seja, as pessoas então, vão deixando as coisas por fazer.

E deixam muito mais por fazer, sobretudo, por causa da sua formação, a formação que nós temos nas universidades, salvo raríssimas exceções, ela não dá conta de tratar com esses temas. Os cursos de Pedagogia, as faculdades de Psicologia não dão con-ta de tracon-tar do tema. Então, se nós paramos no senso comum e o conhecimento do senso comum é um tipo de conhecimento, mas ele é eivado de preconceitos, nós nos tornamos repetidores de preconceitos. En-tão, temos que avançar para além do conhecimen-to do senso comum. Nós, educadores, educadoras hoje temos que trabalhar dentro dessa perspectiva. Então, a concepção de Educação nos traz um novo conceito, então Educação como uma construção sócio-política, econômica, cultural e histórica. E nes-se universo, não dá para ninguém ficar à margem. Eu costumo dizer que é dar visibilidade a autores e au-toras que estão dentro desse universo escolar, mas não são enxergados numa tela de pintura. Não são enxergados porque eles não estão nos livros, eles não aparecem nos livros e não aparecem, também, nas leituras que os professores fazem nas salas de aula e, hoje, nós estamos vivendo uma questão que é muito interessante e eu falo isso por vezes em pales-tras, não devemos criticar os materiais didáticos, eu digo… eu próprio fazendo reflexão comigo, digo: “Não, esses materiais não precisavam mais ser criticados, são materiais didáticos que são comprados por um governo que aprova uma lei nacional em que história e cultura africana, afro-brasileira e indígena devem estar nos currículos”. Ora, os livros já deveriam dar conta disso e não dar conta de um matiz cultural ape-nas eurocêntrico ou colocar, por exemplo, as popula-ções indígenas dentro da colônia. Não tem mais… não se fala mais sobre a questão de colônia, invisibiliza as populações indígenas dos livros. Então, é aquele que está lá preso. Ou áfrica, a ideia de que a áfrica é um continente parado no tempo, porque em algumas vezes, em algumas das reflexões em que mostramos fotos, nada de excepcional, mas uma foto de uma ci-dade africana com sete milhões e trezentos e poucos mil habitantes, as pessoas assustam, porque a ideia é de que a áfrica é o leão correndo atrás de uma ze-bra numa savana. isso é áfrica. Então, não é um con-tinente parado no tempo, faz parte de todo processo que todos os países, continentes vivem.

Então, essas dimensões são dimensões que a gente… passam, às vezes, despercebidas dentro dessas matérias que nós trabalhamos e, aí, temos que criar um material paradidático para trabalhar com livros comprados pelo governo que dedam aquilo que estamos propondo, ou apenas fazem em alguns deles, algumas denúncias; existem alguns li-vros também denuncistas, mas não avançam mais do que isso. Então, portanto, é fundamental proble-matizarmos esses materiais para problematizar-mos, também, o silêncio e o silenciamento das crian-ças dentro da escola, porque umas fazem silêncio e outras são silenciadas e os conteúdos ajudam a silenciar. Lembro-me que em algumas vezes, quando eu estudava no ensino fundamental, o meu profes-sor ia falar sobre o negro no Brasil, dava vontade de esconder debaixo da última carteira. Então, era uma percepção importante. E daí partimos, é necessário que pensemos em currículo, pensamos em currículo dentro da perspectiva desse diálogo com a diver-sidade que está presente na sociedade brasileira. E quando eu estou falando, eu estou dizendo que o que nós temos de mais novo, hoje, de um ponto de vista de currículo é, sim, discutir as questões de gênero, discutir questões de sexualidade, discutir questões étnico-raciais, negro, indígena, discutir a questão de acessibilidade, é o que pontua como algo novo do ponto de vista do reconhecimento de sujeitos e sujeitos que foram considerados invisíveis ao longo de toda uma trajetória educacional. Então, visibilizar esses sujeitos dentro da nossa sociedade.

“Portanto, é fundamental

problematizarmos esses materiais

para problematizarmos, também,

o silêncio e o silenciamento das

crianças dentro da escola, porque

umas fazem silêncio e outras

são silenciadas e os conteúdos

ajudam a silenciar”

“Uma outra coisa que é fundamental

com relação ao racismo: há um

reconhecimento da existência do

racismo, mas as pessoas acham

que não devem fazer políticas

específicas para discutir isso”

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