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O Desenvolvimento da Criatividade e da Percepção Visual

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Academic year: 2021

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Para nós, designers, a criatividade é a principal fer-ramenta. Devemos saber como usá-la, como aproveitá-la integralmente, pois é ela que move nosso trabalho. É ela que representa o grande diferencial em um projeto de de-sign. Planejamento e criatividade são os dois fatores que determinam a qualidade de um projeto. O planejamento é uma técnica. Formalmente, começa com a detecção de um problema ou uma questão. Depois de observá-la, faz-se uma pesquisa sobre o tema. Assimiladas as informa-ções coletadas, geram-se alternativas para a solução do problema, e o projeto se desenvolve. Já a criatividade é o fator que dá a personalidade, a vida e a alma ao projeto. Nesse artigo, pretendo trazer um estudo sobre a criativi-dade, de onde ela vem, e também indícios sobre onde ela foi parar.

É comum ouvirmos as pessoas dizerem que não têm criatividade. Isso não é verdade. Apenas em algumas pessoas ela está mais aflorada do que em outras. Todos nós nascemos com criatividade, a diferença é o que fazemos com ela.

Para entender melhor esse processo, precisamos voltar à infância, e estudar como o desenvolvimento da criatividade ocorre nas crianças. O processo se manifesta claramente nos desenhos infantis, primeiro registro creto da expressão pessoal. Os desenhos infantis con-têm uma originalidade e um frescor de concepção que é a própria essência da infância. As crianças menores,

O Desenvolvimento da Criatividade

e da Percepção Visual

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principalmente, expressam suas idéias, pensamentos e emoções com uma espontaneidade invejada por muitos artistas. O desenho das crianças é feito de maneira mais inconsciente, sem a preocupação do que os observa-dores irão pensar. A criança desenha por puro prazer. Até certa idade, ela não é limitada pelas barreiras exteriores que nos são impostas, as cobranças da família ou da so-ciedade. O que vale é a pura expressão pessoal. Daí os desenhos serem mais criativos. O que torna a arte expres-siva é a manifestação do “eu”, e suas reações subjetivas ao meio.

De acordo com os autores Lowenfeld e Brittain, no livro “O Desenvolvimento da Capacidade Criadora”, o desenho infantil passa por algumas fases de desenvolvimento. Por volta dos dois anos de idade já são feitos os primeiros rabiscos. A criança está livre das influências externas. Suas garatujas são realizadas pelo puro prazer cinestésico, pela possibilidade de poder reg-istrar os movimentos. Aos poucos as linhas vão ficando mais controladas, conforme a criança adquire um con-trole visual sobre elas. O pensamento deixa de ser cines-tésico para ser imaginativo quando a criança relacionar as garatujas a elementos do seu meio. Essas são as primei-ras manifestações de suas experiências sensoriais, e é o desenvolvimento da base para a retenção visual.

A partir dos quatro anos, surgem as primeiras ex-periências representativas. Ainda que sejam ligadas às garatujas, não impedem a identificação dos elementos que estão sendo representados. Nessa fase, o desenho é a oportunidade da criança organizar suas experiências, convertendo o pensamento em forma concreta. O impor-tante não é o aspecto externo dos desenhos, mas o pro-cesso total de criação. Não se deve estabelecer técnicas e padrões.

Por volta dos sete anos, a criança está começando a estruturar seus processos mentais de tal forma que pode começar a ver relações em seu ambiente. Os de-senhos são estruturais e esquematizados. Para isso, as crianças lançam mão da perspectiva afetiva, rebatimento, “Um homem”, desenhado por uma criança de

quatro anos. As primeiras experiências represen-tativas decorrem, naturalmente, das garatujas infantis.

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visão de raio X e representação simultânea de tempo e espaço como recursos.

Entre os nove e doze anos, a criança deixa de lado a repetição dos mesmos símbolos. Ela adquire auto-crítica e também consciência do ambiente natural. Passa a se preocupar com proporções e profundidade. Ainda de

acordo com o livro, “(...) entre os doze e os quatorze anos, alguns jovens já têm o sentimento de serem adultos, mas seus desenhos são apreciados como algo infantil. Isso lhes causa um grande choque.” Assim, a criança se torna muito crítica em relação aos seus trabalhos, devido à pressão que ela sente para que ele se conforme aos padrões adultos de comportamento. Isso pode sufocar seus impulsos criadores. A ânsia e crescer gera uma certa vergonha na criança em relação aos seus desenhos. A cri-ança não quer ser vista como cricri-ança, e sim como adulto, merecedor de respeito perante a sociedade. Assim, a cri-ança sente-se envergonhada de seus desenhos ainda “Estamos brincando no playground”, desenho de uma menina de oito anos. Há o esquema para correr e o esquema para ficar de pé. As criaças que formam a roda são representadas de acordo com a experência infantil de um cículo, não por sua percepção visual. Este desenho é incomum, porque se afasta do conceito de linha de base.

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infantis, e acaba por reprimi-los, e reprime sua vontade de desenhar e de se expressar livremente.

O papel do professor de Artes é extremamente im-portante nesse processo. É ele que está sempre presente, observando o desenvolvimento de cada criança, orientan-do-o e direcionanorientan-do-o. Segundo Lowenfeld e Brittain, o professor deve ter sempre em mente que não se deve im-por padrões e regras a serem seguidos, estabelecer algo supostamente correto, “bonito” ou “feio”. Essas seriam restrições à capacidade criadora e, conseqüentemente, inibiriam a expressão individual da criança e sua auto-afirmação. É preciso ajudar as crianças a desenvolver a confiança na auto-afirmação, propiciada pela expressão artística. O desenho infantil deve ser estimulado não com a intenção de ensinar as técnicas para as crianças, mas pelo fato de este ser um importante processo de apren-dizagem. É a oportunidade dela se expressar, de expor de forma concreta seus pensamentos e sentimentos. À medida que a criança desenha, ela aprende, pois assim ela organiza e concretiza seus pensamentos. Ao mesmo tempo em que lhe dá autoconfiança por estar construindo e se expressando livremente.

1. “Digo alô ao meu amigo do outro lado da rua”. As linhas de base estão nas bordas do papel. 2. Mostra uma parte do estábulo seccionado, para que possamos ver o que tem mais importância: as vacas e o fazendeiro. Vemos o céu, na parte superior, e uma linha de base sob o estábulo, com ar no espaço intermédio.

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De acordo com Maria Helena Guerra, professora do núcleo de artes do Colégio George Pfinsterer, as etapas do desenvolvimento do desenho infantil, propostas no livro mencionado, de fato existem, mas não de uma maneira tão rígida, tão atrelada às faixas etárias. Essa divisão é fei-ta por questões didáticas. Geralmente uma efei-tapa sucede a outra, mas não com uma data marcada para começar e acabar. Algumas crianças se desenvolvem com mais rapi-dez do que outras. Também existem casos de crianças que pulam certas etapas. Exemplificando, podemos relatar um caso concreto. Durante uma aula da professora Maria Helena, observamos os desenhos feitos por duas meni-nas, uma de cinco e outra de sete anos de idade. As duas fizeram seus respectivos desenhos estando juntas em sala de aula. A semelhança na tentativa de organização é bastante nítida. Fizeram uma menina no primeiro plano, enfatizando o rosto, e com uma parte do tronco. Usaram o mesmo esquema para representar o cabelo, e com o mesmo tipo de faixa na cabeça. O desenho da menina de cinco anos era muito mais desenvolvido do que o da de sete, que possivelmente foi quem copiou. As proporções no desenho da mais nova eram muito mais próximas das reais, como o tamanho do corpo em relação ao tamanho da cabeça, o tamanho dos olhos, do nariz e da boca. Estes elementos do rosto estavam corretamente posicionados. Todo o espaço da folha foi bem aproveitado, pois o rosto estava posicionado no centro ótico. Já o desenho da me-nina de sete anos era bastante desproporcional. O corpo era muito menor do que a cabeça, os braços eram cur-tos demais, os olhos, nariz e boca também eram muito pequenos e mal posicionados no rosto, além de terem um formato mais primitivo. A ocupação da folha de papel foi mal planejada. A cabeça estava localizada no centro geométrico da folha, gerando uma grande área vazia no topo do papel, que foi preenchida com outros elementos aleatórios.

Obviamente a menina de cinco anos tem uma per-cepção visual muito mais desenvolvida do que a da meni-na de sete. Cai por terra a rigidez proposta por Lowenfeld em sua teoria. A questão é que, na prática, é impossível

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para o professor saber qual é causa do maior ou menor desenvolvimento da capacidade visual de uma criança. Cabe a ele detectar as deficiências e tentar corrigi-las com seus exercícios.

O que diferencia um desenho pertencente a uma fase ou outra do desenvolvimento é o nível de sofistica-ção se o desenho é mais ou menos elaborado. Isso, na verdade, é um reflexo da maior ou menor apuração da percepção visual da criança autora do desenho. A percep-ção visual e a criatividade se desenvolvem paralelamente. Existem exercícios tanto para um quanto para outro. Se-gundo a professora Maria Helena, nada do que criamos surge do nada. Tudo que criamos vem de alguma ex-periência anterior, vem de algo que usamos como refer-ência, ainda que de maneira inconsciente. Isso também vale para as crianças, que comumente desenham cenas do seu cotidiano. Sendo assim, é preciso que a criança saiba observar ao máximo aquilo que está à sua volta pra que ela possa criar cada vez mais.

Quando a criança começa a desenhar alguma coisa, um carro por exemplo, a partir daí ela vai obser-var com mais atenção os carros em seu dia a dia. O ato de desenhar o carro, e o resultado final do seu desenho, lhe despertam a atenção sobre o tema carro. Se ela se acostumar a observar os carros com mais atenção a cada detalhe, isso vai contribuir para que ela desenvolva a sua percepção visual. Além disso, quanto mais ela observar, mais informação ela vai reter, maior será o seu repertório visual. Conseqüentemente, maior será a sua capacidade de criar.

Por isso, a maior preocupação de Maria Helena em suas aulas é fazer com que as crianças observem o ambiente à sua volta e os seus trabalhos com mais aten-ção. E, principalmente, que reflitam sobre o que estão vendo. Como ela diz, fazer com que eles “olhem, vendo”. O ato de desenhar, antes de tudo, depende do ato de observar, pois as crianças também precisam ter suas referências para criar.

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A criatividade infantil tem origem e reflexo no próprio desenho. A partir dele a criança aumenta sua percepção. Isso desenvolve sua criatividade, que vai se refletir no próprio desenho.

O desenho infantil encanta e desperta o interesse dos adultos pela sua criatividade e pela inocência da mais pura expressão. É curioso o fato de que em trabalhos de ilustração, adultos resgatam a linguagem do desenho in-fantil, encantados pela sua inocência e simplicidade que dão expressividade ao desenho. É o caso de Paul Rand, por exemplo. Seu design era bastante moderno para a época. Em 1956, Rand ilustrou o primeiro de quatro livros infantis de Ann Rand, sua segunda esposa, chamado “I know a lot of things”. Em 1957 ilustrou “Sparkle and spin”, em 1962, “Little 1”, e em 1970, “Listen! Listen!”. Seus livros seguiam a mesma linha de design e ilustração que usava em seus cartazes publicitários. A inspiração nos desenhos infantis, simples e descompromissados, se fa-zia presente, sempre carregados com humor. Nos livros infantis, os desenhos eram um pouco menos sofisticados.

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Eles eram simplificados para facilitar a caracterização. Seu trabalho em capas de livros já era bastante solto e expressivo. Com os livros infantis, seu trabalho era feito à velocidade do inconsciente, o que lhe oferecia mais liber-dade para exercitar seu espírito lúdico.

Sabemos que a importância da criatividade vai muito além do próprio desenho. É das idéias mais inusita-das e criativas, dos brainstorms que nascem as grandes idéias que vão melhorar a nossa sociedade e gerar

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hores condições de vida, com mais conforto e eficiência. Por isso devemos quebrar as barreiras que nos foram im-postas desde a nossa infância. Não devemos inibir nossa idéias diferentes, nossa livre-expressão. Maior será a cria-tividade de um projeto quanto mais pura for a expressão pessoal, livre das barreiras. Somos todos diferentes uns dos outros. Não pensamos e, principalmente, não nos expressamos da mesma forma. Devemos aceitar essas diferenças e enfatizá-las, a fim de realizar um trabalho mais autêntico.

Bibliografia:

LOWENFELD, Viktor.; BRITTAIN, W. Lambert. Desenvolvi-mento da capacidade criadora . São Paulo : Mestre Jou 1977. 448p.

HELLER, Steven. Paul Rand. New York: Phaidon 1999. 255p.

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