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A rivalidade entre
Estados Unidos e China e
os impactos para o Brasil
DESTAQUES DO CEBC WEBINAR
COM
THOMAS SHANNON
CEBC BRIEFING - Edição 15 | Outubro de 2020
A rivalidade entre Estados Unidos e China e os impactos para o Brasil
Destaques do CEBC Webinar com Thomas Shannon
Embaixador Thomas Shannon
Thomas Shannon é embaixador de carreira com 35 anos de experiência no Serviço de Relações Exteriores dos Estados Unidos. Trabalhou com seis Presidentes e 11 Secretários de Estado. Quando se aposentou, em 2018, era Subsecretário de Estado para Assuntos Políticos, o terceiro cargo mais alto do Departamento de Estado. Shannon foi Embaixador dos Estados Unidos no Brasil de 2010 a 2013. Atualmente, é Consultor Sênior de Políticas Internacionais do Arnold & Porter, um dos maiores escritórios de advocacia do mundo.
ABERTURA:
Embaixador Luiz Augusto de Castro Neves
Presidente do CEBC. Foi embaixador do Brasil no Japão, na China, e no Paraguai. No Itamaraty, foi secretário-geral adjunto das Relações Exteriores e diretor-geral para as Américas. Foi presidente do CEBRI e atualmente é vice-presidente emérito. É mestre em economia pelo University College da Universidade de Londres.MODERAÇÃO:
Embaixador Sergio Amaral
Former Brazilian Ambassador to the US, England, and France. A career diplomat, Amaral was Minister of Industry and Commerce and spokesperson of the President during the Fernando Henrique Cardoso government. In the private sector, he presided the Brazil-China Business Council (CEBC) and was a member of the board of WWF Brasil, and French and Brazilian companies. Currently, Amaral is associated with the law firm Felsberg e Advogados and is a member of FIESP’s Strategic Council.
CEBC BRIEFING
CEBC Briefing é uma publicação periódica do Conselho Empresarial Brasil-China com relatos
de eventos realizados pelo CEBC, incluindo transcrições, depoimentos, apresentações e materiais similares. Elaboração: Cláudia Trevisan, Tulio Cariello e Camila Amigo
CEBC BRIEFING - Edição 15 | Outubro de 2020 3
s relações diplomáticas entre as duas maiores economias do mundo estão em seu ponto mais baixo desde que foram estabelecidas oficialmente, em 1979. A “guerra comercial” iniciada pelo presidente Donald Trump em 2018 com objetivo de reduzir o gigantesco déficit nas transações americanas com a China, logo evoluiu para uma rivalidade muito mais complexa, que passou a incluir aspectos tecnológicos e geopolíticos que definirão as relações internacionais deste século. O Brasil, que tem China e Estados Unidos como seus mais importantes parceiros econômicos, deve evitar escolher lados. O desafio da diplomacia nacional será equilibrar essas duas relações fundamentais e tirar o máximo de benefícios de ambas, sem que isso prejudique o diálogo e as trocas com um lado ou outro.
Relações entre Estados Unidos e China definirão os rumos do Século XXI
A rivalidade atual entre Estados Unidos e China não é baseada em divergências ideológicas, como foi a Guerra Fria entre americanos e soviéticos, mas em diferenças de poder e propósito. Apesar de Washington e Pequim entenderem governança de maneiras distintas, nenhum dos dois almeja substituir o outro. Suas economias têm um nível de simbiose tão elevado que um eventual rompimento entre ambas seria impensável. Shannon acredita que a forma como a relação bilateral será conduzida pelas lideranças das duas potências definirá os contornos da política e economia internacionais no Século XXI.
A impossibilidade de acordo abrangente entre Estados Unidos e China comprometeu as relações entre Trump e Xi
Quando chegou à presidência, Donald Trump estava decidido a estabelecer uma agenda com Xi Jinping que seria baseada em uma relação pessoal de confiança, para então remodelar aspectos do relacionamento entre os Estados Unidos e a China.
Essa abordagem teve sucesso no período inicial de sua gestão, com a tentativa de reformular o pilar de segurança na relação entre os dois países, saindo de um foco de conflito no Mar do Sul da China para um ponto de cooperação sobre as negociações com a Coreia do Norte. Todavia, devido à impossibilidade de um acordo abrangente, as relações
bilaterais começaram a se deteriorar, ficando ainda mais comprometidas com o surgimento das disputas comerciais.
As economias dos EUA e da China têm um nível de simbiose
tão elevado que um eventual rompimento entre ambas seria
impensável. A forma como a relação bilateral será conduzida
pelas lideranças das duas potências definirá os contornos da
política e economia internacionais no Século XXI.”
Os discursos na Assembleia Geral da ONU evidenciaram a rivalidade entre os dois países
Os discursos dos presidentes Donald Trump e Xi Jinping na Assembleia Geral da ONU, realizada em setembro de 2020, demonstram grandes diferenças entre os dois países e a confirmação de que ambos se enxergam como adversários.
Defendendo seu lema “America First”, Trump, em tom agressivo, culpou a China pela pandemia, defendeu que o país deve ser responsabilizado e punido, além de ter atacado as políticas ambientais chinesas.
Por outro lado, Xi Jinping proferiu um discurso mais diplomático, defendendo o multilateralismo, o diálogo e a cooperação internacional. Alegou que linhas ideológicas ou “jogos de soma zero” não são a resolução para os problemas que o mundo enfrenta. O líder chinês adotou uma abordagem descentralizadora, voltada à ideia de um sistema internacional em que não haja um único país ditando as regras do jogo.
Visão dos americanos sobre a China se deteriorou no governo Trump, mas quadro atual de animosidade pode ser amenizado
De acordo com pesquisas do Pew Research Center, ao longo dos últimos quatro anos houve uma mudança dramática na forma como a população dos Estados Unidos percebe a China. Em 2017, a maioria dos americanos tinha uma visão favorável do país, enquanto pesquisas mais recentes mostram que 60% passaram a vê-lo com desconfiança.
CEBC BRIEFING - Edição 15 | Outubro de 2020 5 De acordo com Shannon, a política externa do governo Trump em relação a Pequim contribuiu para a deterioração da imagem da China junto aos americanos, na medida em que o presidente passou a criticar temas como militarização no Mar do Sul da China e Oceano Índico, espionagem industrial, violação de propriedade intelectual e desrespeito aos direitos humanos e acordos internacionais.
O diplomata acredita que, apesar do cenário geral conturbado, a maior parte da população americana não vê as relações econômicas entre os países como um “jogo de soma zero”. O crescimento da economia chinesa é visto como positivo para os Estados Unidos, uma vez que pode gerar ganhos para os dois lados. Essa percepção favorável da sociedade seria um indicador importante de que é possível construir uma base que leve a uma melhora das relações entre as potências.
Apesar de não se igualar militarmente e em termos de
softpower cultural, a presença global da China nas áreas de
comércio e investimentos já é comparável à dos Estados
Unidos, sendo que em muitos setores há forte interação entre
ambos”
O sucesso da China é um vetor fundamental para o sucesso dos Estados Unidos
Há um debate nos Estados Unidos sobre a competição entre grandes potências. Mesmo o corpo político americano, em sua maioria avesso à China, reconhece que o país asiático se tornou um competidor importante e que deve ser tratado como tal.
Apesar de não se igualar militarmente e em termos de softpower cultural, a presença global da China nas áreas de comércio e investimentos já é comparável à dos Estados Unidos, sendo que em muitos setores há forte interação entre ambos. Esse entendimento evidencia os inúmeros vínculos entre os dois países e põe em xeque a possibilidade de uma dissociação econômica.
Esse grau de interdependência demandará que Washington e Pequim trabalhem por relações mutuamente proveitosas. De acordo com Shannon, a economia mundial e o nível de globalização alcançado não permitem uma desconexão, fazendo com que o sucesso de China seja um vetor fundamental para sucesso dos Estados Unidos.
Aliança nacional contra a China: país é visto como ameaça por Republicanos e Democratas
No próprio governo americano há divergências sobre como deve ser a atuação do país em relação à China. Segundo Shannon, de um lado há um grupo mais moderado, que vê o comportamento chinês como predatório e perigoso, mas acredita que ele pode ser influenciado e mudar ao longo do tempo. Ainda que defenda a utilização de ferramentas punitivas nas relações com Pequim, também reconhece a interdependência entre as duas economias. Dessa forma, não almeja causar danos duradouros ao bem estar econômico da China, já que isso poderia implicar em perdas para os Estados Unidos.
A ala mais radical considera a China um adversário implacável, e a forma de salvar a economia americana seria por meio da dissociação econômica e tecnológica entre duas as potências, de forma a causar consequências graves ao país asiático e dificultar sua emergência no cenário internacional.
O grupo mais extremista é encontrado em maior número no Partido Republicano, mas os Democratas, apesar de perceberem a Rússia como uma ameaça maior, também enxergam Pequim como um adversário de peso. Há, portanto, um apoio bipartidário, tanto no Congresso quanto no Senado americano, à algumas das ações que o presidente Donald Trump tem tomado em relação à China.
Mesmo com uma vitória do democrata Joe Biden nas eleições
de novembro, a deterioração da imagem da China perante a
sociedade americana limita a possibilidade de uma mudança
radical na política externa em relação ao país asiático.”
Com reeleição de Trump ou vitória de Joe Biden, as relações com a China manterão tom de disputa
Mesmo com uma vitória do democrata Joe Biden nas eleições de novembro, a deterioração da imagem da China perante a sociedade americana limita a possibilidade de uma mudança
CEBC BRIEFING - Edição 15 | Outubro de 2020 7 haveria diferenças entre uma administração Republicana, que deve manter uma abordagem unilateral, e um governo Democrata, que poderia priorizar uma estratégia multilateral, por meio de instituições internacionais e alianças com parceiros que compartilham preocupações semelhantes em relação ao comportamento chinês.
EUA mantêm supremacia militar, mas confronto com a China seria altamente custoso
Washington acredita que ainda levará tempo até que a China tenha o mesmo poderio militar dos Estados Unidos. Todavia, a crescente modernização das forças armadas chinesas e sua maior presença nos mares da Ásia elevam muito os riscos de um confronto direto com a marinha dos EUA, o que seria altamente custoso a ambos. Para Shannon, esse contexto faz com que um entendimento no campo militar entre os dois países seja fundamental para conter eventual escalada de tensões que possa levar a um conflito armado.
O Brasil não deve escolher lados nessa disputa, mas poderia
contribuir positivamente para o entendimento entre as duas
potências, na medida em que tenha a capacidade de ajudar os
EUA a compreenderem a importância econômica e comercial
da China em uma América do Sul globalizada.”
Brasil não teria benéficos em escolher lados na disputa entre Washington e Pequim
Segundo o embaixador Sergio Amaral, a maioria dos países latino-americanos estabeleceu relações políticas sólidas e de grande proximidade com os Estados Unidos, ao mesmo tempo que tem fortes interesses econômicos com a China. A rivalidade entre as duas potências pode, portanto, ser prejudicial aos países da região, caso sejam forçados a escolher lados nessa disputa. O caso brasileiro ilustra bem essa situação, uma vez que o país tem China e Estados Unidos como seus principais parceiros comerciais e não poderia escolher um alinhamento único, sob pena de ter graves consequências políticas e econômicas.
Estados Unidos e China têm inúmeros desafios a serem superados para que seja possível remodelar o diálogo bilateral, mas é certo que a relação entre Washington e Pequim será
diretamente influenciada pela forma como seus parceiros no mundo lidarão com as consequências dessa rivalidade. Na visão de Shannon, o Brasil não deve escolher lados nessa disputa, mas poderia contribuir positivamente para o entendimento entre as duas potências, na medida em que tenha a capacidade de ajudar os Estados Unidos a compreenderem a importância econômica e comercial da China em uma América do Sul globalizada. Além disso, também poderia demonstrar à China a importância da democracia, do respeito aos direitos humanos e do comprometimento com acordos internacionais.
O Brasil em meio à disputa pelo 5G
O governo americano tem grande preocupação com a presença da chinesa Huawei no processo de construção das redes 5G no mundo. Washington tem feito uma campanha mundial contra a gigante das telecomunicações, alegando que a empresa representaria um risco à segurança de dados de países aliados.
A Huawei tem presença consolidada nas redes de telecomunicações do Brasil e pode desempenhar um papel importante na construção de infraestrutura 5G nacional. Para Shannon, as lideranças brasileiras precisam ter ciência dos riscos dessa parceria e criar ferramentas para mitigá-los, caso optem por estabelecer acordos com uma empresa que se tornou um ponto central da animosidade entre Estados Unidos e China.
As lideranças brasileiras precisam ter ciência dos riscos de uma
parceria coma Huawei e criar ferramentas para mitigá-los,
caso optem por estabelecer acordos com uma empresa que se
tornou um ponto central da animosidade entre EUA e China.”
Meio ambiente pode ser um escopo para a cooperação entre as duas potências
Estados Unidos e China são potências econômicas altamente poluentes e grandes consumidores de energias fósseis, ainda que o país asiático tenha avançado muito no desenvolvimento de tecnologias ambientais nos últimos anos, chegando a se tornar líder em alguns segmentos.
CEBC BRIEFING - Edição 15 | Outubro de 2020 9 Shannon percebe o setor ambiental como um potencial candidato para uma possível cooperação entre os dois países, sobretudo com a emergência cada vez mais evidente da questão climática na agenda internacional. O diplomata ainda afirmou que o Brasil poderia ter um papel relevante nessa cooperação, dado seu histórico de liderança em preservação ambiental e utilização de fontes de energia não-fósseis.
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SOBRE O CEBC
Fundado em 2004, o Conselho Empresarial Brasil-China é uma instituição bilateral sem fins lucrati-vos formada por duas seções independentes, uma no Brasil e outra na China, e dedicada à promoção do diálogo entre empresas nos dois países. O CEBC concentra sua atuação nos temas estruturais do relacionamento bilateral sino-brasileiro, com o objetivo de aperfeiçoar o ambiente de comércio e investimento entre os países. Em 2015, o CEBC foi reconhecido oficial-mente, no Plano de Ação Conjunta assinado entre o Brasil e a China, como o principal interlocutor dos governos na promoção das relações empre-sariais entre os dois países. Em 2019, no âmbito da Quinta Reunião Plenária da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível (COSBAN), presidida pelos vice-presidentes do Brasil e da China, as partes reconheceram novamente o papel relevante desempenhado pelo Conselho como canal de comunicação com a comunidade empresarial.
DIRETORIA
PRESIDENTE
Embaixador Luiz Augusto de Castro Neves
PRESIDENTE EMÉRITO
Embaixador Sergio Amaral
VICE-PRESIDENTES
José Leandro Borges (Bradesco)
Marcio Senne de Moraes (Vale)
Bruno Ferla (BRF)
DIRETORES
André Clark (Siemens) Luiz Felipe Trevisan (Itaú BBA)
Nelson Salgado (Embraer)
Pedro Aguiar de Freitas (Veirano Advogados)
Reinaldo Guang Ruey Ma (TozziniFreire Advogados)
Roberto Amadeu Milani (Comexport)
DIRETORA DE ECONOMIA
Fabiana D’Atri (Bradesco)
COMITÊ CONSULTIVO
Embaixador Marcos Caramuru de Paiva; Embaixador Paulo Estivallet; Embaixador Sergio Amaral; Ivan Ramalho; Luiz Fernando Furlan; Marcos Jank; Octávio de Barros; Renato Baumann; Tatiana Rosito ASSOCIADOS
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