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Fake news e social media em Portugal: conceitos, realidades e hipóteses

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Academic year: 2021

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Mestrado em Sociologia

Fake news e social media em Portugal:

conceitos, realidades e hipóteses.

Pedro José Rodrigues Pinto

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Pedro José Rodrigues Pinto

Fake news e social media em Portugal: conceitos,

realidades e hipóteses.

O caso da página “Os Truques da Imprensa Portuguesa”.

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Sociologia orientada pelo Professor Doutor José Manuel Azevedo

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

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Fake news e social media em Portugal: conceitos,

realidades e hipóteses.

O caso da página “Os Truques da Imprensa Portuguesa”.

Pedro José Rodrigues Pinto

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Sociologia orientada pelo Professor Doutor José Manuel Azevedo

Membros do Júri

Professor Doutor Carlos Manuel da Silva Gonçalves Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor Fernando Vasco Moreira Ribeiro Faculdade de Letras - Universidade do Porto

Professor Doutor José Manuel Pereira Azevedo Faculdade de Letras - Universidade do Porto

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Sumário

Declaração de honra ... viii

Agradecimentos ... ix

Resumo ... x

Abstract ... xi

Índice de figuras ... xii

Índice de tabelas ... xiii

Introdução ... 1

Capítulo 1: Pós-verdade e fake news ... 5

1.1 Classificação e categorias de fake news ... 10

1.2 A emergência dos social media e as suas implicações ... 13

1.3 Técnicas de disseminação de informação nos social media ... 18

1.4 Motivações para a promoção de fake news ... 20

1.5 Efeitos das fake news nos indivíduos ... 22

1.6 Implicações geracionais das mudanças nos contextos informacionais ... 25

1.7 Os desafios dos novos contextos para o jornalismo contemporâneo ... 29

1.8 Literacia mediática como ferramenta de resistência às fake news ... 38

Capítulo 2: Fake news e social media em Portugal: O caso da página “Os Truques da Imprensa Portuguesa” ... 42

2.1 Objetivos ... 43

2.2 Abordagem Metodológica ... 45

2.2.1 Contextos e estudos sobre fake news e imprensa em Portugal ... 48

2.2.2 A página de Facebook “Os Truques da Imprensa Portuguesa” ... 53

2.3 Entrevista e análise ... 56

2.4 Apresentação e discussão de resultados ... 74

2.4.1 Principais dimensões de análise ... 75

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vii

2.4.2.1 Temática da Notícia ... 85

2.4.2.2 Gravidade do Enviesamento ... 89

2.4.2.3 Órgãos de Comunicação Social ... 96

Capítulo 3: Conclusões e Considerações Finais ... 102

Bibliografia ... 107 Anexos ... 112 Anexo 1 ... 113 Anexo 2 ... 121 Anexo 3 ... 198 Anexo 4 ... 212 Anexo 5 ... 218 Anexo 6 ... 271 Anexo 7 ... 273

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viii

Declaração de honra

Declaro que a presente dissertação é de minha autoria e não foi utilizada previamente noutro curso ou unidade curricular, desta ou de outra instituição. As referências a outros autores (afirmações, ideias, pensamentos) respeitam escrupulosamente as regras da atribuição, e encontram-se devidamente indicadas no texto e nas referências bibliográficas, de acordo com as normas de referenciação. Tenho consciência de que a prática de plágio e auto-plágio constitui um ilícito académico.

Porto, setembro de 2018 Pedro José Rodrigues Pinto

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ix

Agradecimentos

À minha mãe, ao meu pai, ao meu irmão e à minha avó, Por terem feito de mim aquilo que sou hoje.

Ao Professor José Azevedo, Por toda a ajuda, orientação, apoio e paciência demonstrados ao longo do ano.

Ao Pedro Bragança, Pela disponibilidade e pela clareza e valor que acrescenta a esta dissertação.

Ao Miguel, à Teresa, à Raquel, à Mariana, ao Rui e à Sofia, Pelas infindáveis horas de trabalho e companhia.

Ao Filipe, ao Ricardo, à Rita, ao João, à Joana, à Inês, à Bárbara, ao Nuno, à Raquel, ao Max, ao Duarte, ao Diogo, ao Francisco, ao Zé e ao Luís, Por nunca me deixarem cair.

A todos estes e a muitos outros, O meu mais sincero obrigado.

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x

Resumo

As fake news são um fenómeno que tem alcançado uma relevância incontornável na sociedade contemporânea global e que utiliza as plataformas de social media como um campo fértil de difusão de desinformação. Este estudo procura abordar a realidade portuguesa relativa a esta temática, através do enquadramento de diversos conceitos essenciais para a compreensão integral do fenómeno. Os objetivos passam por averiguar quais são os principais tipos de enviesamentos existentes na imprensa portuguesa e como os mesmos se distribuem em termos de temática, gravidade e órgão de comunicação social. Esta investigação carateriza-se por ser exploratória, tendo como amostra a página de Facebook “Os Truques da Imprensa Portuguesa”, e por uma metodologia qualitativa em dois momentos, tendo-se realizado uma entrevista semidiretiva a um dos criadores e administradores da referida página e aplicado a técnica de análise de conteúdo aos dados recolhidos na mesma página. Os resultados apontam para que os principais problemas da produção noticiosa em Portugal se prendam com a distorção de quem beneficia ou é prejudicado pelas notícias, assim como com alterações relativas às ideias e valores implícitos nas mesmas. Adicionalmente, foram identificados problemas relativos às razões pelas quais as notícias se assumem como relevantes para os leitores e, principalmente, problemas relacionados com a inadequação ou a imprecisão dos títulos das publicações.

Palavras-chave: Fake news, social media, imprensa, notícias, “Os Truques da Imprensa Portuguesa”.

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xi

Abstract

The fake news phenomenon has attained an essential relevance in contemporary global society and uses social media platforms as a fertile field of dissemination of disinformation. This study tries to approach the portuguese reality related to this subject, through the framing of several essential concepts for the integral understanding of the phenomenon. The objectives are to find out what are the main types of biases in the portuguese press and how they are distributed in terms of theme, seriousness and media organization. This research is characterized as exploratory, using as a sample the Facebook page "Os Truques da Imprensa Portuguesa", through a qualitative methodology in two moments, a semi-structured interview to one of the creators and administrators of the page and the technique of content analysis to the data collected on the same page. The results point out that the main problems of news production in Portugal are related to the distortion of those who benefit or are prejudiced by the news, as well as changes related to the ideas and values implicit in them. Additionally, problems were identified regarding the reasons why news are deemed to be relevant to readers and, especially, problems related to the inadequacy or inaccuracy of the titles of publications.

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Índice de figuras

Figura 1 – Frequências das notícias por órgão de comunicação social ... 75

Figura 2 – Distribuição das notícias por data ... 76

Figura 3 – Distribuição das notícias por grau de enviesamento ... 80

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Índice de tabelas

Tabela 1 – Categorias de análise ... 45

Tabela 2 – Análise de entrevista: âmbito e finalidade da página ... 57

Tabela 3 – Análise de entrevista: funcionamento e razões do sucesso ... 59

Tabela 4 – Análise de entrevista: recursos ... 61

Tabela 5 – Análise de entrevista: dificuldades encontradas e reações ... 62

Tabela 6 – Análise de entrevista: "fake news" e imprensa ... 67

Tabela 7 – Análise de entrevista: impacto e futuro da página ... 69

Tabela 8 – Análise de entrevista: o combate às "fake news" e o papel do público ... 71

Tabela 9 – Órgão de comunicação social por temática ... 85

Tabela 10 – Nível de gravidade de enviesamento por órgão de comunicação social .... 90

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Introdução

Num mundo crescentemente conectado e livre de fronteiras, na era dourada do desenvolvimento das tecnologias de informação, assistimos in loco a eventos e a fenómenos sem precedentes na história da própria humanidade. A comunicação instantânea entre seres humanos em pontos opostos do globo, a organização de iniciativas comunitárias com fins sociais, políticos ou humanitários através de plataformas digitais, a criação de uma identidade e de uma cultura próprias da Internet são apenas exemplos das infinitas possibilidades atuais de comunicação com uma escala inigualável em todo o passado histórico da nossa civilização.

Consequentemente, neste “século da comunicação”, o controlo da informação e a difusão de perceções e de narrativas pelas grandes massas assume-se como um ponto incontornável e transversal a todas as sociedades, classes, grupos e comunidades, independentemente de orientações políticas, ideológicas e religiosas. Num extremo, verificam-se inúmeros fenómenos relativos aos perigos do controlo e da censura da informação, da propaganda e do facciosismo, visíveis nas realidades recentes um pouco por todo o globo, desde o conflito corrente de natureza fundamentalmente “informacional” entre os Estados Unidos da América e a Rússia, decorrentes de uma alegada campanha de influência russa e de hacks de informação sensível constante em contas de correio eletrónico de oficiais do Partido Democrata americano, no contexto das eleições presidenciais americanas de 2016; à realidade norte-coreana de um controlo estatal total da informação disponível, assim como da censura e impossibilidade de acesso a outras fontes de informação, por parte da população; passando pelo recente bloqueio de acesso a grande parte das plataformas de social media na Turquia; e que se assumem como eventos-chave na análise e na discussão da verdadeira extensão do impacto e da influência das tecnologias de informação na sociedade global contemporânea.

No outro extremo, verifica-se uma emergência da ideia da liberdade de expressão como um direito sem moderação nem restrições, o que, em certas realidades, se assume como um ponto de ignição e de perpetuação de conflitos e de confrontos entre grupos, etnias e classes, quando se toma em conta a realidade da banalização dos “discursos de ódio”. Inúmeros exemplos podem ser apontados relativos a esta realidade, particularmente aqueles visíveis no contexto americano dos últimos anos, com um

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profundo debate relativamente à “freedom of speech” e aos seus limites, numa sociedade que apresenta problemas profundos e enraizados de racismo, preconceito e discriminação, e que se encontra profundamente dividida desde a eleição de Donald Trump como presidente em 2016; e à realidade europeia decorrente da crise migratória na Europa, desde 2015, e do consequente ressurgimento de grupos e do populismo de extrema-direita, muitas vezes quasi-fascista, sendo possível verificar um crescimento dos casos de “discurso de ódio” dirigidos, particularmente, a minorias étnicas.

Adicionalmente, verificam-se na sociedade global contemporânea fenómenos relacionados com a censura e a revelação de informação, de uma relevância global incontornável, como os fenómenos da Wikileaks, uma organização multinacional que assume como objetivo a publicação de documentação oficial censurada pelos meios de comunicação mainstream relativos à guerra, à espionagem e à corrupção, e que alcançou notoriedade global com a publicação de documentos e de vídeos de crimes de guerra perpetrados aquando da invasão americana do Iraque e com a publicação de e-mails comprometedores de Hillary Clinton durante as eleições presidenciais americanas de 2016; e o caso de whistleblowing – delação – de Edward Snowden, em 2013, que revelou a existência de inúmeros programas globais de vigilância e de espionagem sobre cidadãos comuns e instituições democraticamente eleitas, executado por agências americanas como a NSA – “National Security Agency”, com a cooperação de empresas de telecomunicação e de agências e governos europeus, em grande medida ignorado ou censurado pelos mass media.

No sentido de não permitir um potencial estabelecimento de uma sociedade quasi-orwelliana, refém da censura da informação e do controlo de um “Big Brother”, torna-se imperativo o esforço da sociedade e, particularmente, da academia, de contribuição para o conhecimento e compreensão, em toda a sua extensão, desta realidade e deste processo, que se desenrola diária e ininterruptamente em espaços comunicacionais online, de onde importa realçar as diversas plataformas de social media, que apresentam um alcance de milhares de milhões de indivíduos em todo o mundo.

Desta forma, as fake news constituem-se apenas como uma das dimensões de um processo de controlo informacional muito vasto. No entanto, são, possivelmente, uma das dimensões mais gravosas e potencialmente mais perigosas, pois são direcionadas às grandes massas, no sentido de controlar ou de moderar o grande público, através da promoção de narrativas, de perceções e do controlo do debate e da opinião públicos –

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particularmente as fake news que versam sobre assuntos mais controversos e fraturantes e que podem ter consequências mais graves na sociedade. Um outro tipo de notícias enviesadas menos gravosas, nomeadamente as notícias clickbait surgem, como veremos, de uma necessidade maioritariamente financeira, decorrente da crise do modelo de negócio dos órgãos de comunicação social em contexto online, e da sua própria necessidade de sobrevivência.

A pós-verdade e as fake news, expressões que ganharam notoriedade e relevância no panorama informacional e jornalístico global nos últimos anos, assumem-se, então, em certa medida, como um fenómeno tão antigo como a própria imprensa e comunicação social. Há séculos que a concentração e a transmissão de informação se assume como um vetor fundamental na estruturação e na condução da opinião e do debate públicos nas diversas sociedades. No entanto, com a expansão digital em rede, com o desenvolvimento de conteúdos na Internet, com o surgimento de novas plataformas noticiosas e com uma maior procura e competitividade informacional “em direto” e “on demand”, este fenómeno assume contornos e consequências substancialmente mais gravosas do que até há algumas décadas atrás.

Esta investigação pretende contribuir para o corpo de conhecimento relativo a esta temática, particularmente no que toca à realidade portuguesa. Para tal, procurou-se enquadrar teoricamente a temática, seguindo-se uma análise de conteúdo e posterior análise quantitativa aos principais problemas e enviesamentos apresentados pelos órgãos de comunicação social portugueses, através da análise de uma base de dados de uma página de uma rede social intitulada “Os Truques da Imprensa Portuguesa” cujo objetivo passa por apontar conteúdos noticiosos problemáticos e más-práticas jornalísticas. Neste sentido, foi ainda realizada uma entrevista a um dos criadores e administradores da referida página, de forma a enriquecer esta investigação e justificar a utilização da referida página, simultaneamente como estudo de caso e como base de dados para a supramencionada análise.

Do ponto de vista estrutural, esta dissertação organiza-se da seguinte forma: inicialmente, no primeiro capítulo, procurou-se contextualizar uma série de conceitos e realidades teóricas essenciais. Ainda que, em grande medida, estas sejam realidades que justificariam, em si mesmas, uma dissertação própria, tomou-se a opção de realizar um apanhado geral sobre cada uma delas, de forma a apresentar-se a contextualização necessária para uma compreensão integral do contexto real da investigação empírica

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levada a cabo e apresentada no segundo capítulo deste documento. Por fim, no terceiro capítulo, apresentam-se as mais importantes descobertas e conclusões decorrentes do estudo realizado, assim como as principais considerações finais e propostas de investigação futuras.

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Capítulo 1: Pós-verdade e fake news

Em 2016, “pós-verdade” foi considerada a palavra do ano pelo Dicionário Oxford, que a define como um adjetivo:

“Relacionado com ou que indica circunstâncias em que os factos objetivos são menos influentes na modelagem da opinião pública do que apelos à emoção e crenças pessoais” (Oxford Dictionaries, 2016).

O termo “pós-verdade” parece ter sido originalmente utilizado – com o significado que assume hoje – pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich num ensaio de 1992 publicado na revista The Nation, intitulado “A Government Of Lies”, onde o autor, refletindo sobre o escândalo Irão-Contras e sobre a Guerra do Golfo, lamenta que “nós [os americanos], como um povo livre, decidimos livremente que queremos viver num mundo de pós-verdade” (Tesich, 1992, p. 13).

Apesar do conceito existir há várias décadas, foi no período temporal correspondente ao ano de 2016, grosso modo, que o mesmo extravasou o domínio comunicacional e jornalístico e entrou no léxico da população geral, assim como outras expressões relacionadas, tais como os “factos alternativos” e, principalmente, as “fake news”. Estas expressões e, de forma geral, a temática a que aludem passaram, desde então, e de forma frequente, a fazer parte do debate e da opinião públicos.

De forma a explicar as razões justificativas desta realidade, importa realçar dois eventos concretos, que tiveram lugar durante o ano de 2016, e cujo contexto foi essencial para a emergência e disseminação globais desta temática e das expressões supramencionadas: o Referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, que deu origem ao processo de saída do Reino Unido da União Europeia, e que decorre ainda hoje – mais de dois anos depois do referendo –, comummente designado por Brexit; e a Eleição Presidencial nos Estados Unidos da América, que elegeu Donald Trump como o novo presidente americano.

Estes fenómenos altamente mediáticos são eventos concretos onde, em contextos comunicacionais inflamáveis e radicalizados, é possível verificar o combate entre a “verdade” e a “mentira” e que acabam por “cristalizar a ideia de um mundo movido a paixões e crenças (…) onde a verdade não é mais necessária” (Medeiros, 2017, p. 24). Dada a sua natureza política, ambos os eventos mencionados foram altamente fraturantes

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nas respetivas sociedades, o que acaba por justificar o facto do conceito de “pós-verdade” surgir frequentemente associado a um substantivo em particular: “política”. O conceito passou, então, de um termo periférico para um pilar fundamental do comentário político, utilizado hoje frequentemente pelas principais publicações noticiosas sem necessidade de clarificação ou definição, assim como em programas televisivos e radiofónicos de comentário e debate político (Oxford Dictionaries, 2016).

Em suma, a delimitação do conceito de “pós-verdade” passa, em grande medida, pela ideia de que a atualidade se constitui como uma era de pós-verdade, onde as crenças pessoais e as emoções tomaram o lugar dos factos e das evidências (Rochlin, 2017). Naturalmente, um dos segmentos da sociedade mais implicado nesta realidade – e aquele que merece a nossa particular atenção nesta investigação – é aquele frequentemente denominado de “Quarto Poder”: a imprensa ou os media – meios de comunicação em massa.

Assim, e de acordo com Rochlin (2017), a natureza das notícias, e o que os indivíduos aceitam como notícias, também se tem vindo a transformar num mercado baseado nas crenças e nas emoções. Em muitos casos, a verdade da história já não importa, sendo que o que importa, isso sim, é se a história se alinha com aquilo que o indivíduo quer ler e ouvir. Não obstante a definição do conceito avançada, importa realçar, por outro lado, a opinião de alguns autores que postulam a ideia do conceito de “pós-verdade”, no universo jornalístico, como um eufemismo para um outro conceito bastante mais conhecido e próximo de todos os indivíduos: a “mentira” (Berckemeyer, 2017; Cruz, 2017; Medrán, 2017; Prego, 2017).

No seguimento do contexto estabelecido pelo conceito de “pós-verdade”, impõe-se a análiimpõe-se de outro fenómeno mais concreto que ganhou notoriedade global nos últimos anos, particularmente nos contextos jornalístico e comunicacional, designado frequentemente por “fake news” – notícias falsas, numa tradução literal. No entanto, e no sentido de abarcar uma realidade extremamente vasta e em constante mutação, essencial para a compreensão deste fenómeno, torna-se necessário contextualizar aquilo que é a realidade atual da imprensa e dos meios de comunicação em massa na nova era digital.

Paralelamente àquilo que se tem vindo a verificar em inúmeros sectores da sociedade, também a comunicação social tem vindo a migrar para o contexto digital, no sentido de seguir o trajeto dos seus leitores (Pickard, 2016). Ora, esta transição de um

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formato físico para um formato digital – pelo menos no caso dos jornais – não é imediata e levanta uma série de obstáculos para estes órgãos de comunicação social, em particular a nível do modelo de negócio. Enquanto que, até à “explosão” das tecnologias de informação, o modelo de negócio tradicional dos jornais passava, em grande medida, pela publicidade e pelas receitas da venda do formato físico do mesmo, a transição para o contexto digital acaba por “desintegrar” este modelo, dada a gratuitidade de grande parte da oferta noticiosa online. Adicionalmente, nenhum outro modelo de receita – incluindo modelos de subscrição e estatutos de associado – é comercialmente viável a um nível sistémico (ibidem). Esta “indefinição” de modelo de negócio acaba por fragilizar a posição das redações noticiosas e por abrir espaço a problemas na publicação e partilha de notícias, como veremos mais à frente.

A expressão “fake news” refere-se, então, de forma sumária, a mentiras apresentadas como notícias, i.e., falsidades formatadas e feitas circular de forma a que o leitor as possa interpretar como artigos noticiosos legítimos (Mustafaraj & Metaxas, 2017, Rochlin, 2017). Uma outra classificação é avançada por Love (2007, cit. in Crittenden, Hopkins & Simmons, 2011), que define fake news como notícias apresentadas como factuais, objetivas e credíveis quando, de facto, são ficcionais.

Por outro lado, alguns autores consideram que as fake news não incluem somente notícias falsas na sua integralidade, introduzindo na sua definição do conceito a omissão ou a retenção de informação e abrindo espaço à inclusão neste fenómeno de notícias que, não sendo necessária e totalmente falsas, apresentam problemas e enviesamentos decorrentes da seleção e apresentação da informação veiculada. A título de exemplo, Elliot & Culver (1992, cit. in Lee, 2004, p. 98, cit. in Rubin, Chen & Conroy, 2015b) definiram, há quase três décadas, um conceito próximo daquele que atualmente designamos por fake news, ainda que num contexto não-digital, “journalistic deception” – fraude jornalística, como:

“um ato de comunicar mensagens verbalmente (…) ou não-verbalmente, através da retenção de informação, com a intenção de iniciar ou de sustentar uma falsa crença” (p. 1).

Num novo contexto digital, este tipo de notícias falsas, fabricadas, falsificadas, tendenciosas ou enganadoras constituem-se como instâncias de “digital deception” – fraude digital, conceito que pode ser definido como um tipo de controlo intencional de

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informação num ambiente tecnologicamente mediado, com o objetivo de criar uma falsa crença ou uma falsa conclusão (Rubin, Conroy & Chen, 2015a).

No entanto, e ainda que os termos sejam relativamente recentes, os conceitos de pós-verdade e de fake news não são um fenómeno completamente novo, decorrendo de fenómenos similares existentes desde tempos remotos, ainda que em décadas passadas se designassem simplesmente por propaganda (Medrán, 2017, Quirós, 2017). No entanto, a rápida e poderosa evolução das tecnologias de informação tornou possível a produção, a difusão e o consumo das mesmas numa escala massiva (Mustafaraj & Metaxas, 2017).

Ainda que seja naturalmente difícil definir, de forma indiscutível, a origem das fake news, estas serão, alegadamente, uma criação do editor americano Benjamin Day, que publicou uma série de artigos, no The Sun, um periódico sediado em Nova Iorque, hoje em dia referidos como o Great Moon Hoax of 1835 – Grande Engodo da Lua de 1835, onde, sumariamente, era descrita a descoberta de vida e de uma civilização na lua, com a principal motivação vender mais jornais (Crittenden, Hopkins & Simmons, 2011).

É possível encontrar inúmeras referências a histórias falsas publicadas durante o século XIX e inícios do século XX, o que suporta a ideia de que esta problemática não é, na realidade, um fenómeno recente. No sentido de compreender a lógica por trás das motivações da publicação, à época, destes logros, importa recuperar a opinião do afamado editor americano William Randolph Hearst, que acreditava que:

“a verdade crua é, de certa forma, uma comodidade negociável, especialmente quando a sua subversão pode levar a lucro ou poder” (Love, 2007, p. 34, cit. in ibidem, p. 174).

Independentemente da sua origem, e de uma perspetiva micro, confundir fake news com relatos autênticos pode acarretar consequências graves, na medida em que ser induzido em erro ou estar mal-informado impacta negativamente o processo de tomada de decisão dos indivíduos e, consequentemente, os resultados que daí decorrem. Isto é particularmente gravoso na sociedade atual, dado que as notícias diárias constituem uma importante fonte de informação para as vidas sociais e profissionais dos indivíduos, afetando decisões em matérias tão variadas como investimentos, saúde, compras online, questões legais ou recreação. Também os analistas profissionais, nos domínios financeiro e de inteligência governamental, por exemplo, fazem uso das notícias no sentido de descobrir factos, revelar padrões e fazer predições para o futuro (Bakshy et al., 2011, cit.

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in Ferrara et al., 2016; Rubin, Conroy & Chen, 2015a; 2015b; Shao et al., 2017, Wu et al., 2017).

A um nível macro, a propagação massiva de fake news tem vindo a ser identificada como um importante risco global, sendo inclusivamente e alegadamente responsável pela influência de eleições e pela ameaça à saúde dos sistemas democráticos (Prego, 2017; Shao et al., 2017). Um exemplo claro desta realidade, e que pode ser verificado ainda nos dias de hoje, é a questão das eleições presidenciais americanas de 2016: quase dois anos depois da eleição de Donald Trump, esta temática mantém-se relevante no contexto noticioso americano e global, onde alusões às fake news, críticas à comunicação social, acusações de parcialidade e submissão e discursos inflamados, tolhidos pelas emoções e por crenças pessoais, continuam na ordem do dia.

Em suma, a divulgação e o consumo de fake news implica a banalização da mentira e, consequentemente, a relativização da verdade, através do aumento da importância do emocional e das crenças pessoais, comparativamente ao objetivo e ao racional, independentemente dos factos verificáveis (Llorente, 2017).

No seguimento do exposto supra, importa tentar definir aquilo que podem ser consideradas notícias genuínas, contrariamente às fake news. Apesar da subjetividade inerente a toda e qualquer notícia, reportagens verdadeiras e de valor incontestável no jornalismo digital são abundantes na imprensa bem-estabelecida e em órgãos de comunicação social de “legado jornalístico”, assim como em blogs pessoais de natureza jornalística de cidadãos com reputação estabelecida. Este tipo de fontes pode ser considerada como genuína até prova em contrário, ou até serem retratadas ou corrigidas (Rubin, Conroy & Chen, 2015b).

No entanto, existem eventos cuja natureza controversa ou fraturante implicam, muitas vezes involuntariamente, uma parcialidade por parte dos jornalistas ou repórteres. Assim, em alguns eventos políticos, conflitos territoriais, guerras ou outras controvérsias correntes, os canais noticiosos ou repórteres individuais podem ser acusados de parcialidade, fanatismo ou simplesmente de mentiras. Estas situações não cumprem os critérios de mentira intencional, podendo não se incluir numa classificação de fake news, pois a reportagem de um dado acontecimento tem grande probabilidade de ser consistente com as crenças, perspetivas do mundo, enviesamentos e afiliações do repórter (ibidem).

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1.1 Classificação e categorias de fake news

Dado o mediatismo que estas temáticas têm assumido nos últimos anos no domínio público, também a academia se tem debruçado sobre as mesmas. Desta forma, vários autores têm tentado categorizar e classificar os diferentes tipos de fake news existentes. A título de exemplo, e no sentido de aprofundar a lógica por trás da análise a este tipo de produções noticiosas, atentaremos agora aos trabalhos desenvolvidos por Rubin, Conroy & Chen (2015b, 2015c). Estes autores definem três tipos fundamentais de fake news:

1. Clickbait e tabloides (Serious fabrications). Nesta categoria enquadra-se aquilo que se designa por “imprensa amarela” – “yellow press” no original. Este tipo de media caracteriza-se por apresentar um vasto espectro de notícias não-verificadas, utilizando títulos chamativos, exageros, aproveitamento de escândalos e sensacionalismo no sentido de aumentar o tráfego e os lucros. Os tabloides, especificamente, enfatizam frequentemente tópicos cujo valor de notícia é reduzido, tais como histórias de criminalidade, astrologia e intrigas relativas a celebridades, entre outros;

2. Fraudes e burlas (Large-scale hoaxes). Este tipo de falsificações deliberadas são tentativas de enganar as audiências disfarçando histórias ficcionais de notícias, originando geralmente em fontes duvidosas, mas que podem ser aproveitadas e erradamente validadas por estações jornalísticas tradicionais. Brunvand (1998; cit. in Rubin, Conroy & Chen, 2015b, p. 3) distingue estas fraudes das “partidas” ou das “brincadeiras”, definindo-os como “construções relativamente complexas e de larga-escala” que podem incluir inverdades que vão para além da mera dimensão de brincadeira e “causar perdas materiais ou danos à sua vítima” (p. 875; cit. in ibidem, p. 3). Estas fraudes apresentam um nível de complexidade elevado, pelo que requerem métodos de análise que vão para além da simples análise textual, tais como a análise multiplataformas, de e em rede;

3. Sátira e enganos de natureza humorística (Humorous fakes). Esta categoria apresenta-se naturalmente menos gravosa do que as anteriores, pois se os leitores estiverem cientes da intenção humorística, deixam de estar

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predispostos a aceitar a informação como verdadeira. Os sites de sátira ou de paródias são exemplo de um género específico que apresentam as notícias “num formato típico do jornalismo tradicional mas que se baseiam fortemente na ironia e no humor de forma a emular uma fonte noticiosa genuína, imitando fontes e histórias noticiosas credíveis, e frequentemente alcançando uma vasta distribuição” (News Satire, 2015, cit. in Rubin, Conroy & Chen, 2015b, p. 3).

É de realçar que, simultaneamente, o mesmo esforço tem sido realizado no âmbito das fontes das fake news, i.e., os órgãos de comunicação social e os respetivos websites que publicam e alojam as mesmas. Neste sentido, importa realçar o trabalho de Zimdars (2016, cit. in Rochlin, 2017), que avança 11 categorias de vários tipos de websites de fake news:

1. Fake News (órgãos que apresentam notícias objetivamente falsas); 2. Satire (órgãos de natureza fundamentalmente satírica);

3. Extreme Bias (órgãos que, apesar de não publicarem notícias objetivamente falsas, apresentam um viés e uma parcialidade recorrentes e pronunciados); 4. Conspiracy Theory (órgãos que publicam principalmente notícias de natureza

conspiratória não verificadas);

5. Rumor Mill (órgãos cuja atividade passa, principalmente, pela publicação de notícias baseada em rumores e informação não verificada);

6. State News (órgãos de natureza estatal, que apresentam publicações parciais e alinhadas com os interesses do referido Estado);

7. Junk Science (órgãos cujas publicações se baseiam fundamentalmente em pseudociência e temáticas daí decorrentes);

8. Hate News (órgãos orientados por motivações de ódio, a grupos e minorias étnicas, religiosas, de género, e outros);

9. Clickbait (órgãos cujas notícias são principalmente clickbait – isco de cliques); 10. Proceed With Caution (órgãos que, apesar de nem sempre incorrerem em

enviesamentos, por vezes apresentam distorções e falsificações);

11. Political (órgãos com tendências político-ideológicas definidas, que se traduzem no teor e no tom das notícias publicadas).

Apesar dos esforços destes e de outros autores em estruturar a informação relativa a esta temática ser útil no sentido de promover uma maior literacia mediática e de partilhar

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conhecimento relativo a uma questão tão fulcral como a credibilidade noticiosa com que somos confrontados atualmente, a verdade é que esta sistematização através da elaboração de categorias acaba por sofrer de um problema fundamental: a mesma só é eficaz para os indivíduos que partilhem das mesmas perspetivas político-ideológicas, i.e., dependendo das crenças do indivíduo, diferentes categorizações podem ser utilizadas para a mesma notícia e respetiva fonte (Rochlin, 2017).

Esta é uma questão muito importante relativa a qualquer tipo de análise sobre esta temática, pois cristaliza a ideia de que toda e qualquer tentativa de contributo para a construção, por parte de cientistas e pesquisadores, de um corpo de conhecimento relativo ao estado atual da produção noticiosa, em contexto digital, e das falhas e enviesamentos que as mesmas apresentam poderá ser sempre alvo de críticas por parte de indivíduos e organizações cujas posições e crenças difiram das dos investigadores. Com isto em mente, naturalmente que esta investigação sofrerá dos mesmos problemas. No entanto, apesar da subjetividade inerente à problemática, potenciais investigadores não se deverão sentir inibidos de procurar colaborar para a análise e compreensão deste fenómeno, sendo que, como referido supra, em última instância, todo e qualquer trabalho que incida sobre este tema contribuirá, pelo menos, para o aumento da consciencialização e da literacia mediáticas dos indivíduos.

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1.2 A emergência dos social media e as suas implicações

Como referido supra, apesar das fake news não serem um fenómeno novo, o ciberespaço, ou o ecossistema informacional online é um campo particularmente fértil para a propagação de desinformação. A evolução e a consolidação deste “novo” espaço de disseminação tem um impacto colossal na forma como os indivíduos acedem a, consomem e partilham notícias (Shao et al., 2017).

Hoje em dia, a maior parte dos indivíduos obtém acesso às notícias através das redes sociais – “social media” (ibidem), estando as tradicionais formas de jornalismo a perder relevância perante o crescimento de novos canais e plataformas de comunicação, como os blogs, as aplicações de mensagens instantâneas e as redes sociais, que se assumem cada vez mais como fontes primárias de notícias para os consumidores (Oh et al., 2010, cit. in Wu et al., 2017; Gottfried & Shearer, 2016, cit. in Pickard, 2016; Llorente, 2017; Rochlin, 2017).

Os social media podem ser definidos como “um grupo de aplicações baseadas na Internet que se desenvolvem com base nas fundações ideológicas e tecnológicas da Web 2.0 e que permitem a criação e a partilha de conteúdo gerado pelo utilizador” (Kaplan & Haenlein, 2010, p. 61, cit. in Crittenden, Hopkins & Simmons, 2011, p. 176). Com a consolidação das redes sociais, a capacidade de aceder e de partilhar informação mudou drasticamente com o desenvolvimento de um protocolo de comunicação em rede comum. Paralelamente ao crescimento do número de utilizadores, também a sofisticação do conteúdo evoluiu, de uma comunicação unidirecional e passiva para um conjunto de plataformas que permitem aos utilizadores operar e comunicar instantaneamente num mundo crescentemente conectado e livre de fronteiras. A tecnologia existente dentro das plataformas de social media geraram formas radicalmente novas de interagir, e o mundo dos social media cresceu drasticamente (Crittenden, Hopkins & Simmons, 2011). De acordo com Hansen et al. (2011, p. 3, cit. in ibidem, p. 176), “milhares de milhões de pessoas criam biliões de conexões através dos social media, a cada dia”.

Um dos principais problemas associados à temática das fake news, no contexto dos social media, passa pelo facto de que uma quantidade considerável dos indivíduos não lê para além do título do artigo. Um estudo de Gabielkov et al. (2016, p. 182, cit. in Rochlin, 2017) demonstrou que 59% dos artigos noticiosos partilhados no Twitter – uma das principais plataformas de consumo e partilha de informação online - não são sequer

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lidos antes de serem partilhados. Para além da problemática associada à estruturação do debate público – naturalmente fragilizada pela falta de profundidade das opiniões construídas pelos indivíduos, com base apenas nos títulos dos artigos, esta questão acarreta consequências graves para os órgãos de comunicação social que, cientes desta realidade, sentem a necessidade de titular os seus artigos de forma atraente e sugestiva, muitas vezes distorcendo ou enviesando a realidade dos mesmos, de forma a levar os indivíduos a selecionar e a partilhar os conteúdos que produzem, de entre uma vasta quantidade de opções disponíveis.

No seguimento da questão referida supra, torna-se necessário introduzir e definir um novo conceito importante para esta investigação. O “clickbait” – “isco de cliques”, numa tradução literal – é um termo que se refere a “conteúdo cujo principal propósito passa por atrair a atenção e encorajar os utilizadores a clicarem numa hiperligação para uma página web em particular” (Chen, Conroy & Rubin, 2015c, p. 15; Oxford Dictionaries, 2017, cit. in Rochlin, 2017, p. 389).

O fenómeno do clickbait decorre diretamente da transição do jornalismo tradicional para o contexto digital e pela absorção do mesmo pelos social media. Uma das principais motivações para a propagação de fake news e de notícias enviesadas ou sensacionalistas passam pela obtenção de receitas através de uma “competição por cliques”. Tal como referido anteriormente, esta transição do jornalismo tradicional para o contexto digital colocou em causa o modelo de negócio dos órgãos de comunicação social, o que, aliado à fácil monetização do tráfego nos respetivos websites através da publicidade (Chen, Conroy & Rubin, 2015c; Shao et al., 2017), gera a necessidade de atrair o leitor a clicar na notícia. Para tal, o fenómeno de clickbait é uma das ferramentas mais poderosas, sendo que, tipicamente, de forma a serem bem-sucedidos na atração da atenção dos leitores, são apresentadas histórias falsas ou enviesadas, de temáticas que apresentem um apelo emocional, tal como de natureza política ou religiosa, aliadas a títulos e imagens provocativas (Mustafaraj & Metaxas, 2017).

Em suma, os leitores são atraídos pelo apelo emocional, enquanto que os fornecedores de fake news, ou de notícias que apresentam falhas ou enviesamentos, através do apelo do clickbait, ganham uma percentagem do dinheiro da publicidade por cada clique (Chen, Conroy & Rubin, 2015c; Rochlin, 2017).

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A ideia de procura de obtenção do lucro por parte deste tipo de artigos e websites é corroborada pelos próprios órgãos de comunicação social. Por exemplo, após os surpreendentes resultados das eleições presidenciais americanas de 2016, na medida em que contrariaram a esmagadora maioria das sondagens realizadas, os media americanos direcionaram a sua ira para plataformas digitais como o Facebook e a Google, como no artigo editorial do New York Times, de 19 de Novembro de 2016:

“A maior parte das “fake news” são produzidas por burlões em busca de dinheiro fácil. A vasta maioria destes assume posições da extrema-direita. No entanto, uma grande parte da responsabilidade por este flagelo jaz com companhias da Internet, tais como o Facebook e a Google, que tornaram possível que “fake news” sejam partilhadas quase instantaneamente com milhões de utilizadores e que têm sido pouco céleres a bloqueá-las dos seus sites.” (cit. in Mustafaraj & Metaxas, 2017, p. 2).

Apesar do tom agressivo e emocional que transparece no artigo, possivelmente despoletado pela eleição de Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos da América, dado que o New York Times endossou a candidatura de Hillary Clinton, estas acusações são, de certa forma, fundamentadas. O Facebook, através da substituição de seres humanos por algoritmos (na filtragem de fontes na ferramenta “Trending News” – notícias tendência), assumiu um papel crucial na propagação de fake news. De forma similar, a facilidade com que a Google permite a monetização e a obtenção de lucro através da publicidade também contribui para a criação de uma indústria de fake news. Desta forma, o que se torna preocupante é o facto de os programadores de plataformas web e as próprias companhias de tecnologia terem conhecimento relativamente a estes problemas e fazerem pouco no sentido de informar e educar o público das possíveis consequências, assim como não agirem de forma proactiva e efetiva no sentido de impedir este tipo de instrumentalização (Mustafaraj & Metaxas, 2017).

No contexto dos social media há, então, uma grande exposição diária a fake news, i.e., conteúdo falso ou enganador – boatos, rumores, teorias da conspiração, reportagens fabricadas, títulos clickbait e sátira (Shao et al., 2017), sendo que, em suma, as fronteiras entre a produção de notícias e a criação e partilha de informação se têm vindo gradualmente a esbater no ambiente atual de notícias online e dos social media, sendo que notícias ou publicações outrora “fugazes” fazem agora parte da dimensão estática da informação pesquisável (Rubin, Conroy & Chen, 2015b).

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Apesar do exposto supra, a propaganda online não começou com os social media, em plataformas como o Twitter ou o Facebook. Na realidade, a mesma é muito mais antiga do que o surgimento e a consolidação das redes sociais, sendo tão antiga quanto a própria web. No entanto, antes do desenvolvimento das mesmas, assim como de poderosos motores de busca, não era fácil para a propaganda “descobrir” os utilizadores. As redes sociais tornaram, então, mais fácil o acesso e a partilha de conteúdos, através de técnicas conhecidas hoje em dia como “web spam” (Mustafaraj & Metaxas, 2017).

As notícias em contexto digital são, hoje em dia, facilmente acessíveis através de websites de fontes noticiosas, dos social media, de pesquisas de palavras-chave em motores de pesquisa ou através de websites e serviços agregadores de notícias, que compilam os feeds subscritos pelo utilizador no seu computador ou dispositivo móvel (Crittenden, Hopkins & Simmons, 2011; Rubin, Conroy & Chen, 2015a, 2015b). No entanto, como supramencionado, as fontes noticiosas online variam em credibilidade, desde websites institucionais de meios de comunicação mainstream a websites não-institucionais de repórteres amadores ou “cidadãos-jornalistas” (Gillmore, 2004; cit. in Rubin, Conroy & Chen, 2015a).

Um outro conceito que se torna, então, essencial analisar, neste contexto, são os “cidadãos-jornalistas” e as consequentes notícias “contribuídas pelo utilizador”, potenciadas em grande medida pela massificação de dispositivos móveis capazes de recolher informação em formato de áudio e de vídeo sem necessidade de intermediários: “Um número crescente de distribuidores de media dependem de contribuições de repórteres amadores, que produzem material autêntico no local, e.g., em casos de desastres naturais ou perturbações políticas. Com os dispositivos móveis é fácil estabelecer conteúdos mediáticos no local de captura e de publicação dos mesmos. Assim, torna-se progressivamente mais difícil determinar a origem e a qualidade dos conteúdos fornecidos, especialmente sob a constante pressão de ser o primeiro no mercado noticioso” (Ahmed et al., 2012, cit. in Rubin, Conroy & Chen, 2015a, p. 2).

Estes “cidadãos-jornalistas”, exemplo acabado da democratização mediática (Gooch, 2017), não são obrigados a seguir as linhas orientadoras de verificação de fontes e de factos existentes no jornalismo profissional, por vezes referido como “Notícias 1.0” ou “a disciplina da verificação rigorosa”. Meios de comunicação não-institucionais,

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incluindo os “cidadãos-jornalista” ou “Notícias 2.0”, permitem que conteúdos não verificados passem por reportagens bona fide. Em muitos casos, as notícias produzidas por “cidadãos-jornalistas” são confiáveis e verificadas, mas existem outros em que as notícias são intencionalmente falsificadas, tanto em reportagens amadoras como em institucionais (Rubin, Conroy & Chen, 2015a).

Esta é uma questão particularmente importante na realidade noticiosa atual, pois dada a necessidade, por parte dos órgãos de comunicação social, de estar “em cima” de todo e qualquer acontecimento, no sentido de ser o primeiro ou de estar na linha da frente na cobertura de eventos relevantes, os mesmos acabam por, não raras vezes, utilizar os conteúdos produzidos por estes “cidadãos-jornalistas”. Inclusivamente, não é estranho encontrar pedidos de contribuição de informação – em formato de imagens, vídeo e áudio – por parte dos principais órgãos de comunicação social, ao público, particularmente em situações mais urgentes ou controversas.

Ainda que esta realidade se assuma como uma consequência natural da evolução tecnológica e comunicacional, que a facilidade com que indivíduos comuns possam recolher informação relevante para a população geral, por se encontrarem no local certo à hora certa na posse de ferramentas que permitam a recolha de imagens ou vídeos, e que, por conseguinte, todos nós sejamos “cidadãos-jornalistas” em potencial, a mesma acarreta alguns problemas que não devem ser ignorados. Como supramencionado, notavelmente, importa realçar a maior dificuldade que existe em aferir a origem e a credibilidade dos conteúdos e problemáticas relativas ao crédito que os órgãos de comunicação social dão aos autores dos conteúdos em questão.

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1.3 Técnicas de disseminação de informação nos social media

A importância e o impacto dos social media na propagação de informação assume uma relevância incontornável, não só no contexto noticioso, mas também em outras atividades, tais como campanhas políticas. Desta forma, é frequente encontrar esforços de influenciar o debate numa determinada direção, em várias plataformas online. As técnicas utilizadas podem ser classificadas em duas categorias distintas: as explícitas, que passam pela partilha de conteúdo cujo autor é identificável, sendo que os utilizadores de uma dada plataforma de social media sabem quem são os agentes políticos e podem observar e participar na sua campanha; e as dissimuladas, em que agentes e utilizadores não identificados ou associados com a campanha política, frequentemente sob um manto de imparcialidade, procuram influenciar a opinião de utilizadores reais (Morstatter, Trevino & Liu, 2017).

Na medida em que as técnicas designadas como explícitas são legítimas e uma consequência natural da adaptação da realidade política ao contexto digital, o mesmo não pode ser afirmado inequivocamente para as técnicas dissimuladas, que assumem consequências potencialmente gravosas para os indivíduos. Ainda que a motivação política por trás destas técnicas seja central, estas assumem também uma relevância considerável quando analisadas de um ponto de vista comunicacional e jornalístico, sendo que muita da produção noticiosa tem contornos e implicações políticas e os espaços criados pelas publicações noticiosas – tais como caixas de comentários – são locais de excelência para a aplicação destas técnicas. Neste sentido, atentaremos agora a duas técnicas dissimuladas de propagação de informação nas redes sociais.

A primeira técnica dissimulada que importa identificar e que se assume como um fenómeno relativamente recente em contexto online são os “social bots” – robôs sociais, numa tradução literal. Ainda que a verdadeira extensão da sua atuação seja alvo de debate, é aceite que, em determinados contextos, os mesmos assumam um papel de relevo na propagação de fake news (Morstatter, Trevino & Liu, 2017; Shao et al., 2017).

Estas contas automatizadas são particularmente ativas nas fases iniciais de propagação de alegações virais, tendendo a ter como alvo utilizadores influentes, através de respostas e menções, de forma a estes servirem como plataforma orgânica de disseminação da informação em causa. Os seres humanos são vulneráveis a esta manipulação, partilhando publicações de bots que espalham estas fake news, sendo que

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fontes bem-sucedidas na propagação de alegações falsas ou enviesadas são largamente apoiadas por estas contas. Estes bots podem “postar” conteúdo e interagir uns com os outros e com utilizadores reais através de conexões sociais, como se de pessoas reais se tratassem. Neste sentido, as “câmaras de eco” criadas facilitam a adaptação da desinformação e a sua propagação àqueles que têm maior probabilidade de nela acreditar. A amplificação de fake news através de social bots sobrecarrega a capacidade de verificação dos factos, dada a atenção finita dos indivíduos, assim como a tendência de aderir ao que é popular e de confiar em informação em determinados contextos sociais (Shao et al., 2017).

Paralelamente, a segunda técnica dissimulada importante para a compreensão da influência e da relevância dos social media atualmente é o de “shill”, termo que pode ser livremente traduzido como “cúmplice” ou “figurante”. Os shills são profissionais que levam a cabo respostas concertadas perante utilizadores com posições ou perspetivas opostas, frequentemente ao serviço de uma campanha política, sendo então utilizadores reais contratados por uma organização no sentido de promover uma ideia ou uma agenda através do combate concertado de opiniões opostas. Ao invés de criarem novas publicações, os shills caracterizam-se por espalhar informação confrontando diretamente indivíduos com opiniões opostas, respondendo diretamente aos mesmos, de forma a não só disseminar a “sua” informação, mas também de “corrigir” utilizadores que disseminam informação contrária aos objetivos da sua campanha (Morstatter, Trevino & Liu, 2017).

Na realidade portuguesa, apesar de não haver uma grande quantidade de investigações sobre estas temáticas nem um corpo de conhecimento sistematizado, é inegável a importância dada pelos principais partidos às redes sociais e ao tipo de comunicação realizada através das mesmas. Adicionalmente, no que toca às técnicas dissimuladas, a verdade é que é possível encontrar, em contexto online, vários artigos e discussões sobre as mesmas1. Também algumas cadeias televisivas realizaram reportagens, particularmente durante a campanha eleitoral das últimas eleições legislativas, relativamente à criação de contas falsas nas redes sociais com motivações políticas, no sentido de influenciar a opinião dos utilizadores. Ainda que, possivelmente, de forma ainda incipiente quando comparado a outras realidades, Portugal não estará imune a este tipo de técnicas de disseminação de informação nos social media.

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1.4 Motivações para a promoção de fake news

No seguimento do exposto supra, em que foram abordadas algumas das técnicas utilizadas para a propagação de fake news em contexto digital online, importa analisar agora as principais motivações para a disseminação das mesmas. Como já foi referido, a partilha de informação nos social media contribui para a formação e estruturação de opiniões individuais e coletivas. Milhões de utilizadores são expostos diariamente a quantidades incomensuráveis de informação, cuja origem vai desde ativistas de base a utilizadores sustentados em publicidade. Enquanto que a maior parte das campanhas de informação são benignas, algumas podem ter propósitos nefastos, tais como propaganda terrorista, astroturfing político – i.e., propaganda dissimulada por parte de poderosos atores políticos com o objetivo de imitar atividade orgânica de base (Keller et al., 2017) – e manipulação de mercados financeiros (Ferrara et al., 2016; Shao et al., 2017).

A disseminação de desinformação online é, ainda, muito mais barata quando comparada com a televisão ou com a imprensa escrita, podendo ainda ser adaptada, multiplicada e difundida além-fronteiras de forma muito eficiente (Illarianov, 2014, cit. in Aro, 2016).

Para além das motivações financeiras e da busca de obtenção de receitas através da competição por cliques e do fenómeno de clickbait, já referidas, importa atentar agora a motivações de ordem política e social na disseminação de fake new.

Assim, no que toca às motivações por trás das fake news, as mais gravosas incluem a promoção de informação e a influência sobre opiniões coletivas (Ferrara et al., 2016). Esta participação por parte de diferentes agentes, tais como corporações e governos, entre outros, pode ser caraterizada por métodos opacos de popularidade percecionada e real da informação promovida, sendo que recentes exemplos de abuso incluem:

1. Astroturfing em campanhas políticas, ou tentativas de disseminação de fake news sob o pretexto de conversações de base orgânica (Ratkiewicz et al., 2011, cit. in ibidem);

2. A promoção orquestrada do consenso percecionado em assuntos sociais relevantes por parte de alguns governos (Shearlaw, 2015, cit. in Ferrara et al., 2016);

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3. Propaganda e recrutamento por parte de organizações terroristas tais como o ISIS (Berger & Morgan, 2015, cit. in Ferrara et al., 2016);

4. Campanhas envolvendo os social media e a manipulação do mercado de ações (U.S. Securities and Exchange Commission, 2015, cit. in Ferrara et al., 2016). Segundo Ferrara et al. (2016), existem pelo menos três importantes dimensões em que as campanhas de informação merecem investigação. O primeiro contende com a questão da fiabilidade da informação difundida, que pode variar entre factos verificados e rumores e notícias exageradas, enviesadas, não-verificadas e fabricadas. O segundo concerne com as estratégias levadas a cabo no âmbito propagandístico: de uma marca conhecida que promove abertamente os seus produtos, dirigindo-se a utilizadores que mostraram interesse no produto, à adoção de social bots e contas falsas ou manipuladas que se fazem passar por humanos (Ferrara et al., 2014, cit. in ibidem). A terceira dimensão relaciona-se com as entidades – possivelmente dissimuladas – por trás dos esforços de promoção e da transparência dos seus objetivos.

No que toca aos conteúdos noticiosos per se, importa realçar três objetivos aparentes por trás das motivações subjacentes à falsificação de informação (Rubin, Conroy & Chen, 2015a):

1. Maximizar os ganhos, a reputação e a competência de um indivíduo;

2. Minimizar a reputação de indivíduos ou organizações, diminuindo a sua avaliação ou credibilidade;

3. Montar “armadilhas” de copyright, no sentido de detetar situações de plágio ou de violações de direitos de autor.

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1.5 Efeitos das fake news nos indivíduos

Apesar de não ser esse o objetivo primordial desta investigação, importa compreender de que forma os indivíduos assimilam a desinformação a que são expostos, no sentido de perceber a verdadeira extensão potencial das consequências das fake news para os mesmos em particular, e para a sociedade, como um todo.

Primeiramente, importa compreender que a desinformação online tem tanta probabilidade de se tornar “viral” como a informação confiável (Qiu et al., 2017, cit. in Shao et al., 2017). As redes sociais encontram-se fortemente polarizadas e segregadas ao longo de linhas políticas, sendo que as “câmaras de eco” resultantes providenciam exposição seletiva a fontes noticiosas, enviesando a perspetiva do mundo. Para além disto, as plataformas de social media estão desenhadas de forma a priorizar conteúdos envolventes, em prejuízo de notícias confiáveis, sendo que este viés algorítmico de popularidade impede a seleção de conteúdo de qualidade. Todos estes fatores desempenham um papel no sentido do “confirmation bias” – viés de confirmação, tornando a verdade difícil de discernir, sendo que, adicionalmente, as teorias de informação motivada sugerem que as predisposições políticas afetam a seleção, o processamento e a retenção de informação política (Stroud & Muddiman, 2013, Rochlin, 2017; Shao et al., 2017).

Adicionalmente, uma breve abordagem a alguns fenómenos psicológicos é essencial para compreender como e porquê os indivíduos, por vezes, assimilam fake news como histórias verdadeiras. Um destes fenómenos passa pelo facto de que informação que é frequentemente repetida tem maior probabilidade de ser considerada verdadeira do que informação que nunca tenha sido ouvida antes (Polage, 2012). Este fenómeno é comummente denominado na literatura por “illusory-truth effect” – efeito de verdade ilusória, sendo que os sujeitos classificam declarações repetidas como mais verdadeiras do que novas declarações, sendo a familiaridade um critério de base de validação de informações (Hasher, Goldstein & Topino, 1977, Arkes, Hackett & Boehm, 1989, Begg, Anas & Farinacci, 1992; cit. in Polage, 2012).

Um estudo realizado por Polage (2012) demonstra que a exposição a histórias falsas aumentam a plausibilidade e credibilidade percecionadas das mesmas. Esta conclusão sugere que expor indivíduos a informação falsa aumenta a sua crença na mesma informação falsa. Alguns autores afirmam que, consequentemente, quanto mais familiar

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a informação parecer, mais credível é percecionada a fonte de onde se assume que a mesma originou (Fragale & Heath, 2004; cit. in ibidem).

De uma perspetiva mais concreta, é expectável que indivíduos com acesso a múltiplas fontes de informação, incluindo “hard news” – notícias que se caracterizam por ter um elevado valor de notícia, usualmente relativas a tópicos como política, economia e temas sociais, e que exigem publicação imediata (Smith, 1985, Whetmore, 1987, Limor & Mann, 1997, Patterson, 2000, cit. in Lehman-Wilzig & Seletzky, 2010) – e fake news, percecionem menos as últimas como representativas do mundo político real do que indivíduos expostos, principalmente, a fake news e apenas raramente a hard news. A exposição a hard news modera o efeito de exposição a fake news no realismo percecionado das mesmas fake news. Enquanto a maior parte dos estudos existentes assumem os efeitos das fake news como diretos, Balmas (2012) indica que é a perceção das fake news como realistas, mais do que a mera exposição às mesmas, que impacta a sensibilidade política dos indivíduos. Em suma, as fake news relativas a políticas e a políticos são percecionadas como realistas apenas até as hard news serem levadas em conta. Adicionalmente, o impacto das fake news nas atitudes políticas encontram-se grandemente limitadas aos indivíduos que as interpretam como sérias, acreditando que representam de forma precisa a arena política.

Relativamente à capacidade do ser humano de detetar fraudes noticiosas, estudos recentes da área da psicologia interpessoal e da comunicação demonstram que os indivíduos geralmente não apresentam grande sucesso na deteção de mentiras, mesmo quando alertados para tal possibilidade, sendo que, em média, a taxa de sucesso é de cerca de 50% (Rubin, Conroy & Chen, 2015a). No entanto, uma análise de dez importantes casos de fake news em meios de comunicação mainstream americanos sugere que os editores estão atentos a padrões reconhecíveis no sentido de evitar fraudes jornalísticas:

“Notícias enganadoras têm maior probabilidade de serem apresentadas de uma localização remota, de se incluírem em tópicos propícios ao sigilo das fontes, de saírem na primeira página ou na capa, de conterem um maior número de fontes, mais diversas e mais difíceis de rastrear” (Lasorsa & Dai, 2007; cit. in Rubin, Conroy & Chen, 2015a).

Com o esbatimento das distinções entre notícias genuínas e enganosas, “poucos mecanismos de verificação de notícias existem atualmente, e o simples volume de

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informação requer novas e automatizadas abordagens” (Rubin, Conroy & Chen, 2015b, p. 1), sendo que o contexto das notícias online tem, surpreendentemente, recebido pouca atenção no que toca à deteção de “digital deception”, quando comparado a outros contextos digitais, tais como e-mails interpessoais, perfis de redes sociais falsos, perfis de dating e avaliação de produtos e currículos online (Rubin, Conroy & Chen, 2015a). No entanto, investigadores das áreas da comunicação, do social, da cognição e dos computadores têm vindo a focar-se no estudo das causas complexas da difusão viral de desinformação digital e no desenvolvimento de soluções enquanto plataformas de pesquisa e de social media começam a implementar contramedidas. Uma das sugestões mais recorrente passa por moderar os social bots e contas automatizadas por software, o que poderá ser uma estratégia eficaz na mitigação da propagação online de desinformação (Shao et al., 2017).

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1.6 Implicações geracionais das mudanças nos contextos

informacionais

Apesar dos social media já não ser uma ferramenta utilizada apenas pelos jovens, tal como indica um estudo conduzido pela Pew Foundation (Marchi, 2012) – que mostra que 47% dos indivíduos de idade compreendida entre os 50 e os 64 anos utilizam os social media e que, até para os indivíduos acima dos 65 anos de idade, a utilização dos mesmos tem crescido rapidamente –, torna-se essencial compreender de que forma as mudanças tecnológicas das últimas décadas são percecionadas de forma geracional, i.e., de que forma os jovens acedem a e assimilam publicações noticiosas no contexto online, sendo que inúmeros estudos enfatizam a importância do papel da Internet para os jovens, na sua expressão identitária e na manutenção das suas ligações sociais com os seus pares, sendo o consumo e a partilha de notícias uma parte integrante deste processo (Livingstone, 2009, Singer et al., 2009, Watkins, 2009, cit. in Marchi, 2012).

Diversos estudos indicam que os hábitos de consumo de notícias formados durante a adolescência moldam os hábitos de consumo de notícias em adulto (Barnhurst & Wartella, 1991, Burgon et al., 1983, Collins & Armstrong, 2008, Grusin & Stone, 1993, Robinson & Levy, 1996, 1998, cit. in Marchi, 2012). No entanto, verifica-se que a maior parte dos indivíduos com menos de 30 anos não subscreve jornais ou sintoniza habitualmente noticiários televisivos ou radiofónicos. Alguns académicos interpretam esta tendência como indicação de que a geração mais jovem não tem interesse nas notícias e que tem uma mentalidade cívica menor do que as gerações passadas (Jones, 2008, Mindich, 2005, Patterson, 2007, Quigley, 1999, cit. in Marchi, 2012), enquanto outros contendem que a diminuição do consumo de notícias tradicionais não significa, necessariamente, que os jovens não tenham interesse em notícias e na política (Costera Meijer, 2007, Harrington, 2008a, Marchi, 2012, Raeymaeckers, 2004, Sherr & Staples, 2004, cit. in Marchi, 2012).

Estas diferentes interpretações refletem dois distintos modelos de cidadania. Segundo Bennett (2008, cit. in Marchi, 2012), no primeiro modelo, correlacionado com os indivíduos mais velhos, o “dutiful citizen” – cidadão zeloso – sente a obrigação de seguir atentamente as notícias diárias e de participar em atividades centradas no governo, tais como votar e políticas partidárias. No segundo modelo, correspondente à juventude, o “actualizing citizen” – cidadão auto-realizante – tem um sentido diminuído de obrigação

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governamental, uma desconfiança dos mainstream media e dos políticos, e um sentido mais elevado de auto-propósito. Os actualizing citizens expressam engajamento cívico através de voluntariado, ativismo de movimentos sociais, e redes de comunicação facilitadas pelas novas tecnologias.

A escassez de jovens nas audiências da imprensa escrita e de radiodifusão contemporâneas tem sido largamente referida (Brown, 2005, Jones, 2008, Mindich, 2005, Patterson, 2007, Purcell et al., 2010, cit. in Marchi, 2012), sendo que académicos e organizações noticiosas têm encontrado dificuldades em compreender o fenómeno. Mindich (2005, cit. in Marchi, 2012), com base num estudo realizado nos Estados Unidos da América, defende que se deu uma “mudança geracional” no sentido do distanciamento das notícias, particularmente das políticas. Na medida em que 80% dos jovens com menos de 30 anos não lê jornais diariamente enquanto 70% dos indivíduos mais velhos o faz, assim como o facto de a idade mediana dos telespectadores de noticiários ser de 60 anos, este autor prevê consequências graves para o futuro da democracia.

Um outro estudo do Joan Shorenstein Center on the Press Politics and Public Policy corrobora esta ideia, demonstrando um ainda maior declínio no consumo de notícias por parte de jovens e concluindo que existe uma base para pessimismo relativamente ao futuro das notícias e dos jovens adultos. Conclui ainda que, quando os adolescentes e jovens adultos seguem as notícias, “são atraídos desproporcionalmente para histórias que têm pouco ou nenhum conteúdo de relações públicas” (Patterson, 2007, cit. in Marchi, 2012).

Estes estudos são representativos do paradigma de “disengaged youth” – juventude desligada (Bennett, 2008, cit. in Marchi, 2012) –, que mantém o foco no declínio geracional relativamente à ligação ao governo (e.g., padrões de voto) e ao envolvimento cívico no geral (e.g., seguir os assuntos públicos nas notícias) como ameaças à própria saúde da democracia.

Por outro lado, um estudo recente relativo a esta temática concluiu que os jovens de hoje em dia não são necessariamente desinformados, mas que são “diferentemente informados” das gerações mais antigas, obtendo notícias através de mensagens de telemóvel, e-mail, redes sociais e conversas com amigos e família (Singer, Clark & Monserrate, 2009, cit. in Marchi, 2012). Neste modelo “a la carte” de obtenção de

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