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Zoran Živković O ÚLTIMO LIVRO

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Academic year: 2021

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O úLTIMO LIVRO

Tradução

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Título original: Poslednja knjiga

Copyright © 2008 by Zoran Živkovic´

© Cavalo de Ferro Editores, 2011

para a publicação em território português

Revisão: Marta Duarte Paginação: Finepaper

1.ª edição, Março de 2011 ISBN: 978-989-623-144-6

Quando não encontrar algum livro Cavalo de Ferro nas livrarias, sugerimos que visite o nosso site: www.cavalodeferro.com

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nada naquela morte fazia crer que tivesse sido causada por um acto violento, portanto não havia indícios que justifi-cassem a abertura de uma investigação. Mas a proprietá-ria da Livraproprietá-ria Papyrus entrou em pânico. Era a primeira vez que alguém perdia a vida na sua loja. Telefonou em primeiro lugar para a polícia e logo a seguir chamou uma ambulância.

cheguei ao mesmo tempo que a ambulância. afastei--me para um dos lados da loja e, enquanto o médico fazia o seu trabalho, dei uma olhadela em redor. nunca ali tinha estado antes. Pelos pormenores, podia dizer-se que aquele lugar tinha personalidade. os vasos com plan-tas estavam bem cuidados, as peças decorativas que se encontravam sobre a cornijada pequenalareira estavam agradavelmente arrumadas e não havia vestígios do pó que normalmente se associa aos livros.

— não há nada para si aqui, inspector Lukic´ — disse o médico, enquanto retirava as luvas de plástico. — Foi uma morte natural. Muito provavelmente de paragem cardíaca. Saberemos mais pormenores depois da autóp-sia. independentemente do que possa ter sido, parece ter ocorrido enquanto dormia. resta-nos por isso invejá-lo. — Soltou um risinho discreto entre dentes. — nunca irá sequer saber que morreu.

— Qual foi a hora da morte?

— algures entre as cinco e as seis. Há pelo menos duas horas que o velho senhor estava aqui sentado morto

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ZORan ŽIVkOVIC´

e ninguém se apercebeu de nada. vivemos num mundo impiedoso.

— assim parece — disse eu afastando-me para o lado, de maneira a permitir a passagem dos paramédicos de serviço, que transportavam o corpo numa maca debaixo de um lençol verde.

o médico acenou com a cabeça.

— até à próxima, inspector, quando as circunstâncias forem mais emocionantes.

assim que ficámos os dois sozinhos, aproximei-me da proprietária. Era uma mulher esbelta, com uma longa cabeleira ruiva e um rosto sardento. Tinha um ar muito jovem, mas devia ter perto de trinta e cinco anos. vestia um fato de tweed azul-escuro que condizia com a blusa de um tom mais claro. os óculos de lentes estreitas, pró-prios para leitura, estavam suspensos num cordão colo-cado à volta do pescoço. Permanecia em frente à caixa registadora, sem saber o que fazer com as mãos, o que acontece frequentemente às pessoas que não conseguem esconder a ansiedade.

Estendi-lhe a minha mão numa tentativa de a alhear do seu dilema, nem que fosse por uns instantes.

— inspector Dejan Lukic´. Boa tarde.

— Já tive melhores tardes. vera Gavrilovic´, proprietá-ria da Livraproprietá-ria Papyrus. — Fez uma pausa e depois acres-centou quase relutantemente: — Menina...

— não se quer sentar? — Perguntei-lhe. — não, obrigada. Estou bem assim.

— Já alguma vez tinha visto uma pessoa morta? Por uns breves momentos, ela olhou para mim em silêncio, depois abanou levemente a cabeça.

— a primeira vez é sempre um choque. Especialmente se o falecido não é uma pessoa estranha. conhecia-o?

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— não me lembro de o ter visto anteriormente. Mas entram aqui muitas pessoas. É impossível lembrar-me de todas elas.

— Se lhe serve de consolo, também não se torna mais fácil mesmo para quem já está habituado a ver mortos.

— não me parece que alguma vez me venha a habi-tuar a uma coisa destas.

— Eu apostaria seguramente nisso. Uma livraria é o último lugar onde se espera encontrar um cadáver. É o pri-meiro caso de que tenho conhecimento.

— vamos esperar que assim seja.

— importa-se de me contar o que se passou? Miss Gavrilovic´ respirou fundo antes de começar. — Um pouco antes das oito horas, como é meu hábito todas as noites, anunciei que a loja estava quase a encer-rar. alguns clientes dirigiram-se para a caixa registadora para pagar os livros que queriam levar, enquanto os res-tantes saíram. Só quando o último cliente pagou e se foi embora é que me apercebi de que não estava sozinha.

Ela deu meia-volta e avançou na direcção de um cadei-rão com os estofos desgastados, de um tecido grosso de cor verde-escura. Existiam mais três como aquele, colo-cados nos demais cantos da livraria.

— a cabeça do velho senhor encontrava-se inclinada sobre o livro que tinha no colo. Parecia que estava a ler, mas fiquei com a ideia de que estaria a dormir. não há nada de estranho nisso. Durante o inverno, muitas pes-soas vêm cá sobretudo para se aquecerem. Escolhem um livro, sentam-se num cadeirão e aí permanecem até à hora de fechar. a maior parte lê realmente o livro esco-lhido, mas alguns, particularmente os mais idosos, aca-bam por dormitar. Eu não me importo, desde que não ressonem.

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ZORan ŽIVkOVIC´

Miss Gavrilovic´ encolheu os ombros, como que des- culpando-se.

— aproximei-me do cadeirão e disse-lhe que íamos fechar, mas ele não se mexeu. Depois repeti o que tinha dito anteriormente, mas mais alto, e foi então que lhe coloquei a mão no ombro e o abanei um pouco. o corpo simplesmente tombou para o lado...

acenei com a cabeça.

— De facto foi muito desagradável. Mas o pior já passou. — Será?

olhei para ela de forma inquiridora. — o que quer dizer com isso?

— Se a notícia se espalhar, os nossos clientes podem começar a evitar vir cá. a morte não é a melhor das publicidades para uma livraria.

— não há qualquer motivo para que isso venha a acon-tecer. Tratou-se de uma morte natural e não de um crime. o que aconteceu ao pobre homem poderia ter ocorrido em qualquer outro lugar. É algo que acontece quase todos os dias. ninguém irá fazer caso do sucedido. — Depois de sorrir, repeti as palavras que tinha ouvido havia pouco tempo antes. — vivemos num mundo impiedoso.

a dona da livraria suspirou novamente. Dei mais uma vista de olhos em redor.

— a sua livraria é muito agradável. Preferia ter cá vindo sem ser em trabalho.

— infelizmente não temos muitos livros que possam interessar um inspector da polícia. os livros que vende-mos são maioritariamente literatura séria.

— Então vende o que interessa a este inspector da polícia.

— Deveras?

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— E foi trabalhar para a polícia?

— Fui trabalhar para onde me ofereceram trabalho. o facto de ser entendido em literatura não foi um obstá-culo. Muito pelo contrário, por vezes até me ajudou.

— Policiais? não podem ser considerados literatura séria.

— Pensa que Crime e Castigo ou O Nome da Rosa são lite-ratura light?

— não, claro que não. Mas também nunca os classifi-caria como «histórias de detectives».

— De qualquer maneira, são livros que podem ser lidos como tal.

— É possível. Mas é melhor não entrarmos em assun-tos tão complexos como os da literatura, pelo menos por agora: este não é o momento indicado. Ficarei mais do que satisfeita por trocar opiniões consigo sobre estas questões numa outra ocasião. Quando não estiver de serviço.

— com todo o prazer. — os meus olhos percorreram uma vez mais as altas estantes cheias de livros. — adeus, menina Gavrilovic´.

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2.

o meu colega, o inspector Jovan Petronijevic´, levantou os olhos do jornal quando me viu entrar no gabinete.

— o Dr. Dimitrijevic´ acabou de telefonar. Queria conversar contigo sobre a autópsia que efectuou. Pediu para lhe ligares. É sobre o que vem aqui no jornal, não é?

Estendeu-me o jornal sensacionalista que costu-mava ler habitualmente. Segurei o jornal e olhei para onde ele apontava, ao fundo da página. o título do breve artigo era: «Morte numa Livraria». Pelos vistos, um jornalista bisbilhoteiro tinha descoberto o inci-dente e considerara-o digno de ser noticiado, pro-vavelmente por causa do local onde tudo se passou. a menina Gavrilovic´ não iria ficar muito satisfeita, mesmo que o episódio já estivesse esquecido na manhã seguinte.

— É sobre isso mesmo.

— Finalmente um caso feito à tua medida, eh? — Proferiu ele com uma ponta de troça.

— Literatura e livrarias não são propriamente a mesma coisa. isso deveria ser óbvio mesmo para alguém que só raramente abre um livro. Devolvi-lhe o jornal. — De qualquer forma, não há caso nenhum. o velhote mor-reu de causas naturais. Fui lá em vão.

— Eu não diria isso, a julgar pelo tom de voz do Dr. Dimitrijevic´ ao telefone.

olhei-o, confundido, mas ele mergulhou novamente no jornal sem proferir mais nenhuma palavra.

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Liguei para o departamento de necropsia. Uma voz feminina estridente pediu-me para aguardar um momen- to. Passaram uns bons três minutos até o Dr. Dimitrijevic´ atender.

— como está, inspector? Desculpe tê-lo feito esperar. afinal, as coisas não são tão simples como eu pensava na noite passada.

— como assim?

— o velho senhor não morreu de um ataque cardíaco. a propósito, chamava-se Predrag Todorovic´. Era professor de piano reformado. não há ninguém a quem comunicar a sua morte. vivia sozinho, se não se tiver em conta os três gatos. a sua mulher faleceu há alguns anos atrás. não tiveram filhos.

— Então qual foi a causa da morte?

Do outro lado da linha fez-se silêncio durante uns momentos.

— nada.

Foi a minha vez de ficar em silêncio. — importa-se de repetir?

o médico-legista aclarou a garganta antes de con- tinuar.

— o que eu quero dizer é que não existe nenhuma razão médica para que o Sr. Todorovic´ esteja morto. Ele não teve nem um ataque cardíaco, nem uma apoplexia, nem qualquer outro problema que possa provocar morte súbita. Pelo contrário, apresentava uma forma física surpreenden-temente boa para a sua idade. Pessoas muito mais novas poderiam perfeitamente invejar a sua saúde.

— Mas ele morreu? — E hesitei uns segundos. — não é verdade?

— De facto, sim. Ele está bem morto. Se não estava quando o trouxemos, duvido muito que tivesse sobrevi-vido à autópsia.

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ZORan ŽIVkOVIC´

Franzi o sobrolho. o sentido de humor cínico do Dr. Dimitrijevic´ afastava-se muito dos meus padrões. Talvez não conseguisse evitá-lo, dada a natureza do seu trabalho.

— Então como explica o que aconteceu? — não existe uma explicação simples.

— isso quer dizer que existe uma complicada? normal- mente as pessoas não morrem sem uma razão. algo haverá que a tenha causado.

— Se eu der largas à minha imaginação, talvez seja capaz de arranjar uma explicação complicada. Mas será de tal maneira rebuscadaque até hesito mencioná-la.

— Por favor, não hesite. os devaneios fazem com que o mundo continue a girar.

Ele conteve uma risada. — Pensava que era o dinheiro.

— o dinheiro também, claro. Sou todo ouvidos. — Existe um certo tipo de substâncias químicas que pode causar a morte a uma pessoa sem deixar qualquer rasto. o efeito para quem as tomou é apenas deixar de viver. Simplesmente batem a bota, por assim dizer, tal e qual como aconteceu ao Sr. Todorovic´. aparentemente sem qualquer razão. É claro que, no meu trabalho, nunca me deparei com um caso semelhante: o que sei sobre o assunto, li-o na literatura especializada.

— Uma substância química?

— Sim. Daquelas que apenas podem ser sintetizadas num laboratório bem equipado. não é possível fazê-las em casa. Graças a Deus.

— Mas porque é que são sintetizadas? Quem poderá necessitar delas?

— Bem, em relação a isso, terá de perguntar à agência nacional de Segurança. Eu não passo de um simples médico-legista.

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Seguiu-se um novo período de silêncio.

— a agência nacional de Segurança recorreu a subs-tâncias letais com o propósito de despachar um professor de piano reformado que tinha três gatos e que estava de passagem numa livraria para se aquecer?

— Eu avisei-o de que a explicação seria rebuscada. — vai referir essa situação na certidão de óbito, como sendo a causa da morte?

— É obvio que não.

— Então, o que é que irá mencionar?

— aquilo de que tenho a certeza. Que a causa da morte é desconhecida.

— E isso será suficiente? — Sim, vai ser. a não ser que... — a não ser que?

— a não ser que surja em breve outro caso de morte sem causa aparente.

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3.

Quando entrei na Papyrus, eram aproximadamente oito menos um quarto. apesar de serem quase horas de fechar, ainda permanecia dentro da loja uma dúzia de clientes. a maior parte encontrava-se diante das pra-teleiras, apreciando os títulos das lombadas ou folhe-ando algum volume. Três dos cadeirões estavam ocu-pados. observei as pessoas que neles estavam sentadas. nenhuma parecia dormir. a menina Gavrilovic´ estava na caixa, junto à qual dois clientes aguardavam a sua vez de ser atendidos.

aproximei-me da estante mais próxima, tirei um livro ao acaso, depois dirigi-me para o único cadeirão que estava livre, desabotoei o sobretudo e sentei-me. como as molas estavam bastante gastas, afundei-me completa-mente no assento. os meus joelhos ficaram ao nível da cin-tura. Só depois de me ter sentado é que fiquei consciente de que tinha sido naquele sofá que o Sr. Todorovic´ tinha morrido na noite anterior. Sem nenhuma causa aparente.

abri o volume nas páginas do meio, mas mantive o meu olhar atento por cima do livro. Entretanto, a fila diante da caixa tinha aumentado para o dobro. De entre as pessoas que estavam sentadas nos cadeirões, tentei per-ceber quais teriam vindo à livraria por causa dos livros e quais estariam ali apenas para se aquecer. a mulher de cabelo grisalho, que envergava um casacão cinzento e uma boina a condizer, devia ver muito mal. aproximara de tal forma um volume de lombada estreita dos olhos

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que este lhe ocultava o rosto. o cavalheiro que vestia um casaco axadrezado e segurava um cachimbo apagado folheava um livro cheio de ilustrações. o jovem que tra-zia um cachecol comprido vermelho vivo e uns brincos ostensivos na orelha esquerda estava concentrado na página que tinha diante de si.

Um pouco antes das oito, quando a menina Gavrilovic´ anunciou num tom de voz um pouco mais elevado que estavam prestes a encerrar, o cavalheiro do cachimbo e o jovem levantaram-se de imediato. o jovem diri-giu-se para a caixa, enquanto o cavalheiro mais velho, com algum esforço, voltou a colocar o pesado volume na prateleira mais alta da estante que se encontrava mais próxima. Depois foi buscar o casaco que estava pendurado no bengaleiro junto à entrada e saiu logo a seguir.

a senhora de cabelo grisalho só baixou o livro que estava a ler quando a fila junto à caixa desapareceu. colocou o volume dentro da grande mala de mão que estava no seu colo e dirigiu-se em passos lentos para a porta, caminhando com a relutância de quem não queria trocar a luminosidade e o calor da livraria pela escuridão das ruas ventosas de novembro.

Fracassei lamentavelmente outra vez. Ela parecera-me a menos suspeita. Ficara com a certeza de que era o jovem quem teria segundas intenções e, afinal, ele fora o único a comprar um livro. É o que acontece quando deixamos que os nossos preconceitos levem a melhor. Pessoalmente, nunca seria capaz de usar brincos, mas um bom inspector da polícia não se pode deixar enganar pelas suas preferências pessoais.

Quando a campainha que estava por cima da porta parou de tocar após a saída da velha senhora, virei-me para

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ZORan ŽIVkOVIC´

a dona da loja. Ela sorriu e avançou na minha direcção. Levantei-me e apertei-lhe a mão, que ela me estendera. — Boa noite, inspector.

— Boa noite, menina Gavrilovic´. Espero que a cliente que acabou de sair tenha pago o livro que levou com ela.

— Ela não conseguiu passar despercebida diante de si? claro que não. Um bom inspector tem de ter um exce-lente olho.

— Devia ter intervindo?

— Pensava que o seu trabalho se restringia à investiga-ção de crimes mais sérios, e não a pequenos furtos.

— Tratar de pequenos furtos é uma boa maneira de me manter em forma durante as pausas entre os crimes sérios.

— Se tivesse intervindo estaria enganado. não se regis-tou qualquer roubo. Ela comprou aquela colecção de poe-mas de amor há já bastante tempo e, ao fazê-lo, ganhou o direito de vir para aqui lê-la. visita-nos com regularidade, às quintas-feiras à tarde. Senta-se sempre no mesmo cadei-rão. Se por acaso estiver ocupado, ela mantém-se a seu lado, com uma paciência inabalável, até que fique livre.

— a Papyrus parece atrair personagens únicas.

— Ela está entre as mais moderadas. Temos clientes consideravelmente mais excêntricos. Quer saber como lhes chamamos? aqui entre nós, evidentemente.

— como?

Sorriu de novo, desta vez com uma ponta de des-conforto.

— Pacientes.

— Presumo que mereçam essa designação.

— ajuíze também o senhor. Temos outro cliente que, sempre que cá vem, o que acontece pelo menos uma vez

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por semana, compra sempre o mesmo livro. Leva todos os exemplares que estiverem à mão. isto repete-se há mais de um ano. Já lhe devemos ter vendido perto de 150 exemplares.

— Talvez seja o autor. Ela riu retumbantemente.

— isso não me passou pela cabeça. Mas por que motivo privaria um escritor os seus leitores da oportuni-dade de comprarem o seu livro?

— oh, consigo lembrar-me de pelo menos dois moti-vos. Talvez por não estar satisfeito com o que escreveu. ou então, pelo contrário, por estar tão satisfeito com o seu trabalho que acha que mais ninguém é merecedor de ler o que escreveu.

— Essa seria a forma mais elevada de egoísmo.

— São poucos os escritores que podem gabar-se da sua modéstia.

— ainda estou para conhecer algum. E conheço bas- tantes.

— Porque não lhe pergunta simplesmente se o livro que ele costuma comprar é o livro que ele próprio escreveu?

— Porque a vida nem sempre é assim tão simples. a discrição está em primeiro lugar aqui na Papyrus. não inquirimos acerca das motivações dos nossos clien-tes, embora ocasionalmente eu morra de curiosidade para saber quais são. Por exemplo, adoraria entrar na cabeça da senhora que costuma passar horas em frente da mesma estante a reorganizar os livros que lá se encon-tram. Tenta fazê-lo da maneira mais insuspeita, espe-rando pelos momentos em que julga que eu não estou a olhar na sua direcção.

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ZORan ŽIVkOVIC´

— Sim. nós arrumamos os livros segundo os títulos. ao princípio pensava que ela preferia que os livros estivessem organizados segundo o autor. Mas afinal estava enganada. Durante algum tempo tentei encontrar um padrão na forma como ela os organizava, mas sem sucesso. ou eu não sou suficientemente esperta, ou então não é possível descor-tinar qualquer padrão.

— Porque não lhe pede para não alterar a organiza-ção dos livros?

— Porque se o fizesse perderíamos um bom cliente. Depois de dar livre curso aos seus impulsos de reorgani-zar os livros, ela compra sempre vários. E, na maior parte das vezes, volumes caros. constitui uma compensação mais do que suficiente para a desordem que deixa atrás de si.

— Talvez eu deva dar uma vista de olhos à desordem que ela faz.

Ela lançou-me um olhar de censura.

— Para mostrar que é mais inteligente do que eu? com aquela observação, pôs-me no meu lugar. — claro que não. apenas pensei que...

— Bem, pode ser — disse ela, interrompendo o meu balbuciar. — a próxima vez que ela cá vier eu telefono- -lhe. assim ficaremos a saber até onde vai a sua inteligên-cia. Poderá ficar desapontado quanto às suas aptidões de detective, mas, pelo menos, não será o único a procurar sentidos ocultos nesta livraria.

— não me diga…

— Um dos pacientes da livraria é um velho professor de matemática. Também ele nos visita com regularidade, mas nunca faz nada às escondidas. Pediu-me educada-mente que o autorizasse a desenvolver uma espécie de pesquisa. Uma vez tentou explicar-me de que se tratava,

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mas a matemática nunca foi o meu forte. até mesmo a noção de hipotenusa me ultrapassa.

— Eu gosto de números.

— E no entanto estudou literatura.

— Estão mais relacionadas do que poderia parecer à primeira vista.

— certamente que o professor concordaria consigo. o seu livro de apontamentos está cheio de números e de símbolos. Ele retira livros das prateleiras de acordo com uma espécie de código, folheia-os até encontrar o que procura, depois tira do bolso a sua máquina de calcular e carrega nos números. Depois de assentar os resultados, passa para o livro seguinte. Durante horas a fio. É uma autêntica obsessão.

— Quando termina a consulta compra algum dos livros? — não. Mas na verdade isso não importa. Sou bene-volente com ele, por ser tão simpático. É como se fosse a mascote da Papyrus. os clientes ficam a olhar para ele, porque é parecido com o Einstein: baixa estatura, cabe-los cinzentos desgrenhados, bigode espesso. E é encanta-doramente distraído. Às vezes tem os atacadores desaper-tados, ou abotoou o casaco de forma errada. Uma vez até trazia as pantufas calçadas. E estava a nevar.

— as mascotes são sempre úteis.

— É verdade. Mas não podemos olhar para as coisas apenas pela sua utilidade. À primeira vista poderíamos pensar que tiramos o máximo partido de um paciente, que é exactamente o oposto de um ladrão. Mas ele pro-voca-nos as maiores dores de cabeça.

— o oposto de um ladrão?

— É verdade. Ele não rouba livros; trá-los para a loja. Mesmo quando estamos de olho nele, consegue sempre colocar sorrateiramente um dos seus próprios livros na prateleira.

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ZORan ŽIVkOVIC´

— Mas porque é que ele faz isso?

— não faço ideia. no início pensávamos que ele que-ria livrar-se de alguns livros sem valor e que aquela seque-ria uma solução preferível a deitá-los fora. Mas alguns dos livros que nos deixou aqui na loja eram edições verda-deiramente valiosas. Quando tentámos devolver-lhos, argumentou que não lhe pertenciam e ficou furioso con-nosco. claro que não os podíamos vender, porque não os tínhamos comprado legalmente. Desde então, sem-pre que ele cá vem, temos de procurar aquilo que ele cá deixa e, consequentemente, perdemos imenso tempo.

Percorri a livraria vazia com o olhar.

— as aparências podem realmente enganar. Este local parecia-me inofensivo quando cá entrei ontem pela pri-meira vez.

— a Papyrus não é uma excepção. Todas as livrarias têm os seus pacientes. Mas, independentemente da sua excentricidade, são basicamente inofensivos. não era necessário voltar cá em serviço mais uma vez.

— o que é que a faz pensar que estou aqui em serviço?

— Porque uma pessoa como o senhor não entra numa livraria pouco antes de esta fechar se não for em serviço. a não ser que tenha vindo por causa desse livro, mas duvido.

Ela apontou para o livro que eu segurava.

com um olhar contrito, dirigi-me para a prateleira e coloquei o livro no seu lugar outra vez.

— Quis verificar se o artigo do jornal que noticiou o incidente da noite passada vos tinha causado grandes dissabores.

— oh, não, nada disso. contrariamente às minhas expectativas, tivemos consideravelmente mais visitantes

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do que é habitual. o mundo em que vivemos não é ape-nas cruel, também é depravado. afinal, a morte parece ser a melhor publicidade. Um cínico poderia querer que as coisas continuassem assim.

Dei uma olhadela ao relógio.

— São quase oito e meia. Desculpe tê-la feito esperar tanto tempo. Só mais uma coisa. Lembra-se de ter notado alguma coisa fora do normal em relação ao senhor que morreu aqui ontem à noite?

— algo fora do normal?

— alguém se aproximou dele, ou alguém falou com ele?

Ela pensou um pouco.

— não, pelo menos que me lembre. Mas eu já o tinha informado que não lhe tinha prestado qualquer atenção. alguma coisa pode ter passado despercebida. Porque me pergunta isso? Existe alguma suspeição em relação à sua morte?

— não, claro que não. nenhuma suspeição. Está tudo esclarecido. Foi apenas uma pergunta de rotina.

Sondou-me com o olhar durante uns momentos, mas não disse nada.

— Boa noite, menina Gavrilovic´. Prometo-lhe que a próxima vez que cá vier não estarei definitivamente em serviço.

— Gostaria muito. agrada-me falar consigo. Embora tenha sido eu a fazer a maior parte da conversa. o inspector sabe realmente fazer com que uma pessoa se abra.

— Que tipo de investigador da polícia seria eu se não fosse capaz de o fazer?

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4.

Quando o meu telemóvel tocou, eu conduzia vagarosa-mente, com ambas as mãos no volante, abrindo caminho através do trânsito matinal. Tocou cinco vezes antes de o conseguir atender.

— Dejan, é o Jovan. a menina Gavrilovic´ da Livraria Papyrus acabou de telefonar. Pediu para lhe ligares com urgência. Parece que surgiram novos problemas por lá. Deu-me o número do seu telemóvel. Já o tens?

— como é que o poderia ter?

— Estava só a perguntar. Podias tê-lo anotado.

— não tinha qualquer motivo para o fazer. Pensava que o caso estava encerrado.

— Mesmo que estivesse, e claramente não está, eu teria certamente pedido o número de telefone a uma senhora com uma voz daquelas.

— Estarias a perder o teu tempo. Um indivíduo que se orgulha de não ler quaisquer livros nunca pode-ria impressionar uma senhora com uma voz como aquela.

— Desde quando é que ser um bom leitor tem alguma coisa a ver com o assunto?

— Desde sempre. Tu é que nunca fizeste caso. Dá-me o número.

Depois de mo ter dado, desliguei o telemóvel, enfiei o carro num lugar disponível em plena curva e desliguei o motor. não gosto de falar ao telefone enquanto estou a conduzir.

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Ela atendeu a chamada logo ao primeiro toque. — Estou?

— Menina Gavrilovic´? Fala o inspector Dejan Lukic´. — obrigada por ter telefonado tão rapidamente. — o que aconteceu?

— Parece-me que vamos ter de nos encontrar nova-mente por motivos profissionais. Houve mais uma morte na Papyrus.

como fui lento a responder, ela perguntou: — ainda está aí?

— Sim, desculpe. Diga-me o que aconteceu.

— não tenho muitas informações. a minha colega, que trabalha no turno da manhã, telefonou-me há cerca de dez minutos. Estava muito perturbada. a única coisa que conseguiu dizer-me foi que alguém tinha morrido, mas depois teve de desligar imediatamente, porque a ambulância tinha acabado de chegar.

— Estarei aí em dez minutos. E a menina?

— Eu já estou no carro. Se não ficar retida no trânsito, chegarei à loja ao mesmo tempo que o senhor.

Tirei a luz de emergência do porta-luvas e coloquei-a no tejadilho do carro. Uma chuva gelada ensopou por completo a manga do meu casaco. Liguei a luz de emer-gência, mas não a sirene. o barulho complica-me com os nervos.

apesar do meu avanço, quando cheguei à Papyrus a menina Gavrilovic´ já lá estava. Tinha estacionado ao lado da ambulância e estava naquele momento a sair do carro. Levantou o colarinho do casaco e percorreu apressada-mente a pequena distância até à porta da loja, onde ficou à minha espera.

— como se não bastasse este tempo horrível — disse ela com desalento.

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ZORan ŽIVkOVIC´

Segurei a porta para ela passar e entrei na loja atrás dela. os paramédicos já estavam a levantar a maca. Dirigi-me à jovem médica de serviço e mostrei-lhe o meu distintivo. nunca a tinha visto antes. Era loura, de estatura baixa e roliça e usava demasiada maquilhagem para o meu gosto.

— inspector Lukic´ — proferi eu. — o que descobriu? — não precisava de ter vindo, inspector. Foi um vul-gar ataque de coração. É o terceiro desta manhã. Hoje é um daqueles dias fatais para quem sofre do coração. não temos mãos a medir.

— Tem a certeza?

Ela fulminou-me com o olhar.

— Tem algum motivo para duvidar do meu diagnóstico? — claro que não. Desculpe.

— De qualquer maneira, poderá verificar com os seus próprios olhos quando receber o relatório oficial da autópsia.

— Dê os meus cumprimentos ao Dr. Dimitrijevic´. Ela olhou para mim por um breve instante sem pro-ferir palavra, depois acenou com a cabeça e seguiu atrás dos paramédicos.

Dirigi-me para a caixa registadora, onde se encontrava Miss Gavrilovic´ e uma mulher que devia ser mais nova do que ela, embora parecesse mais velha. Provavelmente porque tudo nela era antiquado, desde o penteado que usava até à roupa e ao porte. o seu cabelo era preto, cortado curto e a direito, e os lábios finos e usava uns óculos demasiado gran-des. vestia um fato escuro completo e uns sapatos de salto raso. ao contrário da médica, não parecia usar maquilha-gem. Este extremo oposto também não me agradou.

— inspector Lukic´ — disse Miss Gavrilovic´ -, deixe-me apresentar-lhe a menina olga Bogdanovic´. É a minha sócia, somos co-proprietárias da Papyrus.

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— Prazer em conhecê-lo — declarou a menina Bogdanovic´, com um sorriso fugaz que mal lhe alterou a seriedade que tinha estampada no rosto. o seu aperto de mão foi frouxo. — a vera já me tinha falado de si, inspector. Ela admira o seu interesse pela literatura. no entanto falhou um pouco enquanto polícia. Garantiu-lhe que não ocorreriam mais mortes na nossa livraria.

— Enganei-me. a Papyrus não parece ser uma livra-ria típica.

— certamente que não. Mas não me agrada nada a ideia de que sejam os cadáveres a tornarem-na atípica.

— os cadáveres também podem ser úteis. até se pode-ria dizer que contribuem para o negócio.

— Será que todos os inspectores da polícia têm um sentido de humor tão mórbido como o seu?

— Por favor, olga — interrompeu a menina Gavrilovic´. — o inspector Lukic´ não pode ser culpabilizado pelo que aconteceu. Tentou ajudar-nos.

— Espero que os nossos problemas terminem aqui — disse eu. — Por favor, conte-me o que se passou.

a menina Bogdanovic´ empurrou os óculos pelo nariz acima com o dedo médio.

— a falecida foi a nossa primeira cliente do dia, logo depois de abrir a loja às dez horas. nunca temos muito movimento pela manhã, especialmente quando chove desta maneira.

— Já alguma vez a tinha visto?

— Julgo que sim, mas não com muita frequência. — Entrou alguém depois dela?

— não, pelo menos até a ambulância chegar. Mas deixe, por favor, as suas perguntas para o fim, após lhe ter contado tudo. as suas interrupções distraem-me.

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ZORan ŽIVkOVIC´

— Percorreu as prateleiras por uns momentos, depois escolheu um livro e sentou-se ali.

apontou para o cadeirão que se encontrava do lado direito do balcão, onde estava a caixa registadora.

— Foi aí que morreu o homem, há duas noites atrás — disse a menina Gavrilovic´.

— Pois é. Se ela soubesse, teria escolhido outro ca- deirão.

— Talvez não fosse supersticiosa — murmurei.

— Desculpe? — Proferiu a menina Bogdanivic´. Ela não precisava de franzir o sobrolho para parecer estar de sobrolho franzido.

— nada. continue, por favor.

— Ela estava concentrada na leitura e eu estava ocu-pada com a caixa. Às sextas-feiras temos quase toda a contabilidade para fazer. Deviam ter passado uns dez minutos quando eu voltei a olhar para ela. não me aper-cebi logo que estava morta.

— Tem alguma experiência em avaliar se alguém está morto?

— não é necessária qualquer experiência quando se constata que alguém se encontra com a cabeça tombada para trás, a boca aberta e os olhos imóveis a olharem fixa-mente para o tecto. Foi uma visão aterradora. Fiquei toda arrepiada.

— não ouviu nada?

— Deveria ter escutado alguma coisa?

— Um ataque cardíaco é normalmente acompanhado por um estertor de morte, e não é silencioso.

— Talvez a pobre coitada não tenha morrido de ata-que cardíaco.

— a médica pensa que sim. — Mas o inspector tem dúvidas.

(29)

— Será que um vulgar inspector da polícia deveria duvidar do que afirma uma especialista?

a menina Gavrilovic´ evitou uma vez mais que uma faísca incendiasse o ambiente entre nós.

— ontem esqueci-me de lhe fazer uma pergunta, inspector. Sempre se confirma que a causa da morte do velhote foi um ataque cardíaco?

— Todorovic´. Predrag Todorivic´. Era um professor de piano aposentado.

— De certo modo era o que ele aparentava ser. — não recebi o relatório do médico que o autopsiou.

— Estava a mentir apenas parcialmente. rigoro-samente falando, a conversa telefónica não fora oficial, e, de facto, ainda não tinha recebido qualquer informação por escrito. — Quando o processo não implica qualquer crime, costumam atrasar-se prover- bialmente. Tem de compreender, estão cheios de trabalho.

— Eu nunca conseguiria ser médica-legista. — o rosto carrancudo da menina Bogdanovic´ deixou transpa-recer uma expressão de aversão.

— E eu gostava de passar o meu tempo a lidar com os livros. Bem vistas as coisas, foi para isso que eu estudei. Mas alguém tem de fazer o trabalho sujo. Pelos vistos, até mesmo o mundo dos livros tem o seu quinhão.

a menina Gavrilovic´ aproximou-se do cadeirão que já tinha contabilizado duas mortes.

— Pergunto-me se deveríamos retirá-lo daqui. os clientes já começaram a evitá-lo e depois desta segunda morte não creio que alguém volte a sentar-se nele.

— como é que descobriram que o Sr. Todorovic´ tam-bém morreu sentado ali? — Perguntei, ao mesmo tempo que me juntava a ela.

(30)

ZORan ŽIVkOVIC´

— oh! Devo ter comentado com alguém. não me lembro. De qualquer maneira, os rumores espalham-se muito rapidamente. ontem, o cadeirão esteve ostensiva- mente vazio durante todo o meu turno. E durante o teu, olga?

a menina Bogdanovic´ permaneceu junto à caixa. — Penso que aconteceu o mesmo. não prestei muita atenção.

olhei para a menina Gavrilovic´.

— não esteve sempre tão ostensivamente vazio. — não esteve?

— não. não se lembra? Eu estive cerca de quinze minutos sentado nele.

— Sim, claro. Mas eu não contei com o inspector. o se- nhor não é um cliente. Esteve aqui em trabalho.

— Essa excelente distinção não teria constituído grande ajuda se existisse algo no cadeirão que causasse ataques cardíacos.

instalou-se o silêncio.

a menina Bogdanovic´ foi a primeira a quebrá-lo. — isso é ridículo. como é que um simples cadeirão poderia causar ataques cardíacos?

— não sei. no entanto, é a única coisa que liga duas mortes repentinas.

— Então, porque não teve também um ataque car- díaco?

— Talvez o cadeirão me tenha poupado devido à minha afinidade com a literatura.

a menina Bogdanovic´ deixou escapar um som que parecia um gato a bufar.

— o seu comportamento parece-me bastante inapro-priado! — Disse ela severamente. os seus lábios apertados formavam uma linha estreita. — as duas desafortunadas

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almas que ali morreram merecem respeito, e não que alguém as ridicularize.

virou-se e dirigiu-se apressadamente para a porta que ficava por detrás do balcão da caixa e que, sem dúvida, levaria a uma divisão de acesso reservado.

— não leve a mal — disse a menina Gavrilovic´ quando ficámos sozinhos. — Tudo isto é demasiado para a olga. Ela também nunca tinha visto uma pessoa morta antes.

— a culpa é minha. Fui longe demais. Parece que este tempo também teve um efeito negativo sobre mim.

— ninguém se sente bem com um tempo assim. agora falando a sério: o que pensa que deveríamos fazer em relação ao cadeirão?

— nada. a melhor coisa a fazer é deixá-lo onde está. — alguém pode sentar-se nele.

— Disse-me que os clientes evitam sentar-se nele. — Mas e se, mesmo assim, alguém se sentar?

— nesse caso, preste atenção a todos os pormeno-res. E telefone-me de imediato. Tem o meu número de telemóvel.

a menina Gavrilovic´ abriu a boca para dizer mais qualquer coisa, mas os sininhos por cima da porta de entrada impediram-na. Um homem jovem e uma rapa-riga entraram na livraria. Ela olhou na direcção da porta da divisão dos fundos, que continuava fechada.

— Está na hora de me ir embora — declarei eu, sal-vando-a de uma situação embaraçosa. E salvando-me a mim também. Se tivéssemos continuado a nossa conversa teria sido certamente confrontado com questões às quais não estava ainda preparado para responder. — Também tenho imenso trabalho entre mãos. Fico a aguardar o seu telefonema.

(32)

5.

Tinha começado a ler quando o telefone tocou.

Estava no meu gabinete. o inspector Petronijevic´ tinha saído mais cedo, durante a tarde, e informara que já não regressaria. a escuridão instalara-se há muito. não havia nenhuma luz acesa, excepto o candeeiro da minha secre-tária, que iluminava um livro aberto.

— Estou?

— Boa tarde, inspector Lukic´. Fala o Dr. Dimitrijevic´. Já não esperava encontrá-lo no seu gabinete.

— Que horas são? — São seis e vinte.

— É assim tão tarde? Fiquei absorvido num caso e não me dei conta de que o tempo passou a voar.

coloquei a fita que fazia de marcador entre as páginas e fechei o livro.

— antes de avançar para o que interessa, gostaria de lhe fazer uma pergunta. Espero que não se importe. É uma questão pessoal.

— Diga. — É casado?

Dei uma gargalhada.

— Se fosse, duvido que ainda estivesse a trabalhar. Porque pergunta?

— Perdi a aposta. — a aposta?

— Por alguma razão estava convencido de que era casado. o meu equívoco vai custar-me uma barra grande de chocolate com avelãs.

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