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O controle de convencionalidade no processo penal como condição de possibilidade para um maior diálogo com os direitos humanos

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DCJS – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO

MESTRADO EM DIREITOS HUMANOS

ANA PAULA SCHMIDT FAVARIN

O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA UM MAIOR DIÁLOGO

COM OS DIREITOS HUMANOS

Ijuí (RS) 2017

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DCJS – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DIREITO

MESTRADO EM DIREITOS HUMANOS

ANA PAULA SCHMIDT FAVARIN

O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA UM MAIOR DIÁLOGO

COM OS DIREITOS HUMANOS

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Direitos Humanos da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth

Ijuí (RS) 2017

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Catalogação na Publicação

Gislaine Nunes dos Santos CRB10/1845 F272c Favarin, Ana Paula Schimidt.

O controle de convencionalidade no processo penal como condição de possibilidade para um maior diálogo com os direitos humanos / Ana Paula Schmidt Favarin. – Ijuí, 2017. –

89 f. ; 29 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Direitos Humanos.

“Orientador: Maiquel Angelo Dezordi Wermuth”.

1. Direitos humanos. 2. Garantias fundamentais. 3. Controle de convencionalidade. 4. Audiência de custódia. 5. Superlotação carcerária I. Wermuth, Maiquel Angelo Dezordi. II. Título.

CDU: 342.7

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UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Direito

Curso de Mestrado em Direitos Humanos

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação

O CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA UM MAIOR DIÁLOGO

COM OS DIREITOS HUMANOS

elaborada por

ANA PAULA SCHMIDT FAVARIN

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito

Banca Examinadora:

Prof. Dr. Maiquel Angelo Dezordi Wermuth (UNIJUÍ): ______________________________

Profª. Drª. Daiane Moura de Aguiar (UNIAN/SP): __________________________________

Profª. Drª. Fabiana Marion Spengler (UNIJUÍ): _____________________________________

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Lúcio, Mailin e Maitê; para vocês, por seus sorrisos, meus filhos queridos.

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AGRADECIMENTOS

Quero agradecer ao Professor Doutor Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth, meu orientador pela generosidade com que me recebeu no Programa de Pós-Graduação em Direito da UNIJUÍ e pela paciência com que me orientou. À todos os demais professores do PPGD/Mestrado da UNIJUÍ que se doaram de alguma maneira ou outra para ensinar o que sabem e pela amizade construída. À minha família, em especial ao meu esposo Luis, pelo companheirismo e amor, agradeço por poder compartilhar contigo todos os sonhos e projetos. À todos os demais que me auxiliaram em algum momento durante a “fase mestrado”.

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RESUMO

A presente dissertação de mestrado insere-se na linha de pesquisa intitulada “Direitos humanos, relações internacionais e equidade”, do Programa de Pós-Graduação em Direito - Mestrado em Direitos Humanos, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. A pesquisa perspectiva a audiência de custódia como ferramenta para um processo penal mais humano, a partir da observância da convencionalidade da lei aplicada no Brasil, no que se refere à Convenção Americana de Direitos Humanos. Esta investigação teve como problema de pesquisa questionar em que medida o controle de convencionalidade no processo penal pode viabilizar a redução dos danos provocados em razão do exercício do poder punitivo do Estado, viabilizando um maior diálogo com os Direitos Humanos. A hipótese provisoriamente levantada para tal problema é de que a audiência de custódia está prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos em seu artigo 7, apartado 5, o qual dispõe que toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Neste sentido, o estudo tem como finalidade fazer uma reflexão acerca do controle de convencionalidade das leis e a referida audiência de custódia, destinando-se a discutir a redução dos danos provocados pelo poder punitivo a partir do diálogo inclusivo dos direitos humanos. O primeiro capítulo trata do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos e o Direito Processual Penal brasileiro, apresentando a Convenção Americana de Direitos Humanos, juntamente com a atuação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Interamericana de Direitos Humanos no que se refere à proteção internacional dos Direitos Humanos e às consequências de suas decisões sobre as jurisdições dos Estados. Posteriormente, é abordado o delineamento do processo penal de garantias na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 e na Constituição Federal de 1988 como condição de possibilidade para o controle de convencionalidade. No segundo capítulo, trata-se da proteção da liberdade e da prisão como “extrema ratio”. Primeiramente, abordando os problemas referentes ao Direito penal e processual penal brasileiro, que contribuem para a questão da superlotação das prisões do país, referenciando o alto índice de prisões provisórias e a frequente violação aos direitos e garantias fundamentais do preso. Após, trata-se da audiência de custódia como possível solução para o problema das prisões brasileiras, e a efetiva garantia de controle judicial das prisões provisórias. Busca-se, então, demonstrar que a realização da audiência de custódia imediatamente após a prisão em flagrante é iniciativa que encontra respaldo em normas internacionais, sendo mecanismo de prevenção e de combate à tortura, visando também à humanização e à garantia de efetivo controle judicial das prisões provisórias.

Palavras-chave: Direitos Humanos. Controle de Convencionalidade. Audiência de Custódia. Superlotação Carcerária. Garantias Fundamentais.

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ABSTRACT

The present dissertation is inserted in the line of research entitled "Human Rights, international relations and equity", of the post-graduate program in law-masters in Human Rights, the Regional University of the Northwest of the State of Rio Grande do Sul. The research perspective the custody hearing as a tool for criminal proceedings, from the observance of the conventionality of the law applied in Brazil, with regard to the American Convention on human rights. This investigation had the problem of research question to what extent the control of conventionality in the criminal process can enable the reduction of damage caused as a result of the punitive power of the State, enabling greater dialogue with human rights. The hypothesis provisionally lifted to such a problem is that the custody hearing is scheduled in the American Convention on human rights in your article 7, section 5, which provides that any person arrested, detained or held must be conducted, without delay, to the presence of a judge or other authority authorized by law to exercise judicial functions and has the right to be judged within a reasonable period of time or to be released without prejudice to continue the process .In this sense, the study aims to make a reflection about the conventionality of the control laws and such custody hearing, and is intended to discuss the reduction of the damage caused by punitive power from the inclusive human rights dialogue. The first chapter deals with the Inter-American system of Human rights protection and the Brazilian criminal procedural law, the American Convention on human rights, together with the activities of the Inter-American Commission on human rights and the Inter-American Court of human rights in referring to the international protection of human rights and the consequences of their decisions on the jurisdictions of States. Subsequently, it is the delineation of the penal process addressed guarantees on the American Convention on human rights of 1969 and the Federal Constitution of 1988 as a condition of possibility for the control of conventionality. In the second chapter, it is the protection of freedom and imprisonment as "extreme ratio". First, addressing the problems relating to criminal law and criminal procedure in Brazil, contributing to the issue of overcrowding of prisons in the country, referring to the high rate of provisional prisons and the frequent violation of the rack. After, it is the custody hearing as a possible solution to the problem of Brazilian prisons, and to guarantee effective judicial control of provisional prisons. Search, then demonstrate that the implementation of the custody hearing immediately after the arrest in the Act is an initiative that is backed by international standards, being and prevention mechanism to combat torture, seeking the humanization and to ensuring effective judicial control of provisional prisons.

Keywords: Human Rights. Control of Conventionality. Custody hearing. Prison Overcrowding. Fundamental Guarantees.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CADH- Convenção Americana de Direitos Humanos CIDH- Corte Interamericana de Direitos Humanos CIDH- Comissão Interamericana de Direitos Humanos C.F.- Constituição Federal de 1988

C.P.P.- Código de Processo Penal

OEA- Organização dos Estados Americanos ONU- Organização das Nações Unidas

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SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 11 2 O SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E O DIREITO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO: UMA IMBRICAÇÃO NECESSÁRIA... 13

2.1 A formação, desenvolvimento e consolidação do Sistema Interamericano de Direitos Humanos ... 13 2.2 A Convenção Americana de Direitos Humanos e o controle de convencionalidade no processo penal ... 31 2.3 O delineamento do processo penal de garantias na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 e na Constituição Federal de 1988: condição de possibilidade para o controle de convencionalidade ... 38

3 A PROTEÇÃO DA LIBERDADE E A PRISÃO COMO “EXTREMA RATIO” ... 52

3.1 A subversão da lógica da prisão como “extrema ratio” no Brasil: o encarceramento em massa e a violação sistemática de Direitos Humanos dos apenados no cárcere ... 52 3.2 A audiência de custódia como condição de possibilidade para um maior diálogo do direito processual penal brasileiro com os direitos humanos constitucional e convencionalmente assegurados ... 65

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 82 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 85

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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente pesquisa aborda o controle de convencionalidade no Processo Penal como condição de possibilidade para um maior diálogo com os Direitos Humanos. Perspectiva-se a audiência de custódia como ferramenta para um processo penal mais humano, a partir da observância da convencionalidade da lei aplicada no Brasil, no que se refere à Convenção Americana de Direitos Humanos. Neste sentido, este estudo empreende uma reflexão acerca do controle de convencionalidade das leis e a referida audiência de custódia, a partir do diálogo inclusivo dos direitos humanos.

A delimitação do tema questiona a audiência de custódia como instrumento do controle de convencionalidade do ordenamento brasileiro e condição de humanização do processo penal, através da qual, torna-se possível a redução dos índices da superlotação da população carcerária. Esta investigação teve como problema de pesquisa questionar em que medida o controle de convencionalidade no processo penal pode viabilizar a redução dos danos provocados em razão do exercício do poder punitivo do Estado, viabilizando um maior diálogo com os Direitos Humanos.

A hipótese provisoriamente levantada para tal problema é de que a audiência de custódia está prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos em seu artigo 7, apartado 5, o qual dispõe que toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Nesse sentido, compreende-se que a audiência de custódia representa um avanço no que se refere ao tema do controle de convencionalidade no âmbito do processo penal brasileiro. Como objetivo geral de estudo, busca-se analisar, a partir da interação fenomenológica do direito processual penal doméstico com o Direito Internacional de proteção dos Direitos Humanos – por meio do controle de convencionalidade – a possibilidade de uma atuação do sistema processual brasileiro, orientada a reduzir os danos provocados pelo poder punitivo a partir do diálogo (inclusivo) dos Direitos Humanos.

A justificativa inicialmente considerada é a de que o controle de convencionalidade das leis, já bastante conhecido na esfera internacional, vem tomando força no direito nacional dos Estados. Dessa forma, por ser um mecanismo muito eficiente e utilizado no plano internacional, deve também passar a ser mais observado pelos corpos judiciais domésticos, que devem utilizar-se de instrumentos supranacionais advindos do direito dos Direitos Humanos, com a finalidade de dar máxima efetividade aos tratados internacionais.

No que concerne à relevância científica, o tema proposto contribui na superação de lacunas relacionadas à análise da problemática, possibilitando a consolidação de uma crítica reflexiva a partir dos resultados já estabelecidos pela normatização penal positiva. Outrossim, o tema proposto desenvolve-se dentro da linha de pesquisa “Direitos humanos, relações internacionais e equidade”, do Programa de Pós-Graduação em Direito Mestrado em Direitos Humanos, da Unijuí, a qual possui como ênfase de pesquisa discussões acerca de temáticas sociais relacionadas à concretização e efetividade dos direitos humanos e as consequentes políticas que permeiam o debate.

Como metodologia, adotou-se o método científico hipotético-dedutivo, ou dedutivo-falseável, de Karl Popper, por entendê-lo mais apropriado à pesquisa pretendida, na medida em que se acredita que toda pesquisa parte já de um conhecimento prévio, baseado na observação

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dos fenômenos ou no acúmulo de conhecimentos que se processa ao longo da vida do cientista, e, ainda, com base na crença de que, levantado o problema, vislumbram-se algumas possíveis soluções, as hipóteses, que poderão ou não ser corroboradas, ao final da pesquisa.

Ao lado do método de abordagem, o hipotético-dedutivo, opta-se, como método de procedimento, pelo método monográfico. Todavia, o fato de se fazer uso do método procedimental monográfico não significa que não se utilizará, paralelamente, de uma visão panorâmica de outras temáticas correlatas, pois são necessárias e imprescindíveis ao estudo da temática escolhida, na medida em que informem, justifiquem, estruturem ou deem sentido ao tema central.

Operacionalizar-se-ão tais métodos na medida em que se pesquisará sobre uma temática específica e bem delimitada, falseando-se as hipóteses suscitadas, por meio do emprego de vasta pesquisa bibliográfica, utilizando-se da doutrina existente acerca da temática proposta – livros e periódicos, do fichamento e do apontamento, bem como da legislação e da jurisprudência, o que se fará via acesso à Internet.

O presente trabalho foi estruturado em quatro seções, incluindo esta seção introdutória e a seção conclusiva do trabalho. Na segunda seção, trata-se do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos e o Direito Processual Penal brasileiro: uma imbricação necessária. Demonstram-se aí a apresentação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e acerca da atuação da Corte Interamericana de Direitos Humanos na proteção internacional dos Direitos Humanos e as consequências as de suas decisões sobre as jurisdições dos Estados. Realizada a análise do processo histórico de internacionalização desses direitos e da formação de sistemas regionais de defesa e garantia dos direitos humanos, especificamente a partir da consolidação do sistema Interamericano de Direitos Humanos, abordando-se, na sequência, a Convenção Americana de Direitos Humanos e as obrigações de caráter penal e processual penal assumidas pelo Estado brasileiro, que a ratificou.

Após, refere-se sobre a Convenção Americana de Direitos Humanos e o controle de convencionalidade no processo penal, destacando-se o controle de convencionalidade pelos tribunais domésticos, e a intervenção da Corte Interamericana. Posteriormente, é abordado o delineamento do processo penal de garantias na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 e na Constituição Federal de 1988 como condição de possibilidade para o controle de convencionalidade.

Na terceira seção, trata-se da proteção da liberdade e a prisão como “extrema ratio”. Primeiramente, abordam-se os problemas referentes ao Direito penal, que contribuem para a questão da superlotação das prisões brasileiras, referenciando o alto índice de prisões provisórias. Após, trata-se da audiência de custódia como possível solução para o problema das prisões brasileiras, e a efetiva garantia de controle judicial das prisões provisórias.

Por fim, em seção conclusiva, faz-se uma análise dos pontos importantes abordados durante todo o trabalho, agrupando as ideias centrais e discutindo os resultados obtidos com a pesquisa.

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2 O SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E O DIREITO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO: UMA IMBRICAÇÃO

NECESSÁRIA

Conforme Flavia Piovesan (2014, p. 1), o “Direito Internacional dos Direitos Humanos” ganha relevância na metade do século XX, por ocasião da Segunda Guerra Mundial, e seu desenvolvimento pode ser relacionado às grandes violações de direitos humanos ocorridas neste período. Para tanto, torna-se necessário a explanação sobre a origem e formação do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

1.1 A formação, desenvolvimento e consolidação do Sistema Interamericano de Direitos Humanos

Apresentando o Estado como maior violador de direitos humanos, a Era Hitler foi marcada pela lógica da destruição e da descartabilidade da pessoa humana. Sobre o tema, Primo Levi (1988) dá o seu real testemunho de uma tragédia que afetou milhões de pessoas. “É isto um homem?” é considerado o mais belo livro já escrito sobre a existência massacrada dos judeus e nos traz a certeza de que os sujeitos nos campos de extermínio dificilmente poderiam ser identificados com os homens que eram antes da tragédia.

O relato de Primo Levi, diante dos horrores vividos durante a 2ª Guerra, demonstram com clareza as violações cometidas pelos nazistas. Nas palavras de Levi (1988, p. 31), “estamos transformados em fantasmas como os que vimos ontem à noite. Pela primeira vez, então, nos damos conta de que a nossa língua não tem palavras para expressar esta ofensa, a aniquilação de um homem”. A narrativa acerca dos horrores da Guerra segue nos seguintes termos:

Num instante, por intuição quase profética, a realidade nos foi revelada: chegamos ao fundo. Mais para baixo não é possível. Condição humana mais miserável não existe, não dá para imaginar”. “Nada mais é nosso: tiram-nos as roupas, os sapatos, até os cabelos, se falarmos, não nos escutarão – e, se nos escutarem, não nos compreenderão. Roubarão também o nosso nome, e, se quisermos mantê-lo, devemos encontrar dentro de nós a força para tanto, para que, além do nome, sobre alguma coisa de nós, do que éramos” (PRIMO LEVI, 1988, p. 32).

A narrativa de Levi revela que, a partir do momento em que os seres humanos se tornam descartáveis, ou seja, em que vige a lógica da destruição, ocorre uma cruel abolição do valor da pessoa humana, o que torna necessária e urgente a reconstrução dos direitos humanos. Diante das barbáries cometidas contra os direitos humanos, especialmente por ocasião da Segunda Guerra Mundial, os Estados perceberam a necessidade de criar mecanismos internacionais que

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pudessem garantir proteção aos indivíduos e gerassem a responsabilização pela violação ao Estado que descumpriu a obrigação.

Etimologicamente, a palavra “responsabilidade” deriva do latim responsus e do verbo respondere, cujo significado se assemelha a “direito a determinada resposta” (RAMOS, 2004, p. 57). Constitui, em essência, a obrigação de reparar os danos oriundos da violação da norma. Nesse sentido, a teoria da responsabilidade é o ponto de sustentação do ordenamento internacional, posto que não há estabilidade e segurança nas relações internacionais, se o descumprimento de um dever não gerar consequências jurídicas (COELHO, 2008, p. 41).

A responsabilidade internacional e sua evolução não ocorreram de forma linear, mas oscilante, com momentos de avanços e outros de retrocessos. Como fato preliminar, é importante o conhecimento de que a responsabilidade internacional do individuo jamais excluirá a do Estado.

Em consequência da crescente diversidade das formas que os direitos humanos são violados, se faz necessária a imposição de obrigação erga omnes e a extensão de garantias fundamentais também a terceiros indiretamente atingidos pela violação. Não apenas pessoas, mas também Estados começam a ser responsabilizados pela reparação por um dano causado ao projeto de vida de um ser humano, por exemplo.

O reconhecimento das obrigações erga omnes e do acesso à jurisdição internacional como garantia ao individuo previstos nos tratados de direitos humanos já são sinais da prevalência de uma incipiente “razão da humanidade” sobre a habitual razão de Estado. Nas palavras de Cançado Trindade, “não se pode visualizar a humanidade como sujeito de direito a partir da ótica do Estado; o que se impõe é reconhecer os limites do Estado a partir da ótica da humanidade” (RAMOS, 2016, p. 358).

Segundo Piovesan (2015), os precedentes históricos mais significativos do processo de internacionalização dos direitos humanos foram o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho. A autora (1997, p. 133) entende por Direito humanitário aquele que se aplica na hipótese de guerra, no intuito de fixar limites à atuação do Estado e assegurar a observância de direitos fundamentais.

Durante as fases do capitalismo, os direitos humanos foram consagrados, desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e, mais tarde, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), como algo essencial à natureza humana. Conforme Wolkmer (2013), o processo de reconhecimento e afirmação dos direitos humanos constituiu uma verdadeira conquista da sociedade moderna ocidental.

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Os tratados internacionais, especificamente aqueles que versam sobre direitos humanos, são, nesse sentido, de altíssima relevância, pois expressam a evolução da sociedade internacional ao exigirem dos Estados o reconhecimento, a promoção e a proteção desses direitos, Gorczevski; Dias (2012, p. 243).

Efetivamente, essa nova visão, de proteção internacional dos direitos humanos, é algo extremamente recente na história da humanidade e tem seu início com o término da Segunda Guerra Mundial. Com a liberdade de imprensa e o desenvolvimento de modernos meios de comunicação, a comunidade internacional tomou conhecimento das barbáries e atrocidades cometidas. Atitudes que envergonhavam a própria espécie humana. Isso demonstra a necessidade de uma proteção mais efetiva aos direitos humanos; o que nos levou ao processo de internacionalização desses direitos resultando na criação de sistemas de proteção internacional, em que é possível a própria responsabilização de um Estado. O aspecto mais positivo dessas ações foi a reformulação do conceito clássico de soberania como um poder ilimitado que não admite restrições ou exceções (GORCZEVSKI; DIAS, 2012, p. 244).

Herrera Flores (2009, p. 169) conceitua os direitos humanos como o resultado de lutas históricas decorrentes das resistências contra a violência que as diferentes formas de manifestações contra o poder dominante do capital exerceram sobre os indivíduos e coletivos. Deste modo, segundo o autor (2009, p. 170) “Direitos humanos não são algo dado e construído, mas processos, dinâmicas e lutas históricas decorrentes das resistências contra a violência que as diferentes manifestações de poder do capital exerceram contra os indivíduos e coletivos”.

Por direitos humanos, segundo Günther Maluschke, (1998) compreendem-se direitos que pertencem aos indivíduos independentemente de serem membros de um certo Estado, direitos que lhes são próprios somente devido ao fato de serem seres humanos.

Na mesma direção, Bobbio (1992, p. 17) salienta que todos os homens são titulares destes direitos e nem os próprios titulares os podem alienar. O autor entende que os seres humanos possuem certos direitos que devem ser respeitados e garantidos e ninguém, nem mesmo o Estado – e principalmente o Estado, que existe para garantir seu bem-estar – pode violar. Por isso que, na ótica de Bobbio (1992), o mundo moderno pode ser compreendido como uma era de direitos.

De acordo com Gilmar Bedin (2009, p. 14):

Esta referência se materializa na adoção da concepção de Estado de Direito pela maioria dos Estados modernos. Assim sendo, é comum que a referência mais evidentemente vinculada ao conceito de Estado de Direito é a que afirma ser este tipo de Estado aquele que constitucionaliza direitos fundamentais. Por isso, Estado de Direito e direitos humanos (ou direitos fundamentais) são conceitos indissociáveis.

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Assim, nessa visão, os chamados Direitos Humanos aparecem, conforme atesta a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (DUDH), no seu artigo 2º1, como sendo direitos inerentes a todos os seres humanos, “sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição”.

Nessa ótica, seriam os direitos humanos as liberdades, as garantias e os interesses elementares conferidos à pessoa pelo simples fato de nascerem como seres humanos, com a respectiva possibilidade de desenvolver todas as suas plenitudes.

Isso significa que o Direito abrigaria a esfera jurídica mais primária do indivíduo pela única razão de ele se constituir e se desenvolver como ser humano. Contudo, a expressão Direitos Humanos se mostra muito abrangente e difícil de ser conceituada de modo objetivo. Destarte, mais importante do que a sua definição, é a ideia em si de que eles estão ligados à pessoa humana, isto é, aos homens e mulheres, pois são eles que conferem justificação à existência humana.

Neste diapasão, optou-se, no presente trabalho, por adotar a noção de Herrera Flores, ao afirmar que Direitos Humanos são processos de luta pela dignidade e, portanto, não são produtos de essências, nem são imutáveis, nem tampouco universais, pois se constituem a partir das lutas sociais pela dignidade. Com efeito:

Todo producto cultural surge en una determinada realidad, es decir, en un específico e histórico marco de relaciones sociales, morales y naturales. No hay productos culturales al margen del sistema de relaciones que constituye sus condiciones de existencia. No hay productos culturales en sí mismos (HERRERA FLORES, 2010, p. 74).

Isso significa dizer que a efetivação dos direitos, necessariamente, não se reconhece a partir de resoluções, convenções ou declarações, mas a partir de setores organizados da

1No mesmo sentido, dispõe o art. 2º, 1, da CADH que “todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e

as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”. Dando continuidade, o apartado 2 do art. 2º reza que “não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania” (CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 1969).

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sociedade, das lutas sociais que buscam garantir a sua instituição e implementação. Nas palavras de Herrera Flores (2010, p. 74):

Todos surgen como respuestas simbólicas a determinados contextos de relaciones. Ahora bien, los productos culturales no sólo están determinados por dicho contexto, sino que, a su vez, condicionan la realidad en la que se insertan. Este es el circuito cultural. No hay, pues, nada que pueda ser considerado en sí mismo, al margen del contexto específico en que surge y sobre el que actúa.

Conforme Alessandra Facchi (2011), direitos são enunciados em todas as cartas constitucionais, tratados e convenções internacionais. Fazem-se constantes referências aos direitos, seja para opor-se a políticas públicas, seja para legitimá-las ou para solicitá-las, defender e difundir interesses, valores e princípios. Toda reivindicação, individual e coletiva, tende a apresentar-se nos termos de um direito.

Neste sentido, complementa Facchi (2011) que os Direitos Humanos são expressão de valores e necessidades essenciais da pessoa humana, que são devidos a todos independentemente da nacionalidade, como a liberdade e os direitos sociais fundamentais, por exemplo.

Após a segunda guerra mundial, houve uma série de proclamações de direitos humanos em nível interestatal. Maluschke (1998) explica que houve acordos internacionais e convênios entre Estados para proteger os direitos humanos. Sabe-se que todas essas tentativas são louváveis. Mas não pode passar despercebido o fato de que há um grande número de países que ratificaram estes tratados e convenções, mas, não obstante, continuam violando os direitos humanos de maneira extremada.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos serviu de parâmetro para diversos países, inclusive o Brasil, a implantar em seu ordenamento a proteção ao ser humano e a democracia como regime político a ser adotado. A abrangente positivação dos direitos humanos no âmbito internacional é um processo de criação normativa que se inicia no pós-segunda guerra mundial. Tem como fonte material um engajamento moral e político que almejou ser uma resposta jurídica às atrocidades e horrores do totalitarismo no poder. Para Gallardo (2010, p. 63) “nosotros hemos indicado que este resultado, el conflicto y la guerra, resultan de relacionalidades previas, estructurales y situacionales, en las que imperan la violencia y la discriminación resueltas mediante lógicas dedominación”.

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É neste contexto, como afirma Flávia Piovesan (2014), que o pós-guerra deveria significar a reconstrução dos direitos humanos, fazendo-os prevalecer na ordem internacional, produzindo efeito direto no plano interno das sociedades nacionais, por meio do referencial axiológico dos direitos humanos. Daí um direito novo, distinto do direito internacional público tradicional, baseado em normas e obrigações de coexistência e cooperação entre estados soberanos.

Cuando se habla de derechos humanos resulta siempre oportuno recordar la perspectiva desde la que se los enfoca. Existe un exceso de complejo ruido académico, diplomático y político sobre ellos como para imaginar que la expresión, por sí misma tampoco unívoca, “derechos humanos”, tiene valor y significado universales indisputables. Para el caso que nos ocupa, consideramos que el desafío más grande e intenso en el campo de derechos humanos es la distancia que existe, que hemos socialmente producido, y que algunos consideran abismo, entre el discurso que los afirma, la norma jurídica que los reconoce y su cumplimiento efectivo (GALLARDO, 2010, p. 55).

Para Norberto Bobbio (1992), o maior problema dos direitos humanos hoje não é mais o de fundamentá-los, e sim, o de protegê-los, o que corrobora o pensamento de Gallardo (2010). Para muitas pessoas, ainda, os “direitos humanos” representam um horizonte nebuloso. Conforme Gallardo (2010, p. 28, grifos do autor), “en especial para los más empobrecidos socioeconómica y culturalmente, un difuso horizonte de esperanza, pero no una lucha política permanente”. Evidencia-se uma diferença entre o que é dito e o que é praticado, uma distância abissal entre compromisso social e o reivindicar de direitos.

Destarte, Bolzan (2010) salienta que os direitos humanos são universais e cada vez mais se projetam no sentido de seu alargamento objetivo e subjetivo, mantendo seu caráter de temporalidade. Ou seja, são históricos, não definitivos, exigindo a todo o instante não apenas o reconhecimento de situações novas, como também a moldagem de novos instrumentos de resguardo e efetivação de situações já consolidadas.

Com a adoção e a aceitação da Carta das Nações Unidas, da Declaração Universal dos Direitos do Homem e de instrumentos internacionais posteriores no domínio dos direitos humanos, reconheceu-se o princípio de que cada um tem direito à dignidade e ao respeito, a ser reconhecido em qualquer lugar como pessoa diante da lei, assim como de que ninguém pode ser excluído das vantagens do direito e da justiça. Tal reconhecimento representa uma ruptura fundamental com um passado no qual os Direitos Humanos só evocavam os interesses dos privilegiados.

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A Liga das Nações foi criada após a Primeira Guerra Mundial, e tinha como objetivo “promover a cooperação, paz e segurança internacional, condenando agressões externas contra a integridade territorial e independência política de seus membros” (PIOVESAN, 2014, p. 134). A Liga estabelecia obrigações relativas a condições de trabalho justas e dignas, que consubstanciavam um limite à soberania estatal, já que estes dispositivos estabeleciam sanções contra os Estados que os violassem por imposição da comunidade internacional. Piovesan (2014, p. 133) destaca que o Direito Humanitário “é o Direito que se aplica na hipótese de guerra, no intuito de fixar limites à atuação do Estado e assegurar a observância de direitos fundamentais”. Desse modo, “a proteção humanitária objetiva proteger, em caso de guerra, militares postos fora de combate (feridos, doentes, náufragos, prisioneiros) e populações civis.” Assim, pode-se concluir que, “ao se referir a situações de extrema gravidade, o Direito Humanitário ou o Direito Internacional da Guerra impõe uma regulamentação jurídica do emprego da violência no âmbito internacional.” O Direito Humanitário, assim, foi a primeira expressão de que, no plano internacional, há limites à liberdade e à autonomia dos Estados, ainda que na hipótese de conflito armado.

Neste sentido, Cançado Trindade (2005, p. 413) ensina que ao lado dos princípios da universalidade, indivisibilidade e integralidade, os direitos humanos “são pautados pelo princípio da complementariedade dos sistemas e mecanismos de proteção, sejam de base convencional e extraconvencional ou de âmbito global e regional”. Nesse sentido é que a criação dos sistemas regionais, no ensinamento de Hans-Joachim Heintze (2010), é um esforço das Nações Unidas no sentido de garantir regionalmente a proteção dos direitos humanos de forma adequada, levando em consideração especialmente aspectos da tradição histórica, cultural, política e jurídica de cada região.

Conforme salienta Bicudo (2003, p. 229), “o continente americano nos dá o segundo exemplo de regionalização dos Direitos Humanos, no âmbito da OEA e da cooperação interamericana, ao instituir um mecanismo de proteção sofisticado, fortemente inspirado no modelo europeu.” Para tanto, a proteção internacional dos Direitos Humanos no continente americano é pautada por duas instâncias: uma política e outra jurídica. A instância política é formada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), e a instância jurídica é formada pela Convenção Americana de Direitos Humanos e seus órgãos de aplicação e monitoramento.

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De acordo com Carvalho Ramos (2012, p. 188), seus objetivos são amplos e consistem na:

Garantia da paz e segurança internacionais, cooperação e ação solidária, promoção da democracia representativa, promoção dos direitos humanos e erradicação da pobreza, desenvolvimento econômico e social. prevenção de conflitos e busca de solução pacífica de controvérsias.

O sistema criado pela Convenção Americana de Direitos Humanos conta com a participação ativa da Comissão Interamericana, que é o principal órgão jurídico da OEA. Contudo, enquanto 35 Estados são membros da OEA, desses países, 24 ratificaram a Convenção Americana de Direitos Humanos.

Segundo Guerra (2013, p. 101), embora ocorra um grande crescimento em casos que consagram a responsabilidade internacional do Estado por violação aos direitos humanos, em especial aos civis e políticos, no âmbito regional cada sistema de proteção (europeu, americano, africano) apresenta uma estrutura jurídica própria. Embora todos sejam importantes, como já assinalado, o sistema interamericano teve lugar privilegiado neste estudo.

O instrumento de maior importância no sistema interamericano de proteção dos direitos humanos é a Convenção Americana de Direitos Humanos, também denominada de Pacto de San José da Costa Rica. A Convenção foi assinada em San José, na Costa Rica, em 1969, e somente entrou em vigor em 1978. Conforme Trindade (apud GOMES; PIOVESAN, 2000, p. 109):

Para alcançar este estágio, foi necessário esperar quase uma década, desde a adoção da Convenção em 1969. Quatro anos antes, já em 1965, pela resolução XXIV, a II Conferência Extraordinária Interamericana decidira-se pela preparação de uma Convenção Americana sobre Direitos Humanos, cujo anteprojeto original foi elaborado pela Comissão Interamericana em 1967, e por esta adotado no ano seguinte. O texto foi submetido à consideração dos Estados-membros da OEA e, um ano após a Conferência Interamericana Especial sobre Direitos Humanos (realizada em San José da Costa Rica, de 7 a 22 de novembro de 1969), enfim preparou e adotou a Convenção Americana de Direitos Humanos.

Segundo Bicudo (2003, p. 228), os pactos consagraram um fenômeno de coletivização dos direitos do homem. “A Declaração Universal é inteiramente voltada para a pessoa: os direitos humanos são, antes de tudo, os direitos do indivíduo e a Declaração é endereçada aos indivíduos e não aos Estados”.

Já os pactos são dirigidos aos Estados e não aos indivíduos. Conforme o autor (2003, p. 230), a dimensão social do indivíduo é a pedra de toque a ser considerada. O homem não realiza

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os seus direitos senão no interior de uma sociedade liberta de toda contenção externa (colonização) ou interna (opressão): o interesse do indivíduo se confunde com aquele da sociedade em que vive.

A América Latina ostenta o maior grau de desigualdade do mundo. A pobreza na região diminuiu do patamar de 48,3% a 33,2%. Não bastando o acentuado grau de desigualdade, a região ainda se destaca por ser a mais violenta do mundo. Concentra 27% dos homicídios, tendo apenas 9% da população mundial. Dez dos 20 países com maiores taxas de homicídio do mundo são latino-americanos (LAGOS; DAMMERT apud PIOVESAN, 2014, p. 143).

Para Flávia Piovesan (2014, p. 143), a região latino-americana tem, assim, sido caracterizada por elevado grau de exclusão e violência “ao qual se somam democracias em fase de consolidação. A região ainda convive com o legado dos regimes autoritários ditatoriais, com uma cultura de violência e de impunidade,” com a baixa densidade de Estados de Direitos e com a precária tradição de respeito aos direitos humanos no âmbito doméstico.

No período de transição para a democracia em diferentes países da América Latina, nos anos 1980, o tema da violação dos direitos humanos foi um dos pontos mais importantes da agenda política. Mas essa importância foi diferenciada de país para país. No Brasil, por exemplo, a questão das violações e a descoberta de uma nova postura na valorização dos direitos humanos não encontrou a mesma força que em outros países.

O tema sobre os direitos humanos e o tratamento dos conflitos posteriores à liberalização e democratização dos regimes não é um tema que seja exclusivo da América Latina. Na década de 1970, segundo Rodrigo Stumpf González (2010, p. 494) a mesma “situação apresentou-se em países como Espanha, Portugal e Grécia, quando do final de períodos de autoritarismo que, no caso português e espanhol, duraram mais de trinta anos.” Por isso, o tema, que parecia degredado a um segundo plano, surgiu após a estruturação dos novos regimes e a realização de eleições presidenciais, que demonstrariam a superação do passado, trazendo um novo enfoque, nos diferentes países. Na América Latina:

A abertura de processo contra o General Pinochet e a investigação da Caravana da Morte, no Chile, o processo contra o General Videla, entre outros oficiais, por desaparecimento e tráfico de crianças no período ditatorial, na Argentina, a investigação da Operação Condor, o reconhecimento da morte de militantes políticos desaparecidos e indenização de suas famílias no Brasil são uma ilustração. As questões que se colocam são, em primeiro lugar, se esses eventos contribuirão para a prevenção da ocorrência de novos períodos semelhantes e se será resolvido o problema da punição dos violadores ou encontrado um consenso sobre o perdão dentro de cada sociedade. As soluções dadas em cada país para a apuração dos crimes e eventual responsabilização de autores, o tratamento dado a familiares e perseguidos

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e as reações de cada sociedade são alguns dos aspectos abordados (GONZALES, 2010, p. 495).

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, o Brasil foi um dos signatários originais tanto da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem quanto da Declaração Universal de Direitos Humanos (ambas de 1948).

No contexto histórico do Brasil, somente após a democratização do país, com a edição da Constituição de 1988, também conhecida por “Constituição Cidadã”, começa a adquirir consistência e se concretizar esse processo evolutivo de garantias dos direitos fundamentais. Apesar de o Brasil ter sido um dos últimos Estados-membros a aderirem à Convenção Americana dos Direitos Humanos, em 1992, aceitando a jurisdição da Corte a partir de 1998, pode-se afirmar, hoje, que o país teve um rápido avanço na incorporação dos direitos por ela protegidos em seu ordenamento jurídico interno (CAMBIAGHI; VANNUCH, 2013, p. 134).

Assim, a partir da Carta de 1988, importantes tratados internacionais de direitos humanos foram ratificados pelo Brasil. Dentre eles, Piovesan (2008, p. 4) destaca a ratificação: a) da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; b) da Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 28 de setembro de 1989; c) da Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; d) do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; e) do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; f) da Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25 de setembro de 1992; g) da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995; h) do Protocolo à Convenção Americana referente à Abolição da Pena de Morte, em 13 de agosto de 1996; i) do Protocolo à Convenção Americana referente aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), em 21 de agosto de 1996; j) da Convenção Interamericana para Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência, em 15 de agosto de 2001; k) do Estatuto de Roma, que cria o Tribunal Penal Internacional, em 20 de junho de 2002; l) do Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, em 28 de junho de 2002; m) do Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados, em 27 de janeiro de 2004; n) do Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre Venda, Prostituição e Pornografia Infantis, também em 27 de janeiro de 2004; o) do Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura, em 11 de janeiro de 2007.

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Ainda, o Estado brasileiro participou de uma série de acordos de proteção dos direitos individuais, entre os quais a Convenção sobre Genocídio de 1948, as quatro Convenções de Genebra de 1949 (inclusive os dois protocolos adicionais), a Convenção sobre Refugiados de 1951, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (ambos de 1966), a I Convenção Mundial sobre Direitos Humanos, em Teerã (1968) e a II Convenção Mundial sobre Direitos Humanos, em Viena (1993), Coelho (2008, p. 54).

O Sistema Interamericano de Direitos Humanos surgiu junto ao pós-guerra, no direito internacional e em complementariedade à construção do sistema universal de proteção que começou a ser construído com a Declaração de 1948. Conforme Coelho (2008, p. 140), tanto em escala mundial quanto continental, esse novo “sistema representou uma reação normativa, jurídica, política, ética e moral ao extermínio provocado pela Segunda Guerra, com sua catastrófica destruição de vidas humanas, que atingiu o paroxismo no terror do holocausto.”

Assumindo caráter progressista e inovador, o SIDH constituiu-se como sistema regional de proteção e defesa dos direitos humanos, contribuindo para a difusão regional da ideia de que o Estado não é o único sujeito de direito internacional, passando-se a aceitar o indivíduo como pleiteador de seus direitos no âmbito mundial. Tal movimento deu início à revisão do conceito tradicional de soberania do Estado, admitindo-se certo grau de intervenção internacional no contexto interno, em nome da garantia e do respeito aos direitos humanos (CAMBIAGHI, VANNUCH, 2013, p. 134).

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) foi criada por resolução da Quinta Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores em Santiago do Chile, em 1959. A CIDH foi formalmente instalada em 1960, quando o conselho da Organização aprovou seu Estatuto. O Regulamento da Comissão, aprovado em 1980, foi modificado em várias oportunidades, a última delas em 2006.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, segundo Guerra (2013, p. 41), “é um dos órgãos do Sistema Interamericano responsáveis pela promoção e pela proteção de direitos humanos. O objetivo do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos é fazer a responsabilidade internacional dos Estados” de respeitar e garantir o exercício dos direitos humanos.

Segundo o artigo 35 da Carta da OEA, a comissão é uma entidade autônoma da Organização dos Estados Americanos, regida pelas normas da mencionada Carta e da Convenção Americana. A Corte, ao contrário, não é um órgão principal da OEA e sim, um tribunal jurisdicional, que atua em função da Competência estabelecida pela

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Convenção Americana. Desta forma, a Comissão é um órgão quase judicial que possui funções de caráter político diplomático, além de atribuições jurisdicionais quanto ao recebimento dos casos individuais de violações de direitos humanos (GALLY; DULITZKY, apud GOMES; PIOVESAN, 2000, p. 61).

Para tanto, importante frisar que a competência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos alcança todos os Estados partes da Convenção Americana, em relação aos direitos humanos nela consagrados. Alcança, ainda, todos os Estados membros da Organização dos Estados Americanos, em relação aos direitos consagrados na Declaração Americana de 1948.

Quanto à sua composição, segundo Flávia Piovesan (1997), a Comissão é integrada por sete membros “de alta autoridade moral e reconhecida versação em matéria de direitos humanos”, que podem ser nacionais de qualquer Estado-membro da Organização dos Estados Americanos. Ainda, cumpre salientar que os membros da Comissão são eleitos, a título pessoal pela assembleia geral por um período de quatro anos, podendo ser reeleitos apenas uma vez.

A principal função da Comissão Interamericana é promover a observância e a proteção dos direitos humanos na América Latina. Neste sentido, cabe à Comissão fazer recomendações aos governos dos Estados-partes, prevendo a adoção de medidas adequadas à proteção desses direitos. A Comissão é órgão autônomo, uma vez que seus membros exercem suas funções com independência e imparcialidade, não representando o Estado de origem (COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2009).

Cabe à Comissão Interamericana, em relação à Convenção Americana, examinar comunicações, encaminhadas por pessoas, grupos de pessoas ou entidades não governamentais que contenham denúncia de violação de direito consagrado pela Convenção, bem como alegações de violações de direitos humanos por um Estado parte (CONVENÇÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 1969). Como destaca Piovesan (1997, p. 229), “o Estado, ao se tornar parte da Convenção, aceita automática e obrigatoriamente a competência da Comissão para examinar essas comunicações, não sendo necessário elaborar qualquer declaração expressa e específica para tal fim”.

A inexistência de litispendência internacional, também é um requisito de admissibilidade, pois a mesma questão não pode estar pendente em outra instância internacional. Em relação ao procedimento, ao receber uma petição, a Comissão inicialmente decide sobre a sua admissibilidade, levando em consideração os requisitos estabelecidos no

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artigo 462 da Convenção. Se reconhecer a admissibilidade da petição, solicita informações ao Governo denunciado.

Em relação ao exame das petições ou comunicações recebidas, contendo alegações de violações de direitos humanos, Trindade (apud GOMES; PIOVESAN, 2000) explica que a natureza dos procedimentos adotados permitiu à Comissão Interamericana agir com flexibilidade e evitar a pronta rejeição de certas comunicações com base nas condições de admissibilidade (tais como, e.g., o requisito do prévio esgotamento, pelos demandantes, dos recursos de direito interno). À Comissão tem sido possível, mediante uma série de técnicas processuais, e pelo motivo básico acima indicado, usar presunções mais a favor dos reclamantes no que tange às condições de admissibilidade de suas petições ou comunicações.

Sobre o assunto, ensina Trindade (apud GOMES; PIOVESAN, 2000, p. 115) que:

Em relação ao requisito de admissibilidade do prévio esgotamento dos recursos internos, por exemplo, a Comissão tem adotado uma diversidade de soluções, que incluem a solicitação de informações adicionais e o adiantamento da decisão (ao invés as simples rejeição das petições), e a reabertura subsequente dos casos. Em virtude de uma regra de interpretação adotada na II Conferência Interamericana Extraordinária (Rio de Janeiro, 1965) admitiu-se que o requisito de admissibilidade de prévio esgotamento de recursos do direito interno não se aplicaria aos chamados “casos gerais” (de violações generalizadas de direitos humanos). A questão foi objeto de estudos em dezembro de 1968 e maio de 1972, e em 1971-1972 aquela regra de interpretação era aplicada no caso 1.684. Pouco depois, em outro caso, em 1974, a Comissão voltou a aplicar aquela regra de interpretação em alguns casos concernentes à suspensão de garantias de devido processo legal e a outras irregularidades, e à ineficácia dos recursos de amparo e de habeas corpus; com a dispensa de pré-requisito do esgotamento dos recursos internos, pode a Comissão proceder de imediato ao exame do mérito casos.

A tramitação das denúncias e reclamações, tanto privadas, como dos Estados, podem ser divididas em duas etapas: a primeira se refere aos requisitos de admissibilidade e a segunda consiste na observância do contraditório. Piovesan (2014) esclarece que recebidas as

2 Dispõe o Artigo 46 da Convenção Americana que: “1. Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo

com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a. que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos; b. que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c. que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d. que, no caso do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2. As disposições das alíneas a e b do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando: a. não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b. não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los; e c. houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos”.

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informações do governo, ou transcorrido o prazo sem que as tenha recebido, a Comissão verifica se existem ou se subsistem os motivos da petição ou comunicação.

Na hipótese de não existirem ou não subsistirem, a Comissão mandará arquivar o expediente. Contudo, se “o expediente não for arquivado, a Comissão realizará, com o conhecimento das partes, em exame apurado do assunto e, se necessário, realizará uma investigação dos fatos” (PIOVESAN, 2014, p. 143).

Realizado o exame da matéria, a Comissão se empenhará em buscar uma solução amistosa entre as partes – denunciante e Estado. Se atingir seu objetivo, ou seja, a solução amistosa, a Comissão produzirá um parecer que será transmitido ao peticionário e também aos Estados partes da Convenção. O parecer conterá uma breve exposição dos fatos e da solução alcançada.

Importante destacar que, se não for alcançada qualquer solução amistosa, a Comissão redigirá um relatório, para apresentar os fatos e conclusões pertinentes ao caso, e, se necessário, recomendações ao Estado-parte. Este relatório, criado pela Comissão, na chamada terceira fase do procedimento, será determinante e conterá as informações e conclusões da Comissão diante do caso apresentado, indicando se o Estado violou ou não a Convenção Americana. Este documento é enviado ao Estado–parte, que terá o prazo de três meses para se adaptar e cumprir as recomendações exigidas. Se, durante este prazo, o caso não for resolvido pelas partes e nem mesmo for submetido à corte, a Comissão, por maioria absoluta de votos, poderá emitir sua própria opinião e conclusão.

Segundo Piovesan (1997, p. 233):

A Comissão fará as recomendações pertinentes e fixará um prazo, dentro do qual o Estado deverá tomar as medidas que lhe competirem para remediar a situação. Vencido o prazo fixado, a Comissão decidirá, por maioria absoluta de votos de seus membros, se as medidas recomendadas foram adotadas e aplicadas pelo Estado e se publicará o informe, elaborado por ela no relatório anual de suas atividades.

Após a remessa do relatório ao Estado denunciado, respeitado o prazo de três meses, o caso poderá ser direcionado para a Corte Interamericana, que é o órgão jurisdicional do Sistema Interamericano, para ser apreciado. Segundo Piovesan (2014, p. 145), no Sistema Interamericano “apenas a Comissão Interamericana e os Estados-partes podem submeter um

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caso à Corte Interamericana, não estando prevista a legitimação do indivíduo, nos termos do artigo 613 da Convenção Americana”.

Se a Comissão considerar que o Estado em questão não cumpriu as recomendações do informe, nos termos do artigo 504 da Convenção Americana, submeterá o caso à Corte Interamericana, salvo decisão fundada da maioria absoluta dos membros da Comissão.

Cumpre ressaltar que qualquer pessoa, grupo de pessoas ou entidade não governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, nos termos do artigo 445, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado-parte. Segundo Guerra (2013, p. 65), diferentemente do que ocorre no sistema europeu, é vedada a possibilidade de a pessoa litigar diretamente à Corte Interamericana de Direitos Humanos por seus direitos que foram violados no âmbito de determinado Estado, devendo, portanto, provocar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos tem sede em San José, Costa Rica, e se reúne em períodos ordinários e extraordinários de sessões. A instituição foi criada pela Convenção Americana em 1969, mas só começou a operar em 1978, quando o acordo entrou em vigor. A Corte Interamericana de Direitos Humanos se apresenta como uma instituição judicial independente e autônoma regulada pelos artigos 33, b e 52 a 73 da referida Convenção, bem como pelas normas do seu Estatuto.

Sua criação tem origem na proposta apresentada pela delegação brasileira à IX Conferência Interamericana realizada em Bogotá no ano de 1948 e é composta de sete juízes, nacionais dos Estados-membros da Organização, eleitos a título pessoal dentre juristas da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de direitos humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das mais

3 Dispõe o artigo 61 da Convenção Americana que: “1 Somente os Estados Partes e a Comissão têm direito de

submeter caso à decisão da Corte. 2. Para que a Corte possa conhecer de qualquer caso, é necessário que sejam esgotados os processos previstos nos artigos 48 a 50”.

4Dispõe o artigo 50 da Convenção Americana que: “1. Se não se chegar a uma solução, e dentro do prazo que for

fixado pelo Estatuto da Comissão, esta redigirá um relatório no qual exporá os fatos e suas conclusões. Se o relatório não representar, no todo ou em parte, o acordo unânime dos membros da Comissão, qualquer deles poderá agregar ao referido relatório seu voto em separado. Também se agregarão ao relatório as exposições verbais ou escritas que houverem sido feitas pelos interessados em virtude do inciso 1, e, do artigo 48. 2. O relatório será encaminhado aos Estados interessados, aos quais não será facultado publicá-lo. 3. Ao encaminhar o relatório, a Comissão pode formular as proposições e recomendações que julgar adequadas”.

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Dispõe o artigo 44 da Convenção Americana que: “Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado Parte”.

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elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam nacionais ou do Estado que os propuser como candidatos (GUERRA, 2013, p. 72).

A Corte Interamericana de Direitos Humanos apresenta como objetivos a aplicabilidade do referido tratado internacional na ordem jurídica dos Estados-membros que a compõem, conforme preceitua o artigo 1º6.

A grande importância conferida à Corte interamericana é a de que suas decisões são imperativas e exigíveis dentro do território dos países que ratificaram a Convenção Americana de Direitos Humanos. Conforme estabelece o artigo 677 da Convenção, a sentença da Corte será definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance da sentença, a Corte interpretá-la-á, a pedido de qualquer das partes, desde que o pedido seja apresentado dentro de noventa dias a partir da data da notificação da sentença. A sentença proferida pela Corte deve ser motivada.

De acordo com Guerra (2013, p. 107):

Devem ser apresentadas a descrição dos fatos, os fundamentos jurídicos, as conclusões das partes, a decisão propriamente dita, o pronunciamento das custas e o resultado da votação. Como acentuam alguns autores, a sentença determina que o Estado faça cessar a violação, determine que o Estado indenize a vítima ou seus familiares.

Embora a solução amistosa no âmbito da Comissão possa apresentar o mesmo resultado que as sentenças da Corte, enquanto a primeira é fruto de uma negociação entre o Estado e o peticionário, a sentença é produto do livre convencimento dos juízes e possui caráter obrigatório.

O âmbito de atuação da Corte se restringe aos Estados partes da Convenção Americana que reconheceram a obrigatoriedade de sua competência contenciosa. Conforme Coelho (2008, p. 68), além dos preceitos contidos no Pacto São Jose da Costa Rica, a Corte é regida por Estatuto e Regulamento próprios.

6Dispõe o artigo 1 da Convenção Americana que: “A Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma instituição

judiciária autônoma, cujo objetivo é aplicação e a interpretação de Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Corte exerce suas funções em conformidade com as disposições da citada Convenção e deste Estatuto”.

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Dispõe o artigo 67 da Convenção Americana que: “A sentença da Corte será definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance da sentença, a Corte interpretá-la-á, a pedido de qualquer das partes, desde que o pedido seja apresentado dentro de noventa dias a partir da data da notificação da sentença”.

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Os integrantes da Corte são eleitos em Assembleia Geral da OEA, em votação secreta e por aprovação da maioria, a partir da lista de nomes indicados pelos Estados parte da Convenção Americana. Cada país poderá indicar até três indivíduos, desde que sejam nacionais de qualquer membro da organização.

Gaspar Coelho (2008, p. 68) explica que, quando houver lista tríplice, pelo menos um candidato deverá ter nacionalidade diferente daquela do Estado proponente. “Sete juízes serão escolhidos para mandatos de seis anos, sendo que os juízes da Corte só poderão ser reeleitos uma vez, em votação secreta,” e pelo voto da maioria absoluta dos Estados partes na Convenção, na Assembleia Geral da Organização, de uma lista de candidatos propostos pelos mesmos Estados.

Segundo Coelho (2008, p. 68), “os critérios de escolha são a alta autoridade moral e a reconhecida competência em matéria de direitos humanos.” O candidato também deve ter condições para exercer as mais elevadas funções judiciais, de acordo com a Lei de seu Estado natal ou do Estado que o houver indicado.

Os juízes cumprirão com seus deveres de forma independente e imparcial, devendo guardar segredo de todas as deliberações. Também não haverá mais de um juiz do mesmo país (COELHO, 2008, p. 69). Os juízes da Corte “gozam das imunidades conferidas aos agentes diplomáticos e dos privilégios inerentes ao desempenho de suas funções. O presidente dirigirá os trabalhos da Corte e a representará,” podendo ser substituído pelo vice-presidente, quando necessário.

A Corte também pode contar com juízes ah hoc para tratar de determinadas matérias, conforme estabelece o artigo 55 da Convenção Americana, cujos requisitos são os mesmos dos demais juízes da Corte.

Segundo Guerra (2013), a Corte Interamericana tem funções consultiva e jurisdicional. A função consultiva abrange a interpretação de todos os tratados internacionais aplicáveis aos Estados-membros da OEA. Já a função jurisdicional refere-se exclusivamente à aplicação dos preceitos da Convenção Americana de Direitos Humanos. Mas cada função apresenta suas peculiaridades.

Desses compromissos, derivam obrigações de punir, com o rigor de suas normas internas, os infratores de normas de direitos humanos constantes de sua legislação e da

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Convenção Americana, assegurando à vítima a reparação adequada. O Estado não pode se eximir da obrigação de reparar a violação, conforme estabelecem as normas de Direito Internacional relativas à responsabilidade internacional do Estado, alegando, por exemplo, que a medida a ser tomada violaria seu direito interno.

Até o presente momento, somam-se vinte e um Estados que declararam reconhecer a competência contenciosa da Corte. Segundo Guerra (2013, p. 109), dentre os trinta e cinco Estados-membros da Organização dos Estados Americanos, vinte e cinco Estados americanos são partes na Convenção Americana. Os Estados Unidos e o Canadá não ratificaram a Convenção Americana e não reconhecem a competência da Corte.

Os Estados poderão solicitar interpretação sobre o conteúdo da Convenção ou de quaisquer tratados relativos à proteção dos Direitos Humanos aplicáveis aos Estados Americanos. Os pareceres da Corte também poderão versar sobre a (in)compatibilidade entre a legislação interna e os acordos internacionais.

Já a consulta dos órgãos listados no capitulo X da Carta se restringirá aos assuntos de competência do respectivo órgão. Por fim, a Comissão Interamericana poderá requisitar o posicionamento da Corte em relação a qualquer tópico sobre direitos humanos, consoante opinião consultiva do próprio organismo jurisdicional.

É importante sublinhar que os pareceres da Corte Interamericana deverão ser respeitados por todos os Estados, sob pena de responsabilização internacional. Caso contrário, não haveria sentido em se esclarecer como devem ser entendidos da Convenção Americana e se este acordo é compatível com normas internas ou com outros tratados internacionais (COELHO, 2008, p. 70).

Quanto à função contenciosa, Coelho (2008, p. 70) complementa que a “Corte tem atribuição para julgar casos de violação dos direitos humanos somente em relação aos Estados que reconheceram expressamente a obrigatoriedade de sua jurisdição. Somente os Estados-partes da Convenção Americana e da Comissão Interamericana “tem legitimidade para apresentar uma denúncia à Corte e serão representados por meio de um agente e um delegado” respectivamente, que poderão ser auxiliados por quaisquer pessoas de sua confiança.

As decisões que são prolatadas na Corte Interamericana de Direitos Humanos produzem efeitos no plano interno do Estado nacional. No caso brasileiro, por exemplo, tal fato ocorre porque a adesão do Brasil deu-se por meio do Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992, que promulgou a Convenção Americana de Direitos Humanos. Conforme Guerra (2013), a

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